Este documento discute a meningite bacteriana. Resume os principais pontos como:
1) Define meningite bacteriana e discute sua epidemiologia, etiologia, fatores de risco e vias de infecção.
2) Detalha o quadro clínico, exames auxiliares como punção lombar e seus achados, e o significado destes achados.
3) Apresenta as considerações sobre o tratamento empírico e guiado pela cultura, com ênfase nos antibióticos usados.
1. REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE
MINISTÉRIO DA SAÚDE
HOSPITAL PROVINCIAL DE XAI-XAI
Meningite Bacteriana
Xai-Xai, de Março de 2016
Sebastião Moisés (Medico Generalista)
2. Tópicos
• Breve consideração anatómica das meninges (orador)
• Conceito
• Epidemiologia
• Etiologia
• Factores de risco
• Vias de infecção
• Fisiopatologia
• Quadro clinico
• Exames auxiliares(Elisa Mabuza)
• Tratamento
• Complicações
• Seguimento
• Conclusões
3. Meningite bacteriana
Conceito:
• Inflamação das
membranas que
envolvem o SNC (pia-
máter, aracnóide) até
ao espaço
subaracnoídeo.
• Constitui uma
urgência medica
extrema.
• São de notificação
obrigatória.
Epidemiologia:
Fr. nos extremos da vida
(infância e idosos), em
adultos fr. em indivíduos
com patologia debilitante:
HIV, Neoplasias,
quimioterapia,
Esplenectomias, DM,
doenças auto-imunes, ID.
primarias, desnutrição, etc.
Com mortalidade elevada e
graves sequelas associadas.
• Aumenta a fr. durante o
inverno.
4.
5. Agentes etiológicos
Idade/ situação clinica debilitante Agentes etiológicos frequentes
Recém-nascidos S. Agalactiae, E. Coli, L. Monocytogens
1-3 meses S. Agalactiae, S. Pneumoniae, N. Meningite
Acima de 3meses e adultos S. Pneumoniae, N. Meningite, H. Influenza
Derivação Ventrículo peritoneal Sthaphylococcus aureus/ epidermidis,
bacilos gran-,
Esplenectomizados S. Pneumoniae, N. Meningite, H. Influenza,
Pseudomonas, E.Coli, microrganismos
entericos
SIDA S. Pneumoniae, N. Meningite, H. Influenza,
M. Tuberculose, Pseudomonas, L.
Monocitogens
6. Factores de risco
Factor de Risco Patógeno
Alcoolismo, Esplenectomia,
Anemia falciforme, Doença
sinusal, défice de actividade do
complemento,
Fratura da base do crânio
Pneumococos
Traumatismo, Cateter ventricular,
Cirurgia intracraniana
Staphylococcus
Idosos, Debilitados Listeria
Pacientes pediátricos com otite
ou
infecção respiratória, Navahos,
HLA B12
Haemophilus influenzae
7. Vias de Infecção
• Hematogenica
• Por continuidade (mastoidite, otite media, etc)
• Cateteres com acesso ao SNC
• Directa (fracturas, defeitos de fechamento do
tubo neural)
Devendo o microorganismo vencer os mecanismos
de defesa local para poder proliferar-se
8. Fisiopatologia
• Bacteremia, com segregação de IgA bacteriana que
inactiva os anticorpos do hospedeiro e há adesão ao
endotelio;
• Há dano da barreira hematoencefalica e a bactéria
atinge o LCR (pobre imunologicamente);
• Os astrocitos e Neuroglias quando expostos ao
antígeno bacteriano liberam citoquinas abundantes;
• Há quimiotaxia com migração leucocitária e resposta
imunológica exagerada (edema citotóxico) e aumento
da permeabilidade vascular(vasogénico);
• Há diminuição do fluxo sanguíneo cerebral e
metabolismo anaeróbico
9. Fisiopatologia
• A morte celular leva a formação de exsudado
purulento e posterior obstrução das do
sistema ventricular, granulações= Edema
intersticial e posterior hidrocefalia;
• A vasculite leva a eventos: isquemicos,
tromboembolismo, tromboflebite;
• Edema vasogenico+ citotoxico+ intersticial=
HTIC (consequente diminuição da PPC)
11. Quadro clinico
Anamnese
Idade Clinica
RN Sintomas B, irritabilidade, choro
fr., não mama, convulsões
Lactente Sintomas B, irritabilidade,
convulsões, alt. na alimentação
Adulto Sintomas B, cefaleia, diplopia,
convulsões, alteração do nível de
consciência
Exame Físico
Idade Clinica
RN Abaulamento da
fontanela,
hipertermia, sinais de
HTIC, grito meníngeo
(grito ao fletir as
pernas)
Lactente Há sinais meníngeos
acima dos 10meses,
sinais de HTIC,
hipertermia
Adulto Sinais meníngeos, S.
HTIC., paralesias dos
pares craneanos
13. Colheita e manipulação
• O LCR e colectado por punção lombar, entre a
terceira e a quarta vértebras lombares.
• Embora esse procedimento não seja complicado
requer determinadas precauções cuidadosa
técnica para evitar a introdução de infecção ou
danificar o tecido neural.
• O volume a ser removido baseia-se no volume
disponível do paciente (adulto versus neonato) e
na pressão de abertura do LCR tomada quando a
agulha entra pela primeira vez no espaço
subaracnoideo.
14. Colheita de amostras
• As amostras são colectadas em três tubos estéreis, que
são rotulados em 1,2e 3 na ordem em que são retirados.
• O 1 e para testes químicos e serológicos,
• O 2 e destinado para o lab. De microbiologia e o 3 para a
contagem celular porque e o menos provável de conter
células introduzidas pelo procedimento de punção
lombar.
• Os testes são realizados em carácter de urgência. Se isso
não for possível as amostras são mantidas da seguinte
maneira:
• Hematologia: os tubos são refrigerados; microbiologia
temp. ambiente; bioquímica os tubos são congelados.
15. Aspecto
• O aspecto de um LCR normalmente cristalino
pode fornecer informações importantes para o
diagnostico.
• O primeiro exame do liquido e feito na cabeceira
do paciente, e o seu resultado faz parte do
relatório do laboratório.
16. Terminologia
• O liquor pode ser cristalino límpido, ligeiramente
turvo ou turvo, leitoso, xantocromico e hemolisado̸
sanguinolento.
• Uma amostras ligeiramente turva ou leitosa, pode ser
resultado de aumento da concentração das proteínas
ou de lipidos, mas tambem pode ser indicativo de
infecção, sendo a turbidez causada pela presença de
de GBs.
• Xantocromia- a causa mais comum é a presença de
produtos de degradação das hemacias e billurubina
sérica elevada.
17. Punção Traumática
• LCR macroscopicamente sanguinolento pode ser uma
indicação de hemorragia intracraniana, mas tambem
pode ser por causa da punção lombar.
• Deve-se determinar se o sangue é o resultado de uma
hemorragia ou de uma punção traumática através de:
• Distribuição desigual de sangue;
• Formação de coágulos;
• Sobrenadante xantocromico.
• Note: Uma película reticular pode ser vista depois de
uma noite de refrigeração de fluido associado a
meningite tuberculosa.
18. Contagem de Células
• A contagem de células que é realizada rotineiramente
nas amostras é a de GBs.
• Qualquer contagem de células deve ser realizado
imediatamente, pois os GBs e Gvs começam a lisar
dentro de uma hora, com 40% dos leucócitos
desintegrados dentro de 2 horas.
• A amostras que não puder ser analisada
imediatamente deve ser refrigerada.
19. Células/
ml
Predomínio Proteínas Glicose Outros testes
LCR normal <10 Mn <45 35-100
Bacteriana >1000 PMN Elevadas Diminuída Gran
Cultura+TSA
Viral <300 MN Normal Normal Aglutinação de
Latex, PCR
M.Tuberculose <1000 MN Muito
elevado
Diminuída ADA+;
BK/Genexpert+
Cryptococos 1-100 MN Elevadas Normal/Baixa Tinta de china
Cultura
21. Testes Bioquímicos
• Proteínas no Liquor
• Significado clínico:
• A analise mais frequente é a dosagem proteica, o
LCR contem uma quantidade muito pequena de
proteínas, e seus valores normais variam entre 15
a 45mg/dl.
• A elevação dos valores proteicos deve-se a
meningite e a hemorragia hematoencefalica, o
que torna o liquor opaco e eleva o nr. De células
22. Glicose no LCR
• O valor normal da glicose no LCR é de 60 a 70% da glicose
plasmática.
• Se a glicose plasmática é de 100mg/dL, a glicose no LCR será
de aproximadamente 65mg/dL.
• Para uma avaliação precisa de glicose no LCR, um teste de
glicemia deve ser realizado para comparação.
• O sangue para o exame da glicemia deve ser colhido duas
horas antes da punção lombar para dar tempo par equilíbrio
entre o sangue e o liquor, cuja a glicose é analisada com os
mesmos métodos usados para a glicemia.
• As amostras devem ser examinadas de imediato, pois um
decréscimo nos valores de glicose podem produzir erros
graves no tratamento do paciente.
23. Significado Clínico
• O significado do diagnostico da glicose no LCR
restringe-se ao achado de valores inferiores aos
plasmáticos.
• Valores baixos de glicose no LCR acompanhados
por aumento de GBs e com grande percentual de
neutrófilos é indicativo de meningite bacteriana.
• Se os GBs são linfocitos a suspeita é meningite
tuberculosa.
• Se o valor de glicose é normal mas com aumento
de nr. De linfocitos a suspeita é meningite viral.
24. Punção Lombar
Contra-Indicações absolutas
• Evidência de aumento da pressão intracraniana :(exame
neurológico pormenorizado, com fundo de olho –
papiledema) para que a realização do procedimento não
cause herniação de amigdalas cerebelares. Essa condição é
rara em crianças pequenas em função da complacência
craniana (suturas abertas).
• Infecções superficiais no local da punção.
Obs. Em caso de dúvidas quanto a possibilidade de aumento
da pressão intracraniana, indicar ultra-sonografia ou
tomografia antes da realização do procedimento.
25. Possíveis resultados do estudo de Gran
Patógeno Bacterioscopia pelo Gram
S. pneumoniae Cocos Gram +
N. meningitidis Diplococos Gram -
S. aureus Cocos Gram +
L. monocytogenes Bacilos Gram +
Enterobacteriaceae;
P. aeruginosa;
Acinetobacter spp.
Bacilos Gram -
H. influenzae Cocobacilos Gram -
26. Exames auxiliares
Exame Achado
Hemograma Leucocitose/Leucopenia com predomínio de neutrofilos,
trombocitopenia(CIVD)
Reagentes da fase
aguda
VS aumentada, Proteina C reactiva, Procalcitonina
Glicemia Para comparar com a glicorraquia
Hemocultura Valor prognostico se a hemocultura for
positiva=prognostico reservado
Coagulograma CIVD, sindrome de Waterhouse-Friderichsen
Ionograma Hiponatremia ( Na+ menor que 135mEq/L)
TAC-CE (se há sinais focais)
27. Tratamento
GERAL:
• Ressuscitação volêmica e equilíbrio hidroeletrolítico
• Manejo da hipertensão intracraniana: proteção de
vias aéreas, cabeceira a 30º, agente hiperosmolar
(manitol 20% 0,25-0,5g/kg/dose), corticóide
(dexametasona 0,15mg/kg/dose 6/6h),
hiperventilação, sedação(tiopental)/indução do coma
com hipotermia 34ᴼC.
• Controlar e evitar crises convulsivas;
• Tratamento Sintomático(analgesia, antipireticos, etc);
28. Antibiótico terapia empírica
Perfil do paciente Agentes
prováveis
Esquema
preferencial
Esquema
alternativo
2-50 anos S. pneumoniae
N. meningitidis
H. influenzae
Ceftriaxone +
Vancomicina
Moxifloxacino
/Cloranfenicol+
Vancomicina
> 50 anos S. pneumoniae
L.monocytogenes
N. meningitidis
Ceftriaxone +
Vancomicina+
Ampicilina
Moxifloxacino
/Cloranfenicol
+Vancomicina
+SMX-TMP
Imunocomprometidos S. pneumoniae
L.monocytogenes
N. meningitidis
Gram-negativos
Cefepime+
Vancomicina +
Ampicilina
Meropenem+
Vancomicina+
SMX-TMP
Trauma,
neurocirurgia,
dispositivos,
nosocomial
Gram-negativos
Staphylococcus spp.
S. pneumoniae
Cefepime +
Vancomicina
Meropenem+
Vancomicina
29. Antibiótico terapia guiada
Patógeno Esquema
preferencial
Esquema
alternativo
Duração
S. pneumoniae
Penicilina ≤ 0,06 (S)
Penicilina G Ceftriaxone
Mofloxacino ou
CAF
10-14 dias
S. pneumoniae:
Penicilina ≥ 0,12
(R) Cef 3ª < 1 (MIC <
I)
Ceftriaxone
S. pneumoniae
Penicilina > 2 (muito
R); Cef 3ª > 1 (MIC >
I)
Ceftriaxone + Vancomicina
±
Rifampicina
N. meningitidis
Ceftriaxone ou
Penicilina G (conforme
perfil de sensibilidade local)
Cloranfenicol 7-10dias
S. aureus - MSSA Oxacilina Vancomicina+
Rifampicina
14 dias
30. Antibiótico terapia guiada
Patógeno Esquema
preferencial
Esquema
alternativo
Duração
S. aureus - MRSA Vancomicina+
Rifampicina
Linezolida ou SMX-
TMP
14 dias
H. influenzae Ceftriaxone Cloranfenicol 7-10 dias
L.
monocytogenes
Ampicilina ou
Penicilina G+
Gentamicina
SMX-TMP
21 dias
Enterobacteriacea
e
Ceftriaxone Meropenem 14-21 dias
P. aeruginosa;
Acinetobacter spp.
Cefepime+
Gentamicina
Meropenem+
Gentamicina
14-21 dias
32. Complicações
• Hipertensão intracraneal
• Ventriculite
• Meningoencefalite
• Abcesso cerebral
• Surdez/ paralise de pares oculomotores
• Epilepsia
• Atraso de desenvolvimento psicomotor
• Défice motor
33. Seguimento
• Fisioterapia
• Terapia de fala
• Psicólogo
• Psiquiatria
• Medicina interna/ Neurologia
• Otorrinolaringologia
• Neurocirurgia
Requerendo uma abordagem multidisciplinar
Crianças devem ser seguidas até a idade escolar.
34. Conclusão
• Meningite constitui emergência medica de
notificação obrigatória;
• O diagnostico é clinico, necessitando de exames
auxiliares para etiologia e tratamento guiado;
• Importante o inicio precoce da antibioticoterapia
cobrindo todos agentes prováveis
• A punção lombar é necessário para o diagnostico
e também para o tratamento;
• O seguimento deve ser prolongado e
multidisciplinar devido as sequelas associadas a
meningite.