A Humanidade mergulha em nova Idade das Trevas porque estamos vivenciando, também, crescente desintegração social em todos os países do mundo, o incremento dos conflitos internacionais e, até mesmo, a ameaça de sobrevivência da vida no planeta resultante da mudança climática catastrófica em curso. A gigantesca crise do sistema capitalista mundial e o declínio dos Estados Unidos como potência hegemônica econômica e militar se associam à luta dos bárbaros modernos representados pelos povos dos países capitalistas periféricos que buscam sua emancipação da espoliação exercida pelas grandes potências capitalistas lideradas pelos Estados Unidos. A invasão dos bárbaros modernos ocorre no momento com a presença na Europa Ocidental e nos Estados Unidos de grupos terroristas oriundos, sobretudo dos países islâmicos.
SOCIAL REVOLUTIONS, THEIR TRIGGERS FACTORS AND CURRENT BRAZIL
O Mundo rumo à nova Idade das Trevas
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O MUNDO RUMO A NOVA IDADE DAS TREVAS
Fernando Alcoforado*
A "idade das trevas" é um período da história que enfatiza as deteriorações cultural e
econômica que ocorreram na Europa entre os séculos V e IX consequentes do declínio
do Império Romano. A expressão Idade das Trevas referida à Idade Média foi muito
utilizada no passado. Alguns historiadores usaram esta expressão, pois tinham como
referências a cultura greco-romana e o Renascimento. De acordo com estes
historiadores, a Idade Média foi uma época com pouco desenvolvimento cultural, pois a
cultura foi controlada pela Igreja Católica. Afirmavam também que praticamente não
ocorreu desenvolvimento científico e técnico, pois a Igreja impedia estes avanços ao
colocar a fé como único caminho a seguir. O rótulo "idade das trevas" é empregado no
tradicional embate entre luz versus escuridão para contrastar a "escuridão" deste período
com os períodos anteriores e posteriores de "luz".
Geralmente, a Idade das Trevas se refere ao período da história que teve início com a
queda do Império Romano do Ocidente. O termo "trevas" foi usado para caracterizar
práticas retrógradas que prevaleciam durante este período da Idade Média. A Idade das
Trevas aconteceu quando o último imperador do Ocidente, Rômulo Augusto, foi
deposto por Odoacro, um bárbaro. Esse evento aconteceu em 476 DC. A Idade das
Trevas foi também os anos das conquistas muçulmanas. Juntamente com outros
nômades e guerreiros com cavalos e camelos, os muçulmanos atravessaram o império
em decadência, causando estragos e semeando heresia intelectual e social em seu
caminho. As conquistas muçulmanas prevaleceram até a época das Cruzadas que
ocorreram de 1096 a 1270. Este antigo conflito entre o Cristianismo e o Islamismo
permanece até hoje.
A Idade das Trevas foi uma época conturbada. Invasores errantes a cavalo atacavam os
campos. Surgiram conflitos religiosos. Os muçulmanos conquistaram terras. A escassez
de boa literatura e realizações culturais e práticas bárbaras prevaleceram. O período da
Idade das Trevas foi visto também como uma época de fé. Homens e mulheres
buscavam a Deus. Alguns através dos mais sérios rituais da Igreja Católica, outros em
formas protestantes de adoração. Os intelectuais, por sua vez, viam qualquer religião,
por si mesma, como um tipo de "escuridão". Estes pensadores afirmavam que as crenças
religiosas alienavam as pessoas criando uma falsa realidade. Estavam dominados pelas
emoções, não pela razão. A religião era vista como contrária à racionalidade e à razão, e
essa mentalidade foi que deu início ao Iluminismo – um afastamento da “escuridão”. A
ciência e a razão ganharam ascendência, progredindo de forma constante durante e após
a Reforma Protestante e o Iluminismo.
O fim do Império Romano e a "quebra" da economia escravista são explicados por
alguns historiadores como resultados do assalto dos povos bárbaros que teve como
consequência a destruição do sistema econômico escravista. Outros historiadores têm
procurado ver na própria crise interna do império, particularmente a partir do século IV,
as sucessivas revoltas antiescravistas e camponesas que assolaram os últimos anos do
Império Romano como causas da decadência romana e sua fragilidade em face dos
povos bárbaros. Isto é, o império estava condenado antes do assalto dos povos bárbaros,
sendo que a presença das tribos germânicas teve o papel de tornar complexa uma crise
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em pleno curso. Outros historiadores identificam o fim do Império Romano no
expansionismo militar e sua crise, com a consequente dificuldade de refazer os
contingentes de escravos, assim como o colapso das estruturas fiscais e financeiras do
império, que tiveram um papel central na crise romana.
O Império Romano era, em verdade, varrido por uma grande vaga de revolta social,
normalmente enfrentada com incrível rigor pelas autoridades romanas. Alguns
historiadores viam nas revoltas antiescravistas e camponesas manifestações de
banditismo ou simples "tumultos" em um mundo assaltado pela barbárie não levando
em conta a profunda miséria da grande maioria das populações romanas escravizadas.
A ordem social romana estava seriamente abalada desde o reinado de Cômodo (180
DC), quando surge um profundo movimento insurrecional na Gália. Este movimento,
que se estende até o século V, foi consequência da pauperização crescente das massas
trabalhadoras do campo.
No seu conjunto, todo o Império Romano empobrecia. As cidades destruídas pelas
primeiras invasões mal são reconstruídas, as minas são abandonadas (sinal máximo do
empobrecimento romano) e os jogos circenses são interrompidos. Junto ao povo a
situação é bem mais dramática porque nos campos, a miséria lança sobre as grandes
rotas bandos de vagabundos e desocupados que, em busca de trabalho, dinheiro ou
comida, se transformavam em bandidos. Daí era um passo para, em bandos mais ou
menos armados, surgirem como real ameaça à ordem estabelecida. Não havia grupos
organizados politicamente e agrupados em torno de uma ideologia qualquer.
Na era contemporânea, o equivalente ao Império Romano é representado pelo
imperialismo exercido pelos Estados Unidos e os bárbaros são os povos dos países
capitalistas periféricos e semiperiféricos objetos há séculos da espoliação imperialista
exercida pelas grandes potências ao longo da história. Da mesma forma que o fim do
Império Romano se explica pelo expansionismo militar e com o colapso de suas
estruturas fiscais e financeiras o mesmo está acontecendo com os Estados Unidos que,
enfraquecido econômica e financeiramente, já não reúne mais as condições de expandir
seu poder militar em todo o mundo. Da mesma forma que o Império Romano estava
condenado antes do assalto dos povos bárbaros, os Estados Unidos apresentam também
as mesmas características.
Da mesma forma que as sucessivas revoltas antiescravistas e camponesas que assolaram
os últimos anos do Império Romano foram, também, causas da decadência romana e de
sua fragilidade em face dos povos bárbaros, os governos dos Estados Unidos e de seus
aliados enfrentam dificuldades para manterem subjugadas as populações no interior de
seus países, especialmente, no momento atual de crise profunda do sistema capitalista
mundial responsável pela queda na atividade econômica e a elevação dos níveis de
desemprego que atinge profundamente o proletariado e a classe média. A manutenção
da ordem pública está se tornando cada vez mais difícil nesses países. A era
contemporânea de declínio do capitalismo aponta no sentido de que estamos
caminhando a passos largos para uma era tão obscura quanto foi a Idade das Trevas na
Idade Média.
A Humanidade mergulha em nova Idade das Trevas porque estamos vivenciando,
também, crescente desintegração social em todos os países do mundo, o incremento dos
conflitos internacionais e, até mesmo, a ameaça de sobrevivência da vida no planeta
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resultante da mudança climática catastrófica em curso. A gigantesca crise do sistema
capitalista mundial e o declínio dos Estados Unidos como potência hegemônica
econômica e militar se associam à luta dos bárbaros modernos representados pelos
povos dos países capitalistas periféricos que buscam sua emancipação da espoliação
exercida pelas grandes potências capitalistas lideradas pelos Estados Unidos. A invasão
dos bárbaros modernos ocorre no momento com a presença na Europa Ocidental e nos
Estados Unidos de grupos terroristas oriundos, sobretudo dos países islâmicos.
Tudo indica que já estamos às vésperas de uma transição entre o sistema capitalista em
declínio e o advento de um novo sistema econômico cuja passagem será tão traumática
quanto à do escravismo para o feudalismo na Idade Média haja vista a dificuldade ou
impossibilidade de conciliar os interesses das potências imperialistas lideradas pelos
Estados Unidos e os povos espoliados do mundo inteiro. Esta dificuldade ou
impossibilidade resulta do fato de o sistema capitalista dominante se caracterizar pela
onipresença de sua ideologia mercantil que ocupa ao mesmo tempo todo o espaço e
todos os setores da vida. Esta ideologia não diz nada mais do que: produza, venda,
consuma, acumule! Ela reduziu todas as relações humanas em relações mercantis e
considera nosso planeta como uma simples mercadoria. O dever que nos impõe é o
trabalho servil. O único direito que ele reconhece é o direito à propriedade privada. O
único deus que ele adora é o dinheiro.
A onipresença da ideologia mercantil com o culto ao dinheiro faz com que a
humanidade fique sujeita à ação do sistema mercantil totalitário. O homem, a sociedade
e o conjunto de nosso planeta estão ao serviço desta ideologia. O sistema mercantil
totalitário realizou o que nenhum totalitarismo conseguiu fazer antes: unificar o mundo
à sua imagem. Hoje já não existe exílio possível. Até atingir o colapso, o sistema
capitalista mundial produzirá mortes e destruição em uma escala sem precedentes na
história da humanidade em todos os quadrantes da Terra. A barbárie caracterizada pelas
revoltas e revoluções sociais em cada país e pelos conflitos internacionais será a
principal marca do sistema capitalista mundial até o final de sua trajetória. À medida
que a opressão capitalista se estende por todos os setores da vida, a possibilidade de
revolta adquire aspecto de uma guerra civil em escala nacional e global que já se
manifesta na atualidade. A destruição da sociedade mercantil totalitária que impera hoje
é inevitável porque o sistema capitalista já está condenado à morte. Estamos apenas no
início de motins, revoltas e revoluções sociais que renascem em toda parte do planeta e
anunciam o fim da nova Idade das Trevas e a emergência de um novo Renascimento.
*Fernando Alcoforado, 76, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em
Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor
universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento
regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São
Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo,
1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do
desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de
Barcelona,http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento
(Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos
Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the
Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller
Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe
Planetária (P&A Gráfica e Editora, Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e
combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011),
Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012),
Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV,
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Curitiba, 2015) e As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo
(Editora CRV, Curitiba, 2016). Possui blog na Internet (http://fernando.alcoforado.zip.net). E-mail:
falcoforado@uol.com.br.