O documento discute a construção histórica do conceito de juventude e adolescência ao longo dos séculos. Apresenta como diferentes sociedades lidaram com a transição entre a infância e a vida adulta, destacando a preocupação constante em regular e dar sentido ao papel dos jovens. Também analisa a evolução do tratamento dispensado às crianças e adolescentes, especialmente os mais pobres, pelas instituições sociais ao longo do tempo.
2. Como as sociedades criaram e lidaram com essa
passagem transitória de seus membros?
Por que a definição de um faixa etária
denominada adolescência?
Seria realmente a juventude uma fase de
conflitos, traumas, contestação e indisciplina?
No decorrer da história, percebe-se uma
contínua preocupação social com aqueles que
deixam a condição de dependência infantil para
ingressarem no mundo das responsabilidades
adultas, sejam elas de ordem política, sexual,
intelectual e de cidadania
3. Não existe uma categoria juventude universalizante e
naturalizada no decorrer da história, ou seja, o ideal de
adolescência enquanto essência e condição humana
consiste numa construção que foi continuamente
reformulada – pluralidade de manifestações da condição
jovem no tempo
No entanto, uma constante preocupação da sociedade em
atribuir sentidos simbólicos e regular a ordem,
questionando-se sobre o que fazer com os jovens.
Ou seja, os jovens sempre foram objeto de atenção
ambivalente das sociedades, despertando sentimentos de
cautela, atração, desconfiança e expectativas
4. Ênfase nos RITOS DE PASSAGEM
PROVAÇÕES: elementos simbólicos que
marcam o pertencimento à comunidade no
mundo da produção e da ordem social
Não existe diferenciação de fases: desde
crianças exercem atividades junto com os
adultos, dentro de suas possibilidades
Papéis sociais bem delimitados dentro da
organização das tribos
5. Ênfase na aprendizagem militar
Grécia: Educação vista pela ética e estética
Canalização da agressividade pela prática de
esportes e pela educação para a guerra
Temor da barbárie dos jovens: manutenção do
patriarcado
Império Romano: adolescentia 15 aos 30 anos e
juventos 30 aos 45.
Envergatura da tora viril: exercício inicial da
cidadania que somente era cumprida com a
morte do pai – dominação e ambiguidade
canalizada no treinamento
6. Bacheler – transição profissional (sem feudo) e afetiva
(solteiro) - Construção de família, compra de feudo
garante a inserção social
Registros de preocupação com os grupos de jovens
baderneiros – fragilidade da alma e da razão,
necessitando de orientação religiosa
Festas barulhentas, sexualidade, desordem e excessos
diversos:Transgressão que incomoda e preocupa o
social
CAVALARIA – canalização da agressividade dos jovens
– proteção da propriedade – servidão e fidelidade ao
rei e a comunidade – internalização da lei -Valores:
honra, coragem, solidariedade, fidelidade
Amor Cortês exaltado como platônico e irrealizável
7. Contestação da ordem social por meio de
formação e ação em grupos
URBANIZAÇÃO/INDIVIDUALIZAÇÃO
Atos sociais transgressores: furtos, depredações,
contestações, protestos
Dispositivos sociais de regulação da ordem e
canalização dos impulsos destrutivos:
Charivari (humilhação dos infratores)
Carnaval: tumulto, desordem e caos tolerado
nas festas comunitárias
8. Rigidez de costumes na educação de jovens nas famílias
aristocráticas: enobrecimento, refinamento dos costumes
e docilização
Casamentos contratuais e submissão a ordem paterna
Sec. XVIII: Individualização e reconhecimento de sua
singularidade no contexto social – discussão ampla sobre o
destino dos jovens: educação, trabalho e serviço militar –
saem da família e invadem as ruas – intervenção do Estado
ESCOLA se torna destino social privilegiado para os jovens
– educação MORAL e CÍVICA – ênfase na disciplina e na
rigidez como forma de inserir os cidadãos na ordem social
– diferenças entre o propósito educacional da burguesia e
da classe proletária
9. Destino dos jovens de classes populares:TRABALHO
– educação para a exploração do trabalho na indústria
– família repressora e controladora
Liberdade: ida as ruas e cidades – surgem os
delinquentes juvenis com seus grupos e trajes
estranhos – vagabundos, baderneiros, libertinos e
contestadores
Outro destino: SERVIÇO MILITAR: rito de passagem
obrigatório para o adulto homem entrar na ordem
social – emancipação, crescimento, autonomia,
separação da família, virilidade, força e orgulho em
prol da Ordem Nacional – Guerras: os pobres eram
convocados, poupando os ricos
10. Período pós guerras: surge a ADOLESCENCIA
reconhecida como fase do desenvolvimento
Dispositivos legais e sociais na forma de
pesquisas, programas e sanções jurídicas para o
cuidado da juventude – reabilitar e tratar os
jovens naturalmente transgressores
Século XX: CULTURAADOLESCENTE –
surgimento das tribos – espaços para encontros
e códigos culturais/grupais específicos – grupo
mais forte que a família ou religião
Insegurança contemporânea com a juventude:
falta de limites, permissividade, violência,
consumismo, falência da autoridade
11. Séc. XIX: até esse momento, a instabilidade populacional, a baixa
expectativa de vida e a resistência dos portugueses em
estabelecer laços familiares sólidos com a terra colonial explorada
dificultaram a produção de registros que revelassem
historicamente a preocupação social no cuidado com as crianças e
adolescentes.
Infância: um momento de transição para assumir
responsabilidades adultas, considerado de pouca importância,
cujo cuidado e responsabilidade ao nível educacional era exercido
pelas ordens religiosas da época.
Em termos assistenciais, foi também a Igreja que se
responsabilizou em acolher as crianças “abandonadas” em
orfanatos e asilos: “filhos do pecado”.
No período colonial, a desobediência e os pecados das crianças
eram corrigidos com punições físicas, revelando a violência no
trato pedagógico, tanto a nível familiar quanto institucional.
12. Atenção especializada para as crianças de elite, com a crescente formação
de famílias no território brasileiro, tanto no que se refere à consolidação da
sociedade existente, quanto à vinda crescente de famílias européias para
estabelecer residência nas cidades em acelerado processo de urbanização.
As crianças eram vistas como pessoas sem juízo, irrequietas, que devem
ser disciplinadas com rigor para assumirem condutas adultas aceitáveis
pelo bom gosto, ou etiqueta nobre de vida, imobilizando a capacidade
criativa e espontaneidade.
A preocupação com a consciência, no sentido de discernimento, dos atos
das crianças e adolescentes tem sido um eixo central de debates durante os
séculos XIX e XX.A infância é reconhecida como fase de desenvolvimento
peculiar: ideal evolucionista, positivista, repercute numa preocupação
pública/estatal com o futuro da nação.
A concepção higienista e saneadora da sociedade atua diretamente sobre o
poder privado, as famílias sofrem intervenções médicas e sociais com vistas
à orientação, saúde e disciplina infantil.
Brasil que está se consolidando enquanto pátria, tentando configurar uma
identidade própria, no momento da realização do anseio emancipatório de
Portugal.
13. A abolição da escravatura agrava os contrastes sociais no fim do
séc. XIX, com a grande quantidade de famílias que se encontravam
em condições desfavoráveis, marginalizadas. A falta de um
mercado que assimilasse os escravos recém libertos deixava-os
em um estado de pobreza difícil de ser superado - RUAS
Ambivalência social no tocante às crianças pobres, as quais eram
consideradas desprotegidas, abandonadas, em condições moral e
material. Surge, nesse período, a descoberta do menor como uma
designação, uma categoria social que está associada à criança e ao
adolescente pobres.
O menor era considerado ora como vítima de uma família
desestruturada que o abandonou à própria sorte e que deve ser
amparado por medidas assistenciais (concepção humanista de
bondade natural e vitimização); ora como perigoso, delinqüente,
uma ameaça à ordem social (concepção da maldade natural e
patologia existente nas camadas desfavorecidas – individualismo).
14. Famílias pobres foram vigiadas, observadas, policiadas – projeção
social das angústias decorrentes da urbanização desordenada
Estado: medidas legais e educativas para os jovens abandonados e
delinqüentes, em instituições caracterizadas por elementos
combinados de escola, fábrica e prisão. O trabalho infantil era
considerado uma forma de combater a ociosidade, o vício – condição
propícia para a criminalidade e desordem.
Diversos dispositivos jurídicos foram elaborados e continuamente
rediscutidos no tocante à situação de responsabilidade legal do
menor, como também de regulamentação de sua força de trabalho.
Preocupação com a responsabilidade penal dos menores e as medidas
corretivas / disciplinares necessárias de punição para a marginalidade.
Séc. XX marca uma progressão nas idéias sobre a menoridade, com os
primeiros projetos de lei, discutidos nos poderes legislativo e
judiciário, voltados para a assistência e defesa do direito dos menores,
numa tentativa de redirecionar ações antes repressivas e policiais para
medidas educativas de prevenção e tratamento dos jovens pobres
15. Criação da Primeira Lei de Menores
Planos e programas públicos direcionados a solucionar o
problema. Dentre eles, destacamos a criação do Serviço de
Assistência aos Menores (SAM), que posteriormente evoluiu
para a FUNABEM (Fundação Nacional de Bem Estar do
Menor) e FEBEM (Fundação Estadual do Bem Estar do
Menor).
Ótica assistencialista de transformação da personalidade
individual do jovem, que se encontrava num meio
desfavorável para o seu desenvolvimento. A pobreza, em
um sentido causa e efeito, geraria as condutas anti-sociais e
transgressoras.
Cabia ao Estado receptar esses jovens, formá-los, isolá-los,
discipliná-los, puni-los e, se for o caso, reintegrá-los à
sociedade, mas sem ocupar cargos privilegiados dentro do
mercado, reproduzindo assim o ciclo social da exclusão.
16. Exacerbação do nacionalismo, educação moral e amor à pátria.
Ressalta-se o mito do brasileiro dócil, hospitaleiro e democrático, de
forma a considerar todas as formas de contraposição à ordem vigente
como transgressões graves a serem duramente combatidas.
Rebeliões jovens são perigosas, os movimentos de contracultura
submetem-se a censuras e batalhas sociais travam-se nas ruas entre a
polícia e o movimento estudantil.
A juventude, enquanto categoria, evidencia-se no cenário cultural
brasileiro. Pela primeira vez na história nacional, jovens de classe
privilegiada ousam dirigir ações de contraposição à ordem vigente. A
esses “rebeldes sem causa” cabe uma intervenção no sentido de
compreender, investigar o motivo de suas “revoltas”; assim surgem as
diversas pesquisas que tentam dar conta da “instabilidade, turbulência,
insegurança e transitoriedade” dos jovens
Aos jovens pobres, ainda cabia a política de repressão de suas
tendências naturalmente agressivas, mais ainda em uma idade na qual
o discernimento de seus atos é considerado como consolidado
17. Anos 80: Movimentos sociais diversos, articulando diversas
instituições e grupos de defesa dos direitos das crianças e
adolescentes - série de discussões, eventos e documentos que
culminaram, inicialmente em dois capítulos sobre os direitos das
crianças e adolescentes na Constituição Federal de 1988, e
posteriormente na promulgação do Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA) como lei magna de regulação da situação
social, familiar, política, de saúde, educacional, de trabalho e
jurídica dos jovens brasileiros
Medidas educativas, levando em consideração os direitos
fundamentais de todas as crianças e adolescentes, acabando com
a dicotomia existente na lei entre crianças e menores.
Aos jovens lhes é dada a condição de pessoa em
desenvolvimento, em processo de construção contínua de sua
formação psicológica, social, biológica, econômica.
18. Preocupação em compreender as diversas formas de expressão da
juventude no Brasil, levando em consideração as temáticas referentes à
sexualidade, vínculos grupais, cultura do consumo, mundo do trabalho e
relação com a escola
Alongamento da transição adolescente, ou seja, a maior convivência
com os pais até aproximadamente 30 anos, sem as responsabilidades
consideradas adultas, decorrentes da formação de uma família ou a
manutenção de um espaço próprio.
O eixo central das preocupações atuais nas políticas públicas: violência
(tráfico, consumo de drogas, delitos, homicídios), prostituição e
gravidez indesejada.
Necessidade de observar o contexto do jovem nos seus aspectos
positivos, numa perspectiva interacionista e ecológica de
desenvolvimento, superando a noção de carência afetiva e família
desestruturada.
O espaço da rua, antes visto como potencialmente causador das más
condutas, hoje é visto como referencial de aprendizagens peculiares, de
regras e sobrevivência ímpares, possibilitando redes diversas de vínculos
para os jovens de diversas classes