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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA E ESPORTE
Dos questionários de atividade física ao método da escuta: para
além da crítica ao discurso do medo e o resgate da relação com o
corpo
Rodrigo Hisgail de Almeida Nogueira
São Paulo
2019
RODRIGO HISGAIL DE ALMEIDA NOGUEIRA
Dos questionários de atividade física ao método da escuta: para
além da crítica ao discurso do medo e o resgate da relação com o
corpo
Monografia apresentada à Escola de
Educação Física e Esporte da
Universidade de São Paulo, como
requisito parcial para a obtenção do
título de Bacharel em Educação
Física.
Área de Concentração:
Educação Física e Saúde
Coletiva/Saúde Pública
Orientadora:
Professora Dra. Yara Maria de
Carvalho
São Paulo
2019
1
FICHA DE APROVAÇÃO
Autor​: NOGUEIRA, Rodrigo Hisgail de Almeida
Título​: Dos questionários de atividade física ao método da escuta: para além da
crítica ao discurso do medo e o resgate da relação com o corpo.
Monografia apresentada à Escola de
Educação Física e Esporte da
Universidade de São Paulo, como
requisito parcial para a obtenção do
título de Bacharel em Educação
Física.
Data: ____/____/____
Banca Examinadora
Prof. Dr.:________________________________________________________
Instituição:_______________________________ Julgamento:_____________
Prof. Dr.:________________________________________________________
Instituição:_______________________________ Julgamento:_____________
Prof. Dr.:________________________________________________________
Instituição:_______________________________ Julgamento:_____________
2
AGRADECIMENTOS
À Iris, flor que segue a brotar em minha vida, ao nosso carinhoso Mathias, que
me enche de alegria, e a minha família, pelo amor de todos os dias.
Aos queridos amigos que apoiaram cada novo passo desta emocionante difícil
trajetória, porém possível e prazerosa, de novos aprendizados e significados.
Aos professores desta Universidade de São Paulo em nome da minha
orientadora, Profa. Dra. Yara Maria de Carvalho, pelo corpo de conhecimento
adquirido, que possibilitou tantas revelações nas diferentes dimensões pelas
quais perpassa a área de conhecimento da Educação Física na atualidade.
Aos supervisores e colegas de estágio que compartilharam de importantes
aprendizados obtidos desde as bancadas de pesquisa aos trabalhos em campo.
Aos queridos alunos, que a mim confiaram a oportunidade de cada novo
encontro, especiais em sua particularidade, e fundamentais para o meu
desenvolvimento e formação profissional.
À Pró-Reitoria de Extensão Universitária e à Pró-Reitoria de Graduação pelos
financiamentos obtidos nos Programas Unificado de Bolsas de Estudos para
Apoio e Formação de Estudantes de Graduação e Aprender na Comunidade.
Dedico este trabalho à classe trabalhadora. ​In memoriam ​a Marielle Franco,
socióloga, política, feminista e defensora dos direitos humanos no Brasil.
3
NOGUEIRA, Rodrigo Hisgail de Almeida. Dos questionários de atividade
física ao método da escuta: para além da crítica ao discurso do medo e o
resgate da relação com o corpo. São Paulo - SP, 2019. [Monografia de
Bacharelado – Escola de Educação Física e Esporte – Universidade de São
Paulo].
RESUMO
As práticas corporais figuram-se na atualidade como uma forma de
resgate e cuidado da relação com o corpo e com o outro, reconhecendo na
existência dos afetos importantes elementos para a construção de uma
proposta de intervenção da Educação Física na área da Saúde Coletiva. Os
objetivos da presente investigação foram estabelecer uma reflexão crítica sobre
as estratégias de intervenção da Educação Física no campo da Saúde Coletiva,
além de avançar ​n​o exercício de uma proposta de intervenção pelo método da
escuta junto a oito sujeitos aleatoriamente selecionados, em que identificou-se
distintas formas de afetos disparados ao pensar suas vivências corporais. A
abordagem mecano-sanitarista oriunda da sociedade moderna parte, por sua
vez, da orientação voltada à educação e governo dos corpos, pautada numa
conduta moral de caráter higienista e protocolização dos cuidados, através de
doses mínimas de esforço físico que ofereçam benefícios à saúde. Ferramentas
de medida foram criadas, entre elas os questionários de avaliação de nível de
atividade física que, no entanto, oferecem uma ilustração imprecisa da
realidade. No Brasil, recentes pesquisas apresentaram critérios inconsistentes,
reduzindo-se a indicadores em busca de alguma aproximação com o tema.
Palavras-chave: Práticas corporais, Saúde Pública, Filosofia.
4
NOGUEIRA, Rodrigo Hisgail de Almeida. ​From physical activity
questionnaires to the listening method: beyond the criticism of the fear discourse
and the rescue of the relationship with the body​. São Paulo - SP, 2019.
[Monografia de Bacharelado – Escola de Educação Física e Esporte –
Universidade de São Paulo].
ABSTRACT
The body practices are nowadays a way of rescue and care of the
relationship with the body and the other, recognizing in the existence of the
affection important elements for the construction of a Physical Education
intervention proposal in the Collective Health area. The objectives of the present
investigation were to establish a critical reflection on the intervention strategies
of Physical Education in the field of Collective Health, as well as to advance the
exercise of an intervention proposal by the method of listening with eight
randomly selected subjects, in which we identified different forms of affections
triggered when thinking about their bodily experiences. The mechano-sanitarist
approach from modern society starts, in turn, from the orientation towards the
education and governance of the bodies, based on a hygienist moral conduct
and protocol of care, through minimum doses of physical effort that offer health
benefits. Measurement tools have been created, including physical activity level
assessment questionnaires which, however, provide an inaccurate illustration of
reality. In Brazil, recent research has presented inconsistent criteria, reducing
itself to indicators seeking some approximation with the theme​.
Key words​: ​Body practices, Public Health, Philosophy​.
5
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 - Nuvem de termos………………………………………………………...32
6
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Termos mais frequentemente relacionados aos trechos dos
relatos.33
Tabela 2 - Síntese das definições das principais recomendações mundiais para
atividade física, 2014…………………………………………………………………58
Tabela 3 - Classificação da intensidade do exercício: intensidade absoluta e
relativa do exercício para exercício resistido e capacidade cardiorrespiratória.61
Tabela 4 - Vantagens e desvantagens dos métodos de medida de atividade
física……………………………………………………….…………………………...65
Tabela 5 - Coeficientes de correlação ajustados para sexo/idade entre diversos
questionários de atividade física e oito domínios de validação………………….71
7
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Prática de atividade física em tempo de lazer pela população
brasileira por sexo - em %..................................................................................89
8
SUMÁRIO
Introdução…………………………………………………………………………….11
1. Práticas corporais e exercício da escuta…….……………………………...16
1.1. Relatos pessoais………………………………………………………………...18
1.2. Cuidados com o gesto…………………………………………………………..31
1.2.1. Nuvem de termos……………………………………………………….31
1.2.2. Afetos disparados……………………………………………………….33
1.2.3. Proposta de intervenção……………………………………………….39
1.3. Práticas corporais no campo da saúde……………………………………….42
2. Protocolização dos cuidados e suas formas de instrumentalização…..48
2.1. Governo dos corpos……………………………………………………………..48
2.2. A retórica do ​agito​…………………………………………………………….....53
2.3. Principais recomendações para prática de atividade física…………………57
2.3.1. Consensos e divergências entre os protocolos internacionais…….58
2.3.2. Determinações sobre a intensidade de realização da prática……..60
2.3.3. Instrumentos de medida da atividade física………………………….64
2.3.4. Questionários de atividade física: limitações ao uso………………..69
3. “​Bio​estatística” da atividade física no Brasil …………..…………………..82
3.1. Diagnóstico Nacional do Esporte (Diesporte) (2013)..................................83
3.2. Práticas de Esporte e Atividade Física (2015).............................................85
3.3. Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças
Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) (2006 - 2018)...................................88
3.4. Pesquisa Nacional de Saúde (2013)...........................................................91
3.5. Algumas reflexões..…………………………………………………………......94
Conclusão…………………………………………………………………………….97
9
Bibliografia………………………………………………………………………….100
Anexos……………………………………………………………………………….111
10
INTRODUÇÃO
A Universidade é uma fonte de produção de inúmeros conteúdos,
disciplinas, seminários de pesquisa, trabalhos acadêmicos, estágios de
extensão, etc., por isso, a quantidade de informação sistematizada para o
alcance desse projeto foi enorme e pautou-se em diferentes perspectivas e
dimensões do conhecimento, fato que exigiu, assim, alguns recomeços a cada
nível de profundidade e clareza alcançado​s​.
Interessado na atuação junto ao mercado da prevenção de doenças e
agravos crônicos com a saúde, entrei no campo da Educação Física prevendo
boas possibilidades de negócio juntamente a uma população que adota hábitos
de vida ditos “inadequados” e que gradualmente se torna mais longeva.
Assunto pertinente, porém, insuficiente para alguém que possui uma formação
prévia em Economia Política, campo que reconhece haver no sistema
capitalista contradições e vínculos de poder existentes na esfera das relações
sociais de produção que, além da tradicional exploração da força de trabalho e
dos espaços de viver, chega também ao domínio dos próprios corpos.
Situo-me num momento em que reconheço haver limitações a este
modelo “utilitarista” da Educação Física pautado na hegemonia
mecano-sanitarista e, apesar de convocá-lo, juntamente a outras práticas
estudadas e vivenciadas, tal discurso mostra-se ser, também, subproduto de
uma nova ordem econômica mundial pautada pelos interesses do ​laissez-faire​,
por meio da proliferação de uma retórica pautada num tipo de mensagem de
medo e necessidade de controle de fatores de risco modificáveis, em especial,
a inatividade física, ou sedentarismo.
11
Distante de firmar qualquer tipo de apologia ao sedentarismo, reconheço
haver a necessidade de que tanto o profissional de Educação Física, como e
principalmente a população, não sejam “capturados” pelo discurso dominante
do “corpo saudável”. Em última instância, à medida que o indivíduo é capturado
pela mensagem midiática, e também científica, privado-o de constituir a
gestualidade e o cuidado acerca da sua relação com seu próprio corpo, com
respeito à sua história e afetos aí envolvidos, isso pode levar à algum tipo de
dominação e governo sobre os corpos.
Nesse sentido, o estudo do indivíduo sob a perspectiva da Educação
Física e seus desdobramentos sobre o movimento dos corpos tem se
desenvolvido numa importante e abrangente área de conhecimento, na qual
muitas óticas sobre um mesmo objeto mostram-se possíveis sob algum tipo de
perspectiva político-ideológica, sendo capazes, inclusive, de orientar projetos e
ações de intervenção pública pautada em grupos particulares de interesse.
Essas diversas possibilidades conferem ao campo da Educação Física
diferentes abordagens teóricas, das quais sagrou-se vencedora a de cunho
mecânico-biologicista apoiada no discurso neoliberal de dominação sanitarista,
e recentemente apoiada na retórica do “agito” (Fraga, 2006). Ao impor sua
ideologia através da ênfase quanto aos risco de agravos e doenças crônicas e
degenerativas com a saúde, sem considerar elementos de diferentes
dimensões, tais correntes mais podem levar a alguma forma de dominação
econômica por meio dos corpos, do que ao desenvolvimento das estruturas
sociais.
Diante da hegemonia das concepções sobre as atividades e exercícios
físicos para a saúde, destaca-se as normas internacionais para padronização
dos cuidados e recomendações para prática de atividade física para a
12
população, sendo a mais amplamente conhecida aquela que oferece uma
“dose” mínima de esforço físico que resulte em benefícios para a saúde. Ela
deve ser de pelo menos 150 minutos acumulados por semana de atividade
física moderada ou 75 minutos por semana de atividade física vigorosa, em
sessões de pelo menos 10 minutos de duração, sem determinação de
frequência semanal (WHO, 2010, p. 26).
Disso decorre a construção de todo um aparato metodológico que
utiliza-se de instrumentos de medida para qualificação do nível de atividade
física praticada pelo indivíduo, como é o caso dos questionários de nível de
atividade física. À medida que tais ferramentas categorizam os sujeitos em
ativos, insuficientemente ativos ou inativos através da estimativa sobre a
quantidade de atividade física habitual praticada por eles, transfere-se a eles a
responsabilidade por sua condição de “sedentário” ou, ainda, “preguiçoso”. Tal
condição cria um padrão medicalizador que, além disso, pode ser impreciso e
insuficiente em seu propósito.
Por um lado, a imprecisão dessas ferramentas diz respeito a uma série
de limitações - metodológicas, do contexto do indivíduo e também de ordem
social - sobre a realidade da atividade física praticada. Subentende-se, dessa
forma, que um questionário de atividade física não consegue avaliar, como
deseja reproduzir o ​mainstream​, todos os tipos e quantidades de prática​s​, não
sendo possível criar, assim, a expectativa de que algum deles ofereça uma
representação fidedigna e válida da realidade.
Por outro lado, o uso dessas ferramentas é insuficiente, pois apesar de a
norma para a prática de atividade física pouco colaborar para a melhoria do
quadro de inatividade física da população - o que é contraditório, já que tais
ferramentas deveriam pautar ações que levassem as pessoas a se tornarem
13
pelo menos mais ativas -, elas objetificam o sujeito da ação como se fosse um
autômato e a ele transfere a responsabilização por sua condição de
corpo-marginal, submetido às distintas formas de vulnerabilidades, seja de
cunho motor, socioeconômico, afetivo, espacial, entre outras vividas.
Tais ferramentas parecem atuar, assim, mais no sentido de colaborar
para a proliferação de um discurso político-ideológico neoliberal de dominação
e governo dos corpos do que de levar a condições que atuem no cerne do
problema da desigualdade social e falta de autonomia em curso, estas sim que
são questões anteriores à inatividade física e que dizem respeito, entre outr​a​s,
a um tipo de cerceamento que limita a realização das práticas corporais, tais
como ​a ​escassez de tempo, falta de espaços públicos de qualidade, falta de
repertório corporal e, principalmente, proliferação de abordagens pouco
inclusivas e que não valorizam o cuidado com o corpo.
Os objetivos da presente investigação foram estabelecer uma
reflexão crítica sobre as estratégias de intervenção da Educação Física no
campo da Saúde Coletiva, além de avançar no exercício de uma proposta
de intervenção pelo método da escuta junto a oito sujeitos aleatoriamente
selecionados.
O método de investigação contou com: uma coleta de dados de caráter
qualitativa realizada com uma amostra de oito participantes de diferentes faixas
etárias, sexo, e sem qualquer restrição para participação; uma revisão
abrangente sobre as principais normas de intervenção e instrumentos de
medida para avaliação do nível de atividade física no tempo de lazer, com
destaque para alguns dos principais questionários de nível de atividade física
selecionados com base na disponibilidade de estudos sobre sua validação; bem
como de uma recente base de pesquisas de institutos públicos nacionais, que
14
ofereciam como critério de análise dados demográficos sobre a prática de
atividade física, especialmente ​n​o tempo de lazer.
Com o intuito de convidar o sujeito da história, neste caso um aluno ou
aluna, a ser participante da construção da proposta de intervenção, o primeiro
capítulo, “Práticas corporais e o exercício de escuta” apresenta o resultado de
um levantamento feito com oito sujeitos, a partir do método da escuta,
evidenciando alguns dos principais afetos neles disparados ao pensar sua
relação com as práticas corporais por eles vivenciadas. Daí decorre importantes
elementos sobre o trabalho de intervenção proposto, baseado no cuidado com
os gestos e demais fundamentos da abordagem das práticas corporais.
Frente à dominância das abordagens mecânico-biologicistas de
intervenção da Educação Física no campo da Saúde Coletiva, o segundo
capítulo, “Protocolização dos cuidados e suas formas de instrumentalização”
procurou refletir sobre como as principais recomendações e ferramental teórico
que embasam esta construção, enfatizando o uso dos questionários para
classificação do nível de atividade para uma vida saudável, levam a uma certa
forma de dominação e governo sobre os corpos.
Finalmente, frente a alguns dos principais conceitos e significados sobre
as práticas corporais na contemporaneidade, o terceiro capítulo “‘​Bio​estatística
da atividade física no Brasil’” tem vistas a obter uma “radiografia” sobre o perfil
de realização das atividades físicas e esportivas pela população brasileira que,
amparada no intuito de caracterizar o quão ativa é esta população,
comparativamente às normas internacionais, leva à criação de biodados que
geram mudanças sociais insuficientes, simplificando-se, assim, a indicadores
que buscam alguma aproximação com o tema, mas cuja utilidade destina-se
mais ao seu uso midiático do que propriamente científico e social.
15
CAPÍTULO 1 - PRÁTICAS CORPORAIS E EXERCÍCIO DA ESCUTA
Através do método da escuta, uma amostra de oito participantes, sendo
5 mulheres, com idade média de 50 ±17 anos, foi aleatoriamente selecionada
por um mesmo pesquisador e convidada a responder ao seguinte
questionamento: o que um profissional da área da Educação Física deveria
saber sobre você e seu corpo (prazeres, dores, medos, frustrações, anseios)
baseado nas suas experiências com as atividades físicas e práticas corporais
ao longo da vida?
A pergunta foi encaminhada entre os meses de maio a agosto de 2019
por mensagem de texto ou ​e-mail a doze sujeitos, que correspondiam a alunos
de ​personal trainner de um dos pesquisadores deste estudo, dos quais houve
oito respostas. O tempo de intervenção com cada participante variou de 0-30
meses sem que tenha havido vínculo ou relação empregatícia ou de qualquer
outra natureza com qualquer instituição ou órgão que sustentasse a realização
dos encontros. A resposta era condicionada ao interesse e disponibilidade de
cada participante em respondê-la.
A partir da leitura das cartas, cada termo afetivo associado à experiência
com o corpo ao longo da vida foi listado em uma tabela eletrônica e relacionado
ao trecho correspondente da carta. Reuniu-se os termos mais frequentemente
mencionados em uma “nuvem de palavras” contendo diferentes níveis de1
frequência de repetições, de acordo com o tamanho da palavra.
Em seguida​, estes termos foram analisados, um a um, por meio de filtros
aplicados às colunas das planilhas eletrônicas. A seleção de cada termo
revelava um conjunto de trechos compilados de uma ou diferentes narrativas
1
Serviço gratuito oferecido pelo site eletrônico ​https://www.wordclouds.com/
16
mas que assemelhavam-se. Seguiu-se à análise uma reflexão crítica realizada
a partir do reconhecimento dos afetos também disparados nos pesquisadores e
sua importância para a construção de outros modos de pensar e fazer
educação física.
17
1.1. Relatos pessoais
1.1.1. S.L., 74a, feminino.
18
1.1.2. C.C., 33a, masculino.
19
20
1.1.3. C.M., 59a., masculino.
21
22
23
1.1.4. S.T., 66a., feminino
24
25
1.1.5. J.B., 39a., feminino.
26
1.1.6. I.F., 31a., feminino.
27
28
1.1.7. A.H., 62a., feminino.
29
1.1.8. E.C., 36a., masculino.
30
1.2. Cuidados com o gesto
Partindo-se dos relatos anteriormente apresentados, o exercício da
escuta aqui realizado seguiu com a interpretação de alguns dos principais tipos
de afetos e condições associados à experiência deste grupo com seu repertório
de práticas corporais e atividades físicas já vivenciados.
Procurou-se identificar, com isso, o significado de alguns trechos
frequentemente associados às vivências motoras, contidos em cada um dos
relatos. Trata-se, assim, do ponto de partida a partir do qual é possível
compreender o quanto um gesto motor pode vir a ser positivo ou, nocivo, para a
condição de cada sujeito.
1.2.1. Nuvem de termos
A nuvem de palavras representada na Figura 1 reúne os termos mais
frequentemente associados a cada um dos trechos do conjunto de relatos
apresentado no item anterior, a partir da interpretação dada pelo autor. Em uma
breve análise já é possível a identificação da existência de diferentes níveis de
frequência de repetições de uma mesma palavra conforme o seu tamanho
verificando-se, assim, a existência de palavras de primeiro nível de frequência
de repetição, segundo, terceiro, e sucessivamente.
31
Figura 1: Nuvem de termos.
O propósito aqui é evidenciar como alguns termos destacam-se frente
aos demais: saúde, desconforto, desprazer, obesidade, preconceito, dor,
prazer, consciência, medo, obrigação, abandono, humilhação, sedentarismo e
sofrimento, que na sua maioria representam afetos tristes e condições
negativas relacionados às experiências com as atividades físicas e práticas
corporais relatados pelo grupo (Tabela 1).
32
Termos
Número de
vezes
saúde 9
desconforto 7
desprazer 7
obesidade 7
preconceito 7
dor 6
prazer 6
consciência 5
medo 5
obrigação 5
abandono 4
humilhação 4
sedentarismo 4
sofrimento 4
Tabela 1: Termos mais frequentemente relacionados aos trechos dos relatos
1.2.2. Afetos disparados
Ao tomar contato e analisar este conjunto de relatos a partir de um ponto
de escuta sobre o os elementos abordados por cada indivíduo, uma espécie de
onda de afetos tomou conta de mim - do interlocutor que as leu -​, sob forma de
importantes revelações que marcaram a sensibilidade do futuro profissional
quanto a elementos presentes na dimensão afetiva dos indivíduos.
1.2.2.1. Condição de saúde
O termo saúde foi aquele que apresentou maior frequência de
correspondência quando pensado sob a ótica da atividade física. Não é de
33
surpreender que grande parte dos termos que indicam afetos e/ou condições
relacionadas às experiências com as atividades físicas relatados pelo grupo de
sujeitos avaliados estejam ligadas à prevenção à saúde, especialmente aos
cuidados com agravos a doenças crônicas não transmissíveis, como no caso da
obesidade e dor crônica, termos frequentemente relatados, incluindo-se aí,
também, o sedentarismo como um elemento de preocupação ligado ao estilo de
vida “ativo”.
No primeiro parágrafo de seu relato, a jovem I.F., 31a., revela: “talvez o
primeiro impulso para a prática de atividades físicas seja criar um hábito
saudável, e atingir uma estética corporal, como emagrecer ou ganhar massa
muscular”. Não obstante, também a senhora S.T., 66a., considera que “a
atividade física e as práticas corporais são importantes para nos mantermos em
equilíbrio e saudáveis, física e mentalmente”.
As práticas corporais são, assim, lançadas ao principal foco de
solucionar problemas ou dificuldades com a saúde, como no caso de J.B., 39a.,
fem., que “acordando as 04:30 e dormindo por volta das 24:00, aprendi a comer
besteiras, fui aumentando a minha massa corporal, principalmente a de
gordura”.
Além da prevenção à saúde, e da tentativa de compensação de um
quadro de sobrepeso, obesidade, ou estilo de vida sedentário, episódios
relacionados à busca pela cura para solucionar alguma dor osteomioesquelética
também chama a atenção quando relacionada à busca pelas práticas corporais
e atividades-físicas. A mesma J.B. revela em tom de auto-deboche que “hoje,
com 39 anos, 66kg, trabalhando fazendo entregas, carregando peso, uma
hérnia de disco, uma protusão e dor no nervo ciático, consigo enxergar (não
pelo amor e sim pela dor kkkk), a necessidade de inserir exercícios físicos na
34
minha rotina”. Não diferente, C.M. menciona que “com 59 anos de idade, duas
hérnias de disco e com o nervo ciático que me incomoda muito (...) é
dolorosamente necessário enfrentar esse percurso”.
Invés de ser despertado pelo prazer com o gesto praticado, o despertar
do corpo, nestas situações, apresentaram-se por meio da dor, evidenciando
que estes indivíduos passaram décadas sem vivenciar experiências de
movimentos corporais positivas com seus corpos, a ponto dessa associação
ocorrer a partir de um ponto de incômodo, nestes casos a dor, ou o medo de
adoecer, de engordar, de não atender a padrões estéticos e assim por diante.
1.2.2.2. Aspectos afetivos-sociais
Afora àqueles termos que remetem à preocupação com a saúde, ou sua
prevenção, outro conjunto de manifestações associadas às experiências
corporais relatadas pelo grupo diz respeito a aspectos de cunho afetivo-social.
Entre os termos, destacam-se: desconforto, desprazer, preconceito, prazer,
consciência, medo, obrigação, abandono, humilhação e sofrimento. Elementos
marcantes, a maioria deles sinaliza a episódios de desagrado a partir de algum
tipo de violência sofrida.
O corpo que é estranho a si mesmo é o primeiro elemento a chamar a
atenção, evidenciando o distanciamento já existente da pessoa com o seu lugar
de morada, seu próprio corpo. C.M., 59a., masculino, considera ser seu corpo
“praticamente um estranho, distanciado, inatingível (...) Nunca me dei bem com
o meu corpo”. E completa com suas memórias de infância: “eu sempre usava
umas camisetas brancas por baixo, grossas e de manga longa que, com
frequência me faziam transpirar mesmo no inverno”.
35
O desconforto com as experiências corporais de movimento podem
manifestar-se e causar, em alguns, auto-bloqueios que até mesmo impedem ou
retardam, sobremaneira, o indivíduo de iniciar um programa de treinamento.
“Tenho vergonha só de tentar (...) teve sempre (e tem até hoje, embora muito
menos) um desconforto com o corpo”, C.C., 33a. Para ele, o desconforto
alcançou tal medida a ponto de afastá-lo de possíveis experiências com as
práticas corporais. “A natação e a musculação foram boas nesse sentido, pois
posso fazer sozinho, longe dos olhos avaliadores temidos pelo meu
inconsciente (ou já “consciente” rss)”, completa. ​Os preconceitos por ele
enfrentado iniciou-se, neste caso, da própria família. “Sofria certa pressão pela
família, em especial pela minha mãe, que me cobrava desempenho em
atividades tipicamente de meninos (...) Era como se minha falta de aptidão
revelasse o que eu tinha que esconder na época”, revela.
A falta de atenção, ou de sensibilidade da família e do próprio núcleo
escolar para acolher a condição do Outro, a partir de tentativa de padronizá-lo a
um certo tipo de estereótipo que atenda a padrões sociais estabelecidos passa
a ser, assim, um dos elementos que tanto reprime, como distancia o indivíduo
de relacionar-se com seu próprio corpo, a partir das mais diversas experiências,
incluindo-se aí aquelas associadas às práticas corporais. Em suas palavras,
“entendo que se a divisão de gênero fosse menos rígida, se tivesse tido mais
liberdade de eu poder fazer o que eu tivesse vontade, se fosse menos cobrado
para ser igual aos outros meninos (ou ao que minha mãe entendia ser um
menino), a história pudesse ter sido outra”.
Episódios envolvendo humilhação durante a prática de atividades físicas
não são raros, especialmente no ambiente escolar, facilitando o distanciamento
do indivíduo do alcance de alguma forma de prazer com tais elementos.
36
Relembrando da experiência junto ao seu professor na aula de educação física
quando criança, C.M., 59a., revela:
“Ele parava a aula e gritava perguntando para um colega
quantas cambalhotas ele tinha feito. Em seguida gritava: C.M.:
quantas fez? A resposta era sempre: Nenhuma! E a turma
festejava dando risada (...) essa cena se repetiu muitas vezes,
mas nunca nenhum professor dedicou uns minutos para me
explicar individualmente qual era a técnica para poder fazer
corretamente essa cambalhota (...) Ficar radicalmente por
último era muito humilhante, me angustiava muito”.
Em alguns casos, o grau de assédio sofrido pode ter sido tal que, como
no caso de S.L., 74a., feminino, ela relata: “nunca fui de praticar esportes com
prazer (...) nunca me deu prazer”. E.C., 36a., masculino, considera que a
prática de atividade física, “precisa ser um prazer para o aluno, não uma
‘pressão’”.
Soma-se a isso a possível existência de medos de diferentes ordens
incorporados às vivências motoras relatadas pelos indivíduos e que podem se
tornar barreiras para a elaboração de um programa de treinamento,
afastando-os ainda mais da prática corporal. I.F., 31a., feminino, preocupada
em não lesionar-se, relata: “avisei o professor logo na primeira aula, com medo
de me machucar novamente”.
A dominância do discurso do medo sobre os corpos é tal, que muitas
vezes, a falta de consciência corporal provocada pelo afastamento do indivíduo
do próprio corpo constitui-se em um dos maiores medos a serem enfrentados,
uma condição nocebo. Segundo a mesma I.F., 31a., “ao longo das aulas, os
alunos tomam maior consciência de seus corpos e percebem que o que
achavam ser seus limites, muitas vezes são medos”.
37
Tais medos, que em alguns momentos se misturam com o sentimento de
abandono, denunciam ser a falta de acolhimento, especialmente quando
pensada a prática corporal ao longo do período de desenvolvimento e
afirmação do indivíduo, um dos principais elementos que leva ao seu
distanciamento da prática corporal. C.M., 59a., afirma, desta forma:
“demorei muitos anos para tomar consciência de que eu tinha
estatura baixa (1,64 m) como se o corpo fosse algo para não
dar nenhuma atenção (...) Não faz muitos anos que descobri,
com muita raiva e revolta, que houve alguns grandes atletas,
em diversas modalidades de esportes, que eram de estatura
baixa. Eu achava que a única alternativa era desenvolver a
mente...”
Diante dessas situações de violência enfrentadas, seja por experiências
ruins do passado, ou diante do discurso dominante de fazer sentir medo, muitos
destes indivíduos relatam praticar atividades físicas como uma espécie de
obrigação associada à saúde, porém, avaliando haver no processo um aspecto
dificultoso que beira o desagrado. “Tenho que me forçar a sair de casa”,
escreve S.L., 74a. Segundo C.C., 33a., “era, por vezes, empurrado pelos meus
pais para fazer”.
Fora os poucos trechos dos relatos que indicavam haver algum tipo de
prazer e ganho de consciência corporal percebidos a partir da realização das
práticas corporais vivenciadas, torna-se evidente a predominância dos afetos
ligados a aspectos essencialmente violentos, resgatados deste exercício de
escuta.
A partir de uma lógica pautada no poder sobre os corpos, empenhada na
razão e na produtividade, desconsiderando qualquer tipo de afeto, a sociedade
38
passa a enxergar a relação com o corpo como algo acessório, que pode ser
deixado de lado até que se volte a reconhecê-lo por intermédio da dor, ou de
outras tipificações sociais como "sedentário", "preguiçoso", entre tantos outros
estereótipos que tentam dar conta de responder o porquê de uma pessoa não
aderir a um programa de treinamento.
Tal condição leva a pessoa a considerar, então, que este distanciamento
do próprio corpo possa ser da sua estrita responsabilidade quando, na verdade,
mais parece resultado de um contexto social perverso ao qual esteve exposta
(horas e horas de trabalho; limitação financeira; distintas formas de preconceito
e violência; falta de espaços públicos adequados; excesso de atividades ​indoor​;
hegemonia de esportes de massa como o futebol, que tira o espaço de outras
iniciativas corporais, etc.).
1.2.3. Proposta de intervenção
Os relatos descritos acima emocionam pela peculiaridade e
singularidade das experiências de cada sujeito, trazendo histórias marcantes
sobre os afetos e condições despertados a partir do repertório de atividades
físicas e/ou práticas corporais vivenciadas.
Trata-se, aqui, da existência de importantes elementos a serem
cuidadosamente considerados e reconhecidos a partir da fala do Outro, e que
dizem respeito às manifestações sobre suas condições pessoais na forma de
limitações e/ ou restrições sociais relatadas, a partir das quais entende-se haver
a facilitação do processo de ressignificação do exercício das práticas corporais.
Neste sentido, compreender a prática corporal a partir do
reconhecimento de um incômodo, como a dor ou o medo, torna-se um
importante caminho para que se possa colaborar no processo de resgate da
39
relação do sujeito com seu corpo, à medida que enxerga a oportunidade de
voltar a relacionar-se com seu lugar de morada. “Estou tentando fazer as pazes
com o meu corpo (...) Estou decidido a respeitá-lo mais, a escutá-lo e até
mimá-lo muito mais”, afirma C.M., 59a.
É de fundamental importância reconhecer, por exemplo, que se um
sujeito apresenta maior sensibilidade à dor, uma proposta de treinamento que
ignore este elemento pode se tornar extremamente árdua, enfadonha e,
consequentemente, pouco exitosa. S.L., 74a., conta que “não progredia nunca
porque não fazia o mínimo esforço para aguentar a dor que causava’”.
Não diferente, a falta de sensibilidade de alguns profissionais na área
infantil, e muitas vezes dos próprios pais, em assuntos como, por exemplo,
inclusão social e/ou identidade de gênero, é outro importante aspecto a ser
considerado. Colocar-se no papel do Outro torna-se fundamental para
compreender o sofrimento relatado por C.C., 33a., durante sua adolescência,
ao lidar com o preconceito alheio durante as aulas de educação física, quando
acreditava precisava conter algo que nada tinha de errado. Com isso, e devido
nosso sistema educacional atrasado, C.C. não pôde ser devidamente
introduzido às práticas corporais. Ademais, a subordinação de muitos
professores de educação física infanto-juvenil às modalidades esportivas no
ambiente escolar, como o futebol, basquete, vôlei e handball (quarteto
fantástico), tanto exclui como retira o espaço para o ganho de outros
importantes repertórios motores obtidos por meio de outras diversas
modalidades corporais, como a dança, por exemplo, que configura-se como
uma prática ainda pouco explorada junto ao público masculino em idade
escolar.
40
Não diferente, as violências corporais relatadas por C.M., 59a., durante
sua infância, agora são traumas. Reconhecer suas marcas é a única maneira
de entender que sua condição de “inatividade física” não é sinal de “preguiça”,
ou descaso com si próprio. Para além, faz-se necessário motivá-lo a
experimentar para saber que é capaz de executar diversos pequenos gestos,
descobrindo no corpo um “amigo” a ser cuidado, com limitações a serem
igualmente respeitadas.
Antes que oriente a intervenção ao campo da saúde é preciso que o
profissional de educação física faça o exercício da escuta daquele com quem
irá ministrar algum tipo de trabalho envolvendo as práticas corporais, na
tentativa de garantir o respeito às suas individualidades. Tais relatos dizem
respeito, neste sentido, a um processo de resgate e ressignificação da relação
com o corpo, “desconstruindo” muros que foram erguidos no passado e
“plantando” novas sementes.
Esta proposta tem como objetivo último, portanto, a promoção de um
posicionamento crítico diante do discurso dominante de grupos de interesse
que perpetuam na mídia, nas escolas, etc., e dos olhares avaliadores da
sociedade. As práticas corporais, a partir deste reconhecimento, podem se
tornar emancipadoras no sentido de proporcionar o resgate das pessoas com
seus corpos e movimentos, a partir do respeito ao mais sutil gesto, que
transcende aos aspectos motor e biológico para o plano sócio-afetivo, espiritual
e cognitivo dos indivíduos.
41
1.3. Práticas corporais no campo da saúde
Com a proposta de ressignificar as estratégias de intervenção da
Educação Física junto à área da Saúde Coletiva , o uso do termo “práticas2
corporais” foi adotado e encontra-se em expansão, estando sua conceituação
também presente nos conhecimentos oriundos das ciências humanas e sociais
e não apenas nos da biologia. A existência das práticas corporais parte do
reconhecimento dos afetos humanos e não da performance alcançada,
elementos estritamente ligados aos movimentos e que, portanto, devem ser
acolhidos e cuidados através de uma relação de corresponsabilidade.
Para Carvalho (2006), a orientação de programas de intervenção de
Saúde Coletiva pautados sob a ótica das práticas corporais são capazes de
“privilegiar o encontro, a escuta e a atenção de pessoas adoecidas visando à
construção de relações de vínculo, de corresponsabilidade, de autonomia no
processo de cuidado com o corpo” (Op. cit., p. 33).
Pensando o estabelecimento de uma rede de encontros, Alves e
Carvalho (2010) consideram que “as próprias práticas corporais já estão
abertas a este movimento relacional e se estruturam a partir deste movimento
de promoção do encontro” (Op. cit., p. 242). Tal condição se opera tanto no
esfera da pessoalidade, consigo mesmo, como no âmbito das relações com os
outros, “onde os laços sociais são ressignificados à luz de outros domínios não
restritivos (os imperativos morais), mas potenciais” (Id.).
Baseando-se em Campos (2003), Mendes e Carvalho (2016) consideram
que esta abordagem é construída no sentido de potencializar a inserção das
práticas corporais acoplada à ideia de produção de saúde com um enfoque
2
A área de conhecimento da Saúde Coletiva é considerada um “campo de saberes e práticas que assume
como objeto as necessidades sociais de saúde, com o propósito de elaborar e propor novas possibilidades
interpretativas e explicativas sobre o processo saúde-doença” (MENDES & CARVALHO, 2013, p. 27).
42
mais participativo e democrático. Segundo elas, “a atuação com os sujeitos e as
comunidades, a partir dessa perspectiva, abre novas possibilidades de
experiência do corpo e com a produção de cuidado em contraste com a lógica
da atividade física e do exercício físico” (Op. cit, 2013, p. 28).
Para Santiago Pich (2016), o saber verdadeiro no contexto das práticas
corporais não mais se impõe como necessário para atender a um conjunto de
normas e práticas a serem incorporadas pelo sujeito, mas da produção de
sentidos a partir da relação que estabelece com “a vida que se vive”. Nas
palavras do autor, “a produção de si só se torna possível pela relação com o
outro, que possibilita a criação da própria vida como obra de arte” (Op. cit., p.
170). Em suas palavras:
“se reconhece a existência de um diálogo com o corpo e
com saberes corporais que não passam pelo registro da
racionalidade discursiva, mas que não por isso deixam de
constituir a racionalidade, uma racionalidade outra que tem
na dimensão sensível a sua matriz” (Id.).
No entendimento de Conrado Federici (2015), as práticas corporais no
campo da Saúde Coletiva devem compreender o que considera ser,
metaforicamente, “um abraço apertado entre o afeto de alegria (...) potência
produtora de saúde no encontro entre as pessoas” (Op. cit., p. 163). Para
esclarecer seu entendimento, o autor recorre ao filósofo Baruch de Spinoza
(2009), para o qual os afetos conjugam-se numa potência global, à medida que
as relações humanas não se distinguem das leis universais da natureza. Sendo
os afetos munidos de alegria, quando há aumento de nossa potência vital, e de
tristeza, quando o sentimento transita na direção da sua diminuição (Op. cit.,
apud​, SPINOZA, 2009, p. 107).
43
Federici destaca alguns elementos corporais como a brincadeira, o jogo,
as expressões corporais e artísticas como as artes do corpo, a música, e suas
ressonâncias na percepção de possibilidades de práticas corporais em sistemas
institucionalizados de saúde, especialmente do Sistema Único de Saúde (SUS),
e suas problematizações. As abordagens propostas e reveladas pelo autor em
algumas das suas experiências de intervenção junto a equipes
multidisciplinares no campo da saúde e alunos de cursos de graduação partem
desde a simplicidade do contato com o próprio corpo a técnicas de respiração
em salas de espera, antiginástica, e outras formas de cuidado.
Trata-se, assim, de práticas provenientes de processos de criação e que
valorizam “os pensamentos filosóficos e artísticos que operam por outras
estruturas, talvez menos assépticas e historicamente purificadas, porém
vitalizadoras do processo de saúde em seu conceito mais amplo e atual”
(FEDERICI, 2015, p. 166).
Este autor considera que a arte, o jogo e o brincar, promovem paixões
alegres, estados de espírito importantes para a noção de cuidado com a saúde,
mas até o momento, segundo ele, pouco explorados nos processos de
intervenção. “No jogo é possível errar. Sem grande importância (...) os aspectos
de alegria e tristeza inerentes ao jogo relembram ao ser humano aspectos da
vida que os tratamentos de saúde insistem em extirpar” (Op. cit. 167).
O caráter lúdico dessa proposta de intervenção revela-se na hipótese de
que “o jogo e a brincadeira podem ser, por vezes, as únicas alternativas
possíveis a se abraçar (...) a possibilidade de perceber, perceber-se, perceber o
outro (...) lidando com a qualidade do encontro entre as pessoas” (Id). O
benefício ao campo da Saúde Coletiva a partir da incorporação dos conteúdos
do jogo e do brincar, segundo Federici, é que “o jogo anda de mãos dadas com
44
as paixões alegres (...) [e] o brincar frequenta outra direção nos modos de
existência que, por definição, admitem-se em permanente oscilação” (Op. cit.,
p. 172-3).
E é neste ponto que o autor chama atenção ao conteúdo da
aleatoriedade e situações circunstanciais existente no jogo, que desenvolvem a
incerteza e o mistério em sentidos que potencializam o tempo presente da vida,
mantendo-se em “permanente oscilação, no contínuo jogo entre os afetos sem
almejar um final definitivo, mas sua manutenção em diversão” (Id.), tal como a
figura do palhaço:
“Tal modo de proceder sobre a provisoriedade dos
conteúdos, distante de técnicas didáticas que
intencionariam objetivos prévios, é originário da presença
cênica do palhaço. Esta arte exige que se expresse a
simplicidade do real imediatamente. Alegre e triste” (Id.).
Para Federici, o jogo permite um meio de alcançar o “desarme e o vestir
a pele do outro”, uma espécie de exercício de perceber a si mesmo que é tão
importante quanto o fazer, a partir de princípios do fazer artístico que torna o
corpo novamente presente (Op. cit., p. 174).
“Qual a lógica de um jogo que não a própria possibilidade de que não
possua uma lógica?”, questionou Ana Cristina Zimmermann (2014), para a qual
o jogo é, antes de mais nada, uma provocação que rompe com a estrutura
linear de causa e efeito da atividade física, no qual os limites das regras podem
ser extrapolados, indicando “infinitas” novas possibilidades (Id., p. 153-4).
O jogo, aqui, mostra-se como um convite à prática, baseada sobretudo
por desejos irracionais e inexplicáveis, envolvendo instintos e paixões que só
acontecem mediante o comprometimento do jogador com o universo do próprio
45
brincar. Para Zimmermann, “o jogador não sabe previamente o que será
requisitado a cada momento e todo movimento precisa ser constantemente
recriado (...) O jogo oferece justamente a oportunidade de experimentação em
relação ao que está supostamente estabelecido” (Id. p. 155). Tal condição leva
à possibilidade de que todas as preocupações sejam abstraídas, levando o
jogador a engajar-se na atividade sem outro objetivo além do próprio jogo.
Ao reconhecer o jogo como um elemento presente em todas as esferas
da cultura humana, a autora o considera como uma das categorias mais
fundamentais na vida, à medida que se trata, também, de um fenômeno cultural
que perpassa e transmite tradições, fantasias, histórias, sonhos, ou mesmo
componentes de transição e renovação social.
O jogo permite, assim, o exercício da criatividade, da inovação e da
indeterminação que, ao alcançar o imaginário, possibilita um novo convite a
cada encontro. Para a autora, trata-se de “um gesto a espera de uma resposta
desconhecida que se torna pergunta à espera do outro gesto, uma dialética
sem síntese em um campo de movimento que é compartilhado” (Id. p. 155).
Para ela, “o jogo acolhe e provoca também alegria, o gracejo, a raiva, a
frustração” (id., p. 156), permitindo a possibilidade da falha, do acerto, do
atrapalho, e sobretudo das imperfeições.
Em última instância, o jogo oferece espaço para a experiência da
transgressão do tempo linear e das suas regras, à medida que é possível
questioná-las e com elas negociar. “Em jogo nem sempre quanto mais rápido
melhor, nem sempre há progressão unidimensional nos resultados e nem
sempre o resultado final é o mais importante” (Id. p. 157).
O fazer compartilhado por meio das atividades lúdicas pautadas no jogo
e no brincar torna-se, assim, estratégia de conteúdo das práticas corporais.
46
“Estariam em jogo não somente os procedimentos atestados, mas a
observação minuciosa sobre os movimentos de aumento de potência dos
indivíduos, sempre nas relações” (FEDERICI, 2015, p. 176).
No que diz respeito aos profissionais que lidam com as práticas
corporais, Mendes e Carvalho (2016) consideram que a “função do profissional
de saúde não é a de ‘promover’ a saúde para as pessoas, segundo uma
postura verticalizada e impositiva, mas sim de ‘produzir’ saúde de modo
conjunto com cada pessoa e sua comunidade” (Op. cit., 2013, p. 30).
Federici (2015) enfatiza, no entanto, que “a aridez do ambiente de
formação universitária da área da saúde, de fato, não tem contribuído com
conhecimentos gerados por processos criativos. Há tempos ocorre a formação
de profissionais que não sabem como brincar” (Op. cit, p. 181). Para Alves e
Carvalho (2010), “como efeito, o profissional de Educação Física passa a ser
agente ativo de uma ideologia do ser saudável, passando por cima da
diversidade dos corpos, em função da reprodução de uma lógica excludente”
(Op. cit., p. 231).
Finalmente, no âmbito das práticas corporais, “propõe-se que haja os
movimentos de parada, observação e percepção (...), com vistas à produção de
experiências sensíveis de se sentir cheio de vida” (Op. cit., p. 186),
considerando-se as particularidades “com sentido primordial a cultura do
sujeito, com suas crenças, músicas, danças, comidas, festas, enfim, as
manifestações da alegria” (Id.), mas deveras mantidas em segundo plano.
47
CAPÍTULO 2 - PROTOCOLIZAÇÃO DOS CUIDADOS E SUAS
FORMAS DE INSTRUMENTALIZAÇÃO
Frente à dominância da abordagem de atuação da Educação Física com
enfoque mecânico-biologicista, este capítulo apresenta sua principal forma de
intervenção, pautada em pressupostos e recomendações estabelecidos por
instituições internacionais que, ao classificar indivíduos por níveis de atividade
física populacional, recomendam atividades e exercícios físicos pensados como
uma espécie de “medicamento” voltado ao combate das doenças e agravos
crônicos não transmissíveis para a saúde.
2.1. Governo dos corpos
O contexto histórico para compreender o surgimento dos exercícios
físicos como método e estrutura pedagógica definidas, segundo Soares (2016),
abrange os séculos XVI a XVIII, e especialmente este último, denominado o
Século das “Luzes”, que foi o marco de importantes rupturas em relação ao
modo de pensar e conceber o corpo, que de imóvel, imagem aceita como a
mais adequada na época, dá espaço a novas formas de pensar e conceber os
movimentos corporais que não mais apenas corrigem, mas que também
educam. Daí se poderia pensar, segundo a autora, na modalidade da Ginástica3
como “possibilidade de emergência e de significação de uma educação mais
específica voltada ao corpo” (Op. cit, p. 44).
Soares destaca, assim, importantes deslocamentos no modo de
conceber e intervir nos corpos advindo deste período, como: a ideia do
3
“A Ginástica pode ser pensada como um conjunto sistematizado de conhecimentos, saberes e práticas
que tomam bases científicas para se referir ao corpo em movimento” (Op. cit., p.59).
48
movimento corporal centrado a uma visão da corrente da ciência moderna,
segundo a qual, “de um modo inédito, a perfeição das ações corporais ganha
um lugar e ela é buscada, então, com meios específicos, previstos e
programados” (Op. cit., p. 45); do contexto político e cultural em que afirma-se a
preocupação pública em relação ao corpo, sendo a transformação dos corpos
uma missão coletiva; e o afastamento das concepções clássicas da medicina,
que conferiam aos afetos o funcionamento do corpo.
Mais do que a simples ideia de que o movimento pudesse corrigir a
degenerescência física que a ação da natureza inscreveu ao corpo, pautada na
ideia de abandono da imobilidade corporal e superação das fraquezas físicas, a
grande ruptura ocorrida neste período foi a de pensar o movimento como um
elemento ​educador a um novo padrão higienista socialmente estabelecido. “É
assim que a firmeza e o vigor do corpo, qualidades físicas tão caras a uma
burguesia emergente e em ascensão neste período começam a impor-se” (Op.
cit, p. 50), porém, muito mais como interesse ligado à saúde e prevenção de
doenças do que como requisito de boa aparência. Desta forma, indicando que o
termo ​obesidade ​teve um dos seus primeiros usos no século XVII, Soares
entende que “são considerados belos os corpos firmes, que engendram vigor,
tonicidade e dinamismo (...) que devem expressar a saúde dos órgãos” (Op. cit.,
p.51).
Ao passo que uma nova representação de beleza se produz e nela já
existe a relação perceptível com a saúde, um crescente desejo pela
aprendizagem motora e sua utilidade para o alcance do sucesso de uma ação
gestual acentua-se. “Ação, repetição, meios ‘naturais’ domesticados” (Op. cit.,
p. 54). Daí se inventa, segundo a autora, o que viria a ser uma ​educação física​,
49
educação corporal, educação medicinal de aperfeiçoamento da espécie
humana.
O ​exercício físico passa a incorporar o cotidiano, a educação dos
indivíduos, e não apenas a correção dos problemas físicos. Os “jogos corporais”
passam a compor, segundo Soares, um quadro mais amplo da vida social,
incluindo os jogos de salão, jogos com bolas, raquetes ou tacos, danças,
cavalgadas e, principalmente, a Ginástica, com técnicas específicas de
educação e governo dos corpos (Op. cit., p. 59-60).
Segundo a autora, a ideia da Ginástica nas modernas sociedades
ocidentais tornou-se, assim, como a leitura e a escrita que leva a um
aprendizado universal, “uma espécie de alfabeto do corpo”. Desse modo, à
medida que os tratados da época atestam para a preocupação de construir um
conhecimento do corpo e para o corpo sob bases científicas, a partir de
justificativas e prescrições fornecidas por este tipo de conhecimento “ela, [a
Ginástica], não se define mais como ​arte (...) se firma como ​ciência​” (Op. cit., p.
62).
Adicionalmente, o processo “governamentalizador” dos cuidados com o
corpo é apresentado por Santiago Pich (2016) como aquele em que “a vida,
como alvo e objeto do investimento do poder na modernidade, é reduzida à sua
dimensão biológica, para tornar-se um parâmetro moral, um imperativo, na
prédica do cuidar de si na alta modernidade” (Op. cit., p. 155).
Para ele, considerando as anotações do pensador Michel Foucault
(1985), o período moderno é marcado por um deslocamento do antigo conceito
do exercício de poder existente na Idade Média, no qual “o velho direito de
causar ​a morte ou ​deixar ​viver foi substituído por um poder de ​causar ​a vida ou
devolver à morte​” (Op. cit., p. 157, ​apud​ FOUCAULT, 1985, p. 130).
50
Este novo conceito de biopolítica do poder, ou “biopoder” trata, segundo
o autor, da gestão calculada da vida apresentada em duas faces - anatômica e
biológica. A primeira “produzindo corpos dóceis politicamente e produtivos
economicamente; a segunda tem como objeto o corpo humano como espécie, e
visa majorar a vida da população, regulando os processos biológicos” (Op. cit).
Entendendo haver no cristianismo uma grande influência aos processos
de dominação ideológica ao longo dos séculos, os autores se valem do papel
social do pastor como aquele que se compromete com a orientação do
rebanho, especialmente no que se refere a sujeitos que aceitam que a verdade
de si deve assumir um caráter externo, com reconhecimento da aceitação de
uma ordem moral divina e heteronormativa. No que se refere ao ​biopoder sobre
os corpos que emergem na modernidade, no entanto,
“o pastor não é mais o abade do mosteiro ou o bispo, mas os
diversos sacerdotes da saúde do corpo: o médico, o
nutricionista, o professor de educação física (...) por deterem
os saberes necessários que definem a moral moderna” (Op.
cit., p. 161).
Reforçam, portanto, que as atividades físicas podem ser pensadas,
nesse contexto, como um registro da governabilidade sobre os corpos,
“concebidas como um espaço no qual os sujeitos são levados a estabelecerem
uma relação com seu corpo, balizada por parâmetros de ordem biomédica que
definem um ideal de normalidade, constitutivo de um regime de moralidade (Op.
cit, p. 163).
Fenômeno que persiste na contemporaneidade ou pós-modernidade, o
discurso da ideologia dominante de governo sobre os corpos produzido nas
ideias da ​performance corporal e da adequação do corpo a parâmetros de
51
beleza corporal considerados desejáveis são, na visão dos autores, duas das
suas dimensões centrais.
O autor chama a atenção ao uso de ​blogs e redes sociais como
confessionários e, e ao mesmo tempo, disseminadores dessa ideologia de
governabilidade sobre os corpos, dando o exemplo da jovem C.F. que revela
suas experiências desde a fase pré-operatória bariátrica à de recuperação, até
que alcançasse a meta desejada, conferida sobre a variável do índice de massa
corporal (IMC), que assume o papel de um imperativo moral, fazendo-a “deixar
de ser uma mariposa para tornar-se uma borboleta” (Id.). Para Pich, “a
enunciação da verdade, neste caso, ganha contornos particulares pelo fato de
que o exame de consciência está diretamente relacionado com a realização de
exames de cunho biológico que revelam a verdade do corpo” (Op. cit., p. 165).
Os autores consideram, assim, que a modernidade se apresenta como
um período histórico que limitou seriamente, ou até mesmo impossibilitou, o
“cuidado de si” em detrimento dos cuidados com a saúde e que, “salvar-se, ter
saúde, passa a ser um problema que tem como horizonte a produção do sujeito
como sujeito ético” (Op. cit., p. 170). Para Federici (2015), ainda:
“A substituição automática do indivíduo pela condição de
doença pela qual está passando e a busca por uma felicidade
que estaria escondida logo atrás da esperança da cura final,
são confusões constantes que contribuem para que o usuário
do sistema de saúde não mais se reconheça em si mesmo ao
incorporar o estereótipo do seu diagnóstico” (Op. cit., p. 168).
Partindo-se da modernidade à pós-modernidade, este padrão de governo
sobre os corpos aprimorou-se a partir da retórica do agito, inflamada pelo
discurso auto-suficiente dos cuidados contínuos com a saúde.
52
2.2. A retórica do ​agito
Segundo Nahas e Garcia (2010), o interesse da área da Saúde Coletiva
com a atividade física ganhou destaque em meados do século XX, quando
estudos pioneiros passaram a associar as doenças cardiovasculares ao nível
de atividade física no ambiente de trabalho (Op. cit., p. 137). Nos anos 50 e 60
do século passado, além do interesse da medicina nos fatores associados à
crescente incidência de doenças cardíacas em países industrializados, “havia
na Educação Física um interesse particular na aptidão física relacionada ao
desempenho motor, fosse para a competição esportiva ou a preparação militar
de jovens” (Id.). Bandmann (2008, p. 3) indica que neste período os esforços se
intensificaram para identificar o nível de atividade física praticado por grupos
populacionais, sendo o principal foco as atividades físicas realizadas
especialmente no domínio da ocupação profissional.
Já nos anos 1970, com o argumento da promoção da saúde para todos
os povos do mundo, em ressonância ao apelo de uma numa nova ordem
econômica internacional, foi realizada pela OMS (Organização Mundial da
Saúde) no âmbito da saúde internacional, em 1978, a Conferência de Alma-Ata
entre líderes internacionais, na então União Soviética, que resultou na
Declaração de Alma-Ata, documento com dez princípios ligados à Atenção
Primária à Saúde (APS).
Segundo Nahas e Garcia (2010), foi a partir desse período, e
especialmente na década de 1980, que os estudos epidemiológicos
enfatizaram, na contemporaneidade, a importância de o indivíduo manter-se
ativo. Segundo estes autores, “a Educação Física começava a utilizar os
conhecimentos e as evidências epidemiológicas em suas práticas, e sua
53
vinculação com as questões de saúde pública (e de promoção da saúde) foi
fortalecida” (Op. cit., p. 138).
Foi ao longo dos anos 1990 que a atividade física foi definida como uma
das prioridades da pesquisa em Saúde Coletiva. A inatividade física foi
institucionalizada “como um fator de risco primário e independente para
doenças cardiovasculares pela American Heart Association - AHA (...),
despertando um interesse crescente e multidisciplinar na pesquisa em atividade
física e saúde” (Id.).
Neste período, também, ao passo que o trabalho tornou-se menos físico
e mais intelectual, maior interesse passou a haver nas atividades em tempo
livre de lazer, principalmente atividades como esportes e recreação. Nesta
ocasião o Brasil contou com os primeiros “levantamentos” de perfis de atividade
física em grupos específicos. “O foco passou para as questões que predispõem
ou que dificultam as mudanças de hábitos, e os estudos de intervenção
ganharam grande destaque (...) em particular da atividade física e hábitos
alimentares” (Id.).
Já no início século XXI, durante o Congresso Internacional de Atividade
Física e Lazer realizado em 2006 em Atlanta (Bandmann, 2008, p. 3) foi
confirmado entre seus participantes o interesse de que a medida da intensidade
das atividades físicas fosse realizada considerando-se diferentes domínios,
surgindo a partir daí um consenso na literatura quanto às quatro principais
dimensões da atividade física praticadas, sendo elas: 1) domésticas, como
limpar a casa, cuidar do jardim e realizar reparos na casa; 2) ocupacionais,
considerando-se, por exemplo, carregar objetos pesados e subir/ descer
escadas no local de trabalho; 3) de deslocamento, como caminhar até o
supermercado ou ir de bicicleta para o trabalho, e; 4) de lazer, como passear
54
com o cachorro, brincar e jogar ativamente e, praticar esportes, ginástica,
dança, etc. (PNUD, 2007, p. 70).
Pensando exatamente no par binário estilo de vida ativo e sedentarismo,
Alex Branco Fraga (2006) realizou uma investigação acerca do discurso
físico-sanitário contemporâneo por detrás do “Agita São Paulo” (1996),
programa de promoção populacional de atividades físicas, fruto do convênio
entre o Centro de Estudos do Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do
Sul (Celafiscs) e a Secretaria de Saúde do Estado, partindo-se da adoção das
recomendações internacionais de atividade física para saúde . O programa foi4
eleito pela OMS, em 2002, como referência nas comemorações do Dia Mundial
da Saúde - ​Move for Health​” (Op., p. 4).
A “maquinaria do agito”, como denomina o autor, parte da análise de
“como se constitui/dissemina/fixa, contemporaneamente, o estilo de vida ativo
como objeto de valor pleno na educação dos corpos, na regulação da saúde e
no governo de si” (Op. cit., p. 9), diante de uma rede discursiva de informação
através da qual ocorre um “processo de ‘glorificação’ do estilo de vida ativo e
‘demonização’ do sedentarismo” (Op. cit., p. 14).
De acordo com este autor, o estilo de vida ativo pode ser considerado
“uma forma de controle que opera sobre os corpos através de tecnologias de
poder destinadas não só a imprimir um determinado modo de conduzir a vida,
mas também de regular as múltiplas manifestações do viver” (op. cit., p 19). E
estes, por sua vez, “estão visceralmente ligados à propagação dos males
provenientes de uma vida sedentária” (Id.).
4
“Acumule trinta minutos ou mais de atividades físicas de intensidade moderada por dia, de forma
contínua ou fracionada em dois blocos de quinze minutos ou três de dez, preferencialmente todos os dias
da semana” (Op. cit., p. 60, apud PATE, PRATT, BLAIR ​et al.​, 1995).
55
É com base num discurso ancorado pelo medo de não salvar-se,
segundo o autor, que permeiam as políticas de promoção à saúde, através do
enfrentamento ao sedentarismo e do estilo de vida ativo. Chama a atenção,
contudo, que “aqui a quantidade de atividade física diária é mais importante do
que a maneira como ela é realizada (...) o que importa é contar o tempo e incluir
cálculos sobre o consumo energético” (Op. cit., p. 31).
Afora a dominância sobre os corpos, o autor chama a atenção que tal
fenômeno leva à crescente responsabilização dos sujeitos sobre seus hábitos
de vida, “na forma de administrar sua própria saúde, condição física e,
principalmente, seu grau de exposição a comportamentos e situações de risco”
(Op. cit., p. 39). Esta retórica político-sanitária não leva simplesmente ao
governo dos corpos mas, concomitantemente, “amplia as responsabilidades do
sujeito na administração de seu próprio bem-estar” (Op. cit., p. 64).
Exemplo disso são programas televisivos como ​The Biggest Loser ​(SBT
2005, 2007) e Medida Certa (Rede Globo, 2011-2015), que reforçam esta
mensagem. Para Fraga, no entanto, “pouco importa se a mensagem de fato
chegará (...), e sim evidenciar o domínio político da circulação da mensagem”
(Op. cit., p. 122). Recentes ataques do atual presidente do Brasil, Jair
Bolsonaro, a estética de Brigitte Macron, esposa do presidente francês
Emmanuel Macron, revelam, não obstante, a persistência da governabilidade
sobre os corpos na pós-modernidade. “Os casos recentes de homens que
xingam mulheres mais velhas de feias são típicos de uma mentalidade
preconceituosa que associa o envelhecimento feminino à feiura”
(GOLDENBERG, 2019, A24).
56
2.3. Principais recomendações para prática de atividade física
A inserção da “retórica do agito” enquanto um comportamento habitual
na vida das pessoas ganhou magnitude e passou a ser colocada como
prioridade na agenda global de saúde pública, tornando-se objeto de algumas
das principais campanhas de saúde pelo Brasil e no mundo. No Brasil, em
2011, o Ministério da Saúde lançou o Plano de Ações Estratégicas para o
Enfrentamento das DCNT no Brasil 2011-2022 (BRASIL, 2011), que estabelece
o aumento da prática de atividades físicas como um dos principais alicerces das
intervenções de saúde.
Apesar dos benefícios da atividade física relacionados à saúde, Forjaz
et. al. ​(2011) lembram, no entanto, que não se pode esquecer haver riscos.
Com o objetivo de se tornarem mais ativas, diminuindo o risco de desenvolver
DCNT, muitas pessoas (re)iniciaram a prática de atividades físicas, como
caminhada e corrida em espaços públicos, como praças e parques, sem que
tais práticas sejam necessariamente feitas com a orientação de um profissional
apto para realizar uma prescrição de treinamento individualizado, podendo levar
ao aumento do risco de acometimento de eventos cardiovasculares agudos,
como parada cardíaca ou infarto.
Para estes grupo de autores, “para maximizar os benefícios e minimizar
os riscos individuais, é importante que os praticantes façam uma avaliação para
identificar seu risco e recebam uma prescrição ou, no mínimo, uma orientação
sobre a prática adequada” (Op. cit., p. 62), especialmente em se tratando de um
indivíduo hipertenso (FECCHIO ​et al.​, 2017). Modesto (2017) acrescenta que a
caminhada com orientação e prescrição individualizada, no entanto, tem efeitos
positivos mesmo sem supervisão profissional.
57
Por esta razão Lima ​et al​. (2014) destacam que apesar de haver um
consenso entre as principais instituições de saúde internacionais sobre haver
uma ​dose mínima de esforço físico que resulte em benefícios para a saúde​, “as
recomendações divergem a respeito da constituição e da administração da
dose mínima” (Op. cit., p. 164) - Tabela 2.
Tabela 2: Síntese das definições das principais recomendações mundiais para
atividade física, 2014
Fonte: Op. cit., p. 166.
2.3.1. Consensos e divergências entre os protocolos internacionais
A ​American College of Sports Medicine ​(ACSM), grande organização de
associação de medicina esportiva e ciência do exercício sediada nos EUA,
oferece uma das diretrizes mais amplamente adotadas em todo o mundo,
orientando que indivíduos adultos realizem ao menos 30 minutos de atividade
58
física com intensidade moderada pelo menos cinco dias por semana, ou 20
minutos de atividade física de intensidade vigorosa pelo menos três dias por
semana, além das atividades da vida diária (HASKELL, 2007, p. 1083).
A World Health Organization (WHO) - Organização Mundial da Saúde
(OMS) -, por sua vez, endossa a diretriz estadunidense e é, então, também
seguida pelo Ministério da Saúde do Brasil. Sua diretriz considerava serem
ativos, até 2010, indivíduos que praticassem atividades de intensidade leve ou
moderada por pelo menos 30 minutos diários em cinco ou mais dias da semana
ou atividades de intensidade vigorosa por pelo menos 20 minutos diários em
três ou mais dias da semana. Contudo, de acordo com a atualização de 2010, a
OMS orienta adultos à prática de pelo menos 150 minutos acumulados por
semana de atividade física moderada ou 75 minutos por semana de atividade
física vigorosa, em sessões de pelo menos 10 minutos de duração, sem
determinação de frequência semanal (WHO, 2010, p. 26).
No que se refere ao ​Institute of Medicine (IOM), atual ​National Academy
of Medicine​, Lima ​et al. ​(2014, p. 165) lembram que embora este não
represente a recomendação oficial dos Estados Unidos, o IOM influencia o
aconselhamento e as decisões da comunidade médica naquele país. Sendo
assim, o IOM recomenda, para adultos, a realização de 60 minutos de atividade
física moderada todos os dias da semana ou 30 minutos de atividade vigorosa
diária (IOM, 2004, p. 880). De fato, quando se trata de adultos com 65 anos ou
mais, a recomendação da OMS de 2010 coincide com a diretriz do IOM. Assim,
de modo que obtenham ​benefícios adicionais à saúde, adultos com idade igual
ou superior a 65 anos devem aumentar sua atividade física aeróbica de
intensidade moderada para 300 minutos por semana, ou praticar 150 minutos
de atividade física aeróbica por semana, ou, ainda, uma combinação
59
equivalente de atividade física de intensidade moderada e vigorosa (WHO,
2010, p. 31).
No que toca à diretriz da União Europeia (UE) de 2008, destinada aos
então 27 Estados-Membros que formavam o bloco, à época, a orientação para
adultos saudáveis é de que praticassem pelo menos 30 minutos diários de
atividade física moderada, seguindo a recomendação oferecida pela OMS,
especialmente à anterior ao ano 2010.
Finalmente, o Comitê Consultivo do ​International Physical Activity
Questionnaire ​(Questionário Internacional de Atividade Física, IPAQ),
consultado em 2005, definiu como padrão mínimo realizar um dos três
seguintes conjuntos de alternativas: a) pelo menos 20 minutos por dia de
atividade física vigorosa durante três ou mais dias por semana; b) pelo menos
30 minutos por dia de atividade física moderada durante cinco ou mais dias por
semana ou; c) qualquer combinação de esforço moderado e vigoroso, desde
que atinja o mínimo de 600 MET-minutos por semana (IPAQ, 2004, p. 6).
A partir desta concordância de entendimento sobre a importância de
garantir uma dose mínima de esforço físico necessário associado aos
benefícios com a saúde, considerando-se tipologia da atividade, frequência
semanal, duração da sessão e intensidade do esforço, torna-se igualmente
importante compreender, então, como tais informações são detectadas,
especialmente no que toca à variável “intensidade” associada aos diversos tipos
de atividades físicas praticadas.
2.3.2. Determinações sobre a intensidade de realização da prática
Frente ao consenso entre as diretrizes das principais instituições de
saúde internacionais de que há intensidades apropriadas para a realização das
60
atividades físicas diárias e semanais em quantidades mínimas, podendo ser
estas intensidades moderada, ou vigorosa, ou uma combinação entre estas,
torna-se fundamental recorrer ao entendimento sobre o que vem a ser cada
uma delas e como identificá-las.
McArdle ​et al (1998) indicaram as principais variáveis existentes para
medir a intensidade relativa dos exercícios, destacando-se: percentual do
VO​2​máx; frequência cardíaca; escala de percepção subjetiva de esforço (PSE),
e; % 1RM (Op. cit.). Aprofundando este entendimento, Garder ​et al​. (2011)
enfatizam que “a intensidade do exercício é um importante determinante das
respostas fisiológicas ao treinamento físico” (Op. cit, p. 1339-40), contribuindo
com a formulação das recomendações para classificação das intensidades dos
exercícios físicos praticados para a melhoria da capacidade cardiorrespiratória
e controle dos fatores de risco de doenças cardiometabólicas (Op. cit., p., 1341)
- Tabela 3.
Tabela 3: Classificação da intensidade do exercício: intensidade absoluta e relativa do exercício
para exercício resistido e capacidade cardiorrespiratória
Fonte: Id.
61
A partir de uma escala que varia das intensidades muito leve, leve,
moderada, vigorosa e, perto da máxima à máxima, é possível traçar uma
correspondência, a partir da tabela apresentada por Garder ​et al​., entre a
variável utilizada para medir a intensidade relativa dos exercícios e a
intensidade do esforço realizado.
Assim, o VO​2 ​representa a quantidade (taxa) do metabolismo aeróbio do
organismo, podendo ser medido diretamente (ergoespirometria) e indiretamente
(ex.: teste ergométrico, banco, cooper 12min) tanto no repouso (taxa metabólica
basal = ~ 3,5 mL O​2​/ Kg/ min), como durante o exercício. Sua medida é
representada pelo consumo de Oxigênio (O​2​) ou gasto energético do organismo
durante determinado período de tempo. Sendo assim, as formas de expressar o
VO​2 ​são representadas pelo VO​2 ​absoluto (L O​2​/ min) e VO​2 ​relativo (ml O​2 ​/ Kg/
min) (Id.)
O pico de consumo O​2 durante um exercício físico é denominado
VO​2​máx e seu percentual é definido, então, como a intensidade relativa do
exercício, isto é o nível de estresse do exercício gerado ao organismo. Em
outras palavras, sendo o VO​2​máx a capacidade máxima de consumo de O​2 pelo
metabolismo aeróbio durante a atividade física praticada por um indivíduo, o
percentual do VO​2​máx corresponde à intensidade do exercício em percentual
da capacidade aeróbia máxima individual. O percentual de VO​2​máx é, por isso,
a principal determinante do nível das adaptações bioquímicas e fisiológicas ao
exercício físico.
Uma forma considerada absoluta de medida da intensidade do esforço
do exercício corresponde ao equivalente metabólico (MET), que consiste do
múltiplo da taxa metabólica basal (TMB) para uma dada atividade e seu
correspondente esforço. Sendo assim, quando se exprime o gasto de energia
62
em METs, representa-se, então, o número de vezes pelo qual o metabolismo de
repouso foi multiplicado durante uma atividade. Farinatti (2003) realizou a
apresentação da versão em português do compêndio de atividades físicas em
METs.
Além destas, a medida da frequência cardíaca também possibilita inferir
a intensidade de realização do exercício. Após estimação ou medição da
frequência cardíaca máxima, o seu percentual (%) corresponde ao esforço
empregado pelo indivíduo na respectiva tarefa motora. Em geral, as principais
maneiras de prescrever a intensidade por frequência cardíaca são por
percentual da frequência cardíaca máxima e percentual da frequência cardíaca
de reserva, esta última que leva em conta a frequência cardíaca de repouso do
sujeito e que, ao gerar maior acerto para estimar a carga de trabalho cardíaco,
torna-se individualizada.
A Percepção Subjetiva do Esforço (PSE), por sua vez, consiste da
percepção do indivíduo quanto à intensidade do esforço realizado na tarefa
motora, determinando as intensidades através de números. A principal delas é
a Tabela de Borg (1990), que varia de uma escala de 6 a 20 pontos ou 0 a 10
pontos (versão mais recente), sendo 6, ou zero (nova versão) muito fácil e 20,
ou 10 (nova versão), exaustivo. Sendo especialmente utilizada no treinamento
aeróbio, seu uso apresenta relação direta com a frequência cardíaca, consumo
de oxigênio (VO2) e ponto máximo de oxidação de gordura. Sua principal
vantagem é a praticidade, usabilidade, e eficiência ao que se propõe.
Mais utilizada para prescrição de exercícios anaeróbios, como o
treinamento de força, a técnica de determinação de uma repetição máxima
(1RM) é considerada padrão-ouro para indicação da intensidade do exercício
de força resistida. Sendo 1RM, portanto, a quantidade máxima de peso que
63
pode ser levantada em uma repetição, o percentual (%) de 1RM consiste da
medida de intensidade relativa associada à intensidade do esforço realizado.
Compreendido haver alguns dos instrumentos para medir de forma direta
e indireta a intensidade das atividades físicas e sabendo-se da importância de
garantir uma dose mínima de esforço físico para que se obtenha benefícios com
a saúde, segundo as recomendações dos principais organismos de Saúde
internacionais, considerando-se tipo, frequência, duração e intensidade das
atividades físicas praticadas, torna-se importante, em seguida, realizar a
medição e o monitoramento do esforço, ou volume total realizado, no intuito de
verificar sua efetividade, através do uso de instrumentos de medida do nível da
atividade física.
2.3.3. Instrumentos de medida da atividade física
Diante dos esforços epidemiológicos feitos para incentivar e promover a
prática de atividades físicas como forma de diminuir riscos para saúde,
tornou-se importante a existência e utilização de instrumentos precisos e
adequados para medir e avaliar o nível de atividade física praticado por
indivíduos.
Cafruni ​et al ​(2012), realizaram a revisão de diferentes métodos e
instrumentos identificados nas bases Medline/PubMed, SciELO, BioMed Central
e Sport Discus para realizar ​medidas do nível de atividade física​, entre os quais:
água duplamente marcada, observação direta, calorimetria indireta, monitores
cardíacos e sensores de movimentos (métodos objetivos); e questionários e
diários (métodos subjetivos) - Tabela 4.
64
Tabela 4: Vantagens e desvantagens dos métodos de medida de atividade
física
Fonte: Op. cit., p. 68.
De acordo com os autores, a água duplamente marcada (ADM) é um
método padrão-ouro que serve para estimar o gasto energético total (GET),
especialmente em pesquisa de campo. Sua técnica consiste da ingestão de
uma dose de água marcada com deutério (H​2​
) e oxigênio (O​18​
): o H​2
é eliminado
como água e o O​18
é eliminado como água e dióxido de carbono (CO​2​), sendo
65
possível, daí, conhecer o GET por meio da equação de “Weir”, onde GET =
(3,044 * quociente respiratório + 1,104) taxa do fluxo de CO​2​.
Embora preciso para medir o GET e adequado para todas as faixas
etárias, as desvantagens da técnica da ADM incidem sobre o alto custo para a
sua realização, à complexidade de aplicação do teste e, sobretudo, à falta de
informações sobre o tipo da atividade física praticada, a frequência, a duração
da prática e sua intensidade.
A calorimetria indireta, juntamente com ADM, é considerada uma técnica
padrão-ouro para avaliação do nível de atividade física praticado por indivíduos.
Neste método, o sujeito utiliza uma máscara para captar a troca gasosa e o
gasto energético (GE) é obtido através do consumo de O​2 e da produção de
CO​2​. Entre suas vantagens, a introdução de equipamentos portáteis têm
permitido seu uso em condições mais naturais, possibilitando a medição do GE
da atividade física em ambientes não controlados, embora o aparelho seja caro,
incômodo e limite a duração do seu uso por tempo prolongado, impossibilitando
medir a atividade física habitual.
Com relação aos frequencímetros ou monitores cardíacos, consistem de
aparelhos eletrônicos que atualmente são amplamente utilizados para o
monitoramento da frequência cardíaca (FC), variável que permite definir a
intensidade de exercícios físicos durante as fases de repouso, execução do
exercício e recuperação, sendo sua unidade expressa em batimentos por
minuto (bpm) (Op. cit., p. 65). Com a popularização desse instrumento para
população, seu custo caiu expressivamente, não sendo, por isso, um empecilho
para seu uso em estudos epidemiológicos.
Cafruni ​et al. ​consideram que o monitoramento da FC é útil para coletar
dados sobre nível individual de atividade física, apresentando resultados
66
razoáveis de validade e reprodutibilidade para estimativa do GE. No entanto, o
método apresenta limitações, pois pode ser afetado por temperatura,
medicamentos, emoção e condicionamento físico, além de não registrar
informações sobre contexto da atividade física que está sendo executada, e de
não ser o melhor método para medir atividades físicas leves, bem como em
crianças, devido à natureza esporádica das atividades físicas realizadas por
essa população. Apesar disso, esse instrumento é eficiente para avaliar
atividades físicas moderadas e intensas (Id.).
Pedômetro e acelerômetro são considerados sensores de movimento
que, diferentemente dos monitores cardíacos, têm a função de captar o
movimento ou a aceleração de um membro ou do tronco, dependendo da parte
do corpo onde é colocado. Enquanto a capacidade dos pedômetros está
reduzida a medir a quantidade de passos diários, os acelerômetros são
dispositivos que medem a aceleração e a desaceleração dos movimentos em
um, dois ou três planos.
Apesar do baixo custo, precisão para medir o número de passos e
registro total da atividade física, o pedômetro não é capaz de medir a
intensidade da atividade física, já que se limita à medição apenas em algumas
delas. Já o acelerômetro, embora meça atividade física total, intensidade e
tempo, apresenta complexidade para interpretação dos seus dados, maior custo
e impossibilidade para captação de determinadas atividades físicas, como
atividades isométricas, trabalho de força muscular, caminhadas na esteira,
remo ou patinação, podendo por isso subestimar a atividade física.
A observação direta, por sua vez, é um procedimento no qual os sujeitos
são observados em diferentes contextos e ambientes, especialmente não
controlados, permitindo um fornecimento de dados sobre a atividade realizada.
67
Para os autores, “ao se conseguirem informações sobre o tipo de atividade,
onde, como e quando ela ocorre, este método acaba superando os demais e se
torna útil na medida em que ajuda a responder a questões sobre como o
ambiente físico e social pode influenciar a prática da AF” (Id.). Em contrapartida,
apesar do alto custo de contratação de observadores, esta técnica não permite
a observação da atividade física habitual, uma vez que não é possível
acompanhar um sujeito por um dia todo, ou dias.
Por último, os questionários e diários correspondem a métodos
classificados como subjetivos, baseados em informações fornecidas pelos
sujeitos, que registram ou informam dados sobre sua participação ou realização
em atividades físicas durante um período de tempo, e cujo recordatório pode
variar entre uma semana a um ano.
No caso dos diários, eles são utilizados como forma de registro. Já os
questionários são compostos por perguntas que podem ser respondidas pelo
formato de autoavaliação ou entrevista. Estes métodos são largamente
adotados em pesquisas epidemiológicas devido ao baixo custo e boa
aceitabilidade por parte dos sujeitos, além de fornecer informações sobre a
realização de atividades físicas habituais. No entanto, de todos os métodos, são
os que possuem menor precisão para medir a atividade física (Op. cit., p. 67).
Frente à variedade de instrumentos existentes, os autores destacam que
a seleção dos métodos de medida deve ser feita conforme aquilo que se deseja
analisar, a depender do tipo de ambiente, faixa etária, disponibilidade de
recursos e diferenças étnicas e culturais existentes entre povos e países.
Ressaltam também que todos eles apresentam algum tipo de limitação quanto a
sua capacidade de medir o tipo, a frequência, a duração e, principalmente, a
intensidade da atividade física (CAFRUNI ​et al​, 2012, p. 62). Mais difícil, no
68
entanto, é que a aplicação de cada um deles apresenta diferentes unidades de
medida, dificultando o estabelecimento de equivalência entre eles (Id.), bem
como de comparações entre estudos da mesma natureza. Para os autores,
“nenhum dos métodos pode ser considerado suficiente a ponto de descartar os
demais e, por isso, a combinação de mais de um método pode resultar em uma
melhor avaliação da AF” (Op. cit., p. 68).
2.3.4. Questionários de medida de atividade física: limitações ao uso
Considerado um instrumento de mais fácil aplicação e baixo custo para
medição do nível de atividade física em grandes populações, os questionários
de atividade física podem ser realizados na forma de entrevistas baseadas em
inquéritos presenciais em campo ou telefônicos, ou auto-avaliações/
autopreenchimento individual ou à distância, sendo os dados obtidos usados,
principalmente, em ações de intervenção populacional assistida, além de
compor recomendações de atividades físicas (BANDMANN, 2008, p. 3).
Os primeiros questionários de atividade física datam dos anos 1950,
tendo como foco atividades de ocupação profissional. A partir das décadas
seguintes, ao ponto que o trabalho tornou-se menos físico, maior interesse
passou a haver nas atividades em tempo livre de lazer, principalmente
atividades como esportes e recreação.
Já nos anos 2000, com a popularização dos estudos científicos sobre os
benefícios da atividade física para a Saúde, reforçou-se também a importância
das atividades físicas de menor intensidade, como caminhada, jardinagem e
tarefas domésticas, que anteriormente não eram consideradas como
“exercício”. Em 2006, durante o Congresso Internacional de Atividade Física e
Lazer, realizado nos EUA, definiu-se o interesse de que a intensidade das
69
atividades físicas fossem medidas por diferentes domínios, sendo assim,
doméstico, laboral, deslocamento e lazer.
Estima-se haver cerca de ao menos uma centena de questionários de
atividade física oficialmente validados para a finalidade a que se propõem (NCI,
online​), os quais distinguem-se em tamanho - sendo alguns deles curtos e
outros mais longos -, em temporalidade - alguns utilizando período recordatório
de uma semana e, outros, de um ano -, e em pontuação - com escores
dimensionados em minutos, equivalente metabólico (MET), ou em pontuação
adimensional com unidades arbitrárias. De acordo com Bandmann, devido a
essas diferenças, a confiabilidade e a validade destes questionários não é
dependente dessas variáveis mas, especialmente, da construção lógica que
norteia a construção das questões ali presentes, que devem mirar
especificamente os domínios da atividade física nos quais as pessoas
realmente realizam suas atividades e incluindo, possivelmente, até mesmo os
jargões específicos que são utilizados para aquela atividade física (Id.).
A forma mais comum de testar a confiabilidade dos questionários de
atividade física, isto é, a reprodutibilidade de uma medida em diferentes testes
realizados com o mesmo sujeito, ocorre, em geral, de acordo com a autora,
pela aplicação do método teste-reteste, sendo o tempo de realização entre os
testes um aspecto de influência sobre o resultado, já que neste ínterim pode
haver variações em relação ao próprio sujeito da amostra, ou somatória de
todos os participantes. Por isso, os questionários de atividade física costumam
apresentar maior correlação no curto do que no longo prazo. A autora destaca
que a maioria dos estudos reportou haver boa ou muito boa confiabilidade na
maior parte dos questionários, através da correlação apresentada na realização
do teste-reteste (Id.).
70
Diferentemente da confiabilidade, a validade do teste diz respeito, por
sua vez, à precisão da medida do instrumento a partir da comparação com um
outro instrumento que corresponda ao padrão-ouro (Id.). No caso dos
questionários de atividade física, os instrumentos mais utilizados para realizar
esta correlação são o acelerômetro e o VO​2​máx (Tabela 5).
Tabela 5: Coeficientes de correlação ajustados para sexo/idade entre diversos
questionários de atividade física e oito domínios de validação.
Fonte: JACOBS, 1993, p.89.
71
Além destes, Jacobs (1993, p.89) tratou de validar uma seleção de
questionários de atividade física também baseado em diários de quatro
semanas, no entanto, assim como verificou Bandmann, diferentemente da
confiabilidade do teste, a maioria das pesquisas reportaram que sua validade
apresenta correlação linear variando de baixa a média.
Para enfatizar esta análise, o anexo 1 da presente pesquisa corresponde
a uma síntese elaborada pelo autor sobre as informações de alguns dos
principais questionários de atividade física selecionados a partir de destacadas
referências da literatura científica e que, consequentemente, são os mais
largamente utilizados, sendo eles: ​3-Day Physical Activity Recall (3DPAR) -
Bouchard; Questionário de atividade física habitual de Baecke; Questionário de
atividade física de tempo de lazer de Godin-Shephard; IPAQ - versão curta;
IPAQ - versão longa (dimensão lazer), e; Tópico Atividades Físicas do
questionário da Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças
Crônicas por Inquérito Telefônico), do Ministério da Saúde.
O ​3-Day Physical Activity Recall (3DPAR) (Anexo 2) foi elaborado por
Bouchard (CITAR REF BIBLIOGRÁFICAS), em 1983, no Canadá, e é destinado
a sujeitos entre 10 e 50 anos de idade. O questionário apresenta formato de
autoavaliação com questões que estratificam as atividades físicas realizadas
por seus diferentes domínios (refeições; atividades físicas laborais; atividades
físicas de lazer e locomoção; atividades físicas de deslocamento; atividades
físicas escolares, e; esportes).
Pavlidou ​et al (2011) realizaram a validação do instrumento ante ao uso
de acelerômetro colocado em crianças gregas, obtendo 44% de correlação
entre eles. Para preenchê-lo, os participantes são levados a compreender por
meio de ilustrações as diferenças existentes em cada tipo de intensidade de
72
prática (leve, moderada, difícil e muito difícil) e, depois, informar em um
recordatório de três dias (sendo um deles obrigatoriamente no fim de semana),
dividido por blocos de 30 minutos, as atividades físicas (entre as listadas) e
suas respectivas intensidades.
Embora eficiente para estimar a energia gasta diariamente em MET em
um recordatório minucioso, a desvantagem do 3DPAR diz respeito ao tempo
necessário para o seu preenchimento, em torno de 30 minutos, assim como da
variância da medida em MET relacionada a diferentes perfis populacionais.
O questionário de atividade física habitual de Baecke (Anexo 3), de 1982,
também carrega o formato de autoavaliação. Embora com questões
similarmente separadas por dimensão da atividade física - atividades físicas
ocupacionais (AFO); exercícios físicos no lazer (EFL), e; atividades físicas de
lazer e locomoção (AFLL), este questionário apresenta a particularidade do seu
recordatório levar em consideração os últimos 12 meses de atividade física
habitual. Sua validação foi proposta por Bandmann (2008) e Florindo ​et al.
(2013), quando obtiveram índices de correlação linear, respectivamente, de
r=0,07-0,16 e r = 0,36-0,54. Seu preenchimento se dá a partir de um
questionário curto, contendo 12 questões, que são brevemente respondidas
(em torno de cinco minutos).
Apesar de validado, esse questionário está sujeito a maiores vieses de
memória, por conta do maior período a ser recordado, além de carregar certa
subjetividade nas respostas para as escalas nominais (ex. "nunca",
"raramente", "algumas vezes", "frequentemente" e "muito frequentemente"). O
uso da fórmula para determinação do escore adimensional utilizado também
não é de fácil compreensão, dificultando a assimilação do resultado
apresentado pela ferramenta. Soma-se a isso o fato de os escores
73
adimensionais não serem validados para obter as quantidades absolutas de
prática dos indivíduos, ou seja, da magnitude absoluta da prática habitual em
atividade física para estudos de intervenção populacional, mas sim um
indicador a ser monitorado de tempos em tempos.
Ainda do mesmo período (1985) advém o questionário de atividade física
de tempo de lazer de Godin-Shephard (Anexo 4). Utilizado com participantes
entre 18 e 65 anos de idade, este questionário constitui-se também em formato
de autoavaliação, porém, diferentemente dos demais, está especificamente
orientado para a dimensão da atividade física de lazer.
O questionário destaca-se, também, quanto ao tempo do recordatório,
que trata de uma ​semana usual de sete dias sem especificar o período. Além
disso, é um dos únicos a estruturar a validação da informação sobre a
frequência ​semanal (e não apenas duração e intensidade) de realização de
atividades físicas em intensidade moderada a vigorosa por meio da
reprodutibilidade da questão sobre a frequência de suor.
Favorecido por possuir apenas duas questões que podem ser
respondidas em cerca de 90 segundos, este questionário recebeu validações
aceitáveis ​por acelerometria (r = 0,32 - score) e (r = 0,31 - suor); VO​2​max (r =
0,56 - score) e (r = 0,57 - suor), e; diário de anotações de quatro semanas (r =
0,52 - suor).
Bandmann (2008) destaca, no entanto, que o coeficiente linear de
teste-reteste mostrou-se pouco significativo para atividades leves (r = 0,24) e
moderadas (r = 0,36), embora fortemente significativo para atividades intensas
(r=0,84). Ademais, em se tratando de escores adimensionais, os resultados não
levam a quantidades absolutas da prática dos indivíduos. A​s freqüências
semanais de atividades extenuantes, moderadas e leves foram multiplicadas
74
por nove, cinco e três, respectivamente, sendo a atividade semanal total de
lazer calculada em unidades arbitrárias pela soma dos produtos dos
componentes separados.
Produto de uma reunião de especialistas convidados pela OMS e
pautado em uma nova compreensão sobre os benefícios de atividades físicas
de mais baixas intensidades à saúde, como atividades físicas domésticas,
caminhada a passeio, entre outras, o ​International Physical Activity
Questionnaire ​(IPAQ), versão curta (Anexo 5), consiste de um questionário de
atividade física contendo nove itens sobre atividade física sem dimensão
especificada, nas quais os participantes preenchem informações sobre tipo,
frequência e duração das atividades realizadas por diferentes intensidades.
Baseado no recordatório dos últimos sete dias, o questionário é recomendado a
indivíduos com faixa etária entre 18 e 65 anos de idade.
Apesar da baixa correlação (r = 0,30), este questionário foi validado
contra acelerômetro nos formatos entrevista e autoavaliação. E além de levar
poucos minutos para ser respondido (aproximadamente quatro minutos),
destaca-se por apresentar em seu resultado informações com quantidades
absolutas de prática dos indivíduos, comparáveis com as normas
internacionais.
Embora possibilite que os sujeitos sejam classificados por nível de
atividade física praticado, ao passo que desconsidera possíveis variações
sazonais da prática, o IPAQ não pode ser considerado, assim, um medidor de
atividade física habitual. Ademais, "recente revisão bibliográfica identificou que
o instrumento superestimou a atividade física quando comparado com
mensurações objetivas e que o instrumento foi um indicador relativo ou absoluto
fraco de atividade física" (FLORINDO ​et al​, 2013, p. 318-27).
75
Já o uso da versão longa do IPAQ (Anexo 6) ganhou força, no entanto, a
partir do interesse de identificar o nível de prática por diferentes dimensões da
atividade física. Esta versão consiste em 31 itens similares aos da versão curta,
porém, distribuídos em diferentes dimensões de atividade física: atividade física
no trabalho; atividade física como meio de transporte; atividade física em casa
e; atividades físicas de recreação, esporte, exercício e de lazer.
Também pautado no recordatório dos últimos sete dias e apresentando a
quantidade total do tempo, em minutos, do esforço realizado na última semana,
com o somatório das atividades feitas realizadas por ao menos dez minutos
contínuos, possibilitando a comparação com as normas internacionais, esta
versão do IPAQ foi apenas validada para o formato entrevista. Bandamann
(2008) apresentou correlação linear ante acelerômetro de r = 0,33, assim como
Florindo ​et al. ​(2013), r = 0,34. Esta autores consideram que o “módulos de
lazer e deslocamento da versão longa do IPAQ apresentaram evidências de
validade adequada na comparação com acelerometria” (Id).
Dessa forma, os autores consideram que a versão longa do IPAQ
apresenta-se como uma ​“alternativa mais adequada em relação à versão curta
e também em relação aos domínios do trabalho e das atividades domésticas, os
quais são mais complexos de mensurar e são os dois domínios em que as
pessoas tendem mais a superestimar a atividade física praticada” (Id.; Hallal,
2010).
Hallal ​et al​. (2010, p. 262) consideram, ainda, que os módulos de lazer e
deslocamento do IPAQ são os mais relevantes para a categorização dos níveis
populacionais de atividade física e para orientar políticas públicas e programas
de saúde. Além de rápido para ser respondido, o IPAQ (versão longa) é
internacionalmente comparável, tendo sido validado em 2000 em 12 países,
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Dos questionários de atividade física ao método da escuta: para além da crítica ao discurso do medo e o resgate da relação com o corpo

  • 1. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA E ESPORTE Dos questionários de atividade física ao método da escuta: para além da crítica ao discurso do medo e o resgate da relação com o corpo Rodrigo Hisgail de Almeida Nogueira São Paulo 2019
  • 2. RODRIGO HISGAIL DE ALMEIDA NOGUEIRA Dos questionários de atividade física ao método da escuta: para além da crítica ao discurso do medo e o resgate da relação com o corpo Monografia apresentada à Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Educação Física. Área de Concentração: Educação Física e Saúde Coletiva/Saúde Pública Orientadora: Professora Dra. Yara Maria de Carvalho São Paulo 2019 1
  • 3. FICHA DE APROVAÇÃO Autor​: NOGUEIRA, Rodrigo Hisgail de Almeida Título​: Dos questionários de atividade física ao método da escuta: para além da crítica ao discurso do medo e o resgate da relação com o corpo. Monografia apresentada à Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Educação Física. Data: ____/____/____ Banca Examinadora Prof. Dr.:________________________________________________________ Instituição:_______________________________ Julgamento:_____________ Prof. Dr.:________________________________________________________ Instituição:_______________________________ Julgamento:_____________ Prof. Dr.:________________________________________________________ Instituição:_______________________________ Julgamento:_____________ 2
  • 4. AGRADECIMENTOS À Iris, flor que segue a brotar em minha vida, ao nosso carinhoso Mathias, que me enche de alegria, e a minha família, pelo amor de todos os dias. Aos queridos amigos que apoiaram cada novo passo desta emocionante difícil trajetória, porém possível e prazerosa, de novos aprendizados e significados. Aos professores desta Universidade de São Paulo em nome da minha orientadora, Profa. Dra. Yara Maria de Carvalho, pelo corpo de conhecimento adquirido, que possibilitou tantas revelações nas diferentes dimensões pelas quais perpassa a área de conhecimento da Educação Física na atualidade. Aos supervisores e colegas de estágio que compartilharam de importantes aprendizados obtidos desde as bancadas de pesquisa aos trabalhos em campo. Aos queridos alunos, que a mim confiaram a oportunidade de cada novo encontro, especiais em sua particularidade, e fundamentais para o meu desenvolvimento e formação profissional. À Pró-Reitoria de Extensão Universitária e à Pró-Reitoria de Graduação pelos financiamentos obtidos nos Programas Unificado de Bolsas de Estudos para Apoio e Formação de Estudantes de Graduação e Aprender na Comunidade. Dedico este trabalho à classe trabalhadora. ​In memoriam ​a Marielle Franco, socióloga, política, feminista e defensora dos direitos humanos no Brasil. 3
  • 5. NOGUEIRA, Rodrigo Hisgail de Almeida. Dos questionários de atividade física ao método da escuta: para além da crítica ao discurso do medo e o resgate da relação com o corpo. São Paulo - SP, 2019. [Monografia de Bacharelado – Escola de Educação Física e Esporte – Universidade de São Paulo]. RESUMO As práticas corporais figuram-se na atualidade como uma forma de resgate e cuidado da relação com o corpo e com o outro, reconhecendo na existência dos afetos importantes elementos para a construção de uma proposta de intervenção da Educação Física na área da Saúde Coletiva. Os objetivos da presente investigação foram estabelecer uma reflexão crítica sobre as estratégias de intervenção da Educação Física no campo da Saúde Coletiva, além de avançar ​n​o exercício de uma proposta de intervenção pelo método da escuta junto a oito sujeitos aleatoriamente selecionados, em que identificou-se distintas formas de afetos disparados ao pensar suas vivências corporais. A abordagem mecano-sanitarista oriunda da sociedade moderna parte, por sua vez, da orientação voltada à educação e governo dos corpos, pautada numa conduta moral de caráter higienista e protocolização dos cuidados, através de doses mínimas de esforço físico que ofereçam benefícios à saúde. Ferramentas de medida foram criadas, entre elas os questionários de avaliação de nível de atividade física que, no entanto, oferecem uma ilustração imprecisa da realidade. No Brasil, recentes pesquisas apresentaram critérios inconsistentes, reduzindo-se a indicadores em busca de alguma aproximação com o tema. Palavras-chave: Práticas corporais, Saúde Pública, Filosofia. 4
  • 6. NOGUEIRA, Rodrigo Hisgail de Almeida. ​From physical activity questionnaires to the listening method: beyond the criticism of the fear discourse and the rescue of the relationship with the body​. São Paulo - SP, 2019. [Monografia de Bacharelado – Escola de Educação Física e Esporte – Universidade de São Paulo]. ABSTRACT The body practices are nowadays a way of rescue and care of the relationship with the body and the other, recognizing in the existence of the affection important elements for the construction of a Physical Education intervention proposal in the Collective Health area. The objectives of the present investigation were to establish a critical reflection on the intervention strategies of Physical Education in the field of Collective Health, as well as to advance the exercise of an intervention proposal by the method of listening with eight randomly selected subjects, in which we identified different forms of affections triggered when thinking about their bodily experiences. The mechano-sanitarist approach from modern society starts, in turn, from the orientation towards the education and governance of the bodies, based on a hygienist moral conduct and protocol of care, through minimum doses of physical effort that offer health benefits. Measurement tools have been created, including physical activity level assessment questionnaires which, however, provide an inaccurate illustration of reality. In Brazil, recent research has presented inconsistent criteria, reducing itself to indicators seeking some approximation with the theme​. Key words​: ​Body practices, Public Health, Philosophy​. 5
  • 7. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 - Nuvem de termos………………………………………………………...32 6
  • 8. LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Termos mais frequentemente relacionados aos trechos dos relatos.33 Tabela 2 - Síntese das definições das principais recomendações mundiais para atividade física, 2014…………………………………………………………………58 Tabela 3 - Classificação da intensidade do exercício: intensidade absoluta e relativa do exercício para exercício resistido e capacidade cardiorrespiratória.61 Tabela 4 - Vantagens e desvantagens dos métodos de medida de atividade física……………………………………………………….…………………………...65 Tabela 5 - Coeficientes de correlação ajustados para sexo/idade entre diversos questionários de atividade física e oito domínios de validação………………….71 7
  • 9. LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Prática de atividade física em tempo de lazer pela população brasileira por sexo - em %..................................................................................89 8
  • 10. SUMÁRIO Introdução…………………………………………………………………………….11 1. Práticas corporais e exercício da escuta…….……………………………...16 1.1. Relatos pessoais………………………………………………………………...18 1.2. Cuidados com o gesto…………………………………………………………..31 1.2.1. Nuvem de termos……………………………………………………….31 1.2.2. Afetos disparados……………………………………………………….33 1.2.3. Proposta de intervenção……………………………………………….39 1.3. Práticas corporais no campo da saúde……………………………………….42 2. Protocolização dos cuidados e suas formas de instrumentalização…..48 2.1. Governo dos corpos……………………………………………………………..48 2.2. A retórica do ​agito​…………………………………………………………….....53 2.3. Principais recomendações para prática de atividade física…………………57 2.3.1. Consensos e divergências entre os protocolos internacionais…….58 2.3.2. Determinações sobre a intensidade de realização da prática……..60 2.3.3. Instrumentos de medida da atividade física………………………….64 2.3.4. Questionários de atividade física: limitações ao uso………………..69 3. “​Bio​estatística” da atividade física no Brasil …………..…………………..82 3.1. Diagnóstico Nacional do Esporte (Diesporte) (2013)..................................83 3.2. Práticas de Esporte e Atividade Física (2015).............................................85 3.3. Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) (2006 - 2018)...................................88 3.4. Pesquisa Nacional de Saúde (2013)...........................................................91 3.5. Algumas reflexões..…………………………………………………………......94 Conclusão…………………………………………………………………………….97 9
  • 12. INTRODUÇÃO A Universidade é uma fonte de produção de inúmeros conteúdos, disciplinas, seminários de pesquisa, trabalhos acadêmicos, estágios de extensão, etc., por isso, a quantidade de informação sistematizada para o alcance desse projeto foi enorme e pautou-se em diferentes perspectivas e dimensões do conhecimento, fato que exigiu, assim, alguns recomeços a cada nível de profundidade e clareza alcançado​s​. Interessado na atuação junto ao mercado da prevenção de doenças e agravos crônicos com a saúde, entrei no campo da Educação Física prevendo boas possibilidades de negócio juntamente a uma população que adota hábitos de vida ditos “inadequados” e que gradualmente se torna mais longeva. Assunto pertinente, porém, insuficiente para alguém que possui uma formação prévia em Economia Política, campo que reconhece haver no sistema capitalista contradições e vínculos de poder existentes na esfera das relações sociais de produção que, além da tradicional exploração da força de trabalho e dos espaços de viver, chega também ao domínio dos próprios corpos. Situo-me num momento em que reconheço haver limitações a este modelo “utilitarista” da Educação Física pautado na hegemonia mecano-sanitarista e, apesar de convocá-lo, juntamente a outras práticas estudadas e vivenciadas, tal discurso mostra-se ser, também, subproduto de uma nova ordem econômica mundial pautada pelos interesses do ​laissez-faire​, por meio da proliferação de uma retórica pautada num tipo de mensagem de medo e necessidade de controle de fatores de risco modificáveis, em especial, a inatividade física, ou sedentarismo. 11
  • 13. Distante de firmar qualquer tipo de apologia ao sedentarismo, reconheço haver a necessidade de que tanto o profissional de Educação Física, como e principalmente a população, não sejam “capturados” pelo discurso dominante do “corpo saudável”. Em última instância, à medida que o indivíduo é capturado pela mensagem midiática, e também científica, privado-o de constituir a gestualidade e o cuidado acerca da sua relação com seu próprio corpo, com respeito à sua história e afetos aí envolvidos, isso pode levar à algum tipo de dominação e governo sobre os corpos. Nesse sentido, o estudo do indivíduo sob a perspectiva da Educação Física e seus desdobramentos sobre o movimento dos corpos tem se desenvolvido numa importante e abrangente área de conhecimento, na qual muitas óticas sobre um mesmo objeto mostram-se possíveis sob algum tipo de perspectiva político-ideológica, sendo capazes, inclusive, de orientar projetos e ações de intervenção pública pautada em grupos particulares de interesse. Essas diversas possibilidades conferem ao campo da Educação Física diferentes abordagens teóricas, das quais sagrou-se vencedora a de cunho mecânico-biologicista apoiada no discurso neoliberal de dominação sanitarista, e recentemente apoiada na retórica do “agito” (Fraga, 2006). Ao impor sua ideologia através da ênfase quanto aos risco de agravos e doenças crônicas e degenerativas com a saúde, sem considerar elementos de diferentes dimensões, tais correntes mais podem levar a alguma forma de dominação econômica por meio dos corpos, do que ao desenvolvimento das estruturas sociais. Diante da hegemonia das concepções sobre as atividades e exercícios físicos para a saúde, destaca-se as normas internacionais para padronização dos cuidados e recomendações para prática de atividade física para a 12
  • 14. população, sendo a mais amplamente conhecida aquela que oferece uma “dose” mínima de esforço físico que resulte em benefícios para a saúde. Ela deve ser de pelo menos 150 minutos acumulados por semana de atividade física moderada ou 75 minutos por semana de atividade física vigorosa, em sessões de pelo menos 10 minutos de duração, sem determinação de frequência semanal (WHO, 2010, p. 26). Disso decorre a construção de todo um aparato metodológico que utiliza-se de instrumentos de medida para qualificação do nível de atividade física praticada pelo indivíduo, como é o caso dos questionários de nível de atividade física. À medida que tais ferramentas categorizam os sujeitos em ativos, insuficientemente ativos ou inativos através da estimativa sobre a quantidade de atividade física habitual praticada por eles, transfere-se a eles a responsabilidade por sua condição de “sedentário” ou, ainda, “preguiçoso”. Tal condição cria um padrão medicalizador que, além disso, pode ser impreciso e insuficiente em seu propósito. Por um lado, a imprecisão dessas ferramentas diz respeito a uma série de limitações - metodológicas, do contexto do indivíduo e também de ordem social - sobre a realidade da atividade física praticada. Subentende-se, dessa forma, que um questionário de atividade física não consegue avaliar, como deseja reproduzir o ​mainstream​, todos os tipos e quantidades de prática​s​, não sendo possível criar, assim, a expectativa de que algum deles ofereça uma representação fidedigna e válida da realidade. Por outro lado, o uso dessas ferramentas é insuficiente, pois apesar de a norma para a prática de atividade física pouco colaborar para a melhoria do quadro de inatividade física da população - o que é contraditório, já que tais ferramentas deveriam pautar ações que levassem as pessoas a se tornarem 13
  • 15. pelo menos mais ativas -, elas objetificam o sujeito da ação como se fosse um autômato e a ele transfere a responsabilização por sua condição de corpo-marginal, submetido às distintas formas de vulnerabilidades, seja de cunho motor, socioeconômico, afetivo, espacial, entre outras vividas. Tais ferramentas parecem atuar, assim, mais no sentido de colaborar para a proliferação de um discurso político-ideológico neoliberal de dominação e governo dos corpos do que de levar a condições que atuem no cerne do problema da desigualdade social e falta de autonomia em curso, estas sim que são questões anteriores à inatividade física e que dizem respeito, entre outr​a​s, a um tipo de cerceamento que limita a realização das práticas corporais, tais como ​a ​escassez de tempo, falta de espaços públicos de qualidade, falta de repertório corporal e, principalmente, proliferação de abordagens pouco inclusivas e que não valorizam o cuidado com o corpo. Os objetivos da presente investigação foram estabelecer uma reflexão crítica sobre as estratégias de intervenção da Educação Física no campo da Saúde Coletiva, além de avançar no exercício de uma proposta de intervenção pelo método da escuta junto a oito sujeitos aleatoriamente selecionados. O método de investigação contou com: uma coleta de dados de caráter qualitativa realizada com uma amostra de oito participantes de diferentes faixas etárias, sexo, e sem qualquer restrição para participação; uma revisão abrangente sobre as principais normas de intervenção e instrumentos de medida para avaliação do nível de atividade física no tempo de lazer, com destaque para alguns dos principais questionários de nível de atividade física selecionados com base na disponibilidade de estudos sobre sua validação; bem como de uma recente base de pesquisas de institutos públicos nacionais, que 14
  • 16. ofereciam como critério de análise dados demográficos sobre a prática de atividade física, especialmente ​n​o tempo de lazer. Com o intuito de convidar o sujeito da história, neste caso um aluno ou aluna, a ser participante da construção da proposta de intervenção, o primeiro capítulo, “Práticas corporais e o exercício de escuta” apresenta o resultado de um levantamento feito com oito sujeitos, a partir do método da escuta, evidenciando alguns dos principais afetos neles disparados ao pensar sua relação com as práticas corporais por eles vivenciadas. Daí decorre importantes elementos sobre o trabalho de intervenção proposto, baseado no cuidado com os gestos e demais fundamentos da abordagem das práticas corporais. Frente à dominância das abordagens mecânico-biologicistas de intervenção da Educação Física no campo da Saúde Coletiva, o segundo capítulo, “Protocolização dos cuidados e suas formas de instrumentalização” procurou refletir sobre como as principais recomendações e ferramental teórico que embasam esta construção, enfatizando o uso dos questionários para classificação do nível de atividade para uma vida saudável, levam a uma certa forma de dominação e governo sobre os corpos. Finalmente, frente a alguns dos principais conceitos e significados sobre as práticas corporais na contemporaneidade, o terceiro capítulo “‘​Bio​estatística da atividade física no Brasil’” tem vistas a obter uma “radiografia” sobre o perfil de realização das atividades físicas e esportivas pela população brasileira que, amparada no intuito de caracterizar o quão ativa é esta população, comparativamente às normas internacionais, leva à criação de biodados que geram mudanças sociais insuficientes, simplificando-se, assim, a indicadores que buscam alguma aproximação com o tema, mas cuja utilidade destina-se mais ao seu uso midiático do que propriamente científico e social. 15
  • 17. CAPÍTULO 1 - PRÁTICAS CORPORAIS E EXERCÍCIO DA ESCUTA Através do método da escuta, uma amostra de oito participantes, sendo 5 mulheres, com idade média de 50 ±17 anos, foi aleatoriamente selecionada por um mesmo pesquisador e convidada a responder ao seguinte questionamento: o que um profissional da área da Educação Física deveria saber sobre você e seu corpo (prazeres, dores, medos, frustrações, anseios) baseado nas suas experiências com as atividades físicas e práticas corporais ao longo da vida? A pergunta foi encaminhada entre os meses de maio a agosto de 2019 por mensagem de texto ou ​e-mail a doze sujeitos, que correspondiam a alunos de ​personal trainner de um dos pesquisadores deste estudo, dos quais houve oito respostas. O tempo de intervenção com cada participante variou de 0-30 meses sem que tenha havido vínculo ou relação empregatícia ou de qualquer outra natureza com qualquer instituição ou órgão que sustentasse a realização dos encontros. A resposta era condicionada ao interesse e disponibilidade de cada participante em respondê-la. A partir da leitura das cartas, cada termo afetivo associado à experiência com o corpo ao longo da vida foi listado em uma tabela eletrônica e relacionado ao trecho correspondente da carta. Reuniu-se os termos mais frequentemente mencionados em uma “nuvem de palavras” contendo diferentes níveis de1 frequência de repetições, de acordo com o tamanho da palavra. Em seguida​, estes termos foram analisados, um a um, por meio de filtros aplicados às colunas das planilhas eletrônicas. A seleção de cada termo revelava um conjunto de trechos compilados de uma ou diferentes narrativas 1 Serviço gratuito oferecido pelo site eletrônico ​https://www.wordclouds.com/ 16
  • 18. mas que assemelhavam-se. Seguiu-se à análise uma reflexão crítica realizada a partir do reconhecimento dos afetos também disparados nos pesquisadores e sua importância para a construção de outros modos de pensar e fazer educação física. 17
  • 19. 1.1. Relatos pessoais 1.1.1. S.L., 74a, feminino. 18
  • 20. 1.1.2. C.C., 33a, masculino. 19
  • 21. 20
  • 22. 1.1.3. C.M., 59a., masculino. 21
  • 23. 22
  • 24. 23
  • 25. 1.1.4. S.T., 66a., feminino 24
  • 26. 25
  • 27. 1.1.5. J.B., 39a., feminino. 26
  • 28. 1.1.6. I.F., 31a., feminino. 27
  • 29. 28
  • 30. 1.1.7. A.H., 62a., feminino. 29
  • 31. 1.1.8. E.C., 36a., masculino. 30
  • 32. 1.2. Cuidados com o gesto Partindo-se dos relatos anteriormente apresentados, o exercício da escuta aqui realizado seguiu com a interpretação de alguns dos principais tipos de afetos e condições associados à experiência deste grupo com seu repertório de práticas corporais e atividades físicas já vivenciados. Procurou-se identificar, com isso, o significado de alguns trechos frequentemente associados às vivências motoras, contidos em cada um dos relatos. Trata-se, assim, do ponto de partida a partir do qual é possível compreender o quanto um gesto motor pode vir a ser positivo ou, nocivo, para a condição de cada sujeito. 1.2.1. Nuvem de termos A nuvem de palavras representada na Figura 1 reúne os termos mais frequentemente associados a cada um dos trechos do conjunto de relatos apresentado no item anterior, a partir da interpretação dada pelo autor. Em uma breve análise já é possível a identificação da existência de diferentes níveis de frequência de repetições de uma mesma palavra conforme o seu tamanho verificando-se, assim, a existência de palavras de primeiro nível de frequência de repetição, segundo, terceiro, e sucessivamente. 31
  • 33. Figura 1: Nuvem de termos. O propósito aqui é evidenciar como alguns termos destacam-se frente aos demais: saúde, desconforto, desprazer, obesidade, preconceito, dor, prazer, consciência, medo, obrigação, abandono, humilhação, sedentarismo e sofrimento, que na sua maioria representam afetos tristes e condições negativas relacionados às experiências com as atividades físicas e práticas corporais relatados pelo grupo (Tabela 1). 32
  • 34. Termos Número de vezes saúde 9 desconforto 7 desprazer 7 obesidade 7 preconceito 7 dor 6 prazer 6 consciência 5 medo 5 obrigação 5 abandono 4 humilhação 4 sedentarismo 4 sofrimento 4 Tabela 1: Termos mais frequentemente relacionados aos trechos dos relatos 1.2.2. Afetos disparados Ao tomar contato e analisar este conjunto de relatos a partir de um ponto de escuta sobre o os elementos abordados por cada indivíduo, uma espécie de onda de afetos tomou conta de mim - do interlocutor que as leu -​, sob forma de importantes revelações que marcaram a sensibilidade do futuro profissional quanto a elementos presentes na dimensão afetiva dos indivíduos. 1.2.2.1. Condição de saúde O termo saúde foi aquele que apresentou maior frequência de correspondência quando pensado sob a ótica da atividade física. Não é de 33
  • 35. surpreender que grande parte dos termos que indicam afetos e/ou condições relacionadas às experiências com as atividades físicas relatados pelo grupo de sujeitos avaliados estejam ligadas à prevenção à saúde, especialmente aos cuidados com agravos a doenças crônicas não transmissíveis, como no caso da obesidade e dor crônica, termos frequentemente relatados, incluindo-se aí, também, o sedentarismo como um elemento de preocupação ligado ao estilo de vida “ativo”. No primeiro parágrafo de seu relato, a jovem I.F., 31a., revela: “talvez o primeiro impulso para a prática de atividades físicas seja criar um hábito saudável, e atingir uma estética corporal, como emagrecer ou ganhar massa muscular”. Não obstante, também a senhora S.T., 66a., considera que “a atividade física e as práticas corporais são importantes para nos mantermos em equilíbrio e saudáveis, física e mentalmente”. As práticas corporais são, assim, lançadas ao principal foco de solucionar problemas ou dificuldades com a saúde, como no caso de J.B., 39a., fem., que “acordando as 04:30 e dormindo por volta das 24:00, aprendi a comer besteiras, fui aumentando a minha massa corporal, principalmente a de gordura”. Além da prevenção à saúde, e da tentativa de compensação de um quadro de sobrepeso, obesidade, ou estilo de vida sedentário, episódios relacionados à busca pela cura para solucionar alguma dor osteomioesquelética também chama a atenção quando relacionada à busca pelas práticas corporais e atividades-físicas. A mesma J.B. revela em tom de auto-deboche que “hoje, com 39 anos, 66kg, trabalhando fazendo entregas, carregando peso, uma hérnia de disco, uma protusão e dor no nervo ciático, consigo enxergar (não pelo amor e sim pela dor kkkk), a necessidade de inserir exercícios físicos na 34
  • 36. minha rotina”. Não diferente, C.M. menciona que “com 59 anos de idade, duas hérnias de disco e com o nervo ciático que me incomoda muito (...) é dolorosamente necessário enfrentar esse percurso”. Invés de ser despertado pelo prazer com o gesto praticado, o despertar do corpo, nestas situações, apresentaram-se por meio da dor, evidenciando que estes indivíduos passaram décadas sem vivenciar experiências de movimentos corporais positivas com seus corpos, a ponto dessa associação ocorrer a partir de um ponto de incômodo, nestes casos a dor, ou o medo de adoecer, de engordar, de não atender a padrões estéticos e assim por diante. 1.2.2.2. Aspectos afetivos-sociais Afora àqueles termos que remetem à preocupação com a saúde, ou sua prevenção, outro conjunto de manifestações associadas às experiências corporais relatadas pelo grupo diz respeito a aspectos de cunho afetivo-social. Entre os termos, destacam-se: desconforto, desprazer, preconceito, prazer, consciência, medo, obrigação, abandono, humilhação e sofrimento. Elementos marcantes, a maioria deles sinaliza a episódios de desagrado a partir de algum tipo de violência sofrida. O corpo que é estranho a si mesmo é o primeiro elemento a chamar a atenção, evidenciando o distanciamento já existente da pessoa com o seu lugar de morada, seu próprio corpo. C.M., 59a., masculino, considera ser seu corpo “praticamente um estranho, distanciado, inatingível (...) Nunca me dei bem com o meu corpo”. E completa com suas memórias de infância: “eu sempre usava umas camisetas brancas por baixo, grossas e de manga longa que, com frequência me faziam transpirar mesmo no inverno”. 35
  • 37. O desconforto com as experiências corporais de movimento podem manifestar-se e causar, em alguns, auto-bloqueios que até mesmo impedem ou retardam, sobremaneira, o indivíduo de iniciar um programa de treinamento. “Tenho vergonha só de tentar (...) teve sempre (e tem até hoje, embora muito menos) um desconforto com o corpo”, C.C., 33a. Para ele, o desconforto alcançou tal medida a ponto de afastá-lo de possíveis experiências com as práticas corporais. “A natação e a musculação foram boas nesse sentido, pois posso fazer sozinho, longe dos olhos avaliadores temidos pelo meu inconsciente (ou já “consciente” rss)”, completa. ​Os preconceitos por ele enfrentado iniciou-se, neste caso, da própria família. “Sofria certa pressão pela família, em especial pela minha mãe, que me cobrava desempenho em atividades tipicamente de meninos (...) Era como se minha falta de aptidão revelasse o que eu tinha que esconder na época”, revela. A falta de atenção, ou de sensibilidade da família e do próprio núcleo escolar para acolher a condição do Outro, a partir de tentativa de padronizá-lo a um certo tipo de estereótipo que atenda a padrões sociais estabelecidos passa a ser, assim, um dos elementos que tanto reprime, como distancia o indivíduo de relacionar-se com seu próprio corpo, a partir das mais diversas experiências, incluindo-se aí aquelas associadas às práticas corporais. Em suas palavras, “entendo que se a divisão de gênero fosse menos rígida, se tivesse tido mais liberdade de eu poder fazer o que eu tivesse vontade, se fosse menos cobrado para ser igual aos outros meninos (ou ao que minha mãe entendia ser um menino), a história pudesse ter sido outra”. Episódios envolvendo humilhação durante a prática de atividades físicas não são raros, especialmente no ambiente escolar, facilitando o distanciamento do indivíduo do alcance de alguma forma de prazer com tais elementos. 36
  • 38. Relembrando da experiência junto ao seu professor na aula de educação física quando criança, C.M., 59a., revela: “Ele parava a aula e gritava perguntando para um colega quantas cambalhotas ele tinha feito. Em seguida gritava: C.M.: quantas fez? A resposta era sempre: Nenhuma! E a turma festejava dando risada (...) essa cena se repetiu muitas vezes, mas nunca nenhum professor dedicou uns minutos para me explicar individualmente qual era a técnica para poder fazer corretamente essa cambalhota (...) Ficar radicalmente por último era muito humilhante, me angustiava muito”. Em alguns casos, o grau de assédio sofrido pode ter sido tal que, como no caso de S.L., 74a., feminino, ela relata: “nunca fui de praticar esportes com prazer (...) nunca me deu prazer”. E.C., 36a., masculino, considera que a prática de atividade física, “precisa ser um prazer para o aluno, não uma ‘pressão’”. Soma-se a isso a possível existência de medos de diferentes ordens incorporados às vivências motoras relatadas pelos indivíduos e que podem se tornar barreiras para a elaboração de um programa de treinamento, afastando-os ainda mais da prática corporal. I.F., 31a., feminino, preocupada em não lesionar-se, relata: “avisei o professor logo na primeira aula, com medo de me machucar novamente”. A dominância do discurso do medo sobre os corpos é tal, que muitas vezes, a falta de consciência corporal provocada pelo afastamento do indivíduo do próprio corpo constitui-se em um dos maiores medos a serem enfrentados, uma condição nocebo. Segundo a mesma I.F., 31a., “ao longo das aulas, os alunos tomam maior consciência de seus corpos e percebem que o que achavam ser seus limites, muitas vezes são medos”. 37
  • 39. Tais medos, que em alguns momentos se misturam com o sentimento de abandono, denunciam ser a falta de acolhimento, especialmente quando pensada a prática corporal ao longo do período de desenvolvimento e afirmação do indivíduo, um dos principais elementos que leva ao seu distanciamento da prática corporal. C.M., 59a., afirma, desta forma: “demorei muitos anos para tomar consciência de que eu tinha estatura baixa (1,64 m) como se o corpo fosse algo para não dar nenhuma atenção (...) Não faz muitos anos que descobri, com muita raiva e revolta, que houve alguns grandes atletas, em diversas modalidades de esportes, que eram de estatura baixa. Eu achava que a única alternativa era desenvolver a mente...” Diante dessas situações de violência enfrentadas, seja por experiências ruins do passado, ou diante do discurso dominante de fazer sentir medo, muitos destes indivíduos relatam praticar atividades físicas como uma espécie de obrigação associada à saúde, porém, avaliando haver no processo um aspecto dificultoso que beira o desagrado. “Tenho que me forçar a sair de casa”, escreve S.L., 74a. Segundo C.C., 33a., “era, por vezes, empurrado pelos meus pais para fazer”. Fora os poucos trechos dos relatos que indicavam haver algum tipo de prazer e ganho de consciência corporal percebidos a partir da realização das práticas corporais vivenciadas, torna-se evidente a predominância dos afetos ligados a aspectos essencialmente violentos, resgatados deste exercício de escuta. A partir de uma lógica pautada no poder sobre os corpos, empenhada na razão e na produtividade, desconsiderando qualquer tipo de afeto, a sociedade 38
  • 40. passa a enxergar a relação com o corpo como algo acessório, que pode ser deixado de lado até que se volte a reconhecê-lo por intermédio da dor, ou de outras tipificações sociais como "sedentário", "preguiçoso", entre tantos outros estereótipos que tentam dar conta de responder o porquê de uma pessoa não aderir a um programa de treinamento. Tal condição leva a pessoa a considerar, então, que este distanciamento do próprio corpo possa ser da sua estrita responsabilidade quando, na verdade, mais parece resultado de um contexto social perverso ao qual esteve exposta (horas e horas de trabalho; limitação financeira; distintas formas de preconceito e violência; falta de espaços públicos adequados; excesso de atividades ​indoor​; hegemonia de esportes de massa como o futebol, que tira o espaço de outras iniciativas corporais, etc.). 1.2.3. Proposta de intervenção Os relatos descritos acima emocionam pela peculiaridade e singularidade das experiências de cada sujeito, trazendo histórias marcantes sobre os afetos e condições despertados a partir do repertório de atividades físicas e/ou práticas corporais vivenciadas. Trata-se, aqui, da existência de importantes elementos a serem cuidadosamente considerados e reconhecidos a partir da fala do Outro, e que dizem respeito às manifestações sobre suas condições pessoais na forma de limitações e/ ou restrições sociais relatadas, a partir das quais entende-se haver a facilitação do processo de ressignificação do exercício das práticas corporais. Neste sentido, compreender a prática corporal a partir do reconhecimento de um incômodo, como a dor ou o medo, torna-se um importante caminho para que se possa colaborar no processo de resgate da 39
  • 41. relação do sujeito com seu corpo, à medida que enxerga a oportunidade de voltar a relacionar-se com seu lugar de morada. “Estou tentando fazer as pazes com o meu corpo (...) Estou decidido a respeitá-lo mais, a escutá-lo e até mimá-lo muito mais”, afirma C.M., 59a. É de fundamental importância reconhecer, por exemplo, que se um sujeito apresenta maior sensibilidade à dor, uma proposta de treinamento que ignore este elemento pode se tornar extremamente árdua, enfadonha e, consequentemente, pouco exitosa. S.L., 74a., conta que “não progredia nunca porque não fazia o mínimo esforço para aguentar a dor que causava’”. Não diferente, a falta de sensibilidade de alguns profissionais na área infantil, e muitas vezes dos próprios pais, em assuntos como, por exemplo, inclusão social e/ou identidade de gênero, é outro importante aspecto a ser considerado. Colocar-se no papel do Outro torna-se fundamental para compreender o sofrimento relatado por C.C., 33a., durante sua adolescência, ao lidar com o preconceito alheio durante as aulas de educação física, quando acreditava precisava conter algo que nada tinha de errado. Com isso, e devido nosso sistema educacional atrasado, C.C. não pôde ser devidamente introduzido às práticas corporais. Ademais, a subordinação de muitos professores de educação física infanto-juvenil às modalidades esportivas no ambiente escolar, como o futebol, basquete, vôlei e handball (quarteto fantástico), tanto exclui como retira o espaço para o ganho de outros importantes repertórios motores obtidos por meio de outras diversas modalidades corporais, como a dança, por exemplo, que configura-se como uma prática ainda pouco explorada junto ao público masculino em idade escolar. 40
  • 42. Não diferente, as violências corporais relatadas por C.M., 59a., durante sua infância, agora são traumas. Reconhecer suas marcas é a única maneira de entender que sua condição de “inatividade física” não é sinal de “preguiça”, ou descaso com si próprio. Para além, faz-se necessário motivá-lo a experimentar para saber que é capaz de executar diversos pequenos gestos, descobrindo no corpo um “amigo” a ser cuidado, com limitações a serem igualmente respeitadas. Antes que oriente a intervenção ao campo da saúde é preciso que o profissional de educação física faça o exercício da escuta daquele com quem irá ministrar algum tipo de trabalho envolvendo as práticas corporais, na tentativa de garantir o respeito às suas individualidades. Tais relatos dizem respeito, neste sentido, a um processo de resgate e ressignificação da relação com o corpo, “desconstruindo” muros que foram erguidos no passado e “plantando” novas sementes. Esta proposta tem como objetivo último, portanto, a promoção de um posicionamento crítico diante do discurso dominante de grupos de interesse que perpetuam na mídia, nas escolas, etc., e dos olhares avaliadores da sociedade. As práticas corporais, a partir deste reconhecimento, podem se tornar emancipadoras no sentido de proporcionar o resgate das pessoas com seus corpos e movimentos, a partir do respeito ao mais sutil gesto, que transcende aos aspectos motor e biológico para o plano sócio-afetivo, espiritual e cognitivo dos indivíduos. 41
  • 43. 1.3. Práticas corporais no campo da saúde Com a proposta de ressignificar as estratégias de intervenção da Educação Física junto à área da Saúde Coletiva , o uso do termo “práticas2 corporais” foi adotado e encontra-se em expansão, estando sua conceituação também presente nos conhecimentos oriundos das ciências humanas e sociais e não apenas nos da biologia. A existência das práticas corporais parte do reconhecimento dos afetos humanos e não da performance alcançada, elementos estritamente ligados aos movimentos e que, portanto, devem ser acolhidos e cuidados através de uma relação de corresponsabilidade. Para Carvalho (2006), a orientação de programas de intervenção de Saúde Coletiva pautados sob a ótica das práticas corporais são capazes de “privilegiar o encontro, a escuta e a atenção de pessoas adoecidas visando à construção de relações de vínculo, de corresponsabilidade, de autonomia no processo de cuidado com o corpo” (Op. cit., p. 33). Pensando o estabelecimento de uma rede de encontros, Alves e Carvalho (2010) consideram que “as próprias práticas corporais já estão abertas a este movimento relacional e se estruturam a partir deste movimento de promoção do encontro” (Op. cit., p. 242). Tal condição se opera tanto no esfera da pessoalidade, consigo mesmo, como no âmbito das relações com os outros, “onde os laços sociais são ressignificados à luz de outros domínios não restritivos (os imperativos morais), mas potenciais” (Id.). Baseando-se em Campos (2003), Mendes e Carvalho (2016) consideram que esta abordagem é construída no sentido de potencializar a inserção das práticas corporais acoplada à ideia de produção de saúde com um enfoque 2 A área de conhecimento da Saúde Coletiva é considerada um “campo de saberes e práticas que assume como objeto as necessidades sociais de saúde, com o propósito de elaborar e propor novas possibilidades interpretativas e explicativas sobre o processo saúde-doença” (MENDES & CARVALHO, 2013, p. 27). 42
  • 44. mais participativo e democrático. Segundo elas, “a atuação com os sujeitos e as comunidades, a partir dessa perspectiva, abre novas possibilidades de experiência do corpo e com a produção de cuidado em contraste com a lógica da atividade física e do exercício físico” (Op. cit, 2013, p. 28). Para Santiago Pich (2016), o saber verdadeiro no contexto das práticas corporais não mais se impõe como necessário para atender a um conjunto de normas e práticas a serem incorporadas pelo sujeito, mas da produção de sentidos a partir da relação que estabelece com “a vida que se vive”. Nas palavras do autor, “a produção de si só se torna possível pela relação com o outro, que possibilita a criação da própria vida como obra de arte” (Op. cit., p. 170). Em suas palavras: “se reconhece a existência de um diálogo com o corpo e com saberes corporais que não passam pelo registro da racionalidade discursiva, mas que não por isso deixam de constituir a racionalidade, uma racionalidade outra que tem na dimensão sensível a sua matriz” (Id.). No entendimento de Conrado Federici (2015), as práticas corporais no campo da Saúde Coletiva devem compreender o que considera ser, metaforicamente, “um abraço apertado entre o afeto de alegria (...) potência produtora de saúde no encontro entre as pessoas” (Op. cit., p. 163). Para esclarecer seu entendimento, o autor recorre ao filósofo Baruch de Spinoza (2009), para o qual os afetos conjugam-se numa potência global, à medida que as relações humanas não se distinguem das leis universais da natureza. Sendo os afetos munidos de alegria, quando há aumento de nossa potência vital, e de tristeza, quando o sentimento transita na direção da sua diminuição (Op. cit., apud​, SPINOZA, 2009, p. 107). 43
  • 45. Federici destaca alguns elementos corporais como a brincadeira, o jogo, as expressões corporais e artísticas como as artes do corpo, a música, e suas ressonâncias na percepção de possibilidades de práticas corporais em sistemas institucionalizados de saúde, especialmente do Sistema Único de Saúde (SUS), e suas problematizações. As abordagens propostas e reveladas pelo autor em algumas das suas experiências de intervenção junto a equipes multidisciplinares no campo da saúde e alunos de cursos de graduação partem desde a simplicidade do contato com o próprio corpo a técnicas de respiração em salas de espera, antiginástica, e outras formas de cuidado. Trata-se, assim, de práticas provenientes de processos de criação e que valorizam “os pensamentos filosóficos e artísticos que operam por outras estruturas, talvez menos assépticas e historicamente purificadas, porém vitalizadoras do processo de saúde em seu conceito mais amplo e atual” (FEDERICI, 2015, p. 166). Este autor considera que a arte, o jogo e o brincar, promovem paixões alegres, estados de espírito importantes para a noção de cuidado com a saúde, mas até o momento, segundo ele, pouco explorados nos processos de intervenção. “No jogo é possível errar. Sem grande importância (...) os aspectos de alegria e tristeza inerentes ao jogo relembram ao ser humano aspectos da vida que os tratamentos de saúde insistem em extirpar” (Op. cit. 167). O caráter lúdico dessa proposta de intervenção revela-se na hipótese de que “o jogo e a brincadeira podem ser, por vezes, as únicas alternativas possíveis a se abraçar (...) a possibilidade de perceber, perceber-se, perceber o outro (...) lidando com a qualidade do encontro entre as pessoas” (Id). O benefício ao campo da Saúde Coletiva a partir da incorporação dos conteúdos do jogo e do brincar, segundo Federici, é que “o jogo anda de mãos dadas com 44
  • 46. as paixões alegres (...) [e] o brincar frequenta outra direção nos modos de existência que, por definição, admitem-se em permanente oscilação” (Op. cit., p. 172-3). E é neste ponto que o autor chama atenção ao conteúdo da aleatoriedade e situações circunstanciais existente no jogo, que desenvolvem a incerteza e o mistério em sentidos que potencializam o tempo presente da vida, mantendo-se em “permanente oscilação, no contínuo jogo entre os afetos sem almejar um final definitivo, mas sua manutenção em diversão” (Id.), tal como a figura do palhaço: “Tal modo de proceder sobre a provisoriedade dos conteúdos, distante de técnicas didáticas que intencionariam objetivos prévios, é originário da presença cênica do palhaço. Esta arte exige que se expresse a simplicidade do real imediatamente. Alegre e triste” (Id.). Para Federici, o jogo permite um meio de alcançar o “desarme e o vestir a pele do outro”, uma espécie de exercício de perceber a si mesmo que é tão importante quanto o fazer, a partir de princípios do fazer artístico que torna o corpo novamente presente (Op. cit., p. 174). “Qual a lógica de um jogo que não a própria possibilidade de que não possua uma lógica?”, questionou Ana Cristina Zimmermann (2014), para a qual o jogo é, antes de mais nada, uma provocação que rompe com a estrutura linear de causa e efeito da atividade física, no qual os limites das regras podem ser extrapolados, indicando “infinitas” novas possibilidades (Id., p. 153-4). O jogo, aqui, mostra-se como um convite à prática, baseada sobretudo por desejos irracionais e inexplicáveis, envolvendo instintos e paixões que só acontecem mediante o comprometimento do jogador com o universo do próprio 45
  • 47. brincar. Para Zimmermann, “o jogador não sabe previamente o que será requisitado a cada momento e todo movimento precisa ser constantemente recriado (...) O jogo oferece justamente a oportunidade de experimentação em relação ao que está supostamente estabelecido” (Id. p. 155). Tal condição leva à possibilidade de que todas as preocupações sejam abstraídas, levando o jogador a engajar-se na atividade sem outro objetivo além do próprio jogo. Ao reconhecer o jogo como um elemento presente em todas as esferas da cultura humana, a autora o considera como uma das categorias mais fundamentais na vida, à medida que se trata, também, de um fenômeno cultural que perpassa e transmite tradições, fantasias, histórias, sonhos, ou mesmo componentes de transição e renovação social. O jogo permite, assim, o exercício da criatividade, da inovação e da indeterminação que, ao alcançar o imaginário, possibilita um novo convite a cada encontro. Para a autora, trata-se de “um gesto a espera de uma resposta desconhecida que se torna pergunta à espera do outro gesto, uma dialética sem síntese em um campo de movimento que é compartilhado” (Id. p. 155). Para ela, “o jogo acolhe e provoca também alegria, o gracejo, a raiva, a frustração” (id., p. 156), permitindo a possibilidade da falha, do acerto, do atrapalho, e sobretudo das imperfeições. Em última instância, o jogo oferece espaço para a experiência da transgressão do tempo linear e das suas regras, à medida que é possível questioná-las e com elas negociar. “Em jogo nem sempre quanto mais rápido melhor, nem sempre há progressão unidimensional nos resultados e nem sempre o resultado final é o mais importante” (Id. p. 157). O fazer compartilhado por meio das atividades lúdicas pautadas no jogo e no brincar torna-se, assim, estratégia de conteúdo das práticas corporais. 46
  • 48. “Estariam em jogo não somente os procedimentos atestados, mas a observação minuciosa sobre os movimentos de aumento de potência dos indivíduos, sempre nas relações” (FEDERICI, 2015, p. 176). No que diz respeito aos profissionais que lidam com as práticas corporais, Mendes e Carvalho (2016) consideram que a “função do profissional de saúde não é a de ‘promover’ a saúde para as pessoas, segundo uma postura verticalizada e impositiva, mas sim de ‘produzir’ saúde de modo conjunto com cada pessoa e sua comunidade” (Op. cit., 2013, p. 30). Federici (2015) enfatiza, no entanto, que “a aridez do ambiente de formação universitária da área da saúde, de fato, não tem contribuído com conhecimentos gerados por processos criativos. Há tempos ocorre a formação de profissionais que não sabem como brincar” (Op. cit, p. 181). Para Alves e Carvalho (2010), “como efeito, o profissional de Educação Física passa a ser agente ativo de uma ideologia do ser saudável, passando por cima da diversidade dos corpos, em função da reprodução de uma lógica excludente” (Op. cit., p. 231). Finalmente, no âmbito das práticas corporais, “propõe-se que haja os movimentos de parada, observação e percepção (...), com vistas à produção de experiências sensíveis de se sentir cheio de vida” (Op. cit., p. 186), considerando-se as particularidades “com sentido primordial a cultura do sujeito, com suas crenças, músicas, danças, comidas, festas, enfim, as manifestações da alegria” (Id.), mas deveras mantidas em segundo plano. 47
  • 49. CAPÍTULO 2 - PROTOCOLIZAÇÃO DOS CUIDADOS E SUAS FORMAS DE INSTRUMENTALIZAÇÃO Frente à dominância da abordagem de atuação da Educação Física com enfoque mecânico-biologicista, este capítulo apresenta sua principal forma de intervenção, pautada em pressupostos e recomendações estabelecidos por instituições internacionais que, ao classificar indivíduos por níveis de atividade física populacional, recomendam atividades e exercícios físicos pensados como uma espécie de “medicamento” voltado ao combate das doenças e agravos crônicos não transmissíveis para a saúde. 2.1. Governo dos corpos O contexto histórico para compreender o surgimento dos exercícios físicos como método e estrutura pedagógica definidas, segundo Soares (2016), abrange os séculos XVI a XVIII, e especialmente este último, denominado o Século das “Luzes”, que foi o marco de importantes rupturas em relação ao modo de pensar e conceber o corpo, que de imóvel, imagem aceita como a mais adequada na época, dá espaço a novas formas de pensar e conceber os movimentos corporais que não mais apenas corrigem, mas que também educam. Daí se poderia pensar, segundo a autora, na modalidade da Ginástica3 como “possibilidade de emergência e de significação de uma educação mais específica voltada ao corpo” (Op. cit, p. 44). Soares destaca, assim, importantes deslocamentos no modo de conceber e intervir nos corpos advindo deste período, como: a ideia do 3 “A Ginástica pode ser pensada como um conjunto sistematizado de conhecimentos, saberes e práticas que tomam bases científicas para se referir ao corpo em movimento” (Op. cit., p.59). 48
  • 50. movimento corporal centrado a uma visão da corrente da ciência moderna, segundo a qual, “de um modo inédito, a perfeição das ações corporais ganha um lugar e ela é buscada, então, com meios específicos, previstos e programados” (Op. cit., p. 45); do contexto político e cultural em que afirma-se a preocupação pública em relação ao corpo, sendo a transformação dos corpos uma missão coletiva; e o afastamento das concepções clássicas da medicina, que conferiam aos afetos o funcionamento do corpo. Mais do que a simples ideia de que o movimento pudesse corrigir a degenerescência física que a ação da natureza inscreveu ao corpo, pautada na ideia de abandono da imobilidade corporal e superação das fraquezas físicas, a grande ruptura ocorrida neste período foi a de pensar o movimento como um elemento ​educador a um novo padrão higienista socialmente estabelecido. “É assim que a firmeza e o vigor do corpo, qualidades físicas tão caras a uma burguesia emergente e em ascensão neste período começam a impor-se” (Op. cit, p. 50), porém, muito mais como interesse ligado à saúde e prevenção de doenças do que como requisito de boa aparência. Desta forma, indicando que o termo ​obesidade ​teve um dos seus primeiros usos no século XVII, Soares entende que “são considerados belos os corpos firmes, que engendram vigor, tonicidade e dinamismo (...) que devem expressar a saúde dos órgãos” (Op. cit., p.51). Ao passo que uma nova representação de beleza se produz e nela já existe a relação perceptível com a saúde, um crescente desejo pela aprendizagem motora e sua utilidade para o alcance do sucesso de uma ação gestual acentua-se. “Ação, repetição, meios ‘naturais’ domesticados” (Op. cit., p. 54). Daí se inventa, segundo a autora, o que viria a ser uma ​educação física​, 49
  • 51. educação corporal, educação medicinal de aperfeiçoamento da espécie humana. O ​exercício físico passa a incorporar o cotidiano, a educação dos indivíduos, e não apenas a correção dos problemas físicos. Os “jogos corporais” passam a compor, segundo Soares, um quadro mais amplo da vida social, incluindo os jogos de salão, jogos com bolas, raquetes ou tacos, danças, cavalgadas e, principalmente, a Ginástica, com técnicas específicas de educação e governo dos corpos (Op. cit., p. 59-60). Segundo a autora, a ideia da Ginástica nas modernas sociedades ocidentais tornou-se, assim, como a leitura e a escrita que leva a um aprendizado universal, “uma espécie de alfabeto do corpo”. Desse modo, à medida que os tratados da época atestam para a preocupação de construir um conhecimento do corpo e para o corpo sob bases científicas, a partir de justificativas e prescrições fornecidas por este tipo de conhecimento “ela, [a Ginástica], não se define mais como ​arte (...) se firma como ​ciência​” (Op. cit., p. 62). Adicionalmente, o processo “governamentalizador” dos cuidados com o corpo é apresentado por Santiago Pich (2016) como aquele em que “a vida, como alvo e objeto do investimento do poder na modernidade, é reduzida à sua dimensão biológica, para tornar-se um parâmetro moral, um imperativo, na prédica do cuidar de si na alta modernidade” (Op. cit., p. 155). Para ele, considerando as anotações do pensador Michel Foucault (1985), o período moderno é marcado por um deslocamento do antigo conceito do exercício de poder existente na Idade Média, no qual “o velho direito de causar ​a morte ou ​deixar ​viver foi substituído por um poder de ​causar ​a vida ou devolver à morte​” (Op. cit., p. 157, ​apud​ FOUCAULT, 1985, p. 130). 50
  • 52. Este novo conceito de biopolítica do poder, ou “biopoder” trata, segundo o autor, da gestão calculada da vida apresentada em duas faces - anatômica e biológica. A primeira “produzindo corpos dóceis politicamente e produtivos economicamente; a segunda tem como objeto o corpo humano como espécie, e visa majorar a vida da população, regulando os processos biológicos” (Op. cit). Entendendo haver no cristianismo uma grande influência aos processos de dominação ideológica ao longo dos séculos, os autores se valem do papel social do pastor como aquele que se compromete com a orientação do rebanho, especialmente no que se refere a sujeitos que aceitam que a verdade de si deve assumir um caráter externo, com reconhecimento da aceitação de uma ordem moral divina e heteronormativa. No que se refere ao ​biopoder sobre os corpos que emergem na modernidade, no entanto, “o pastor não é mais o abade do mosteiro ou o bispo, mas os diversos sacerdotes da saúde do corpo: o médico, o nutricionista, o professor de educação física (...) por deterem os saberes necessários que definem a moral moderna” (Op. cit., p. 161). Reforçam, portanto, que as atividades físicas podem ser pensadas, nesse contexto, como um registro da governabilidade sobre os corpos, “concebidas como um espaço no qual os sujeitos são levados a estabelecerem uma relação com seu corpo, balizada por parâmetros de ordem biomédica que definem um ideal de normalidade, constitutivo de um regime de moralidade (Op. cit, p. 163). Fenômeno que persiste na contemporaneidade ou pós-modernidade, o discurso da ideologia dominante de governo sobre os corpos produzido nas ideias da ​performance corporal e da adequação do corpo a parâmetros de 51
  • 53. beleza corporal considerados desejáveis são, na visão dos autores, duas das suas dimensões centrais. O autor chama a atenção ao uso de ​blogs e redes sociais como confessionários e, e ao mesmo tempo, disseminadores dessa ideologia de governabilidade sobre os corpos, dando o exemplo da jovem C.F. que revela suas experiências desde a fase pré-operatória bariátrica à de recuperação, até que alcançasse a meta desejada, conferida sobre a variável do índice de massa corporal (IMC), que assume o papel de um imperativo moral, fazendo-a “deixar de ser uma mariposa para tornar-se uma borboleta” (Id.). Para Pich, “a enunciação da verdade, neste caso, ganha contornos particulares pelo fato de que o exame de consciência está diretamente relacionado com a realização de exames de cunho biológico que revelam a verdade do corpo” (Op. cit., p. 165). Os autores consideram, assim, que a modernidade se apresenta como um período histórico que limitou seriamente, ou até mesmo impossibilitou, o “cuidado de si” em detrimento dos cuidados com a saúde e que, “salvar-se, ter saúde, passa a ser um problema que tem como horizonte a produção do sujeito como sujeito ético” (Op. cit., p. 170). Para Federici (2015), ainda: “A substituição automática do indivíduo pela condição de doença pela qual está passando e a busca por uma felicidade que estaria escondida logo atrás da esperança da cura final, são confusões constantes que contribuem para que o usuário do sistema de saúde não mais se reconheça em si mesmo ao incorporar o estereótipo do seu diagnóstico” (Op. cit., p. 168). Partindo-se da modernidade à pós-modernidade, este padrão de governo sobre os corpos aprimorou-se a partir da retórica do agito, inflamada pelo discurso auto-suficiente dos cuidados contínuos com a saúde. 52
  • 54. 2.2. A retórica do ​agito Segundo Nahas e Garcia (2010), o interesse da área da Saúde Coletiva com a atividade física ganhou destaque em meados do século XX, quando estudos pioneiros passaram a associar as doenças cardiovasculares ao nível de atividade física no ambiente de trabalho (Op. cit., p. 137). Nos anos 50 e 60 do século passado, além do interesse da medicina nos fatores associados à crescente incidência de doenças cardíacas em países industrializados, “havia na Educação Física um interesse particular na aptidão física relacionada ao desempenho motor, fosse para a competição esportiva ou a preparação militar de jovens” (Id.). Bandmann (2008, p. 3) indica que neste período os esforços se intensificaram para identificar o nível de atividade física praticado por grupos populacionais, sendo o principal foco as atividades físicas realizadas especialmente no domínio da ocupação profissional. Já nos anos 1970, com o argumento da promoção da saúde para todos os povos do mundo, em ressonância ao apelo de uma numa nova ordem econômica internacional, foi realizada pela OMS (Organização Mundial da Saúde) no âmbito da saúde internacional, em 1978, a Conferência de Alma-Ata entre líderes internacionais, na então União Soviética, que resultou na Declaração de Alma-Ata, documento com dez princípios ligados à Atenção Primária à Saúde (APS). Segundo Nahas e Garcia (2010), foi a partir desse período, e especialmente na década de 1980, que os estudos epidemiológicos enfatizaram, na contemporaneidade, a importância de o indivíduo manter-se ativo. Segundo estes autores, “a Educação Física começava a utilizar os conhecimentos e as evidências epidemiológicas em suas práticas, e sua 53
  • 55. vinculação com as questões de saúde pública (e de promoção da saúde) foi fortalecida” (Op. cit., p. 138). Foi ao longo dos anos 1990 que a atividade física foi definida como uma das prioridades da pesquisa em Saúde Coletiva. A inatividade física foi institucionalizada “como um fator de risco primário e independente para doenças cardiovasculares pela American Heart Association - AHA (...), despertando um interesse crescente e multidisciplinar na pesquisa em atividade física e saúde” (Id.). Neste período, também, ao passo que o trabalho tornou-se menos físico e mais intelectual, maior interesse passou a haver nas atividades em tempo livre de lazer, principalmente atividades como esportes e recreação. Nesta ocasião o Brasil contou com os primeiros “levantamentos” de perfis de atividade física em grupos específicos. “O foco passou para as questões que predispõem ou que dificultam as mudanças de hábitos, e os estudos de intervenção ganharam grande destaque (...) em particular da atividade física e hábitos alimentares” (Id.). Já no início século XXI, durante o Congresso Internacional de Atividade Física e Lazer realizado em 2006 em Atlanta (Bandmann, 2008, p. 3) foi confirmado entre seus participantes o interesse de que a medida da intensidade das atividades físicas fosse realizada considerando-se diferentes domínios, surgindo a partir daí um consenso na literatura quanto às quatro principais dimensões da atividade física praticadas, sendo elas: 1) domésticas, como limpar a casa, cuidar do jardim e realizar reparos na casa; 2) ocupacionais, considerando-se, por exemplo, carregar objetos pesados e subir/ descer escadas no local de trabalho; 3) de deslocamento, como caminhar até o supermercado ou ir de bicicleta para o trabalho, e; 4) de lazer, como passear 54
  • 56. com o cachorro, brincar e jogar ativamente e, praticar esportes, ginástica, dança, etc. (PNUD, 2007, p. 70). Pensando exatamente no par binário estilo de vida ativo e sedentarismo, Alex Branco Fraga (2006) realizou uma investigação acerca do discurso físico-sanitário contemporâneo por detrás do “Agita São Paulo” (1996), programa de promoção populacional de atividades físicas, fruto do convênio entre o Centro de Estudos do Laboratório de Aptidão Física de São Caetano do Sul (Celafiscs) e a Secretaria de Saúde do Estado, partindo-se da adoção das recomendações internacionais de atividade física para saúde . O programa foi4 eleito pela OMS, em 2002, como referência nas comemorações do Dia Mundial da Saúde - ​Move for Health​” (Op., p. 4). A “maquinaria do agito”, como denomina o autor, parte da análise de “como se constitui/dissemina/fixa, contemporaneamente, o estilo de vida ativo como objeto de valor pleno na educação dos corpos, na regulação da saúde e no governo de si” (Op. cit., p. 9), diante de uma rede discursiva de informação através da qual ocorre um “processo de ‘glorificação’ do estilo de vida ativo e ‘demonização’ do sedentarismo” (Op. cit., p. 14). De acordo com este autor, o estilo de vida ativo pode ser considerado “uma forma de controle que opera sobre os corpos através de tecnologias de poder destinadas não só a imprimir um determinado modo de conduzir a vida, mas também de regular as múltiplas manifestações do viver” (op. cit., p 19). E estes, por sua vez, “estão visceralmente ligados à propagação dos males provenientes de uma vida sedentária” (Id.). 4 “Acumule trinta minutos ou mais de atividades físicas de intensidade moderada por dia, de forma contínua ou fracionada em dois blocos de quinze minutos ou três de dez, preferencialmente todos os dias da semana” (Op. cit., p. 60, apud PATE, PRATT, BLAIR ​et al.​, 1995). 55
  • 57. É com base num discurso ancorado pelo medo de não salvar-se, segundo o autor, que permeiam as políticas de promoção à saúde, através do enfrentamento ao sedentarismo e do estilo de vida ativo. Chama a atenção, contudo, que “aqui a quantidade de atividade física diária é mais importante do que a maneira como ela é realizada (...) o que importa é contar o tempo e incluir cálculos sobre o consumo energético” (Op. cit., p. 31). Afora a dominância sobre os corpos, o autor chama a atenção que tal fenômeno leva à crescente responsabilização dos sujeitos sobre seus hábitos de vida, “na forma de administrar sua própria saúde, condição física e, principalmente, seu grau de exposição a comportamentos e situações de risco” (Op. cit., p. 39). Esta retórica político-sanitária não leva simplesmente ao governo dos corpos mas, concomitantemente, “amplia as responsabilidades do sujeito na administração de seu próprio bem-estar” (Op. cit., p. 64). Exemplo disso são programas televisivos como ​The Biggest Loser ​(SBT 2005, 2007) e Medida Certa (Rede Globo, 2011-2015), que reforçam esta mensagem. Para Fraga, no entanto, “pouco importa se a mensagem de fato chegará (...), e sim evidenciar o domínio político da circulação da mensagem” (Op. cit., p. 122). Recentes ataques do atual presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, a estética de Brigitte Macron, esposa do presidente francês Emmanuel Macron, revelam, não obstante, a persistência da governabilidade sobre os corpos na pós-modernidade. “Os casos recentes de homens que xingam mulheres mais velhas de feias são típicos de uma mentalidade preconceituosa que associa o envelhecimento feminino à feiura” (GOLDENBERG, 2019, A24). 56
  • 58. 2.3. Principais recomendações para prática de atividade física A inserção da “retórica do agito” enquanto um comportamento habitual na vida das pessoas ganhou magnitude e passou a ser colocada como prioridade na agenda global de saúde pública, tornando-se objeto de algumas das principais campanhas de saúde pelo Brasil e no mundo. No Brasil, em 2011, o Ministério da Saúde lançou o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das DCNT no Brasil 2011-2022 (BRASIL, 2011), que estabelece o aumento da prática de atividades físicas como um dos principais alicerces das intervenções de saúde. Apesar dos benefícios da atividade física relacionados à saúde, Forjaz et. al. ​(2011) lembram, no entanto, que não se pode esquecer haver riscos. Com o objetivo de se tornarem mais ativas, diminuindo o risco de desenvolver DCNT, muitas pessoas (re)iniciaram a prática de atividades físicas, como caminhada e corrida em espaços públicos, como praças e parques, sem que tais práticas sejam necessariamente feitas com a orientação de um profissional apto para realizar uma prescrição de treinamento individualizado, podendo levar ao aumento do risco de acometimento de eventos cardiovasculares agudos, como parada cardíaca ou infarto. Para estes grupo de autores, “para maximizar os benefícios e minimizar os riscos individuais, é importante que os praticantes façam uma avaliação para identificar seu risco e recebam uma prescrição ou, no mínimo, uma orientação sobre a prática adequada” (Op. cit., p. 62), especialmente em se tratando de um indivíduo hipertenso (FECCHIO ​et al.​, 2017). Modesto (2017) acrescenta que a caminhada com orientação e prescrição individualizada, no entanto, tem efeitos positivos mesmo sem supervisão profissional. 57
  • 59. Por esta razão Lima ​et al​. (2014) destacam que apesar de haver um consenso entre as principais instituições de saúde internacionais sobre haver uma ​dose mínima de esforço físico que resulte em benefícios para a saúde​, “as recomendações divergem a respeito da constituição e da administração da dose mínima” (Op. cit., p. 164) - Tabela 2. Tabela 2: Síntese das definições das principais recomendações mundiais para atividade física, 2014 Fonte: Op. cit., p. 166. 2.3.1. Consensos e divergências entre os protocolos internacionais A ​American College of Sports Medicine ​(ACSM), grande organização de associação de medicina esportiva e ciência do exercício sediada nos EUA, oferece uma das diretrizes mais amplamente adotadas em todo o mundo, orientando que indivíduos adultos realizem ao menos 30 minutos de atividade 58
  • 60. física com intensidade moderada pelo menos cinco dias por semana, ou 20 minutos de atividade física de intensidade vigorosa pelo menos três dias por semana, além das atividades da vida diária (HASKELL, 2007, p. 1083). A World Health Organization (WHO) - Organização Mundial da Saúde (OMS) -, por sua vez, endossa a diretriz estadunidense e é, então, também seguida pelo Ministério da Saúde do Brasil. Sua diretriz considerava serem ativos, até 2010, indivíduos que praticassem atividades de intensidade leve ou moderada por pelo menos 30 minutos diários em cinco ou mais dias da semana ou atividades de intensidade vigorosa por pelo menos 20 minutos diários em três ou mais dias da semana. Contudo, de acordo com a atualização de 2010, a OMS orienta adultos à prática de pelo menos 150 minutos acumulados por semana de atividade física moderada ou 75 minutos por semana de atividade física vigorosa, em sessões de pelo menos 10 minutos de duração, sem determinação de frequência semanal (WHO, 2010, p. 26). No que se refere ao ​Institute of Medicine (IOM), atual ​National Academy of Medicine​, Lima ​et al. ​(2014, p. 165) lembram que embora este não represente a recomendação oficial dos Estados Unidos, o IOM influencia o aconselhamento e as decisões da comunidade médica naquele país. Sendo assim, o IOM recomenda, para adultos, a realização de 60 minutos de atividade física moderada todos os dias da semana ou 30 minutos de atividade vigorosa diária (IOM, 2004, p. 880). De fato, quando se trata de adultos com 65 anos ou mais, a recomendação da OMS de 2010 coincide com a diretriz do IOM. Assim, de modo que obtenham ​benefícios adicionais à saúde, adultos com idade igual ou superior a 65 anos devem aumentar sua atividade física aeróbica de intensidade moderada para 300 minutos por semana, ou praticar 150 minutos de atividade física aeróbica por semana, ou, ainda, uma combinação 59
  • 61. equivalente de atividade física de intensidade moderada e vigorosa (WHO, 2010, p. 31). No que toca à diretriz da União Europeia (UE) de 2008, destinada aos então 27 Estados-Membros que formavam o bloco, à época, a orientação para adultos saudáveis é de que praticassem pelo menos 30 minutos diários de atividade física moderada, seguindo a recomendação oferecida pela OMS, especialmente à anterior ao ano 2010. Finalmente, o Comitê Consultivo do ​International Physical Activity Questionnaire ​(Questionário Internacional de Atividade Física, IPAQ), consultado em 2005, definiu como padrão mínimo realizar um dos três seguintes conjuntos de alternativas: a) pelo menos 20 minutos por dia de atividade física vigorosa durante três ou mais dias por semana; b) pelo menos 30 minutos por dia de atividade física moderada durante cinco ou mais dias por semana ou; c) qualquer combinação de esforço moderado e vigoroso, desde que atinja o mínimo de 600 MET-minutos por semana (IPAQ, 2004, p. 6). A partir desta concordância de entendimento sobre a importância de garantir uma dose mínima de esforço físico necessário associado aos benefícios com a saúde, considerando-se tipologia da atividade, frequência semanal, duração da sessão e intensidade do esforço, torna-se igualmente importante compreender, então, como tais informações são detectadas, especialmente no que toca à variável “intensidade” associada aos diversos tipos de atividades físicas praticadas. 2.3.2. Determinações sobre a intensidade de realização da prática Frente ao consenso entre as diretrizes das principais instituições de saúde internacionais de que há intensidades apropriadas para a realização das 60
  • 62. atividades físicas diárias e semanais em quantidades mínimas, podendo ser estas intensidades moderada, ou vigorosa, ou uma combinação entre estas, torna-se fundamental recorrer ao entendimento sobre o que vem a ser cada uma delas e como identificá-las. McArdle ​et al (1998) indicaram as principais variáveis existentes para medir a intensidade relativa dos exercícios, destacando-se: percentual do VO​2​máx; frequência cardíaca; escala de percepção subjetiva de esforço (PSE), e; % 1RM (Op. cit.). Aprofundando este entendimento, Garder ​et al​. (2011) enfatizam que “a intensidade do exercício é um importante determinante das respostas fisiológicas ao treinamento físico” (Op. cit, p. 1339-40), contribuindo com a formulação das recomendações para classificação das intensidades dos exercícios físicos praticados para a melhoria da capacidade cardiorrespiratória e controle dos fatores de risco de doenças cardiometabólicas (Op. cit., p., 1341) - Tabela 3. Tabela 3: Classificação da intensidade do exercício: intensidade absoluta e relativa do exercício para exercício resistido e capacidade cardiorrespiratória Fonte: Id. 61
  • 63. A partir de uma escala que varia das intensidades muito leve, leve, moderada, vigorosa e, perto da máxima à máxima, é possível traçar uma correspondência, a partir da tabela apresentada por Garder ​et al​., entre a variável utilizada para medir a intensidade relativa dos exercícios e a intensidade do esforço realizado. Assim, o VO​2 ​representa a quantidade (taxa) do metabolismo aeróbio do organismo, podendo ser medido diretamente (ergoespirometria) e indiretamente (ex.: teste ergométrico, banco, cooper 12min) tanto no repouso (taxa metabólica basal = ~ 3,5 mL O​2​/ Kg/ min), como durante o exercício. Sua medida é representada pelo consumo de Oxigênio (O​2​) ou gasto energético do organismo durante determinado período de tempo. Sendo assim, as formas de expressar o VO​2 ​são representadas pelo VO​2 ​absoluto (L O​2​/ min) e VO​2 ​relativo (ml O​2 ​/ Kg/ min) (Id.) O pico de consumo O​2 durante um exercício físico é denominado VO​2​máx e seu percentual é definido, então, como a intensidade relativa do exercício, isto é o nível de estresse do exercício gerado ao organismo. Em outras palavras, sendo o VO​2​máx a capacidade máxima de consumo de O​2 pelo metabolismo aeróbio durante a atividade física praticada por um indivíduo, o percentual do VO​2​máx corresponde à intensidade do exercício em percentual da capacidade aeróbia máxima individual. O percentual de VO​2​máx é, por isso, a principal determinante do nível das adaptações bioquímicas e fisiológicas ao exercício físico. Uma forma considerada absoluta de medida da intensidade do esforço do exercício corresponde ao equivalente metabólico (MET), que consiste do múltiplo da taxa metabólica basal (TMB) para uma dada atividade e seu correspondente esforço. Sendo assim, quando se exprime o gasto de energia 62
  • 64. em METs, representa-se, então, o número de vezes pelo qual o metabolismo de repouso foi multiplicado durante uma atividade. Farinatti (2003) realizou a apresentação da versão em português do compêndio de atividades físicas em METs. Além destas, a medida da frequência cardíaca também possibilita inferir a intensidade de realização do exercício. Após estimação ou medição da frequência cardíaca máxima, o seu percentual (%) corresponde ao esforço empregado pelo indivíduo na respectiva tarefa motora. Em geral, as principais maneiras de prescrever a intensidade por frequência cardíaca são por percentual da frequência cardíaca máxima e percentual da frequência cardíaca de reserva, esta última que leva em conta a frequência cardíaca de repouso do sujeito e que, ao gerar maior acerto para estimar a carga de trabalho cardíaco, torna-se individualizada. A Percepção Subjetiva do Esforço (PSE), por sua vez, consiste da percepção do indivíduo quanto à intensidade do esforço realizado na tarefa motora, determinando as intensidades através de números. A principal delas é a Tabela de Borg (1990), que varia de uma escala de 6 a 20 pontos ou 0 a 10 pontos (versão mais recente), sendo 6, ou zero (nova versão) muito fácil e 20, ou 10 (nova versão), exaustivo. Sendo especialmente utilizada no treinamento aeróbio, seu uso apresenta relação direta com a frequência cardíaca, consumo de oxigênio (VO2) e ponto máximo de oxidação de gordura. Sua principal vantagem é a praticidade, usabilidade, e eficiência ao que se propõe. Mais utilizada para prescrição de exercícios anaeróbios, como o treinamento de força, a técnica de determinação de uma repetição máxima (1RM) é considerada padrão-ouro para indicação da intensidade do exercício de força resistida. Sendo 1RM, portanto, a quantidade máxima de peso que 63
  • 65. pode ser levantada em uma repetição, o percentual (%) de 1RM consiste da medida de intensidade relativa associada à intensidade do esforço realizado. Compreendido haver alguns dos instrumentos para medir de forma direta e indireta a intensidade das atividades físicas e sabendo-se da importância de garantir uma dose mínima de esforço físico para que se obtenha benefícios com a saúde, segundo as recomendações dos principais organismos de Saúde internacionais, considerando-se tipo, frequência, duração e intensidade das atividades físicas praticadas, torna-se importante, em seguida, realizar a medição e o monitoramento do esforço, ou volume total realizado, no intuito de verificar sua efetividade, através do uso de instrumentos de medida do nível da atividade física. 2.3.3. Instrumentos de medida da atividade física Diante dos esforços epidemiológicos feitos para incentivar e promover a prática de atividades físicas como forma de diminuir riscos para saúde, tornou-se importante a existência e utilização de instrumentos precisos e adequados para medir e avaliar o nível de atividade física praticado por indivíduos. Cafruni ​et al ​(2012), realizaram a revisão de diferentes métodos e instrumentos identificados nas bases Medline/PubMed, SciELO, BioMed Central e Sport Discus para realizar ​medidas do nível de atividade física​, entre os quais: água duplamente marcada, observação direta, calorimetria indireta, monitores cardíacos e sensores de movimentos (métodos objetivos); e questionários e diários (métodos subjetivos) - Tabela 4. 64
  • 66. Tabela 4: Vantagens e desvantagens dos métodos de medida de atividade física Fonte: Op. cit., p. 68. De acordo com os autores, a água duplamente marcada (ADM) é um método padrão-ouro que serve para estimar o gasto energético total (GET), especialmente em pesquisa de campo. Sua técnica consiste da ingestão de uma dose de água marcada com deutério (H​2​ ) e oxigênio (O​18​ ): o H​2 é eliminado como água e o O​18 é eliminado como água e dióxido de carbono (CO​2​), sendo 65
  • 67. possível, daí, conhecer o GET por meio da equação de “Weir”, onde GET = (3,044 * quociente respiratório + 1,104) taxa do fluxo de CO​2​. Embora preciso para medir o GET e adequado para todas as faixas etárias, as desvantagens da técnica da ADM incidem sobre o alto custo para a sua realização, à complexidade de aplicação do teste e, sobretudo, à falta de informações sobre o tipo da atividade física praticada, a frequência, a duração da prática e sua intensidade. A calorimetria indireta, juntamente com ADM, é considerada uma técnica padrão-ouro para avaliação do nível de atividade física praticado por indivíduos. Neste método, o sujeito utiliza uma máscara para captar a troca gasosa e o gasto energético (GE) é obtido através do consumo de O​2 e da produção de CO​2​. Entre suas vantagens, a introdução de equipamentos portáteis têm permitido seu uso em condições mais naturais, possibilitando a medição do GE da atividade física em ambientes não controlados, embora o aparelho seja caro, incômodo e limite a duração do seu uso por tempo prolongado, impossibilitando medir a atividade física habitual. Com relação aos frequencímetros ou monitores cardíacos, consistem de aparelhos eletrônicos que atualmente são amplamente utilizados para o monitoramento da frequência cardíaca (FC), variável que permite definir a intensidade de exercícios físicos durante as fases de repouso, execução do exercício e recuperação, sendo sua unidade expressa em batimentos por minuto (bpm) (Op. cit., p. 65). Com a popularização desse instrumento para população, seu custo caiu expressivamente, não sendo, por isso, um empecilho para seu uso em estudos epidemiológicos. Cafruni ​et al. ​consideram que o monitoramento da FC é útil para coletar dados sobre nível individual de atividade física, apresentando resultados 66
  • 68. razoáveis de validade e reprodutibilidade para estimativa do GE. No entanto, o método apresenta limitações, pois pode ser afetado por temperatura, medicamentos, emoção e condicionamento físico, além de não registrar informações sobre contexto da atividade física que está sendo executada, e de não ser o melhor método para medir atividades físicas leves, bem como em crianças, devido à natureza esporádica das atividades físicas realizadas por essa população. Apesar disso, esse instrumento é eficiente para avaliar atividades físicas moderadas e intensas (Id.). Pedômetro e acelerômetro são considerados sensores de movimento que, diferentemente dos monitores cardíacos, têm a função de captar o movimento ou a aceleração de um membro ou do tronco, dependendo da parte do corpo onde é colocado. Enquanto a capacidade dos pedômetros está reduzida a medir a quantidade de passos diários, os acelerômetros são dispositivos que medem a aceleração e a desaceleração dos movimentos em um, dois ou três planos. Apesar do baixo custo, precisão para medir o número de passos e registro total da atividade física, o pedômetro não é capaz de medir a intensidade da atividade física, já que se limita à medição apenas em algumas delas. Já o acelerômetro, embora meça atividade física total, intensidade e tempo, apresenta complexidade para interpretação dos seus dados, maior custo e impossibilidade para captação de determinadas atividades físicas, como atividades isométricas, trabalho de força muscular, caminhadas na esteira, remo ou patinação, podendo por isso subestimar a atividade física. A observação direta, por sua vez, é um procedimento no qual os sujeitos são observados em diferentes contextos e ambientes, especialmente não controlados, permitindo um fornecimento de dados sobre a atividade realizada. 67
  • 69. Para os autores, “ao se conseguirem informações sobre o tipo de atividade, onde, como e quando ela ocorre, este método acaba superando os demais e se torna útil na medida em que ajuda a responder a questões sobre como o ambiente físico e social pode influenciar a prática da AF” (Id.). Em contrapartida, apesar do alto custo de contratação de observadores, esta técnica não permite a observação da atividade física habitual, uma vez que não é possível acompanhar um sujeito por um dia todo, ou dias. Por último, os questionários e diários correspondem a métodos classificados como subjetivos, baseados em informações fornecidas pelos sujeitos, que registram ou informam dados sobre sua participação ou realização em atividades físicas durante um período de tempo, e cujo recordatório pode variar entre uma semana a um ano. No caso dos diários, eles são utilizados como forma de registro. Já os questionários são compostos por perguntas que podem ser respondidas pelo formato de autoavaliação ou entrevista. Estes métodos são largamente adotados em pesquisas epidemiológicas devido ao baixo custo e boa aceitabilidade por parte dos sujeitos, além de fornecer informações sobre a realização de atividades físicas habituais. No entanto, de todos os métodos, são os que possuem menor precisão para medir a atividade física (Op. cit., p. 67). Frente à variedade de instrumentos existentes, os autores destacam que a seleção dos métodos de medida deve ser feita conforme aquilo que se deseja analisar, a depender do tipo de ambiente, faixa etária, disponibilidade de recursos e diferenças étnicas e culturais existentes entre povos e países. Ressaltam também que todos eles apresentam algum tipo de limitação quanto a sua capacidade de medir o tipo, a frequência, a duração e, principalmente, a intensidade da atividade física (CAFRUNI ​et al​, 2012, p. 62). Mais difícil, no 68
  • 70. entanto, é que a aplicação de cada um deles apresenta diferentes unidades de medida, dificultando o estabelecimento de equivalência entre eles (Id.), bem como de comparações entre estudos da mesma natureza. Para os autores, “nenhum dos métodos pode ser considerado suficiente a ponto de descartar os demais e, por isso, a combinação de mais de um método pode resultar em uma melhor avaliação da AF” (Op. cit., p. 68). 2.3.4. Questionários de medida de atividade física: limitações ao uso Considerado um instrumento de mais fácil aplicação e baixo custo para medição do nível de atividade física em grandes populações, os questionários de atividade física podem ser realizados na forma de entrevistas baseadas em inquéritos presenciais em campo ou telefônicos, ou auto-avaliações/ autopreenchimento individual ou à distância, sendo os dados obtidos usados, principalmente, em ações de intervenção populacional assistida, além de compor recomendações de atividades físicas (BANDMANN, 2008, p. 3). Os primeiros questionários de atividade física datam dos anos 1950, tendo como foco atividades de ocupação profissional. A partir das décadas seguintes, ao ponto que o trabalho tornou-se menos físico, maior interesse passou a haver nas atividades em tempo livre de lazer, principalmente atividades como esportes e recreação. Já nos anos 2000, com a popularização dos estudos científicos sobre os benefícios da atividade física para a Saúde, reforçou-se também a importância das atividades físicas de menor intensidade, como caminhada, jardinagem e tarefas domésticas, que anteriormente não eram consideradas como “exercício”. Em 2006, durante o Congresso Internacional de Atividade Física e Lazer, realizado nos EUA, definiu-se o interesse de que a intensidade das 69
  • 71. atividades físicas fossem medidas por diferentes domínios, sendo assim, doméstico, laboral, deslocamento e lazer. Estima-se haver cerca de ao menos uma centena de questionários de atividade física oficialmente validados para a finalidade a que se propõem (NCI, online​), os quais distinguem-se em tamanho - sendo alguns deles curtos e outros mais longos -, em temporalidade - alguns utilizando período recordatório de uma semana e, outros, de um ano -, e em pontuação - com escores dimensionados em minutos, equivalente metabólico (MET), ou em pontuação adimensional com unidades arbitrárias. De acordo com Bandmann, devido a essas diferenças, a confiabilidade e a validade destes questionários não é dependente dessas variáveis mas, especialmente, da construção lógica que norteia a construção das questões ali presentes, que devem mirar especificamente os domínios da atividade física nos quais as pessoas realmente realizam suas atividades e incluindo, possivelmente, até mesmo os jargões específicos que são utilizados para aquela atividade física (Id.). A forma mais comum de testar a confiabilidade dos questionários de atividade física, isto é, a reprodutibilidade de uma medida em diferentes testes realizados com o mesmo sujeito, ocorre, em geral, de acordo com a autora, pela aplicação do método teste-reteste, sendo o tempo de realização entre os testes um aspecto de influência sobre o resultado, já que neste ínterim pode haver variações em relação ao próprio sujeito da amostra, ou somatória de todos os participantes. Por isso, os questionários de atividade física costumam apresentar maior correlação no curto do que no longo prazo. A autora destaca que a maioria dos estudos reportou haver boa ou muito boa confiabilidade na maior parte dos questionários, através da correlação apresentada na realização do teste-reteste (Id.). 70
  • 72. Diferentemente da confiabilidade, a validade do teste diz respeito, por sua vez, à precisão da medida do instrumento a partir da comparação com um outro instrumento que corresponda ao padrão-ouro (Id.). No caso dos questionários de atividade física, os instrumentos mais utilizados para realizar esta correlação são o acelerômetro e o VO​2​máx (Tabela 5). Tabela 5: Coeficientes de correlação ajustados para sexo/idade entre diversos questionários de atividade física e oito domínios de validação. Fonte: JACOBS, 1993, p.89. 71
  • 73. Além destes, Jacobs (1993, p.89) tratou de validar uma seleção de questionários de atividade física também baseado em diários de quatro semanas, no entanto, assim como verificou Bandmann, diferentemente da confiabilidade do teste, a maioria das pesquisas reportaram que sua validade apresenta correlação linear variando de baixa a média. Para enfatizar esta análise, o anexo 1 da presente pesquisa corresponde a uma síntese elaborada pelo autor sobre as informações de alguns dos principais questionários de atividade física selecionados a partir de destacadas referências da literatura científica e que, consequentemente, são os mais largamente utilizados, sendo eles: ​3-Day Physical Activity Recall (3DPAR) - Bouchard; Questionário de atividade física habitual de Baecke; Questionário de atividade física de tempo de lazer de Godin-Shephard; IPAQ - versão curta; IPAQ - versão longa (dimensão lazer), e; Tópico Atividades Físicas do questionário da Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), do Ministério da Saúde. O ​3-Day Physical Activity Recall (3DPAR) (Anexo 2) foi elaborado por Bouchard (CITAR REF BIBLIOGRÁFICAS), em 1983, no Canadá, e é destinado a sujeitos entre 10 e 50 anos de idade. O questionário apresenta formato de autoavaliação com questões que estratificam as atividades físicas realizadas por seus diferentes domínios (refeições; atividades físicas laborais; atividades físicas de lazer e locomoção; atividades físicas de deslocamento; atividades físicas escolares, e; esportes). Pavlidou ​et al (2011) realizaram a validação do instrumento ante ao uso de acelerômetro colocado em crianças gregas, obtendo 44% de correlação entre eles. Para preenchê-lo, os participantes são levados a compreender por meio de ilustrações as diferenças existentes em cada tipo de intensidade de 72
  • 74. prática (leve, moderada, difícil e muito difícil) e, depois, informar em um recordatório de três dias (sendo um deles obrigatoriamente no fim de semana), dividido por blocos de 30 minutos, as atividades físicas (entre as listadas) e suas respectivas intensidades. Embora eficiente para estimar a energia gasta diariamente em MET em um recordatório minucioso, a desvantagem do 3DPAR diz respeito ao tempo necessário para o seu preenchimento, em torno de 30 minutos, assim como da variância da medida em MET relacionada a diferentes perfis populacionais. O questionário de atividade física habitual de Baecke (Anexo 3), de 1982, também carrega o formato de autoavaliação. Embora com questões similarmente separadas por dimensão da atividade física - atividades físicas ocupacionais (AFO); exercícios físicos no lazer (EFL), e; atividades físicas de lazer e locomoção (AFLL), este questionário apresenta a particularidade do seu recordatório levar em consideração os últimos 12 meses de atividade física habitual. Sua validação foi proposta por Bandmann (2008) e Florindo ​et al. (2013), quando obtiveram índices de correlação linear, respectivamente, de r=0,07-0,16 e r = 0,36-0,54. Seu preenchimento se dá a partir de um questionário curto, contendo 12 questões, que são brevemente respondidas (em torno de cinco minutos). Apesar de validado, esse questionário está sujeito a maiores vieses de memória, por conta do maior período a ser recordado, além de carregar certa subjetividade nas respostas para as escalas nominais (ex. "nunca", "raramente", "algumas vezes", "frequentemente" e "muito frequentemente"). O uso da fórmula para determinação do escore adimensional utilizado também não é de fácil compreensão, dificultando a assimilação do resultado apresentado pela ferramenta. Soma-se a isso o fato de os escores 73
  • 75. adimensionais não serem validados para obter as quantidades absolutas de prática dos indivíduos, ou seja, da magnitude absoluta da prática habitual em atividade física para estudos de intervenção populacional, mas sim um indicador a ser monitorado de tempos em tempos. Ainda do mesmo período (1985) advém o questionário de atividade física de tempo de lazer de Godin-Shephard (Anexo 4). Utilizado com participantes entre 18 e 65 anos de idade, este questionário constitui-se também em formato de autoavaliação, porém, diferentemente dos demais, está especificamente orientado para a dimensão da atividade física de lazer. O questionário destaca-se, também, quanto ao tempo do recordatório, que trata de uma ​semana usual de sete dias sem especificar o período. Além disso, é um dos únicos a estruturar a validação da informação sobre a frequência ​semanal (e não apenas duração e intensidade) de realização de atividades físicas em intensidade moderada a vigorosa por meio da reprodutibilidade da questão sobre a frequência de suor. Favorecido por possuir apenas duas questões que podem ser respondidas em cerca de 90 segundos, este questionário recebeu validações aceitáveis ​por acelerometria (r = 0,32 - score) e (r = 0,31 - suor); VO​2​max (r = 0,56 - score) e (r = 0,57 - suor), e; diário de anotações de quatro semanas (r = 0,52 - suor). Bandmann (2008) destaca, no entanto, que o coeficiente linear de teste-reteste mostrou-se pouco significativo para atividades leves (r = 0,24) e moderadas (r = 0,36), embora fortemente significativo para atividades intensas (r=0,84). Ademais, em se tratando de escores adimensionais, os resultados não levam a quantidades absolutas da prática dos indivíduos. A​s freqüências semanais de atividades extenuantes, moderadas e leves foram multiplicadas 74
  • 76. por nove, cinco e três, respectivamente, sendo a atividade semanal total de lazer calculada em unidades arbitrárias pela soma dos produtos dos componentes separados. Produto de uma reunião de especialistas convidados pela OMS e pautado em uma nova compreensão sobre os benefícios de atividades físicas de mais baixas intensidades à saúde, como atividades físicas domésticas, caminhada a passeio, entre outras, o ​International Physical Activity Questionnaire ​(IPAQ), versão curta (Anexo 5), consiste de um questionário de atividade física contendo nove itens sobre atividade física sem dimensão especificada, nas quais os participantes preenchem informações sobre tipo, frequência e duração das atividades realizadas por diferentes intensidades. Baseado no recordatório dos últimos sete dias, o questionário é recomendado a indivíduos com faixa etária entre 18 e 65 anos de idade. Apesar da baixa correlação (r = 0,30), este questionário foi validado contra acelerômetro nos formatos entrevista e autoavaliação. E além de levar poucos minutos para ser respondido (aproximadamente quatro minutos), destaca-se por apresentar em seu resultado informações com quantidades absolutas de prática dos indivíduos, comparáveis com as normas internacionais. Embora possibilite que os sujeitos sejam classificados por nível de atividade física praticado, ao passo que desconsidera possíveis variações sazonais da prática, o IPAQ não pode ser considerado, assim, um medidor de atividade física habitual. Ademais, "recente revisão bibliográfica identificou que o instrumento superestimou a atividade física quando comparado com mensurações objetivas e que o instrumento foi um indicador relativo ou absoluto fraco de atividade física" (FLORINDO ​et al​, 2013, p. 318-27). 75
  • 77. Já o uso da versão longa do IPAQ (Anexo 6) ganhou força, no entanto, a partir do interesse de identificar o nível de prática por diferentes dimensões da atividade física. Esta versão consiste em 31 itens similares aos da versão curta, porém, distribuídos em diferentes dimensões de atividade física: atividade física no trabalho; atividade física como meio de transporte; atividade física em casa e; atividades físicas de recreação, esporte, exercício e de lazer. Também pautado no recordatório dos últimos sete dias e apresentando a quantidade total do tempo, em minutos, do esforço realizado na última semana, com o somatório das atividades feitas realizadas por ao menos dez minutos contínuos, possibilitando a comparação com as normas internacionais, esta versão do IPAQ foi apenas validada para o formato entrevista. Bandamann (2008) apresentou correlação linear ante acelerômetro de r = 0,33, assim como Florindo ​et al. ​(2013), r = 0,34. Esta autores consideram que o “módulos de lazer e deslocamento da versão longa do IPAQ apresentaram evidências de validade adequada na comparação com acelerometria” (Id). Dessa forma, os autores consideram que a versão longa do IPAQ apresenta-se como uma ​“alternativa mais adequada em relação à versão curta e também em relação aos domínios do trabalho e das atividades domésticas, os quais são mais complexos de mensurar e são os dois domínios em que as pessoas tendem mais a superestimar a atividade física praticada” (Id.; Hallal, 2010). Hallal ​et al​. (2010, p. 262) consideram, ainda, que os módulos de lazer e deslocamento do IPAQ são os mais relevantes para a categorização dos níveis populacionais de atividade física e para orientar políticas públicas e programas de saúde. Além de rápido para ser respondido, o IPAQ (versão longa) é internacionalmente comparável, tendo sido validado em 2000 em 12 países, 76