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Para Viver Um Grande Amor
Vinicius de Moraes

Para viver um grande amor, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e
pouco riso — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor, mister é ser um homem de uma só mulher; pois ser de
muitas, poxa! é de colher... — não tem nenhum valor.

Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama
por inteiro — seja lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a
mulher amada e postar-se de fora com uma espada — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor, vos digo, é preciso atenção como o "velho amigo", que
porque é só vos quer sempre consigo para iludir o grande amor. É preciso muitíssimo
cuidado com quem quer que não esteja apaixonado, pois quem não está, está sempre
preparado pra chatear o grande amor.

Para viver um amor, na realidade, há que compenetrar-se da verdade de que não existe
amor sem fidelidade — para viver um grande amor. Pois quem trai seu amor por vanidade
é um desconhecedor da liberdade, dessa imensa, indizível liberdade que traz um só
amor.

Para viver um grande amor, il faut além de fiel, ser bem conhecedor de arte culinária e de
judô — para viver um grande amor.

Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também
ter muito peito — peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua
primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor.

É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista — muito mais, muito mais
que na modista! — para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber
mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta
ponto a favor...

Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões, sopinhas, molhos,
strogonoffs — comidinhas para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha
e preparar com amor uma galinha com uma rica e gostosa farofinha, para o seu grande
amor?

Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se
possível, um só defunto — pra não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não
só com o corpo mas também com a mente, pois qualquer "baixo" seu, a amada sente — e
esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem
covardia; saber ganhar dinheiro com poesia — para viver um grande amor.

É preciso saber tomar uísque (com o mau bebedor nunca se arrisque!) e ser impermeável
ao diz-que-diz-que — que não quer nada com o amor.
Mas tudo isso não adianta nada, se nesta selva oscura e desvairada não se souber achar
a bem-amada — para viver um grande amor.




Drummond...só podia ser dele...

Quando encontrar alguém e esse alguém fizer seu coração parar de funcionar por alguns
segundos, preste atenção: pode ser a pessoa mais importante da sua vida.
Se os olhares se cruzarem e, neste momento, houver o mesmo brilho intenso entre eles,
fique alerta: pode ser a pessoa que você está esperando desde o dia em que nasceu.
Se o toque dos lábios for intenso, se o beijo for apaixonante, e os olhos se encherem
d'água neste momento, perceba: existe algo mágico entre vocês.
Se o primeiro e o último pensamento do seu dia for essa pessoa, se a vontade de ficar
juntos chegar a apertar o coração, agradeça: Deus te mandou um presente divino - O
Amor.
Se um dia tiverem que pedir perdão um ao outro por algum motivo e em troca receber um
abraço, um sorriso, um afago nos cabelos e os gestos valerem mais que mil palavras,
entregue-se: vocês foram feitos um pro outro.
Se por algum motivo você estiver triste, se a vida te deu uma rasteira e a outra pessoa
sofrer o seu sofrimento, chorar as suas lágrimas e enxugá-las com ternura, que coisa
maravilhosa: você poderá contar com ela em qualquer momento de sua vida.
Se você conseguir, em pensamento, sentir o cheiro da pessoa como se ela estivesse ali
do seu lado...
Se você achar a pessoa maravilhosamente linda, mesmo ela estando de pijamas velhos,
chinelos de dedo e cabelos emaranhados...
Se você não consegue trabalhar direito o dia todo, ansioso pelo encontro que está
marcado para a noite...
Se você não consegue imaginar, de maneira nenhuma, um futuro sem a pessoa ao seu
lado...
Se você tiver a certeza que vai ver a outra envelhecendo e, mesmo assim, tiver a
convicção que vai continuar sendo louco por ela...
Se você preferir morrer, antes de ver a outra partindo: é o amor que chegou na sua vida.
É uma dádiva.
Muitas pessoas apaixonam-se muitas vezes na vida, mas poucas amam ou encontram
um amor verdadeiro.
Ou às vezes encontram e, por não prestarem atenção nesses sinais, deixam o amor
passar, sem deixá-lo acontecer verdadeiramente. É o livre-arbítrio.
Por isso, preste atenção nos sinais - não deixe que as loucuras do dia-a-dia o deixem
cego para a melhor coisa da vida: O Amor.
Essa negra fulo _ Jorge de Lima


Ora, se deu que chegou
(isso já faz muito tempo)
no bangüê dum meu avô
uma negra bonitinha,
chamada negra Fulô.

Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô!
(Era a fala da Sinhá)
— Vai forrar a minha cama
pentear os meus cabelos,
vem ajudar a tirar
a minha roupa, Fulô!

Essa negra Fulô!

Essa negrinha Fulô!
ficou logo pra mucama
pra vigiar a Sinhá,
pra engomar pro Sinhô!

Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô!
(Era a fala da Sinhá)
vem me ajudar, ó Fulô,
vem abanar o meu corpo
que eu estou suada, Fulô!
vem coçar minha coceira,
vem me catar cafuné,
vem balançar minha rede,
vem me contar uma história,
que eu estou com sono, Fulô!

Essa negra Fulô!

"Era um dia uma princesa
que vivia num castelo
que possuía um vestido
com os peixinhos do mar.
Entrou na perna dum pato
saiu na perna dum pinto
o Rei-Sinhô me mandou
que vos contasse mais cinco".

Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô!
Vai botar para dormir
esses meninos, Fulô!
"minha mãe me penteou
minha madrasta me enterrou
pelos figos da figueira
que o Sabiá beliscou".

Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô!
(Era a fala da Sinhá
Chamando a negra Fulô!)
Cadê meu frasco de cheiro
Que teu Sinhô me mandou?
— Ah! Foi você que roubou!
Ah! Foi você que roubou!

Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!

O Sinhô foi ver a negra
levar couro do feitor.
A negra tirou a roupa,
O Sinhô disse: Fulô!
(A vista se escureceu
que nem a negra Fulô).

Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô!
Cadê meu lenço de rendas,
Cadê meu cinto, meu broche,
Cadê o meu terço de ouro
que teu Sinhô me mandou?
Ah! foi você que roubou!
Ah! foi você que roubou!

Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!

O Sinhô foi açoitar
sozinho a negra Fulô.
A negra tirou a saia
e tirou o cabeção,
de dentro dêle pulou
nuinha a negra Fulô.

Essa negra Fulô!
Essa negra Fulô!

Ó Fulô! Ó Fulô!
Cadê, cadê teu Sinhô
que Nosso Senhor me mandou?
Ah! Foi você que roubou,
foi você, negra fulô?

Essa negra Fulô!




Inverno_ Jorge de Lima



Zefa, chegou o inverno!
Formigas de asas e tanajuras!
Chegou o inverno!
Lama e mais lama
chuva e mais chuva, Zefa!
Vai nascer tudo, Zefa,
Vai haver verde,
verde do bom,
verde nos galhos,
verde na terra,
verde em ti, Zefa,
que eu quero bem!
Formigas de asas e tanajuras!
O rio cheio,
barrigas cheias,
mulheres cheias, Zefa!
Águas nas locas,
pitus gostosos,
carás, cabojés,
e chuva e mais chuva!
Vai nascer tudo
milho, feijão,
até de novo
teu coração, Zefa!
Formigas de asas e tanajuras!
Chegou o inverno!
Chuva e mais chuva!
Vai casar, tudo,
moça e viúva!
Chegou o inverno
Covas bem fundas
pra enterrar cana:
cana caiana e flor de Cuba!
Terra tão mole
que as enxadas
nelas se afundam
com olho e tudo!
Leite e mais leite
pra requeijões!
Cargas de imbu!
Em junho o milho,
milho e canjica
pra São João!
E tudo isto, Zefa...
E mais gostoso
que tudo isso:
noites de frio,
lá fora o escuro,
lá fora a chuva,
trovão, corisco,
terras caídas,
córgos gemendo,
os caborés gemendo,
os caborés piando, Zefa!
Os cururus cantando, Zefa!
Dentro da nossa
casa de palha:
carne de sol
chia nas brasas,
farinha d'água,
café, cigarro,
cachaça, Zefa...
...rede gemendo...
Tempo gostoso!
Vai nascer tudo!
Lá fora a chuva,
chuva e mais chuva,
trovão, corisco,
terras caídas
e vento e chuva,
chuva e mais chuva!
Mas tudo isso, Zefa,
vamos dizer,
só com os poderes
de Jesus Cristo!




José


E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
e agora, Você?
Você que é sem nome,
que zomba dos outros,
Você que faz versos,
que ama, protesta?
e agora, José?

Está sem mulher,
está sem discurso,
está sem carinho,
já não pode beber,
já não pode fumar,
cuspir já não pode,
a noite esfriou,
o dia não veio,
o bonde não veio,
o riso não veio,
não veio a utopia
e tudo acabou
e tudo fugiu
e tudo mofou,
e agora, José?

E agora, José?
sua doce palavra,
seu instante de febre,
sua gula e jejum,
sua biblioteca,
sua lavra de ouro,
seu terno de vidro,
sua incoerência,
seu ódio, - e agora?

Com a chave na mão
quer abrir a porta,
não existe porta;
quer morrer no mar,
mas o mar secou;
quer ir para Minas,
Minas não há mais.
José, e agora?

Se você gritasse,
se você gemesse,
se você tocasse,
a valsa vienense,
se você dormisse,
se você cansasse,
se você morresse....
Mas você não morre,
você é duro, José!

Sozinho no escuro
qual bicho-do-mato,
sem teogonia,
sem parede nua
para se encostar,
sem cavalo preto
que fuja do galope,
você marcha, José!
José, para onde?




Morte do Leiteiro Carlos Drummond de Andrade


Há pouco leite no país,
é preciso entregá-lo cedo.
Há muita sede no país,
é preciso entregá-lo cedo.
Há no país uma legenda,
que ladrão se mata com tiro.
Então o moço que é leiteiro
de madrugada com sua lata
sai correndo e distribuindo
leite bom para gente ruim.
Sua lata, suas garrafas
e seus sapatos de borracha
vão dizendo aos homens no sono
que alguém acordou cedinho
e veio do último subúrbio
trazer o leite mais frio
e mais alvo da melhor vaca
para todos criarem força
na luta brava da cidade.

Na mão a garrafa branca
não tem tempo de dizer
as coisas que lhe atribuo
nem o moço leiteiro ignaro,
morados na Rua Namur,
empregado no entreposto,
com 21 anos de idade,
sabe lá o que seja impulso
de humana compreensão.
E já que tem pressa, o corpo
vai deixando à beira das casas
uma apenas mercadoria.

E como a porta dos fundos
também escondesse gente
que aspira ao pouco de leite
disponível em nosso tempo,
avancemos por esse beco,
peguemos o corredor,
depositemos o litro...
Sem fazer barulho, é claro,
que barulho nada resolve.

Meu leiteiro tão sutil
de passo maneiro e leve,
antes desliza que marcha.
É certo que algum rumor
sempre se faz: passo errado,
vaso de flor no caminho,
cão latindo por princípio,
ou um gato quizilento.
E há sempre um senhor que acorda,
resmunga e torna a dormir.

Mas este acordou em pânico
(ladrões infestam o bairro),
não quis saber de mais nada.
O revólver da gaveta
saltou para sua mão.
Ladrão? se pega com tiro.
Os tiros na madrugada
liquidaram meu leiteiro.
Se era noivo, se era virgem,
se era alegre, se era bom,
não sei,
é tarde para saber.

Mas o homem perdeu o sono
de todo, e foge pra rua.
Meu Deus, matei um inocente.
Bala que mata gatuno
também serve pra furtar
a vida de nosso irmão.
Quem quiser que chame médico,
polícia não bota a mão
neste filho de meu pai.
Está salva a propriedade.
A noite geral prossegue,
a manhã custa a chegar,
mas o leiteiro
estatelado, ao relento,
perdeu a pressa que tinha.

Da garrafa estilhaçada,
no ladrilho já sereno
escorre uma coisa espessa
que é leite, sangue... não sei.
Por entre objetos confusos,
mal redimidos da noite,
duas cores se procuram,
suavemente se tocam,
amorosamente se enlaçam,
formando um terceiro tom
a que chamamos aurora.


Romance II ou do Ouro Incansável _ Cecília Meireles
Mil bateias vão rodando
sobre córregos escuros;
a terra vai sendo aberta
por intermináveis sulcos;
infinitas galerias
penetram morros profundos.

De seu calmo esconderijo,
o ouro vem, dócil e ingênuo;
torna-se pó, folha, barra,
prestígio, poder, engenho...
É tão claro! - e turva tudo:
honra, amor e pensamento.

Borda flores nos vestidos,
sobe a opulentos altares,
traça palácios e pontes,
eleva os homens audazes,
e acende paixões que alastram
sinistras rivalidades.

Pelos córregos, definham
negros a rodar bateias.
Morre-se de febre e fome
sobre a riqueza da terra:
uns querem metais luzentes,
outros, as redradas pedras.

Ladrões e contrabandistas
estão cercando os caminhos;
cada família disputa
privilégios mais antigos;
os impostos vão crescendo
e as cadeias vão subindo.

Por ódio, cobiça, inveja,
vai sendo o inferno traçado.
Os reis querem seus tributos,
- mas não se encontram vassalos.
Mil bateias vão rodando,
mil bateias sem cansaço.

Mil galerias desabam;
mil homens ficam sepultos;
mil intrigas, mil enredos
prendem culpados e justos;

já ninguém dorme tranqüilo,
que a noite é um mundo de sustos.

Descem fantasmas dos morros,
vêm almas dos cemitérios:
todos pedem ouro e prata,
e estendem punhos severos,
mas vão sendo fabricadas
muitas algemas de ferro.




Romance XXI ou das Idéias
A vastidão desses campos.
A alta muralha das serras.
As lavras inchadas de ouro.
Os diamantes entre as pedras.
Negros, índios e mulatos.
Almocrafes e gamelas.

Os rios todos virados.
Toda revirada, a terra.
Capitães, governadores,
padres intendentes, poetas.
Carros, liteiras douradas,
cavalos de crina aberta.
A água a transbordar das fontes.
Altares cheios de velas.
Cavalhadas. Luminárias.
Sinos, procissões, promessas.
Anjos e santos nascendo
em mãos de gangrena e lepra.
Finas músicas broslando
as alfaias das capelas.
Todos os sonhos barrocos
deslizando pelas pedras.
Pátios de seixos. Escadas.
Boticas. Pontes. Conversas.
Gente que chega e que passa.
E as idéias.

Amplas casas. Longos muros.
Vida de sombras inquietas.
Pelos cantos da alcovas,
histerias de donzelas.
Lamparinas, oratórios,
bálsamos, pílulas, rezas.
Orgulhosos sobrenomes.
Intrincada parentela.
No batuque das mulatas,
a prosápia degenera:
pelas portas dos fidalgos,
na lã das noites secretas,
meninos recém-nascidos
como mendigos esperam.
Bastardias. Desavenças.
Emboscadas pela treva.
Sesmarias, salteadores.
Emaranhadas invejas.
O clero. A nobreza. O povo.
E as idéias.

E as mobílias de cabiúna.
E as cortinas amarelas.
Dom José. Dona Maria.
Fogos. Mascaradas. Festas.
Nascimentos. Batizados.
Palavras que se interpretam
nos discursos, nas saúdes...
Visitas. Sermões de exéquias.
Os estudantes que partem.
Os doutores que regressam.
(Em redor das grandes luzes,
há sempre sombras perversas.
Sinistros corvos espreitam
pelas douradas janelas.)
E há mocidade! E há prestígio.
E as idéias.

As esposas preguiçosas
na rede embalando as sestas.
Negras de peitos robustos
que os claros meninos cevam.
Arapongas, papagaios,
passarinhos da floresta.
Essa lassidão do tempo
entre imbaúbas, quaresmas,
cana, milho, bananeiras
e a brisa que o riacho encrespa.
Os rumores familiares
que a lenta vida atravessam:
elefantíase; partos;
sarna; torceduras; quedas;
sezões; picadas de cobras;
sarampos e erisipelas...
Candombeiros. Feiticeiros.
Ungüentos. Emplastos. Ervas.
Senzalas. Tronco. Chibata.
Congos. Angolas. Benguelas.
Ó imenso tumulto humano!
E as idéias.

Banquetes. Gamão. Notícias.
Livros. Gazetas. Querelas.
Alvarás. Decretos. Cartas.
A Europa a ferver em guerras.
Portugal todo de luto:
triste Rainha o governa!
Ouro! Ouro! Pedem mais ouro!
E sugestões indiscretas:
Tão longe o trono se encontra!
Quem no Brasil o tivera!
Ah, se Dom José II
põe a coroa na testa!
Uns poucos de americanos,
por umas praias desertas,
já libertaram seu povo
da prepotente Inglaterra!
Washington. Jefferson. Franklin.
(Palpita a noite, repleta
de fantasmas, de presságios...)
E as idéias.

Doces invenções da Arcádia!
Delicada primavera:
pastoras, sonetos, liras,
- entre as ameaças austeras
de mais impostos e taxas
que uns protelam e outros negam.
Casamentos impossíveis.
Calúnias. Sátiras. Essa
paixão da mediocridade
que na sombra se exaspera.
E os versos de asas douradas,
que amor trazem e amor levam...
Anarda. Nise. Marília...
As verdades e as quimeras.
Outras leis, outras pessoas.
Novo mundo que começa.
Nova raça. Outro destino.
Planos de melhores eras.
E os inimigos atentos,
que, de olhos sinistros, velam.
E os aleives. E as denúncias.
E as idéias.
Tu Tens um Medo
Acabar.
Não vês que acabas todo o dia.
Que morres no amor.
Na tristeza.
Na dúvida.
No desejo.
Que te renovas todo dia.
No amor.
Na tristeza
Na dúvida.
No desejo.
Que és sempre outro.
Que és sempre o mesmo.
Que morrerás por idades imensas.
Até não teres medo de morrer.
E então serás eterno.
Não ames como os homens amam.
Não ames com amor.
Ama sem amor.
Ama sem querer.
Ama sem sentir.
Ama como se fosses outro.
Como se fosses amar.
Sem esperar.
Tão separado do que ama, em ti,
Que não te inquiete
Se o amor leva à felicidade,
Se leva à morte,
Se leva a algum destino.
Se te leva.
E se vai, ele mesmo...
Não faças de ti
Um sonho a realizar.
Vai.
Sem caminho marcado.
Tu és o de todos os caminhos.
Sê apenas uma presença.
Invisível presença silenciosa.
Todas as coisas esperam a luz,
Sem dizerem que a esperam.
Sem saberem que existe.
Todas as coisas esperarão por ti,
Sem te falarem.
Sem lhes falares.
Sê o que renuncia
Altamente:
Sem tristeza da tua renúncia!


Sem orgulho da tua renúncia!
Abre as tuas mãos sobre o infinito.
E não deixes ficar de ti
Nem esse último gesto!
O que tu viste amargo,
Doloroso,
Difícil,
O que tu viste inútil
Foi o que viram os teus olhos
Humanos,
Esquecidos...
Enganados...
No momento da tua renúncia
Estende sobre a vida
Os teus olhos
E tu verás o que vias:
Mas tu verás melhor...
... E tudo que era efêmero
se desfez.
E ficaste só tu, que é eterno.




O Vaqueiro
Eu venho dêrne menino,
Dêrne munto pequenino,
Cumprindo o belo destino
Que me deu Nosso Senhô.
Eu nasci pra sê vaquêro,
Sou o mais feliz brasilêro,
Eu não invejo dinhêro,
Nem diproma de dotô.
Sei que o dotô tem riquêza,
É tratado com fineza,
Faz figura de grandeza,
Tem carta e tem anelão,
Tem casa branca jeitosa
E ôtas coisa preciosa;
Mas não goza o quanto goza
Um vaquêro do sertão.

Da minha vida eu me orgúio,
Levo a Jurema no embrúio
Gosto de ver o barúio
De barbatão a corrê,
Pedra nos casco rolando,
Gaios de pau estralando,
E o vaquêro atrás gritando,
Sem o perigo temê.
Criei-me neste serviço,
Gosto deste reboliço,
Boi pra mim não tem feitiço,
Mandinga nem catimbó.
Meu cavalo Capuêro,
Corredô, forte e ligêro,
Nunca respeita barsêro
De unha de gato ou cipó.
 Tenho na vida um tesôro
Que vale mais de que ôro:
O meu liforme de côro,
Pernêra, chapéu, gibão.
Sou vaquêro destemido,
Dos fazendêro querido,
O meu grito é conhecido
Nos campo do meu sertão.
O pulo do meu cavalo
Nunca me causou abalo;
Eu nunca sofri um galo,
pois eu sei me desviá.
Travesso a grossa chapada,
Desço a medonha quebrada,
Na mais doida disparada,
Na pega do marruá.
Se o bicho brabo se acoa,
Não corro nem fico à tôa:
Comigo ninguém caçoa,
Não corro sem vê de quê.
É mêrmo por desaforo
Que eu dou de chapéu de côro
Na testa de quarqué tôro
Que não qué me obedecê.
Não dou carrêra perdida,
Conheço bem esta lida,
Eu vivo gozando a vida
Cheio de satisfação.
Já tou tão acostumado
Que trabaio e não me enfado,
Faço com gosto os mandado
Das fia do meu patrão.
Vivo do currá pro mato,
Sou correto e munto izato,
Por farta de zelo e trato
Nunca um bezerro morreu.
Se arguém me vê trabaiando,
A bezerrama curando,
Dá pra ficá maginando
Que o dono do gado é eu.
Eu não invejo riqueza
Nem posição, nem grandeza,
Nem a vida de fineza
Do povo da capitá.
Pra minha vida sê bela
Só basta não fartá nela
Bom cavalo, boa sela
E gado pr'eu campeá.
Somente uma coisa iziste,
Que ainda que teja triste
Meu coração não resiste
E pula de animação.
É uma viola magoada,
Bem chorosa e apaxonada,
Acompanhando a toada
Dum cantadô do sertão.
Tenho sagrado direito
De ficá bem satisfeito
Vendo a viola no peito
De quem toca e canta bem.
Dessas coisa sou herdêro,
Que o meu pai era vaquêro,
Foi um fino violêro
E era cantadô tombém.
Eu não sei tocá viola,
Mas seu toque me consola,
Verso de minha cachola
Nem que eu peleje não sai,
Nunca cantei um repente
Mas vivo munto contente,
Pois herdei perfeitamente
Um dos dote de meu pai.
O dote de sê vaquêro,
Resorvido marruêro,
Querido dos fazendêro
Do sertão do Ceará.
Não perciso maió gozo,
Sou sertanejo ditoso,
O meu aboio sodoso
Faz quem tem amô chorá.
Patativa do Assaré




A TERRA É NATURÁ

Esta terra é como o Só
Que nace todos os dia
Briando o grande, o menó
E tudo que a terra cria.
O só quilarêa os monte,
Tombém as água das fonte,
Com a sua luz amiga,
Potrege, no mesmo instante,
Do grandaião elefante
A pequenina formiga.

Esta terra é como a chuva,
Que vai da praia a campina,
Móia a casada, a viúva,
A véia, a moça, a menina.
Quando sangra o nevuêro,
Pra conquistá o aguacêro,
Ninguém vai fazê fuxico,
Pois a chuva tudo cobre,
Móia a tapera do pobre
E a grande casa do rico.

Esta terra é como a lua,
Este foco prateado
Que é do campo até a rua,
A lampa dos namorado;
Mas, mesmo ao véio cacundo,
Já com ar de moribundo
Sem amô, sem vaidade,
Esta lua cô de prata
Não lhe dêxa de sê grata;
Lhe manda quilaridade.

Esta terra é como o vento,
O vento que, por capricho
Assopra, às vez, um momento,
Brando, fazendo cuchicho.
Ôtras vez, vira o capêta,
Vai fazendo piruêta,
Roncando com desatino,
Levando tudo de móio
Jogando arguêro nos óio
Do grande e do pequenino.

Se o orguiôso podesse
Com seu rancô desmedido,
Tarvez até já tivesse
Este vento repartido,
Ficando com a viração
Dando ao pobre o furacão;
Pois sei que ele tem vontade
E acha mesmo que percisa
Gozá de frescô da brisa,
Dando ao pobre a tempestade.

Pois o vento, o só, a lua,
A chuva e a terra também,
Tudo é coisa minha e sua,
Seu dotô conhece bem.
Pra se sabê disso tudo
Ninguém precisa de istudo;
Eu, sem escrevê nem lê,
Conheço desta verdade,
Seu dotô, tenha bondade
De uvi o que vô dizê.

Não invejo o seu tesôro,
Sua mala de dinhêro
A sua prata, o seu ôro
O seu boi, o seu carnêro
Seu repôso, seu recreio,
Seu bom carro de passeio,
Sua casa de morá
E a sua loja surtida,
O que quero nesta vida
É terra pra trabaiá.

Iscute o que tô dizendo,
Seu dotô, seu coroné:
De fome tão padecendo
Meus fio e minha muié.
Sem briga, questão nem guerra,
Meça desta grande terra
Umas tarefa pra eu!
Tenha pena do agregado
Não me dêxe deserdado
Daquilo que Deus me deu.




Poema(s) da Cabra
João Cabral de Melo Neto
Nas margens do Mediterrâneo
não se vê um palmo de terra
que a terra tivesse esquecido
de fazer converter em pedra.

Nas margens do Mediterrâneo
Não se vê um palmo de pedra
que a pedra tivesse esquecido
de ocupar com sua fera.

Ali, onde nenhuma linha
pode lembrar, porque mais doce,
o que até chega a parecer
suave serra de uma foice,
não se vê um palmo de terra
por mais pedra ou fera que seja,
que a cabra não tenha ocupado
com sua planta fibrosa e negra.
A cabra é negra. Mas seu negro
não é o negro do ébano douto
(que é quase azul) ou o negro rico
do jacarandá (mais bem roxo).

O negro da cabra é o negro
do preto, do pobre, do pouco.
Negro da poeira, que é cinzento.
Negro da ferrugem, que é fosco.

Negro do feio, às vezes branco.
Ou o negro do pardo, que é pardo.
disso que não chega a ter cor
ou perdeu toda cor no gasto.

É o negro da segunda classe.
Do inferior (que é sempre opaco).
Disso que não pode ter cor
porque em negro sai mais barato.
Se o negro quer dizer noturno
o negro da cabra é solar.
Não é o da cabra o negro noite.
É o negro de sol. Luminar.

Será o negro do queimado
mais que o negro da escuridão.
Negra é do sol que acumulou.
É o negro mais bem do carvão.

Não é o negro do macabro.
Negro funeral. Nem do luto.
Tampouco é o negro do mistério,
de braços cruzados, eunuco.

É mesmo o negro do carvão.
O negro da hulha. Do coque.
Negro que pode haver na pólvora:
negro de vida, não de morte.
O negro da cabra é o negro
da natureza dela cabra.
Mesmo dessa que não é negra,
como a do Moxotó, que é clara.

O negro é o duro que há no fundo
da cabra. De seu natural.
Tal no fundo da terra há pedra,
no fundo da pedra, metal.

O negro é o duro que há no fundo
da natureza sem orvalho
que é a da cabra, esse animal
sem folhas, só raiz e talo,

que é a da cabra, esse animal
de alma-caroço, de alma córnea,
sem moelas, úmidos, lábios,
pão sem miolo, apenas côdea.
Quem já encontrou uma cabra
que tivesse ritmos domésticos?
O grosso derrame do porco,
da vaca, do sono e de tédio?

Quem encontrou cabra que fosse
animal de sociedade?
Tal o cão, o gato, o cavalo,
diletos do homem e da arte?

A cabra guarda todo o arisco,
rebelde, do animal selvagem,
viva demais que é para ser
animal dos de luxo ou pajem.

Viva demais para não ser,
quando colaboracionista,
o reduzido irredutível,
o inconformado conformista.
A cabra é o melhor instrumento
de verrumar a terra magra.
Por dentro da serra e da seca
não chega onde chega a cabra.

Se a serra é terra, a cabra é pedra.
Se a serra é pedra, é pedernal.
Sua boca é sempre mais dura
que a serra, não importa qual.

A cabra tem o dente frio,
a insolência do que mastiga.
Por isso o homem vive da cabra
mas sempre a vê como inimiga.

Por isso quem vive da cabra
e não é capaz do seu braço
desconfia sempre da cabra:
diz que tem parte com o Diabo
Não é pelo vício da pedra,
por preferir a pedra à folha.
É que a cabra é expulsa do verde,
trancada do lado de fora.

A cabra é trancada por dentro.
Condenada à caatinga seca.
Liberta, no vasto sem nada,
proibida, na verdura estreita.

Leva no pescoço uma canga
que a impede de furar as cercas.
Leva os muros do próprio cárcere:
prisioneira e carcereira.

Liberdade de fome e sede
da ambulante prisioneira.
Não é que ela busque o difícil:
é que a sabem capaz de pedra.
A vida da cabra não deixa
lazer para ser fina ou lírica
(tal o urubu, que em doces linhas
voa à procura da carniça).

Vive a cabra contra a pendente,
sem os êxtases das decidas.
Viver para a cabra não é
re-ruminar-se introspectiva.

É, literalmente, cavar
a vida sob a superfície,
que a cabra, proibida de folhas,
tem de desentranhar raízes.

Eis porque é a cabra grosseira,
de mãos ásperas, realista.
Eis porque, mesmo ruminando,
não é jamais contemplativa.
O núcleo de cabra é visível
por debaixo de muitas coisas.
Com a natureza da cabra
outras aprendem sua crosta.

Um núcleo de cabra é visível
em certos atributos roucos
que têm as coisas obrigadas
a fazer de seu corpo couro.

A fazer de seu couro sola,
a armar-se em couraças, escamas:
como se dá com certas coisas
e muitas condições humanas.

Os jumentos são animais
que muito aprenderam com a cabra.
O nordestino, convivendo-a,
fez-se de sua mesma casta.          9
O núcleo de cabra é visível
debaixo do homem do Nordeste.
Da cabra lhe vem o escarpado
e o estofo nervudo que o enche.

Se adivinha o núcleo de cabra
no jeito de existir, Cardozo,
que reponta sob seu gesto
como esqueleto sob o corpo.

E é outra ossatura mais forte
que o esqueleto comum, de todos;
debaixo do próprio esqueleto,
no fundo centro de seus ossos.

A cabra deu ao nordestino
esse esqueleto mais de dentro:
o aço do osso, que resiste
quando o osso perde seu cimento.
O Mediterrâneo é mar clássico,
com águas de mármore azul.
Em nada me lembra das águas
sem marca do rio Pajeú.

As ondas do Mediterrâneo
estão no mármore traçadas.
Nos rios do Sertão, se existe,
a água corre despenteada.

As margens do Mediterrâneo
parecem deserto balcão.
Deserto, mas de terras nobres
não da piçarra do Sertão.

Mas não minto o Mediterrâneo
nem sua atmosfera maior
descrevendo-lhe as cabras negras
em termos da do Moxotó.
MORTE E VIDA SEVERINA João Cabral de Melo Neto
O RETIRANTE EXPLICA AO LEITOR QUEM É E A QUE VAI
— O meu nome é Severino,
como não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.
Mais isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um coronel
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
senhor desta sesmaria.
Como então dizer quem falo
ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias,
lá da serra da Costela,
limites da Paraíba.
Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
com nome de Severino
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.
Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas
e iguais também porque o sangue,
que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar
alguns roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.




ONDE SAIU O HOMEM,
ANUNCIA-LHE O QUE SE VERÁ


 —— Compadre José, compadre,
que na relva estais deitado:
conversais e não sabeis
que vosso filho é chegado?
Estais aí conversando
em vossa prosa entretida:
não sabeis que vosso filho
saltou para dentro da vida?
Saltou para dento da vida
ao dar o primeiro grito
e estais aí conversando
pois sabeis que ele é nascido.
APARECEM E SE APROXIMAM DA CASA DO
HOMEM VIZINHOS,
AMIGOS, DUAS CIGANAS, ETC
—— Todo o céu e a terra
lhe cantam louvor.
Foi por ele que a maré
esta noite não baixou.
—— Foi por ele que a maré
fez parar o seu motor:
a lama ficou coberta
e o mau-cheiro não voou.
—— E a alfazema do sargaço,
ácida, desinfetante,
veio varrer nossas ruas
enviada do mar distante.
—— E a língua seca de esponja
que tem o vento terral
veio enxugar a umidade
do encharcado lamaçal.
—— Todo o céu e a terra
lhe cantam louvor
e cada casa se torna
num mocambo sedutor.
—— Cada casebre se torna
no mocambo modelar
que tanto celebram os
sociólogos do lugar.
—— E a banda de maruins
que toda noite se ouvia
por causa dele, esta noite,
creio que não irradia.
—— E este rio de água, cega,
ou baça, de comer terra,
que jamais espelha o céu,
hoje enfeitou-se de estrelas.
COMEÇAM A CHEGAR PESSOAS TRAZENDO
PRESENTES PARA
O RECÉM-NASCIDO


  — Minha pobreza tal é
que não trago presente grande:
trago para a mãe caranguejos
pescados por esses mangues
mamando leite de lama
conservará nosso sangue.
—— Minha pobreza tal é
que coisa alguma posso ofertar:
somente o leite que tenho
para meu filho amamentar
aqui todos são irmãos,
de leite, de lama, de ar.
—— Minha pobreza tal é
que não tenho presente melhor:
trago este papel de jornal
para lhe servir de cobertor
cobrindo-se assim de letras
vai um dia ser doutor.
—— Minha pobreza tal é
que não tenho presente caro:
como não posso trazer
um olho d'água de Lagoa do Cerro,
trago aqui água de Olinda,
água da bica do Rosário.

—— Minha pobreza tal é
que grande coisa não trago:
trago este canário da terra
que canta sorrindo e de estalo.
—— Minha pobreza tal é
que minha oferta não é rica:
trago daquela bolacha d'água
que só em Paudalho se fabrica.
—— Minha pobreza tal é
que melhor presente não tem:
dou este boneco de barro
de Severino de Tracunhaém.
—— Minha pobreza tal é
que pouco tenho o que dar:
dou da pitu que o pintor Monteiro
fabricava em Gravatá.
—— Trago abacaxi de Goiana
e de todo o Estado rolete de cana.
—— Eis ostras chegadas agora,
apanhadas no cais da Aurora.
—— Eis tamarindos da Jaqueira
e jaca da Tamarineira.
—— Mangabas do Cajueiro
e cajus da Mangabeira.
—— Peixe pescado no Passarinho,
carne de boi dos Peixinhos.
—— Siris apanhados no lamaçal
que já no avesso da rua Imperial.
—— Mangas compradas nos quintais ricos
do Espinheiro e dos Aflitos.
—— Goiamuns dados pela gente pobre
da Avenida Sul e da Avenida Norte.




FALAM AS DUAS CIGANAS QUE HAVIAM
APARECIDO COM OS VIZINHOS


—— Atenção peço, senhores,
para esta breve leitura:
somos ciganas do Egito,
lemos a sorte futura.
Vou dizer todas as coisas
que desde já posso ver
na vida desse menino
acabado de nascer:
aprenderá a engatinhar
por aí, com aratus,
aprenderá a caminhar
na lama, como goiamuns,
e a correr o ensinarão
o anfíbios caranguejos,
pelo que será anfíbio
como a gente daqui mesmo.
Cedo aprenderá a caçar:
primeiro, com as galinhas,
que é catando pelo chão
tudo o que cheira a comida
depois, aprenderá com
outras espécies de bichos:
com os porcos nos monturos,
com os cachorros no lixo.
Vejo-o, uns anos mais tarde,
na ilha do Maruim,
vestido negro de lama,
voltar de pescar siris
e vejo-o, ainda maior,
pelo imenso lamarão
fazendo dos dedos iscas
para pescar camarão.

—— Atenção peço, senhores,
também para minha leitura:
também venho dos Egitos,
vou completar a figura.
Outras coisas que estou vendo
é necessário que eu diga:
não ficará a pescar
de jereré toda a vida.
Minha amiga se esqueceu
de dizer todas as linhas
não pensem que a vida dele
há de ser sempre daninha.
Enxergo daqui a planura
que é a vida do homem de ofício,
bem mais sadia que os mangues,
tenha embora precipícios.
Não o vejo dentro dos mangues,
vejo-o dentro de uma fábrica:
se está negro não é lama,
é graxa de sua máquina,
coisa mais limpa que a lama
do pescador de maré
que vemos aqui vestido
de lama da cara ao pé.
E mais: para que não pensem
que em sua vida tudo é triste,
vejo coisa que o trabalho
talvez até lhe conquiste:
que é mudar-se destes mangues
daqui do Capibaribe
para um mocambo melhor

nos mangues do Beberibe.
FALAM OS VIZINHOS, AMIGOS, PESSOAS QUE
VIERAM COM PRESENTES, ETC


—— De sua formosura
já venho dizer:
é um menino magro,
de muito peso não é,
mas tem o peso de homem,
de obra de ventre de mulher.
—— De sua formosura
deixai-me que diga:
é uma criança pálida,
é uma criança franzina,
mas tem a marca de homem,
marca de humana oficina.
—— Sua formosura
deixai-me que cante:
é um menino guenzo
como todos os desses mangues,
mas a máquina de homem
já bate nele, incessante.
—— Sua formosura
eis aqui descrita:
é uma criança pequena,
enclenque e setemesinha,
mas as mãos que criam coisas
nas suas já se adivinha.


—— De sua formosura
deixai-me que diga:
é belo como o coqueiro
que vence a areia marinha.
—— De sua formosura
deixai-me que diga:
belo como o avelós
contra o Agreste de cinza.
—— De sua formosura
deixai-me que diga:
belo como a palmatória
na caatinga sem saliva.
—— De sua formosura
deixai-me que diga:
é tão belo como um sim
numa sala negativa.
—— é tão belo como a soca
que o canavial multiplica.
—— Belo porque é uma porta
abrindo-se em mais saídas.
—— Belo como a última onda
que o fim do mar sempre adia.
—— é tão belo como as ondas
em sua adição infinita.


—— Belo porque tem do novo
a surpresa e a alegria.
—— Belo como a coisa nova
na prateleira até então vazia.
—— Como qualquer coisa nova
inaugurando o seu dia.
—— Ou como o caderno novo
quando a gente o principia.


—— E belo porque o novo
todo o velho contagia.
—— Belo porque corrompe
com sangue novo a anemia.
—— Infecciona a miséria
com vida nova e sadia.
—— Com oásis, o deserto,
com ventos, a calmaria.




O CARPINA FALA COM O RETIRANTE QUE
ESTEVE DE FORA,
SEM TOMAR PARTE DE NADA

—— Severino, retirante,
deixe agora que lhe diga:
eu não sei bem a resposta
da pergunta que fazia,
se não vale mais saltar
fora da ponte e da vida
nem conheço essa resposta,
se quer mesmo que lhe diga
é difícil defender,
só com palavras, a vida,
ainda mais quando ela é
esta que vê, severina
mas se responder não pude
à pergunta que fazia,
ela, a vida, a respondeu
com sua presença viva.


E não há melhor resposta
que o espetáculo da vida:
vê-la desfiar seu fio,
que também se chama vida,
ver a fábrica que ela mesma,
teimosamente, se fabrica,
vê-la brotar como há pouco
em nova vida explodida
mesmo quando é assim pequena
a explosão, como a ocorrida
como a de há pouco, franzina
mesmo quando é a explosão
de uma vida severina.


A um Bruxo, Com Amor
Carlos Drummond Andrade
Em certa casa da Rua Cosme Velho
(que se abre no vazio)
venho visitar-te; e me recebes
na sala trajestada com simplicidade
onde pensamentos idos e vividos
perdem o amarelo
de novo interrogando o céu e a noite.
Outros leram da vida um capítulo, tu leste o livro inteiro.
Daí esse cansaço nos gestos e, filtrada,
uma luz que não vem de parte alguma
pois todos os castiçais
estão apagados.
Contas a meia voz
maneiras de amar e de compor os ministérios
e deitá-los abaixo, entre malinas
e bruxelas.
Conheces a fundo
a geologia moral dos Lobo Neves
e essa espécie de olhos derramados
que não foram feitos para ciumentos.
E ficas mirando o ratinho meio cadáver
com a polida, minuciosa curiosidade
de quem saboreia por tabela
o prazer de Fortunato, vivisseccionista amador.
Olhas para a guerra, o murro, a facada
como para uma simples quebra da monotonia universal
e tens no rosto antigo
uma expressão a que não acho nome certo
(das sensações do mundo a mais sutil):
volúpia do aborrecimento?
ou, grande lascivo, do nada?
O vento que rola do Silvestre leva o diálogo,
e o mesmo som do relógio, lento, igual e seco,
tal um pigarro que parece vir do tempo da Stoltz e do gabinete Paraná,
mostra que os homens morreram.
A terra está nua deles.
Contudo, em longe recanto,
a ramagem começa a sussurar alguma coisa
que não se estende logo
a parece a canção das manhãs novas.
Bem a distingo, ronda clara:
É Flora,
com olhos dotados de um mover particular
ente mavioso e pensativo;
Marcela, a rir com expressão cândida (e outra coisa);
Virgília,
cujos olhos dão a sensação singular de luz úmida;
Mariana, que os tem redondos e namorados;
e Sancha, de olhos intimativos;
e os grandes, de Capitu, abertos como a vaga do mar lá fora,
o mar que fala a mesma linguagem
obscura e nova de D. Severina
e das chinelinhas de alcova de Conceição.
A todas decifrastes íris e braços
e delas disseste a razão última e refolhada
moça, flor mulher flor
canção de mulher nova...
E ao pé dessa música dissimulas (ou insinuas, quem sabe)
o turvo grunhir dos porcos, troça concentrada e filosófica
entre loucos que riem de ser loucos
e os que vão à Rua da Misericórdia e não a encontram.
O eflúvio da manhã,
quem o pede ao crepúsculo da tarde?
Uma presença, o clarineta,
vai pé ante pé procurar o remédio,
mas haverá remédio para existir
senão existir?
E, para os dias mais ásperos, além
da cocaína moral dos bons livros?
Que crime cometemos além de viver
e porventura o de amar
não se sabe a quem, mas amar?
Todos os cemitérios se parecem,
e não pousas em nenhum deles, mas onde a dúvida
apalpa o mármore da verdade, a descobrir
a fenda necessária;
onde o diabo joga dama com o destino,
estás sempre aí, bruxo alusivo e zombeteiro,
que resolves em mim tantos enigmas.
Um som remoto e brando
rompe em meio a embriões e ruínas,
eternas exéquias e aleluias eternas,
e chega ao despistamento de teu pencenê.
O estribeiro Oblivion
bate à porta e chama ao espetáculo
promovido para divertir o planeta Saturno.
Dás volta à chave,
envolves-te na capa,
e qual novo Ariel, sem mais resposta,
sais pela janela, dissolves-te no ar.




                                    Caso do Vestido

                                                          Carlos Drummond de Andrade



                              Nossa mãe, o que é aquele
                               vestido, naquele prego?

                               Minhas filhas, é o vestido
                               de uma dona que passou.

                              Passou quando, nossa mãe?
                                 Era nossa conhecida?

                               Minhas filhas, boca presa.
                               Vosso pai evém chegando.

                               Nossa mãe, dizei depressa
                               que vestido é esse vestido.

                               Minhas filhas, mas o corpo
                                ficou frio e não o veste.

                                O vestido, nesse prego,
                                está morto, sossegado.
Nossa mãe, esse vestido
 tanta renda, esse segredo!

   Minhas filhas, escutai
  palavras de minha boca.

  Era uma dona de longe,
  vosso pai enamorou-se.

  E ficou tão transtornado,
  se perdeu tanto de nós,

  se afastou de toda vida,
   se fechou, se devorou,

 chorou no prato de carne,
 bebeu, brigou, me bateu,

me deixou com vosso berço,
 foi para a dona de longe,

   mas a dona não ligou.
   Em vão o pai implorou.

  Dava apólice, fazenda,
  dava carro, dava ouro,

     beberia seu sobejo,
    lamberia seu sapato.

   Mas a dona nem ligou.
   Então vosso pai, irado,

 me pediu que lhe pedisse,
 a essa dona tão perversa,

    que tivesse paciência
  e fosse dormir com ele...

Nossa mãe, por que chorais?
 Nosso lenço vos cedemos.

  Minhas filhas, vosso pai
chega ao pátio. Disfarcemos.

Nossa mãe, não escutamos
  pisar de pé no degrau.

   Minhas filhas, procurei
  aquela mulher do demo.
E lhe roguei que aplacasse
  de meu marido a vontade.

   Eu não amo teu marido,
    me falou ela se rindo.

   Mas posso ficar com ele
   se a senhora fizer gosto,

     só pra lhe satisfazer,
não por mim, não quero homem.

     Olhei para vosso pai,
     os olhos dele pediam.

   Olhei para a dona ruim,
   os olhos dela gozavam.

   O seu vestido de renda,
   de colo mui devassado,

 mais mostrava que escondia
   as partes da pecadora.

    Eu fiz meu pelo-sinal,
  me curvei... disse que sim.

   Sai pensando na morte,
  mas a morte não chegava.

   Andei pelas cinco ruas,
   passei ponte, passei rio,

    visitei vossos parentes,
     não comia, não falava,

    tive uma febre terçã,
  mas a morte não chegava.

     Fiquei fora de perigo,
   fiquei de cabeça branca,

perdi meus dentes, meus olhos,
    costurei, lavei, fiz doce,

minhas mãos se escalavraram,
 meus anéis se dispersaram,

    minha corrente de ouro
   pagou conta de farmácia.
Vosso pais sumiu no mundo.
O mundo é grande e pequeno.

   Um dia a dona soberba
  me aparece já sem nada,

  pobre, desfeita, mofina,
  com sua trouxa na mão.

  Dona, me disse baixinho,
  não te dou vosso marido,

 que não sei onde ele anda.
  Mas te dou este vestido,

    última peça de luxo
que guardei como lembrança

    daquele dia de cobra,
    da maior humilhação.

 Eu não tinha amor por ele,
  ao depois amor pegou.

  Mas então ele enjoado
 confessou que só gostava

de mim como eu era dantes.
 Me joguei a suas plantas,

   fiz toda sorte de dengo,
  no chão rocei minha cara,

  me puxei pelos cabelos,
  me lancei na correnteza,

   me cortei de canivete,
   me atirei no sumidouro,

     bebi fel e gasolina,
  rezei duzentas novenas,

    dona, de nada valeu:
    vosso marido sumiu.

   Aqui trago minha roupa
  que recorda meu malfeito

  de ofender dona casada
  pisando no seu orgulho.
Recebei esse vestido
  e me dai vosso perdão.

   Olhei para a cara dela,
 quede os olhos cintilantes?

  quede graça de sorriso,
  quede colo de camélia?

  quede aquela cinturinha
   delgada como jeitosa?

 quede pezinhos calçados
 com sandálias de cetim?

   Olhei muito para ela,
  boca não disse palavra.

   Peguei o vestido, pus
  nesse prego da parede.

   Ela se foi de mansinho
  e já na ponta da estrada

    vosso pai aparecia.
 Olhou pra mim em silêncio,

   mal reparou no vestido
 e disse apenas: — Mulher,

põe mais um prato na mesa.
  Eu fiz, ele se assentou,

    comeu, limpou o suor,
era sempre o mesmo homem,

    comia meio de lado
 e nem estava mais velho.

   O barulho da comida
  na boca, me acalentava,

 me dava uma grande paz,
  um sentimento esquisito

 de que tudo foi um sonho,
vestido não há... nem nada.

 Minhas filhas, eis que ouço
vosso pai subindo a escada.
Texto extraído do livro "Nova Reunião - 19 Livros de Poesia", José Olympio Editora -
1985, pág. 157.

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Para viver um grande amor

  • 1. Para Viver Um Grande Amor Vinicius de Moraes Para viver um grande amor, preciso é muita concentração e muito siso, muita seriedade e pouco riso — para viver um grande amor. Para viver um grande amor, mister é ser um homem de uma só mulher; pois ser de muitas, poxa! é de colher... — não tem nenhum valor. Para viver um grande amor, primeiro é preciso sagrar-se cavalheiro e ser de sua dama por inteiro — seja lá como for. Há que fazer do corpo uma morada onde clausure-se a mulher amada e postar-se de fora com uma espada — para viver um grande amor. Para viver um grande amor, vos digo, é preciso atenção como o "velho amigo", que porque é só vos quer sempre consigo para iludir o grande amor. É preciso muitíssimo cuidado com quem quer que não esteja apaixonado, pois quem não está, está sempre preparado pra chatear o grande amor. Para viver um amor, na realidade, há que compenetrar-se da verdade de que não existe amor sem fidelidade — para viver um grande amor. Pois quem trai seu amor por vanidade é um desconhecedor da liberdade, dessa imensa, indizível liberdade que traz um só amor. Para viver um grande amor, il faut além de fiel, ser bem conhecedor de arte culinária e de judô — para viver um grande amor. Para viver um grande amor perfeito, não basta ser apenas bom sujeito; é preciso também ter muito peito — peito de remador. É preciso olhar sempre a bem-amada como a sua primeira namorada e sua viúva também, amortalhada no seu finado amor. É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista — muito mais, muito mais que na modista! — para aprazer ao grande amor. Pois do que o grande amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor... Conta ponto saber fazer coisinhas: ovos mexidos, camarões, sopinhas, molhos, strogonoffs — comidinhas para depois do amor. E o que há de melhor que ir pra cozinha e preparar com amor uma galinha com uma rica e gostosa farofinha, para o seu grande amor? Para viver um grande amor é muito, muito importante viver sempre junto e até ser, se possível, um só defunto — pra não morrer de dor. É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mas também com a mente, pois qualquer "baixo" seu, a amada sente — e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia — para viver um grande amor. É preciso saber tomar uísque (com o mau bebedor nunca se arrisque!) e ser impermeável ao diz-que-diz-que — que não quer nada com o amor.
  • 2. Mas tudo isso não adianta nada, se nesta selva oscura e desvairada não se souber achar a bem-amada — para viver um grande amor. Drummond...só podia ser dele... Quando encontrar alguém e esse alguém fizer seu coração parar de funcionar por alguns segundos, preste atenção: pode ser a pessoa mais importante da sua vida. Se os olhares se cruzarem e, neste momento, houver o mesmo brilho intenso entre eles, fique alerta: pode ser a pessoa que você está esperando desde o dia em que nasceu. Se o toque dos lábios for intenso, se o beijo for apaixonante, e os olhos se encherem d'água neste momento, perceba: existe algo mágico entre vocês. Se o primeiro e o último pensamento do seu dia for essa pessoa, se a vontade de ficar juntos chegar a apertar o coração, agradeça: Deus te mandou um presente divino - O Amor. Se um dia tiverem que pedir perdão um ao outro por algum motivo e em troca receber um abraço, um sorriso, um afago nos cabelos e os gestos valerem mais que mil palavras, entregue-se: vocês foram feitos um pro outro. Se por algum motivo você estiver triste, se a vida te deu uma rasteira e a outra pessoa sofrer o seu sofrimento, chorar as suas lágrimas e enxugá-las com ternura, que coisa maravilhosa: você poderá contar com ela em qualquer momento de sua vida. Se você conseguir, em pensamento, sentir o cheiro da pessoa como se ela estivesse ali do seu lado... Se você achar a pessoa maravilhosamente linda, mesmo ela estando de pijamas velhos, chinelos de dedo e cabelos emaranhados... Se você não consegue trabalhar direito o dia todo, ansioso pelo encontro que está marcado para a noite... Se você não consegue imaginar, de maneira nenhuma, um futuro sem a pessoa ao seu lado... Se você tiver a certeza que vai ver a outra envelhecendo e, mesmo assim, tiver a convicção que vai continuar sendo louco por ela... Se você preferir morrer, antes de ver a outra partindo: é o amor que chegou na sua vida. É uma dádiva. Muitas pessoas apaixonam-se muitas vezes na vida, mas poucas amam ou encontram um amor verdadeiro. Ou às vezes encontram e, por não prestarem atenção nesses sinais, deixam o amor passar, sem deixá-lo acontecer verdadeiramente. É o livre-arbítrio. Por isso, preste atenção nos sinais - não deixe que as loucuras do dia-a-dia o deixem cego para a melhor coisa da vida: O Amor.
  • 3. Essa negra fulo _ Jorge de Lima Ora, se deu que chegou (isso já faz muito tempo) no bangüê dum meu avô uma negra bonitinha, chamada negra Fulô. Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô! Ó Fulô! (Era a fala da Sinhá) — Vai forrar a minha cama pentear os meus cabelos, vem ajudar a tirar a minha roupa, Fulô! Essa negra Fulô! Essa negrinha Fulô! ficou logo pra mucama pra vigiar a Sinhá, pra engomar pro Sinhô! Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô! Ó Fulô! (Era a fala da Sinhá) vem me ajudar, ó Fulô, vem abanar o meu corpo que eu estou suada, Fulô! vem coçar minha coceira, vem me catar cafuné, vem balançar minha rede, vem me contar uma história, que eu estou com sono, Fulô! Essa negra Fulô! "Era um dia uma princesa que vivia num castelo que possuía um vestido com os peixinhos do mar. Entrou na perna dum pato saiu na perna dum pinto
  • 4. o Rei-Sinhô me mandou que vos contasse mais cinco". Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô! Ó Fulô! Vai botar para dormir esses meninos, Fulô! "minha mãe me penteou minha madrasta me enterrou pelos figos da figueira que o Sabiá beliscou". Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô! Ó Fulô! (Era a fala da Sinhá Chamando a negra Fulô!) Cadê meu frasco de cheiro Que teu Sinhô me mandou? — Ah! Foi você que roubou! Ah! Foi você que roubou! Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! O Sinhô foi ver a negra levar couro do feitor. A negra tirou a roupa, O Sinhô disse: Fulô! (A vista se escureceu que nem a negra Fulô). Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô! Ó Fulô! Cadê meu lenço de rendas, Cadê meu cinto, meu broche, Cadê o meu terço de ouro que teu Sinhô me mandou? Ah! foi você que roubou! Ah! foi você que roubou! Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! O Sinhô foi açoitar
  • 5. sozinho a negra Fulô. A negra tirou a saia e tirou o cabeção, de dentro dêle pulou nuinha a negra Fulô. Essa negra Fulô! Essa negra Fulô! Ó Fulô! Ó Fulô! Cadê, cadê teu Sinhô que Nosso Senhor me mandou? Ah! Foi você que roubou, foi você, negra fulô? Essa negra Fulô! Inverno_ Jorge de Lima Zefa, chegou o inverno! Formigas de asas e tanajuras! Chegou o inverno! Lama e mais lama chuva e mais chuva, Zefa! Vai nascer tudo, Zefa, Vai haver verde, verde do bom, verde nos galhos, verde na terra, verde em ti, Zefa, que eu quero bem! Formigas de asas e tanajuras! O rio cheio, barrigas cheias, mulheres cheias, Zefa! Águas nas locas, pitus gostosos, carás, cabojés, e chuva e mais chuva! Vai nascer tudo milho, feijão, até de novo teu coração, Zefa!
  • 6. Formigas de asas e tanajuras! Chegou o inverno! Chuva e mais chuva! Vai casar, tudo, moça e viúva! Chegou o inverno Covas bem fundas pra enterrar cana: cana caiana e flor de Cuba! Terra tão mole que as enxadas nelas se afundam com olho e tudo! Leite e mais leite pra requeijões! Cargas de imbu! Em junho o milho, milho e canjica pra São João! E tudo isto, Zefa... E mais gostoso que tudo isso: noites de frio, lá fora o escuro, lá fora a chuva, trovão, corisco, terras caídas, córgos gemendo, os caborés gemendo, os caborés piando, Zefa! Os cururus cantando, Zefa! Dentro da nossa casa de palha: carne de sol chia nas brasas, farinha d'água, café, cigarro, cachaça, Zefa... ...rede gemendo... Tempo gostoso! Vai nascer tudo! Lá fora a chuva, chuva e mais chuva, trovão, corisco, terras caídas e vento e chuva, chuva e mais chuva! Mas tudo isso, Zefa, vamos dizer, só com os poderes
  • 7. de Jesus Cristo! José E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora, José? e agora, Você? Você que é sem nome, que zomba dos outros, Você que faz versos, que ama, protesta? e agora, José? Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir já não pode, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio, não veio a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, e agora, José? E agora, José? sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de ouro, seu terno de vidro,
  • 8. sua incoerência, seu ódio, - e agora? Com a chave na mão quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora? Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse, a valsa vienense, se você dormisse, se você cansasse, se você morresse.... Mas você não morre, você é duro, José! Sozinho no escuro qual bicho-do-mato, sem teogonia, sem parede nua para se encostar, sem cavalo preto que fuja do galope, você marcha, José! José, para onde? Morte do Leiteiro Carlos Drummond de Andrade Há pouco leite no país, é preciso entregá-lo cedo.
  • 9. Há muita sede no país, é preciso entregá-lo cedo. Há no país uma legenda, que ladrão se mata com tiro. Então o moço que é leiteiro de madrugada com sua lata sai correndo e distribuindo leite bom para gente ruim. Sua lata, suas garrafas e seus sapatos de borracha vão dizendo aos homens no sono que alguém acordou cedinho e veio do último subúrbio trazer o leite mais frio e mais alvo da melhor vaca para todos criarem força na luta brava da cidade. Na mão a garrafa branca não tem tempo de dizer as coisas que lhe atribuo nem o moço leiteiro ignaro, morados na Rua Namur, empregado no entreposto, com 21 anos de idade, sabe lá o que seja impulso de humana compreensão. E já que tem pressa, o corpo vai deixando à beira das casas uma apenas mercadoria. E como a porta dos fundos também escondesse gente que aspira ao pouco de leite disponível em nosso tempo, avancemos por esse beco, peguemos o corredor, depositemos o litro... Sem fazer barulho, é claro, que barulho nada resolve. Meu leiteiro tão sutil de passo maneiro e leve, antes desliza que marcha. É certo que algum rumor sempre se faz: passo errado, vaso de flor no caminho, cão latindo por princípio, ou um gato quizilento. E há sempre um senhor que acorda,
  • 10. resmunga e torna a dormir. Mas este acordou em pânico (ladrões infestam o bairro), não quis saber de mais nada. O revólver da gaveta saltou para sua mão. Ladrão? se pega com tiro. Os tiros na madrugada liquidaram meu leiteiro. Se era noivo, se era virgem, se era alegre, se era bom, não sei, é tarde para saber. Mas o homem perdeu o sono de todo, e foge pra rua. Meu Deus, matei um inocente. Bala que mata gatuno também serve pra furtar a vida de nosso irmão. Quem quiser que chame médico, polícia não bota a mão neste filho de meu pai. Está salva a propriedade. A noite geral prossegue, a manhã custa a chegar, mas o leiteiro estatelado, ao relento, perdeu a pressa que tinha. Da garrafa estilhaçada, no ladrilho já sereno escorre uma coisa espessa que é leite, sangue... não sei. Por entre objetos confusos, mal redimidos da noite, duas cores se procuram, suavemente se tocam, amorosamente se enlaçam, formando um terceiro tom a que chamamos aurora. Romance II ou do Ouro Incansável _ Cecília Meireles Mil bateias vão rodando sobre córregos escuros; a terra vai sendo aberta por intermináveis sulcos; infinitas galerias
  • 11. penetram morros profundos. De seu calmo esconderijo, o ouro vem, dócil e ingênuo; torna-se pó, folha, barra, prestígio, poder, engenho... É tão claro! - e turva tudo: honra, amor e pensamento. Borda flores nos vestidos, sobe a opulentos altares, traça palácios e pontes, eleva os homens audazes, e acende paixões que alastram sinistras rivalidades. Pelos córregos, definham negros a rodar bateias. Morre-se de febre e fome sobre a riqueza da terra: uns querem metais luzentes, outros, as redradas pedras. Ladrões e contrabandistas estão cercando os caminhos; cada família disputa privilégios mais antigos; os impostos vão crescendo e as cadeias vão subindo. Por ódio, cobiça, inveja, vai sendo o inferno traçado. Os reis querem seus tributos, - mas não se encontram vassalos. Mil bateias vão rodando, mil bateias sem cansaço. Mil galerias desabam; mil homens ficam sepultos; mil intrigas, mil enredos prendem culpados e justos; já ninguém dorme tranqüilo, que a noite é um mundo de sustos. Descem fantasmas dos morros, vêm almas dos cemitérios: todos pedem ouro e prata, e estendem punhos severos,
  • 12. mas vão sendo fabricadas muitas algemas de ferro. Romance XXI ou das Idéias A vastidão desses campos. A alta muralha das serras. As lavras inchadas de ouro. Os diamantes entre as pedras. Negros, índios e mulatos. Almocrafes e gamelas. Os rios todos virados.
  • 13. Toda revirada, a terra. Capitães, governadores, padres intendentes, poetas. Carros, liteiras douradas, cavalos de crina aberta. A água a transbordar das fontes. Altares cheios de velas. Cavalhadas. Luminárias. Sinos, procissões, promessas. Anjos e santos nascendo em mãos de gangrena e lepra. Finas músicas broslando as alfaias das capelas. Todos os sonhos barrocos deslizando pelas pedras. Pátios de seixos. Escadas. Boticas. Pontes. Conversas. Gente que chega e que passa. E as idéias. Amplas casas. Longos muros. Vida de sombras inquietas. Pelos cantos da alcovas, histerias de donzelas. Lamparinas, oratórios, bálsamos, pílulas, rezas. Orgulhosos sobrenomes. Intrincada parentela. No batuque das mulatas, a prosápia degenera: pelas portas dos fidalgos, na lã das noites secretas, meninos recém-nascidos como mendigos esperam. Bastardias. Desavenças. Emboscadas pela treva. Sesmarias, salteadores. Emaranhadas invejas. O clero. A nobreza. O povo. E as idéias. E as mobílias de cabiúna. E as cortinas amarelas. Dom José. Dona Maria. Fogos. Mascaradas. Festas. Nascimentos. Batizados. Palavras que se interpretam nos discursos, nas saúdes... Visitas. Sermões de exéquias. Os estudantes que partem.
  • 14. Os doutores que regressam. (Em redor das grandes luzes, há sempre sombras perversas. Sinistros corvos espreitam pelas douradas janelas.) E há mocidade! E há prestígio. E as idéias. As esposas preguiçosas na rede embalando as sestas. Negras de peitos robustos que os claros meninos cevam. Arapongas, papagaios, passarinhos da floresta. Essa lassidão do tempo entre imbaúbas, quaresmas, cana, milho, bananeiras e a brisa que o riacho encrespa. Os rumores familiares que a lenta vida atravessam: elefantíase; partos; sarna; torceduras; quedas; sezões; picadas de cobras; sarampos e erisipelas... Candombeiros. Feiticeiros. Ungüentos. Emplastos. Ervas. Senzalas. Tronco. Chibata. Congos. Angolas. Benguelas. Ó imenso tumulto humano! E as idéias. Banquetes. Gamão. Notícias. Livros. Gazetas. Querelas. Alvarás. Decretos. Cartas. A Europa a ferver em guerras. Portugal todo de luto: triste Rainha o governa! Ouro! Ouro! Pedem mais ouro! E sugestões indiscretas: Tão longe o trono se encontra! Quem no Brasil o tivera! Ah, se Dom José II põe a coroa na testa! Uns poucos de americanos, por umas praias desertas, já libertaram seu povo da prepotente Inglaterra! Washington. Jefferson. Franklin. (Palpita a noite, repleta de fantasmas, de presságios...)
  • 15. E as idéias. Doces invenções da Arcádia! Delicada primavera: pastoras, sonetos, liras, - entre as ameaças austeras de mais impostos e taxas que uns protelam e outros negam. Casamentos impossíveis. Calúnias. Sátiras. Essa paixão da mediocridade que na sombra se exaspera. E os versos de asas douradas, que amor trazem e amor levam... Anarda. Nise. Marília... As verdades e as quimeras. Outras leis, outras pessoas. Novo mundo que começa. Nova raça. Outro destino. Planos de melhores eras. E os inimigos atentos, que, de olhos sinistros, velam. E os aleives. E as denúncias. E as idéias.
  • 16. Tu Tens um Medo Acabar. Não vês que acabas todo o dia. Que morres no amor. Na tristeza. Na dúvida. No desejo. Que te renovas todo dia.
  • 17. No amor. Na tristeza Na dúvida. No desejo. Que és sempre outro. Que és sempre o mesmo. Que morrerás por idades imensas. Até não teres medo de morrer. E então serás eterno. Não ames como os homens amam. Não ames com amor. Ama sem amor. Ama sem querer. Ama sem sentir. Ama como se fosses outro. Como se fosses amar. Sem esperar. Tão separado do que ama, em ti, Que não te inquiete Se o amor leva à felicidade, Se leva à morte, Se leva a algum destino. Se te leva. E se vai, ele mesmo... Não faças de ti Um sonho a realizar. Vai. Sem caminho marcado. Tu és o de todos os caminhos. Sê apenas uma presença. Invisível presença silenciosa. Todas as coisas esperam a luz, Sem dizerem que a esperam. Sem saberem que existe. Todas as coisas esperarão por ti, Sem te falarem. Sem lhes falares. Sê o que renuncia Altamente: Sem tristeza da tua renúncia! Sem orgulho da tua renúncia! Abre as tuas mãos sobre o infinito. E não deixes ficar de ti Nem esse último gesto! O que tu viste amargo, Doloroso, Difícil, O que tu viste inútil
  • 18. Foi o que viram os teus olhos Humanos, Esquecidos... Enganados... No momento da tua renúncia Estende sobre a vida Os teus olhos E tu verás o que vias: Mas tu verás melhor... ... E tudo que era efêmero se desfez. E ficaste só tu, que é eterno. O Vaqueiro Eu venho dêrne menino, Dêrne munto pequenino, Cumprindo o belo destino Que me deu Nosso Senhô. Eu nasci pra sê vaquêro, Sou o mais feliz brasilêro, Eu não invejo dinhêro, Nem diproma de dotô.
  • 19. Sei que o dotô tem riquêza, É tratado com fineza, Faz figura de grandeza, Tem carta e tem anelão, Tem casa branca jeitosa E ôtas coisa preciosa; Mas não goza o quanto goza Um vaquêro do sertão. Da minha vida eu me orgúio, Levo a Jurema no embrúio Gosto de ver o barúio De barbatão a corrê, Pedra nos casco rolando, Gaios de pau estralando, E o vaquêro atrás gritando, Sem o perigo temê. Criei-me neste serviço, Gosto deste reboliço, Boi pra mim não tem feitiço, Mandinga nem catimbó. Meu cavalo Capuêro, Corredô, forte e ligêro, Nunca respeita barsêro De unha de gato ou cipó. Tenho na vida um tesôro Que vale mais de que ôro: O meu liforme de côro, Pernêra, chapéu, gibão. Sou vaquêro destemido, Dos fazendêro querido, O meu grito é conhecido Nos campo do meu sertão. O pulo do meu cavalo Nunca me causou abalo; Eu nunca sofri um galo, pois eu sei me desviá. Travesso a grossa chapada, Desço a medonha quebrada, Na mais doida disparada, Na pega do marruá. Se o bicho brabo se acoa, Não corro nem fico à tôa: Comigo ninguém caçoa, Não corro sem vê de quê. É mêrmo por desaforo Que eu dou de chapéu de côro Na testa de quarqué tôro Que não qué me obedecê.
  • 20. Não dou carrêra perdida, Conheço bem esta lida, Eu vivo gozando a vida Cheio de satisfação. Já tou tão acostumado Que trabaio e não me enfado, Faço com gosto os mandado Das fia do meu patrão. Vivo do currá pro mato, Sou correto e munto izato, Por farta de zelo e trato Nunca um bezerro morreu. Se arguém me vê trabaiando, A bezerrama curando, Dá pra ficá maginando Que o dono do gado é eu. Eu não invejo riqueza Nem posição, nem grandeza, Nem a vida de fineza Do povo da capitá. Pra minha vida sê bela Só basta não fartá nela Bom cavalo, boa sela E gado pr'eu campeá. Somente uma coisa iziste, Que ainda que teja triste Meu coração não resiste E pula de animação. É uma viola magoada, Bem chorosa e apaxonada, Acompanhando a toada Dum cantadô do sertão. Tenho sagrado direito De ficá bem satisfeito Vendo a viola no peito De quem toca e canta bem. Dessas coisa sou herdêro, Que o meu pai era vaquêro, Foi um fino violêro E era cantadô tombém. Eu não sei tocá viola, Mas seu toque me consola, Verso de minha cachola Nem que eu peleje não sai, Nunca cantei um repente Mas vivo munto contente, Pois herdei perfeitamente Um dos dote de meu pai. O dote de sê vaquêro, Resorvido marruêro,
  • 21. Querido dos fazendêro Do sertão do Ceará. Não perciso maió gozo, Sou sertanejo ditoso, O meu aboio sodoso Faz quem tem amô chorá. Patativa do Assaré A TERRA É NATURÁ Esta terra é como o Só Que nace todos os dia Briando o grande, o menó E tudo que a terra cria. O só quilarêa os monte, Tombém as água das fonte, Com a sua luz amiga, Potrege, no mesmo instante, Do grandaião elefante A pequenina formiga. Esta terra é como a chuva, Que vai da praia a campina, Móia a casada, a viúva, A véia, a moça, a menina. Quando sangra o nevuêro, Pra conquistá o aguacêro, Ninguém vai fazê fuxico, Pois a chuva tudo cobre, Móia a tapera do pobre E a grande casa do rico. Esta terra é como a lua, Este foco prateado Que é do campo até a rua, A lampa dos namorado; Mas, mesmo ao véio cacundo, Já com ar de moribundo Sem amô, sem vaidade, Esta lua cô de prata Não lhe dêxa de sê grata; Lhe manda quilaridade. Esta terra é como o vento, O vento que, por capricho Assopra, às vez, um momento,
  • 22. Brando, fazendo cuchicho. Ôtras vez, vira o capêta, Vai fazendo piruêta, Roncando com desatino, Levando tudo de móio Jogando arguêro nos óio Do grande e do pequenino. Se o orguiôso podesse Com seu rancô desmedido, Tarvez até já tivesse Este vento repartido, Ficando com a viração Dando ao pobre o furacão; Pois sei que ele tem vontade E acha mesmo que percisa Gozá de frescô da brisa, Dando ao pobre a tempestade. Pois o vento, o só, a lua, A chuva e a terra também, Tudo é coisa minha e sua, Seu dotô conhece bem. Pra se sabê disso tudo Ninguém precisa de istudo; Eu, sem escrevê nem lê, Conheço desta verdade, Seu dotô, tenha bondade De uvi o que vô dizê. Não invejo o seu tesôro, Sua mala de dinhêro A sua prata, o seu ôro O seu boi, o seu carnêro Seu repôso, seu recreio, Seu bom carro de passeio, Sua casa de morá E a sua loja surtida, O que quero nesta vida É terra pra trabaiá. Iscute o que tô dizendo, Seu dotô, seu coroné: De fome tão padecendo Meus fio e minha muié. Sem briga, questão nem guerra, Meça desta grande terra Umas tarefa pra eu! Tenha pena do agregado
  • 23. Não me dêxe deserdado Daquilo que Deus me deu. Poema(s) da Cabra João Cabral de Melo Neto Nas margens do Mediterrâneo não se vê um palmo de terra que a terra tivesse esquecido de fazer converter em pedra. Nas margens do Mediterrâneo Não se vê um palmo de pedra que a pedra tivesse esquecido de ocupar com sua fera. Ali, onde nenhuma linha pode lembrar, porque mais doce, o que até chega a parecer suave serra de uma foice,
  • 24. não se vê um palmo de terra por mais pedra ou fera que seja, que a cabra não tenha ocupado com sua planta fibrosa e negra. A cabra é negra. Mas seu negro não é o negro do ébano douto (que é quase azul) ou o negro rico do jacarandá (mais bem roxo). O negro da cabra é o negro do preto, do pobre, do pouco. Negro da poeira, que é cinzento. Negro da ferrugem, que é fosco. Negro do feio, às vezes branco. Ou o negro do pardo, que é pardo. disso que não chega a ter cor ou perdeu toda cor no gasto. É o negro da segunda classe. Do inferior (que é sempre opaco). Disso que não pode ter cor porque em negro sai mais barato. Se o negro quer dizer noturno o negro da cabra é solar. Não é o da cabra o negro noite. É o negro de sol. Luminar. Será o negro do queimado mais que o negro da escuridão. Negra é do sol que acumulou. É o negro mais bem do carvão. Não é o negro do macabro. Negro funeral. Nem do luto. Tampouco é o negro do mistério, de braços cruzados, eunuco. É mesmo o negro do carvão. O negro da hulha. Do coque. Negro que pode haver na pólvora: negro de vida, não de morte. O negro da cabra é o negro da natureza dela cabra. Mesmo dessa que não é negra, como a do Moxotó, que é clara. O negro é o duro que há no fundo da cabra. De seu natural. Tal no fundo da terra há pedra,
  • 25. no fundo da pedra, metal. O negro é o duro que há no fundo da natureza sem orvalho que é a da cabra, esse animal sem folhas, só raiz e talo, que é a da cabra, esse animal de alma-caroço, de alma córnea, sem moelas, úmidos, lábios, pão sem miolo, apenas côdea. Quem já encontrou uma cabra que tivesse ritmos domésticos? O grosso derrame do porco, da vaca, do sono e de tédio? Quem encontrou cabra que fosse animal de sociedade? Tal o cão, o gato, o cavalo, diletos do homem e da arte? A cabra guarda todo o arisco, rebelde, do animal selvagem, viva demais que é para ser animal dos de luxo ou pajem. Viva demais para não ser, quando colaboracionista, o reduzido irredutível, o inconformado conformista. A cabra é o melhor instrumento de verrumar a terra magra. Por dentro da serra e da seca não chega onde chega a cabra. Se a serra é terra, a cabra é pedra. Se a serra é pedra, é pedernal. Sua boca é sempre mais dura que a serra, não importa qual. A cabra tem o dente frio, a insolência do que mastiga. Por isso o homem vive da cabra mas sempre a vê como inimiga. Por isso quem vive da cabra e não é capaz do seu braço desconfia sempre da cabra: diz que tem parte com o Diabo
  • 26. Não é pelo vício da pedra, por preferir a pedra à folha. É que a cabra é expulsa do verde, trancada do lado de fora. A cabra é trancada por dentro. Condenada à caatinga seca. Liberta, no vasto sem nada, proibida, na verdura estreita. Leva no pescoço uma canga que a impede de furar as cercas. Leva os muros do próprio cárcere: prisioneira e carcereira. Liberdade de fome e sede da ambulante prisioneira. Não é que ela busque o difícil: é que a sabem capaz de pedra. A vida da cabra não deixa lazer para ser fina ou lírica (tal o urubu, que em doces linhas voa à procura da carniça). Vive a cabra contra a pendente, sem os êxtases das decidas. Viver para a cabra não é re-ruminar-se introspectiva. É, literalmente, cavar a vida sob a superfície, que a cabra, proibida de folhas, tem de desentranhar raízes. Eis porque é a cabra grosseira, de mãos ásperas, realista. Eis porque, mesmo ruminando, não é jamais contemplativa. O núcleo de cabra é visível por debaixo de muitas coisas. Com a natureza da cabra outras aprendem sua crosta. Um núcleo de cabra é visível em certos atributos roucos que têm as coisas obrigadas a fazer de seu corpo couro. A fazer de seu couro sola, a armar-se em couraças, escamas:
  • 27. como se dá com certas coisas e muitas condições humanas. Os jumentos são animais que muito aprenderam com a cabra. O nordestino, convivendo-a, fez-se de sua mesma casta. 9 O núcleo de cabra é visível debaixo do homem do Nordeste. Da cabra lhe vem o escarpado e o estofo nervudo que o enche. Se adivinha o núcleo de cabra no jeito de existir, Cardozo, que reponta sob seu gesto como esqueleto sob o corpo. E é outra ossatura mais forte que o esqueleto comum, de todos; debaixo do próprio esqueleto, no fundo centro de seus ossos. A cabra deu ao nordestino esse esqueleto mais de dentro: o aço do osso, que resiste quando o osso perde seu cimento. O Mediterrâneo é mar clássico, com águas de mármore azul. Em nada me lembra das águas sem marca do rio Pajeú. As ondas do Mediterrâneo estão no mármore traçadas. Nos rios do Sertão, se existe, a água corre despenteada. As margens do Mediterrâneo parecem deserto balcão. Deserto, mas de terras nobres não da piçarra do Sertão. Mas não minto o Mediterrâneo nem sua atmosfera maior descrevendo-lhe as cabras negras em termos da do Moxotó.
  • 28. MORTE E VIDA SEVERINA João Cabral de Melo Neto O RETIRANTE EXPLICA AO LEITOR QUEM É E A QUE VAI — O meu nome é Severino, como não tenho outro de pia. Como há muitos Severinos, que é santo de romaria, deram então de me chamar Severino de Maria como há muitos Severinos com mães chamadas Maria, fiquei sendo o da Maria do finado Zacarias. Mais isso ainda diz pouco: há muitos na freguesia, por causa de um coronel que se chamou Zacarias e que foi o mais antigo senhor desta sesmaria. Como então dizer quem falo ora a Vossas Senhorias? Vejamos: é o Severino da Maria do Zacarias, lá da serra da Costela, limites da Paraíba. Mas isso ainda diz pouco: se ao menos mais cinco havia com nome de Severino filhos de tantas Marias mulheres de outros tantos, já finados, Zacarias, vivendo na mesma serra magra e ossuda em que eu vivia. Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida: na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra, no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas e iguais também porque o sangue, que usamos tem pouca tinta.
  • 29. E se somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte severina: que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença é que a morte severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida). Somos muitos Severinos iguais em tudo e na sina: a de abrandar estas pedras suando-se muito em cima, a de tentar despertar terra sempre mais extinta, a de querer arrancar alguns roçado da cinza. Mas, para que me conheçam melhor Vossas Senhorias e melhor possam seguir a história de minha vida, passo a ser o Severino que em vossa presença emigra. ONDE SAIU O HOMEM, ANUNCIA-LHE O QUE SE VERÁ —— Compadre José, compadre, que na relva estais deitado: conversais e não sabeis que vosso filho é chegado? Estais aí conversando em vossa prosa entretida: não sabeis que vosso filho saltou para dentro da vida? Saltou para dento da vida ao dar o primeiro grito e estais aí conversando pois sabeis que ele é nascido.
  • 30. APARECEM E SE APROXIMAM DA CASA DO HOMEM VIZINHOS, AMIGOS, DUAS CIGANAS, ETC —— Todo o céu e a terra lhe cantam louvor. Foi por ele que a maré esta noite não baixou. —— Foi por ele que a maré fez parar o seu motor: a lama ficou coberta e o mau-cheiro não voou. —— E a alfazema do sargaço, ácida, desinfetante, veio varrer nossas ruas enviada do mar distante. —— E a língua seca de esponja que tem o vento terral veio enxugar a umidade do encharcado lamaçal. —— Todo o céu e a terra lhe cantam louvor e cada casa se torna num mocambo sedutor. —— Cada casebre se torna no mocambo modelar que tanto celebram os sociólogos do lugar. —— E a banda de maruins que toda noite se ouvia por causa dele, esta noite, creio que não irradia. —— E este rio de água, cega, ou baça, de comer terra, que jamais espelha o céu, hoje enfeitou-se de estrelas.
  • 31. COMEÇAM A CHEGAR PESSOAS TRAZENDO PRESENTES PARA O RECÉM-NASCIDO — Minha pobreza tal é que não trago presente grande: trago para a mãe caranguejos pescados por esses mangues mamando leite de lama conservará nosso sangue. —— Minha pobreza tal é que coisa alguma posso ofertar: somente o leite que tenho para meu filho amamentar aqui todos são irmãos, de leite, de lama, de ar. —— Minha pobreza tal é que não tenho presente melhor: trago este papel de jornal para lhe servir de cobertor cobrindo-se assim de letras vai um dia ser doutor. —— Minha pobreza tal é que não tenho presente caro: como não posso trazer um olho d'água de Lagoa do Cerro, trago aqui água de Olinda, água da bica do Rosário. —— Minha pobreza tal é que grande coisa não trago: trago este canário da terra que canta sorrindo e de estalo. —— Minha pobreza tal é que minha oferta não é rica: trago daquela bolacha d'água que só em Paudalho se fabrica. —— Minha pobreza tal é que melhor presente não tem: dou este boneco de barro de Severino de Tracunhaém. —— Minha pobreza tal é que pouco tenho o que dar: dou da pitu que o pintor Monteiro fabricava em Gravatá. —— Trago abacaxi de Goiana e de todo o Estado rolete de cana. —— Eis ostras chegadas agora, apanhadas no cais da Aurora.
  • 32. —— Eis tamarindos da Jaqueira e jaca da Tamarineira. —— Mangabas do Cajueiro e cajus da Mangabeira. —— Peixe pescado no Passarinho, carne de boi dos Peixinhos. —— Siris apanhados no lamaçal que já no avesso da rua Imperial. —— Mangas compradas nos quintais ricos do Espinheiro e dos Aflitos. —— Goiamuns dados pela gente pobre da Avenida Sul e da Avenida Norte. FALAM AS DUAS CIGANAS QUE HAVIAM APARECIDO COM OS VIZINHOS —— Atenção peço, senhores, para esta breve leitura: somos ciganas do Egito, lemos a sorte futura. Vou dizer todas as coisas que desde já posso ver na vida desse menino acabado de nascer: aprenderá a engatinhar por aí, com aratus, aprenderá a caminhar na lama, como goiamuns, e a correr o ensinarão o anfíbios caranguejos, pelo que será anfíbio como a gente daqui mesmo. Cedo aprenderá a caçar: primeiro, com as galinhas, que é catando pelo chão tudo o que cheira a comida depois, aprenderá com outras espécies de bichos: com os porcos nos monturos, com os cachorros no lixo. Vejo-o, uns anos mais tarde, na ilha do Maruim,
  • 33. vestido negro de lama, voltar de pescar siris e vejo-o, ainda maior, pelo imenso lamarão fazendo dos dedos iscas para pescar camarão. —— Atenção peço, senhores, também para minha leitura: também venho dos Egitos, vou completar a figura. Outras coisas que estou vendo é necessário que eu diga: não ficará a pescar de jereré toda a vida. Minha amiga se esqueceu de dizer todas as linhas não pensem que a vida dele há de ser sempre daninha. Enxergo daqui a planura que é a vida do homem de ofício, bem mais sadia que os mangues, tenha embora precipícios. Não o vejo dentro dos mangues, vejo-o dentro de uma fábrica: se está negro não é lama, é graxa de sua máquina, coisa mais limpa que a lama do pescador de maré que vemos aqui vestido de lama da cara ao pé. E mais: para que não pensem que em sua vida tudo é triste, vejo coisa que o trabalho talvez até lhe conquiste: que é mudar-se destes mangues daqui do Capibaribe para um mocambo melhor nos mangues do Beberibe.
  • 34. FALAM OS VIZINHOS, AMIGOS, PESSOAS QUE VIERAM COM PRESENTES, ETC —— De sua formosura já venho dizer: é um menino magro, de muito peso não é, mas tem o peso de homem, de obra de ventre de mulher. —— De sua formosura deixai-me que diga: é uma criança pálida, é uma criança franzina, mas tem a marca de homem, marca de humana oficina. —— Sua formosura deixai-me que cante: é um menino guenzo como todos os desses mangues, mas a máquina de homem já bate nele, incessante. —— Sua formosura eis aqui descrita: é uma criança pequena, enclenque e setemesinha, mas as mãos que criam coisas nas suas já se adivinha. —— De sua formosura deixai-me que diga: é belo como o coqueiro que vence a areia marinha. —— De sua formosura deixai-me que diga: belo como o avelós contra o Agreste de cinza. —— De sua formosura deixai-me que diga: belo como a palmatória na caatinga sem saliva. —— De sua formosura deixai-me que diga: é tão belo como um sim numa sala negativa.
  • 35. —— é tão belo como a soca que o canavial multiplica. —— Belo porque é uma porta abrindo-se em mais saídas. —— Belo como a última onda que o fim do mar sempre adia. —— é tão belo como as ondas em sua adição infinita. —— Belo porque tem do novo a surpresa e a alegria. —— Belo como a coisa nova na prateleira até então vazia. —— Como qualquer coisa nova inaugurando o seu dia. —— Ou como o caderno novo quando a gente o principia. —— E belo porque o novo todo o velho contagia. —— Belo porque corrompe com sangue novo a anemia. —— Infecciona a miséria com vida nova e sadia. —— Com oásis, o deserto, com ventos, a calmaria. O CARPINA FALA COM O RETIRANTE QUE ESTEVE DE FORA, SEM TOMAR PARTE DE NADA —— Severino, retirante, deixe agora que lhe diga: eu não sei bem a resposta da pergunta que fazia, se não vale mais saltar fora da ponte e da vida nem conheço essa resposta, se quer mesmo que lhe diga é difícil defender, só com palavras, a vida, ainda mais quando ela é esta que vê, severina
  • 36. mas se responder não pude à pergunta que fazia, ela, a vida, a respondeu com sua presença viva. E não há melhor resposta que o espetáculo da vida: vê-la desfiar seu fio, que também se chama vida, ver a fábrica que ela mesma, teimosamente, se fabrica, vê-la brotar como há pouco em nova vida explodida mesmo quando é assim pequena a explosão, como a ocorrida como a de há pouco, franzina mesmo quando é a explosão de uma vida severina. A um Bruxo, Com Amor Carlos Drummond Andrade Em certa casa da Rua Cosme Velho (que se abre no vazio) venho visitar-te; e me recebes na sala trajestada com simplicidade onde pensamentos idos e vividos perdem o amarelo de novo interrogando o céu e a noite. Outros leram da vida um capítulo, tu leste o livro inteiro. Daí esse cansaço nos gestos e, filtrada, uma luz que não vem de parte alguma pois todos os castiçais estão apagados. Contas a meia voz maneiras de amar e de compor os ministérios e deitá-los abaixo, entre malinas e bruxelas. Conheces a fundo a geologia moral dos Lobo Neves e essa espécie de olhos derramados que não foram feitos para ciumentos. E ficas mirando o ratinho meio cadáver com a polida, minuciosa curiosidade de quem saboreia por tabela o prazer de Fortunato, vivisseccionista amador. Olhas para a guerra, o murro, a facada como para uma simples quebra da monotonia universal e tens no rosto antigo
  • 37. uma expressão a que não acho nome certo (das sensações do mundo a mais sutil): volúpia do aborrecimento? ou, grande lascivo, do nada? O vento que rola do Silvestre leva o diálogo, e o mesmo som do relógio, lento, igual e seco, tal um pigarro que parece vir do tempo da Stoltz e do gabinete Paraná, mostra que os homens morreram. A terra está nua deles. Contudo, em longe recanto, a ramagem começa a sussurar alguma coisa que não se estende logo a parece a canção das manhãs novas. Bem a distingo, ronda clara: É Flora, com olhos dotados de um mover particular ente mavioso e pensativo; Marcela, a rir com expressão cândida (e outra coisa); Virgília, cujos olhos dão a sensação singular de luz úmida; Mariana, que os tem redondos e namorados; e Sancha, de olhos intimativos; e os grandes, de Capitu, abertos como a vaga do mar lá fora, o mar que fala a mesma linguagem obscura e nova de D. Severina e das chinelinhas de alcova de Conceição. A todas decifrastes íris e braços e delas disseste a razão última e refolhada moça, flor mulher flor canção de mulher nova... E ao pé dessa música dissimulas (ou insinuas, quem sabe) o turvo grunhir dos porcos, troça concentrada e filosófica entre loucos que riem de ser loucos e os que vão à Rua da Misericórdia e não a encontram. O eflúvio da manhã, quem o pede ao crepúsculo da tarde? Uma presença, o clarineta, vai pé ante pé procurar o remédio, mas haverá remédio para existir senão existir? E, para os dias mais ásperos, além da cocaína moral dos bons livros? Que crime cometemos além de viver e porventura o de amar não se sabe a quem, mas amar? Todos os cemitérios se parecem, e não pousas em nenhum deles, mas onde a dúvida apalpa o mármore da verdade, a descobrir a fenda necessária; onde o diabo joga dama com o destino,
  • 38. estás sempre aí, bruxo alusivo e zombeteiro, que resolves em mim tantos enigmas. Um som remoto e brando rompe em meio a embriões e ruínas, eternas exéquias e aleluias eternas, e chega ao despistamento de teu pencenê. O estribeiro Oblivion bate à porta e chama ao espetáculo promovido para divertir o planeta Saturno. Dás volta à chave, envolves-te na capa, e qual novo Ariel, sem mais resposta, sais pela janela, dissolves-te no ar. Caso do Vestido Carlos Drummond de Andrade Nossa mãe, o que é aquele vestido, naquele prego? Minhas filhas, é o vestido de uma dona que passou. Passou quando, nossa mãe? Era nossa conhecida? Minhas filhas, boca presa. Vosso pai evém chegando. Nossa mãe, dizei depressa que vestido é esse vestido. Minhas filhas, mas o corpo ficou frio e não o veste. O vestido, nesse prego, está morto, sossegado.
  • 39. Nossa mãe, esse vestido tanta renda, esse segredo! Minhas filhas, escutai palavras de minha boca. Era uma dona de longe, vosso pai enamorou-se. E ficou tão transtornado, se perdeu tanto de nós, se afastou de toda vida, se fechou, se devorou, chorou no prato de carne, bebeu, brigou, me bateu, me deixou com vosso berço, foi para a dona de longe, mas a dona não ligou. Em vão o pai implorou. Dava apólice, fazenda, dava carro, dava ouro, beberia seu sobejo, lamberia seu sapato. Mas a dona nem ligou. Então vosso pai, irado, me pediu que lhe pedisse, a essa dona tão perversa, que tivesse paciência e fosse dormir com ele... Nossa mãe, por que chorais? Nosso lenço vos cedemos. Minhas filhas, vosso pai chega ao pátio. Disfarcemos. Nossa mãe, não escutamos pisar de pé no degrau. Minhas filhas, procurei aquela mulher do demo.
  • 40. E lhe roguei que aplacasse de meu marido a vontade. Eu não amo teu marido, me falou ela se rindo. Mas posso ficar com ele se a senhora fizer gosto, só pra lhe satisfazer, não por mim, não quero homem. Olhei para vosso pai, os olhos dele pediam. Olhei para a dona ruim, os olhos dela gozavam. O seu vestido de renda, de colo mui devassado, mais mostrava que escondia as partes da pecadora. Eu fiz meu pelo-sinal, me curvei... disse que sim. Sai pensando na morte, mas a morte não chegava. Andei pelas cinco ruas, passei ponte, passei rio, visitei vossos parentes, não comia, não falava, tive uma febre terçã, mas a morte não chegava. Fiquei fora de perigo, fiquei de cabeça branca, perdi meus dentes, meus olhos, costurei, lavei, fiz doce, minhas mãos se escalavraram, meus anéis se dispersaram, minha corrente de ouro pagou conta de farmácia.
  • 41. Vosso pais sumiu no mundo. O mundo é grande e pequeno. Um dia a dona soberba me aparece já sem nada, pobre, desfeita, mofina, com sua trouxa na mão. Dona, me disse baixinho, não te dou vosso marido, que não sei onde ele anda. Mas te dou este vestido, última peça de luxo que guardei como lembrança daquele dia de cobra, da maior humilhação. Eu não tinha amor por ele, ao depois amor pegou. Mas então ele enjoado confessou que só gostava de mim como eu era dantes. Me joguei a suas plantas, fiz toda sorte de dengo, no chão rocei minha cara, me puxei pelos cabelos, me lancei na correnteza, me cortei de canivete, me atirei no sumidouro, bebi fel e gasolina, rezei duzentas novenas, dona, de nada valeu: vosso marido sumiu. Aqui trago minha roupa que recorda meu malfeito de ofender dona casada pisando no seu orgulho.
  • 42. Recebei esse vestido e me dai vosso perdão. Olhei para a cara dela, quede os olhos cintilantes? quede graça de sorriso, quede colo de camélia? quede aquela cinturinha delgada como jeitosa? quede pezinhos calçados com sandálias de cetim? Olhei muito para ela, boca não disse palavra. Peguei o vestido, pus nesse prego da parede. Ela se foi de mansinho e já na ponta da estrada vosso pai aparecia. Olhou pra mim em silêncio, mal reparou no vestido e disse apenas: — Mulher, põe mais um prato na mesa. Eu fiz, ele se assentou, comeu, limpou o suor, era sempre o mesmo homem, comia meio de lado e nem estava mais velho. O barulho da comida na boca, me acalentava, me dava uma grande paz, um sentimento esquisito de que tudo foi um sonho, vestido não há... nem nada. Minhas filhas, eis que ouço vosso pai subindo a escada.
  • 43. Texto extraído do livro "Nova Reunião - 19 Livros de Poesia", José Olympio Editora - 1985, pág. 157.