O documento discute a relação entre genética e câncer. Apresenta que o câncer é sempre iniciado por danos no DNA, geralmente causados por agentes químicos, físicos ou virais. Detalha os principais tipos de genes envolvidos no câncer, como oncogenes que promovem o crescimento celular e genes supressores tumorais que regulam negativamente o ciclo celular. Fornece exemplos de síndromes de câncer hereditário associados a mutações em genes específicos.
1. GENÉTICA E CÂNCER
Flávia Scapin
O câncer é uma doença genética, independente de ocorrer de forma esporádica ou
hereditária, pois a carcinogênese sempre inicia com danos no DNA. Geralmente esses
danos são causados por agentes químicos, físicos ou virais.
Existem, basicamente, duas categorias de genes envolvidos nas formações
neoplásicas: os oncogenes e os genes supressores tumorais.
Oncogenes:
O controle das atividades celulares normais é feito por muitos tipos de genes,
entre eles os proto-oncogenes. Os oncogenes são proto-oncogenes que sofreram
mutações ativadoras, ou seja, que passaram a ter ganho de função ou hiperexpressão.
Uma característica importante dos oncogenes é que eles têm efeito dominante na célula,
ou seja, um único alelo mutado é suficiente para alterar o fenótipo de uma célula normal
para tumoral.
As mutações formadoras de oncogenes necessariamente são adquiridas, uma vez
que se ocorrerem na linhagem germinativa (mutações herdadas) são letais para o
embrião. São vários os tipos de mutações que formam oncogenes: mutações gênicas,
mutações cromossômicas, amplificação gênica e superexpressão gênica.
Os oncogenes são responsáveis por aumentar a proliferação celular ao mesmo
tempo em que inibem a apoptose, eventos que podem dar início a uma neoplasia.
A ativação dos oncogenes tem papel importante tanto nos cânceres hereditários
como nos esporádicos. Alguns exemplos estão listados abaixo com suas respectivas
funções na célula:
• Gene RAS: foi um dos primeiros oncogenes descoberto. O gene RAS normal codifica
as proteínas G, que se ligam ao GTP para ativar ou inibir a proliferação celular.
Quando mutado codifica proteína anormal que não mais depende da presença de GTP
ligado ou não para sinalizar e estimular a proliferação celular. Geralmente a mutação
que ocorre nesse gene é a troca de apenas um par de bases (mutação de ponto).
• Genes ABL / BCR: a translocação do proto-oncogene ABL do cromossomo 9 para o
22 (cromossomo Philadelphia) faz com que ele fique em justaposição ao gene BCR, o
que provoca a síntese de proteína abl alterada (quimera). O aumento da atividade
dessa proteína é fator desencadeante para a Leucemia Mielóide Crônica.
• Gene MYC: algumas vezes esse gene sofre uma translocação do cromossomo 8 para
o 14, ficando posicionado próximo a um gene codificador de imunoglobulinas, o que
desregula a sua função. Como essa translocação geralmente é balanceada não provoca
alterações evidentes no portador e pode ser transmitida a outras gerações
subseqüentes. A proteína myc atua como fator de transcrição e na expressão da
telomerase, portanto esses eventos se darão de forma desordenada se a proteína
estiver mutada. Esse oncogene está associado a um tipo importante de câncer: o
Linfoma de Burkitt.
• Gene HER2: é um proto-oncogene responsável por codificar receptores de fatores de
crescimento. Se transformado em oncogene produz um número maior de receptores
muito sensíveis, mas pouco específicos, ou seja, responderão a qualquer estímulo
2. iniciando a proliferação celular. Esse gene está muito relacionado ao câncer de mama
em ambos os sexos.
• Gene BCL2: responsável por regular a apoptose. Quando ocorre uma translocação
cromossômica específica, um gene de cadeia pesada de imunoglobulinas é
translocado do cromossomo 14 para o 18, onde está posicionado o BCL2. Essa
justaposição ativa o gene, que passa a codificar uma proteína com efeitos
antiapoptóticos nas células B, originando o Linfoma de Células B Folicular.
• Genes MET e RET: são oncogenes responsáveis por desencadear uma série de
eventos, que quando combinados a outros fatores, provocam o carcinoma papilar
renal e o carcinoma medular da tireóide, ambos hereditários.
• Genes que codificam a telomerase: são responsáveis pela fabricação da enzima de
mesmo nome, que mantém um número suficiente de repetições tipo TTAGGG na
região do telômero, impedindo a destruição da célula. Porém, é normal que uma
célula, com o passar do tempo, perca os telômeros e seja eliminada, sendo esse um
processo importante de controle da qualidade das células do organismo. Quando há
uma mutação, a telomerase é expressa de forma desregulada perpetuando as células
em que atua.
Genes supressores tumorais:
São genes que expressam produtos que regulam negativamente o ciclo celular.
Quando mutados deixam de exercer seus papéis através de processos específicos para
cada gene.
Os genes supressores tumorais são divididos em dois grandes grupos: os
Gatekeepers e os Caretakers.
1) Gatekeepers ou genes protetores: regulam diretamente o ciclo celular:
• Gene TP53: presente no cromossomo 17 (17p13.1). Está mutado em cerca de 2/3 dos
casos de câncer. Ele é responsável pela interrupção do ciclo celular na fase G1
quando há qualquer alteração na seqüência de DNA para que o dano seja reparado. Se
o reparo não for feito, o gene induzirá a apoptose celular. A disfunção desse gene faz
com que o ciclo celular prossiga mesmo que haja uma mutação no DNA,
transmitindo-a às células descendentes e iniciando um processo neoplásico, como
ocorre na Síndrome de Li-Fraumeni (condição em que ocorre predisposição a
desenvolver câncer em vários sítios como mama, ossos, cólon, pâncreas, entre
outros.)
• Gene RB1: situado no cromossomo 13 (13q14.3), produz uma proteína que bloqueia
o ciclo celular quando hipofosforilada. Esse bloqueio ocorre quando a proteína
hipofosforilada se liga a determinados fatores de transcrição inativando-os. Quando
esse gene está mutado o seu produto encontra-se permanentemente hiperfosforilado,
permitindo a progressão do ciclo e dando início a um processo neoplásico. Apesar
desse gene se expressar em vários tecidos além da retina, sua mutação resulta
geralmente em um Retinoblastoma, hereditário em 40% dos casos e esporádico em
60% dos casos.
3. • Gene APC: está localizado no cromossomo 5 (5q21-q22). Produz a proteína apc que
regula a quantidade de β-catenina livre no citoplasma. Em condições normais, quando
a célula não precisa se multiplicar, a β-catenina se encontra ligada a um complexo E-
caderina, inibindo a progressão do ciclo celular. Se o gene APC estiver mutado,
produzirá uma proteína truncada, responsável por um aumento da porção livre de β-
catenina, que é transportada para o núcleo ativando a transcrição de genes de
proliferação celular, inclusive o MYC. Mutações nesse gene provocam Polipose
Intestinal Adenomatosa de caráter familiar ou esporádico e síndromes que envolvem
câncer colorretal como a Síndrome de Gardner.
2) Caretakers ou genes de manutenção: atuam reparando danos no DNA,
mantendo a integridade genômica e evitando a instabilidade genética. Sozinhos não
induzem a formação de neoplasia, pois alterações nesses genes não conferem vantagem à
célula, mas facilitam a ocorrência de mutações nos genes gatekeepers que darão início a
carcinogênese.
• Genes BRCA1 e BRCA2: presentes no cromossomo 17 (17q21) e 13 (13q12)
respectivamente. São ativados nas fases G1 e S do ciclo celular. Os produtos dos dois
genes estão em um mesmo complexo multiprotéico e são responsáveis pela resposta
celular às quebras do DNA que ocorrem normalmente na recombinação homóloga ou
de forma anormal quando há danos na estrutura do DNA. Se mutados predispõem ao
aparecimento de câncer de mama e de ovário, que tanto podem ter caráter esporádico
como hereditário.
• Genes MMR: são genes responsáveis por reparar erros de pareamento do DNA
(Mismatch Repair genes). Existem inúmeros genes de reparo, mas somente alguns já
foram identificados como causadores de tumores como: MLH1, MSH2, PMSL1,
PMSL2 e MSH6. Mutações nesses genes provocam aumento da incidência de
mutações de ponto no DNA e tendência à instabilidade dos microssatélites. Essa
instabilidade é chamada de fenótipo Erro de Replicação Positivo (RER+) que ocorre
em vários tipos de tumores. Alterações nos genes de reparo provocam, mais
freqüentemente, o câncer colorretal hereditário sem polipose, mas também são
responsáveis por cânceres intestinais esporádicos.
SÍNDROMES DE CÂNCER HEREDITÁRIO
As síndromes são definidas como combinações de sinais e sintomas, formando
apresentação clínica distinta indicativa de anormalidade particular. As síndromes de
câncer hereditário são afecções genéticas nas quais neoplasias malignas parecem se
aglomerar em certas famílias. Apenas uma pequena parcela dos cânceres relatados pode
ser considerada parte de uma síndrome de câncer hereditário. A maior parte resulta de
defeitos na replicação do DNA, em seus mecanismos de controle ou pela ação de agentes
carcinógenos.
As características clínicas associadas ao câncer hereditário são: idade precoce ao
diagnóstico, múltiplas neoplasias em um mesmo indivíduo, múltiplos membros de uma
4. mesma família apresentando a mesma neoplasia ou neoplasias relacionadas, múltiplas
gerações acometidas.
A identificação de indivíduos em risco para câncer hereditário é importante por
várias razões. Primeiro, porque indivíduos afetados apresentam risco cumulativo vital
muito superior ao da população para vários tipos de câncer. Segundo, porque outros
familiares de um indivíduo afetado podem estar em risco para o câncer hereditário (como
a maioria dessas doenças genéticas seguem herança autossômica dominante, 50% dos
irmãos e 50% dos filhos de um afetado podem ser portadores da mesma mutação que está
levando ao câncer). Terceiro, porque medidas de rastreamento intensivo e intervenções
preventivas (cirurgias profiláticas e quimioprofilaxia) se mostraram eficazes em reduzir
significativamente o risco de câncer em portadores de tais mutações.
A tecnologia atualmente nos permite diagnosticar uma mutação genética muito
antes do aparecimento dos sintomas. Por outro lado, a identificação precisa de um
indivíduo não afetado em uma família de risco, permite a tranqüilização do indivíduo e
elimina os gastos e complicações de rastreamento e intervenções preventivas
desnecessários.
A seguir são apresentados alguns dos cânceres hereditários com suas principais
alterações e características. O teste pré-natal descrito na tabela refere-se à investigação de
genes mutados quando há risco de desenvolvimento da doença pelo feto.
Genes
Mutados
Locus no
Cromossomo
Doenças Associadas Prevalência Herança Teste Pré-Natal
Câncer de
Mama/Ovário
BRCA1
BRCA2
17q21
13q12.3
Câncer Pancreático
Familiar
Entre
1/500 e
1/1000
Autossômica
Dominante
Células fetais
por
amniocentese
entre 16 e 18
semanas
Carcinoma
Basocelular
PTCH 9q22.3
Holoprosencefalia,
ceratose,
tricoepitelioma de
pele, meduloblastoma
1/40.000 Autossômica
Dominante
Amniocentese
entre 15 e 18
semanas ou
vilos coriônicos
entre 10 e 12
semanas
Câncer Hereditário
do Cólon (HNPCC)
MLH1
MSH2
MSH6
PMS2
3p21.3
2p22-p21
2p16
7p22
Há aumento do risco
para câncer
endometrial, de
ovário, estômago,
intestino delgado,
trato hepatobiliar
1-3% dos
cânceres de
cólon
Autossômica
Dominante
Amniocentese
entre 16 e 18
semanas ou
vilos coriônicos
entre 10 e 12
semanas
Esclerose Tuberosa TSC1
TSC2
9q34
16p13.3
Não há outras doenças
associadas
1/5.800 Autossômica
Dominante
Amniocentese
entre 16 e 19
semanas ou
vilos coriônicos
entre 10 e 12
semanas
5. Síndrome de
Li-Fraumeni
TP53
CHEK2
17p13.1
22q12.1
TP53: não há outras
doenças hereditárias
associadas
CHEK2: osteossarco-
ma e câncer de mama
Raro: 400
famílias
em todo o
mundo
Autossômica
Dominante
Amniocentese
entre 15 e 18
semanas ou
vilos coriônicos
entre 10 e 12
semanas
Neurofibromatose NF1 17q11.2
Neurofibroma
espinhal, glioma
óptico, lipomatose
encefalocraniocutâneo
1/3.000 Autossômica
Dominante
Amniocentese
entre 15 e 18
semanas ou
vilos coriônicos
entre 10 e 12
semanas
Síndrome de
Peutz-Jeghers
STK11
(LKB1)
19p13.3 Não há outras doenças
associadas
Entre
1/25.000 e
1/280.000
Autossômica
Dominante -
PTEN Hamartoma PTEN 10q23.31 Lipomas e tumores de
mama
1/200.000 Autossômica
Dominante
Amniocentese
entre 15 e 18
semanas ou
vilos coriônicos
entre 10 e 12
semanas
Retinoblastoma RB1 13q14.1-
q14.2
Não há outras doenças
associadas
Entre
1/15.000 e
1/20.000
Autossômica
Dominante
Amniocentese
entre 15 e 18
semanas ou
vilos coriônicos
entre 10 e 12
semanas
Tumor de Wilms WT1 11p13 -
Entre
1/8.000 e
1/10.000
Autossômica
Dominante
Amniocentese
entre 16 e 18
semanas ou
vilos coriônicos
entre 10 e 12
semanas
Síndrome de Von
Hippel-Lindau
VHL 3p26-p25
Feocromocitoma e
Policitemia de
Chuvash
1/36.000 Autossômica
Dominante
Amniocentese
entre 15 e 18
semanas ou
vilos coriônicos
entre 10 e 12
semanas
6. Xeroderma
Pigmentoso
XPA
ERCC3
XPC
ERCC2
DDB2
ERCC4
ERCC5
POLH
9q22.3
2q21
3p25
19q13.2-
q13.3
11p12-p11
16p13.3-
p13.13
13q33
6p21.1-p12
Síndrome cérebro-
óculo-facial,
tricotiodistrofia
1 em 1
milhão
Autossômica
Recessiva
Não é feito,
exceto quando
há afetados na
família
TESTE GENÉTICO PARA CÂNCER DE MAMA
Aproximadamente 5 a 10% dos cânceres de mama se apresentam de forma
hereditária. As alterações herdadas nos genes BRCA1 e BRCA2 são as responsáveis por
muitos casos de câncer hereditário de mama e ovário.
Homens com os genes BRCA1 e BRCA2 alterados também tem risco aumentado
para câncer de mama (principalmente se a alteração for no gene BRCA2), e possivelmente
para câncer de próstata.
Teste positivo para BRCA1 ou BRCA2: um teste positivo indica que uma pessoa
herdou uma mutação conhecida no BRCA1 ou BRCA2 e tem um risco aumentado de
desenvolver certos tipos de câncer. O teste não indica se o câncer se desenvolverá e
quando se desenvolverá. Além disso, nem toda mulher que herda um gene mutado
desenvolverá câncer de ovário ou de mama. Assim, o teste positivo pode resultar em uma
série de implicações sociais e de saúde para os membros da família, incluindo as futuras
gerações.
Tanto o homem quanto a mulher que herda uma alteração nos genes BRCA1 ou
BRCA2, ele tendo ou não desenvolvido o câncer, podem passar as alterações para seus
filhos e filhas. Entretanto, nem todo filho de pais com o gene alterado herdarão a
alteração.
Teste negativo para BRCA1 ou BRCA2: se uma pessoa em uma família
apresenta uma mutação conhecida no BRCA1 ou BRCA2, testar outros membros da
família para esta alteração gênica específica pode fornecer informação sobre seu risco de
desenvolver câncer. Neste caso, se um membro dessa família tiver um teste negativo para
a mutação conhecida, é muito provável que haja apenas a herança aumentada para a
suscetibilidade para o câncer.
O teste negativo, entretanto, não significa que a pessoa não terá câncer, significa
que o risco para o desenvolvimento de câncer é igual ao da população em geral.
Opções quando o teste é positivo:
• Avaliação: para uma avaliação adequada, é importante detectar precocemente o
surgimento do câncer. Assim, a monitorização cuidadosa para os sintomas do câncer
podem identificar a doença ainda em seu estágio inicial. Outros métodos para a
7. identificação do câncer de mama incluem mamografias periódicas e exames clínicos,
além do auto-exame. Para o câncer de ovário, os métodos de avaliação incluem
ecografia transvaginal, teste para o marcador CA-125, e exames clínicos.
• Cirurgia Profilática: este tipo de cirurgia envolve a remoção da maior quantidade
possível de tecido com o objetivo de reduzir a chance de desenvolvimento do câncer.
Mastectomia preventiva (remoção de tecido mamário saudável) e salpingo-
ooferectomia preventiva (remoção das trompas de falópio e dos ovários saudáveis),
não oferece, entretanto, garantia contra o desenvolvimento desses cânceres. Devido a
impossibilidade de remover todo o tecido por esses procedimentos, algumas mulheres
desenvolvem câncer de mama, câncer de ovário, ou carcinomatose peritoneal
primária (um tipo de câncer similar ao câncer de ovário) mesmo depois da cirurgia
profilática.
• Quimioprevenção: a quimioprevenção envolve o uso de substâncias naturais ou
sintéticas para reduzir o risco de desenvolvimento de câncer, ou para reduzir a chance
daquele câncer retornar. Um estudo mostrou que tamoxifen (antiestrogênico) reduz a
incidência de câncer de mama em 62% em mulheres com alteração no BRCA2.
entretanto, os resultados encontrados não mostraram redução na incidência de câncer
de mama quando a alteração é no gene BRCA1.
• Terapia Gênica: atualmente, genes BRCA1 e BRCA2 alterados não podem ser
reparados.
Fatores que aumentam a chance de desenvolver câncer de mama e/ou ovário:
os seguintes fatores tem sido associados com aumento do risco para câncer de mama e/ou
ovário. Ainda não se sabe claramente como esses fatores influenciam no risco das
pessoas com alterações no BRCA1 e BRCA2.
• Idade: o risco de câncer de mama e de ovário aumenta com a idade. A maioria dos
cânceres de mama e ovário ocorrem em mulheres acima de 50 anos. Mulheres com
alteração nos genes BRCA1 ou BRCA2 freqüentemente desenvolvem câncer de mama
e de ovário antes dos 50 anos.
• História Familiar: uma mulher com história familiar significativa de câncer de
mama e/ou ovário possuem risco aumentado de desenvolver esses cânceres. Você tem
uma história familiar significativa se:
- você tem 2 ou mais membros da família que tiveram câncer de mama e/ou
ovário;
- o câncer de mama nesse membro da família foi encontrado antes dos 50 anos
de idade.
Os membros da família podem ser: mãe, irmã, avós (tanto maternos quanto paternos),
irmãs do pai ou da mãe. Além disso, mulheres com parentes que tiveram câncer de cólon
também apresentam risco aumentado para o desenvolvimento de câncer de ovário.
8. • História Médica: mulheres que já tiveram câncer de mama apresentam risco
aumentado de ter novamente, ou de desenvolver câncer de ovário. Mulheres que
tiveram câncer de cólon também tem risco aumentado de desenvolver câncer de
ovário.
• Influência Hormonal: estrogênio é produzido naturalmente pelo corpo e estimula o
crescimento normal do tecido mamário. Suspeita-se que o excesso de estrogênio pode
contribuir para o risco de câncer de mama pois seu papel é a estimulação do
crescimento das células mamárias. Mulheres que tiveram seu primeiro ciclo
menstrual antes dos 12 anos e a menopausa depois dos 55 anos apresentam um leve
aumento no risco de câncer de mama, assim como as mulheres que tiveram seu
primeiro filho antes dos 30 anos. Quando os ovários são removidos, os quais
produzem estrogênio, há redução do risco de câncer de mama.
• Contraceptivos Orais: muitos estudos mostram nenhum ou discreto aumento no
risco de câncer de mama em mulheres que tomam anticoncepcionais orais. Alguns
estudos sugerem que as mulheres que tomam contraceptivos orais por um longo
período, começando em uma idade precoce ou depois da sua primeira gravidez,
apresentam pequeno risco de desenvolver câncer de mama. Além disso, os
anticoncepcionais orais reduzem o risco de câncer de ovário.
• Terapia de Reposição Hormonal: o risco de desenvolvimento de câncer de mama
em mulheres pode aumentar pela terapia de reposição hormonal (TRH),
especialmente quando usado por um longo período de tempo. Os médicos muitas
vezes prescrevem a TRH para reduzir o desconforto dos sintomas relacionados a
menopausa, como os “calorões”. Os riscos e benefícios da TRH devem ser
cuidadosamente avaliados pela mulher e seu médico.
9. • Dieta Gordurosa: apesar de alguns estudos sugerirem uma possível associação entre
uma dieta rica em gordura e aumento do risco de câncer de mama, estudos mais
recentes mostraram-se inconclusivos.
• Atividade Física: alguns estudos sugerem que exercícios regulares, particulartmente
em mulheres com 40 anos ou menos, podem diminuir o risco de câncer de mama.
• Álcool: o consumo de álcool pode aumentar o risco de câncer de mama, mas o
mecanismo biológico dessa relação ainda não está estabelecido.
• Fatores Ambientais: a exposição da mama à radiação ionizante, assim como à
radioterapia para a doença de Hodgkin ou outras doenças, está associada com um
aumento do risco de câncer de mama, especialmente quando a exposição ocorre em
mulheres jovens. Evidências da relação do risco de câncer de mama associado à
exposição ocupacional, ambiental ou química ainda não está totalmente esclarecida.
Mais informações sobre os diversos tipos de câncer e sobre aconselhamento genético
podem ser encontrados:
http://www.hcanc.org.br/dmeds/genet/ongenet1.html
LEUCEMIAS
Leucemia Linfóide Aguda (LLA)
É uma doença maligna de células linfocitárias derivadas das células
indiferenciadas linfóides que estão presentes em grande número na medula óssea, no timo
e nos gânglios linfáticos. As células leucêmicas mantêm uma certa capacidade de
multiplicação, mas não se diferenciam até formas mais maduras e normais. As LLA
podem ser de tipo B ou de tipo T, sendo as primeiras mais freqüentes.
O quadro clínico não permite o diagnóstico diferencial entre LLA e LMA, pois
em ambas há queixas de fraqueza, palidez progressiva, hemorragias e quadro infeccioso.
Na LLA, as células malignas proliferantes deixam de responder à ação
controladora dos fatores estimuladores e inibidores da hemopoese normal. A citogenética
tem permitido localizar genes cuja função é codificar fatores estimulantes do crescimento
celular ou receptores de membrana para esses fatores. A função desses genes é alterada
por ação de vírus que os transformam em oncogenes. Alguns desses oncogenes
estimulam o crescimento de células malignas, sendo responsáveis pelo aparecimento de
proliferações malignas de tipo linfóide ou mielóide.
Em alguns tipos de leucemias, as translocações envolvendo cromossomos
diferentes parecem estimular a ação de oncogenes localizados nos pontos de quebra
(breakpoints) ou próximos a elas, cujo resultado final é o aparecimento de neoplasia.
A etiologia da LLA está relacionada com mutações de genes secundárias a uma
virose ou à ação de agentes físicos ou químicos. Outras anomalias cromossômicas de
natureza constitucional, como a doença de Fanconi, a síndrome de Down e a síndrome de
Bloom, também podem ser responsáveis pela maior incidência de LLA. Nessas
patologias podem estar presentes os denominados sítios frágeis, em alguns cromossomos.
10. Esses locais representam zonas de quebra fácil, dando origem à instabilidade
cromossômica. Eles representam locais de difícil reparo do DNA após a exposição do
indivíduo a agentes mutagênicos ambientais.
Alguns oncogenes estão mapeados exatamente nesses sítios frágeis ou próximos a
eles. Podem ser citados como exemplos:
a) oncogene mos, translocado na LMA com t(8;21);
b) oncogene abl, translocado na LMC com t(9;22);
c) translocações do cromossomo 11q23, envolvendo o oncogene mll, na LLA da
criança.
Alguns sítios frágeis podem ser herdados, enquanto outros são induzidos por ação
de quimioterápicos. Dentre estes, estão os agentes alquilantes, o metotrexate e a 5-
azacitidina.
Os sítios frágeis podem estar presentes também em certas deleções ou inversões
cromossômicas.
Além da mutação genética, a ativação de genes é outro mecanismo que origina a
leucemia. A própria mutação genética pode causar a ativação de outros genes. A
leucemia aguda, tanto linfóide como mielóide, surge como resultado de alterações
genéticas que se instalam em etapas sucessivas na vida de um indivíduo. Estas são, na
verdade, imprevisíveis, dependendo de fatores ambientais, tais como: (1) exposição a
vírus, (2) exposições a substâncias químicas (benzeno, pesticidas, etc), ou (3) exposições
a radiações ionizantes ou campos eletromagnéticos.
Entre as alterações que podem ocorrer estão os rearranjos do gene mll que levam à
produção de tipos diversos de proteínas importantes na leucemogênese. Este gene está
localizado no cromossomo 11 (11q23) e sofre translocações de vários tipos,
considerando-se que esteja rearranjado em cerca de 60 a 70% das leucemias infantis.
Com freqüência há translocações entre o gene 11q23 com os cromossomos 4 e 19.
Classificação:
• LLA tipo L1: leucemia linfóide de blastos pequenos e homogêneos, com relação
nucleocitoplasmática alta. Os núcleos são conspícuos, dificultando a observação dos
nucléolos.
• LLA tipo L2: leucemia linfóide de blastos de tamanho variável, heterogêneos.
Relação núcleo citoplasmática pequena, nucléolos grandes e bem visíveis. Pode ser
confundida com a LMA tipo M7 (com blastos pequenos).
• LLA tipo L3: leucemia linfóide de blastos grandes, com citoplasma abundante,
basófilo e vacuolizado, tipo Burkitt. Forma grave e com pior prognóstico.
Citogenética no Tratamento e Prognóstico:
Certas anomalias citogenéticas são encontradas com maior freqüência na LLA.
Algumas representam melhor prognóstico e pequeno risco de falha na terapêutica. A
hiperdiploidia (>50 cromossomos), por exemplo, é considerada fator de bom prognóstico,
embora com normodiploidia também se consiga bom resultado no tratamento.
Há outros fatores de bom prognóstico concomitantemente com a hiperdiploidia,
como: (1) idade entre 2 e 10 anos; (2) leucócitos em número não muito alto (<50.000/µl);
11. (3) não há anemia acentuada, quadro neurológico, massa mediastinal ou gânglios
volumosos.
Entre os pacientes que apresentam hiperdiploidia, verificou-se que quando o
número de cromossomos varia de 54 a 58 os resultados da terapêutica são bem melhores
do que naqueles em que esse número fica abaixo de 51. Nestes pacientes, a síntese do
DNA apresenta-se aumentada. Casos com hiperdiploidia com trissomia dos cromossomos
4, 10 e 17 evoluem de forma favorável, respondendo bem aos quimioterápicos. Outras
trissomias como a do cromossomo 6, 18, 21 e X, que conferem bom prognóstico,
enquanto as dos cromossomos 5 e 9 traduzem piores resultados ao tratamento.
As translocações são freqüentes na LLA e, em geral, se correlacionam com mau
prognóstico. Entre estas, as que envolvem os cromossomos 8 e 14, 8 e 2 ou 8 e 22 são
indicativas de mau prognóstico. Algumas das translocações interferem na expressão do
gene myc e acabam por alterar a proliferação e a diferenciação das células linfóides. A
t(12;21) está ligada a bom prognóstico, enquanto a t(9;22), associada à formação do gene
bcr/abl, é indicadora de mau prognóstico.
Os rearranjos do gene mll situado na região 11q23 estão correlacionados com a
leucemogênese e estão presentes em várias translocações, sendo relacionados a um mau
prognóstico.
A deleção do cromossomo 6 está freqüentemente associada ao tipo morfológico
L2 e tem bom prognóstico.
Alguns fatores têm importância na orientação do tratamento, procurando-se
identificar os casos em que há alto risco e aqueles para os quais existe risco-padrão. Essa
separação se relaciona com o prognóstico da doença. Entre esses fatores está a idade, o
número de leucócitos, a citogenética, o sexo (o prognóstico costuma ser pior no sexo
masculino), tipo imunológico e tipo morfológico.
Leucemia Linfóide Crônica (LLC)
Esta doença linfoproliferativa é relativamente rara em nosso meio, caracterizando-
se por quadro clínico benigno, evolução lenta e grande leucocitose no sangue. A
leucocitose é causada por aumento acentuado de linfócitos de tipo maduro, com raras
formas blásticas (linfoblastos) e formas intermediárias (prolinfócitos) circulantes.
Alguns casos são assintomáticos, mas outras vezes o quadro clínico é severo,
ocorrendo anemia grave, icterícia, hepatoesplenomegalia e adenomegalia generalizada. A
doença tem caráter lento e progressivo, podendo ser detectada em várias fases de sua
evolução natural.
A doença se origina da proliferação neoplásica de uma célula indiferenciada que é
responsável pelo aparecimento do clone leucêmico. A maioria é de tipo B.
As anomalias cromossômicas detectadas incluem:
a) trissomia do 12(+12q), presente em cerca de 50% dos casos;
b) deleção do 13(-13q14), considerada por alguns como a anomalia mais
freqüente;
c) deleção do 11(-11q22);
d) deleção do 6(-6q21-23); deleção do 17(17p13), com mutação do gene TP53
(supressor tumoral).
12. Vários genes são candidatos a apresentar alterações em decorrência dessas
anomalias cromossômicas.
Outras alterações genéticas menos freqüentes incluem: (1) trissomia do 8(+8q);
(2) t(11;14); (3) trissomia do 3(+3q)
Entre as translocações, a t(11;14) pode afetar o gene atm, alterado na
telangiectasia.
Alguns agentes parecem atuar positivamente na origem da doença. É o caso do
contato com substâncias químicas usadas como pesticidas (organofosfatados), além de
certas doenças hereditárias com alterações cromossômicas (mutações, etc) e doenças
auto-imunes.
Considera-se que, ao lado das anomalias genéticas herdadas, as mutações devem
estar relacionadas também com a ação de fatores ambientais.
Os linfócitos leucêmicos da LLC têm pequeno índice de proliferação,
acumulando-se na circulação ou nos órgãos linfóides na fase G0 do ciclo celular. O
acúmulo das células está relacionado com a inibição do fenômeno da apoptose ou morte
programada que ocorre em células normais.
A LLC é considerada uma linfoproliferação com características próprias, na qual
o aumento progressivo de linfócitos na circulação não ocorre por excesso de proliferação,
mas sim por acúmulo das células. Estas têm sua sobrevida aumentada em virtude de
defeito no mecanismo de apoptose, ou seja, de perda da capacidade de caminhar para a
morte.
A apoptose é comandada por proteínas e genes que decidem o destino das células
para a proliferação ou para a morte. Entre estes estão:
• As enzimas cisteína proteinases ou caspases que favorecem a apoptose.
• Genes da família bcl-2, dentre eles alguns que estimulam a apoptose por meio dos
produtos Bcl-2, Bcl-XL, etc. e outros que a inibem, através das proteínas Bax, Bad,
Bak.
• Genes produtores de proteínas inibidoras de apoptose (inibitors of apoptosis proteins
= IAP), que são antiapoptose.
Citogenética no Tratamento e Prognóstico:
Verificou-se que a redução da apoptose nos linfócitos B da LLC está relacionada
com o aumento da expressão do gene bcl-2. Este gene possui vários tipos de proteínas
que interferem na apoptose, aumentando ou diminuindo a resistência celular aos
mecanismos que conduzem à morte.
O gene bcl-2 se localiza no cromossomo 18q21 e está freqüentemente translocado
na t(14;18) (q32;q21). Apesar dessa translocação ser mais freqüente nos linfomas não-
Hodgkin, a proteína Bcl-2 pode ser encontrada em linfócitos da LLC.
Em cerca de 15% dos casos de LLC ocorre mutação do gene supressor p53, o qual
também interfere na proliferação celular e na apoptose. Além disso, a mutação do gene
p53 na LLC estaria relacionada com a resistência ao tratamento com o clorambucil
(agente antineoplásico alquilante) e análogos de nucleosídeos.
13. Leucemia Mielóide Aguda (LMA)
É uma doença de natureza maligna, caracterizada pela proliferação anômala dos
precursores granulocíticos da medula óssea. No processo de diferenciação das células
pluripotentes (stem-cells) da medula óssea ocorre parada ou dificuldade de maturação, de
modo que se acumulam células jovens que nunca chegam ao amadurecimento completo.
As células resultantes podem ter aspectos variados, desde formas muito indiferenciadas
(blastos), até aspecto bem mais diferenciado.
Suspeita-se de leucemia aguda sempre que um paciente apresenta sintomas de
palidez cutaneomucosa, febre com quadro de tipo infeccioso e hemorragias. Além dessa
tríade de sintomas, podem estar presentes adenomegalia, hepatomegalia, esplenomegalia,
alterações da pele, sintomas neurológicos, dores ósseas, derrame pleural, sinais de
insuficiência respiratória e infiltrados de tipo tumoral em qualquer tecido ou órgão.
Os blastos encontrados na LMA correspondem a células incapazes de evoluir até
o estágio de maturação completa. O processo de multiplicação e diferenciação normal
está alterado em virtude da falha no mecanismo genético regulador do ciclo celular. Os
genes responsáveis pela síntese dos fatores de crescimento e de seus receptores celulares
(proto-oncogenes) podem sofrer mutações, e isto vai afetar os sinais que devem ser
transmitidos ao DNA dos precursores medulares.
O crescimento desordenado das células malignas do câncer e das leucemias traduz
o desequilíbrio entre a proliferação e a diferenciação.
Genes encarregados da síntese dos vários fatores de crescimento da série
granulocítica e de seus receptores celulares (proto-oncogenes) podem sofrer mutações
que resultam em leucemia. As alterações cromossômicas do tipo translocações também
podem resultar numa proliferação leucêmica em decorrência de alteração dos chamados
fatores de transcrição. A leucemia ainda pode resultar de mutação presente em genes
supressores do crescimento celular.
O TP53 é outro gene supressor associado à incidência de câncer e de leucemia,
quando sofre mutação. Está relacionado com prognóstico pior e alto risco da doença.
Alguns casos de LMA aparecem depois do tratamento quimioterápico utilizado
para vários tipos de câncer ou de linfomas, tanto em indivíduos adultos como em
crianças. São casos de LMA secundária, que também está associada a alterações
genéticas. Dois tipos de quimioterápicos são, reconhecidamente, responsáveis pelas LMA
secundárias: (1) os agentes alquilantes e (2) os inibidores da enzima topoisomerase II.
As alterações citogenéticas que predominam são as anomalias dos cromossomos 5
e 7, quando ocorre a mielodisplasia.
Na LMA secundária aos inibidores da topoisomerase II as alterações citogenéticas
envolvem os rearranjos do gene mll, com translocações do tipo 11q23. As translocações
mais freqüentes são:
a) t(9;11)(p21;q23)
b) t(11;19)(q23;p13).
O clone leucêmico é composto de elementos que estão bloqueados, em fase G0 ou
G1 do ciclo celular, incapazes de chegar à diferenciação.
Outros genes estão envolvidos na patogenia da LMA, sofrendo mutações em
decorrência de alterações cromossômicas, como, por exemplo:
14. a) t(15;17), presente na LMA tipo M3, com envolvimento dos proto-oncogenes
pml e rar (localizados nos cromossomos 15q e 17q);
b) t(8;21), presente na LMA tipo M2, com envolvimento do gene myc (localizado
no cromossomo 8q);
c) t(9;22), da LMA tipo M1/M2, envolvendo os genes abl (cromossomo 9q) e sis
(cromossomo 22q);
d) inv (16), da LMA tipo Eo.
Outras alterações genéticas que comprometem a expressão de diferentes genes
têm sido observadas e consideradas fatores responsáveis pelo aparecimento de leucemias
agudas mielóides. Assim, o gene evi1, que está envolvido nas translocações t(3;21) e
t(3;12), pode apresentar aumento de expressão por fusão com outros dois genes (mds1 ou
tel), o que é encontrado em casos de LMA, bem como em fase blástica de uma LMC.
A translocação 11q23 é freqüente na LMA e na LLA, estando presente em mais
de 60% dos casos de leucemia aguda nas crianças. O gene mll, assim denominado por
estar envolvido tanto em leucemias mielóides, linfóides como na bifenotípica tem sua
expressão alterada nessa translocação.
Outro gene freqüentemente mutado na LMA é o aml1, localizado no cromossomo
21q22. o produto desse gene costuma se fundir com o de outro gene – eto, formando o
aml1/eto, cuja expressão reforça a ação do receptor G-CSF. O aumento da expressão
desse receptor parece, pois, estar relacionado com a etiologia da LMA.
Classificação FAB (classificação universal que descreve as características
morfológicas e citoquímicas principais):
• M1: blastos indiferenciados em alta porcentagem.
• M2: blastos indiferenciados e diferenciação até promielócito que contém granulações
primárias abundantes.
• M3: grande porcentagem de promielócitos hipergranulares, com ou sem bastonetes de
Auer. Grande quantidade de grãos soltos por ruptura de células jovens.
• M4: diferencia-se de M2 por ter >20% de células monocíticas na medula óssea e/ou
sangue. Diferencia-se de M5 por ter >20% de Pmc e Mb na medula óssea e/ou
sangue.
• M5a: blastos grandes, com citoplasma abundante, levemente basófilo e com projeções
citoplasmáticas.
• M5b: >80% das células do sangue são monócitos ou promonócitos. Na medula óssea,
as células são mais indiferenciadas.
• M6: >30% de blastos mielóides (Mb ou Pmc) e >50% de blastos da série vermelha
(eritroblastos).
• M7: células indiferenciadas (>30%), pequenas, semelhantes a linfoblastos no sangue.
15. Classificação MIC (Morfológica, Imunológica, Citogenética):
Morfologia FAB Citogenética Classificação MIC
M2 t(8;21) (q22;q22) M2/t(8;21)
M3, M3v t(15;17) (q22;q12) M3/t(15;17)
M5a (M5b, M4) t/Del (11) (q23) M5a/t(11q)
M4 Eo Inv/del (16) (q22) M4Eo/inv(16)
M1 (M2) t(9;22) (q34;q11) M1/t(9;22)
M2 ou M4 com basofilia t(6;9) (p21-22;q34) M2/t(6;9)
M1 (M2, M4, M7) com trombocitose Inv(3) (q21q26) M1/inv(3)
M5b com fagocitose t(8;16) (p11;p13) M5b/t(8;16)
M2 com basofilia t/Del (12) (p11-13) M2Baso/t(12p)
M4 (M2) +4 M4/+4
Citogenética no Tratamento e Prognóstico:
O tipo de LMA tem ligação muito estreita com as anomalias citogenéticas
encontradas. Com isto pode-se ter idéia do prognóstico da doença, além de se saber qual
a melhor medida terapêutica a ser adotada. Pesquisas sistematizadas sobre essas
alterações citogenéticas têm mostrado também o aspecto epidemiológico das doenças,
pois tais anomalias têm distribuição geográfica distinta, incidindo com freqüência
variável segundo o país ou a região focalizada.
As crianças com idade inferior a 2 anos, do sexo masculino e com leucocitose alta
têm sobrevida menor.
As características citogenéticas também influenciam a resposta à terapêutica,
assim como o tipo morfológico.
Tem sido verificado que as crianças com menos de 12 meses de idade, com
quadro de neuroleucemia, leucocitose elevada, rearranjo genético mll/11q23 e pequena
resposta inicial ao tratamento têm pior prognóstico.
Ao contrário, aquelas crianças com mais de 2 anos, com leucócitos baixos, com
t(9;11) e do sexo feminino evoluem melhor.
A incidência de LMA aumenta com a idade, tanto no sexo masculino como no
feminino. Embora a sobrevida dos pacientes tenha aumentado nas últimas décadas,
devido, principalmente, ao uso da quimioterapia intensiva e aos transplantes, os
resultados finais continuam precários.
Isto se verifica, sobretudo, nos pacientes com idade superior aos 55-60 anos, em
decorrência de vários fatores como: pequena tolerância dos idosos aos quimioterápicos,
devido à alta incidência de mielodisplasia que acompanha a patologia leucêmica; alta
incidência de leucemia secundária, para a qual evolui a mielodisplasia; aspecto
citogenético adverso; expressão aumentada da P-glicoproteína (P-gp), responsável pela
resistência à ação dos quimioterápicos.
Têm-se dado importância à presença das anomalias citogenéticas ligadas ao
prognóstico da LMA em idosos e em pacientes com idade inferior a 55 anos.
Assim, o achado de cariótipos que refletem melhor prognóstico, como as
translocações t(15;17) e t(8;21), assim como a inv(16), embora raro, pode ser detectado
em idosos. A remissão completa da doença nos casos de cariótipos pode atingir 70%. Por
16. outro lado, é muito freqüente nesses casos o achado de cariótipos complexos, de tipos:
+8; -7; 7q-; -5; 5q-. Nesses casos, a porcentagem de remissão raramente alcança os 20%.
Atuam como fatores de bom prognóstico para a obtenção da remissão prolongada
e até a cura da LMA: (1) baixa idade; (2) sexo feminino; (3) menor quantidade de células
blásticas no sangue e na medula óssea; (4) número normal de plaquetas; (5) presença de
corpúsculos de Auer nas células leucêmicas; (6) tipo de LMA – M1,M2, ou M3; (7)
ausência de anomalias cromossômicas nas células hemopoéticas; (8) ausência de
infiltração meníngea; (9) resposta rápida ao tratamento, com pequeno número de ciclos
de quimioterapia; (10) ausência de infiltrados extramedulares de blastos; (11) ausência de
hepato e esplenomegalia; (12) ausência de infecções e de quadro anterior de insuficiência
medular.
As características biológicas das células leucêmicas são fatores que influem na
resposta à terapêutica e no prognóstico. Numerosas alterações citogenéticas e pequena
porcentagem de células leucêmicas em fase proliferativa (fase S do ciclo celular) são
fatores responsáveis por maior número de recidivas, mesmo após quimioterapia
agressiva.
Quanto menor a capacidade proliferativa das células, maior a quantidade de
doença residual após a indução/consolidação que se pode observar em alguns casos pela
persistência de blastos na medula óssea.
A análise citogenética tem importância prognóstica na LMA, podendo indicar
quais os casos que têm maior possibilidade de remissão completa. A inversão do
cromossomo 16 é associada a maior sobrevida, enquanto pacientes com trissomia do 8,
como único defeito, devem ser tratados intensivamente. Pacientes portadores de t(8;21),
t(9;11) e t(15;17) costumam alcançar remissões completas e têm prognóstico
relativamente bom. Quando a análise cromossômica mostra defeitos múltiplos (del 17q
ou –7), o prognóstico é pior.
De outro lado, a expressão do gene mdr (multidrug resistance) está associada a
menor resposta aos agentes quimioterápicos e, portanto, à pior prognóstico. O produto do
gene mdr1, a chamada proteína Mdr ou glicoproteína P, atua na membrana celular
aumentando o efluxo ou saída das drogas quimioterápicas para o meio extracelular. Com
isto, tais drogas permanecem pouco tempo no citoplasma, o que diminui a probabilidade
de se alcançar a remissão completa, em casos de leucemia, por morte de um grande
número de células malignas.
Células presentes nas fases de recidiva da LMA costumam apresentar expressão
aumentada da proteína Mdr. Este fato sugere que tais células constituem um
“reservatório” importante de células refratárias, capazes de causar uma recidiva.
Tem sido observada atividade aumentada da telomerase em células leucêmicas e
em células malignas em geral quando comparadas com células correspondentes normais.
Esta enzima controla o comprimento dos telômeros, o que implica, em última análise, que
ambos estão envolvidos com a sobrevida das células. Células com telômeros encurtados
exibem, em geral, atividade de telomerase aumentada (esta vai alongar, especificamente,
o tamanho dos telômeros).
As células leucêmicas apresentam telômeros muito encurtados indicativos de que
um grande número de divisões celulares deva ter ocorrido. A atividade aumentada da
telomerase é encontrada nas anomalias cromossômicas 11q, -5 e –7 consideradas de mau
17. prognóstico. Quando há alterações cromossômicas consideradas favoráveis, como a
t(8;21) e a inv 16, os níveis de telomerase costumam ser baixos.
As leucemias secundárias, isto é, as que aparecem após tratamento quimioterápico
prévio de outro tipo de malignidade, são sempre mais resistentes aos tratamentos. Nessas
leucemias, assim como em síndromes caracterizadas por dano do DNA nuclear, o
aparecimento de uma segunda neoplasia de tipo leucêmico é relativamente freqüente.
Alterações de genes localizados nos cromossomos 5 e 7 são freqüentes na síndrome de
mielodisplasia que tende a evoluir para LMA.
Todas essas leucemias são de difícil controle terapêutico e pior prognóstico. Além
disso, a LMA que incide em recém-nascidos, crianças pequenas e naquelas portadoras da
síndrome de Down também representa um grupo de prognóstico desfavorável.
Leucemia Mielóide Crônica (LMC)
Caracteriza-se como uma proliferação de células mielóides granulocíticas, que
mantém sua capacidade de diferenciação. É doença de origem clonal, surgindo em
decorrência de anomalia da célula primordial ou indiferenciada (stem-cell) da medula
óssea. O clone anômalo originado dessa célula se expande e infiltra o parênquima
medular, de modo lento, mas progressivo, em detrimento da proliferação das células
normais.
A maioria dos indivíduos afetados é assintomática ou possui poucos sintomas.
Muitos deles, no entanto, podem apresentar manifestações bastante inespecíficas, como
anemia normocítica-normocrômica, fadiga, emagrecimento, mal-estar geral, além de
esplenomegalia, sensação de dor ou massa no quadrante superior esquerdo e saciedade
pós-prandial precoce.
A principal alteração molecular característica da LMC é a presença do
cromossomo Philadelphia (Ph¹), formado por uma translocação 9/22, que tem um
tamanho bastante reduzido e é evidenciado em células progenitoras hematopoiéticas.
O cromossomo Ph¹ resulta de uma translocação recíproca equilibrada entre os
braços longos dos cromossomos 9 e 22. Há adição de um segmento 3’ do gene ABL
(localizado no cromossomo 9q34) à porção 5’ do gene BCR (do cromossomo 22q11),
criando um gene híbrido BCR-ABL (oncogene) que é transcrito em um RNAm quimérico
BCR-ABL.
A translocação cromossômica envolve os pontos de quebra entre o éxon 2 do gene
BCR e o éxon 2 do gene ABL (b2a2), ou o éxon 3 do gene BCR e o éxon 2 do gene ABL
(b3a2). Estas fusões resultam na formação de uma proteína de 210kd, chamada p210BCR-
ABL
, presente na maioria dos casos. O fato da fusão ser do tipo b2a2 ou b3a2 não tem
repercussões no quadro clínico e na resposta ao tratamento, mas os pacientes do tipo b3a2
possuem uma contagem maior de plaquetas. Outros pontos de quebra, embora menos
freqüentes, também podem ocorrer, originando proteínas de 190kd (p190BCR-ABL
) ou de
230kd (p230BCR-ABL
). Todas elas contêm os domínios terminais NH2 do BCR e os
domínios terminais CCH do ABL.
Um aspecto interessante na fisiopatologia da LMC é o efeito decorrente da
proteína p210, que resulta da formação do gene híbrido bcr/abl. A expressão dessa
proteína sobre a linhagem granulocítica se evidencia pela alteração na propriedade de
18. adesão das células ao microambiente medular. A adesão ao estroma permite a
diferenciação normal dos granulócitos devido à ação dos fatores secretados pelas células
que constituem este estroma. Na LMC ocorre a proliferação anormal da linhagem devido
à adesão defeituosa (integrinas defeituosas).
O gene ABL normal é um proto-oncogene e codifica uma proteína tirosina cinase
que pode funcionar como um fator de transcrição regulado pela proteína RB1. A
justaposição de seqüências BCR promove ativação anormal da tirosina cinase da proteína
ABL, ocorrendo um aumento da atividade desta enzima em relação à proteína original.
Como conseqüência dessa hiperexpressão, a proteína BCR-ABL - localizada na face
citoplasmática da membrana celular - pode fosforilar vários substratos, ativando
múltiplas cascatas de transdução de sinal. Esses substratos incluem CRKL, p62Dok,
paxillin, CBL e Rin, os quais ativam vias envolvendo RAS, RAF, fosfotidilinositol 3-
cinase, JUN cinase, MYC e STAT, alterando a regulação do crescimento celular.
Mutações ou deleções de genes de supressão tumoral como p16 e p53 ocorrem com
freqüência variável e presumivelmente contribuem para o fenótipo maligno. Mutações
somáticas e anormalidades cromossômicas adicionais, como a trissomia do 8 e
isocromossomo 17 ou 22 diminuem a capacidade de maturação celular e estão associadas
a um aumento na probabilidade de evolução para crise blástica.
Células da medula de alguns pacientes com LMC não apresentam o cromossomo
Ph1
e geralmente têm um cariótipo normal. Apesar disso, a sobrevida destes pacientes é
substancialmente menor que aqueles cujas células são Ph1
-positivas. Evidências sugerem
que este achado deve-se à inserção do gene ABL no BCR como conseqüência de
rearranjos citogenéticos complexos.
O RNAm para BCR-ABL pode ocasionalmente ser detectado em indivíduos
normais.
Citogenética no Tratamento e Prognóstico:
O acompanhamento clínico dos pacientes com LMC é variável. A morte é
esperada em 10% dos pacientes no decorrer de 2 anos e em cerca de 20% por ano daí em
diante. O tempo médio de sobrevida é de cerca de 4 anos. Portanto, desenvolveram-se
vários modelos prognósticos que identificam diferentes grupos de risco na LMC. O
índice Sokal identifica a percentagem de blastos circulantes, o tamanho do baço, a
contagem de plaquetas, a evolução clonal citogenética e a idade como os fatores
prognósticos mais importantes.
O local do ponto de quebra dentro do gene BCR pode predizer o tempo até o
desenvolvimento da crise blástica. Demonstrou-se também através da citogenética
molecular que a metilação progressiva original do DNA no lócus BCR-ABL inicia a
transformação blástica. Finalmente, a interleucina (IL)-1β pode estar envolvida na
progressão da LMC para a fase blástica. Existem múltiplas vias de transformação da
doença, mas o tempo exato e a relação de cada uma delas permanecem incertos.
O objetivo do tratamento na LMC é alcançar hematopoiese não-clonal, não-
neoplásica, durável e prolongada, que acarrete a erradicação de qualquer célula residual
contendo a transcrição BCR-ABL. Logo, o objetivo é a remissão completa e cura.
Existem diversas modalidades terapêuticas bastante eficazes para estabelecer
remissão completa de LMC. O tratamento contínuo com mesilato de imatinib diminui a
19. freqüência das mutações espontâneas nas células que expressam o cromossomo
Philadelphia, diminuindo a expressão do fenótipo BCR-ABL. O foco de ação deste
fármaco é inibir a ação das proteínas quinases produzidas nas células leucêmicas através
da estabilização do segmento cromossômico BCR-ABL com o intuito de levá-lo à sua
forma inativa.
Outra forma terapêutica existente é o transplante com células tronco alogênico,
apesar de apresentar uma taxa de mortalidade precocemente alta devido aos riscos do
procedimento. Atualmente, pesquisam-se novas formas terapêuticas, cada vez mais
específicas e menos lesivas ao doente. Tem-se estudado a inibição do gene RAS com um
inibidor da farnesiltransferase que bloqueia sua inserção à membrana podendo ter
atividade antitumoral na LMC. Tentativas pré-clínicas de usar peptídeos do BCR-ABL
como uma vacina antitumoral parecem promissoras. O uso de oligonucleotídeos BCR-
ABL anti-senso para purgar células leucêmicas residuais dos progenitores
hematopoiéticos autólogos também está em andamento.
Os estudos têm usado uma variedade de técnicas para medir doença residual
mínima. O nível de sensibilidade tem sido variável e as durações dos acompanhamentos
dos pacientes são curtas. Apesar disso, a PCR-TR parece ser o recurso mais sensível para
predizer a recidiva da LMC.
Biliografia:
• Thompson & Thompson. Genética Médica. 6ª edição. Editora Guanabara Koogan
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• www.cancer.gov
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