O documento descreve uma manhã plácida onde o poeta reflete sobre como transformar a "sujeira" do mundo em poesia. Ele também reflete sobre como a poesia é pequena comparada à palavra.
1. Parado na manhã plácida, nas horas falsas
do dia que começa mais um outro calendário.
Acima uma tela de raros azuis e cinzas claros
que intensifica o sol do poeta e o seu debate
sobre como transformar em poema a sujeira
cinicamente submersa da palavra e da lixeira
que a guarda bem no meio do caos de plástico
do dia que começa mais um outro calendário.
Revirar o breu. A víscera. Pôr a dor na moenda.
A palavra é grande. E a poesia, muito pequena.
PINÇA
Marlos Degani
inha saúde está tão frágil, que um
mgolpe na porta já me assusta, um golpe
de vento derruba, e de golpe em golpe
já não entendo mais nada... Pensei que tinha
hepatite, estive prestes a amarelar, então veio
uma tosse, catarro verde, o céu da boca preto,
pensei que era bronquite, broca no dente, e essa
dor no joelho não ajuda em nada a rezar, e
também a coluna, era sétima a cervical, bico de
papagaio, espinhela caída, pensei ser algo nos
nervos, no baço, um tranco qualquer na
mandíbula, desses que a gente arranja com
brigas de rua, e nessa luta louca eram golpes de
direita, de esquerda, a causa dessa bursite, nos
ombros, baço, pâncreas, o jorro da bílis,
conjuntivite nos olhos, eram lágrimas, risos, eram
cócegas, eram troços estranhos que só mesmo
um monte de golpes, e ainda soma essa falta de
grana? ter esses vampiros todos por vinte anos
secando minhas contas, virando meu bolso do
avesso, diziam ser crise, no intestino, proliferação
de parasitas, tive medo, mas era um problema
maior, ao nível nacional, mundial, no céu as
estrelas vão se apagando, o sol também se cansa,
e lá do fundo do buraco negro a pandora-criança
desvenda o segredo: eram golpes e mais golpes e
mais golpes - então o diagnóstico já não dava
conta: para uma dorzinha de estômago serviria
um engove qualquer, mas dessa vez eram golpes
múltiplos, intensos, piores, e para defender as
entranhas, o jeito foi vomitar sem arrego, sem dar
sossego, da contração do abdomem ao líquido
verde do resto de forças, a confiança escatológica
num futuro nefando, sem esperanças, as
múltiplas lutas do organismo contra o vírus, o
pleonasmo sobre o palimpsesto, o quadro vital
está muito sinistro: então era uma golpite aguda
mesmo.
Alexandre Durratos
www.facebook.com/poetaxandu
aviso aos navegantes:
eu quero mergulhar num mar de água salgada
pra sarar a
madrugada inquieta em mim
aqui
cintila inválida por não poder mexer nas figuras
das estrelas
eu quero aprofundar as teias rasas
deixar acalmar macio minha cama
minha casa
minha carne
quero cortar os cabelos
que me caiam com os medos
traga ar
me traga
o cheiro do meu corpo mesmo de dia
é de noite calada
o gosto dos meus dias é a nova empreitada
que é a grandeza de abrir os olhos
e respirar
Ana Carolina Medeiros
facebook.com/anacarolinamsc
AMEOPO MAERio Janeiro - Bra$il - já!! NEIRO ’ 17
45ediç o:ã
RETORNANDO AS ATIVIDADES
www.facebook.com/marlosdegani
o
2. salve salve pessoas de
poesia...
e quem queria jogar aquela pá de cal na
nossa cara, já pode ir caminhando pra
outra fila... é agora que a coisa vai
andar... e pra tudo que é lado.
éAMEOPOEMAOU DEIXE-O...
as nossas respostas são repteis que
vigiam sua distração. e este desejo de
por sol na boca das pessoas pelas ruas e
passarelas um dia tem que dar em algo...
isso tudo só pra ver se alguem sopra algum eco
diferente. queremos mudar muita coisa. queremos
nos governar feito carretas numa ribanceira
de lama e grama verde e depois deste
desterro, depositar nossas últimas fichas na
tarde que azuleja de negro o fdp do horário de
verão. eis que temos um pequeno fanzine feito na
febre de quem quer abraçar pra sempre quem se
quer bem, eis que seremos enfim reis em nossa
pequena casca de no(z)(s)...
e assim por toda a eternidade teremos sombra e
sobras de tudo que conseguirmos agarrar nesta
viagem sem rumo.
...
PELOAMOR DE DEUS, LEIACOM TESÃO
Antes a solidão que a ilusão.
A poesia tem mil caras
tem olhos
bocas
tentáculos
Dança e esbraveja no mosaico
de pedras portuguesas das ruas do centro do Rio.
A poesia é um michê sentado num banco da
[Cinelândia:
um canivete preenche nossas entranhas de lirismo.
O velho funcionário público
que recolhe gatos abandonados pelos becos
lê na poesia estampada que luas derretem.
Sente que a noite pode ser um arrepio.
Já é tarde. Amanhã talvez recupere sua alma
e sua solidão.
Ficou um buraco na estante.
Antes assim.
Edmilson Borret
facebook.com/edborret
Carolina Coutinho
facebook.com/CarolininaCoutinho
VAZIOS
“Os artistas são as pessoas mais motivadas e
corajosas sobre a face da terra. Lidam com mais
rejeição num ano do que a maioria das pessoas
encara durante toda uma vida. Todos os dias,
artistas enfrentam o desafio financeiro de viver
um estilo de vida independente, o desrespeito
de pessoas que acham que eles deviam ter um
emprego a sério e o seu próprio medo de nunca
mais ter trabalho. Todos os dias têm de ignorar a
possibilidade de que a visão à qual têm
dedicado suas vidas seja apenas um sonho.
Com cada obra ou papel, empurram os seus
limites, emocionais e físicos, arriscando a crítica
e o julgamento, muitos deles a ver outras
pessoas da sua idade a alcançar os marcos
previsíveis da vida normal – o carro, a família, a
casa, o pé-de-meia. Por quê? Porque os artistas
estão dispostos a dar a sua vida inteira por um
momento – para que aquele verso, aquele riso,
aquele gesto, agite a alma do público. Artistas
são seres que provaram o néctar da vida
naquele momento de cristal, quando
derramaram o seu espírito criativo e tocaram no
coração do outro. Nesse instante, eles estão
mais próximos da magia, de Deus e da perfeição
do que qualquer um poderia estar.
E nos seus corações, sabem que dedicar-se a
esse momento vale não só uma, mas mil vidas!”
David Ackert
Rômulo Ferreira
Edição e Coordenação: Selo Editorial Outras Dimensões
Exemplares na pRAÇA: 1ooo exemplares. PIRATEIE!.
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www.facebook.com/ameopoema ilustra:: Breno Ferreira
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por que a gente
é assim
Nesta edição: Edmilson Borret, David Ackert, Marlos Degani,
Alexandre Durratos, Ana Carolina Medeiros, Carolina Coutinho
Os corpos chacoalham entre as centelhas
da manhã
Estremecem entre as pedras, juncos e cacos
A dor não lhes descansa
Por dentro a pele azul os recobre
no meio da escuridão de duas pálpebras
O futuro fecha seus enormes olhos
4/9
Capa: Louise Bourgeois , "The Fabric Works"