SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 10
Baixar para ler offline
estudos semióticos
issn 1980-4016
semestral
vol. 7, no
2
p. 16–25
novembro de 2011
www.fflch.usp.br/dl/semiotica/es
Mecanismos de debreagem e embreagem actanciais
empregados na língua falada
Vanessa Hagemeyer Burgo*
Eduardo Francisco Ferreira**
Letícia Jovelina Storto***
Resumo: Este estudo tem por objetivo discutir a constituição da categoria de pessoa no discurso político,
analisando os efeitos de sentido produzidos pelos mecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados
na conversação. O arcabouço teórico deste trabalho consiste, portanto, em uma abordagem textual-interativa da
língua falada, pautada, sobretudo, em conceitos da semiótica em relação de interface com formulações advindas
da análise da conversação. O corpus é composto de transcrições do debate entre os candidatos à presidência da
República Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin, realizado no dia 8 de outubro de 2006, transmitido pela
TV Bandeirantes. Vale ressaltar que optamos por trabalhar com trechos do primeiro bloco, os quais apresentam
elementos mais pertinentes à análise. Considerando-se que todo político tem como finalidade maior a adesão
dos eleitores e, consequentemente, seus votos, há uma grande preocupação com a imagem que querem passar
à sociedade e, por isso, as exposições são voltadas, sobretudo, aos telespectadores. Porém, na parte inicial
do debate, embora haja a presença da plateia e de jornalistas, os candidatos devem dirigir suas perguntas e
respostas um ao outro, em uma situação de interação face a face, Assim, mesmo que o destinatário direto
pareça ser o oponente, o real destinatário é o público.
Palavras-chave: debreagem, embreagem, língua falada
Introdução
Recentes estudos têm abordado o discurso como objeto
de pesquisa devido ao caráter de interação social que
se evidencia entre os participantes de um processo
de enunciação falante-ouvinte. O alvo de enfoque do
discurso tem sido revelado sob o aspecto do domina-
dor. Nesse sentido, observa-se o falante em posição
de prestígio no contexto social e os mecanismos que o
favorece na obtenção de seu poder, dominação e con-
vencimento. Sob essa perspectiva, tem-se evidenciado
grande enfoque à análise dos discursos políticos, os
quais detêm plenos poderes de persuasão.
O que se pretende com este estudo é enfocar a lin-
guagem do discurso político, visando a desvendar os
efeitos de sentido produzidos com o uso de determina-
dos mecanismos, utilizando os conceitos da semiótica,
paralelamente às formulações da análise da conversa-
ção. Dessa forma, destacamos a fala como localizada
(produzida em um dado momento/espaço), não tendo
uma etapa de planejamento prévio, ou seja, planejada
localmente e, por meio dela, criando um espaço parti-
lhado entre os interlocutores. Conforme Barros (2003,
p. 66),
[...] o exame das estratégias discursivas tem
sido um dos principais objetivos dos estudos
semióticos nos últimos anos. A esses esforços
devem-se somar os das teorias pragmáticas e
da análise da conversação, propostas teóricas
que consideram, todas elas, os mecanismos
de interação social como fenômenos sistemá-
ticos, cujo conhecimento faz parte das regras
que o falante de uma língua domina (Barros,
2003, p. 66).
Diante disso, a linguagem deve ser pensada em re-
lação à constituição dos sujeitos e à produção dos
sentidos. Assim, o discurso supõe um sistema que
se relaciona com sua exterioridade, pois sem história
não há sentido, ou seja, é a inserção da história na
*
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Endereço para correspondência: vanessahburgo@hotmail.com .
**
Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP). Endereço para correspondência: eduardo.uenp@gmail.com .
***
Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Endereço para correspondência: leticia_storto@hotmail.com .
Vanessa H. Burgo, Eduardo F. Ferreira e Letícia J. Storto
língua que faz com que ela signifique. Dessa forma, é
visto como o resultado de uma construção que exige
a presença de um sujeito ideológico que, inserido em
um contexto social e histórico, desencadeia o processo
de significação. Pensa-se em discurso não como uma
forma de transmissão de informação, mas como efeito
de sentido entre locutores.
1. Referencial teórico
Com base na teoria semiótica greimasiana, Fiorin
(1996) observa que o processo de geração de sentido
é entendido como um percurso gerativo, simulacro
metodológico do ato real de produção significante, que
vai do mais simples e abstrato ao mais complexo e
concreto por meio de mecanismos de conversão. Nesse
percurso, distinguem-se a imanência, que tange ao
plano do conteúdo (contempla o níveis fundamental,
o narrativo e o discursivo) da manifestação, que é a
união de um plano de conteúdo com um ou vários
planos de expressão (ideia transformada em produto:
pode ser um filme, um quadro etc.). A enunciação é
a ponte, o momento de transição, a mediação entre
a imanência e a manifestação (enunciado acabado).
Enunciar é transformar idéia em discurso, sendo, pois,
um trabalho de construir. A enunciação compreende
o ‘dizer’ e o enunciado o ‘dito’.
As estratégias de persuasão podem se basear no
acordo que se estabelecem entre enunciação e enunci-
ado e o conflito entre os mesmos. No que concerne aos
contratos enunciativos, Fiorin (1996) menciona que,
quando há um acordo entre enunciado e enunciação,
o enunciado X deve ser lido como X, caso contrário,
o enunciado X deve ser interpretado como não-X. Es-
ses contratos determinam a atribuição de estatutos
veridictórios em quatro categorias: verdade (é e pa-
rece ser), mentira (não é e não parece ser), segredo
(é, mas não parece) e falsidade (parece, mas não é).
Vale ressaltar que o ‘ser’ está no nível da enunciação,
enquanto o ‘parecer’ está no nível do enunciado. Há,
também, a enunciação reportada, que corresponde
a um simulacro, no interior do discurso, da relação
de comunicação entre enunciador e enunciatário. A
enunciação enunciada é a forma como o enunciador
impõe ao enunciatário um ponto de vista acerca dos
acontecimentos narrados. A enunciação reportada
produz efeitos de sentido variados, como objetividade,
subjetividade ou realidade.
Ao produzir um enunciado, o enunciador estabelece
um acordo fiduciário (de fé), que determina o estatuto
veridictório do texto, por exemplo, quando o enuncia-
dor falar algo, o enunciatário, mesmo sabendo que é
mentira, vai agir como se fosse verdade. O autor afirma
que esse acordo fiduciário apresenta dois aspectos: (a)
como o texto deve se considerado do ponto de vista da
verdade e da realidade: há procedimentos culturais e
sociais que determinam o estatuto de verdade ou de
mentira do texto, de realidade ou ficção, por exemplo,
as histórias de pescador, na nossa cultura, são men-
tira; as histórias que começam com o protocolo “era
uma vez...” são irreais as histórias dos santos e de
Cristo são verdadeiras para os católicos e ficcionais
para os ateus; as fábulas de Esopo, ao apresentar a
moral, dizem-se irreais, mas referem-se a comporta-
mentos reais dos seres humanos; (b) como devem ser
entendidos os enunciados: da maneira como foram
dito ou ao contrário: existem marcas discursivas que
indicam se o enunciado X deve ser interpretado como
X ou como não-X. Há, portanto, dois tipos de contratos
enunciativos: o de identidade e o de contraditoriedade.
2. Formas de interação:
entrevistas e debates
O diálogo está presente na vida de todos. A entrevista,
em princípio, é uma aitvidade recorrente no cotidi-
ano, pois, normalmente, os indivíduos atuam como
entrevistadores e entrevistados em conversações diá-
rias. No caso de entrevistas de televisão e rádio, os
textos podem se desenvolver em menor grau de dia-
logicidade, uma vez que a interação tende a ser mais
assimétrica, diferentemente de conversações espon-
tâneas entre amigos, por exemplo. Não obstante, as
entrevistas também podem apresentar-se de forma
menos assimétrica, se comparadas a palestras, nas
quais a tendência é o turno ser mantido por um falante
apenas.
De acordo com Marcuschi (2006), a conversação
pode ser classificada em natural (formal ou assimétrica,
informal, coloquial ou simétrica) ou artificial (as desen-
volvidas em peças, novelas, filmes etc., ou seja, as que
seguem algum tipo de roteiro prévio). Considera-se si-
métrica a conversação em que ambos os interlocutores
têm o mesmo direito de tomar a palavra e de escolher
o tópico discursivo, direcionando-o e estabelecendo o
tempo de participação. Trata-se de uma “situação de
conversação em que todos os interlocutores dão contri-
buições relevantes em relação ao tópico, engajando-se,
substantivamente na consecução do objetivo comum”
(Preti, 2003, p. 267).
Já nas formas assimétricas, um dos participantes
tem o privilégio quanto ao uso da palavra, cabendo a
ele iniciar a conversação, conduzi-la e mudar o tópico.
São alguns exemplos de interações assimétricas as
entrevistas, consultas, palestras, entre outras situa-
ções nas quais, segundo o autor supracitado (2003, p.
266-267), apenas um falante “domina a cena”, ou seja,
toma a palavra para si, enquanto o ouvinte somente
contribui com “intervenções episódicas, marginais em
relação ao tópico do fragmento”. Desse modo, só um
interlocutor desenvolve o assunto, ao passo que o ou-
tro “segue” o que está sendo dito com pequenos turnos
inseridos na conversação.
17
estudos semióticos, vol. 7, no
2
Nas palavras de Urbano et al (1996, p. 84), entre-
vistas são “eventos conversacionais tipicamente de-
senvolvidos por meio de Perguntas e Respostas”, ao
contrário das conversas espontâneas “que não só as
incluem – aliás como estrutura básica – como também
se realizam por movimentos de fala de outros tipos”.
Dessa forma, as respostas nas entrevistas “revelam
uma complexidade que normalmente as conversações
espontâneas desconhecem”.
Fávero e Aquino (1998c, p. 122) asseveram que:
Dependendo de quem seja o entrevistador
ou do papel que lhe destinem, a entrevista
pode construir apenas uma técnica em que se
obtém respostas já esperadas a partir da orga-
nização de um simples questionário e, neste
caso, um pré-texto já estaria construído an-
teriormente ao encontro e seria preenchido
tão somente com as respostas do entrevis-
tado. Tomando-se a interação em termos de
possibilidade e de enquadramento em uma
escala, poder-se-ia dizer que, nesses textos,
observa-se um direcionamento para o menor
grau nessa escala de interação. Por outro
lado, é possível ocorrer um grau elevado de
dialogicidade em que o entrevistador deixa o
texto fluir e transcorrer de tal forma que este
não se identifique com um mero monólogo
(Fávero; Aquino, 1998c, p. 122).
Segundo as autoras, em entrevistas, as perguntas
configuram “estratégias cujos efeitos são cumulati-
vos, isto é, o entrevistador pode formular um pedido
de informação, de confirmação ou esclarecimento, ao
mesmo tempo em que pode utilizá-la para introdu-
zir, mudar, redirecionar o tópico” (1998c, p. 123). É
possível, ainda, que esse expediente sirva para a manu-
tenção do tópico, e seja utilizado para fins específicos,
como provocar o entrevistado a fim de desestruturar
sua resposta ao ponto de conseguir que sua imagem
seja arranhada, sobretudo quando se trata de políticos.
Desse modo, as perguntas e as respostas são fatores
que colaboram para o estabelecimento da coerência,
e não existe, necessariamente, uma única possibili-
dade de resposta, pois esta se encontra relacionada
ao contexto de ocorrência da pergunta. Nesse sentido,
mesmo que um participante formule sua pergunta,
sem apresentar interesse na maneira como seu in-
terlocutor irá interpretá-la, fornecendo-lhe qualquer
resposta, “a quase totalidade das perguntas é formu-
lada em decorrência do contexto discursivo anterior,
fato que permite indicar a importância do contexto
precedente da pergunta o qual acaba por emoldurá-la”
(Fávero; Aquino, 1998c, p. 124).
Em relação à assimetria em entrevistas, o entrevis-
tador, normalmente, tem a função de fazer a escolha
dos assuntos, direcionar a conversação e distribuir
os turnos, atribuindo ao entrevistado maior tempo
de fala. Porém, o conceito de assimetria interacional,
como afirmam Fávero e Andrade (1998a, p. 162), não
está ligado, somente, “às funções dos interlocutores
na situação comunicativa, mas principalmente a seus
papéis sociais e suas características individuais”. A
relevância social do entrevistado pode interferir no
equilíbrio da entrevista e, nesse caso, o entrevistado
seleciona os tópicos e conduz as passagens de turnos.
Por outro lado, “há entrevistadores peculiares que do-
minam a entrevista e não deixam ao entrevistado nem
mesmo os turnos que lhe são devidos”.
No que tange ao planejamento textual e tempo de
elaboração, existem três momentos distintos na en-
trevista, seja na LF (entrevistas televisivas, de rádio,
entre outras) ou na LE (entrevistas publicadas em
revistas, jornais, entre outras). Há o momento de pre-
paração, o da entrevista e o da edição. Como na LF o
planejamento é local, ou seja, desenvolve-se ao mesmo
tempo em que se executa o enunciado, em tempo real,
a entrevista apresenta-se como um “tipo especial de
texto falado, porque o planejamento existe da parte do
entrevistador e pode existir também, em certos casos,
da parte do entrevistado [...]” (Fávero, 2000, p. 83). Os
interlocutores, por terem mais tempo de elaboração,
tendem a diminuir as marcas de reformulação textual.
As estruturas de participação que caracterizam as
entrevistas televisivas demonstram que cada partici-
pante cumpre seu papel de forma efetiva. Assim, eles
se alternam na construção do turno e revelam maior
envolvimento interpessoal. Fávero e Aquino (1997, p.
70) afirmam que, nas entrevistas de televisão,
[...] as perguntas, utilizadas de forma estraté-
gica, dinamizam a interação verbal, ajustam
a participação dos interlocutores, reorgani-
zam o contexto e permitem ao entrevistador
explorar a organização sequencial e, auto-
maticamente, a organização contextual como
recurso criativo para a organização das ativi-
dades em que o entrevistador e entrevistado
estejam engajados (Fávero; Aquino, 1997, p.
70).
No entanto, não se pode desconsiderar o fato de que
há um terceiro elemento que incide significativamente
nesse tipo de interação: o público. A audiência é um
“elemento propulsor de modificações na interação entre
os participantes”, visto que a “interação se desenvolve
exatamente em função da terceira-parte e é em razão
de não se perder esse aliado que se precede a reformu-
lações, preservando-se ou atacando-se a autoimagem”
(Fávero, Andrade e Aquino, 1998b, p. 94).
A partir desse jogo entre entrevistado, entrevistador
e público, Fávero e Andrade (1998a, p. 157) postulam
que os dois primeiros têm a tarefa de informar e conven-
cer o público, desempenhando, portanto, “um duplo
18
Vanessa H. Burgo, Eduardo F. Ferreira e Letícia J. Storto
papel na interação: são cúmplices, no que diz respeito
à comunicação, e oponentes, quanto à conquista desse
mesmo público”. Desse modo, as entrevistas às vezes
convergem para o polo do contrato e, às vezes, para
o da polêmica. “No primeiro caso, os interlocutores
buscam causar boa impressão na audiência, para isso
tentam respeitar a fala do outro, costumam ceder o
turno, evitam traços que demonstrem agressividade.”
O estilo polêmico, por sua vez, permite que a interação
possa desqualificar um dos participantes.
Embora os estudos acerca de trocas entre dois in-
terlocutores tenham sido o foco de análise de muitos
pesquisadores, é preciso considerar que, quanto maior
o número de participantes de um evento conversa-
cional, mais complexa se torna a interação, ou seja,
quando há três ou mais interlocutores, a tomada e a
manutenção de seus turnos exigem maior negociação.
O debate televisivo, então, é outra forma de interação
realizada dentro de uma tríade, ou seja, realizada por
três interlocutores em conjunto. Há, nessa situação,
um “duplo esquema triangular: o que se desenrola no
estúdio entre debatedores e animador e o que põe em
cena dois debatedores diante de um público (telespec-
tador) ” (Fávero; Aquino, 2002, p. 159).
O trílogo, nas palavras das pesquisadoras acima
referidas, “é potencialmente mais conflitual e menos
constrangedor para os participantes do que o dílogo1
,
pois um deles pode, provisoriamente, pôr-se de lado
sem que isso ameace seriamente o desenrolar da con-
versa”. No diálogo, o locutor L2, normalmente, faz
suas intervenções após o locutor L1, e a sobreposição
de vozes é a única maneira de interrupção. Já no
trílogo, a fórmula “fala um por vez” nem sempre se
aplica: nele não existem regras fixas; não há como
prever, exatamente, o sucessor do turno; e o locutor
L3 pode tomar a palavra, sem que ela lhe seja so-
licitada. Por outro lado, essa situação pode causar
menos constrangimento, se, por exemplo, o locutor L3
prolongar seu silêncio, delegando, momentaneamente,
aos outros interactantes a função de desenvolver os
assuntos em seu lugar. Mesmo se abstendo do turno,
por um determinado tempo, seu dever de cooperar com
o andamento da conversação é dividido com os outros
participantes, sem que isso prejudique a interação
como um todo. Dessa maneira, existem momentos
em que o silêncio de um dos interlocutores se estende,
“cabendo aos outros o desenvolvimento da conversa-
ção”, em outras palavras, “a obrigação de cooperar fica
diluída no grupo” (Fávero; Aquino, 2002, p. 161).
O mediador, nesse caso, acaba tendo uma partici-
pação menos ativa, já que o tempo de seus turnos é
previamente estabelecido pela produção da emissora.
Isso não quer dizer que sua importância possa ser
desmerecida: ele propõe os tópicos, controla o tempo
de cada adversário, enfim, conduz a interação de modo
que não aparente tomar partido e se mostre imparcial,
atuando como o árbitro ou juiz do embate.
Em uma conversação casual, a interação, geral-
mente, inclina-se para uma relação pacífica entre os
interactantes, já em debates, ela converge para o lado
contrário, pois a polêmica e a atmosfera de confronto
sempre se fazem presentes. Apesar de não haver um
vencedor declarado em um debate, os índices de au-
diência são fatores altamente significativos, uma vez
que eles denotam o número de pessoas a quem os
textos foram destinados, e no caso da política, o bom
desempenho do candidato pode dissuadir o eleitor a
votar em seu adversário, bem como pode persuadi-lo a
obter sua aprovação.
Conforme McIlvenny (1996, p. 28-29), estudos
acerca dos discursos políticos têm demonstrado que
os oradores raramente desconsideram seu público, e
“adaptam seus discursos ao momento”, a fim de sus-
citar respostas de comum acordo com a audiência.
Os aplausos, por exemplo, não são, “necessariamente,
reações espontâneas”, pois podem ser incentivados
pelo carisma que o falante transparece ter ou pelas
estratégias argumentativas e retóricas que ele emprega.
Por outro lado, em debates políticos, é possível que
os falantes não recebam apenas respostas positivas
da audiência; suas declarações podem ser alvo de re-
ações desfavoráveis e, por conta disso, eles podem
obter reações negativas da audiência (como as vaias),
sobretudo, quando há iniciativa de outros que encora-
jam o restante. Há a possibilidade, ainda, de que as
vaias manifestem uma réplica à determinada postura
arrogante, como a de se vangloriar dos próprios feitos
ou de seu partido, em detrimento de outros.
3. A Instância de instauração do
sujeito (a instalação de
pessoas, espaços e tempos)
Sobre a noção de sujeito, Benveniste (1995) afirma que
a subjetividade é a capacidade de o locutor propor-se
como sujeito de seu discurso que se funda no exercício
da língua. Na enunciação, este locutor posiciona-se
por meio de índices formais que revelam a subjeti-
vidade na linguagem. Pelos pronomes pessoais, é
possível que o sujeito se revele e, na instauração de
um eu, necessariamente, instaura-se também um tu.
Ambos são protagonistas da enunciação que, ao se
referir a um indivíduo específico, a marca da pessoa é
identificada.
Com base nessas ideias, Brandão (1993, p. 49)
conclui que:
1
Fávero e Aquino 2002 (p. 160) utilizam o termo dílogo (troca diádica), com base em Kerbrat-Orecchioni. As autoras reservam a
“diálogo seu sentido etimológico: dia = prefixo grego, que significa através de, como em diacronia, diáfano, diagonal.”
19
estudos semióticos, vol. 7, no
2
O sujeito de Benveniste é um eu que se carac-
teriza pela sua homogeneidade e unicidade e
se constitui na medida em que interage com
um tu – alocutário – opondo-se ambos à não-
pessoa, ele (eu – tu x ele). Apesar desse tu ser
complementar e indispensável, na relação é
o eu que tem ascendência sobre o tu. Deno-
minando sintomaticamente esse eu de ego,
sente-se, nas colocações de Benveniste, uma
marcação bastante acentuada de uma subje-
tividade “ego-cêntrica” a reger o mecanismo
da enunciação (Brandão, 1993, p. 49).
O sujeito é tomado como ponto de referência,
pois ao enunciar-se, todo espaço e todo tempo
organizam-se em torno do sujeito. Nesse sen-
tido, espaço e tempo estão na dependência
do eu, que neles se enuncia, caracterizando o
aqui como o espaço do eu e o presente como
o tempo em que coincidem o momento do
evento descrito e o ato de enunciação que o
descreve. Na visão de Fiorin (1996), todas as
relações espaciais e temporais são organiza-
das a partir desses dois elementos. Sendo a
enunciação o lugar de instauração do sujeito,
é também o lugar do ego, hic et nunc. O autor
citado (1995a, p. 170) assevera que “todas
as pessoas, espaços e tempos instalados no
enunciado estão de alguma forma relaciona-
dos ao eu-aqui-agora da enunciação”.
De acordo com Barros (2003, p. 54):
[...] o sujeito da enunciação faz uma série
de opções para projetar o discurso, tendo em
vista os efeitos de sentido que deseja produzir.
Estudar as projeções da enunciação é, por
conseguinte, verificar quais são os procedi-
mentos utilizados para constituir o discurso
e quais os efeitos de sentido fabricados pe-
los mecanismos escolhidos (Barros, 2003, p.
54).
A competência discursiva em sentido estrito com-
preende o conjunto de procedimentos que visam a
constituir o discurso como um espaço e um tempo
povoados de atores diferentes do enunciador. Segundo
Fiorin (1996), quando se adiciona a essa competência
o depósito de figuras do mundo natural e de configu-
rações discursivas que permite ao sujeito da enuncia-
ção o exercício da figurativização, tem-se a competên-
cia em sentido lato. O sujeito, ao designar-se como
‘eu’, apropria-se da linguagem inteira, construindo o
mundo como objeto e se construindo a si mesmo, ao
mesmo tempo. Isso se dá por uma orientação transitiva
que constitui o que Greimas chama a intencionalidade
fundadora da enunciação e, por isso, a enunciação é
um enunciado cuja função predicativa é a intenciona-
lidade e cujo objeto é o enunciado-discurso.
4. Debreagem e embreagem
As concepções doravante explanadas neste item
baseiam-se em Fiorin (1995b, 1996), as quais con-
tribuem para os estudos acerca dos conceitos de de-
breagem e embreagem. Conforme o autor, são dois
os mecanismos de instauração de pessoas, espaços
e tempos no enunciado: a debreagem e a embrea-
gem. A debreagem é a operação em que a instância
de enunciação se desprende de si e projeta para fora
de si, no momento da discursivização, determinados
termos ligados a sua estrutura de base, buscando a
constituição dos elementos fundadores do enunciado,
quais sejam: pessoa, tempo e espaço. Há a debreagem
actancial, espacial e temporal. A debreagem tira da
instância de enunciação a pessoa, o espaço e o tempo
e projeta no enunciado um não-eu, um não-aqui e um
não-agora.
Existem dois tipos de debreagem. A primeira é a
enunciativa, em que se instalam no enunciado os ac-
tantes da enunciação (eu/tu), o espaço da enunciação
(aqui) e o tempo da enunciação (agora), isto é, em que
o não-eu, o não-aqui e o não-agora são enunciados
como eu, aqui, agora. A segunda é a enunciva, em
que se instauram no enunciado os actantes do enun-
ciado (ele), o espaço do enunciado (algures) e o tempo
do enunciado (então). A debreagem enunciativa e a
enunciva produzem dois efeitos de sentido: o de sub-
jetividade (instalação dos simulacros do ego-hic-nunc
enunciativos, com suas apreciações dos fatos) e o de
objetividade (eliminação das marcas de enunciação
do texto, ou seja, da enunciação enunciada, fazendo
com o discurso se construa somente com enunciado
enunciado).
É relevante considerar, ainda, a debreagem interna,
que consiste no fato de que um actante já debreado,
seja ele da enunciação ou do enunciado, se torna ins-
tância enunciativa, que opera, então, uma segunda
debreagem, que pode ser enunciativa ou enunciva. Em
diálogos, por exemplo, com debreagens internas em
que há mais de uma instância de tomada de palavra.
Essas instâncias subordinam-se umas às outras: o
eu que fala em discurso direto é dominado por um eu
narrador que, por sua vez, depende de um eu pres-
suposto pelo enunciado. Em função dessa cadeia de
subordinação, diz-se que o discurso direto é uma de-
breagem de segundo grau. Seria de terceiro se o sujeito
debreado em segundo grau fizesse outra debreagem.
Por questões de limitação da memória, é muito difícil
que esse processo ultrapasse o terceiro grau ou mesmo
que vá além do segundo.
A embreagem, por sua vez, é o efeito de retorno à
enunciação, produzido pela neutralização das catego-
rias de pessoa e/ou espaço e/ou tempo, bem como
20
Vanessa H. Burgo, Eduardo F. Ferreira e Letícia J. Storto
pela denegação da instância do enunciado. Assim
como ocorre na debreagem, há a embreagem actancial,
espacial e temporal. A embreagem actancial concerne
à neutralização de oposições na categoria de pessoa.
Toda embreagem pressupõe uma debreagem anterior.
Uma debreagem enunciativa (instalação de um eu)
precede a embreagem. A neutralização da oposição de
eu/ele em benefício do ele denega o enunciado, pois
este é afirmado com uma debreagem prévia. Negar
o enunciado estabelecido é retornar à instância que
o precede e é pressuposta por ele, logo, obtém-se na
embreagem um efeito de identificação entre sujeito do
enunciado e sujeito da enunciação, tempo do enun-
ciado e tempo da enunciação, espaço do enunciado
e espaço da enunciação. A embreagem espacial diz
respeito a neutralizações na categoria de espaço, e a
temporal a neutralizações na categoria de tempo.
Existem casos que apresentam embreagem homo-
categórica, que acontece quando a debreagem e a
embreagem que a segue afetam a mesma categoria (a
de pessoa, a do espaço ou a do tempo), e a embreagem
heterocategórica, em que as categorias presentes na
debreagem e na embreagem subseqüente são distintas.
Faz-se necessária, também, a distinção entre em-
breagem enunciativa e enunciva. A primeira ocorre
quando o termo debreante é tanto enunciativo como
enuncivo, porém, o embreante é enunciativo. A se-
gunda é aquela em que o termo debreante pode ser
enunciativo ou enuncivo, porém, o termo embreante
é enuncivo. A embreagem pode, ainda, ser classifi-
cada em externa, quando produzida por uma instância
enunciativa pressuposta pelo enunciado, e interna,
quando realizada por uma instância enunciativa já
inscrita no enunciado.
Para perceber a especificidade da significação dos
termos designativos de pessoa, de tempo e de espaço é
necessário observarmos a diferença entre enunciado-
tipo e enunciado-ocorrência. O primeiro considera o
mesmo enunciado, independentemente das vezes que
é enunciado, Já o segundo leva em conta cada uma
das vezes que é enunciado. De modo geral, os ele-
mentos do código lingüístico são idênticos do ponto de
vista da significação tanto no tipo quanto na ocorrên-
cia. As categorias que assumem o papel de indicar as
circunstâncias da enunciação (pessoa, espaço, tempo)
só podem ser interpretadas se a reportarmos ao ato
único da enunciação que produziu o enunciado em
que se apresentam.
Os elementos lingüísticos referentes à pessoa, ao
espaço e ao tempo dividem-se em dêiticos e anafóricos.
Os primeiros referem-se à situação de enunciação, seja
ela pressuposta, seja ela explicitada no texto pelo narra-
dor (pronomes “eu”/“tu”, advérbios/locuções adverbi-
ais, demonstrativos etc.). Os anafóricos pertencem ao
enunciado enunciado e, portanto, são compreendidos
em função das marcas de tempo e espaço instalados no
enunciado e de actantes do enunciado anteriormente
mencionados.
5. Análise dos dados
No trecho abaixo, Lula (eu) se dirige a Alckmin (tu),
respondendo sua pergunta:
(1) “[...] Me parece que o governador não estava no
Brasil em 2003 porque se ele tivesse, ele poderia
começar esse debate me agradecendo [...]”.
Vemos, em (1), que ocorre a neutralização na catego-
ria de pessoa. Tem-se, formalmente, uma debreagem
enunciva (um ele), mas que assume o valor de um tu, já
que Lula está falando com Alckmin. Trata-se, portanto,
de uma embreagem enunciva, pois há a neutralização
da oposição tu/ele em proveito do último membro do
par.
Assinalamos mais outros exemplos2
de embreagem
actancial enunciva em que o ele é utilizado no lugar
do tu:
(2) “[...] a proposta de reforma tributária está no
Congresso Nacional, aliás, o governador foi co-
migo e mais vinte e seis governadores entregar
[...]”.
(3) “[...] o governador não pode se esquecer que na
campanha de 2002 surgiu o dossiê Caymã [...].
(4) “[...] o governador sabe que em 1989 veio a de-
núncia prá eu fazer contra o Collor e eu resolvi
não fazer porque prá mim tem que ter prova”.
(5) “[...] Possivelmente o governador ainda tenha
saudade do tempo da tortura [...]”.
(6) “[...] Parece que o governador deve olhar para a
cara do povo e dizer um pouco a verdade [...]”.
(7) “[...] A verdade é que o Bajas Negri foi secretá-
rio do CDHU (?), tem cento e duas condenações
provisórias do Tribunal de Contas do Estado
e uma das empresas contratadas é de um se-
nhor chamado Abel que, segundo informações
da imprensa, estava lá para comprar o dossiê.
Mesmo assim, o governador diz que não sabia.
O governador sabe que se tem um brasileiro que
não tinha interesse nisso era eu”.
Observa-se que nos segmentos acima, quando Lula
diz “o governador”, se dirigindo ao próprio governador,
tem-se um ele (termo enuncivo) que significa um tu.
O termo debreante é enunciativo, mas o elemento que
resta no enunciado é enuncivo, caracterizando, pois, a
embreagem enunciva.
Ao dirigir-se ao adversário pelo substantivo “governa-
dor”, Lula emprega a terceira pessoa em substituição à
2
Os exemplos (1) a (7) referem-se a respostas de Lula às perguntas feitas por Alckmin.
21
estudos semióticos, vol. 7, no
2
segunda do singular, produzindo um efeito de polidez
e distanciamento, o que confere, por um lado, um tom
de respeito à posição social do opositor. Por outro lado,
ele também impõe situação recíproca, isto é, espera
receber do oponente o mesmo tratamento pautado em
seu papel social: o presidente. Seria oportuno para
Lula conduzir o debate de forma ponderada e sem in-
sultos, evitando possíveis situações desfavoráveis em
função das denúncias de corrupção em seu governo.
Assim, o presidente procura manter um nível mais
elevado de argumentação, podendo amenizar o teor
das acusações. Esse tipo de recurso é muito apropri-
ado quando se pretende mostrar controle da situação,
visto que esse efeito cordial e sociável no discurso pode
ajudar a desestabilizar o oponente.
Nas respostas de Alckmin a Lula também são obser-
vadas embreagens enuncivas:
(8) “[...] Comigo não tem essa história de que não
assumo responsabilidade. Não se refere ao meu
governo, se refere ao governo passado e que
deve ser apurado, agora, o que o candidato Lula
deve explicar é como é que compra ambulância
superfaturada [...]”.
(9) “[...] O Brasil retrocedeu na saúde. 1,6 bilhão de
reais foram tirados da Saúde, as Santas Casas
tão praticamente quebradas. Foi abandonado
o mutirão de Saúde, aliás, o candidato Lula diz
que a Saúde no Brasil tá quase perfeita [...]”.
Alckmin, em suas falas, dirige-se ao enunciatário
(tu) pelo termo “candidato”, baixando a força política
do adversário, visto que, de autoridade máxima da
Nação, ele passa à condição de candidato assim como
o próprio enunciador.
(10) “[...] porque diferentemente do governador Mário
Covas, ele quis colocar em prática em São Paulo
a chamada guerra fiscal. Bem, eu acho que
o governador deve ter muita clareza que eu
pensei que ele ia trazer a resposta porque faz
exatamente trinta dias que ele quer saber da
onde veio o dinheiro, ele quer saber cadê o
dinheiro [...]” (Lula em resposta a Alckmin).
O exemplo acima difere dos outros de embreagem
analisados anteriormente. Notamos que Lula usa o
substantivo “governador” toda vez que fala com seu
adversário; porém, no recorte (10), ele não se refere
a Alckmin, mas ao governador Mário Covas, havendo
uma debreagem enunciva pela instauração de um ele
no enunciado. Contudo, o “ele”, inserido logo depois,
não diz respeito mais a Mário Covas e sim a Alckmin,
que é com quem Lula está falando. Esse “ele”, en-
tão, opera como um tu e torna-se uma embreagem
enunciva.
Nos trechos abaixo, Alckmin se dirige a Lula:
(11) “Primeiro eu queria dizer ao telespectador...
veja que ele não respondeu, não disse onde
vai cortar um gasto. Ele vai é aumentar imposto
para o povo brasileiro [...]”.
(12) “[...] A minha pergunta é: presidente da Repú-
blica é o chefe comandante, chefe das Forças
Armadas. Tem a Agência Brasileira de Inteligên-
cia, a ABIN, é o chefe do ministro que comanda
a Polícia Federal, é um dos homens mais bem
informados do país. Candidato Lula, de onde
veio o dinheiro sujo, um milhão e setecentos e
cinqüenta mil em dinheiro vivo, reais e dólares
para comprar o dossiê fajuto?”.
(13) “Veja, telespectador, não sabe também. Um mi-
lhão e setecentos e cinqüenta mil dá para um
trabalhador, que ganha salário mínimo, viver
416 anos. Uma fortuna! Não teve nem a curio-
sidade de perguntar pro seu churrasqueiro de
onde veio o dinheiro [...]”.
(14) [...] Olhe nos olhos do povo brasileiro,
candidato Lula e responda de onde veio o di-
nheiro [...]”.
Em (11), há uma debreagem enunciativa (instala-
ção de um eu) em que o tu seria Lula, uma vez que
é ele a pessoa com quem Alckmin fala, no entanto, o
tu acaba sendo o telespectador. Isso se reforça pelo
uso do imperativo “veja”, o que resulta em um meio de
envolver o ouvinte, uma estratégia de chamar sua aten-
ção para determinado aspecto do tema, criando um
efeito de aproximação e cumplicidade com o público.
Em seguida, o enunciador emprega uma debreagem
enunciva (instalação de um ele), falando de Lula para
o povo (diferentemente dos exemplos anteriores em
que o ele significava um tu). O mesmo ocorre em (13).
Alckmin instaura novamente o telespectador como seu
enunciatário e Lula como a pessoa de quem se fala:
“Veja, telespectador (tu), (ele, Lula) não sabe... (ele,
Lula) não teve...”, utilizando, também, um expediente
para atrair o ouvinte à reflexão proposta por ele: “veja,
telespectador”. Já em (12) e (14), Alckmin deixa de
falar com o povo diretamente e instala, pelo vocativo
“candidato Lula” e pelo imperativo “olhe”, um tu que
passa a ser o próprio Lula (debreagem enunciativa).
Cabe salientar que ao se dirigir ao telespectador,
Alckmin instaura um enunciatário (tu), porém, visando
a atingir toda a população que está assistindo ao de-
bate (vocês). Ocorre, então, uma embreagem por meio
da qual a segunda pessoa do singular torna-se a se-
gunda do plural, resultando em uma particularização
que é convertida à generalização, ou seja, direcionar a
fala a cada um individualmente implica em direcioná-la
a todos.
(15) “[...] Primeiro, Lula, não meça as pessoas pela
sua régua. Eu não tenho no meu governo minis-
22
Vanessa H. Burgo, Eduardo F. Ferreira e Letícia J. Storto
tro condenado, não tenho indiciado pela polícia,
não tenho assessor meu condenado, denunci-
ado pelo procurador da República. Tenho 32
anos de vida pública honrada [...]” (Alckmin
em resposta a Lula).
Pelo vocativo e pela introdução de um eu no enunci-
ado, vemos que há uma debreagem enunciativa que
precede a embreagem (primeira pessoa significando
a segunda do singular). Quando Alckmin nega as
corrupções em seu governo, ele está, implicitamente,
afirmando que no governo de Lula isso é uma prática
corrente. O enunciador usa a primeira pessoa, aliada
à forma negativa com o intuito de atingir aquele com
quem fala. O efeito que se tem é o de acusação ao
outro, construído pela substituição do tu pelo eu. Isso
nos remete à idéia de que esse “não tenho...” significa
“você tem...”, bem como, ao asseverar que tem 32 anos
de vida pública honrada, fica subentendido que seu
enunciatário não tem essa qualificação.
Lula em resposta a Alckmin diz:
(16) “[...] é importante lembrar que nós fizemos o
país crescer como em nenhum momento da sua
história dos últimos vinte anos [...]”.
(17) “[...] e nós conseguimos em três anos e meio
fazer com que o Brasil chegasse agora no fi-
nal do ano a quase 135 bilhões de dólares de
exportação”.
O emprego do pronome “nós” é bastante difundido
no meio político e freqüentemente utilizado por autori-
dades para legitimar o papel de representantes do povo.
Trata-se de um “nós” utilizado no lugar de um “eu”, um
plural majestático que, vindo de um chefe de Estado,
afasta a idéia de uma subjetividade que poderia soar
como arrogância se tivesse dito, por exemplo: “eu fiz
o país crescer” ou “eu consegui em três anos e meio
fazer com que o Brasil chegasse agora no final do ano
a quase 135 bilhões de dólares de exportação”.
(18) “[...] na hora que a polícia tiver os dados, pode
ficar certo que eu tenho mais interesse que
vossa excelência de explicar ao povo brasileiro
[...]”.
O pronome de tratamento “vossa excelência” pode
ser considerado como um caso híbrido: há a terceira
pessoa com o valor de tu, que é uma embreagem, e
o possessivo “vossa” (segunda pessoa) que, de certa
forma, caracteriza uma debreagem3
. Essa forma de
tratamento atribui ao discurso um efeito de ironia e
afronta decorrente do respeito exacerbado em relação
a seu enunciatário.
(19) “[...] O escândalo do saguessuga, do vampiro é
do seu governo e se começou antes deveria ter
punido, não tem uma prova. A primeira denún-
cia é de 2003 e eu sou republicano. Apure-se
[...]” (Alckmin em resposta a Lula).
Em (19), ocorre o uso de uma forma indeterminada
em lugar da segunda pessoa, já que temos a sensação
de que Alckmin, ao dizer “apure-se”, está colocando
seu governo à disposição de todos os interessados;
nesse caso, “vocês” da oposição, para que investiguem
a veracidade de suas proposições.
(20) “[...] primeiro porque eles já governaram muitos
estados e governaram o país por muito tempo
e ficou claro que a única coisa que eles sa-
bem fazer primeiro é cortar gastos daquilo que
não deveria cortar, que é o salário do povo tra-
balhador. Segundo é importante lembrar que
quem propôs a reforma da Previdência Social do
setor público fui eu. Terceiro, é importante lem-
brar que nós fizermos o país crescer como em
nenhum momento da sua história dos últimos
vinte anos [...]” (Lula em resposta a Alckmin).
Em um primeiro momento, tem-se uma debreagem,
pois esse “eles” refere-se ao governo Fernando Henri-
que Cardoso, anterior ao de Lula e do mesmo partido
do candidato Alckmin. Numa segunda leitura, esse
“eles”, por extensão, aplica-se a “você/vocês” repre-
sentado pelo oponente, constituindo, portanto, uma
embreagem. Logo, Alckmin é responsabilizado pelos
atos do governo precedente ao de Lula, por perten-
cer à mesma facção política que FHC, o que produz
um efeito de sentido de generalização. Cria-se, ainda,
a impressão de que o enunciador busca mostrar a
“verdade” dos fatos e, desse modo, conseguir manter,
resgatar ou aumentar sua credibilidade perante o povo
brasileiro.
Considerações finais
O discurso é visto como objeto produzido pelo sujeito
da enunciação e como objeto de comunicação entre
um destinador e um destinatário. Assinala-se, dessa
forma, o emprego de determinados mecanismos que
corroboram a acepção de um sujeito que aproveita
momentos de embate para assumir uma posição efe-
tiva de domínio e envolvimento do enunciatário. A
enunciação projeta os actantes no discurso e, por meio
dessas projeções, é possível examinar os procedimen-
tos e elementos da sintaxe utilizados para produzir
determinado efeito de sentido.
Observamos, no corpus, o uso de elementos que
marcam certo distanciamento do falante a respeito de
assuntos delicados ou polêmicos. Isso contribui para
afastar reações negativas e chamar a atenção para
3
No que concerne aos chamados pronomes de tratamento, baseamos a análise de acordo com Fiorin (1996, p. 89).
23
estudos semióticos, vol. 7, no
2
outro aspecto do tema que seja mais conveniente para
aproximar os ouvintes, obtendo, assim, sua aprova-
ção. Por meio dessas marcas enunciativas, pode-se
conhecer o ponto de vista dos falantes, suas atitu-
des e posicionamentos, mesmo que não os revelem
explicitamente.
A rigor, o presente estudo apenas tentou realizar al-
guns apontamentos acerca dos mecanismos de debre-
agem e embreagem actanciais no texto político falado.
Não pretendemos esgotar as discussões em relação a
esse assunto, uma vez que observamos a relevância
do mesmo para trabalhos desenvolvidos também no
campo da análise da conversação. Nossa intenção
está voltada, então, para a possibilidade de termos
delineado alguns aspectos que possam ser úteis para
futuras análises.
Referências
Barros, Diana Luz Pessoa de
2003. Teoria semiótica do texto. São Paulo: Ática.
Benveniste, Émile.
1995. Problemas de linguística geral I. Campinas:
Pontes.
Brandão, Helena Hathsue Nagamine
1993. Introdução à análise do discurso. Campinas:
Editora da Unicamp.
Fávero, Leonor Lopes
2000. A entrevista na fala e na escrita. In: Preti, Dino
(Org.). Fala e escrita em questão. São Paulo: Hu-
manitas/FFLCH/USP, p. 79–98. (Projetos Paralelos-
NURC/SP), v. 4.
Fávero, Leonor Lopes; Andrade, Maria Lúcia da Cunha
Victório de Oliveira
1998a. Os processos de representação da imagem
pública nas entrevistas. In: Preti, Dino (Org.) Es-
tudos de língua falada: variações e confrontos. São
Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, p. 153–178. (Pro-
jetos Paralelos-NURC/SP), v. 3.
Fávero, Leonor Lopes; Andrade, Maria Lúcia da Cunha
Victório de Oliveira; Aquino, Zilda Gaspar Oliveira
de
1998b. Discurso e interação: a reformulação nas
entrevistas. Delta: Revista de Documentação de Es-
tudos em Linguística Teórica e Aplicada, São Paulo,
PUC, v. 14, n. especial, p. 91–103.
Fávero, Leonor Lopes; Aquino, Zilda Gaspar Oliveira
de
1997. Textualização de produções orais formais - o
caso da entrevista. In: Koch, Ingedore Grunfeld Vil-
laça Koch; Barros, Kazue Saito Monteiro de (Orgs.)
Tópicos em linguística de texto e análise da conver-
sação. Natal: EDUFRN, p. 67–72.
Fávero, Leonor Lopes; Aquino, Zilda Gaspar Oliveira
de
1998c. As perguntas na organização das entrevis-
tas. Revista da ANPOLL, São Paulo: Humanitas/
FFLCH/USP, n. 4, jan./jun., p. 121–135.
Fávero, Leonor Lopes; Aquino, Zilda Gaspar Oliveira
de
2002. A dinâmica das interações verbais: o trílogo.
In: Preti, Dino (Org.). Interação na fala e na escrita.
São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, p. 159–178.
(Projetos Paralelos-NURC/SP), v. 5.
Fiorin, José Luiz
1995a. A noção de texto na semiótica. Organon:
Revista do Instituto de Letras da Universidade Fede-
ral do Rio Grande do Sul, Porto Alegre: Instituto de
Letras/ UFRGS, v. 9, n. 23, p. 163–173.
Fiorin, José Luiz
1995b. A pessoa desdobrada. ALFA: Revista de
Linguística, São Paulo, UNESP, v. 39:23–44.
Fiorin, José Luiz
1996. As astúcias da enunciação: as categorias de
pessoa, espaço e tempo. São Paulo: Ática.
Marcuschi, Luiz Antônio
2006. Análise da conversação. São Paulo: Ática.
McIlvenny, Paul
1996. Heckling in Hyde Park: Verbal Audience Par-
ticipation in Popular Public Discourse. Language in
Society, Cambridge University Press, v. 25, n. 1, p.
27–60.
Preti, Dino (Org.)
2003. Análise de textos orais. V 1. São Paulo: Huma-
nitas/ FFLCH/USP. (Projetos Paralelos-NURC/SP).
Urbano, Hudinilson et al
1996. Perguntas e respostas na conversação. In:
Castilho, Ataliba Teixeira de (Org.). Gramática do
português falado. V. 3: As Abordagens Campinas:
Unicamp/FAPESP, p. 75–98.
24
Dados para indexação em língua estrangeira
Burgo, Vanessa Hagemeyer;
Ferreira, Eduardo Francisco; Storto, Letícia Jovelina
Actancial Mechanisms of Shifting Out and Shifting In
Employed in Spoken English
Estudos Semióticos, vol. 7, n. 2 (2011), p. 16-25
issn 1980-4016
Abstract: This study aims to discuss the constitution of the category of person in political discourse. We intend
to analyze the meaning effects produced by actantial mechanisms of shifting out and shifting in employed in
conversation. The theoretical framework of this work is mainly based on Semiotic concepts, from a textual-
interactive perspective of spoken language in relation to the principles of Conversation Analysis. The corpus is
composed of transcriptions of the debate between the candidates Luiz Inácio Lula da Silva and Geraldo Alckmin,
who were at the time running for the presidential position. This debate was aired on October 8, 2006, by the
television broadcasting channel, Rede Bandeirantes. We decided to work with some parts of the first block, which
presented the most important elements for the analysis. Assuming that every politician is concerned with obtaining
the adhesion of the interlocutor and, consequently, getting their votes, it is natural that their goal is to preserve
a positive image by addressing their speech to the viewers/listeners. In the initial part of the debate, however,
the candidates have to ask their questions to one another, in a face-to-face interaction situation, even though the
audience and journalists are present. In spite of the fact that the direct addressee seems to be the opponent, in
fact, the real addressee is the audience.
Keywords: shifting out, shifting in, spoken language
Como citar este artigo
Burgo, Vanessa Hagemeyer; Ferreira, Eduardo Fran-
cisco; Storto, Letícia Jovelina. Mecanismos de debre-
agem e embreagem actanciais empregados na língua
falada. Estudos Semióticos. [on-line] Disponível em:
http://www.fflch.usp.br/dl/semiotica/es . Editores Respon-
sáveis: Francisco E. S. Merçon e Mariana Luz P. de
Barros. Volume 7, Número 2, São Paulo, novembro de
2011, p. 16–25. Acesso em “dia/mês/ano”.
Data de recebimento do artigo: 15/12/2010
Data de sua aprovação: 31/05/2011

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

O texto as propriedades de um texto
O texto   as propriedades de um textoO texto   as propriedades de um texto
O texto as propriedades de um textoRoberta Scheibe
 
O ensino de literatura na educação profissional de
O ensino de literatura na educação profissional deO ensino de literatura na educação profissional de
O ensino de literatura na educação profissional deThiago Soares
 
Língua portuguesa na educação profissional de nível médio
Língua portuguesa na educação profissional de nível médioLíngua portuguesa na educação profissional de nível médio
Língua portuguesa na educação profissional de nível médioThiago Soares
 
A fala dos quartéis e as outras vozes (Resumo Livro)
A fala dos quartéis e as outras vozes (Resumo Livro)  A fala dos quartéis e as outras vozes (Resumo Livro)
A fala dos quartéis e as outras vozes (Resumo Livro) Mabel Teixeira
 
Apresentação português Texto e (Co)texto
Apresentação português Texto e (Co)textoApresentação português Texto e (Co)texto
Apresentação português Texto e (Co)textoJonas Antunes
 
Mecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados na língua falada
Mecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados na língua faladaMecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados na língua falada
Mecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados na língua faladaLetícia J. Storto
 
USO DE ANÁFORAS EM PRODUÇÕES TEXTUAIS DE ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO MÉDIO
USO DE ANÁFORAS EM PRODUÇÕES TEXTUAIS DE ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO MÉDIOUSO DE ANÁFORAS EM PRODUÇÕES TEXTUAIS DE ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO MÉDIO
USO DE ANÁFORAS EM PRODUÇÕES TEXTUAIS DE ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO MÉDIOJobenemar Carvalho
 
O interlocutor nas propostas de produção textual no livro didático
O interlocutor nas propostas de produção textual no livro didáticoO interlocutor nas propostas de produção textual no livro didático
O interlocutor nas propostas de produção textual no livro didáticoDafianaCarlos
 
Leitura e compreensão texto falado e escrito
Leitura e compreensão texto falado e escritoLeitura e compreensão texto falado e escrito
Leitura e compreensão texto falado e escritoAFMO35
 
Texto E Textualidade
Texto E TextualidadeTexto E Textualidade
Texto E Textualidadekerolzinha73
 
A leitura o discurso
A leitura   o discursoA leitura   o discurso
A leitura o discursoGraça Barros
 
A construção com verbos de cognição
A construção com verbos de cogniçãoA construção com verbos de cognição
A construção com verbos de cogniçãoclayse anne medeiros
 
Intertextualidade e polifonia cap 5 parte 1_apresentar_koch
Intertextualidade e polifonia cap 5 parte 1_apresentar_kochIntertextualidade e polifonia cap 5 parte 1_apresentar_koch
Intertextualidade e polifonia cap 5 parte 1_apresentar_kochmarimidlej
 
Processos referenciais - Texto e Ensino
Processos referenciais - Texto e EnsinoProcessos referenciais - Texto e Ensino
Processos referenciais - Texto e EnsinoProfletras2014
 
Pressuposto, subentendido e ironia
Pressuposto, subentendido e ironiaPressuposto, subentendido e ironia
Pressuposto, subentendido e ironiaJosué Brazil
 
Intertextualidade e propaganda
Intertextualidade e propagandaIntertextualidade e propaganda
Intertextualidade e propagandaEdilson A. Souza
 

Mais procurados (20)

Linguística textual
Linguística textualLinguística textual
Linguística textual
 
O texto as propriedades de um texto
O texto   as propriedades de um textoO texto   as propriedades de um texto
O texto as propriedades de um texto
 
Análise do discurso anita
Análise do discurso   anitaAnálise do discurso   anita
Análise do discurso anita
 
Texto e textualidade
Texto e textualidadeTexto e textualidade
Texto e textualidade
 
O ensino de literatura na educação profissional de
O ensino de literatura na educação profissional deO ensino de literatura na educação profissional de
O ensino de literatura na educação profissional de
 
Língua portuguesa na educação profissional de nível médio
Língua portuguesa na educação profissional de nível médioLíngua portuguesa na educação profissional de nível médio
Língua portuguesa na educação profissional de nível médio
 
A fala dos quartéis e as outras vozes (Resumo Livro)
A fala dos quartéis e as outras vozes (Resumo Livro)  A fala dos quartéis e as outras vozes (Resumo Livro)
A fala dos quartéis e as outras vozes (Resumo Livro)
 
Apresentação português Texto e (Co)texto
Apresentação português Texto e (Co)textoApresentação português Texto e (Co)texto
Apresentação português Texto e (Co)texto
 
Mecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados na língua falada
Mecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados na língua faladaMecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados na língua falada
Mecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados na língua falada
 
USO DE ANÁFORAS EM PRODUÇÕES TEXTUAIS DE ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO MÉDIO
USO DE ANÁFORAS EM PRODUÇÕES TEXTUAIS DE ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO MÉDIOUSO DE ANÁFORAS EM PRODUÇÕES TEXTUAIS DE ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO MÉDIO
USO DE ANÁFORAS EM PRODUÇÕES TEXTUAIS DE ALUNOS DO PRIMEIRO ANO DO ENSINO MÉDIO
 
O interlocutor nas propostas de produção textual no livro didático
O interlocutor nas propostas de produção textual no livro didáticoO interlocutor nas propostas de produção textual no livro didático
O interlocutor nas propostas de produção textual no livro didático
 
Leitura e compreensão texto falado e escrito
Leitura e compreensão texto falado e escritoLeitura e compreensão texto falado e escrito
Leitura e compreensão texto falado e escrito
 
Texto E Textualidade
Texto E TextualidadeTexto E Textualidade
Texto E Textualidade
 
A leitura o discurso
A leitura   o discursoA leitura   o discurso
A leitura o discurso
 
95046107 cole-4293
95046107 cole-429395046107 cole-4293
95046107 cole-4293
 
A construção com verbos de cognição
A construção com verbos de cogniçãoA construção com verbos de cognição
A construção com verbos de cognição
 
Intertextualidade e polifonia cap 5 parte 1_apresentar_koch
Intertextualidade e polifonia cap 5 parte 1_apresentar_kochIntertextualidade e polifonia cap 5 parte 1_apresentar_koch
Intertextualidade e polifonia cap 5 parte 1_apresentar_koch
 
Processos referenciais - Texto e Ensino
Processos referenciais - Texto e EnsinoProcessos referenciais - Texto e Ensino
Processos referenciais - Texto e Ensino
 
Pressuposto, subentendido e ironia
Pressuposto, subentendido e ironiaPressuposto, subentendido e ironia
Pressuposto, subentendido e ironia
 
Intertextualidade e propaganda
Intertextualidade e propagandaIntertextualidade e propaganda
Intertextualidade e propaganda
 

Destaque

Variação linguística em livros voltados para professores em formação
Variação linguística em livros voltados para professores em formaçãoVariação linguística em livros voltados para professores em formação
Variação linguística em livros voltados para professores em formaçãoUENP
 
Variação linguística e preconceito na fala do ex-presidente Lula.
Variação linguística e preconceito na fala do ex-presidente Lula.Variação linguística e preconceito na fala do ex-presidente Lula.
Variação linguística e preconceito na fala do ex-presidente Lula.UENP
 
Paráfrases em conversações digitais: marcas da oralidade em interações mediad...
Paráfrases em conversações digitais: marcas da oralidade em interações mediad...Paráfrases em conversações digitais: marcas da oralidade em interações mediad...
Paráfrases em conversações digitais: marcas da oralidade em interações mediad...UENP
 
52150697 resenha-critica-abnt-o-trabalho-thau1
52150697 resenha-critica-abnt-o-trabalho-thau152150697 resenha-critica-abnt-o-trabalho-thau1
52150697 resenha-critica-abnt-o-trabalho-thau1Péricles Oliveira
 
processos fonologicos 2015
processos fonologicos 2015processos fonologicos 2015
processos fonologicos 2015luiscunha
 
Slides 'Preconceito Linguístico o que é, como se faz '
Slides 'Preconceito Linguístico o que é, como se faz 'Slides 'Preconceito Linguístico o que é, como se faz '
Slides 'Preconceito Linguístico o que é, como se faz 'Danielle Galvão
 
EXEMPLO DE RESENHA CRITICA
EXEMPLO DE RESENHA CRITICAEXEMPLO DE RESENHA CRITICA
EXEMPLO DE RESENHA CRITICALarissa Gomes
 

Destaque (8)

Variação linguística em livros voltados para professores em formação
Variação linguística em livros voltados para professores em formaçãoVariação linguística em livros voltados para professores em formação
Variação linguística em livros voltados para professores em formação
 
Variação linguística e preconceito na fala do ex-presidente Lula.
Variação linguística e preconceito na fala do ex-presidente Lula.Variação linguística e preconceito na fala do ex-presidente Lula.
Variação linguística e preconceito na fala do ex-presidente Lula.
 
Paráfrases em conversações digitais: marcas da oralidade em interações mediad...
Paráfrases em conversações digitais: marcas da oralidade em interações mediad...Paráfrases em conversações digitais: marcas da oralidade em interações mediad...
Paráfrases em conversações digitais: marcas da oralidade em interações mediad...
 
52150697 resenha-critica-abnt-o-trabalho-thau1
52150697 resenha-critica-abnt-o-trabalho-thau152150697 resenha-critica-abnt-o-trabalho-thau1
52150697 resenha-critica-abnt-o-trabalho-thau1
 
processos fonologicos 2015
processos fonologicos 2015processos fonologicos 2015
processos fonologicos 2015
 
Slides 'Preconceito Linguístico o que é, como se faz '
Slides 'Preconceito Linguístico o que é, como se faz 'Slides 'Preconceito Linguístico o que é, como se faz '
Slides 'Preconceito Linguístico o que é, como se faz '
 
EXEMPLO DE RESENHA CRITICA
EXEMPLO DE RESENHA CRITICAEXEMPLO DE RESENHA CRITICA
EXEMPLO DE RESENHA CRITICA
 
Resenha pronta
Resenha prontaResenha pronta
Resenha pronta
 

Semelhante a Mecanismos de debreagem e embreagem no discurso político

O que é discurso helena brandão
O que é discurso helena brandãoO que é discurso helena brandão
O que é discurso helena brandãoRose Moraes
 
Resenha a linguagem em uso
Resenha  a linguagem em usoResenha  a linguagem em uso
Resenha a linguagem em usoEdneide Lima
 
anlisededodiscurso-140409123243-phpapp02.ppt
anlisededodiscurso-140409123243-phpapp02.pptanlisededodiscurso-140409123243-phpapp02.ppt
anlisededodiscurso-140409123243-phpapp02.pptadrianomcosta3
 
Gêneros do discurso o que os pcns dizem e o que a prática escolar revela
Gêneros do discurso o que os pcns dizem e o que a prática escolar revelaGêneros do discurso o que os pcns dizem e o que a prática escolar revela
Gêneros do discurso o que os pcns dizem e o que a prática escolar revelaFrancimeire Cesario
 
concepção sociointeracionista no ensino
concepção sociointeracionista no ensinoconcepção sociointeracionista no ensino
concepção sociointeracionista no ensinoNadia Biavati
 
Lingua em uso linguagem e lingua
Lingua em uso   linguagem e linguaLingua em uso   linguagem e lingua
Lingua em uso linguagem e linguaMoises Ribeiro
 
3592 texto do artigo-8204-1-10-20100919
3592 texto do artigo-8204-1-10-201009193592 texto do artigo-8204-1-10-20100919
3592 texto do artigo-8204-1-10-20100919AnaSimes583336
 
3.2 Funcionalismo (Martelotta).pdf
3.2 Funcionalismo (Martelotta).pdf3.2 Funcionalismo (Martelotta).pdf
3.2 Funcionalismo (Martelotta).pdfPedroRocha944191
 
O banner como gênero discursivo uma leitura a luz das teorias bakhtinianas
O banner como gênero discursivo uma leitura a luz das teorias bakhtinianasO banner como gênero discursivo uma leitura a luz das teorias bakhtinianas
O banner como gênero discursivo uma leitura a luz das teorias bakhtinianasAtitude Digital
 
Análise discursiva da lei maria da penha
Análise discursiva da lei maria da penhaAnálise discursiva da lei maria da penha
Análise discursiva da lei maria da penhaGleiciele Ferreira
 
O Discurso argumentativo nos meios de comunicação digitais
O Discurso argumentativo nos meios de comunicação digitaisO Discurso argumentativo nos meios de comunicação digitais
O Discurso argumentativo nos meios de comunicação digitaisJuliana da Silveira
 
Palestra discurso e poder
Palestra discurso e poderPalestra discurso e poder
Palestra discurso e poderNadia Biavati
 

Semelhante a Mecanismos de debreagem e embreagem no discurso político (20)

O que é discurso helena brandão
O que é discurso helena brandãoO que é discurso helena brandão
O que é discurso helena brandão
 
Resenha a linguagem em uso
Resenha  a linguagem em usoResenha  a linguagem em uso
Resenha a linguagem em uso
 
anlisededodiscurso-140409123243-phpapp02.ppt
anlisededodiscurso-140409123243-phpapp02.pptanlisededodiscurso-140409123243-phpapp02.ppt
anlisededodiscurso-140409123243-phpapp02.ppt
 
Análise de (do) discurso
Análise de (do) discursoAnálise de (do) discurso
Análise de (do) discurso
 
Gêneros do discurso o que os pcns dizem e o que a prática escolar revela
Gêneros do discurso o que os pcns dizem e o que a prática escolar revelaGêneros do discurso o que os pcns dizem e o que a prática escolar revela
Gêneros do discurso o que os pcns dizem e o que a prática escolar revela
 
B praticas deleitura
B praticas deleituraB praticas deleitura
B praticas deleitura
 
concepção sociointeracionista no ensino
concepção sociointeracionista no ensinoconcepção sociointeracionista no ensino
concepção sociointeracionista no ensino
 
Análise do discurso
Análise do discursoAnálise do discurso
Análise do discurso
 
Lingua em uso linguagem e lingua
Lingua em uso   linguagem e linguaLingua em uso   linguagem e lingua
Lingua em uso linguagem e lingua
 
Resumo estudo
Resumo estudoResumo estudo
Resumo estudo
 
Resumo
Resumo Resumo
Resumo
 
3592 texto do artigo-8204-1-10-20100919
3592 texto do artigo-8204-1-10-201009193592 texto do artigo-8204-1-10-20100919
3592 texto do artigo-8204-1-10-20100919
 
3.2 Funcionalismo (Martelotta).pdf
3.2 Funcionalismo (Martelotta).pdf3.2 Funcionalismo (Martelotta).pdf
3.2 Funcionalismo (Martelotta).pdf
 
O banner como gênero discursivo uma leitura a luz das teorias bakhtinianas
O banner como gênero discursivo uma leitura a luz das teorias bakhtinianasO banner como gênero discursivo uma leitura a luz das teorias bakhtinianas
O banner como gênero discursivo uma leitura a luz das teorias bakhtinianas
 
Ensinodelinguagem
EnsinodelinguagemEnsinodelinguagem
Ensinodelinguagem
 
Generos Textuais
Generos TextuaisGeneros Textuais
Generos Textuais
 
Análise discursiva da lei maria da penha
Análise discursiva da lei maria da penhaAnálise discursiva da lei maria da penha
Análise discursiva da lei maria da penha
 
O Discurso argumentativo nos meios de comunicação digitais
O Discurso argumentativo nos meios de comunicação digitaisO Discurso argumentativo nos meios de comunicação digitais
O Discurso argumentativo nos meios de comunicação digitais
 
Palestra discurso e poder
Palestra discurso e poderPalestra discurso e poder
Palestra discurso e poder
 
308
308308
308
 

Último

GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - Cartum
GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - CartumGÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - Cartum
GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - CartumAugusto Costa
 
A horta do Senhor Lobo que protege a sua horta.
A horta do Senhor Lobo que protege a sua horta.A horta do Senhor Lobo que protege a sua horta.
A horta do Senhor Lobo que protege a sua horta.silves15
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...azulassessoria9
 
Literatura Brasileira - escolas literárias.ppt
Literatura Brasileira - escolas literárias.pptLiteratura Brasileira - escolas literárias.ppt
Literatura Brasileira - escolas literárias.pptMaiteFerreira4
 
Bullying - Atividade com caça- palavras
Bullying   - Atividade com  caça- palavrasBullying   - Atividade com  caça- palavras
Bullying - Atividade com caça- palavrasMary Alvarenga
 
Considere a seguinte situação fictícia: Durante uma reunião de equipe em uma...
Considere a seguinte situação fictícia:  Durante uma reunião de equipe em uma...Considere a seguinte situação fictícia:  Durante uma reunião de equipe em uma...
Considere a seguinte situação fictícia: Durante uma reunião de equipe em uma...azulassessoria9
 
Atividades sobre Coordenadas Geográficas
Atividades sobre Coordenadas GeográficasAtividades sobre Coordenadas Geográficas
Atividades sobre Coordenadas Geográficasprofcamilamanz
 
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptx
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptxDiscurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptx
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptxferreirapriscilla84
 
PROGRAMA DE AÇÃO 2024 - MARIANA DA SILVA MORAES.pdf
PROGRAMA DE AÇÃO 2024 - MARIANA DA SILVA MORAES.pdfPROGRAMA DE AÇÃO 2024 - MARIANA DA SILVA MORAES.pdf
PROGRAMA DE AÇÃO 2024 - MARIANA DA SILVA MORAES.pdfMarianaMoraesMathias
 
Dicionário de Genealogia, autor Gilber Rubim Rangel
Dicionário de Genealogia, autor Gilber Rubim RangelDicionário de Genealogia, autor Gilber Rubim Rangel
Dicionário de Genealogia, autor Gilber Rubim RangelGilber Rubim Rangel
 
DESAFIO LITERÁRIO - 2024 - EASB/ÁRVORE -
DESAFIO LITERÁRIO - 2024 - EASB/ÁRVORE -DESAFIO LITERÁRIO - 2024 - EASB/ÁRVORE -
DESAFIO LITERÁRIO - 2024 - EASB/ÁRVORE -Aline Santana
 
Noções de Farmacologia - Flávia Soares.pdf
Noções de Farmacologia - Flávia Soares.pdfNoções de Farmacologia - Flávia Soares.pdf
Noções de Farmacologia - Flávia Soares.pdflucassilva721057
 
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptx
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptxSlides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptx
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptxLuizHenriquedeAlmeid6
 
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docx
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docxMapa mental - Classificação dos seres vivos .docx
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docxBeatrizLittig1
 
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdfPRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdfprofesfrancleite
 
VARIEDADES LINGUÍSTICAS - 1. pptx
VARIEDADES        LINGUÍSTICAS - 1. pptxVARIEDADES        LINGUÍSTICAS - 1. pptx
VARIEDADES LINGUÍSTICAS - 1. pptxMarlene Cunhada
 
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envio
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envioManual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envio
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envioManuais Formação
 
Aula de História Ensino Médio Mesopotâmia.pdf
Aula de História Ensino Médio Mesopotâmia.pdfAula de História Ensino Médio Mesopotâmia.pdf
Aula de História Ensino Médio Mesopotâmia.pdfFernandaMota99
 
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! SertãConstrução (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! SertãIlda Bicacro
 

Último (20)

GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - Cartum
GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - CartumGÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - Cartum
GÊNERO TEXTUAL - TIRINHAS - Charges - Cartum
 
A horta do Senhor Lobo que protege a sua horta.
A horta do Senhor Lobo que protege a sua horta.A horta do Senhor Lobo que protege a sua horta.
A horta do Senhor Lobo que protege a sua horta.
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
 
Literatura Brasileira - escolas literárias.ppt
Literatura Brasileira - escolas literárias.pptLiteratura Brasileira - escolas literárias.ppt
Literatura Brasileira - escolas literárias.ppt
 
Bullying - Atividade com caça- palavras
Bullying   - Atividade com  caça- palavrasBullying   - Atividade com  caça- palavras
Bullying - Atividade com caça- palavras
 
Considere a seguinte situação fictícia: Durante uma reunião de equipe em uma...
Considere a seguinte situação fictícia:  Durante uma reunião de equipe em uma...Considere a seguinte situação fictícia:  Durante uma reunião de equipe em uma...
Considere a seguinte situação fictícia: Durante uma reunião de equipe em uma...
 
Atividades sobre Coordenadas Geográficas
Atividades sobre Coordenadas GeográficasAtividades sobre Coordenadas Geográficas
Atividades sobre Coordenadas Geográficas
 
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptx
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptxDiscurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptx
Discurso Direto, Indireto e Indireto Livre.pptx
 
CINEMATICA DE LOS MATERIALES Y PARTICULA
CINEMATICA DE LOS MATERIALES Y PARTICULACINEMATICA DE LOS MATERIALES Y PARTICULA
CINEMATICA DE LOS MATERIALES Y PARTICULA
 
PROGRAMA DE AÇÃO 2024 - MARIANA DA SILVA MORAES.pdf
PROGRAMA DE AÇÃO 2024 - MARIANA DA SILVA MORAES.pdfPROGRAMA DE AÇÃO 2024 - MARIANA DA SILVA MORAES.pdf
PROGRAMA DE AÇÃO 2024 - MARIANA DA SILVA MORAES.pdf
 
Dicionário de Genealogia, autor Gilber Rubim Rangel
Dicionário de Genealogia, autor Gilber Rubim RangelDicionário de Genealogia, autor Gilber Rubim Rangel
Dicionário de Genealogia, autor Gilber Rubim Rangel
 
DESAFIO LITERÁRIO - 2024 - EASB/ÁRVORE -
DESAFIO LITERÁRIO - 2024 - EASB/ÁRVORE -DESAFIO LITERÁRIO - 2024 - EASB/ÁRVORE -
DESAFIO LITERÁRIO - 2024 - EASB/ÁRVORE -
 
Noções de Farmacologia - Flávia Soares.pdf
Noções de Farmacologia - Flávia Soares.pdfNoções de Farmacologia - Flávia Soares.pdf
Noções de Farmacologia - Flávia Soares.pdf
 
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptx
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptxSlides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptx
Slides Lição 5, CPAD, Os Inimigos do Cristão, 2Tr24, Pr Henrique.pptx
 
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docx
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docxMapa mental - Classificação dos seres vivos .docx
Mapa mental - Classificação dos seres vivos .docx
 
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdfPRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
PRÉDIOS HISTÓRICOS DE ASSARÉ Prof. Francisco Leite.pdf
 
VARIEDADES LINGUÍSTICAS - 1. pptx
VARIEDADES        LINGUÍSTICAS - 1. pptxVARIEDADES        LINGUÍSTICAS - 1. pptx
VARIEDADES LINGUÍSTICAS - 1. pptx
 
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envio
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envioManual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envio
Manual da CPSA_1_Agir com Autonomia para envio
 
Aula de História Ensino Médio Mesopotâmia.pdf
Aula de História Ensino Médio Mesopotâmia.pdfAula de História Ensino Médio Mesopotâmia.pdf
Aula de História Ensino Médio Mesopotâmia.pdf
 
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! SertãConstrução (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
 

Mecanismos de debreagem e embreagem no discurso político

  • 1. estudos semióticos issn 1980-4016 semestral vol. 7, no 2 p. 16–25 novembro de 2011 www.fflch.usp.br/dl/semiotica/es Mecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados na língua falada Vanessa Hagemeyer Burgo* Eduardo Francisco Ferreira** Letícia Jovelina Storto*** Resumo: Este estudo tem por objetivo discutir a constituição da categoria de pessoa no discurso político, analisando os efeitos de sentido produzidos pelos mecanismos de debreagem e embreagem actanciais empregados na conversação. O arcabouço teórico deste trabalho consiste, portanto, em uma abordagem textual-interativa da língua falada, pautada, sobretudo, em conceitos da semiótica em relação de interface com formulações advindas da análise da conversação. O corpus é composto de transcrições do debate entre os candidatos à presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva e Geraldo Alckmin, realizado no dia 8 de outubro de 2006, transmitido pela TV Bandeirantes. Vale ressaltar que optamos por trabalhar com trechos do primeiro bloco, os quais apresentam elementos mais pertinentes à análise. Considerando-se que todo político tem como finalidade maior a adesão dos eleitores e, consequentemente, seus votos, há uma grande preocupação com a imagem que querem passar à sociedade e, por isso, as exposições são voltadas, sobretudo, aos telespectadores. Porém, na parte inicial do debate, embora haja a presença da plateia e de jornalistas, os candidatos devem dirigir suas perguntas e respostas um ao outro, em uma situação de interação face a face, Assim, mesmo que o destinatário direto pareça ser o oponente, o real destinatário é o público. Palavras-chave: debreagem, embreagem, língua falada Introdução Recentes estudos têm abordado o discurso como objeto de pesquisa devido ao caráter de interação social que se evidencia entre os participantes de um processo de enunciação falante-ouvinte. O alvo de enfoque do discurso tem sido revelado sob o aspecto do domina- dor. Nesse sentido, observa-se o falante em posição de prestígio no contexto social e os mecanismos que o favorece na obtenção de seu poder, dominação e con- vencimento. Sob essa perspectiva, tem-se evidenciado grande enfoque à análise dos discursos políticos, os quais detêm plenos poderes de persuasão. O que se pretende com este estudo é enfocar a lin- guagem do discurso político, visando a desvendar os efeitos de sentido produzidos com o uso de determina- dos mecanismos, utilizando os conceitos da semiótica, paralelamente às formulações da análise da conversa- ção. Dessa forma, destacamos a fala como localizada (produzida em um dado momento/espaço), não tendo uma etapa de planejamento prévio, ou seja, planejada localmente e, por meio dela, criando um espaço parti- lhado entre os interlocutores. Conforme Barros (2003, p. 66), [...] o exame das estratégias discursivas tem sido um dos principais objetivos dos estudos semióticos nos últimos anos. A esses esforços devem-se somar os das teorias pragmáticas e da análise da conversação, propostas teóricas que consideram, todas elas, os mecanismos de interação social como fenômenos sistemá- ticos, cujo conhecimento faz parte das regras que o falante de uma língua domina (Barros, 2003, p. 66). Diante disso, a linguagem deve ser pensada em re- lação à constituição dos sujeitos e à produção dos sentidos. Assim, o discurso supõe um sistema que se relaciona com sua exterioridade, pois sem história não há sentido, ou seja, é a inserção da história na * Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Endereço para correspondência: vanessahburgo@hotmail.com . ** Universidade Estadual do Norte do Paraná (UENP). Endereço para correspondência: eduardo.uenp@gmail.com . *** Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). Endereço para correspondência: leticia_storto@hotmail.com .
  • 2. Vanessa H. Burgo, Eduardo F. Ferreira e Letícia J. Storto língua que faz com que ela signifique. Dessa forma, é visto como o resultado de uma construção que exige a presença de um sujeito ideológico que, inserido em um contexto social e histórico, desencadeia o processo de significação. Pensa-se em discurso não como uma forma de transmissão de informação, mas como efeito de sentido entre locutores. 1. Referencial teórico Com base na teoria semiótica greimasiana, Fiorin (1996) observa que o processo de geração de sentido é entendido como um percurso gerativo, simulacro metodológico do ato real de produção significante, que vai do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto por meio de mecanismos de conversão. Nesse percurso, distinguem-se a imanência, que tange ao plano do conteúdo (contempla o níveis fundamental, o narrativo e o discursivo) da manifestação, que é a união de um plano de conteúdo com um ou vários planos de expressão (ideia transformada em produto: pode ser um filme, um quadro etc.). A enunciação é a ponte, o momento de transição, a mediação entre a imanência e a manifestação (enunciado acabado). Enunciar é transformar idéia em discurso, sendo, pois, um trabalho de construir. A enunciação compreende o ‘dizer’ e o enunciado o ‘dito’. As estratégias de persuasão podem se basear no acordo que se estabelecem entre enunciação e enunci- ado e o conflito entre os mesmos. No que concerne aos contratos enunciativos, Fiorin (1996) menciona que, quando há um acordo entre enunciado e enunciação, o enunciado X deve ser lido como X, caso contrário, o enunciado X deve ser interpretado como não-X. Es- ses contratos determinam a atribuição de estatutos veridictórios em quatro categorias: verdade (é e pa- rece ser), mentira (não é e não parece ser), segredo (é, mas não parece) e falsidade (parece, mas não é). Vale ressaltar que o ‘ser’ está no nível da enunciação, enquanto o ‘parecer’ está no nível do enunciado. Há, também, a enunciação reportada, que corresponde a um simulacro, no interior do discurso, da relação de comunicação entre enunciador e enunciatário. A enunciação enunciada é a forma como o enunciador impõe ao enunciatário um ponto de vista acerca dos acontecimentos narrados. A enunciação reportada produz efeitos de sentido variados, como objetividade, subjetividade ou realidade. Ao produzir um enunciado, o enunciador estabelece um acordo fiduciário (de fé), que determina o estatuto veridictório do texto, por exemplo, quando o enuncia- dor falar algo, o enunciatário, mesmo sabendo que é mentira, vai agir como se fosse verdade. O autor afirma que esse acordo fiduciário apresenta dois aspectos: (a) como o texto deve se considerado do ponto de vista da verdade e da realidade: há procedimentos culturais e sociais que determinam o estatuto de verdade ou de mentira do texto, de realidade ou ficção, por exemplo, as histórias de pescador, na nossa cultura, são men- tira; as histórias que começam com o protocolo “era uma vez...” são irreais as histórias dos santos e de Cristo são verdadeiras para os católicos e ficcionais para os ateus; as fábulas de Esopo, ao apresentar a moral, dizem-se irreais, mas referem-se a comporta- mentos reais dos seres humanos; (b) como devem ser entendidos os enunciados: da maneira como foram dito ou ao contrário: existem marcas discursivas que indicam se o enunciado X deve ser interpretado como X ou como não-X. Há, portanto, dois tipos de contratos enunciativos: o de identidade e o de contraditoriedade. 2. Formas de interação: entrevistas e debates O diálogo está presente na vida de todos. A entrevista, em princípio, é uma aitvidade recorrente no cotidi- ano, pois, normalmente, os indivíduos atuam como entrevistadores e entrevistados em conversações diá- rias. No caso de entrevistas de televisão e rádio, os textos podem se desenvolver em menor grau de dia- logicidade, uma vez que a interação tende a ser mais assimétrica, diferentemente de conversações espon- tâneas entre amigos, por exemplo. Não obstante, as entrevistas também podem apresentar-se de forma menos assimétrica, se comparadas a palestras, nas quais a tendência é o turno ser mantido por um falante apenas. De acordo com Marcuschi (2006), a conversação pode ser classificada em natural (formal ou assimétrica, informal, coloquial ou simétrica) ou artificial (as desen- volvidas em peças, novelas, filmes etc., ou seja, as que seguem algum tipo de roteiro prévio). Considera-se si- métrica a conversação em que ambos os interlocutores têm o mesmo direito de tomar a palavra e de escolher o tópico discursivo, direcionando-o e estabelecendo o tempo de participação. Trata-se de uma “situação de conversação em que todos os interlocutores dão contri- buições relevantes em relação ao tópico, engajando-se, substantivamente na consecução do objetivo comum” (Preti, 2003, p. 267). Já nas formas assimétricas, um dos participantes tem o privilégio quanto ao uso da palavra, cabendo a ele iniciar a conversação, conduzi-la e mudar o tópico. São alguns exemplos de interações assimétricas as entrevistas, consultas, palestras, entre outras situa- ções nas quais, segundo o autor supracitado (2003, p. 266-267), apenas um falante “domina a cena”, ou seja, toma a palavra para si, enquanto o ouvinte somente contribui com “intervenções episódicas, marginais em relação ao tópico do fragmento”. Desse modo, só um interlocutor desenvolve o assunto, ao passo que o ou- tro “segue” o que está sendo dito com pequenos turnos inseridos na conversação. 17
  • 3. estudos semióticos, vol. 7, no 2 Nas palavras de Urbano et al (1996, p. 84), entre- vistas são “eventos conversacionais tipicamente de- senvolvidos por meio de Perguntas e Respostas”, ao contrário das conversas espontâneas “que não só as incluem – aliás como estrutura básica – como também se realizam por movimentos de fala de outros tipos”. Dessa forma, as respostas nas entrevistas “revelam uma complexidade que normalmente as conversações espontâneas desconhecem”. Fávero e Aquino (1998c, p. 122) asseveram que: Dependendo de quem seja o entrevistador ou do papel que lhe destinem, a entrevista pode construir apenas uma técnica em que se obtém respostas já esperadas a partir da orga- nização de um simples questionário e, neste caso, um pré-texto já estaria construído an- teriormente ao encontro e seria preenchido tão somente com as respostas do entrevis- tado. Tomando-se a interação em termos de possibilidade e de enquadramento em uma escala, poder-se-ia dizer que, nesses textos, observa-se um direcionamento para o menor grau nessa escala de interação. Por outro lado, é possível ocorrer um grau elevado de dialogicidade em que o entrevistador deixa o texto fluir e transcorrer de tal forma que este não se identifique com um mero monólogo (Fávero; Aquino, 1998c, p. 122). Segundo as autoras, em entrevistas, as perguntas configuram “estratégias cujos efeitos são cumulati- vos, isto é, o entrevistador pode formular um pedido de informação, de confirmação ou esclarecimento, ao mesmo tempo em que pode utilizá-la para introdu- zir, mudar, redirecionar o tópico” (1998c, p. 123). É possível, ainda, que esse expediente sirva para a manu- tenção do tópico, e seja utilizado para fins específicos, como provocar o entrevistado a fim de desestruturar sua resposta ao ponto de conseguir que sua imagem seja arranhada, sobretudo quando se trata de políticos. Desse modo, as perguntas e as respostas são fatores que colaboram para o estabelecimento da coerência, e não existe, necessariamente, uma única possibili- dade de resposta, pois esta se encontra relacionada ao contexto de ocorrência da pergunta. Nesse sentido, mesmo que um participante formule sua pergunta, sem apresentar interesse na maneira como seu in- terlocutor irá interpretá-la, fornecendo-lhe qualquer resposta, “a quase totalidade das perguntas é formu- lada em decorrência do contexto discursivo anterior, fato que permite indicar a importância do contexto precedente da pergunta o qual acaba por emoldurá-la” (Fávero; Aquino, 1998c, p. 124). Em relação à assimetria em entrevistas, o entrevis- tador, normalmente, tem a função de fazer a escolha dos assuntos, direcionar a conversação e distribuir os turnos, atribuindo ao entrevistado maior tempo de fala. Porém, o conceito de assimetria interacional, como afirmam Fávero e Andrade (1998a, p. 162), não está ligado, somente, “às funções dos interlocutores na situação comunicativa, mas principalmente a seus papéis sociais e suas características individuais”. A relevância social do entrevistado pode interferir no equilíbrio da entrevista e, nesse caso, o entrevistado seleciona os tópicos e conduz as passagens de turnos. Por outro lado, “há entrevistadores peculiares que do- minam a entrevista e não deixam ao entrevistado nem mesmo os turnos que lhe são devidos”. No que tange ao planejamento textual e tempo de elaboração, existem três momentos distintos na en- trevista, seja na LF (entrevistas televisivas, de rádio, entre outras) ou na LE (entrevistas publicadas em revistas, jornais, entre outras). Há o momento de pre- paração, o da entrevista e o da edição. Como na LF o planejamento é local, ou seja, desenvolve-se ao mesmo tempo em que se executa o enunciado, em tempo real, a entrevista apresenta-se como um “tipo especial de texto falado, porque o planejamento existe da parte do entrevistador e pode existir também, em certos casos, da parte do entrevistado [...]” (Fávero, 2000, p. 83). Os interlocutores, por terem mais tempo de elaboração, tendem a diminuir as marcas de reformulação textual. As estruturas de participação que caracterizam as entrevistas televisivas demonstram que cada partici- pante cumpre seu papel de forma efetiva. Assim, eles se alternam na construção do turno e revelam maior envolvimento interpessoal. Fávero e Aquino (1997, p. 70) afirmam que, nas entrevistas de televisão, [...] as perguntas, utilizadas de forma estraté- gica, dinamizam a interação verbal, ajustam a participação dos interlocutores, reorgani- zam o contexto e permitem ao entrevistador explorar a organização sequencial e, auto- maticamente, a organização contextual como recurso criativo para a organização das ativi- dades em que o entrevistador e entrevistado estejam engajados (Fávero; Aquino, 1997, p. 70). No entanto, não se pode desconsiderar o fato de que há um terceiro elemento que incide significativamente nesse tipo de interação: o público. A audiência é um “elemento propulsor de modificações na interação entre os participantes”, visto que a “interação se desenvolve exatamente em função da terceira-parte e é em razão de não se perder esse aliado que se precede a reformu- lações, preservando-se ou atacando-se a autoimagem” (Fávero, Andrade e Aquino, 1998b, p. 94). A partir desse jogo entre entrevistado, entrevistador e público, Fávero e Andrade (1998a, p. 157) postulam que os dois primeiros têm a tarefa de informar e conven- cer o público, desempenhando, portanto, “um duplo 18
  • 4. Vanessa H. Burgo, Eduardo F. Ferreira e Letícia J. Storto papel na interação: são cúmplices, no que diz respeito à comunicação, e oponentes, quanto à conquista desse mesmo público”. Desse modo, as entrevistas às vezes convergem para o polo do contrato e, às vezes, para o da polêmica. “No primeiro caso, os interlocutores buscam causar boa impressão na audiência, para isso tentam respeitar a fala do outro, costumam ceder o turno, evitam traços que demonstrem agressividade.” O estilo polêmico, por sua vez, permite que a interação possa desqualificar um dos participantes. Embora os estudos acerca de trocas entre dois in- terlocutores tenham sido o foco de análise de muitos pesquisadores, é preciso considerar que, quanto maior o número de participantes de um evento conversa- cional, mais complexa se torna a interação, ou seja, quando há três ou mais interlocutores, a tomada e a manutenção de seus turnos exigem maior negociação. O debate televisivo, então, é outra forma de interação realizada dentro de uma tríade, ou seja, realizada por três interlocutores em conjunto. Há, nessa situação, um “duplo esquema triangular: o que se desenrola no estúdio entre debatedores e animador e o que põe em cena dois debatedores diante de um público (telespec- tador) ” (Fávero; Aquino, 2002, p. 159). O trílogo, nas palavras das pesquisadoras acima referidas, “é potencialmente mais conflitual e menos constrangedor para os participantes do que o dílogo1 , pois um deles pode, provisoriamente, pôr-se de lado sem que isso ameace seriamente o desenrolar da con- versa”. No diálogo, o locutor L2, normalmente, faz suas intervenções após o locutor L1, e a sobreposição de vozes é a única maneira de interrupção. Já no trílogo, a fórmula “fala um por vez” nem sempre se aplica: nele não existem regras fixas; não há como prever, exatamente, o sucessor do turno; e o locutor L3 pode tomar a palavra, sem que ela lhe seja so- licitada. Por outro lado, essa situação pode causar menos constrangimento, se, por exemplo, o locutor L3 prolongar seu silêncio, delegando, momentaneamente, aos outros interactantes a função de desenvolver os assuntos em seu lugar. Mesmo se abstendo do turno, por um determinado tempo, seu dever de cooperar com o andamento da conversação é dividido com os outros participantes, sem que isso prejudique a interação como um todo. Dessa maneira, existem momentos em que o silêncio de um dos interlocutores se estende, “cabendo aos outros o desenvolvimento da conversa- ção”, em outras palavras, “a obrigação de cooperar fica diluída no grupo” (Fávero; Aquino, 2002, p. 161). O mediador, nesse caso, acaba tendo uma partici- pação menos ativa, já que o tempo de seus turnos é previamente estabelecido pela produção da emissora. Isso não quer dizer que sua importância possa ser desmerecida: ele propõe os tópicos, controla o tempo de cada adversário, enfim, conduz a interação de modo que não aparente tomar partido e se mostre imparcial, atuando como o árbitro ou juiz do embate. Em uma conversação casual, a interação, geral- mente, inclina-se para uma relação pacífica entre os interactantes, já em debates, ela converge para o lado contrário, pois a polêmica e a atmosfera de confronto sempre se fazem presentes. Apesar de não haver um vencedor declarado em um debate, os índices de au- diência são fatores altamente significativos, uma vez que eles denotam o número de pessoas a quem os textos foram destinados, e no caso da política, o bom desempenho do candidato pode dissuadir o eleitor a votar em seu adversário, bem como pode persuadi-lo a obter sua aprovação. Conforme McIlvenny (1996, p. 28-29), estudos acerca dos discursos políticos têm demonstrado que os oradores raramente desconsideram seu público, e “adaptam seus discursos ao momento”, a fim de sus- citar respostas de comum acordo com a audiência. Os aplausos, por exemplo, não são, “necessariamente, reações espontâneas”, pois podem ser incentivados pelo carisma que o falante transparece ter ou pelas estratégias argumentativas e retóricas que ele emprega. Por outro lado, em debates políticos, é possível que os falantes não recebam apenas respostas positivas da audiência; suas declarações podem ser alvo de re- ações desfavoráveis e, por conta disso, eles podem obter reações negativas da audiência (como as vaias), sobretudo, quando há iniciativa de outros que encora- jam o restante. Há a possibilidade, ainda, de que as vaias manifestem uma réplica à determinada postura arrogante, como a de se vangloriar dos próprios feitos ou de seu partido, em detrimento de outros. 3. A Instância de instauração do sujeito (a instalação de pessoas, espaços e tempos) Sobre a noção de sujeito, Benveniste (1995) afirma que a subjetividade é a capacidade de o locutor propor-se como sujeito de seu discurso que se funda no exercício da língua. Na enunciação, este locutor posiciona-se por meio de índices formais que revelam a subjeti- vidade na linguagem. Pelos pronomes pessoais, é possível que o sujeito se revele e, na instauração de um eu, necessariamente, instaura-se também um tu. Ambos são protagonistas da enunciação que, ao se referir a um indivíduo específico, a marca da pessoa é identificada. Com base nessas ideias, Brandão (1993, p. 49) conclui que: 1 Fávero e Aquino 2002 (p. 160) utilizam o termo dílogo (troca diádica), com base em Kerbrat-Orecchioni. As autoras reservam a “diálogo seu sentido etimológico: dia = prefixo grego, que significa através de, como em diacronia, diáfano, diagonal.” 19
  • 5. estudos semióticos, vol. 7, no 2 O sujeito de Benveniste é um eu que se carac- teriza pela sua homogeneidade e unicidade e se constitui na medida em que interage com um tu – alocutário – opondo-se ambos à não- pessoa, ele (eu – tu x ele). Apesar desse tu ser complementar e indispensável, na relação é o eu que tem ascendência sobre o tu. Deno- minando sintomaticamente esse eu de ego, sente-se, nas colocações de Benveniste, uma marcação bastante acentuada de uma subje- tividade “ego-cêntrica” a reger o mecanismo da enunciação (Brandão, 1993, p. 49). O sujeito é tomado como ponto de referência, pois ao enunciar-se, todo espaço e todo tempo organizam-se em torno do sujeito. Nesse sen- tido, espaço e tempo estão na dependência do eu, que neles se enuncia, caracterizando o aqui como o espaço do eu e o presente como o tempo em que coincidem o momento do evento descrito e o ato de enunciação que o descreve. Na visão de Fiorin (1996), todas as relações espaciais e temporais são organiza- das a partir desses dois elementos. Sendo a enunciação o lugar de instauração do sujeito, é também o lugar do ego, hic et nunc. O autor citado (1995a, p. 170) assevera que “todas as pessoas, espaços e tempos instalados no enunciado estão de alguma forma relaciona- dos ao eu-aqui-agora da enunciação”. De acordo com Barros (2003, p. 54): [...] o sujeito da enunciação faz uma série de opções para projetar o discurso, tendo em vista os efeitos de sentido que deseja produzir. Estudar as projeções da enunciação é, por conseguinte, verificar quais são os procedi- mentos utilizados para constituir o discurso e quais os efeitos de sentido fabricados pe- los mecanismos escolhidos (Barros, 2003, p. 54). A competência discursiva em sentido estrito com- preende o conjunto de procedimentos que visam a constituir o discurso como um espaço e um tempo povoados de atores diferentes do enunciador. Segundo Fiorin (1996), quando se adiciona a essa competência o depósito de figuras do mundo natural e de configu- rações discursivas que permite ao sujeito da enuncia- ção o exercício da figurativização, tem-se a competên- cia em sentido lato. O sujeito, ao designar-se como ‘eu’, apropria-se da linguagem inteira, construindo o mundo como objeto e se construindo a si mesmo, ao mesmo tempo. Isso se dá por uma orientação transitiva que constitui o que Greimas chama a intencionalidade fundadora da enunciação e, por isso, a enunciação é um enunciado cuja função predicativa é a intenciona- lidade e cujo objeto é o enunciado-discurso. 4. Debreagem e embreagem As concepções doravante explanadas neste item baseiam-se em Fiorin (1995b, 1996), as quais con- tribuem para os estudos acerca dos conceitos de de- breagem e embreagem. Conforme o autor, são dois os mecanismos de instauração de pessoas, espaços e tempos no enunciado: a debreagem e a embrea- gem. A debreagem é a operação em que a instância de enunciação se desprende de si e projeta para fora de si, no momento da discursivização, determinados termos ligados a sua estrutura de base, buscando a constituição dos elementos fundadores do enunciado, quais sejam: pessoa, tempo e espaço. Há a debreagem actancial, espacial e temporal. A debreagem tira da instância de enunciação a pessoa, o espaço e o tempo e projeta no enunciado um não-eu, um não-aqui e um não-agora. Existem dois tipos de debreagem. A primeira é a enunciativa, em que se instalam no enunciado os ac- tantes da enunciação (eu/tu), o espaço da enunciação (aqui) e o tempo da enunciação (agora), isto é, em que o não-eu, o não-aqui e o não-agora são enunciados como eu, aqui, agora. A segunda é a enunciva, em que se instauram no enunciado os actantes do enun- ciado (ele), o espaço do enunciado (algures) e o tempo do enunciado (então). A debreagem enunciativa e a enunciva produzem dois efeitos de sentido: o de sub- jetividade (instalação dos simulacros do ego-hic-nunc enunciativos, com suas apreciações dos fatos) e o de objetividade (eliminação das marcas de enunciação do texto, ou seja, da enunciação enunciada, fazendo com o discurso se construa somente com enunciado enunciado). É relevante considerar, ainda, a debreagem interna, que consiste no fato de que um actante já debreado, seja ele da enunciação ou do enunciado, se torna ins- tância enunciativa, que opera, então, uma segunda debreagem, que pode ser enunciativa ou enunciva. Em diálogos, por exemplo, com debreagens internas em que há mais de uma instância de tomada de palavra. Essas instâncias subordinam-se umas às outras: o eu que fala em discurso direto é dominado por um eu narrador que, por sua vez, depende de um eu pres- suposto pelo enunciado. Em função dessa cadeia de subordinação, diz-se que o discurso direto é uma de- breagem de segundo grau. Seria de terceiro se o sujeito debreado em segundo grau fizesse outra debreagem. Por questões de limitação da memória, é muito difícil que esse processo ultrapasse o terceiro grau ou mesmo que vá além do segundo. A embreagem, por sua vez, é o efeito de retorno à enunciação, produzido pela neutralização das catego- rias de pessoa e/ou espaço e/ou tempo, bem como 20
  • 6. Vanessa H. Burgo, Eduardo F. Ferreira e Letícia J. Storto pela denegação da instância do enunciado. Assim como ocorre na debreagem, há a embreagem actancial, espacial e temporal. A embreagem actancial concerne à neutralização de oposições na categoria de pessoa. Toda embreagem pressupõe uma debreagem anterior. Uma debreagem enunciativa (instalação de um eu) precede a embreagem. A neutralização da oposição de eu/ele em benefício do ele denega o enunciado, pois este é afirmado com uma debreagem prévia. Negar o enunciado estabelecido é retornar à instância que o precede e é pressuposta por ele, logo, obtém-se na embreagem um efeito de identificação entre sujeito do enunciado e sujeito da enunciação, tempo do enun- ciado e tempo da enunciação, espaço do enunciado e espaço da enunciação. A embreagem espacial diz respeito a neutralizações na categoria de espaço, e a temporal a neutralizações na categoria de tempo. Existem casos que apresentam embreagem homo- categórica, que acontece quando a debreagem e a embreagem que a segue afetam a mesma categoria (a de pessoa, a do espaço ou a do tempo), e a embreagem heterocategórica, em que as categorias presentes na debreagem e na embreagem subseqüente são distintas. Faz-se necessária, também, a distinção entre em- breagem enunciativa e enunciva. A primeira ocorre quando o termo debreante é tanto enunciativo como enuncivo, porém, o embreante é enunciativo. A se- gunda é aquela em que o termo debreante pode ser enunciativo ou enuncivo, porém, o termo embreante é enuncivo. A embreagem pode, ainda, ser classifi- cada em externa, quando produzida por uma instância enunciativa pressuposta pelo enunciado, e interna, quando realizada por uma instância enunciativa já inscrita no enunciado. Para perceber a especificidade da significação dos termos designativos de pessoa, de tempo e de espaço é necessário observarmos a diferença entre enunciado- tipo e enunciado-ocorrência. O primeiro considera o mesmo enunciado, independentemente das vezes que é enunciado, Já o segundo leva em conta cada uma das vezes que é enunciado. De modo geral, os ele- mentos do código lingüístico são idênticos do ponto de vista da significação tanto no tipo quanto na ocorrên- cia. As categorias que assumem o papel de indicar as circunstâncias da enunciação (pessoa, espaço, tempo) só podem ser interpretadas se a reportarmos ao ato único da enunciação que produziu o enunciado em que se apresentam. Os elementos lingüísticos referentes à pessoa, ao espaço e ao tempo dividem-se em dêiticos e anafóricos. Os primeiros referem-se à situação de enunciação, seja ela pressuposta, seja ela explicitada no texto pelo narra- dor (pronomes “eu”/“tu”, advérbios/locuções adverbi- ais, demonstrativos etc.). Os anafóricos pertencem ao enunciado enunciado e, portanto, são compreendidos em função das marcas de tempo e espaço instalados no enunciado e de actantes do enunciado anteriormente mencionados. 5. Análise dos dados No trecho abaixo, Lula (eu) se dirige a Alckmin (tu), respondendo sua pergunta: (1) “[...] Me parece que o governador não estava no Brasil em 2003 porque se ele tivesse, ele poderia começar esse debate me agradecendo [...]”. Vemos, em (1), que ocorre a neutralização na catego- ria de pessoa. Tem-se, formalmente, uma debreagem enunciva (um ele), mas que assume o valor de um tu, já que Lula está falando com Alckmin. Trata-se, portanto, de uma embreagem enunciva, pois há a neutralização da oposição tu/ele em proveito do último membro do par. Assinalamos mais outros exemplos2 de embreagem actancial enunciva em que o ele é utilizado no lugar do tu: (2) “[...] a proposta de reforma tributária está no Congresso Nacional, aliás, o governador foi co- migo e mais vinte e seis governadores entregar [...]”. (3) “[...] o governador não pode se esquecer que na campanha de 2002 surgiu o dossiê Caymã [...]. (4) “[...] o governador sabe que em 1989 veio a de- núncia prá eu fazer contra o Collor e eu resolvi não fazer porque prá mim tem que ter prova”. (5) “[...] Possivelmente o governador ainda tenha saudade do tempo da tortura [...]”. (6) “[...] Parece que o governador deve olhar para a cara do povo e dizer um pouco a verdade [...]”. (7) “[...] A verdade é que o Bajas Negri foi secretá- rio do CDHU (?), tem cento e duas condenações provisórias do Tribunal de Contas do Estado e uma das empresas contratadas é de um se- nhor chamado Abel que, segundo informações da imprensa, estava lá para comprar o dossiê. Mesmo assim, o governador diz que não sabia. O governador sabe que se tem um brasileiro que não tinha interesse nisso era eu”. Observa-se que nos segmentos acima, quando Lula diz “o governador”, se dirigindo ao próprio governador, tem-se um ele (termo enuncivo) que significa um tu. O termo debreante é enunciativo, mas o elemento que resta no enunciado é enuncivo, caracterizando, pois, a embreagem enunciva. Ao dirigir-se ao adversário pelo substantivo “governa- dor”, Lula emprega a terceira pessoa em substituição à 2 Os exemplos (1) a (7) referem-se a respostas de Lula às perguntas feitas por Alckmin. 21
  • 7. estudos semióticos, vol. 7, no 2 segunda do singular, produzindo um efeito de polidez e distanciamento, o que confere, por um lado, um tom de respeito à posição social do opositor. Por outro lado, ele também impõe situação recíproca, isto é, espera receber do oponente o mesmo tratamento pautado em seu papel social: o presidente. Seria oportuno para Lula conduzir o debate de forma ponderada e sem in- sultos, evitando possíveis situações desfavoráveis em função das denúncias de corrupção em seu governo. Assim, o presidente procura manter um nível mais elevado de argumentação, podendo amenizar o teor das acusações. Esse tipo de recurso é muito apropri- ado quando se pretende mostrar controle da situação, visto que esse efeito cordial e sociável no discurso pode ajudar a desestabilizar o oponente. Nas respostas de Alckmin a Lula também são obser- vadas embreagens enuncivas: (8) “[...] Comigo não tem essa história de que não assumo responsabilidade. Não se refere ao meu governo, se refere ao governo passado e que deve ser apurado, agora, o que o candidato Lula deve explicar é como é que compra ambulância superfaturada [...]”. (9) “[...] O Brasil retrocedeu na saúde. 1,6 bilhão de reais foram tirados da Saúde, as Santas Casas tão praticamente quebradas. Foi abandonado o mutirão de Saúde, aliás, o candidato Lula diz que a Saúde no Brasil tá quase perfeita [...]”. Alckmin, em suas falas, dirige-se ao enunciatário (tu) pelo termo “candidato”, baixando a força política do adversário, visto que, de autoridade máxima da Nação, ele passa à condição de candidato assim como o próprio enunciador. (10) “[...] porque diferentemente do governador Mário Covas, ele quis colocar em prática em São Paulo a chamada guerra fiscal. Bem, eu acho que o governador deve ter muita clareza que eu pensei que ele ia trazer a resposta porque faz exatamente trinta dias que ele quer saber da onde veio o dinheiro, ele quer saber cadê o dinheiro [...]” (Lula em resposta a Alckmin). O exemplo acima difere dos outros de embreagem analisados anteriormente. Notamos que Lula usa o substantivo “governador” toda vez que fala com seu adversário; porém, no recorte (10), ele não se refere a Alckmin, mas ao governador Mário Covas, havendo uma debreagem enunciva pela instauração de um ele no enunciado. Contudo, o “ele”, inserido logo depois, não diz respeito mais a Mário Covas e sim a Alckmin, que é com quem Lula está falando. Esse “ele”, en- tão, opera como um tu e torna-se uma embreagem enunciva. Nos trechos abaixo, Alckmin se dirige a Lula: (11) “Primeiro eu queria dizer ao telespectador... veja que ele não respondeu, não disse onde vai cortar um gasto. Ele vai é aumentar imposto para o povo brasileiro [...]”. (12) “[...] A minha pergunta é: presidente da Repú- blica é o chefe comandante, chefe das Forças Armadas. Tem a Agência Brasileira de Inteligên- cia, a ABIN, é o chefe do ministro que comanda a Polícia Federal, é um dos homens mais bem informados do país. Candidato Lula, de onde veio o dinheiro sujo, um milhão e setecentos e cinqüenta mil em dinheiro vivo, reais e dólares para comprar o dossiê fajuto?”. (13) “Veja, telespectador, não sabe também. Um mi- lhão e setecentos e cinqüenta mil dá para um trabalhador, que ganha salário mínimo, viver 416 anos. Uma fortuna! Não teve nem a curio- sidade de perguntar pro seu churrasqueiro de onde veio o dinheiro [...]”. (14) [...] Olhe nos olhos do povo brasileiro, candidato Lula e responda de onde veio o di- nheiro [...]”. Em (11), há uma debreagem enunciativa (instala- ção de um eu) em que o tu seria Lula, uma vez que é ele a pessoa com quem Alckmin fala, no entanto, o tu acaba sendo o telespectador. Isso se reforça pelo uso do imperativo “veja”, o que resulta em um meio de envolver o ouvinte, uma estratégia de chamar sua aten- ção para determinado aspecto do tema, criando um efeito de aproximação e cumplicidade com o público. Em seguida, o enunciador emprega uma debreagem enunciva (instalação de um ele), falando de Lula para o povo (diferentemente dos exemplos anteriores em que o ele significava um tu). O mesmo ocorre em (13). Alckmin instaura novamente o telespectador como seu enunciatário e Lula como a pessoa de quem se fala: “Veja, telespectador (tu), (ele, Lula) não sabe... (ele, Lula) não teve...”, utilizando, também, um expediente para atrair o ouvinte à reflexão proposta por ele: “veja, telespectador”. Já em (12) e (14), Alckmin deixa de falar com o povo diretamente e instala, pelo vocativo “candidato Lula” e pelo imperativo “olhe”, um tu que passa a ser o próprio Lula (debreagem enunciativa). Cabe salientar que ao se dirigir ao telespectador, Alckmin instaura um enunciatário (tu), porém, visando a atingir toda a população que está assistindo ao de- bate (vocês). Ocorre, então, uma embreagem por meio da qual a segunda pessoa do singular torna-se a se- gunda do plural, resultando em uma particularização que é convertida à generalização, ou seja, direcionar a fala a cada um individualmente implica em direcioná-la a todos. (15) “[...] Primeiro, Lula, não meça as pessoas pela sua régua. Eu não tenho no meu governo minis- 22
  • 8. Vanessa H. Burgo, Eduardo F. Ferreira e Letícia J. Storto tro condenado, não tenho indiciado pela polícia, não tenho assessor meu condenado, denunci- ado pelo procurador da República. Tenho 32 anos de vida pública honrada [...]” (Alckmin em resposta a Lula). Pelo vocativo e pela introdução de um eu no enunci- ado, vemos que há uma debreagem enunciativa que precede a embreagem (primeira pessoa significando a segunda do singular). Quando Alckmin nega as corrupções em seu governo, ele está, implicitamente, afirmando que no governo de Lula isso é uma prática corrente. O enunciador usa a primeira pessoa, aliada à forma negativa com o intuito de atingir aquele com quem fala. O efeito que se tem é o de acusação ao outro, construído pela substituição do tu pelo eu. Isso nos remete à idéia de que esse “não tenho...” significa “você tem...”, bem como, ao asseverar que tem 32 anos de vida pública honrada, fica subentendido que seu enunciatário não tem essa qualificação. Lula em resposta a Alckmin diz: (16) “[...] é importante lembrar que nós fizemos o país crescer como em nenhum momento da sua história dos últimos vinte anos [...]”. (17) “[...] e nós conseguimos em três anos e meio fazer com que o Brasil chegasse agora no fi- nal do ano a quase 135 bilhões de dólares de exportação”. O emprego do pronome “nós” é bastante difundido no meio político e freqüentemente utilizado por autori- dades para legitimar o papel de representantes do povo. Trata-se de um “nós” utilizado no lugar de um “eu”, um plural majestático que, vindo de um chefe de Estado, afasta a idéia de uma subjetividade que poderia soar como arrogância se tivesse dito, por exemplo: “eu fiz o país crescer” ou “eu consegui em três anos e meio fazer com que o Brasil chegasse agora no final do ano a quase 135 bilhões de dólares de exportação”. (18) “[...] na hora que a polícia tiver os dados, pode ficar certo que eu tenho mais interesse que vossa excelência de explicar ao povo brasileiro [...]”. O pronome de tratamento “vossa excelência” pode ser considerado como um caso híbrido: há a terceira pessoa com o valor de tu, que é uma embreagem, e o possessivo “vossa” (segunda pessoa) que, de certa forma, caracteriza uma debreagem3 . Essa forma de tratamento atribui ao discurso um efeito de ironia e afronta decorrente do respeito exacerbado em relação a seu enunciatário. (19) “[...] O escândalo do saguessuga, do vampiro é do seu governo e se começou antes deveria ter punido, não tem uma prova. A primeira denún- cia é de 2003 e eu sou republicano. Apure-se [...]” (Alckmin em resposta a Lula). Em (19), ocorre o uso de uma forma indeterminada em lugar da segunda pessoa, já que temos a sensação de que Alckmin, ao dizer “apure-se”, está colocando seu governo à disposição de todos os interessados; nesse caso, “vocês” da oposição, para que investiguem a veracidade de suas proposições. (20) “[...] primeiro porque eles já governaram muitos estados e governaram o país por muito tempo e ficou claro que a única coisa que eles sa- bem fazer primeiro é cortar gastos daquilo que não deveria cortar, que é o salário do povo tra- balhador. Segundo é importante lembrar que quem propôs a reforma da Previdência Social do setor público fui eu. Terceiro, é importante lem- brar que nós fizermos o país crescer como em nenhum momento da sua história dos últimos vinte anos [...]” (Lula em resposta a Alckmin). Em um primeiro momento, tem-se uma debreagem, pois esse “eles” refere-se ao governo Fernando Henri- que Cardoso, anterior ao de Lula e do mesmo partido do candidato Alckmin. Numa segunda leitura, esse “eles”, por extensão, aplica-se a “você/vocês” repre- sentado pelo oponente, constituindo, portanto, uma embreagem. Logo, Alckmin é responsabilizado pelos atos do governo precedente ao de Lula, por perten- cer à mesma facção política que FHC, o que produz um efeito de sentido de generalização. Cria-se, ainda, a impressão de que o enunciador busca mostrar a “verdade” dos fatos e, desse modo, conseguir manter, resgatar ou aumentar sua credibilidade perante o povo brasileiro. Considerações finais O discurso é visto como objeto produzido pelo sujeito da enunciação e como objeto de comunicação entre um destinador e um destinatário. Assinala-se, dessa forma, o emprego de determinados mecanismos que corroboram a acepção de um sujeito que aproveita momentos de embate para assumir uma posição efe- tiva de domínio e envolvimento do enunciatário. A enunciação projeta os actantes no discurso e, por meio dessas projeções, é possível examinar os procedimen- tos e elementos da sintaxe utilizados para produzir determinado efeito de sentido. Observamos, no corpus, o uso de elementos que marcam certo distanciamento do falante a respeito de assuntos delicados ou polêmicos. Isso contribui para afastar reações negativas e chamar a atenção para 3 No que concerne aos chamados pronomes de tratamento, baseamos a análise de acordo com Fiorin (1996, p. 89). 23
  • 9. estudos semióticos, vol. 7, no 2 outro aspecto do tema que seja mais conveniente para aproximar os ouvintes, obtendo, assim, sua aprova- ção. Por meio dessas marcas enunciativas, pode-se conhecer o ponto de vista dos falantes, suas atitu- des e posicionamentos, mesmo que não os revelem explicitamente. A rigor, o presente estudo apenas tentou realizar al- guns apontamentos acerca dos mecanismos de debre- agem e embreagem actanciais no texto político falado. Não pretendemos esgotar as discussões em relação a esse assunto, uma vez que observamos a relevância do mesmo para trabalhos desenvolvidos também no campo da análise da conversação. Nossa intenção está voltada, então, para a possibilidade de termos delineado alguns aspectos que possam ser úteis para futuras análises. Referências Barros, Diana Luz Pessoa de 2003. Teoria semiótica do texto. São Paulo: Ática. Benveniste, Émile. 1995. Problemas de linguística geral I. Campinas: Pontes. Brandão, Helena Hathsue Nagamine 1993. Introdução à análise do discurso. Campinas: Editora da Unicamp. Fávero, Leonor Lopes 2000. A entrevista na fala e na escrita. In: Preti, Dino (Org.). Fala e escrita em questão. São Paulo: Hu- manitas/FFLCH/USP, p. 79–98. (Projetos Paralelos- NURC/SP), v. 4. Fávero, Leonor Lopes; Andrade, Maria Lúcia da Cunha Victório de Oliveira 1998a. Os processos de representação da imagem pública nas entrevistas. In: Preti, Dino (Org.) Es- tudos de língua falada: variações e confrontos. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, p. 153–178. (Pro- jetos Paralelos-NURC/SP), v. 3. Fávero, Leonor Lopes; Andrade, Maria Lúcia da Cunha Victório de Oliveira; Aquino, Zilda Gaspar Oliveira de 1998b. Discurso e interação: a reformulação nas entrevistas. Delta: Revista de Documentação de Es- tudos em Linguística Teórica e Aplicada, São Paulo, PUC, v. 14, n. especial, p. 91–103. Fávero, Leonor Lopes; Aquino, Zilda Gaspar Oliveira de 1997. Textualização de produções orais formais - o caso da entrevista. In: Koch, Ingedore Grunfeld Vil- laça Koch; Barros, Kazue Saito Monteiro de (Orgs.) Tópicos em linguística de texto e análise da conver- sação. Natal: EDUFRN, p. 67–72. Fávero, Leonor Lopes; Aquino, Zilda Gaspar Oliveira de 1998c. As perguntas na organização das entrevis- tas. Revista da ANPOLL, São Paulo: Humanitas/ FFLCH/USP, n. 4, jan./jun., p. 121–135. Fávero, Leonor Lopes; Aquino, Zilda Gaspar Oliveira de 2002. A dinâmica das interações verbais: o trílogo. In: Preti, Dino (Org.). Interação na fala e na escrita. São Paulo: Humanitas/FFLCH/USP, p. 159–178. (Projetos Paralelos-NURC/SP), v. 5. Fiorin, José Luiz 1995a. A noção de texto na semiótica. Organon: Revista do Instituto de Letras da Universidade Fede- ral do Rio Grande do Sul, Porto Alegre: Instituto de Letras/ UFRGS, v. 9, n. 23, p. 163–173. Fiorin, José Luiz 1995b. A pessoa desdobrada. ALFA: Revista de Linguística, São Paulo, UNESP, v. 39:23–44. Fiorin, José Luiz 1996. As astúcias da enunciação: as categorias de pessoa, espaço e tempo. São Paulo: Ática. Marcuschi, Luiz Antônio 2006. Análise da conversação. São Paulo: Ática. McIlvenny, Paul 1996. Heckling in Hyde Park: Verbal Audience Par- ticipation in Popular Public Discourse. Language in Society, Cambridge University Press, v. 25, n. 1, p. 27–60. Preti, Dino (Org.) 2003. Análise de textos orais. V 1. São Paulo: Huma- nitas/ FFLCH/USP. (Projetos Paralelos-NURC/SP). Urbano, Hudinilson et al 1996. Perguntas e respostas na conversação. In: Castilho, Ataliba Teixeira de (Org.). Gramática do português falado. V. 3: As Abordagens Campinas: Unicamp/FAPESP, p. 75–98. 24
  • 10. Dados para indexação em língua estrangeira Burgo, Vanessa Hagemeyer; Ferreira, Eduardo Francisco; Storto, Letícia Jovelina Actancial Mechanisms of Shifting Out and Shifting In Employed in Spoken English Estudos Semióticos, vol. 7, n. 2 (2011), p. 16-25 issn 1980-4016 Abstract: This study aims to discuss the constitution of the category of person in political discourse. We intend to analyze the meaning effects produced by actantial mechanisms of shifting out and shifting in employed in conversation. The theoretical framework of this work is mainly based on Semiotic concepts, from a textual- interactive perspective of spoken language in relation to the principles of Conversation Analysis. The corpus is composed of transcriptions of the debate between the candidates Luiz Inácio Lula da Silva and Geraldo Alckmin, who were at the time running for the presidential position. This debate was aired on October 8, 2006, by the television broadcasting channel, Rede Bandeirantes. We decided to work with some parts of the first block, which presented the most important elements for the analysis. Assuming that every politician is concerned with obtaining the adhesion of the interlocutor and, consequently, getting their votes, it is natural that their goal is to preserve a positive image by addressing their speech to the viewers/listeners. In the initial part of the debate, however, the candidates have to ask their questions to one another, in a face-to-face interaction situation, even though the audience and journalists are present. In spite of the fact that the direct addressee seems to be the opponent, in fact, the real addressee is the audience. Keywords: shifting out, shifting in, spoken language Como citar este artigo Burgo, Vanessa Hagemeyer; Ferreira, Eduardo Fran- cisco; Storto, Letícia Jovelina. Mecanismos de debre- agem e embreagem actanciais empregados na língua falada. Estudos Semióticos. [on-line] Disponível em: http://www.fflch.usp.br/dl/semiotica/es . Editores Respon- sáveis: Francisco E. S. Merçon e Mariana Luz P. de Barros. Volume 7, Número 2, São Paulo, novembro de 2011, p. 16–25. Acesso em “dia/mês/ano”. Data de recebimento do artigo: 15/12/2010 Data de sua aprovação: 31/05/2011