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CENTRO UNIVERSITÁRIO METODISTA, DO IPA
        CURSO DE JORNALISMO




            Arthur Machado




        O CASO IBSEN PINHEIRO:
      Um exemplo de mau jornalismo




            PORTO ALEGRE
                 2011
2



        ARTHUR MACHADO




     O CASO IBSEN PINHEIRO:
  Um exemplo de mau jornalismo




        Monografia apresentada como requisito parcial para
        a conclusão do curso e obtenção do título de
        bacharel em Comunicação Social, com habilitação
        em Jornalismo e ênfase em Gestão da
        Comunicação, do Centro Universitário Metodista, do
        IPA.




Orientadora: Profª. Ms.Luciana Kraemer




          PORTO ALEGRE
                2011
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         ARTHUR MACHADO




       O CASO IBSEN PINHEIRO
    Um exemplo de mau jornalismo


          Monografia apresentada como requisito parcial para
          a conclusão do curso e obtenção do título de
          bacharel em Comunicação Social, com habilitação
          em Jornalismo e ênfase em Gestão da
          Comunicação, do Centro Universitário Metodista, do
          IPA.




 Porto Alegre, ___ de ________ de 2011.




        BANCA EXAMINADORA:


Orientadora: Profª. Ms. Luciana Kraemer
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Dedico este trabalho à minha mãe, por ter me aguardado com comida
quentinha durante todos os dias de minha luta por esta graduação.
Aos meus amigos, pelo companheirismo e incentivo. E em especial à
minha irmã e madrinha Adriana Machado, dona de uma fonte
inesgotável de amor e dedicação, a quem atribuo todo o mérito por eu
ter chegado até aqui.
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                               AGRADECIMENTOS
       Em primeiro lugar a Deus, por não ter imputado a mim nenhuma limitação de
ordem física ou emocional, facilitando assim a busca de meus objetivos ao me
abençoar com uma saúde perfeita e uma família que sempre me proporcionou a
estrutura necessária para encarar todo e qualquer desafio.
       À minha irmã Adriana Machado, a quem atribuo todo o mérito por eu ter
chegado até aqui. Lembro como se fosse ontem da mão dela segurando a minha
nas consultas ao dentista, como a dizer: “Não tenha medo, mano. Estou aqui”. Ou
então das inspeções surpresas que ela fazia em meus cadernos, transformando
repentinamente meu estilo de vida irresponsável e despreocupado, a lá Zeca
Pagodinho (Deixa a Vida me Levar) e Martinho da Vila (Devagar, devagarinho), em
uma desgastante – mas sempre bem-aventurada – corrida contra o tempo para
obter a aprovação. Em suma, mais que uma irmã, mais que uma melhor amiga, mais
que um modelo de conduta, força, coragem e determinação que escolhi para me
espelhar, eu vejo nela uma mãe. Porque só mesmo o amor incondicional de uma
mãe para explicar toda a atenção, cuidado e afeto que ela sempre dispensou a mim.
Isso sem falar nos cinco longos anos de sacrifício financeiro, em que investiu boa
parte de seu salário de funcionária pública em minha formação.
       Agradeço também aos meus pais, Luiz Carlos Machado e Jurema Terezinha
Aguiar do Nascimento. O primeiro pelo legado de luta e honradez, que me orgulha e
encoraja a nunca baixar a guarda diante das intempéries da vida. E à minha mãe por
ter me proporcionado casa, comida, roupa lavada e um computador com internet,
estrutura indispensável para qualquer estudante.
        À Luciana Kraemer, professora que ganhou minha simpatia e admiração
desde seu ingresso no IPA, há três anos. Foi por enxergar nela uma amiga e uma
profissional de primeiro nível do jornalismo que a escolhi, já naquela época, para me
orientar nesta pesquisa. E se for verdade que o futuro reflete as escolhas que
fazemos, tenho certeza que uma caminhada de vôos ainda maiores me aguarda.
       Por fim, aos meus amigos, que são a família que Deus me confiou escolher.
E dentre eles, um agradecimento especial a Marluci Stein, colega das mais
competentes e amiga mais certa das horas incertas.
6




Às vezes, a única coisa verdadeira num jornal é a data.
                            (Luis Fernando Veríssimo)
7




                                    RESUMO




O presente estudo tem como objetivo principal analisar os procedimentos éticos
adotados pelos personagens envolvidos na redação e publicação da reportagem
‘Até tu, Ibsen?’, capa da edição n° 1314 da revista Veja, de 18 novembro de 1993. E
a partir de entrevistas e de uma coleta documental, a pesquisa busca também
desvendar as causas deste erro que ficou marcado, na visão de muitos
pesquisadores, como um dos maiores exemplos nacionais de irresponsabilidade da
imprensa. O modo como o Observatório da Imprensa tratou o assunto e se, de fato,
se enquadra como um veículo de regulação da mídia também são objetos
analisados no trabalho.



Palavras-chave: Ibsen Pinheiro – Veja – Istoé – Luis Costa Pinto – Observatório da
Imprensa – Sistemas de regulação da mídia
8



                                                      SUMÁRIO




INTRODUÇÃO ............................................................................................................9


1 REFERENCIAL TEÓRICO .....................................................................................13
1.1 O caso IBSEN .....................................................................................................13
1.2 O conceito de ética ..............................................................................................17
1.3 Sistemas de responsabilização da mídia ............................................................21
1.4 O Observatório da Imprensa ...............................................................................26


2 METODOLOGIA ....................................................................................................32
2.1 Erro do profissional .............................................................................................34
2.2 Responsabilidade da revista ...............................................................................37
2.3 Erro das fontes ....................................................................................................39
2.4 Erro da imprensa .................................................................................................39


CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................42


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .........................................................................45


ANEXOS ...................................................................................................................46
9



INTRODUÇÃO

        A imagem de um grupo de moleques revoltados, batendo com as mãos nas
janelas e chutando a porta da casa de meu pai é parte de um episódio doloroso e
constrangedor de minha infância, que até hoje recordo com tristeza. Eu deveria ter
uns 10, 12 anos no máximo. Jogava futebol com um amigo na cancha do
condomínio em que meu pai morava quando fui surpreendido pela chegada
gradativa destes garotos, todos eles moradores do condomínio. Garotos e garotas
que poderiam muito bem ser meus amigos, não fosse minha timidez e personalidade
introvertida. Eles iam chegando e repercutindo entre si sobre uma matéria publicada
pelo jornal Zero Hora - cujo conteúdo eu não lembro com clareza - mas que
denunciava o envolvimento do ex-vereador Luiz Machado com algum esquema de
desvio de dinheiro público.
        Mesmo eu alegando que aquilo não era verdade, que foi um erro (a foto da
matéria era de outro Luiz Machado, que não era nem nunca havia sido vereador),
acabei percebendo pela ira deles que não havia espaço para reparação: o estrago já
estava feito e só o que me restava era assistir a incineração em praça pública de
meu próprio pai. Corridos pelas britas que arremessavam contra nós, meu amigo e
eu buscamos refúgio na casa de meu pai, que não estava em casa. O que não foi
suficiente para abrandar o ataque, já que nossos algozes para lá se dirigiram aos
gritos de “ladrão” e “corrupto”. Após ganhar um processo que moveu contra o jornal,
meu pai foi indenizado e recebeu um box de cinco linhas onde Zero Hora reconhecia
o erro e se desculpava pela injustiça cometida.
        Foi fundamentalmente por causa desse episódio, que tão negativamente
marcou a minha infância, que optei por estudar um caso parecido: o do ex-deputado
Ibsen Pinheiro. Pertencer à categoria responsável pelo erro que um dia vitimou meu
pai e que talvez tenha sido a principal responsável pela formação de uma opinião
pública contrária a Ibsen também foi um elemento decisivo para escolha. Por
comungar da tese de que sábio é aquele que aprende com os erros alheios,
pretendo retirar deste estudo expertise suficiente para jamais arranhar a honra ou
levar sofrimento à família de uma pessoa inocente com o meu trabalho. Pois, como
bem alerta a sabedoria popular, a palavra pronunciada é uma das três únicas coisas
na vida para as quais não existe volta ou reparação.
10



       Em matéria de capa da edição 1.314, de 17 de novembro de 1993, Veja
acusa o então deputado e ex-presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro, de
envolvimento com a Máfia dos Anões do Orçamento. Dizia o texto da reportagem
que a CPI do Orçamento teria descoberto que, entre 1989 e 1993, o político recebeu
depósitos bancários superiores a um milhão de dólares. A soma, considerada
incompatível com os vencimentos de um deputado, resultou na associação de Ibsen
a um esquema mafioso, bem como em seu indiciamento. Seis meses depois, em
maio de 1994, Ibsen Pinheiro teve o mandato cassado e os direitos políticos
suspensos por oito anos.
       No entanto, os valores divulgados pela matéria de Veja não correspondiam à
verdade. A própria revista tratou de reparar o erro na edição seguinte, informando
que a CPI havia se enganado nos cálculos. De acordo com a matéria intitulada “Um
milhão de dificuldades”, a subcomissão bancária da CPI “confundiu depósitos novos
com transferências de uma conta para outra, ou aplicações financeiras” (Veja, 1993).
Em síntese, o um milhão de dólares inexplicado, informado com grande destaque na
edição anterior, tendo inclusive ganho a capa da revista, em uma semana se
transformou em 230 mil dólares. Só que a admissão do erro rendeu uma página,
enquanto a denúncia foi repercutida em seis.
       A responsabilidade pelo desfecho do caso Ibsen, um dos episódios
jornalísticos mais irresponsáveis do país, na visão de inúmeros pesquisadores, veio
à tona em agosto de 2004. Foi quando a concorrente, Istoé, teve acesso e tornou
público o conteúdo de um depoimento redigido pelo próprio autor da reportagem de
Veja para um livro que Ibsen Pinheiro, o alvo das acusações, estava escrevendo. No
documento, Luis Costa Pinto revela os bastidores da reportagem e conta que o erro
nos cálculos foi identificado com antecedência pela revista. Só que em vez de
corrigir o texto ou suspender a edição, a chefia de Veja teria, de acordo com Costa
Pinto, o induzido a encontrar uma fonte que sustentasse o um milhão. “Não pensei
em Ibsen Pinheiro ou na injustiça que estava ajudando a dar curso com aquela
reportagem calçada em uma falsa prova. Pensei em mim, no meu emprego, em
como salvar uma reportagem fadada a produzir uma tragédia”, (Istoé, 2004).
       Para Martins (2005), no exercício da profissão, o jornalista deve responder a
uma série de lealdades, sendo a lealdade à sociedade a mais importante delas. Ou
seja, o compromisso com o direito da sociedade de ser bem informada é soberano e
inviolável, mesmo que venha a conflitar com a lealdade ao chefe, à empresa, aos
11



colegas e até mesmo contra o próprio interesse do profissional de ascender na
carreira. De modo que se um jornalista for orientado pelo superior a omitir ou
adulterar alguma informação, como alega Costa Pinto em seu depoimento, a
lealdade a chefia deve ser desconsiderada de imediato em nome de seu
compromisso absoluto. Isso porque o jornalismo, conforme destaca Martins (2005),
só se justifica como missão, que é a de informar a sociedade para que a mesma,
bem informada, tenha condições de decidir da melhor maneira possível.
        E no caso de protagonizar a divulgação de alguma notícia equivocada, que
não condiga com a verdade, o jornalista deve assumir o erro publicamente, o mais
rápido possível. O que foi feito parcial e veladamente pela revista Veja, que na
edição posterior à da denúncia publicou matéria onde comunicava o erro, mas o
atribuía única e tão somente à CPI, eximindo-se de qualquer culpa por um deslize
que pautou os principais jornais do país por quase uma semana.
        E é com base nestas colocações e aspectos que esta pesquisa surge, quase
20 anos depois do episódio, com o objetivo geral de entender os procedimentos
éticos envolvidos neste caso, tendo em vista que a Veja é a revista de maior
circulação nacional e a quarta com maior tiragem no mundo. Para atingir o objetivo
descrito, optou-se por analisar o fato a partir do site Observatório da Imprensa. O
veículo foi escolhido devido a sua proposta democrática de funcionar como fórum
permanente de debate e análise crítica acerca do desempenho da mídia, onde é
assegurado a todos, jornalistas ou não, o direito de manifestação e participação
ativa sobre o produto jornalístico. E foi por ter esta característica que se optou por
fazer dele o principal campo de coleta da pesquisa.
        Então, a partir da coleta de documentos e textos publicados no
Observatório da Imprensa, temos como objetivos específicos identificar os erros
jornalísticos apontados pelos artigos, bem como a identidade dos jornalistas que os
escreveram. Também se analisa como o próprio Observatório da Imprensa se
posicionou sobre o tema.
        Sendo assim, a pesquisa tem a intenção de responder a seguinte questão:
de que forma o erro ganhou visibilidade e como o mesmo foi analisado no âmbito
dos jornalistas? Partiu-se da hipótese que o erro está mais relacionado à imperícia
do profissional do que a questões associadas a pressões do veículo ou do mercado.
        A pesquisa foi feita em duas etapas, sendo a primeira delas dividida em três
momentos. No capítulo 1.1 é apresentado um resumo da matéria “Até tu, Ibsen?”,
12



referente à edição n° 1.314 da revista Veja, de 17 de novembro de 1993. Também é
abordado o depoimento de Luis Costa Pinto, no qual a revista Istoé se apoiou para
denunciar o erro da concorrente por meio da reportagem “Massacrado”, capa da
edição n° 1.819, de 18 de agosto de 2004. Os autores que orientam esse primeiro
momento são Pena (2005) e Dines (2004).
        No capítulo 1.2 é apresentado o conceito de ética e os compromissos,
deveres e responsabilidades que um jornalista deve atender no exercício da
profissão. Os autores consultados foram Bucci (2000), Abramo (1997), Martins
(2005), Argolo (2002), Sodré (2002) e Vásquez (2003).
        Já no capítulo 1.3 o assunto versa sobre sistemas de regulação da mídia. Os
diversos tipos de meios possíveis de análise crítica sobre os serviços prestados
pelos veículos de comunicação de massa e a importância dos mesmos para a
sociedade são abordados em contraposição com os entraves que impedem o
público consumidor de informação de exercer influência sobre os mesmos. Os
autores que orientam esse capítulo são Christofoletti (2003) e Bertrand (2002).
        A primeira etapa da pesquisa é encerrada com o capítulo 1.4, onde o site do
Observatório da Imprensa é apresentado como um exemplo de sistema regulador
de mídia. O modo de atuação do veículo também é apresentado, com base em
estudos feitos por Albuquerque (2001) e Braga (2006).
        A segunda etapa consiste na análise do objeto de pesquisa, que são os
artigos publicados pelo Observatório da Imprensa que repercutem o tema.
Primeiramente, apresenta-se a metodologia empregada para a análise e o modo
como   foram   coletados   os   materiais.   Em   seguida    busca-se   relacionar   a
fundamentação teórica e os dados coletados. Por fim, são apresentadas as
considerações finais e a resposta do problema de pesquisa.
13



1 REFERENCIAL TEÓRICO




1.1 O CASO IBSEN



       Passados quase 20 anos, a edição da revista Veja de 17 de novembro de
1993 continua sendo peça de análise para estudantes e teóricos em comunicação. A
reportagem de capa representa, para muitos pesquisadores, um dos principais
exemplos nacionais de prejuízos irreversíveis que o mau jornalismo pode acarretar à
reputação dos envolvidos e à imagem do próprio ofício jornalístico, que tem na
credibilidade sua principal matéria prima. Por meio da manchete “Até tu, Ibsen?”
estampada na capa acima do ombro esquerdo do ex-deputado federal Ibsen
Pinheiro, a revista levanta suspeita de corrupção sobre o político que presidiu a
Câmara Federal no biênio 91/92 em meio ao processo de impeachment do ex-
presidente Fernando Collor. E debaixo da imagem de um Ibsen denotando aparente
tensão, como se estivesse acuado, a revista complementa a chamada com o
subtítulo “Um baluarte do Congresso naufraga em dólares suspeitos” em grifo.
       Produzida pelo então repórter Luís Costa Pinto, a reportagem acusa Ibsen
de enriquecimento ilícito por meio da “Máfia dos Anões do Orçamento”, nome dado a
um grupo de deputados federais – que tinha a baixa estatura como ponto em comum
– que desviava verbas do orçamento da União entre o final dos anos 1980 e o
começo dos anos 1990. O esquema foi descoberto em outubro de 1993 e era
supostamente liderado pelo então deputado baiano João Alves de Almeida, falecido
em 2004.
       Principal reportagem da edição 1.314 de Veja, o caso começa a ser relatado
na página 30, sob o título “Uma estrela na lama”, seguido de três linhas de apoio que
anunciavam: “A CPI descobre que o deputado Ibsen Pinheiro movimentou 1 milhão
de dólares em suas contas e derruba um símbolo do Legislativo”. Sentenças que
parecem ter sido escolhidas a dedo, tamanha a precisão dos significados que
refletiam. O que de acordo com Pena (2005, p.4), não deixava espaço para dúvidas:
Ibsen era realmente culpado. “Não é preciso uma análise semântica mais profunda
para verificar o tom condenatório da reportagem. As palavras escolhidas são
suficientemente conclusivas”.
14



       Só que segundo uma entrevista de Luis Costa Pinto, publicada pela revista
ISTOÉ em 18 de agosto de 2004, a edição 1.314 de Veja não previa a denúncia.
Costa Pinto conta que o que estava originalmente previsto era a repercussão de dois
documentos surgidos durante os trabalhos da CPI dos Anões do Orçamento e que
associavam Ibsen Pinheiro com alguns dos integrantes do esquema. A matéria
naturalmente seria mais branda do que a que acabou chegando às bancas, já que o
material reunido não mostraria nada além de uma boa relação de Ibsen com alguns
dos deputados investigados na CPI. Falamos aqui de um cheque depositado pelo
deputado Genebaldo Correia na conta de Ibsen (cuja assessoria parlamentar
comprovou ser referente à venda de uma caminhonete) e de uma foto tirada durante
um jantar em uma ilha grega, na qual Ibsen aparece acompanhado da esposa e de
cinco dos sete acusados, que também aparecem acompanhados de suas
respectivas cônjuges. Algo complicado de se entender sob a ótica da ética, mas
natural num meio repleto de interesses como é a política.
       Só que um telefonema de Waldomiro Diniz ao repórter Luis Costa Pinto
acabou provocando uma reviravolta no assunto. Funcionário da Subcomissão de
Investigação Bancária da CPI do Orçamento, Diniz teria dito ao repórter que detinha
informações bombásticas e que estava a caminho da sucursal brasiliense de Veja
para encontrá-lo. Na entrevista, Luis Costa Pinto revelou ainda que “os trabalhos de
encerramento da edição estavam avançados” e que se encontrava dedicado à
construção de “um texto de capa sem maiores novidades ou revelações sobre os
trabalhos da CPI”. “Dali a duas horas, no máximo três horas, a edição de Veja teria
de baixar para a gráfica da Editora Abril, em São Paulo”, complementa. O que
significa dizer que o texto da reportagem que acabou chegando às bancas, o qual
segundo Pena (2005) exprimia um tom condenatório e conclusivo, foi elaborado em
poucas horas.
       Braço direito dos então deputados petistas José Dirceu e Aloizio Mercadante
naquelas investigações, Diniz chegou ao escritório de Veja em Brasília munido de
sete boletos bancários e, conforme o relato de Costa Pinto, com um sorriso triunfal
assegurava que os mesmos representavam a prova cabal do envolvimento de Ibsen
com a Máfia dos Anões do Orçamento. “Maravilhado com a possibilidade de cravar
um furo na edição de Veja do fim de semana seguinte”, o repórter se deixou levar
pela versão que lhe foi apresentada e, sem nem mesmo apurar a veracidade do que
acabara de receber, comunicou os editores da matriz de Veja, em São Paulo, de
15



que estaria mudando o tom da reportagem, passando “a ser mais afirmativo contra
Ibsen”.
          E o primeiro movimento após avisar a revista com relação à reversão da
pauta foi ligar para o ex-presidente da Câmara, que desmentiu toda a história. A
negativa, entretanto, não foi suficiente para demovê-lo da intenção de divulgar as
supostas provas já naquela edição. De modo que optou por acreditar no material
que tinha em mãos e escrever a matéria, enviando-a algumas horas depois para
São Paulo juntamente com os documentos bancários que havia recebido das mãos
de Waldomiro Diniz.
          Costa Pinto conta que depois disso foi para casa, onde chegou próximo às
duas horas da manhã de sábado, e que fora acordado pouco antes das 8h por
Silvânia Dal Bosco, sua colega de redação. Ela trazia um recado do então editor-
executivo da revista, Paulo Moreira Leite, de que havia ocorrido um grave problema.
Nesse momento Costa Pinto teria ligado para o editor-executivo e sido informado por
ele de que Adam Sun, então chefe da equipe de checagem da revista, havia
descoberto que a dolarização (o valor dos boletos apresentados por Diniz já veio
dolarizado) não batia: “Lula (apelido de Costa Pinto), essa soma não dá US$ 1
milhão. Dá US$ 1 mil”, teria dito Adam Sun.
          Foi então que, orientado pelo editor-executivo, que já havia mandado
imprimir 1,2 milhão de capas da revista, correu atrás de alguém que sustentasse a
falsa dolarização de um milhão. De posse de apenas 10 minutos para resolver o
problema, Costa Pinto confessa que só pensava em salvar a própria pele.
                      Não pensei em Ibsen Pinheiro ou na injustiça que estava ajudando a dar
                      curso com aquela reportagem calçada em uma falsa prova. Pensei em mim,
                      no meu emprego, em como salvar uma reportagem fadada a produzir uma
                      tragédia. Telefonei para o presidente da CPI do PC, o então deputado
                      Benito Gama, e consegui pegá-lo acordado àquela hora. Narrei-lhe o
                      ocorrido. Ele tinha conhecimento da versão acerca dos tais depósitos de
                      US$ 1 milhão. “Não há chance de isso estar errado. É US$ 1 milhão e Ibsen
                      terá de responder por isso”, asseverou Benito. “Deputado, isso é on (ou
                      seja, no jargão jornalístico, eu perguntava se a informação podia ser
                      publicada assinalando-se a sua origem)? Olhe que a reportagem de Veja,
                      que está errada, vai se escudar nesse on seu”, perguntei mais uma vez. “É
                      on. Agora, deixe-me fazer o meu cooper”, tranquilizou-me Benito. Passei a
                      frase por telefone a Paulo Moreira, que mexeu na edição da revista, e a
                      Veja circulou com o libelo acusatório contra Ibsen. (ISTOÉ, 2004)


          De acordo com a versão de Costa Pinto, foi dessa maneira que a revista foi
parar nas bancas de todo o país, transmitindo ao público certezas das quais nem o
próprio autor da reportagem as possuía. Não obstante, o assunto pautou os jornais
16



de todo o país por dois dias, arrastando o alvo das acusações definitivamente para o
fundo de um buraco do qual não conseguiu mais sair.
       Segundo Costa Pinto, uma empresa de auditoria teria sido contratada por
Ibsen Pinheiro para esquadrinhar todos os registros de entradas e saídas de suas
contas bancárias nos últimos cinco anos. Nenhuma movimentação anormal foi
encontrada, mas a CPI se negou a levar em conta os resultados, alegando que não
havia fiscalizado o processo. E foi assim que, seis meses depois da divulgação da
matéria, Ibsen Pinheiro teve seu mandato cassado pelo voto de 296 deputados,
durante sessão plenária ocorrida no dia 18 de maio de 1994. Na ocasião, 139
parlamentares votaram contra a cassação do mandato.
       Os onze anos que Costa Pinto levou para se retratar, a existência de
diversas versões sobre o caso e o fato do mesmo ter abandonado a reportagem,
passando a dedicar-se a atividades ligadas à política, são elementos que intrigam
Pena (2005). Porém, para o autor do artigo “No jornalismo não há fibrose: a ruína
das fontes, o denuncismo e a opinião pública”, não restam dúvidas de que, nessa
bagunça toda, o maior prejudicado foi o ex-presidente da Câmara Federal.
                     Tudo é, no mínimo, muito estranho, mas o fato concreto é que o deputado
                     Ibsen Pinheiro foi o verdadeiro prejudicado. [...] ele jamais irá recuperar o
                     momento político que vivia na época, quando era um dos mais fortes
                     candidatos à presidência da república. Sua carreira foi interrompida por
                     erros da imprensa, e não há como retomá-la. [...] Para muitos dos que
                     tomaram conhecimento da retratação, ainda há dúvidas sobre sua
                     inocência. Como disse, em jornalismo não há fibrose, pois as feridas
                     abertas pela difamação jamais cicatrizam. (PENA, 2005, p.4)


       Quem também se manifestou sobre a revelação do repórter Luis Costa Pinto
foi Alberto Dines (2004). Por meio do artigo “Por que o remorso demorou tanto”,
divulgado pelo site Observatório da Imprensa, o autor classifica o ocorrido como
“um dos maiores libelos contra os procedimentos irresponsáveis da nossa imprensa
nos idos de 1992/93” e avalia que a colocação de três zeros a mais nas contas de
Ibsen representou um dos maiores vexames da história do jornalismo: “O ridículo
erro de aritmética produziu um vergonhoso linchamento midiático que um Legislativo
irresponsável e suas espertas raposas converteram em clamorosa injustiça”.
       Em seu artigo, Dines (2004) também condena a demora de Costa Pinto em
reparar o erro e lembra que, quatro anos antes, dedicou um programa televisivo do
Observatório da Imprensa ao desvendamento de todas “as maquinações e
mutretas” de que Ibsen Pinheiro pudesse ter sido vítima.
17



                    Onde estava o repórter Luís Costa Pinto, que naquele momento deixou
                    escapar a magnífica oportunidade para uma reabilitação do acusado e
                    manteve-se em silêncio nos dias seguintes? Onde estavam as grandes
                    estrelas do jornalismo investigativo que não se sensibilizaram com a tocante
                    manifestação de inocência num programa de uma hora, ao vivo, em rede
                    nacional? E onde estava Fenaj há tantos anos preocupada – como afirma –
                    com a ética profissional e o combate aos abusos? (DINES, 2004, OI)
       A incapacidade da imprensa de resgatar o caso e avançar nos
desdobramentos, de modo a restabelecer toda a verdade também foi atacada por
Dines (2004).
                    Em fevereiro deste ano, quando apareceu no noticiário o nome de
                    Waldomiro Diniz falou-se muito no seu papel como abastecedor dos então
                    deputados Aloízio Mercadante e José Dirceu nas investigações da CPI do
                    Orçamento – a mesma que levou à cassação do ex-presidente da Câmara
                    dos Deputados. Ninguém se lembrou do seu papel como veiculador da
                    calúnia contra Ibsen Pinheiro relativa à transferência de 1 milhão de dólares
                    de uma conta para outra. Amnésia. (DINES, 2004, OI)



1.2 O CONCEITO DE ÉTICA

       De acordo com Vásquez (2003), a ética é um campo específico da ciência
cujo objetivo é o estudo da moral dos homens em sociedade. Em outras palavras,
sua função é investigar uma determinada experiência humana referente à moral, a
fim de compreendê-la e explicá-la: “estuda uma forma de comportamento humano
que os homens julgam valioso e [...] deve fornecer a compreensão de um aspecto
real, efetivo, do comportamento dos homens”. (VÁSQUEZ, 2003, p.3)
       À ética não devem ser atribuídas às normas, regras e princípios que regem o
comportamento humano em sociedade, já que as mesmas, conforme o autor, foram
constituídas ao longo do tempo de acordo com os valores morais de cada povo. Ou
seja, sua pretensão não é estabelecer, confrontar, corrigir ou agregar novas normas
ou valores, mas sim proporcionar, por meio do resultado de seus estudos,
“conhecimentos sistemáticos, metódicos e, no limite do possível, comprováveis”
sobre um determinado problema moral. (Vásquez, 2003, p.3) Sendo assim, não se
pode confundir a ética com seu objeto de estudo: a moral.
       No entanto, na medida em que exprime conhecimento científico sobre os
efeitos que determinados atos provocam sobre outros indivíduos, determinados
grupos sociais ou até mesmo à sociedade como um todo, o resultado dos estudos
éticos podem acarretar em transformações, fazendo com que os indivíduos
modifiquem sua maneira de ser e/ou agir.
18



       E partindo do pressuposto de que a ética não define o comportamento
adequado para cada situação, pode-se aferir que a cartilha de regras, normas e
princípios que guiam as atividades profissionais das mais diversas categorias foram
constituídas ao longo do tempo, a fim de auxiliar seus filiados sobre como agir de
modo moralmente satisfatório à luz das mais diversas situações. Os jornalistas, por
exemplo, possuem um código que os alertam com relação a direitos, deveres e
responsabilidades de sua função.
       Todavia, há quem julgue desnecessário a definição de uma conduta
específica para cada profissão. É o caso de Abramo (1997), que acredita não ser
possível separar a conduta profissional da cidadã.
                     Onde entra a ética. O que o jornalista não deve fazer que o cidadão comum
                     não deva fazer? O cidadão não pode trair a palavra dada, não pode abusar
                     da confiança do outro, não pode mentir. No jornalismo, o limite entre o
                     profissional como cidadão e como trabalhador é o mesmo que existe em
                     qualquer outra profissão. É preciso ter opinião para poder fazer opções e
                     olhar o mundo da maneira que escolhemos. Se nos eximimos disso,
                     perdemos o senso crítico para julgar qualquer outra coisa. O jornalista não
                     tem ética própria. Isso é um mito. A ética do jornalista é a ética do cidadão.
                     O que é ruim para o cidadão é ruim para o jornalista. (ABRAMO, 1997,
                     p.109)


       Bucci (2000, p.206), entretanto, pensa diferente. Para o autor, os códigos
“anunciam para a sociedade que seus signatários firmam o propósito de observar,
para benefício dessa mesma sociedade, aquele conjunto de princípios, valores e
padrões de conduta”. Porém, observa que a simples exposição desses códigos ou a
ausência dos mesmos é insuficiente para assegurar a lisura ou a desonra do fazer
jornalístico numa empresa.
                     [...] Há ambientes profissionais onde nada está escrito e, não obstante, os
                     melhores valores do jornalismo são vivamente cultivados, cimentando a
                     cultura dos que ali trabalham. Códigos não fabricam bom jornalismo. Ao
                     contrário, com incômoda freqüência, são brandidos para encobrir mau
                     jornalismo. O ponto é outro: os que comandam [...] devem incluir no seu rol
                     de afazeres a formação ética permanente dos jornalistas, dando-lhes
                     retorno transparente sobre cada decisão ética e promovendo debates
                     periódicos sobre o tema, o que inclui a recomendação de leituras e o apoio
                     a cursos de aperfeiçoamento aos que têm interesse em se aprofundar.
                     (BUCCI, 2000, P.207)


       É que para Bucci (2000), mais importante que um código na parede é o
exemplo que os mandarins das redações deixam para os mais novos. Ou seja, se a
conduta dos superiores for exemplar, a tendência é que os subordinados valorizem o
código e procurem seguir o mesmo caminho dos chefes. Além disso, o autor diz que
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é preciso estimular o cumprimento das normas com discussões sadias, tornando o
tema uma cultura do local:
                     Isso pode ser estimulado pelos chefes, na prática, com base nos casos que
                     se apresentam no dia-a-dia em cada editoria ou em cada revista da
                     empresa. Além do quê, é preciso explicá-las com calma aos recém
                     contratados, e, de tempos em tempos, vale a pena revisá-las e atualizá-las
                     com a participação do maior número possível de jornalistas. Só assim elas
                     se tornam letras vivas do fazer jornalístico. (BUCCI, 2000, p.205)


        Com uma posição semelhante a de Abramo (1997) sobre a ética, Martins
(2005) também afirma não acreditar em tipos diferentes de ética. Em outras
palavras, o autor acredita que o indivíduo tende a reproduzir o mesmo padrão de
conduta ética, seja este bom ou ruim, nas diferentes áreas da vida. “Será possível
que um sujeito seja modelo de comportamento na redação e, em casa, espanque a
mulher e deixe os filhos largados ou, por onde passe, dê trambiques?” (2005, p.30),
questiona ele.
        O que muda, segundo o Martins (2005), é o contexto de situações de risco e
tentações comuns a esta ou aquela categoria e que podem, se não advertidas, ir
corrompendo gradativamente a índole do profissional. “Ninguém se torna venal da
noite para o dia”, afirma Martins (2005, p.31). Neste sentido os códigos são
essenciais para o autor, uma vez que atuam como uma espécie de bússola,
orientando o profissional sobre o caminho correto a seguir.
                     O jornalista não chega à redação uma tarde disposto a tornar-se uma pena
                     de aluguel, e então se vende. Geralmente, vai baixando a guarda aos
                     poucos. Um dia, faz uma pequena concessão; dias depois, cede um pouco
                     mais; semanas mais tarde, enfia o pé na lama; anos depois, está metido até
                     o pescoço no que não devia. Cada passo em falso vai minando as defesas
                     do organismo aos ataques da pilantragem até que um dia as resistências
                     simplesmente desapareceram – e o sujeito, então, atravessa o Rubicão.
                     (MARTINS, 2005, p.31/32)


        Se agir com ética é agir de acordo com as normas e princípios morais de
determinada sociedade, pode-se deduzir que a ética só pode ser alcançada com
lealdade nas relações. E no jornalismo, de acordo com Martins (2005), há uma série
de lealdades que o jornalista deve levar em conta, sendo a lealdade à sociedade a
mais importante delas. No caso de situações de conflito, o autor recomenda que o
repórter reflita atentamente sobre sua primeira lealdade, além de recorrer a um
código de ética não-escrito sempre que necessário.
                     Jornalistas seguem códigos de ética escritos, o da Federação Nacional dos
                     Jornalistas e o das empresas onde trabalham, e um código de ética não-
                     escrito, o da Rádio Corredor. Todos são bons: os primeiros [...] porque dão
                     parâmetros e, às vezes, desculpas para driblar situações ambíguas; o
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                      último, porque dá conselhos. Assim, quando estiver em dúvida, converse
                      com pessoas cujo julgamento você respeite. Geralmente, essa troca é muito
                      rica. Não sendo formal, ela tende a descer mais fundo no problema do que
                      os códigos e a enfrentá-lo com uma ferramenta talhada para nuances: o
                      bom senso coletivo da nossa categoria. (MARTINS, 2005, p. 35)


        De acordo com o artigo segundo do Código de Ética dos Jornalistas,
publicado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), a divulgação de
informações    precisas     é    dever      dos     meios      de    comunicação         pública,
independentemente da natureza de sua propriedade. Porém, notícias equivocadas
são divulgadas ao público com desalentadora freqüência, falhas que segundo
Martins (2005) derivam do pouco tempo de que dispõe os jornalistas para apurar as
informações. Mas quando elas ocorrerem, devem ser imediatamente reconhecidas
pelo repórter junto ao público leitor. “Lembre-se de sua primeira lealdade” (2005,
p.43), adverte o autor.
                      Reconhecer um erro não diminui ninguém. Ao contrário, dentro de
                      determinados limites, reforça a credibilidade do profissional. O público sabe
                      que os jornais erram e confia mais no jornal que admite sem subterfúgios
                      suas falhas do que naquele que tenta varrê-las para debaixo do tapete. É
                      claro que se os erros virarem notícia, não há credibilidade que resista.
                      (MARTINS, 2005, p. 43)


        Em entrevista concedida a Argolo (2002), Alberto Dines, um dos mais
conceituados jornalistas do país, refere que o problema envolvendo os equívocos
cometidos pela imprensa na divulgação das informações vai além do tempo. De
acordo com ele, o problema deve ser creditado principalmente à latente insegurança
de editores e diretores.
                      À primeira acusação publicada por um veículo – qualquer veículo,
                      responsável ou não – correm todos na sua esteira, sem investigar ou sequer
                      contraditar. Há um medo de levar bronca do departamento de circulação
                      porque o concorrente está explorando determinada questão e ganhando
                      muita exposição. (ARGOLO, 2002, p. 14)


        Sobre o conjunto de regras que visa à padronização da conduta profissional
de membros de uma determinada categoria Dines é favorável, sugerindo inclusive a
criação de disciplinas que familiarizem os profissionais com estas normas ainda
durante a formação. Porém, por ser a ética uma porção da Filosofia e da Moral, o
autor julga como indevido o emprego da palavra para nominá-los. “Ética situa-se
numa esfera superior e íntima, obviamente mais abrangente e muito mais
complexa”. (ARGOLO, 2002, p. 15)
21



        Questionado por Argolo (2002) sobre o que pensa a respeito da presença
cada vez maior de advogados dentro das redações, Dines condenou a política
adotada pelos grandes veículos de atribuir a estes a decisão sobre o que pode ou
não ser publicado. Mesmo que a idéia por trás da mudança seja a redução de ações
indenizatórias, o autor entende que os advogados não podem exercer um poder que
historicamente   sempre    coube     aos    jornalistas.    A   natureza      antagônica      do
compromisso de cada profissional é usada para justificar o ponto de vista.
                     Advogado não é jornalista, advogado advoga a causa dos clientes, [...]
                     mesmo que confronte aspectos morais ou éticos. Já o cliente do jornalista é
                     [...] o cidadão que precisa ser informado com isenção. O jornalista advoga o
                     interesse público. Se transferimos para os advogados o poder de decidir o
                     que é certo publicar, tiramos do jornalista o livre arbítrio e, com isso,
                     esvaziamos completamente o seu senso de responsabilidade, seus dilemas
                     éticos e morais, sua atenção ao código deontológico. É óbvio que se pode
                     pedir aconselhamento a bacharéis ou juristas sobre determinada
                     publicação. Mas quem deve dar a palavra final é o jornalista. (ARGOLO,
                     2002, p. 21)


        A restrição da alçada de atuação dos jornalistas dentro das redações, que
gradativamente vem perdendo para advogados o poder de decidir sobre o que pode
ou não pode ser publicado, pode ser atribuída a mercantilização da mídia
contemporânea. A hipótese surge na esteira da opinião de Sodré (2002), que
classifica a moral da mídia como “utilitarista” e “mercadológica”. O autor entende que
o interesse público foi contaminado pelo capital financeiro e que está desaparecendo
do horizonte ético das redações. E que diante desta realidade, os códigos
deontológicos “viram letra morta”.
                     É que, na prática midiática corrente, seja no Primeiro ou no Terceiro
                     mundos, o jornalismo e a esfera político-econômica vivem cada vez mais
                     em simbiose, sem o distanciamento necessário à formação de uma ativa
                     cultura crítica, indispensável ao funcionamento de uma verdadeira
                     democracia. Isto significa que frações ponderáveis dos formadores de
                     opinião no interior das redações são tão politicamente empresariais quanto
                     os políticos e empresários profissionais. Servem frequentemente como
                     agentes de informação e contra-informação na guerra surda da
                     “inteligência” empresarial. (SODRÉ, 2002, p. 196)


1.3 SISTEMAS DE RESPONSABILIZAÇÃO DA MÍDIA

        Por ter seu produto encarado como um serviço público fundamental e de
inestimável importância à sociedade, a mídia e os profissionais que dela fazem parte
gozam de prerrogativas previstas em vários artigos da Constituição Federal. Direitos
estes concedidos com o intuito de assegurar o direito à liberdade de expressão e
informação. Um deles é o que concede ao jornalista o direito de manter a
22



confidencialidade sobre suas fontes, mesmo que informações referentes às mesmas
sejam do interesse da justiça, conforme o disposto no artigo 5º, inciso XIV, da
Constituição Federal: "é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o
sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional". E o artigo 71
complementa que "Nenhum jornalista ou radialista, ou, em geral, as pessoas
referidas no art. 25 [o correto é 28], poderão ser compelidos ou coagidos a indicar o
nome de seu informante ou a fonte de suas informações, não podendo seu silêncio,
a respeito, sofrer qualquer sanção, direta ou indireta, nem qualquer espécie de
penalidade." E é por saberem que nenhum jornalista pode ser coagido a dar
informações sobre seu paradeiro, por exemplo, que muitos criminosos acabam
aceitando conceder entrevistas, ampliando o conhecimento do público sobre um
determinado assunto, como por exemplo, a estrutura de funcionamento do tráfico de
drogas e o envolvimento de policiais corruptos no esquema.
       Mas embora a mídia ocupe um papel de destaque, atuando muitas vezes
como uma espécie de sentinela da sociedade em constante vigília pelo cumprimento
das leis e da moral, não podemos esquecer que os meios de comunicação de
massa também são empresas. E como tais, deveriam estar subordinadas a algum
tipo de organização reguladora que se ocupe da fiscalização de seus conteúdos e
que tenha autoridade para apontar ou coibir deslizes éticos, de modo que as
constrangessem a cumprir com sua função social. Só que para Christofoletti (2003),
que se dedicou à análise e identificação de fatores que pudessem neutralizar toda e
qualquer iniciativa de intervenção no modo de produção da mídia, essa não é uma
tarefa simples. A começar pela concentração integral ou parcial de parte
considerável das empresas de comunicação do país nas mãos da classe política,
por ele definido na pesquisa “Dez Impasses para Uma Efetiva Crítica da Mídia” como
“Coronelismo Eletrônico”. Conforme a pesquisa do autor, um levantamento de 2001
da Folha de São Paulo apontou que os políticos aparecem como proprietários de
24% das empresas de radiodifusão do país, fora os jornais impressos e a
participação em portais de informação. O que, de acordo com Christofoletti (2003),
“significa dizer que a cada quatro emissoras, uma está sob as asas de algum
detentor de mandato”. O autor então conclui ser quase impossível a conquista de
algum progresso num cenário repleto de interesses velados pela manipulação do
cidadão.
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                     Num terreno minado como este, o espaço para a crítica é ínfimo, quase
                     inexistente. A política coronelística, que impunha o chamado “voto de
                     cabresto” nas primeiras décadas do século 20, agora se reedita apoiada em
                     mais tecnologia: via satélite, pela internet ou em publicações de qualidade
                     gráfica e técnica. Através do simbolismo ou do imaginário, as consciências
                     são conquistadas e a autonomia de pensamento – e por conseguinte a
                     crítica – é anulada. (CHRISTOFOLETTI, 2003, p.6)


        O oligopólio do setor comunicacional do país é outro entrave apontado por
Christofoletti para reformar a indústria da mídia. Para o autor, o fato de apenas “sete
grupos controlarem 80% de tudo o que é visto, ouvido e lido nos media brasileiros”
acarretou uma padronização do noticiário e uma estandardização do entretenimento,
dificultando a entrada de novas empresas, estilos e conteúdos no mercado.
                     Poderosos, os controladores são avessos à crítica e à contestação de seus
                     procedimentos. No caso das emissoras de rádio e TV, que dependem de
                     concessões públicas para operar, o caso é pior, já que a condição pública,
                     os compromissos decorrentes da permissão de exploração e as
                     contrapartidas sociais são simplesmente esquecidos. (CHRISTOFOLETTI,
                     2003, p.4)


        A inoperância do Conselho de Comunicação Social, órgão criado em 2002
para auxiliar o Congresso Nacional em assuntos relacionados à mídia também é
apontado por Christofoletti (2003) como indicativo da pequena disposição pública em
fiscalizar o setor. Para o autor, essa natureza meramente consultiva do Conselho o
impede de deliberar e definir políticas para os veículos de comunicação, contribuindo
“para a manutenção de uma camada impermeável a críticas na estrutura
comunicacional brasileira” (CHRISTOFOLETTI, 2003, p.8)
        Para Christofoletti (2003), a reestruturação do setor também se torna inviável
devido à consciência arcaica do empresariado, que ainda hoje se comporta como
alguém que “não deve satisfações públicas do seu negócio”. Ou seja, como
empresários sem nenhuma cultura de responsabilidade social.
                     Dessa forma, no ramo da radiodifusão, o permissionário simplesmente
                     ignora a natureza pública da concessão que detém e os compromissos
                     sociais decorrentes desta situação. No ramo impresso e na internet, mesmo
                     que independentemente da legislação exigir tais preocupações, o
                     entendimento geral é de que os assuntos são sempre corporativos,
                     desinteressantes a outras camadas da sociedade, e desnecessários de um
                     debate público. Uma preocupação com a crítica dos media e práticas
                     semelhantes     são    impensáveis     num    ambiente    tão    refratário.
                     (CHRISTOFOLETTI, 2003, p.9)


        Quando o assunto é a discussão do papel dos meios de comunicação de
massa e a qualidade dos conteúdos veiculados, Christofoletti (2003) observa que a
resistência dos profissionais da área é tão grande quanto à dos empresários. Mas
24



mesmo que tal fato por si só se configure num impasse, o autor vai além ao explicar
que, mesmo que quisesse, a categoria encontraria muita dificuldade para regular “o
próprio mercado de trabalho”. Falamos aqui da ausência de um órgão representativo
legítimo da categoria, que se ocupe da punição de profissionais faltosos. Como
explica Christofoletti:
                          Diferente dos médicos, engenheiros e advogados, os jornalistas não podem
                          cassar os registros dos maus profissionais, zelando assim pela qualidade
                          mínima dos que estão atuando no mercado. Quem fornece os registros é o
                          Ministério do Trabalho, instância que pode também suspendê-los, fato raro.
                          Com flancos por onde bons e maus profissionais podem penetrar
                          indistintamente, o mercado de trabalho jornalístico segue quase sem regras.
                          Sem regulação, essa terra-deninguém não tem estabilidade para permitir o
                          desenvolvimento de qualquer crítica ou avaliação mais consistente.
                          (CHRISTOFOLETTI, 2003, p. 9/10)


          Outros fatores complicadores apontados por Christofoletti (2003) para a
criação e disseminação de uma cultura preocupada com a crítica dos meios de
comunicação são o descaso do poder público para com o conteúdo exibido pela
mídia e a inércia da sociedade, que somados acabam por assegurar às emissoras
intermináveis renovações do direito de exploração das concessões públicas de rádio
e TV. O autor, no entanto, observa a ocorrência de tímidos movimentos lançados
com o intuito de induzir a mídia a produzir conteúdos de qualidade, como a
campanha “Quem financia a baixaria é contra a cidadania”, da Comissão de Direitos
Humanos da Câmara dos Deputados. Lançada em 2002 em parceria com entidades
da sociedade civil, a campanha se dedica ao acompanhamento de programas da TV
aberta.    O que segundo Christofoletti (2003), “pode se converter num eficiente
indicador para uma reavaliação das concessões na TV brasileira”.
                          Até 13 de abril de 2003, mais de 800 manifestações haviam chegado à
                          Comissão de Direitos Humanos, queixando-se de abuso na exibição de
                          cenas consideradas impróprias para o horário, de sensacionalismo, apelo
                          sexual e incitação à violência. Apoiado no trabalho da campanha, o
                          Ministério Público de São Paulo entrou com representação no Ministério da
                          Justiça contra o Programa do João Kleber (Rede TV) pedindo a mudança
                          do seu horário de exibição. A campanha faz o levantamento dos piores
                          programas televisivos para depois desestimular os anunciantes a
                          patrocinarem tais iniciativas. A idéia é secar as fontes de financiamento de
                          certos conteúdos, impondo novos padrões de qualidade para a
                          programação. (CHRISTOFOLETTI, 2003, p.7)


          E para o francês Jean-Claude Bertrand (2002), o antídoto para todos esses
impasses depende justamente do envolvimento da sociedade civil. Defensor de uma
liberdade de imprensa a serviço dos cidadãos e não das empresas, Bertrand (2002)
propõe a criação de sistemas de responsabilização da mídia, por ele definidos como
25



“quaisquer meios de melhorar o serviço de mídia ao público, totalmente
independentes do governo”. E de todos os grupos envolvidos na Comunicação
Social somente dois, na opinião do autor, estariam habilitados a integrar estes
sistemas de controle da qualidade do jornalismo: os jornalistas e o público
consumidor. Uma parceria que renderia inúmeros benefícios, segundo Bertrand
(2002).
                     Espera-se que atinjam seu objetivo aumentando a competência dos
                     jornalistas e descobrindo (por meio de observação e análise) o que a mídia
                     faz e não faz, em comparação com o que deveria fazer. E, sobretudo, os
                     MAS (Media Accountability Systems, Sistemas de Responsabilização da
                     Mídia) capacitam os veículos de comunicação a ouvir as opiniões dos
                     consumidores, a saber do que gostam, não gostam ou podem vir a gostar.
                     Graças a eles, a mídia consegue descobrir, corrigir, explicar seus erros e
                     equívocos, desculpando-se por eles. Esses sistemas são um misto de
                     controle de qualidade, serviços ao consumidor, educação contínua e muito
                     mais – não apenas, decerto, auto-regulamentação. Aos cidadãos, os MAS
                     devolvem os direitos humanos que a casta dos profissionais de mídia
                     costuma confiscar. (BERTRAND, 2002, p.35)


          Para Bertrand (2002), a fiscalização da mídia por entidades não-
governamentais compostas por quem produz e consome os produtos da mesma é a
maneira mais segura de obter uma efetiva melhora do serviço, já que a intervenção
do Estado poderia acarretar “conseqüências desastrosas, como o estabelecimento
de um regime autoritário”. E quanto ao mercado, a ressalva que Bertrand (2002) faz
é decorrente da natureza gananciosa da classe empresarial e de sua ainda
incipiente consciência de responsabilidade social.
                     Apelar para a lei ou ceder ao mercado? A legislação cerceia o abuso dos
                     mercadores. A livre-empresa cerceia o abuso do Estado. Mas muitas falhas
                     dos jornalistas (como incompetência, arrogância, parcialidade, covardia,
                     mendacidade) ou da mídia (bairrismo, infoentretenimento, autocensura,
                     publicidade disfarçada) não podem ser sanadas por códigos e tribunais.
                     Quanto ao mercado, é responsável por várias dessas falhas e incapaz de
                     curar outras. Uma terceira força é necessária. (BERTRAND, 2002, p. 31/32)


          De acordo com as palavras de Bertrand (2002), anteriormente referidas
neste capítulo, os sistemas de responsabilização da mídia são um misto de controle
de qualidade, serviço ao consumidor, educação contínua e muitos outros meios
além de auto-regulamentação. De acordo com o autor, o conceito reúne perto de
sessenta desses meios e todos já foram utilizados, “do espaço de correção à crítica
interna, da associação de espectadores à comunidade universitária”. E por tamanha
ser a abundância de meios disponíveis para perseguir um único objetivo, Bertrand
26



(2002) as dividiu em três grupos: documentos impressos ou difundidos por
radioteledifusão; pessoas, indivíduos ou grupos; e processos, longos ou curtos.




1.4 O OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA

       O Observatório da Imprensa é entendido como um meio de regulação da
mídia por ser um veículo jornalístico totalmente independente de governos, cuja
proposta é cobrar da mídia o cumprimento de seus deveres e responsabilidades por
meio da crítica. Também colaboram para esse entendimento o fato do site ser
comandado por um jornalista experiente e ser aberto à participação do cidadão
consumidor de informação.
       Fruto de uma iniciativa do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo
(Projor) e de um projeto original do Laboratório de Estudos Avançados em
Jornalismo (Labjor), da Universidade Estadual de Campinas, o Observatório da
Imprensa (2011) “é um veículo jornalístico” que tem como proposta a análise crítica
do desempenho da mídia brasileira. Lançado como site da web em abril de 1996, o
veículo tem como editor o jornalista Alberto Dines. Com o passar do tempo o
Observatório da Imprensa foi expandindo suas atrações para outras mídias,
contando hoje com programas televisivos (desde 1998) e radiofônicos (desde 2005).
       O veículo também se apresenta, no site, como uma “entidade civil, não-
governamental, não-corporativa e não-partidária”, cuja proposta é funcionar como
um palco de discussão permanente, onde os usuários das mais diversas mídias
tenham a possibilidade de participar ativamente de um processo do qual, segundo o
veículo, “até há pouco desempenhavam o papel de agentes passivos”.
       No entanto, para Albuquerque (2001), mais que oferecer um espaço de
debate e confronto de opiniões a agentes sociais diversos, o Observatório da
Imprensa atua como agente provocador deste processo. O autor chegou a essa
conclusão depois de analisar 24 das primeiras 96 edições do site.
                     Ele se apresenta também como um agente que toma parte ativamente no
                     debate, defendendo posições, buscando influenciar os outros agentes, etc.
                     Obviamente, ele não o faz de uma perspectiva “neutra”, desprovida de
                     qualidades, regras e vícios. Alberto Dines e seus principais colaboradores
                     não são, obviamente, jornalistas “universais” e não têm procuração para
                     falar em nome da classe como um todo. Os seus discursos são permeados
                     por conceitos e preconceitos que refletem as suas trajetórias particulares
                     dentro do jornalismo (ou em referência a ele). (ALBUQUERQUE, 2001, p.1)
27




       De acordo com os objetivos relatados no site do Observatório da
Imprensa, o que o veículo avalia é o produto jornalístico e não os grupos de
comunicação de massa ou os profissionais que executam suas diretrizes. O
Observatório da Imprensa ainda esclarece que “não pretende competir, substituir
ou alinhar-se” a qualquer entidade representativa da categoria ou de mídias, “como
a ABI, a FENAJ, a ABERT, a ANJ e a ANER” (OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA,
2011). Embora o pioneirismo de suas atividades seja destacado no site, consta na
apresentação do mesmo que o veículo não pretende ser o único do gênero crítica da
mídia e convoca outros grupos a fazerem o mesmo.
       Ainda que não especifique quando, é informado no site do Observatório da
Imprensa que a crítica da mídia surgiu nos Estados Unidos “como forma de
sensibilizar a comunidade e os profissionais da mídia para a complexidade da
função jornalística na sociedade moderna” (OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA,
2011), somando-se às experiências anteriores do ombudsman e do media-criticism.
É dito ainda que o país conta com pelo menos duas organizações semelhantes,
cada qual com sua perspectiva política própria: a FAIR (Fairness & Accuracy in
Reporting), cujo enfoque é a análise da intromissão do poder econômico e político
na imprensa, e a Accuracy in Media, mais inclinada a indicar as infiltrações e
distorções liberais na grande imprensa americana. Embora concorrentes, as duas
organizações – segundo o texto de apresentação do Observatório da Imprensa –
se completam, “constituindo um sólido aparelho crítico, pluralista e democrático”.
(OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA, 2011)
       O Observatório da Imprensa é formado por uma equipe composta por
editor responsável, redator chefe, editores assistentes, redatores, produtores,
colaboradores, administrador, consultor e membros do Projor, num total de 25
pessoas. Apresenta um conjunto de 14 seções, sendo cada uma delas dedicada ao
tratamento de um assunto específico. O site do Observatório da Imprensa é
patrocinado pela Petrobrás, Embraer e bancos do Brasil e Bradesco. O portal ainda
conta com atrativos como o OI na TV, Vídeos OI, OI no Rádio e Blogs OI, que
oferecem ao internauta a possibilidade de acompanhar os últimos programas de
rádio e TV do veículo, além do acesso a blogs.
       O site é formado por diversas seções, que de acordo com Albuquerque
(2001, p.2) são “presididas por suas próprias regras de ocupação, as quais
28



determinam os tipos de temas a serem tratados e de agentes a serem aceitos em
cada uma delas”. Conclui-se, então, por inferência, que as seções são as editorias
do Observatório da Imprensa. E ainda segundo o autor, a montagem da página de
abertura do site sinaliza a existência de uma escala de valor relativa, que varia de
edição para edição. O destaque que determinada seção recebe, maior ou menor, é
atribuído por Alberto Dines e sua equipe de colaboradores.
                     O status dessas seções é variável: o índice publicado na página de abertura
                     do Observatório da Imprensa fornece um referencial bastante eficiente
                     acerca do status relativo de cada uma das suas seções (quanto mais acima
                     e à esquerda estiver situada uma seção, maior deverá ser a sua
                     importância); a existência de chamadas ou ilustrações referentes a uma
                     seção também constituem critérios de distinção de uma seção. Do mesmo
                     modo, o status dos agentes que participam do Observatório da Imprensa
                     também varia, em função dos espaços que habitualmente eles ocupam e da
                     frequência com que o fazem. (ALBUQUERQUE, 2001, p.2/3)


       A seção Circo da Notícia, de acordo com Albuquerque (2001), pode ser
apontada como o espaço editorial do Observatório da Imprensa, já que é ocupada
quase que exclusivamente por artigos de seu editor-chefe, Alberto Dines. A seção é
ocupada por artigos que refletem às “concepções particulares do Observatório
sobre questões relacionadas à ética e à responsabilidade social da imprensa”,
(ALBUQUERQUE, 2001, p.5).
       Na seção Imprensa em Questão, a temática discutida, segundo Albuquerque
(2001, p.10), “é bastante semelhante à do Circo da Notícia: questões relativas à
ética e à responsabilidade social do jornalismo”. O que distingue uma da outra,
conforme o autor, é o ponto de vista plural da Imprensa em Questão, ou seja, a
opinião é exercida por agentes sociais diversos, além da do editor-chefe do
Observatório e sua equipe. Essa participação, entretanto, é induzida pela equipe do
Observatório da Imprensa. É que de acordo com Albuquerque (2001, p.10), textos
são coletados “para pautar ou servir [...] de apoio para os artigos publicados”. O
autor cita como exemplo a publicação do artigo “Coisas do Passado”, escrito por
Alberto Dines à época de seu vínculo com o jornal Folha de São Paulo, mas que
não foi divulgado por estar em desacordo com a linha apartidária do veículo. “Tal
fato gerou, na edição de no 56, um ‘Dossiê Censura’, aberto justamente pelo texto
não publicado”, (ALBUQUERQUE, 2001, p.10).
       “Dossiê Censura” foi o nome dado à cartola do conjunto de textos originados
pela publicação do artigo “Coisas do Passado”, de Dines. Agrupados pelo trabalho
de edição, os artigos foram publicados sob o título “Crise nos Jornais”. De acordo
29



com Albuquerque (2001), o título e a cartola são recursos de edição utilizados no
Observatório da Imprensa para atribuir um sentido geral a um determinado
conjunto de textos fundamentalmente distintos. No caso já referido, a intervenção
resultou, nos dizeres de Albuquerque (2001, p.11), num “amplo arco de apoio em
torno de Dines”. Mas o que realmente chamou a atenção do autor foi o tratamento
dispensado pelo veículo a única opinião dissonante do conjunto.
                       [...] o texto é curto demais, o que conspira contra a coerência do argumento;
                       seu conteúdo é relativizado pelo uso de aspas; mesmo a identidade do
                       autor da frase é apagada, em contraste com a “Manifestação dos leitores da
                       Folha”. Os próprios títulos dos dois textos contrastam: no caso do
                       telespectador da versão televisiva do Observatório, o título destaca o fato de
                       se tratar de uma manifestação singular; no caso da Folha, porém, o título se
                       refere à manifestação de leitores, embora a introdução do texto afirme que a
                       carta foi a “única manifestação na seção Painel do Leitor da Folha de S.
                       Paulo”. O efeito é evidente: enquanto a carta do leitor da Folha é tratada
                       como representativa do pensamento do conjunto dos leitores do jornal, a
                       tomada de posição favorável à Folha é caracterizada como puro nonsense.
                       (ALBUQUERQUE, 2001, p.11)


           Na percepção de Braga (2006), que analisou o Observatório da Imprensa de
2001 a 2003, não foi por acaso que Albuquerque (2001) identificou a existência de
um “amplo arco de apoio em torno de Dines” na seção Imprensa em Questão. É
que Braga (2006, p.112) entende ser “evidente que os artigos selecionados para
essa seção o são em função de se caracterizarem como bons exemplares da
démarche crítica preferencial” do veículo. (BRAGA, 2006, p.112) O que caracteriza a
seção, conforme Braga (2006, p.113), como “o campo de um jogo ‘regulamentado’
pelos critérios definidores da ‘posição OI’. Já Albuquerque (2001, p.10) insinua
quase a mesma coisa, ao observar que “a Imprensa em Questão é um espaço
plural, mas [...] isso não significa necessariamente que se trata de um espaço
aberto”.
           Essas veladas intervenções promovidas pela equipe do site são decorrentes,
de acordo com Braga (2006), da natureza militante da crítica do Observatório, que
busca, por meio desse recurso, conquistar a adesão do leitor ao conjunto de valores
e critérios defendidos pelo veículo como sinônimos de bom jornalismo. “[...] o esforço
da crítica é vergastar pontos de vista diferenciais e buscar o aliciamento dos leitores
para o ponto de vista assumido”. (BRAGA, 2006, p.129)
           De acordo com os valores e critérios apontados por Braga (2006) como
norteadores da linha de ação crítica do Observatório da Imprensa, o que o veículo
cobra é um jornalismo crítico, com profissionais dotados de um poder de análise e
30



interpretação capaz de proporcionar ao leitor uma perspectiva mais aguda e refletida
acerca dos fatos que apura. A responsabilidade política da imprensa também é
bastante enfatizada, já que segundo Braga (2006) a imprensa é tida pelo
Observatório como base principal da esfera pública, o meio pelo qual a política se
realiza: “no sentido forte, de planejamento das ações da sociedade, que não se
reduz às estratégias político-partidárias”, (BRAGA, 2006, p.114). De modo que tudo
o que for produzido pela mídia que conflitar com estes valores será expressamente
criticado no Observatório da Imprensa. Como explica o autor:
                     [...] apresenta matérias que fazem a crítica de ações, na sociedade (ações
                     de jornais, mas também de setores econômicos e políticos) que possam ter
                     alguma incidência restritiva sobre a imprensa e particularmente sobre uma
                     imprensa crítica. Igualmente, considerações sobre a legislação e a
                     jurisprudência que possam ter incidência sobre o jornalismo pretendido. [...]
                     Parece-me que essa “linha de ação” crítica determina os demais ângulos e
                     componentes do jornal.


        O Observatório da Imprensa também reproduz, na seção A Voz dos
Ouvidores, críticas feitas por ombudsmans ou colunas de ouvidores de jornais. O
conteúdo, porém, só é publicado se apresentar similaridade com a implícita cartilha
de valores do veículo. E por ter essa característica, de reprodução de publicações
externas que reforçam sua posição, a seção se constitui, na visão de Braga (2006),
como uma das principais seções do Observatório da Imprensa.
        Para Albuquerque (2001, p.14), o poder de cacifar os próprios discursos e de
enfraquecer as opiniões dissonantes torna o Observatório da Imprensa “um espaço
muito menos plural do que nos parecia ser a princípio”.
        A Entre Aspas, de acordo com Braga (2006), é a única seção do site em que
as mais antagônicas interpretações coexistem harmonicamente, sem intervenções
ou manobras editoriais. A seção é ocupada por matérias e/ou artigos assinados, que
foram publicados em algum veículo de imprensa no país. “Com a característica de
um clipping organizado tematicamente (‘imprensa’), aparece toda uma diversidade
de notícias e interpretações, [...] em que o que importa efetivamente é o ‘falar sobre
imprensa’”, (BRAGA, 2006, p.119)
        Na seqüência, ao traçar um paralelo comparativo entre a crítica do
Observatório da Imprensa com a feita pelo ombudsman (jornalista existente em
alguns veículos cuja função é a crítica dos pares em cima de erros por eles
cometidos) o autor identifica que o fato em comum é a de que em ambos os casos
críticos e criticados fazem parte da mesma profissão. Observa, no entanto, que a
31



crítica do ombudsman é feita internamente (o crítico trabalha no mesmo ambiente do
alvo de sua crítica) e embasada nos padrões profissionais vigentes. Trocando em
miúdos, o ombudsman critica o jornalista que, com ou sem intenção comete deslizes
na produção das matérias, afastando-se do modelo comum da produção jornalística.
Enfoque este inversamente proporcional ao do Observatório da Imprensa, que
desenvolve a crítica em cima de alguns dos padrões vigentes e suas realizações
práticas. Prosseguindo o relato da crítica feita no Observatório da Imprensa, o
autor diz que:
                     Os processos jornalísticos são cotejados com uma posição política mais
                     ampla, que cobra sua revisão. Paralelamente, não há propriamente
                     negociação de interpretações – a crítica se coloca como
                     interpretadora/definidora baseada na experiência profissional e analítica do
                     Observatório. Como essa posição é constituída sobretudo por um dever ser
                     (mais do que por uma cobrança de ajustes ou de correção pontual de
                     desvios), demarca-se como um ponto de vista militante. [...] o esforço da
                     crítica é vergastar pontos de vista diferenciais e buscar o aliciamento dos
                     leitores para o ponto de vista assumido. (BRAGA, 2006, p.129)


        A idéia central do Observatório, de acordo com Braga, seria então o
combate aos padrões usuais do fazer jornalismo, criticando-os e argumentando em
defesa da troca por outro modelo, menos neutro e mais opinativo. Diferente do
ombudsman, a crítica do Observatório não se preocupa em ensinar o leitor, em
esclarecê-lo acerca dos métodos e técnicas corretos do fazer jornalismo. Muito antes
pelo contrário, o esforço da crítica é dirigido à conquista da adesão do leitor à visão
do Observatório, numa ação que o autor configura como militante.
                     Isso não significa que não se aprenda através da leitura sistemática do site.
                     Pelo contrário, aprendemos muito sobre a imprensa e seus processos. O
                     que assinalo apenas é que o discurso do jornal não se organiza de modo
                     didático – a interlocução não é assim expressamente construída – como
                     diálogo entre conhecedor e aprendiz, e sim, antes, como apelo de adesão
                     aos bons valores. A interlocução não é voltada para o desenvolvimento de
                     conhecimentos e competências, mas para o embate de valores. (BRAGA,
                     2006, p.130)


        O autor também contesta o mote escolhido pelo Observatório, representado
pela frase “Você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito”, que acompanha o nome
do site a cada número. No entendimento dele, a frase insinua equivocadamente que
o leitor comum de jornais é o público-alvo do OI, a quem o veículo dirige suas
atenções e concentra seus esforços para ensinar, desenvolver e/ou ampliar a
capacidade de leitura crítico-interpretativa das notícias. Para Braga (2006), ensinar
está longe de ser a preocupação dominante do Observatório. A idéia, segundo o
autor dá a entender no trecho abaixo, é persuadir o leitor e captá-lo para o “time”, de
32



modo que ao longo do tempo este também se torne um defensor/difusor das idéias
do Observatório.
                     O aprofundamento da interpretação faz rever essa hipótese. A discussão
                     não se faz entre profissionais e críticos, de um lado, e leitores, de outro.
                     Parece antes se fazer entre iniciados (críticos, militantes – jornalistas ou
                     não), dando acesso a esse debate, para que o leitor possa se tornar, ele
                     também, um “iniciado”. E é só pela passagem a esse outro patamar que o
                     dístico se realiza. Não é, portanto, uma promessa pedagógica, mas um
                     desafio. (BRAGA, 2006, p.131)


        Após discorrer sobre o tom militante da crítica do Observatório da
Imprensa, Braga direciona sua análise para os interlocutores do portal. Ao identificar
a existência de três distintas categorias de público, o autor explica a função de cada
uma dentro da estrutura do site, e fala sobre a postura de ação que o veículo adota
com cada público.
                     Um nós fortemente sintonizado com os valores e com os processos críticos
                     de defesa desses valores; os “adversários”, que são vergastados [...] por se
                     contraporem ou [...] por nem sequer perceberem a validade dos critérios
                     que deveriam estruturar a boa imprensa; e um leitorado disperso, que pode
                     ser composto por jornalistas, estudantes e usuários interessados, leitores
                     habituais da imprensa de interesse político (que deve ser convencido
                     através do vigor crítico do OI). Em suma: trata-se da estrutura básica da boa
                     militância político-social (e, no caso, também profissional). Essa seria a
                     estrutura da polêmica do Observatório. (BRAGA, 2006, p.131)



2. METODOLOGIA

        Para que se possa cumprir o papel exigido neste trabalho de iniciação
científica, que é de cotejar a teoria com a prática, se optou pela metodologia
qualitativa, na modalidade de estudo de caso, que segundo Yin (2001) é uma
pesquisa fundamentada na observação e exploração dos fatos que envolvem um
determinado fenômeno contemporâneo dentro de um contexto de vida real, onde
diferentes fontes de evidência são utilizadas. O Estudo de Caso, conforme Yin
(2001), é a estratégia mais adequada para responder a questões do tipo “como” e
“por que”, em situações em que o pesquisador tem pouco controle sobre os eventos.
Assim sendo, as técnicas de pesquisa empregadas foram a coleta de entrevistas e
documentos, que servirão de base para responder as perguntas já referidas.
        Conforme posteriormente veremos na análise do caso propriamente dito,
diversos personagens emitiram suas opiniões à luz daquilo que representou o cerne
do linchamento moral ou desgaste atribuído a Ibsen. Aliás, faz-se importante dizer
que o termo “linchamento de Ibsen” serviu de cartola para dois desses artigos, um
33



deles de autoria do próprio editor-chefe do site, Alberto Dines. E todas essas
opiniões vieram à tona a partir da matéria publicada pela revista Istoé em agosto de
2004 que, na verdade, foi a sentença de absolvição pública da imprensa, embora
por outro veículo que não o prolator da “sentença condenatória”, no caso a revista
Veja, em novembro de 1993.
       E a fim de responder de que forma o erro ganhou visibilidade e como o
mesmo foi analisado no âmbito dos jornalistas, dividiu-se os artigos em grupos e a
partir do meio em que foram originalmente publicados, sendo que todos foram
reproduzidos pelo Observatório da Imprensa.


  Erro do repórter   Responsabilidade          Erro das fontes    Erro da Imprensa
                           da revista

        5 - 12               4-5                    2-3                 9 - 11

  Paulo Moreira      Florência     Costa Adam Sun (2)            Eliane Cantanhêde
  Leite (5), Benito (1),         Eduardo                         (1),     Guilherme
  Gama (1), Luis Ribeiro                (1),                     Fiuza (1), Mauro
  Costa Pinto (4), Tereza        Cruvinel                        Malin (2), Carlos
  Reinaldo           (1), Alberto Dines                          Brickmann          (1),
  Azevedo (1),       (2)                                         José Paulo Lanyi
  Dora Kramer (1)                                                (1),           Marcelo
                                                                 Beraba    (1),    Luiz
                                                                 Egypto (1), Alberto
                                                                 Dines (2), Deonísio
                                                                 da Silva (1)
34




  Entre Aspas.       Imprensa         em Entre Aspas (6) e Imprensa           em
                     Questão          (5), Imprensa      em Questão (1) Entre
                     Entre Aspas (10), Questão (4).           Aspas (6) e Voz
                     Circo da Notícia                         dos Ouvidores (1).
                     (1),   Voz       dos
                     Ouvidores (1).




       No grupo “Erro do Profissional”, quatro autores apontam o então repórter
Luis Costa Pinto como o responsável por levar adiante uma história que sabia não
ser condizente com a verdade. No grupo “Responsabilidade da Revista”, quatro
autores atribuem a Veja a culpa pelos danos que sua matéria provocou ao então
deputado Ibsen Pinheiro, em novembro de 1993.         Já na opinião de outros dois
autores, a responsabilidade pelos erros nos números divulgados por Veja deve ser
imputada às fontes. E para 11 articulistas, a responsabilidade pelo erro recai sobre
toda a imprensa, já que nenhum veículo se empenhou em recuperar o episódio e
restabelecer a verdade dos fatos.


2.1 ERRO DO PROFISSIONAL
       Dos 28 artigos coletados, o grupo “Erro do Profissional” responde por 42%
do total, com 12 colaborações. As opiniões dos autores Paulo Moreira Leite, Luis
Costa Pinto, Benito Gama, Reinaldo Azevedo e Dora Kramer foram exibidas na
seção “Entre Aspas” do Observatório da Imprensa.
       Editor executivo de Veja à época da publicação da reportagem “Até tu,
Ibsen?”, de 17 de novembro de 1993, Paulo Moreira Leite classifica a versão de Luis
Costa Pinto como “fantasiosa”. Ele admite ter telefonado para Lula (apelido de Costa
Pinto) informando que Adan Sun havia detectado erro nos números referentes aos
depósitos nas contas de Ibsen, mas nega que tenha orientado o repórter a procurar
alguém que sustentasse o valor. No artigo “Radiografia de uma mentira”, exibido
pelo jornal O Globo em 18 de agosto de 2004 e reproduzido pelo Observatório da
Imprensa seis dias depois, Moreira Leite argumenta que telefonou para cobrar
transparência: “Se havia deputados acusando Ibsen, eles deveriam assumir sua
35



responsabilidade e não usar a imprensa como bucha de canhão”. Já em outro artigo,
divulgado pela Istoé em 17 de agosto de 2004, o atual colunista da revista Época
afirma que o erro encontrado por Adam Sun não o havia surpreendido, já que a
condução do impeachment de Fernando Collor havia rendido a Ibsen diversos
desafetos. E que diante dessa descoberta ligou para Costa Pinto a fim de ouvir o
que o repórter tinha dizer. A decisão de divulgar números contestados pela própria
equipe de checagem, segundo Moreira Leite, teria sido tomada por causa dessa
conversa, em que Costa Pinto categoricamente descartava qualquer hipótese de ser
vítima de uma armadilha: “Ninguém nos proibia, naquele momento, de publicar duas
versões, o que teria ao menos amenizado o erro.” (artigo 8)
        Embora o esforço percebido nos artigos de Paulo Moreira Leite para se
isentar de culpa sobre a matéria que exibiu depósitos inexistentes nas contas de
Ibsen Pinheiro, para Bucci (2000) o ex-editor executivo de Veja tem sim grande
responsabilidade no episódio. Não que o autor tenha feito referência a este caso
específico ou tecido algum juízo de valor sobre o mesmo. Mas sim porque afirma
que “os que comandam [...] devem incluir no seu rol de afazeres a formação ética
permanente dos jornalistas, dando-lhes retorno transparente sobre cada decisão”.
(BUCCI, 2000, p.207) O autor acrescenta que o mais importante dentro das
redações é o exemplo que os chefes dão para os mais os novos. É que para Bucci
(2000), a tendência é que os subordinados se espelhem nos mesmos, ou seja,
reproduzam suas ações.
        Por trazer informações incondizentes com a versão de outros autores, optou-
se por ultrapassar excepcionalmente os limites da pesquisa com o adendo de um
parlamentar citado tanto no relato de Costa Pinto, publicado pela Istoé, quanto na
reportagem de Veja que originou este estudo.         Trata-se de Benito Gama, ex-
deputado que exerceu o comando da CPI do Orçamento e da subcomissão bancária
da mesma em 1993. Em artigo publicado na versão online de Veja, de 17 de agosto
de 2004, ele nega que tenha recebido pedido de Costa Pinto para confirmar
qualquer informação falsa sobre Ibsen. E insinua, inclusive, que sequer serviu de
fonte para a matéria: “A fonte do jornalista [...] era oculta na época. Preferiu mentir
[...] informando a seu editor [...] que tinha obtido as informações através de mim, o
que não era verdade”. (artigo 28) Por fim, Benito Gama disse repudiar a tentativa de
Luis Costa Pinto de imputar a terceiros a responsabilidade pelas falsas acusações
36



que perpetrou contra a honra de Ibsen e que ingressaria na justiça contra o jornalista
por crime de calúnia e difamação.
        Atual   colunista   da   revista   Veja,   Reinaldo   Azevedo,   um    jornalista
assumidamente avesso ao Partido dos Trabalhadores, acredita que o erro que
vitimou Ibsen pode ser debitado em boa parte a incapacidade do então repórter Luis
Costa Pinto de ler ou de ao menos questionar as reais intenções da ida de
Waldomiro Diniz à sucursal brasiliense de Veja. Para Azevedo (artigo 20), o repórter
encarou o aliado dos então deputados petistas Aloizio Mercadante e José Dirceu
como “um troço guerreiro, a agir sozinho, movido pelo desejo de justiça”, quando na
verdade simplesmente representava a peça de uma engrenagem, a obedecer a
estratégia de inserção de um partido na vida pública. Na visão do autor, isso
acontece porque a imprensa está contaminada pelo espírito de esquerda, de fazer
justiça com as próprias mãos, de punir os poderosos, os ricos, as elites, e que isso,
aliado à determinação de fazer da opinião pública a caixa de ressonância de seus
valores e teses têm contribuído para fazer o mau jornalismo.
        Para a jornalista Dora Kramer, as falsas informações propagadas contra
Ibsen Pinheiro nasceram de uma arriscada combinação de elementos (ambição,
ignorância, má-fé, açodamento e leviandade). Sem citar nomes, a autora julga que a
associação desses elementos levou a um conluio contra Ibsen que culminou com a
publicação da matéria. Mas se aqui a impressão que fica é a da divisão equânime de
responsabilidades, mais adiante a autora deixa transparecer sua opinião sobre o
principal responsável pelo erro. Ao condenar o jornalismo de delegacia de polícia,
onde segundo ela o jornalista “abre mão do dever de distinguir dados falsos de
informações verdadeiras”, deixando-se levar “pelo primeiro construtor de dossiês
que lhe aparece à frente”, fica fácil deduzir que a crítica sugere falta de imperícia por
parte do repórter na condução do caso.
        Embora advirta que obedeceu à instrução de seu chefe à época para levar a
cabo uma matéria calçada em uma falsa prova, Luis Costa Pinto não se furta de
assumir a responsabilidade pelo texto. No próprio depoimento, publicado pela Istoé,
Costa Pinto já admite sua culpa. Diz que se deixou fascinar pela possibilidade de
emplacar um furo de reportagem e que isso, somado ao pouco tempo que dispunha
para fechar a edição, o levou a ignorar a checagem das informações. E com relação
a sua anuência ao plano de dar curso às falsas acusações por meio de uma fonte
oficial, Costa Pinto lançou mão da juventude para justificar sua omissão. Disse que
37



por ter só 24 anos de idade na época não tinha acumulado maturidade suficiente
para se insurgir contra o comando e que não teme ser condenado por revelar as
falhas que teve e estar do lado da verdade. Em outro momento, o repórter admite
que o medo de perder o emprego falou mais alto, levando-o a seguir a orientação.
        Os interesses profissionais alegados por Costa Pinto para justificar sua
anuência á orientação de seu ex-chefe revelam que em nenhum momento o repórter
levou em consideração as normas, princípios e valores do Código de Ética do
Jornalismo. Mais do que isso, mostram a falta ou a fragilidade de seu caráter como
cidadão à época, que como ele mesmo insinua estava ainda em formação. A
dedução advém das teses de Martins e Abramo (1997), que afirmam ser impossível
separar a conduta profissional da cidadã. Em outras palavras, os autores acreditam
na reprodução, por parte do indivíduo, do mesmo padrão de comportamento nas
mais diversas áreas da vida. “Ninguém se torna venal da noite para o dia”, afirma
Martins (2005, p.31). Contextualizando a sentença de Martins (2005, p.31), a atitude
conivente de Costa Pinto não pode ser entendida como um fato isolado. “O jornalista
[...] geralmente vai baixando a guarda aos poucos. Um dia, faz uma pequena
concessão; dias depois, cede um pouco mais; semanas mais tarde, enfia o pé na
lama.” O que pode ser comprovado pelo próprio relato de Costa Pinto, ao afirmar
que por diversas vezes silenciou ao testemunhar a chefia constrangendo colegas a
encontrar frases de fontes que confirmassem o que já havia sido redigido.



2.2 RESPONSABILIDADE DA REVISTA


        A opinião de que o erro deve ser creditado à revista foi compartilhada por
quatro autores, num total de cinco colaborações. Os artigos dos jornalistas Florência
Costa, Eduardo Ribeiro, Tereza Cruvinel e Alberto Dines correspondem a 17% do
total coletado.
        A jornalista Florência Costa, atualmente vinculada à Istoé, diz em seu artigo
que é longa a história dos erros da mídia e seus efeitos arrasadores para acusados
e acusadores. A autora diz ainda que a mídia americana protagonizou uma
avalanche de erros e retratações nos últimos anos e que a imprensa brasileira,
embora mais jovem, não fica muito atrás. Costa não faz nenhuma referência a Veja
ou ao episódio de erro jornalístico envolvendo o ex-deputado Ibsen, mas sugere a
38



responsabilidade da revista em dois momentos. Primeiro, ao destacar que mais
importante que dar um furo de reportagem é antes se certificar de que o mesmo está
correto. E depois ao recomendar, para casos de erros, postura semelhante à
adotada pelo Correio Braziliense, que no ano 2000 ganhou o Prêmio Esso de
jornalismo por destacar, na própria capa, a admissão de um vacilo por meio da
manchete: “O Correio Errou”. “Se errou, é melhor consertar”, completa.
        Outro que atribui à revista Veja a responsabilidade pelo erro é Eduardo
Ribeiro. Em seu artigo, comemorou o momento que o país atravessava, de
discussão aberta de questões importantes relacionadas à imprensa, e disse esperar
que o debate acarretasse o aprimoramento da atividade. Em outras palavras, o que
Ribeiro defende é o fim da tolerância para com os erros de imprensa: “Se [...] errou,
que repare o erro e que seja punido se for o caso, como acontece em qualquer outra
atividade. Não somos diferentes nem devemos ter foro privilegiado. Delito de opinião
é crime e ponto.” (artigo 26) E ao sustentar que os veículos de mídia devem ser
responsabilizados por tudo o que veiculam, principalmente em casos de ataque a
honra alheia, o autor condena Veja por ter dado mais destaque ao seu revide à
Istoé do que a correção do erro que cometeu na matéria sobre Ibsen. “Os veículos
olham os erros dos outros, e dependendo do caso carregam nas tintas, para
desmoralizar um eventual concorrente, mas na hora de olhar seus próprios erros são
míopes e econômicos”. (artigo 26)
        Presidente da TV Brasil até 1° de novembro do corrente ano, quando então
transferiu o cargo ao colega Nelson Breve, a jornalista Tereza Cruvinel escreveu
artigo sobre o caso contendo uma entrevista com o alvo das acusações de Veja em
1993, Ibsen Pinheiro. Ela entende que a matéria de Istoé e a respectiva confissão
de Costa Pinto representam “o reconhecimento tardio de houve erro numa das
reportagens que fundamentaram o processo de cassação” (art. 27) do mandato do
político. Porém, traz trechos de conversas que teve com Ibsen que colidem com seu
próprio julgamento do episódio: “Ninguém teria tal força, isoladamente. Nem o que
Veja fez foi discrepante do clima generalizado de então. Não fui cassado por uma
revista, mas pela Câmara dos Deputados [...] Era cassar ou cassar”.
        Editor-chefe do Observatório da Imprensa, Alberto Dines é o único dos
autores estudados a fazer parte de dois dos quatro grupos em que a análise foi
dividida. É que ao tecer duras críticas a contenda pública travada pelas rivais Veja e
Istoé, Dines afirmou, no artigo que titulou como “A guerra dos ventiladores”, que “foi
39



na redação de Veja que se inventou a técnica de induzir os entrevistados a dizer
aquilo que o redator já colocara na matéria”. E embora o autor faça referência a
outro episódio de erro protagonizado por Veja, pode-se deduzir que ele não descarta
a versão de Costa Pinto, que alega ter sido orientado pela chefia a procurar por
alguém disposto a sustentar as falsas informações que dispunha. “O erro só foi
assumido semanas depois, porque a infalibilidade olímpica dos chefes de redação
não permitia o reconhecimento do deslize.” (artigo 3)



2.3 ERRO DAS FONTES


        Ocupado exclusivamente pelo jornalista Adam Sun, então chefe da equipe
de checagem de Veja à época da publicação da reportagem “Até tu, Ibsen?”, de 17
de novembro de 1993, o grupo “Erro das Fontes” representa 7% do total de artigos
levantados, com duas colaborações.
        Em artigos publicados pela versão online da Veja e pela revista Istoé,
reproduzidos no site do Observatório da Imprensa, Sun admite que dois cheques
enviados por Costa Pinto à matriz de Veja realmente estavam supervalorizados em
1000%, mas nega que os mesmos tenham sido considerados na soma que apontou
o montante de um milhão em depósitos nas contas do ex-deputado: “A checagem
somou 182.000 dólares com 881.000, valores dados por ‘um auditor do Banco
Central, a pedido da CPI’, e o resultado conferia: um pouco mais de um milhão”. Sun
complementa afirmando que a checagem só autorizou a publicação do número
depois de reconfirmar os dados com o autor da apuração, sugerindo, assim, que se
alguém errou nas contas de Ibsen esse alguém com certeza era a fonte.


2.4 ERRO DA IMPRENSA


        Abrindo o grupo dos articulistas que comungam da hipótese de “Erro da
Imprensa”, representando 39% do total de artigos levantados está o mais incisivo
deles: o editor-chefe do Observatório da Imprensa, Alberto Dines. Para o autor, a
reportagem de capa da edição 1.819 de Istoé revela “um dos maiores libelos contra
os procedimentos irresponsáveis da nossa imprensa nos idos de 1992-93”. Ele
compara Ibsen a Alfred Dreyfus, um oficial de artilharia do exército francês que
40



estava sendo condenado por traição com base em documentos falsos. Na ocasião,
os oficiais do alto escalão francês se deram conta disso, mas tentaram ocultar o erro
judicial. “Veja errou em 1993, mas na ocasião ninguém esperneou em defesa do
deputado Ibsen Pinheiro. Nem a agora generosa Istoé”, conclui. E ao classificar o
erro de Veja como uma "formidável barriga", Dines insinua que o episódio alterou o
curso da história e da conjuntura política do país no momento, já que acarretou o
abandono da disputa presidencial de um quase candidato. Por fim, recorda que o
nome de Waldomiro Diniz, o mesmo que foi até a sucursal brasiliense de Veja com
boletos bancários adulterados de Ibsen nas mãos, foi apontado no noticiário de
fevereiro de 2004 como abastecedor dos então deputados Aloizio Mercadante e
José Dirceu nas investigações da CPI do Orçamento. E critica a imprensa por ter se
omitido de associar o mesmo como artífice da calúnia contra Ibsen e de restabelecer
a verdade sobre o caso: “Se [...] no delírio das denúncias não aparece nas redações
um jornalista capaz de [...] buscar a verdade onde ninguém a procura, então
estamos completa e definitivamente ferrados”.
        Ao destacar que o direito individual de não ter a honra violada é tão
importante quanto o direito público da sociedade à informação, Mauro Malin cobra a
criação de um órgão representativo dos jornalistas que se ocupe de intervir a favor
das vítimas de abusos praticados pela imprensa. E condena o movimento
empreendido por Veja e pelos jornais O Globo e Folha de São Paulo no sentido de
minimizar os efeitos das falhas cometidas para a cassação do ex-deputado Ibsen
Pinheiro. “Para atenuar o alcance dos desatinos que comete, a mídia não hesita em
reduzir sua própria importância no processo político. [...] Em lugar nenhum do
mundo a mídia gosta de reconhecer seus erros ou dar satisfações a quem quer que
seja”. (art.22)
        Essa dificuldade dos veículos de comunicação em lidar com a crítica foi
apontada por Christofoletti (2003) como um dos dez entraves por ele identificados
para uma reforma dos procedimentos adotados pela mídia. Segundo o autor, os
poucos empresários do ramo da comunicação agem assim porque são muito
poderosos, dominando 80% de tudo o que é visto, lido ou ouvido pelos brasileiros. E
somando-se ao oligopólio do setor comunicacional o descaso do poder público em
fiscalizar os compromissos decorrentes das concessões de rádio e TV, o resultado,
segundo Christofoletti (2003, p.4), é desolador: “as contrapartidas sociais são
simplesmente esquecidas”.
O CASO IBSEN PINHEIRO - MONOGRAFIA
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O CASO IBSEN PINHEIRO - MONOGRAFIA

  • 1. CENTRO UNIVERSITÁRIO METODISTA, DO IPA CURSO DE JORNALISMO Arthur Machado O CASO IBSEN PINHEIRO: Um exemplo de mau jornalismo PORTO ALEGRE 2011
  • 2. 2 ARTHUR MACHADO O CASO IBSEN PINHEIRO: Um exemplo de mau jornalismo Monografia apresentada como requisito parcial para a conclusão do curso e obtenção do título de bacharel em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo e ênfase em Gestão da Comunicação, do Centro Universitário Metodista, do IPA. Orientadora: Profª. Ms.Luciana Kraemer PORTO ALEGRE 2011
  • 3. 3 ARTHUR MACHADO O CASO IBSEN PINHEIRO Um exemplo de mau jornalismo Monografia apresentada como requisito parcial para a conclusão do curso e obtenção do título de bacharel em Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo e ênfase em Gestão da Comunicação, do Centro Universitário Metodista, do IPA. Porto Alegre, ___ de ________ de 2011. BANCA EXAMINADORA: Orientadora: Profª. Ms. Luciana Kraemer
  • 4. 4 Dedico este trabalho à minha mãe, por ter me aguardado com comida quentinha durante todos os dias de minha luta por esta graduação. Aos meus amigos, pelo companheirismo e incentivo. E em especial à minha irmã e madrinha Adriana Machado, dona de uma fonte inesgotável de amor e dedicação, a quem atribuo todo o mérito por eu ter chegado até aqui.
  • 5. 5 AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar a Deus, por não ter imputado a mim nenhuma limitação de ordem física ou emocional, facilitando assim a busca de meus objetivos ao me abençoar com uma saúde perfeita e uma família que sempre me proporcionou a estrutura necessária para encarar todo e qualquer desafio. À minha irmã Adriana Machado, a quem atribuo todo o mérito por eu ter chegado até aqui. Lembro como se fosse ontem da mão dela segurando a minha nas consultas ao dentista, como a dizer: “Não tenha medo, mano. Estou aqui”. Ou então das inspeções surpresas que ela fazia em meus cadernos, transformando repentinamente meu estilo de vida irresponsável e despreocupado, a lá Zeca Pagodinho (Deixa a Vida me Levar) e Martinho da Vila (Devagar, devagarinho), em uma desgastante – mas sempre bem-aventurada – corrida contra o tempo para obter a aprovação. Em suma, mais que uma irmã, mais que uma melhor amiga, mais que um modelo de conduta, força, coragem e determinação que escolhi para me espelhar, eu vejo nela uma mãe. Porque só mesmo o amor incondicional de uma mãe para explicar toda a atenção, cuidado e afeto que ela sempre dispensou a mim. Isso sem falar nos cinco longos anos de sacrifício financeiro, em que investiu boa parte de seu salário de funcionária pública em minha formação. Agradeço também aos meus pais, Luiz Carlos Machado e Jurema Terezinha Aguiar do Nascimento. O primeiro pelo legado de luta e honradez, que me orgulha e encoraja a nunca baixar a guarda diante das intempéries da vida. E à minha mãe por ter me proporcionado casa, comida, roupa lavada e um computador com internet, estrutura indispensável para qualquer estudante. À Luciana Kraemer, professora que ganhou minha simpatia e admiração desde seu ingresso no IPA, há três anos. Foi por enxergar nela uma amiga e uma profissional de primeiro nível do jornalismo que a escolhi, já naquela época, para me orientar nesta pesquisa. E se for verdade que o futuro reflete as escolhas que fazemos, tenho certeza que uma caminhada de vôos ainda maiores me aguarda. Por fim, aos meus amigos, que são a família que Deus me confiou escolher. E dentre eles, um agradecimento especial a Marluci Stein, colega das mais competentes e amiga mais certa das horas incertas.
  • 6. 6 Às vezes, a única coisa verdadeira num jornal é a data. (Luis Fernando Veríssimo)
  • 7. 7 RESUMO O presente estudo tem como objetivo principal analisar os procedimentos éticos adotados pelos personagens envolvidos na redação e publicação da reportagem ‘Até tu, Ibsen?’, capa da edição n° 1314 da revista Veja, de 18 novembro de 1993. E a partir de entrevistas e de uma coleta documental, a pesquisa busca também desvendar as causas deste erro que ficou marcado, na visão de muitos pesquisadores, como um dos maiores exemplos nacionais de irresponsabilidade da imprensa. O modo como o Observatório da Imprensa tratou o assunto e se, de fato, se enquadra como um veículo de regulação da mídia também são objetos analisados no trabalho. Palavras-chave: Ibsen Pinheiro – Veja – Istoé – Luis Costa Pinto – Observatório da Imprensa – Sistemas de regulação da mídia
  • 8. 8 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................9 1 REFERENCIAL TEÓRICO .....................................................................................13 1.1 O caso IBSEN .....................................................................................................13 1.2 O conceito de ética ..............................................................................................17 1.3 Sistemas de responsabilização da mídia ............................................................21 1.4 O Observatório da Imprensa ...............................................................................26 2 METODOLOGIA ....................................................................................................32 2.1 Erro do profissional .............................................................................................34 2.2 Responsabilidade da revista ...............................................................................37 2.3 Erro das fontes ....................................................................................................39 2.4 Erro da imprensa .................................................................................................39 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................42 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .........................................................................45 ANEXOS ...................................................................................................................46
  • 9. 9 INTRODUÇÃO A imagem de um grupo de moleques revoltados, batendo com as mãos nas janelas e chutando a porta da casa de meu pai é parte de um episódio doloroso e constrangedor de minha infância, que até hoje recordo com tristeza. Eu deveria ter uns 10, 12 anos no máximo. Jogava futebol com um amigo na cancha do condomínio em que meu pai morava quando fui surpreendido pela chegada gradativa destes garotos, todos eles moradores do condomínio. Garotos e garotas que poderiam muito bem ser meus amigos, não fosse minha timidez e personalidade introvertida. Eles iam chegando e repercutindo entre si sobre uma matéria publicada pelo jornal Zero Hora - cujo conteúdo eu não lembro com clareza - mas que denunciava o envolvimento do ex-vereador Luiz Machado com algum esquema de desvio de dinheiro público. Mesmo eu alegando que aquilo não era verdade, que foi um erro (a foto da matéria era de outro Luiz Machado, que não era nem nunca havia sido vereador), acabei percebendo pela ira deles que não havia espaço para reparação: o estrago já estava feito e só o que me restava era assistir a incineração em praça pública de meu próprio pai. Corridos pelas britas que arremessavam contra nós, meu amigo e eu buscamos refúgio na casa de meu pai, que não estava em casa. O que não foi suficiente para abrandar o ataque, já que nossos algozes para lá se dirigiram aos gritos de “ladrão” e “corrupto”. Após ganhar um processo que moveu contra o jornal, meu pai foi indenizado e recebeu um box de cinco linhas onde Zero Hora reconhecia o erro e se desculpava pela injustiça cometida. Foi fundamentalmente por causa desse episódio, que tão negativamente marcou a minha infância, que optei por estudar um caso parecido: o do ex-deputado Ibsen Pinheiro. Pertencer à categoria responsável pelo erro que um dia vitimou meu pai e que talvez tenha sido a principal responsável pela formação de uma opinião pública contrária a Ibsen também foi um elemento decisivo para escolha. Por comungar da tese de que sábio é aquele que aprende com os erros alheios, pretendo retirar deste estudo expertise suficiente para jamais arranhar a honra ou levar sofrimento à família de uma pessoa inocente com o meu trabalho. Pois, como bem alerta a sabedoria popular, a palavra pronunciada é uma das três únicas coisas na vida para as quais não existe volta ou reparação.
  • 10. 10 Em matéria de capa da edição 1.314, de 17 de novembro de 1993, Veja acusa o então deputado e ex-presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro, de envolvimento com a Máfia dos Anões do Orçamento. Dizia o texto da reportagem que a CPI do Orçamento teria descoberto que, entre 1989 e 1993, o político recebeu depósitos bancários superiores a um milhão de dólares. A soma, considerada incompatível com os vencimentos de um deputado, resultou na associação de Ibsen a um esquema mafioso, bem como em seu indiciamento. Seis meses depois, em maio de 1994, Ibsen Pinheiro teve o mandato cassado e os direitos políticos suspensos por oito anos. No entanto, os valores divulgados pela matéria de Veja não correspondiam à verdade. A própria revista tratou de reparar o erro na edição seguinte, informando que a CPI havia se enganado nos cálculos. De acordo com a matéria intitulada “Um milhão de dificuldades”, a subcomissão bancária da CPI “confundiu depósitos novos com transferências de uma conta para outra, ou aplicações financeiras” (Veja, 1993). Em síntese, o um milhão de dólares inexplicado, informado com grande destaque na edição anterior, tendo inclusive ganho a capa da revista, em uma semana se transformou em 230 mil dólares. Só que a admissão do erro rendeu uma página, enquanto a denúncia foi repercutida em seis. A responsabilidade pelo desfecho do caso Ibsen, um dos episódios jornalísticos mais irresponsáveis do país, na visão de inúmeros pesquisadores, veio à tona em agosto de 2004. Foi quando a concorrente, Istoé, teve acesso e tornou público o conteúdo de um depoimento redigido pelo próprio autor da reportagem de Veja para um livro que Ibsen Pinheiro, o alvo das acusações, estava escrevendo. No documento, Luis Costa Pinto revela os bastidores da reportagem e conta que o erro nos cálculos foi identificado com antecedência pela revista. Só que em vez de corrigir o texto ou suspender a edição, a chefia de Veja teria, de acordo com Costa Pinto, o induzido a encontrar uma fonte que sustentasse o um milhão. “Não pensei em Ibsen Pinheiro ou na injustiça que estava ajudando a dar curso com aquela reportagem calçada em uma falsa prova. Pensei em mim, no meu emprego, em como salvar uma reportagem fadada a produzir uma tragédia”, (Istoé, 2004). Para Martins (2005), no exercício da profissão, o jornalista deve responder a uma série de lealdades, sendo a lealdade à sociedade a mais importante delas. Ou seja, o compromisso com o direito da sociedade de ser bem informada é soberano e inviolável, mesmo que venha a conflitar com a lealdade ao chefe, à empresa, aos
  • 11. 11 colegas e até mesmo contra o próprio interesse do profissional de ascender na carreira. De modo que se um jornalista for orientado pelo superior a omitir ou adulterar alguma informação, como alega Costa Pinto em seu depoimento, a lealdade a chefia deve ser desconsiderada de imediato em nome de seu compromisso absoluto. Isso porque o jornalismo, conforme destaca Martins (2005), só se justifica como missão, que é a de informar a sociedade para que a mesma, bem informada, tenha condições de decidir da melhor maneira possível. E no caso de protagonizar a divulgação de alguma notícia equivocada, que não condiga com a verdade, o jornalista deve assumir o erro publicamente, o mais rápido possível. O que foi feito parcial e veladamente pela revista Veja, que na edição posterior à da denúncia publicou matéria onde comunicava o erro, mas o atribuía única e tão somente à CPI, eximindo-se de qualquer culpa por um deslize que pautou os principais jornais do país por quase uma semana. E é com base nestas colocações e aspectos que esta pesquisa surge, quase 20 anos depois do episódio, com o objetivo geral de entender os procedimentos éticos envolvidos neste caso, tendo em vista que a Veja é a revista de maior circulação nacional e a quarta com maior tiragem no mundo. Para atingir o objetivo descrito, optou-se por analisar o fato a partir do site Observatório da Imprensa. O veículo foi escolhido devido a sua proposta democrática de funcionar como fórum permanente de debate e análise crítica acerca do desempenho da mídia, onde é assegurado a todos, jornalistas ou não, o direito de manifestação e participação ativa sobre o produto jornalístico. E foi por ter esta característica que se optou por fazer dele o principal campo de coleta da pesquisa. Então, a partir da coleta de documentos e textos publicados no Observatório da Imprensa, temos como objetivos específicos identificar os erros jornalísticos apontados pelos artigos, bem como a identidade dos jornalistas que os escreveram. Também se analisa como o próprio Observatório da Imprensa se posicionou sobre o tema. Sendo assim, a pesquisa tem a intenção de responder a seguinte questão: de que forma o erro ganhou visibilidade e como o mesmo foi analisado no âmbito dos jornalistas? Partiu-se da hipótese que o erro está mais relacionado à imperícia do profissional do que a questões associadas a pressões do veículo ou do mercado. A pesquisa foi feita em duas etapas, sendo a primeira delas dividida em três momentos. No capítulo 1.1 é apresentado um resumo da matéria “Até tu, Ibsen?”,
  • 12. 12 referente à edição n° 1.314 da revista Veja, de 17 de novembro de 1993. Também é abordado o depoimento de Luis Costa Pinto, no qual a revista Istoé se apoiou para denunciar o erro da concorrente por meio da reportagem “Massacrado”, capa da edição n° 1.819, de 18 de agosto de 2004. Os autores que orientam esse primeiro momento são Pena (2005) e Dines (2004). No capítulo 1.2 é apresentado o conceito de ética e os compromissos, deveres e responsabilidades que um jornalista deve atender no exercício da profissão. Os autores consultados foram Bucci (2000), Abramo (1997), Martins (2005), Argolo (2002), Sodré (2002) e Vásquez (2003). Já no capítulo 1.3 o assunto versa sobre sistemas de regulação da mídia. Os diversos tipos de meios possíveis de análise crítica sobre os serviços prestados pelos veículos de comunicação de massa e a importância dos mesmos para a sociedade são abordados em contraposição com os entraves que impedem o público consumidor de informação de exercer influência sobre os mesmos. Os autores que orientam esse capítulo são Christofoletti (2003) e Bertrand (2002). A primeira etapa da pesquisa é encerrada com o capítulo 1.4, onde o site do Observatório da Imprensa é apresentado como um exemplo de sistema regulador de mídia. O modo de atuação do veículo também é apresentado, com base em estudos feitos por Albuquerque (2001) e Braga (2006). A segunda etapa consiste na análise do objeto de pesquisa, que são os artigos publicados pelo Observatório da Imprensa que repercutem o tema. Primeiramente, apresenta-se a metodologia empregada para a análise e o modo como foram coletados os materiais. Em seguida busca-se relacionar a fundamentação teórica e os dados coletados. Por fim, são apresentadas as considerações finais e a resposta do problema de pesquisa.
  • 13. 13 1 REFERENCIAL TEÓRICO 1.1 O CASO IBSEN Passados quase 20 anos, a edição da revista Veja de 17 de novembro de 1993 continua sendo peça de análise para estudantes e teóricos em comunicação. A reportagem de capa representa, para muitos pesquisadores, um dos principais exemplos nacionais de prejuízos irreversíveis que o mau jornalismo pode acarretar à reputação dos envolvidos e à imagem do próprio ofício jornalístico, que tem na credibilidade sua principal matéria prima. Por meio da manchete “Até tu, Ibsen?” estampada na capa acima do ombro esquerdo do ex-deputado federal Ibsen Pinheiro, a revista levanta suspeita de corrupção sobre o político que presidiu a Câmara Federal no biênio 91/92 em meio ao processo de impeachment do ex- presidente Fernando Collor. E debaixo da imagem de um Ibsen denotando aparente tensão, como se estivesse acuado, a revista complementa a chamada com o subtítulo “Um baluarte do Congresso naufraga em dólares suspeitos” em grifo. Produzida pelo então repórter Luís Costa Pinto, a reportagem acusa Ibsen de enriquecimento ilícito por meio da “Máfia dos Anões do Orçamento”, nome dado a um grupo de deputados federais – que tinha a baixa estatura como ponto em comum – que desviava verbas do orçamento da União entre o final dos anos 1980 e o começo dos anos 1990. O esquema foi descoberto em outubro de 1993 e era supostamente liderado pelo então deputado baiano João Alves de Almeida, falecido em 2004. Principal reportagem da edição 1.314 de Veja, o caso começa a ser relatado na página 30, sob o título “Uma estrela na lama”, seguido de três linhas de apoio que anunciavam: “A CPI descobre que o deputado Ibsen Pinheiro movimentou 1 milhão de dólares em suas contas e derruba um símbolo do Legislativo”. Sentenças que parecem ter sido escolhidas a dedo, tamanha a precisão dos significados que refletiam. O que de acordo com Pena (2005, p.4), não deixava espaço para dúvidas: Ibsen era realmente culpado. “Não é preciso uma análise semântica mais profunda para verificar o tom condenatório da reportagem. As palavras escolhidas são suficientemente conclusivas”.
  • 14. 14 Só que segundo uma entrevista de Luis Costa Pinto, publicada pela revista ISTOÉ em 18 de agosto de 2004, a edição 1.314 de Veja não previa a denúncia. Costa Pinto conta que o que estava originalmente previsto era a repercussão de dois documentos surgidos durante os trabalhos da CPI dos Anões do Orçamento e que associavam Ibsen Pinheiro com alguns dos integrantes do esquema. A matéria naturalmente seria mais branda do que a que acabou chegando às bancas, já que o material reunido não mostraria nada além de uma boa relação de Ibsen com alguns dos deputados investigados na CPI. Falamos aqui de um cheque depositado pelo deputado Genebaldo Correia na conta de Ibsen (cuja assessoria parlamentar comprovou ser referente à venda de uma caminhonete) e de uma foto tirada durante um jantar em uma ilha grega, na qual Ibsen aparece acompanhado da esposa e de cinco dos sete acusados, que também aparecem acompanhados de suas respectivas cônjuges. Algo complicado de se entender sob a ótica da ética, mas natural num meio repleto de interesses como é a política. Só que um telefonema de Waldomiro Diniz ao repórter Luis Costa Pinto acabou provocando uma reviravolta no assunto. Funcionário da Subcomissão de Investigação Bancária da CPI do Orçamento, Diniz teria dito ao repórter que detinha informações bombásticas e que estava a caminho da sucursal brasiliense de Veja para encontrá-lo. Na entrevista, Luis Costa Pinto revelou ainda que “os trabalhos de encerramento da edição estavam avançados” e que se encontrava dedicado à construção de “um texto de capa sem maiores novidades ou revelações sobre os trabalhos da CPI”. “Dali a duas horas, no máximo três horas, a edição de Veja teria de baixar para a gráfica da Editora Abril, em São Paulo”, complementa. O que significa dizer que o texto da reportagem que acabou chegando às bancas, o qual segundo Pena (2005) exprimia um tom condenatório e conclusivo, foi elaborado em poucas horas. Braço direito dos então deputados petistas José Dirceu e Aloizio Mercadante naquelas investigações, Diniz chegou ao escritório de Veja em Brasília munido de sete boletos bancários e, conforme o relato de Costa Pinto, com um sorriso triunfal assegurava que os mesmos representavam a prova cabal do envolvimento de Ibsen com a Máfia dos Anões do Orçamento. “Maravilhado com a possibilidade de cravar um furo na edição de Veja do fim de semana seguinte”, o repórter se deixou levar pela versão que lhe foi apresentada e, sem nem mesmo apurar a veracidade do que acabara de receber, comunicou os editores da matriz de Veja, em São Paulo, de
  • 15. 15 que estaria mudando o tom da reportagem, passando “a ser mais afirmativo contra Ibsen”. E o primeiro movimento após avisar a revista com relação à reversão da pauta foi ligar para o ex-presidente da Câmara, que desmentiu toda a história. A negativa, entretanto, não foi suficiente para demovê-lo da intenção de divulgar as supostas provas já naquela edição. De modo que optou por acreditar no material que tinha em mãos e escrever a matéria, enviando-a algumas horas depois para São Paulo juntamente com os documentos bancários que havia recebido das mãos de Waldomiro Diniz. Costa Pinto conta que depois disso foi para casa, onde chegou próximo às duas horas da manhã de sábado, e que fora acordado pouco antes das 8h por Silvânia Dal Bosco, sua colega de redação. Ela trazia um recado do então editor- executivo da revista, Paulo Moreira Leite, de que havia ocorrido um grave problema. Nesse momento Costa Pinto teria ligado para o editor-executivo e sido informado por ele de que Adam Sun, então chefe da equipe de checagem da revista, havia descoberto que a dolarização (o valor dos boletos apresentados por Diniz já veio dolarizado) não batia: “Lula (apelido de Costa Pinto), essa soma não dá US$ 1 milhão. Dá US$ 1 mil”, teria dito Adam Sun. Foi então que, orientado pelo editor-executivo, que já havia mandado imprimir 1,2 milhão de capas da revista, correu atrás de alguém que sustentasse a falsa dolarização de um milhão. De posse de apenas 10 minutos para resolver o problema, Costa Pinto confessa que só pensava em salvar a própria pele. Não pensei em Ibsen Pinheiro ou na injustiça que estava ajudando a dar curso com aquela reportagem calçada em uma falsa prova. Pensei em mim, no meu emprego, em como salvar uma reportagem fadada a produzir uma tragédia. Telefonei para o presidente da CPI do PC, o então deputado Benito Gama, e consegui pegá-lo acordado àquela hora. Narrei-lhe o ocorrido. Ele tinha conhecimento da versão acerca dos tais depósitos de US$ 1 milhão. “Não há chance de isso estar errado. É US$ 1 milhão e Ibsen terá de responder por isso”, asseverou Benito. “Deputado, isso é on (ou seja, no jargão jornalístico, eu perguntava se a informação podia ser publicada assinalando-se a sua origem)? Olhe que a reportagem de Veja, que está errada, vai se escudar nesse on seu”, perguntei mais uma vez. “É on. Agora, deixe-me fazer o meu cooper”, tranquilizou-me Benito. Passei a frase por telefone a Paulo Moreira, que mexeu na edição da revista, e a Veja circulou com o libelo acusatório contra Ibsen. (ISTOÉ, 2004) De acordo com a versão de Costa Pinto, foi dessa maneira que a revista foi parar nas bancas de todo o país, transmitindo ao público certezas das quais nem o próprio autor da reportagem as possuía. Não obstante, o assunto pautou os jornais
  • 16. 16 de todo o país por dois dias, arrastando o alvo das acusações definitivamente para o fundo de um buraco do qual não conseguiu mais sair. Segundo Costa Pinto, uma empresa de auditoria teria sido contratada por Ibsen Pinheiro para esquadrinhar todos os registros de entradas e saídas de suas contas bancárias nos últimos cinco anos. Nenhuma movimentação anormal foi encontrada, mas a CPI se negou a levar em conta os resultados, alegando que não havia fiscalizado o processo. E foi assim que, seis meses depois da divulgação da matéria, Ibsen Pinheiro teve seu mandato cassado pelo voto de 296 deputados, durante sessão plenária ocorrida no dia 18 de maio de 1994. Na ocasião, 139 parlamentares votaram contra a cassação do mandato. Os onze anos que Costa Pinto levou para se retratar, a existência de diversas versões sobre o caso e o fato do mesmo ter abandonado a reportagem, passando a dedicar-se a atividades ligadas à política, são elementos que intrigam Pena (2005). Porém, para o autor do artigo “No jornalismo não há fibrose: a ruína das fontes, o denuncismo e a opinião pública”, não restam dúvidas de que, nessa bagunça toda, o maior prejudicado foi o ex-presidente da Câmara Federal. Tudo é, no mínimo, muito estranho, mas o fato concreto é que o deputado Ibsen Pinheiro foi o verdadeiro prejudicado. [...] ele jamais irá recuperar o momento político que vivia na época, quando era um dos mais fortes candidatos à presidência da república. Sua carreira foi interrompida por erros da imprensa, e não há como retomá-la. [...] Para muitos dos que tomaram conhecimento da retratação, ainda há dúvidas sobre sua inocência. Como disse, em jornalismo não há fibrose, pois as feridas abertas pela difamação jamais cicatrizam. (PENA, 2005, p.4) Quem também se manifestou sobre a revelação do repórter Luis Costa Pinto foi Alberto Dines (2004). Por meio do artigo “Por que o remorso demorou tanto”, divulgado pelo site Observatório da Imprensa, o autor classifica o ocorrido como “um dos maiores libelos contra os procedimentos irresponsáveis da nossa imprensa nos idos de 1992/93” e avalia que a colocação de três zeros a mais nas contas de Ibsen representou um dos maiores vexames da história do jornalismo: “O ridículo erro de aritmética produziu um vergonhoso linchamento midiático que um Legislativo irresponsável e suas espertas raposas converteram em clamorosa injustiça”. Em seu artigo, Dines (2004) também condena a demora de Costa Pinto em reparar o erro e lembra que, quatro anos antes, dedicou um programa televisivo do Observatório da Imprensa ao desvendamento de todas “as maquinações e mutretas” de que Ibsen Pinheiro pudesse ter sido vítima.
  • 17. 17 Onde estava o repórter Luís Costa Pinto, que naquele momento deixou escapar a magnífica oportunidade para uma reabilitação do acusado e manteve-se em silêncio nos dias seguintes? Onde estavam as grandes estrelas do jornalismo investigativo que não se sensibilizaram com a tocante manifestação de inocência num programa de uma hora, ao vivo, em rede nacional? E onde estava Fenaj há tantos anos preocupada – como afirma – com a ética profissional e o combate aos abusos? (DINES, 2004, OI) A incapacidade da imprensa de resgatar o caso e avançar nos desdobramentos, de modo a restabelecer toda a verdade também foi atacada por Dines (2004). Em fevereiro deste ano, quando apareceu no noticiário o nome de Waldomiro Diniz falou-se muito no seu papel como abastecedor dos então deputados Aloízio Mercadante e José Dirceu nas investigações da CPI do Orçamento – a mesma que levou à cassação do ex-presidente da Câmara dos Deputados. Ninguém se lembrou do seu papel como veiculador da calúnia contra Ibsen Pinheiro relativa à transferência de 1 milhão de dólares de uma conta para outra. Amnésia. (DINES, 2004, OI) 1.2 O CONCEITO DE ÉTICA De acordo com Vásquez (2003), a ética é um campo específico da ciência cujo objetivo é o estudo da moral dos homens em sociedade. Em outras palavras, sua função é investigar uma determinada experiência humana referente à moral, a fim de compreendê-la e explicá-la: “estuda uma forma de comportamento humano que os homens julgam valioso e [...] deve fornecer a compreensão de um aspecto real, efetivo, do comportamento dos homens”. (VÁSQUEZ, 2003, p.3) À ética não devem ser atribuídas às normas, regras e princípios que regem o comportamento humano em sociedade, já que as mesmas, conforme o autor, foram constituídas ao longo do tempo de acordo com os valores morais de cada povo. Ou seja, sua pretensão não é estabelecer, confrontar, corrigir ou agregar novas normas ou valores, mas sim proporcionar, por meio do resultado de seus estudos, “conhecimentos sistemáticos, metódicos e, no limite do possível, comprováveis” sobre um determinado problema moral. (Vásquez, 2003, p.3) Sendo assim, não se pode confundir a ética com seu objeto de estudo: a moral. No entanto, na medida em que exprime conhecimento científico sobre os efeitos que determinados atos provocam sobre outros indivíduos, determinados grupos sociais ou até mesmo à sociedade como um todo, o resultado dos estudos éticos podem acarretar em transformações, fazendo com que os indivíduos modifiquem sua maneira de ser e/ou agir.
  • 18. 18 E partindo do pressuposto de que a ética não define o comportamento adequado para cada situação, pode-se aferir que a cartilha de regras, normas e princípios que guiam as atividades profissionais das mais diversas categorias foram constituídas ao longo do tempo, a fim de auxiliar seus filiados sobre como agir de modo moralmente satisfatório à luz das mais diversas situações. Os jornalistas, por exemplo, possuem um código que os alertam com relação a direitos, deveres e responsabilidades de sua função. Todavia, há quem julgue desnecessário a definição de uma conduta específica para cada profissão. É o caso de Abramo (1997), que acredita não ser possível separar a conduta profissional da cidadã. Onde entra a ética. O que o jornalista não deve fazer que o cidadão comum não deva fazer? O cidadão não pode trair a palavra dada, não pode abusar da confiança do outro, não pode mentir. No jornalismo, o limite entre o profissional como cidadão e como trabalhador é o mesmo que existe em qualquer outra profissão. É preciso ter opinião para poder fazer opções e olhar o mundo da maneira que escolhemos. Se nos eximimos disso, perdemos o senso crítico para julgar qualquer outra coisa. O jornalista não tem ética própria. Isso é um mito. A ética do jornalista é a ética do cidadão. O que é ruim para o cidadão é ruim para o jornalista. (ABRAMO, 1997, p.109) Bucci (2000, p.206), entretanto, pensa diferente. Para o autor, os códigos “anunciam para a sociedade que seus signatários firmam o propósito de observar, para benefício dessa mesma sociedade, aquele conjunto de princípios, valores e padrões de conduta”. Porém, observa que a simples exposição desses códigos ou a ausência dos mesmos é insuficiente para assegurar a lisura ou a desonra do fazer jornalístico numa empresa. [...] Há ambientes profissionais onde nada está escrito e, não obstante, os melhores valores do jornalismo são vivamente cultivados, cimentando a cultura dos que ali trabalham. Códigos não fabricam bom jornalismo. Ao contrário, com incômoda freqüência, são brandidos para encobrir mau jornalismo. O ponto é outro: os que comandam [...] devem incluir no seu rol de afazeres a formação ética permanente dos jornalistas, dando-lhes retorno transparente sobre cada decisão ética e promovendo debates periódicos sobre o tema, o que inclui a recomendação de leituras e o apoio a cursos de aperfeiçoamento aos que têm interesse em se aprofundar. (BUCCI, 2000, P.207) É que para Bucci (2000), mais importante que um código na parede é o exemplo que os mandarins das redações deixam para os mais novos. Ou seja, se a conduta dos superiores for exemplar, a tendência é que os subordinados valorizem o código e procurem seguir o mesmo caminho dos chefes. Além disso, o autor diz que
  • 19. 19 é preciso estimular o cumprimento das normas com discussões sadias, tornando o tema uma cultura do local: Isso pode ser estimulado pelos chefes, na prática, com base nos casos que se apresentam no dia-a-dia em cada editoria ou em cada revista da empresa. Além do quê, é preciso explicá-las com calma aos recém contratados, e, de tempos em tempos, vale a pena revisá-las e atualizá-las com a participação do maior número possível de jornalistas. Só assim elas se tornam letras vivas do fazer jornalístico. (BUCCI, 2000, p.205) Com uma posição semelhante a de Abramo (1997) sobre a ética, Martins (2005) também afirma não acreditar em tipos diferentes de ética. Em outras palavras, o autor acredita que o indivíduo tende a reproduzir o mesmo padrão de conduta ética, seja este bom ou ruim, nas diferentes áreas da vida. “Será possível que um sujeito seja modelo de comportamento na redação e, em casa, espanque a mulher e deixe os filhos largados ou, por onde passe, dê trambiques?” (2005, p.30), questiona ele. O que muda, segundo o Martins (2005), é o contexto de situações de risco e tentações comuns a esta ou aquela categoria e que podem, se não advertidas, ir corrompendo gradativamente a índole do profissional. “Ninguém se torna venal da noite para o dia”, afirma Martins (2005, p.31). Neste sentido os códigos são essenciais para o autor, uma vez que atuam como uma espécie de bússola, orientando o profissional sobre o caminho correto a seguir. O jornalista não chega à redação uma tarde disposto a tornar-se uma pena de aluguel, e então se vende. Geralmente, vai baixando a guarda aos poucos. Um dia, faz uma pequena concessão; dias depois, cede um pouco mais; semanas mais tarde, enfia o pé na lama; anos depois, está metido até o pescoço no que não devia. Cada passo em falso vai minando as defesas do organismo aos ataques da pilantragem até que um dia as resistências simplesmente desapareceram – e o sujeito, então, atravessa o Rubicão. (MARTINS, 2005, p.31/32) Se agir com ética é agir de acordo com as normas e princípios morais de determinada sociedade, pode-se deduzir que a ética só pode ser alcançada com lealdade nas relações. E no jornalismo, de acordo com Martins (2005), há uma série de lealdades que o jornalista deve levar em conta, sendo a lealdade à sociedade a mais importante delas. No caso de situações de conflito, o autor recomenda que o repórter reflita atentamente sobre sua primeira lealdade, além de recorrer a um código de ética não-escrito sempre que necessário. Jornalistas seguem códigos de ética escritos, o da Federação Nacional dos Jornalistas e o das empresas onde trabalham, e um código de ética não- escrito, o da Rádio Corredor. Todos são bons: os primeiros [...] porque dão parâmetros e, às vezes, desculpas para driblar situações ambíguas; o
  • 20. 20 último, porque dá conselhos. Assim, quando estiver em dúvida, converse com pessoas cujo julgamento você respeite. Geralmente, essa troca é muito rica. Não sendo formal, ela tende a descer mais fundo no problema do que os códigos e a enfrentá-lo com uma ferramenta talhada para nuances: o bom senso coletivo da nossa categoria. (MARTINS, 2005, p. 35) De acordo com o artigo segundo do Código de Ética dos Jornalistas, publicado pela Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj), a divulgação de informações precisas é dever dos meios de comunicação pública, independentemente da natureza de sua propriedade. Porém, notícias equivocadas são divulgadas ao público com desalentadora freqüência, falhas que segundo Martins (2005) derivam do pouco tempo de que dispõe os jornalistas para apurar as informações. Mas quando elas ocorrerem, devem ser imediatamente reconhecidas pelo repórter junto ao público leitor. “Lembre-se de sua primeira lealdade” (2005, p.43), adverte o autor. Reconhecer um erro não diminui ninguém. Ao contrário, dentro de determinados limites, reforça a credibilidade do profissional. O público sabe que os jornais erram e confia mais no jornal que admite sem subterfúgios suas falhas do que naquele que tenta varrê-las para debaixo do tapete. É claro que se os erros virarem notícia, não há credibilidade que resista. (MARTINS, 2005, p. 43) Em entrevista concedida a Argolo (2002), Alberto Dines, um dos mais conceituados jornalistas do país, refere que o problema envolvendo os equívocos cometidos pela imprensa na divulgação das informações vai além do tempo. De acordo com ele, o problema deve ser creditado principalmente à latente insegurança de editores e diretores. À primeira acusação publicada por um veículo – qualquer veículo, responsável ou não – correm todos na sua esteira, sem investigar ou sequer contraditar. Há um medo de levar bronca do departamento de circulação porque o concorrente está explorando determinada questão e ganhando muita exposição. (ARGOLO, 2002, p. 14) Sobre o conjunto de regras que visa à padronização da conduta profissional de membros de uma determinada categoria Dines é favorável, sugerindo inclusive a criação de disciplinas que familiarizem os profissionais com estas normas ainda durante a formação. Porém, por ser a ética uma porção da Filosofia e da Moral, o autor julga como indevido o emprego da palavra para nominá-los. “Ética situa-se numa esfera superior e íntima, obviamente mais abrangente e muito mais complexa”. (ARGOLO, 2002, p. 15)
  • 21. 21 Questionado por Argolo (2002) sobre o que pensa a respeito da presença cada vez maior de advogados dentro das redações, Dines condenou a política adotada pelos grandes veículos de atribuir a estes a decisão sobre o que pode ou não ser publicado. Mesmo que a idéia por trás da mudança seja a redução de ações indenizatórias, o autor entende que os advogados não podem exercer um poder que historicamente sempre coube aos jornalistas. A natureza antagônica do compromisso de cada profissional é usada para justificar o ponto de vista. Advogado não é jornalista, advogado advoga a causa dos clientes, [...] mesmo que confronte aspectos morais ou éticos. Já o cliente do jornalista é [...] o cidadão que precisa ser informado com isenção. O jornalista advoga o interesse público. Se transferimos para os advogados o poder de decidir o que é certo publicar, tiramos do jornalista o livre arbítrio e, com isso, esvaziamos completamente o seu senso de responsabilidade, seus dilemas éticos e morais, sua atenção ao código deontológico. É óbvio que se pode pedir aconselhamento a bacharéis ou juristas sobre determinada publicação. Mas quem deve dar a palavra final é o jornalista. (ARGOLO, 2002, p. 21) A restrição da alçada de atuação dos jornalistas dentro das redações, que gradativamente vem perdendo para advogados o poder de decidir sobre o que pode ou não pode ser publicado, pode ser atribuída a mercantilização da mídia contemporânea. A hipótese surge na esteira da opinião de Sodré (2002), que classifica a moral da mídia como “utilitarista” e “mercadológica”. O autor entende que o interesse público foi contaminado pelo capital financeiro e que está desaparecendo do horizonte ético das redações. E que diante desta realidade, os códigos deontológicos “viram letra morta”. É que, na prática midiática corrente, seja no Primeiro ou no Terceiro mundos, o jornalismo e a esfera político-econômica vivem cada vez mais em simbiose, sem o distanciamento necessário à formação de uma ativa cultura crítica, indispensável ao funcionamento de uma verdadeira democracia. Isto significa que frações ponderáveis dos formadores de opinião no interior das redações são tão politicamente empresariais quanto os políticos e empresários profissionais. Servem frequentemente como agentes de informação e contra-informação na guerra surda da “inteligência” empresarial. (SODRÉ, 2002, p. 196) 1.3 SISTEMAS DE RESPONSABILIZAÇÃO DA MÍDIA Por ter seu produto encarado como um serviço público fundamental e de inestimável importância à sociedade, a mídia e os profissionais que dela fazem parte gozam de prerrogativas previstas em vários artigos da Constituição Federal. Direitos estes concedidos com o intuito de assegurar o direito à liberdade de expressão e informação. Um deles é o que concede ao jornalista o direito de manter a
  • 22. 22 confidencialidade sobre suas fontes, mesmo que informações referentes às mesmas sejam do interesse da justiça, conforme o disposto no artigo 5º, inciso XIV, da Constituição Federal: "é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional". E o artigo 71 complementa que "Nenhum jornalista ou radialista, ou, em geral, as pessoas referidas no art. 25 [o correto é 28], poderão ser compelidos ou coagidos a indicar o nome de seu informante ou a fonte de suas informações, não podendo seu silêncio, a respeito, sofrer qualquer sanção, direta ou indireta, nem qualquer espécie de penalidade." E é por saberem que nenhum jornalista pode ser coagido a dar informações sobre seu paradeiro, por exemplo, que muitos criminosos acabam aceitando conceder entrevistas, ampliando o conhecimento do público sobre um determinado assunto, como por exemplo, a estrutura de funcionamento do tráfico de drogas e o envolvimento de policiais corruptos no esquema. Mas embora a mídia ocupe um papel de destaque, atuando muitas vezes como uma espécie de sentinela da sociedade em constante vigília pelo cumprimento das leis e da moral, não podemos esquecer que os meios de comunicação de massa também são empresas. E como tais, deveriam estar subordinadas a algum tipo de organização reguladora que se ocupe da fiscalização de seus conteúdos e que tenha autoridade para apontar ou coibir deslizes éticos, de modo que as constrangessem a cumprir com sua função social. Só que para Christofoletti (2003), que se dedicou à análise e identificação de fatores que pudessem neutralizar toda e qualquer iniciativa de intervenção no modo de produção da mídia, essa não é uma tarefa simples. A começar pela concentração integral ou parcial de parte considerável das empresas de comunicação do país nas mãos da classe política, por ele definido na pesquisa “Dez Impasses para Uma Efetiva Crítica da Mídia” como “Coronelismo Eletrônico”. Conforme a pesquisa do autor, um levantamento de 2001 da Folha de São Paulo apontou que os políticos aparecem como proprietários de 24% das empresas de radiodifusão do país, fora os jornais impressos e a participação em portais de informação. O que, de acordo com Christofoletti (2003), “significa dizer que a cada quatro emissoras, uma está sob as asas de algum detentor de mandato”. O autor então conclui ser quase impossível a conquista de algum progresso num cenário repleto de interesses velados pela manipulação do cidadão.
  • 23. 23 Num terreno minado como este, o espaço para a crítica é ínfimo, quase inexistente. A política coronelística, que impunha o chamado “voto de cabresto” nas primeiras décadas do século 20, agora se reedita apoiada em mais tecnologia: via satélite, pela internet ou em publicações de qualidade gráfica e técnica. Através do simbolismo ou do imaginário, as consciências são conquistadas e a autonomia de pensamento – e por conseguinte a crítica – é anulada. (CHRISTOFOLETTI, 2003, p.6) O oligopólio do setor comunicacional do país é outro entrave apontado por Christofoletti para reformar a indústria da mídia. Para o autor, o fato de apenas “sete grupos controlarem 80% de tudo o que é visto, ouvido e lido nos media brasileiros” acarretou uma padronização do noticiário e uma estandardização do entretenimento, dificultando a entrada de novas empresas, estilos e conteúdos no mercado. Poderosos, os controladores são avessos à crítica e à contestação de seus procedimentos. No caso das emissoras de rádio e TV, que dependem de concessões públicas para operar, o caso é pior, já que a condição pública, os compromissos decorrentes da permissão de exploração e as contrapartidas sociais são simplesmente esquecidos. (CHRISTOFOLETTI, 2003, p.4) A inoperância do Conselho de Comunicação Social, órgão criado em 2002 para auxiliar o Congresso Nacional em assuntos relacionados à mídia também é apontado por Christofoletti (2003) como indicativo da pequena disposição pública em fiscalizar o setor. Para o autor, essa natureza meramente consultiva do Conselho o impede de deliberar e definir políticas para os veículos de comunicação, contribuindo “para a manutenção de uma camada impermeável a críticas na estrutura comunicacional brasileira” (CHRISTOFOLETTI, 2003, p.8) Para Christofoletti (2003), a reestruturação do setor também se torna inviável devido à consciência arcaica do empresariado, que ainda hoje se comporta como alguém que “não deve satisfações públicas do seu negócio”. Ou seja, como empresários sem nenhuma cultura de responsabilidade social. Dessa forma, no ramo da radiodifusão, o permissionário simplesmente ignora a natureza pública da concessão que detém e os compromissos sociais decorrentes desta situação. No ramo impresso e na internet, mesmo que independentemente da legislação exigir tais preocupações, o entendimento geral é de que os assuntos são sempre corporativos, desinteressantes a outras camadas da sociedade, e desnecessários de um debate público. Uma preocupação com a crítica dos media e práticas semelhantes são impensáveis num ambiente tão refratário. (CHRISTOFOLETTI, 2003, p.9) Quando o assunto é a discussão do papel dos meios de comunicação de massa e a qualidade dos conteúdos veiculados, Christofoletti (2003) observa que a resistência dos profissionais da área é tão grande quanto à dos empresários. Mas
  • 24. 24 mesmo que tal fato por si só se configure num impasse, o autor vai além ao explicar que, mesmo que quisesse, a categoria encontraria muita dificuldade para regular “o próprio mercado de trabalho”. Falamos aqui da ausência de um órgão representativo legítimo da categoria, que se ocupe da punição de profissionais faltosos. Como explica Christofoletti: Diferente dos médicos, engenheiros e advogados, os jornalistas não podem cassar os registros dos maus profissionais, zelando assim pela qualidade mínima dos que estão atuando no mercado. Quem fornece os registros é o Ministério do Trabalho, instância que pode também suspendê-los, fato raro. Com flancos por onde bons e maus profissionais podem penetrar indistintamente, o mercado de trabalho jornalístico segue quase sem regras. Sem regulação, essa terra-deninguém não tem estabilidade para permitir o desenvolvimento de qualquer crítica ou avaliação mais consistente. (CHRISTOFOLETTI, 2003, p. 9/10) Outros fatores complicadores apontados por Christofoletti (2003) para a criação e disseminação de uma cultura preocupada com a crítica dos meios de comunicação são o descaso do poder público para com o conteúdo exibido pela mídia e a inércia da sociedade, que somados acabam por assegurar às emissoras intermináveis renovações do direito de exploração das concessões públicas de rádio e TV. O autor, no entanto, observa a ocorrência de tímidos movimentos lançados com o intuito de induzir a mídia a produzir conteúdos de qualidade, como a campanha “Quem financia a baixaria é contra a cidadania”, da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados. Lançada em 2002 em parceria com entidades da sociedade civil, a campanha se dedica ao acompanhamento de programas da TV aberta. O que segundo Christofoletti (2003), “pode se converter num eficiente indicador para uma reavaliação das concessões na TV brasileira”. Até 13 de abril de 2003, mais de 800 manifestações haviam chegado à Comissão de Direitos Humanos, queixando-se de abuso na exibição de cenas consideradas impróprias para o horário, de sensacionalismo, apelo sexual e incitação à violência. Apoiado no trabalho da campanha, o Ministério Público de São Paulo entrou com representação no Ministério da Justiça contra o Programa do João Kleber (Rede TV) pedindo a mudança do seu horário de exibição. A campanha faz o levantamento dos piores programas televisivos para depois desestimular os anunciantes a patrocinarem tais iniciativas. A idéia é secar as fontes de financiamento de certos conteúdos, impondo novos padrões de qualidade para a programação. (CHRISTOFOLETTI, 2003, p.7) E para o francês Jean-Claude Bertrand (2002), o antídoto para todos esses impasses depende justamente do envolvimento da sociedade civil. Defensor de uma liberdade de imprensa a serviço dos cidadãos e não das empresas, Bertrand (2002) propõe a criação de sistemas de responsabilização da mídia, por ele definidos como
  • 25. 25 “quaisquer meios de melhorar o serviço de mídia ao público, totalmente independentes do governo”. E de todos os grupos envolvidos na Comunicação Social somente dois, na opinião do autor, estariam habilitados a integrar estes sistemas de controle da qualidade do jornalismo: os jornalistas e o público consumidor. Uma parceria que renderia inúmeros benefícios, segundo Bertrand (2002). Espera-se que atinjam seu objetivo aumentando a competência dos jornalistas e descobrindo (por meio de observação e análise) o que a mídia faz e não faz, em comparação com o que deveria fazer. E, sobretudo, os MAS (Media Accountability Systems, Sistemas de Responsabilização da Mídia) capacitam os veículos de comunicação a ouvir as opiniões dos consumidores, a saber do que gostam, não gostam ou podem vir a gostar. Graças a eles, a mídia consegue descobrir, corrigir, explicar seus erros e equívocos, desculpando-se por eles. Esses sistemas são um misto de controle de qualidade, serviços ao consumidor, educação contínua e muito mais – não apenas, decerto, auto-regulamentação. Aos cidadãos, os MAS devolvem os direitos humanos que a casta dos profissionais de mídia costuma confiscar. (BERTRAND, 2002, p.35) Para Bertrand (2002), a fiscalização da mídia por entidades não- governamentais compostas por quem produz e consome os produtos da mesma é a maneira mais segura de obter uma efetiva melhora do serviço, já que a intervenção do Estado poderia acarretar “conseqüências desastrosas, como o estabelecimento de um regime autoritário”. E quanto ao mercado, a ressalva que Bertrand (2002) faz é decorrente da natureza gananciosa da classe empresarial e de sua ainda incipiente consciência de responsabilidade social. Apelar para a lei ou ceder ao mercado? A legislação cerceia o abuso dos mercadores. A livre-empresa cerceia o abuso do Estado. Mas muitas falhas dos jornalistas (como incompetência, arrogância, parcialidade, covardia, mendacidade) ou da mídia (bairrismo, infoentretenimento, autocensura, publicidade disfarçada) não podem ser sanadas por códigos e tribunais. Quanto ao mercado, é responsável por várias dessas falhas e incapaz de curar outras. Uma terceira força é necessária. (BERTRAND, 2002, p. 31/32) De acordo com as palavras de Bertrand (2002), anteriormente referidas neste capítulo, os sistemas de responsabilização da mídia são um misto de controle de qualidade, serviço ao consumidor, educação contínua e muitos outros meios além de auto-regulamentação. De acordo com o autor, o conceito reúne perto de sessenta desses meios e todos já foram utilizados, “do espaço de correção à crítica interna, da associação de espectadores à comunidade universitária”. E por tamanha ser a abundância de meios disponíveis para perseguir um único objetivo, Bertrand
  • 26. 26 (2002) as dividiu em três grupos: documentos impressos ou difundidos por radioteledifusão; pessoas, indivíduos ou grupos; e processos, longos ou curtos. 1.4 O OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA O Observatório da Imprensa é entendido como um meio de regulação da mídia por ser um veículo jornalístico totalmente independente de governos, cuja proposta é cobrar da mídia o cumprimento de seus deveres e responsabilidades por meio da crítica. Também colaboram para esse entendimento o fato do site ser comandado por um jornalista experiente e ser aberto à participação do cidadão consumidor de informação. Fruto de uma iniciativa do Instituto para o Desenvolvimento do Jornalismo (Projor) e de um projeto original do Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor), da Universidade Estadual de Campinas, o Observatório da Imprensa (2011) “é um veículo jornalístico” que tem como proposta a análise crítica do desempenho da mídia brasileira. Lançado como site da web em abril de 1996, o veículo tem como editor o jornalista Alberto Dines. Com o passar do tempo o Observatório da Imprensa foi expandindo suas atrações para outras mídias, contando hoje com programas televisivos (desde 1998) e radiofônicos (desde 2005). O veículo também se apresenta, no site, como uma “entidade civil, não- governamental, não-corporativa e não-partidária”, cuja proposta é funcionar como um palco de discussão permanente, onde os usuários das mais diversas mídias tenham a possibilidade de participar ativamente de um processo do qual, segundo o veículo, “até há pouco desempenhavam o papel de agentes passivos”. No entanto, para Albuquerque (2001), mais que oferecer um espaço de debate e confronto de opiniões a agentes sociais diversos, o Observatório da Imprensa atua como agente provocador deste processo. O autor chegou a essa conclusão depois de analisar 24 das primeiras 96 edições do site. Ele se apresenta também como um agente que toma parte ativamente no debate, defendendo posições, buscando influenciar os outros agentes, etc. Obviamente, ele não o faz de uma perspectiva “neutra”, desprovida de qualidades, regras e vícios. Alberto Dines e seus principais colaboradores não são, obviamente, jornalistas “universais” e não têm procuração para falar em nome da classe como um todo. Os seus discursos são permeados por conceitos e preconceitos que refletem as suas trajetórias particulares dentro do jornalismo (ou em referência a ele). (ALBUQUERQUE, 2001, p.1)
  • 27. 27 De acordo com os objetivos relatados no site do Observatório da Imprensa, o que o veículo avalia é o produto jornalístico e não os grupos de comunicação de massa ou os profissionais que executam suas diretrizes. O Observatório da Imprensa ainda esclarece que “não pretende competir, substituir ou alinhar-se” a qualquer entidade representativa da categoria ou de mídias, “como a ABI, a FENAJ, a ABERT, a ANJ e a ANER” (OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA, 2011). Embora o pioneirismo de suas atividades seja destacado no site, consta na apresentação do mesmo que o veículo não pretende ser o único do gênero crítica da mídia e convoca outros grupos a fazerem o mesmo. Ainda que não especifique quando, é informado no site do Observatório da Imprensa que a crítica da mídia surgiu nos Estados Unidos “como forma de sensibilizar a comunidade e os profissionais da mídia para a complexidade da função jornalística na sociedade moderna” (OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA, 2011), somando-se às experiências anteriores do ombudsman e do media-criticism. É dito ainda que o país conta com pelo menos duas organizações semelhantes, cada qual com sua perspectiva política própria: a FAIR (Fairness & Accuracy in Reporting), cujo enfoque é a análise da intromissão do poder econômico e político na imprensa, e a Accuracy in Media, mais inclinada a indicar as infiltrações e distorções liberais na grande imprensa americana. Embora concorrentes, as duas organizações – segundo o texto de apresentação do Observatório da Imprensa – se completam, “constituindo um sólido aparelho crítico, pluralista e democrático”. (OBSERVATÓRIO DA IMPRENSA, 2011) O Observatório da Imprensa é formado por uma equipe composta por editor responsável, redator chefe, editores assistentes, redatores, produtores, colaboradores, administrador, consultor e membros do Projor, num total de 25 pessoas. Apresenta um conjunto de 14 seções, sendo cada uma delas dedicada ao tratamento de um assunto específico. O site do Observatório da Imprensa é patrocinado pela Petrobrás, Embraer e bancos do Brasil e Bradesco. O portal ainda conta com atrativos como o OI na TV, Vídeos OI, OI no Rádio e Blogs OI, que oferecem ao internauta a possibilidade de acompanhar os últimos programas de rádio e TV do veículo, além do acesso a blogs. O site é formado por diversas seções, que de acordo com Albuquerque (2001, p.2) são “presididas por suas próprias regras de ocupação, as quais
  • 28. 28 determinam os tipos de temas a serem tratados e de agentes a serem aceitos em cada uma delas”. Conclui-se, então, por inferência, que as seções são as editorias do Observatório da Imprensa. E ainda segundo o autor, a montagem da página de abertura do site sinaliza a existência de uma escala de valor relativa, que varia de edição para edição. O destaque que determinada seção recebe, maior ou menor, é atribuído por Alberto Dines e sua equipe de colaboradores. O status dessas seções é variável: o índice publicado na página de abertura do Observatório da Imprensa fornece um referencial bastante eficiente acerca do status relativo de cada uma das suas seções (quanto mais acima e à esquerda estiver situada uma seção, maior deverá ser a sua importância); a existência de chamadas ou ilustrações referentes a uma seção também constituem critérios de distinção de uma seção. Do mesmo modo, o status dos agentes que participam do Observatório da Imprensa também varia, em função dos espaços que habitualmente eles ocupam e da frequência com que o fazem. (ALBUQUERQUE, 2001, p.2/3) A seção Circo da Notícia, de acordo com Albuquerque (2001), pode ser apontada como o espaço editorial do Observatório da Imprensa, já que é ocupada quase que exclusivamente por artigos de seu editor-chefe, Alberto Dines. A seção é ocupada por artigos que refletem às “concepções particulares do Observatório sobre questões relacionadas à ética e à responsabilidade social da imprensa”, (ALBUQUERQUE, 2001, p.5). Na seção Imprensa em Questão, a temática discutida, segundo Albuquerque (2001, p.10), “é bastante semelhante à do Circo da Notícia: questões relativas à ética e à responsabilidade social do jornalismo”. O que distingue uma da outra, conforme o autor, é o ponto de vista plural da Imprensa em Questão, ou seja, a opinião é exercida por agentes sociais diversos, além da do editor-chefe do Observatório e sua equipe. Essa participação, entretanto, é induzida pela equipe do Observatório da Imprensa. É que de acordo com Albuquerque (2001, p.10), textos são coletados “para pautar ou servir [...] de apoio para os artigos publicados”. O autor cita como exemplo a publicação do artigo “Coisas do Passado”, escrito por Alberto Dines à época de seu vínculo com o jornal Folha de São Paulo, mas que não foi divulgado por estar em desacordo com a linha apartidária do veículo. “Tal fato gerou, na edição de no 56, um ‘Dossiê Censura’, aberto justamente pelo texto não publicado”, (ALBUQUERQUE, 2001, p.10). “Dossiê Censura” foi o nome dado à cartola do conjunto de textos originados pela publicação do artigo “Coisas do Passado”, de Dines. Agrupados pelo trabalho de edição, os artigos foram publicados sob o título “Crise nos Jornais”. De acordo
  • 29. 29 com Albuquerque (2001), o título e a cartola são recursos de edição utilizados no Observatório da Imprensa para atribuir um sentido geral a um determinado conjunto de textos fundamentalmente distintos. No caso já referido, a intervenção resultou, nos dizeres de Albuquerque (2001, p.11), num “amplo arco de apoio em torno de Dines”. Mas o que realmente chamou a atenção do autor foi o tratamento dispensado pelo veículo a única opinião dissonante do conjunto. [...] o texto é curto demais, o que conspira contra a coerência do argumento; seu conteúdo é relativizado pelo uso de aspas; mesmo a identidade do autor da frase é apagada, em contraste com a “Manifestação dos leitores da Folha”. Os próprios títulos dos dois textos contrastam: no caso do telespectador da versão televisiva do Observatório, o título destaca o fato de se tratar de uma manifestação singular; no caso da Folha, porém, o título se refere à manifestação de leitores, embora a introdução do texto afirme que a carta foi a “única manifestação na seção Painel do Leitor da Folha de S. Paulo”. O efeito é evidente: enquanto a carta do leitor da Folha é tratada como representativa do pensamento do conjunto dos leitores do jornal, a tomada de posição favorável à Folha é caracterizada como puro nonsense. (ALBUQUERQUE, 2001, p.11) Na percepção de Braga (2006), que analisou o Observatório da Imprensa de 2001 a 2003, não foi por acaso que Albuquerque (2001) identificou a existência de um “amplo arco de apoio em torno de Dines” na seção Imprensa em Questão. É que Braga (2006, p.112) entende ser “evidente que os artigos selecionados para essa seção o são em função de se caracterizarem como bons exemplares da démarche crítica preferencial” do veículo. (BRAGA, 2006, p.112) O que caracteriza a seção, conforme Braga (2006, p.113), como “o campo de um jogo ‘regulamentado’ pelos critérios definidores da ‘posição OI’. Já Albuquerque (2001, p.10) insinua quase a mesma coisa, ao observar que “a Imprensa em Questão é um espaço plural, mas [...] isso não significa necessariamente que se trata de um espaço aberto”. Essas veladas intervenções promovidas pela equipe do site são decorrentes, de acordo com Braga (2006), da natureza militante da crítica do Observatório, que busca, por meio desse recurso, conquistar a adesão do leitor ao conjunto de valores e critérios defendidos pelo veículo como sinônimos de bom jornalismo. “[...] o esforço da crítica é vergastar pontos de vista diferenciais e buscar o aliciamento dos leitores para o ponto de vista assumido”. (BRAGA, 2006, p.129) De acordo com os valores e critérios apontados por Braga (2006) como norteadores da linha de ação crítica do Observatório da Imprensa, o que o veículo cobra é um jornalismo crítico, com profissionais dotados de um poder de análise e
  • 30. 30 interpretação capaz de proporcionar ao leitor uma perspectiva mais aguda e refletida acerca dos fatos que apura. A responsabilidade política da imprensa também é bastante enfatizada, já que segundo Braga (2006) a imprensa é tida pelo Observatório como base principal da esfera pública, o meio pelo qual a política se realiza: “no sentido forte, de planejamento das ações da sociedade, que não se reduz às estratégias político-partidárias”, (BRAGA, 2006, p.114). De modo que tudo o que for produzido pela mídia que conflitar com estes valores será expressamente criticado no Observatório da Imprensa. Como explica o autor: [...] apresenta matérias que fazem a crítica de ações, na sociedade (ações de jornais, mas também de setores econômicos e políticos) que possam ter alguma incidência restritiva sobre a imprensa e particularmente sobre uma imprensa crítica. Igualmente, considerações sobre a legislação e a jurisprudência que possam ter incidência sobre o jornalismo pretendido. [...] Parece-me que essa “linha de ação” crítica determina os demais ângulos e componentes do jornal. O Observatório da Imprensa também reproduz, na seção A Voz dos Ouvidores, críticas feitas por ombudsmans ou colunas de ouvidores de jornais. O conteúdo, porém, só é publicado se apresentar similaridade com a implícita cartilha de valores do veículo. E por ter essa característica, de reprodução de publicações externas que reforçam sua posição, a seção se constitui, na visão de Braga (2006), como uma das principais seções do Observatório da Imprensa. Para Albuquerque (2001, p.14), o poder de cacifar os próprios discursos e de enfraquecer as opiniões dissonantes torna o Observatório da Imprensa “um espaço muito menos plural do que nos parecia ser a princípio”. A Entre Aspas, de acordo com Braga (2006), é a única seção do site em que as mais antagônicas interpretações coexistem harmonicamente, sem intervenções ou manobras editoriais. A seção é ocupada por matérias e/ou artigos assinados, que foram publicados em algum veículo de imprensa no país. “Com a característica de um clipping organizado tematicamente (‘imprensa’), aparece toda uma diversidade de notícias e interpretações, [...] em que o que importa efetivamente é o ‘falar sobre imprensa’”, (BRAGA, 2006, p.119) Na seqüência, ao traçar um paralelo comparativo entre a crítica do Observatório da Imprensa com a feita pelo ombudsman (jornalista existente em alguns veículos cuja função é a crítica dos pares em cima de erros por eles cometidos) o autor identifica que o fato em comum é a de que em ambos os casos críticos e criticados fazem parte da mesma profissão. Observa, no entanto, que a
  • 31. 31 crítica do ombudsman é feita internamente (o crítico trabalha no mesmo ambiente do alvo de sua crítica) e embasada nos padrões profissionais vigentes. Trocando em miúdos, o ombudsman critica o jornalista que, com ou sem intenção comete deslizes na produção das matérias, afastando-se do modelo comum da produção jornalística. Enfoque este inversamente proporcional ao do Observatório da Imprensa, que desenvolve a crítica em cima de alguns dos padrões vigentes e suas realizações práticas. Prosseguindo o relato da crítica feita no Observatório da Imprensa, o autor diz que: Os processos jornalísticos são cotejados com uma posição política mais ampla, que cobra sua revisão. Paralelamente, não há propriamente negociação de interpretações – a crítica se coloca como interpretadora/definidora baseada na experiência profissional e analítica do Observatório. Como essa posição é constituída sobretudo por um dever ser (mais do que por uma cobrança de ajustes ou de correção pontual de desvios), demarca-se como um ponto de vista militante. [...] o esforço da crítica é vergastar pontos de vista diferenciais e buscar o aliciamento dos leitores para o ponto de vista assumido. (BRAGA, 2006, p.129) A idéia central do Observatório, de acordo com Braga, seria então o combate aos padrões usuais do fazer jornalismo, criticando-os e argumentando em defesa da troca por outro modelo, menos neutro e mais opinativo. Diferente do ombudsman, a crítica do Observatório não se preocupa em ensinar o leitor, em esclarecê-lo acerca dos métodos e técnicas corretos do fazer jornalismo. Muito antes pelo contrário, o esforço da crítica é dirigido à conquista da adesão do leitor à visão do Observatório, numa ação que o autor configura como militante. Isso não significa que não se aprenda através da leitura sistemática do site. Pelo contrário, aprendemos muito sobre a imprensa e seus processos. O que assinalo apenas é que o discurso do jornal não se organiza de modo didático – a interlocução não é assim expressamente construída – como diálogo entre conhecedor e aprendiz, e sim, antes, como apelo de adesão aos bons valores. A interlocução não é voltada para o desenvolvimento de conhecimentos e competências, mas para o embate de valores. (BRAGA, 2006, p.130) O autor também contesta o mote escolhido pelo Observatório, representado pela frase “Você nunca mais vai ler jornal do mesmo jeito”, que acompanha o nome do site a cada número. No entendimento dele, a frase insinua equivocadamente que o leitor comum de jornais é o público-alvo do OI, a quem o veículo dirige suas atenções e concentra seus esforços para ensinar, desenvolver e/ou ampliar a capacidade de leitura crítico-interpretativa das notícias. Para Braga (2006), ensinar está longe de ser a preocupação dominante do Observatório. A idéia, segundo o autor dá a entender no trecho abaixo, é persuadir o leitor e captá-lo para o “time”, de
  • 32. 32 modo que ao longo do tempo este também se torne um defensor/difusor das idéias do Observatório. O aprofundamento da interpretação faz rever essa hipótese. A discussão não se faz entre profissionais e críticos, de um lado, e leitores, de outro. Parece antes se fazer entre iniciados (críticos, militantes – jornalistas ou não), dando acesso a esse debate, para que o leitor possa se tornar, ele também, um “iniciado”. E é só pela passagem a esse outro patamar que o dístico se realiza. Não é, portanto, uma promessa pedagógica, mas um desafio. (BRAGA, 2006, p.131) Após discorrer sobre o tom militante da crítica do Observatório da Imprensa, Braga direciona sua análise para os interlocutores do portal. Ao identificar a existência de três distintas categorias de público, o autor explica a função de cada uma dentro da estrutura do site, e fala sobre a postura de ação que o veículo adota com cada público. Um nós fortemente sintonizado com os valores e com os processos críticos de defesa desses valores; os “adversários”, que são vergastados [...] por se contraporem ou [...] por nem sequer perceberem a validade dos critérios que deveriam estruturar a boa imprensa; e um leitorado disperso, que pode ser composto por jornalistas, estudantes e usuários interessados, leitores habituais da imprensa de interesse político (que deve ser convencido através do vigor crítico do OI). Em suma: trata-se da estrutura básica da boa militância político-social (e, no caso, também profissional). Essa seria a estrutura da polêmica do Observatório. (BRAGA, 2006, p.131) 2. METODOLOGIA Para que se possa cumprir o papel exigido neste trabalho de iniciação científica, que é de cotejar a teoria com a prática, se optou pela metodologia qualitativa, na modalidade de estudo de caso, que segundo Yin (2001) é uma pesquisa fundamentada na observação e exploração dos fatos que envolvem um determinado fenômeno contemporâneo dentro de um contexto de vida real, onde diferentes fontes de evidência são utilizadas. O Estudo de Caso, conforme Yin (2001), é a estratégia mais adequada para responder a questões do tipo “como” e “por que”, em situações em que o pesquisador tem pouco controle sobre os eventos. Assim sendo, as técnicas de pesquisa empregadas foram a coleta de entrevistas e documentos, que servirão de base para responder as perguntas já referidas. Conforme posteriormente veremos na análise do caso propriamente dito, diversos personagens emitiram suas opiniões à luz daquilo que representou o cerne do linchamento moral ou desgaste atribuído a Ibsen. Aliás, faz-se importante dizer que o termo “linchamento de Ibsen” serviu de cartola para dois desses artigos, um
  • 33. 33 deles de autoria do próprio editor-chefe do site, Alberto Dines. E todas essas opiniões vieram à tona a partir da matéria publicada pela revista Istoé em agosto de 2004 que, na verdade, foi a sentença de absolvição pública da imprensa, embora por outro veículo que não o prolator da “sentença condenatória”, no caso a revista Veja, em novembro de 1993. E a fim de responder de que forma o erro ganhou visibilidade e como o mesmo foi analisado no âmbito dos jornalistas, dividiu-se os artigos em grupos e a partir do meio em que foram originalmente publicados, sendo que todos foram reproduzidos pelo Observatório da Imprensa. Erro do repórter Responsabilidade Erro das fontes Erro da Imprensa da revista 5 - 12 4-5 2-3 9 - 11 Paulo Moreira Florência Costa Adam Sun (2) Eliane Cantanhêde Leite (5), Benito (1), Eduardo (1), Guilherme Gama (1), Luis Ribeiro (1), Fiuza (1), Mauro Costa Pinto (4), Tereza Cruvinel Malin (2), Carlos Reinaldo (1), Alberto Dines Brickmann (1), Azevedo (1), (2) José Paulo Lanyi Dora Kramer (1) (1), Marcelo Beraba (1), Luiz Egypto (1), Alberto Dines (2), Deonísio da Silva (1)
  • 34. 34 Entre Aspas. Imprensa em Entre Aspas (6) e Imprensa em Questão (5), Imprensa em Questão (1) Entre Entre Aspas (10), Questão (4). Aspas (6) e Voz Circo da Notícia dos Ouvidores (1). (1), Voz dos Ouvidores (1). No grupo “Erro do Profissional”, quatro autores apontam o então repórter Luis Costa Pinto como o responsável por levar adiante uma história que sabia não ser condizente com a verdade. No grupo “Responsabilidade da Revista”, quatro autores atribuem a Veja a culpa pelos danos que sua matéria provocou ao então deputado Ibsen Pinheiro, em novembro de 1993. Já na opinião de outros dois autores, a responsabilidade pelos erros nos números divulgados por Veja deve ser imputada às fontes. E para 11 articulistas, a responsabilidade pelo erro recai sobre toda a imprensa, já que nenhum veículo se empenhou em recuperar o episódio e restabelecer a verdade dos fatos. 2.1 ERRO DO PROFISSIONAL Dos 28 artigos coletados, o grupo “Erro do Profissional” responde por 42% do total, com 12 colaborações. As opiniões dos autores Paulo Moreira Leite, Luis Costa Pinto, Benito Gama, Reinaldo Azevedo e Dora Kramer foram exibidas na seção “Entre Aspas” do Observatório da Imprensa. Editor executivo de Veja à época da publicação da reportagem “Até tu, Ibsen?”, de 17 de novembro de 1993, Paulo Moreira Leite classifica a versão de Luis Costa Pinto como “fantasiosa”. Ele admite ter telefonado para Lula (apelido de Costa Pinto) informando que Adan Sun havia detectado erro nos números referentes aos depósitos nas contas de Ibsen, mas nega que tenha orientado o repórter a procurar alguém que sustentasse o valor. No artigo “Radiografia de uma mentira”, exibido pelo jornal O Globo em 18 de agosto de 2004 e reproduzido pelo Observatório da Imprensa seis dias depois, Moreira Leite argumenta que telefonou para cobrar transparência: “Se havia deputados acusando Ibsen, eles deveriam assumir sua
  • 35. 35 responsabilidade e não usar a imprensa como bucha de canhão”. Já em outro artigo, divulgado pela Istoé em 17 de agosto de 2004, o atual colunista da revista Época afirma que o erro encontrado por Adam Sun não o havia surpreendido, já que a condução do impeachment de Fernando Collor havia rendido a Ibsen diversos desafetos. E que diante dessa descoberta ligou para Costa Pinto a fim de ouvir o que o repórter tinha dizer. A decisão de divulgar números contestados pela própria equipe de checagem, segundo Moreira Leite, teria sido tomada por causa dessa conversa, em que Costa Pinto categoricamente descartava qualquer hipótese de ser vítima de uma armadilha: “Ninguém nos proibia, naquele momento, de publicar duas versões, o que teria ao menos amenizado o erro.” (artigo 8) Embora o esforço percebido nos artigos de Paulo Moreira Leite para se isentar de culpa sobre a matéria que exibiu depósitos inexistentes nas contas de Ibsen Pinheiro, para Bucci (2000) o ex-editor executivo de Veja tem sim grande responsabilidade no episódio. Não que o autor tenha feito referência a este caso específico ou tecido algum juízo de valor sobre o mesmo. Mas sim porque afirma que “os que comandam [...] devem incluir no seu rol de afazeres a formação ética permanente dos jornalistas, dando-lhes retorno transparente sobre cada decisão”. (BUCCI, 2000, p.207) O autor acrescenta que o mais importante dentro das redações é o exemplo que os chefes dão para os mais os novos. É que para Bucci (2000), a tendência é que os subordinados se espelhem nos mesmos, ou seja, reproduzam suas ações. Por trazer informações incondizentes com a versão de outros autores, optou- se por ultrapassar excepcionalmente os limites da pesquisa com o adendo de um parlamentar citado tanto no relato de Costa Pinto, publicado pela Istoé, quanto na reportagem de Veja que originou este estudo. Trata-se de Benito Gama, ex- deputado que exerceu o comando da CPI do Orçamento e da subcomissão bancária da mesma em 1993. Em artigo publicado na versão online de Veja, de 17 de agosto de 2004, ele nega que tenha recebido pedido de Costa Pinto para confirmar qualquer informação falsa sobre Ibsen. E insinua, inclusive, que sequer serviu de fonte para a matéria: “A fonte do jornalista [...] era oculta na época. Preferiu mentir [...] informando a seu editor [...] que tinha obtido as informações através de mim, o que não era verdade”. (artigo 28) Por fim, Benito Gama disse repudiar a tentativa de Luis Costa Pinto de imputar a terceiros a responsabilidade pelas falsas acusações
  • 36. 36 que perpetrou contra a honra de Ibsen e que ingressaria na justiça contra o jornalista por crime de calúnia e difamação. Atual colunista da revista Veja, Reinaldo Azevedo, um jornalista assumidamente avesso ao Partido dos Trabalhadores, acredita que o erro que vitimou Ibsen pode ser debitado em boa parte a incapacidade do então repórter Luis Costa Pinto de ler ou de ao menos questionar as reais intenções da ida de Waldomiro Diniz à sucursal brasiliense de Veja. Para Azevedo (artigo 20), o repórter encarou o aliado dos então deputados petistas Aloizio Mercadante e José Dirceu como “um troço guerreiro, a agir sozinho, movido pelo desejo de justiça”, quando na verdade simplesmente representava a peça de uma engrenagem, a obedecer a estratégia de inserção de um partido na vida pública. Na visão do autor, isso acontece porque a imprensa está contaminada pelo espírito de esquerda, de fazer justiça com as próprias mãos, de punir os poderosos, os ricos, as elites, e que isso, aliado à determinação de fazer da opinião pública a caixa de ressonância de seus valores e teses têm contribuído para fazer o mau jornalismo. Para a jornalista Dora Kramer, as falsas informações propagadas contra Ibsen Pinheiro nasceram de uma arriscada combinação de elementos (ambição, ignorância, má-fé, açodamento e leviandade). Sem citar nomes, a autora julga que a associação desses elementos levou a um conluio contra Ibsen que culminou com a publicação da matéria. Mas se aqui a impressão que fica é a da divisão equânime de responsabilidades, mais adiante a autora deixa transparecer sua opinião sobre o principal responsável pelo erro. Ao condenar o jornalismo de delegacia de polícia, onde segundo ela o jornalista “abre mão do dever de distinguir dados falsos de informações verdadeiras”, deixando-se levar “pelo primeiro construtor de dossiês que lhe aparece à frente”, fica fácil deduzir que a crítica sugere falta de imperícia por parte do repórter na condução do caso. Embora advirta que obedeceu à instrução de seu chefe à época para levar a cabo uma matéria calçada em uma falsa prova, Luis Costa Pinto não se furta de assumir a responsabilidade pelo texto. No próprio depoimento, publicado pela Istoé, Costa Pinto já admite sua culpa. Diz que se deixou fascinar pela possibilidade de emplacar um furo de reportagem e que isso, somado ao pouco tempo que dispunha para fechar a edição, o levou a ignorar a checagem das informações. E com relação a sua anuência ao plano de dar curso às falsas acusações por meio de uma fonte oficial, Costa Pinto lançou mão da juventude para justificar sua omissão. Disse que
  • 37. 37 por ter só 24 anos de idade na época não tinha acumulado maturidade suficiente para se insurgir contra o comando e que não teme ser condenado por revelar as falhas que teve e estar do lado da verdade. Em outro momento, o repórter admite que o medo de perder o emprego falou mais alto, levando-o a seguir a orientação. Os interesses profissionais alegados por Costa Pinto para justificar sua anuência á orientação de seu ex-chefe revelam que em nenhum momento o repórter levou em consideração as normas, princípios e valores do Código de Ética do Jornalismo. Mais do que isso, mostram a falta ou a fragilidade de seu caráter como cidadão à época, que como ele mesmo insinua estava ainda em formação. A dedução advém das teses de Martins e Abramo (1997), que afirmam ser impossível separar a conduta profissional da cidadã. Em outras palavras, os autores acreditam na reprodução, por parte do indivíduo, do mesmo padrão de comportamento nas mais diversas áreas da vida. “Ninguém se torna venal da noite para o dia”, afirma Martins (2005, p.31). Contextualizando a sentença de Martins (2005, p.31), a atitude conivente de Costa Pinto não pode ser entendida como um fato isolado. “O jornalista [...] geralmente vai baixando a guarda aos poucos. Um dia, faz uma pequena concessão; dias depois, cede um pouco mais; semanas mais tarde, enfia o pé na lama.” O que pode ser comprovado pelo próprio relato de Costa Pinto, ao afirmar que por diversas vezes silenciou ao testemunhar a chefia constrangendo colegas a encontrar frases de fontes que confirmassem o que já havia sido redigido. 2.2 RESPONSABILIDADE DA REVISTA A opinião de que o erro deve ser creditado à revista foi compartilhada por quatro autores, num total de cinco colaborações. Os artigos dos jornalistas Florência Costa, Eduardo Ribeiro, Tereza Cruvinel e Alberto Dines correspondem a 17% do total coletado. A jornalista Florência Costa, atualmente vinculada à Istoé, diz em seu artigo que é longa a história dos erros da mídia e seus efeitos arrasadores para acusados e acusadores. A autora diz ainda que a mídia americana protagonizou uma avalanche de erros e retratações nos últimos anos e que a imprensa brasileira, embora mais jovem, não fica muito atrás. Costa não faz nenhuma referência a Veja ou ao episódio de erro jornalístico envolvendo o ex-deputado Ibsen, mas sugere a
  • 38. 38 responsabilidade da revista em dois momentos. Primeiro, ao destacar que mais importante que dar um furo de reportagem é antes se certificar de que o mesmo está correto. E depois ao recomendar, para casos de erros, postura semelhante à adotada pelo Correio Braziliense, que no ano 2000 ganhou o Prêmio Esso de jornalismo por destacar, na própria capa, a admissão de um vacilo por meio da manchete: “O Correio Errou”. “Se errou, é melhor consertar”, completa. Outro que atribui à revista Veja a responsabilidade pelo erro é Eduardo Ribeiro. Em seu artigo, comemorou o momento que o país atravessava, de discussão aberta de questões importantes relacionadas à imprensa, e disse esperar que o debate acarretasse o aprimoramento da atividade. Em outras palavras, o que Ribeiro defende é o fim da tolerância para com os erros de imprensa: “Se [...] errou, que repare o erro e que seja punido se for o caso, como acontece em qualquer outra atividade. Não somos diferentes nem devemos ter foro privilegiado. Delito de opinião é crime e ponto.” (artigo 26) E ao sustentar que os veículos de mídia devem ser responsabilizados por tudo o que veiculam, principalmente em casos de ataque a honra alheia, o autor condena Veja por ter dado mais destaque ao seu revide à Istoé do que a correção do erro que cometeu na matéria sobre Ibsen. “Os veículos olham os erros dos outros, e dependendo do caso carregam nas tintas, para desmoralizar um eventual concorrente, mas na hora de olhar seus próprios erros são míopes e econômicos”. (artigo 26) Presidente da TV Brasil até 1° de novembro do corrente ano, quando então transferiu o cargo ao colega Nelson Breve, a jornalista Tereza Cruvinel escreveu artigo sobre o caso contendo uma entrevista com o alvo das acusações de Veja em 1993, Ibsen Pinheiro. Ela entende que a matéria de Istoé e a respectiva confissão de Costa Pinto representam “o reconhecimento tardio de houve erro numa das reportagens que fundamentaram o processo de cassação” (art. 27) do mandato do político. Porém, traz trechos de conversas que teve com Ibsen que colidem com seu próprio julgamento do episódio: “Ninguém teria tal força, isoladamente. Nem o que Veja fez foi discrepante do clima generalizado de então. Não fui cassado por uma revista, mas pela Câmara dos Deputados [...] Era cassar ou cassar”. Editor-chefe do Observatório da Imprensa, Alberto Dines é o único dos autores estudados a fazer parte de dois dos quatro grupos em que a análise foi dividida. É que ao tecer duras críticas a contenda pública travada pelas rivais Veja e Istoé, Dines afirmou, no artigo que titulou como “A guerra dos ventiladores”, que “foi
  • 39. 39 na redação de Veja que se inventou a técnica de induzir os entrevistados a dizer aquilo que o redator já colocara na matéria”. E embora o autor faça referência a outro episódio de erro protagonizado por Veja, pode-se deduzir que ele não descarta a versão de Costa Pinto, que alega ter sido orientado pela chefia a procurar por alguém disposto a sustentar as falsas informações que dispunha. “O erro só foi assumido semanas depois, porque a infalibilidade olímpica dos chefes de redação não permitia o reconhecimento do deslize.” (artigo 3) 2.3 ERRO DAS FONTES Ocupado exclusivamente pelo jornalista Adam Sun, então chefe da equipe de checagem de Veja à época da publicação da reportagem “Até tu, Ibsen?”, de 17 de novembro de 1993, o grupo “Erro das Fontes” representa 7% do total de artigos levantados, com duas colaborações. Em artigos publicados pela versão online da Veja e pela revista Istoé, reproduzidos no site do Observatório da Imprensa, Sun admite que dois cheques enviados por Costa Pinto à matriz de Veja realmente estavam supervalorizados em 1000%, mas nega que os mesmos tenham sido considerados na soma que apontou o montante de um milhão em depósitos nas contas do ex-deputado: “A checagem somou 182.000 dólares com 881.000, valores dados por ‘um auditor do Banco Central, a pedido da CPI’, e o resultado conferia: um pouco mais de um milhão”. Sun complementa afirmando que a checagem só autorizou a publicação do número depois de reconfirmar os dados com o autor da apuração, sugerindo, assim, que se alguém errou nas contas de Ibsen esse alguém com certeza era a fonte. 2.4 ERRO DA IMPRENSA Abrindo o grupo dos articulistas que comungam da hipótese de “Erro da Imprensa”, representando 39% do total de artigos levantados está o mais incisivo deles: o editor-chefe do Observatório da Imprensa, Alberto Dines. Para o autor, a reportagem de capa da edição 1.819 de Istoé revela “um dos maiores libelos contra os procedimentos irresponsáveis da nossa imprensa nos idos de 1992-93”. Ele compara Ibsen a Alfred Dreyfus, um oficial de artilharia do exército francês que
  • 40. 40 estava sendo condenado por traição com base em documentos falsos. Na ocasião, os oficiais do alto escalão francês se deram conta disso, mas tentaram ocultar o erro judicial. “Veja errou em 1993, mas na ocasião ninguém esperneou em defesa do deputado Ibsen Pinheiro. Nem a agora generosa Istoé”, conclui. E ao classificar o erro de Veja como uma "formidável barriga", Dines insinua que o episódio alterou o curso da história e da conjuntura política do país no momento, já que acarretou o abandono da disputa presidencial de um quase candidato. Por fim, recorda que o nome de Waldomiro Diniz, o mesmo que foi até a sucursal brasiliense de Veja com boletos bancários adulterados de Ibsen nas mãos, foi apontado no noticiário de fevereiro de 2004 como abastecedor dos então deputados Aloizio Mercadante e José Dirceu nas investigações da CPI do Orçamento. E critica a imprensa por ter se omitido de associar o mesmo como artífice da calúnia contra Ibsen e de restabelecer a verdade sobre o caso: “Se [...] no delírio das denúncias não aparece nas redações um jornalista capaz de [...] buscar a verdade onde ninguém a procura, então estamos completa e definitivamente ferrados”. Ao destacar que o direito individual de não ter a honra violada é tão importante quanto o direito público da sociedade à informação, Mauro Malin cobra a criação de um órgão representativo dos jornalistas que se ocupe de intervir a favor das vítimas de abusos praticados pela imprensa. E condena o movimento empreendido por Veja e pelos jornais O Globo e Folha de São Paulo no sentido de minimizar os efeitos das falhas cometidas para a cassação do ex-deputado Ibsen Pinheiro. “Para atenuar o alcance dos desatinos que comete, a mídia não hesita em reduzir sua própria importância no processo político. [...] Em lugar nenhum do mundo a mídia gosta de reconhecer seus erros ou dar satisfações a quem quer que seja”. (art.22) Essa dificuldade dos veículos de comunicação em lidar com a crítica foi apontada por Christofoletti (2003) como um dos dez entraves por ele identificados para uma reforma dos procedimentos adotados pela mídia. Segundo o autor, os poucos empresários do ramo da comunicação agem assim porque são muito poderosos, dominando 80% de tudo o que é visto, lido ou ouvido pelos brasileiros. E somando-se ao oligopólio do setor comunicacional o descaso do poder público em fiscalizar os compromissos decorrentes das concessões de rádio e TV, o resultado, segundo Christofoletti (2003, p.4), é desolador: “as contrapartidas sociais são simplesmente esquecidas”.