1) O cenário macroeconômico global em 2015 será impactado pela queda no preço do petróleo, mas existem riscos como a desaceleração da China e instabilidade geopolítica.
2) No Brasil, os ajustes nas áreas fiscal, monetária e cambial devem permitir o retorno ao crescimento econômico consistente.
3) A zona do euro e o Japão enfrentam o perigo da deflação e precisam retomar o crescimento.
Perspectivas Econômicas 2015: desafios globais e brasileiros
1. CURRENT ISSUES
Janeiro 2015 volume 15 número 1
Perspectivas Econômicas para 2015
Luiz Nelson Porto Araujo
O cenário macroeconômico neste ano será fortemente impactado pela redução do preço do barril
de petróleo. Com o custo energético mais baixo o crescimento global deve ser maior, sem pres-
sões inflacionárias que justifiquem uma política monetária mais restritiva. No Brasil, após o fra-
casso da "Nova Matriz Econômica", adotada entre 2011-2014, os ajustes insinuados pela nova
equipe econômica nas áreas fiscal, monetária, cambial e institucional devem trazer desafios adi-
cionais e, quando operacionalizados, permitirão ao país retomar uma trajetória consistente de
desenvolvimento econômico.
Introdução
Em termos globais persistem as preocupa-
ções com o fraco crescimento do produto e
o aumento dos riscos geopolíticos. Essas
preocupações podem afetar as perspectivas
para a estabilidade financeira global caso as
perspectivas para um baixo crescimento de
longo prazo impliquem em reavaliações re-
pentinas das vulnerabilidades nas economias
mais endividadas, ou se alterações no ape-
tite por risco disparem fortes ajustes nos
mercados financeiros e subvertam o nível de
confidência dos consumidores e das indús-
trias.
O cenário macroeconômico em 2015 será
fortemente impactado pela redução do preço
do barril de petróleo; pela manutenção do
crescimento do Produto Interno Bruto (PIB)
nos Estados Unidos; pelo risco de deflação
na Zona do Euro e pela adoção de uma even-
tual política monetária de compra de ativos;
pelo risco de deflação e pela elevada razão
entre a dívida pública e o PIB no Japão; pelo
ajuste macroeconômico na Rússia, em fun-
ção das sanções do Ocidente e da queda do
preço do petróleo; pela redução do ritmo de
crescimento da economia chinesa em pata-
mar inferior ao histórico; pelos desafios da
infraestrutura na Índia; pelas disparidades
regionais, baixa produtividade da mão-de-
obra, elevada volatilidade e por políticas eco-
nômicas populistas, voluntaristas e inconsis-
tentes na América Latina, inclusive Brasil.
Em julho de 2014 o barril de petróleo Brent
era comercializado a US$ 115. Ao final de
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 2
dezembro foi cotado a US$ 57. Na primeira
semana deste ano a cotação atingiu US$ 50.
Em termos gerais, a queda do preço do barril
é positiva para o crescimento econômico na
medida em que aumenta o poder de compra
dos consumidores e diminui os custos de
produção (em particular, nos setores intensi-
vos em energia, como a petroquímica). Essa
relação entre o preço do petróleo e o desem-
penho econômico é bem definida: o ciclo en-
tre 1948 e 1973 (ano do primeiro choque do
petróleo), e aquele entre 1993 e 2008 (pri-
meiro ano da recente recessão) estão asso-
ciados a baixo custo do petróleo. As quatro
recessões do período do pós-guerra (1974-
75, 1981-82, 1990-91 e 2008-09) estão
associadas com custo crescente do petróleo.
Com o custo energético mais baixo em 2015
o crescimento global deve ser maior, sem
pressões inflacionárias que justifiquem uma
política monetária mais restritiva. Por outro
lado, o baixo preço do petróleo deve implicar
em deterioração das condições de crédito de
economias como a Rússia, a Venezuela e o
Irã, que conseguem equilibrar suas contas
com uma cotação do barril igual ou superior
à US$ 100. Mais ainda, pode afetar o setor
de gás de xisto nos Estados Unidos, que foi
financiado com títulos de elevado risco e re-
torno (high yield junk bonds). Assim, a forte
queda recente do preço do petróleo, ao
mesmo tempo em que deve suportar o cres-
cimento global pode trazer riscos para a es-
tabilidade financeira. Os ajustes serão mais
significativos caso a precificação do risco de
liquidez pelos investidores não reflita as mu-
danças estruturais na liquidez de mercado.
Isto poderia implicar em pressões sobre os
mercados de financiamentos para bancos e
empresas.
A expectativa é que em 2015 o crescimento
médio global seja de 3,5%, liderado pelas
economias mais desenvolvidas, mas grande
disparidade nas taxas de crescimento entre
os países. Esta expectativa está sujeita a di-
versos riscos que podem impactar negativa-
mente os resultados. Em particular, as eco-
nomias fortemente alavancadas da Zona do
Euro colocam dúvidas sobre a capacidade da
região em crescer de maneira sustentada.
Mais ainda, a recuperação da Zona do Euro
será desigual, sendo que as economias pres-
sionadas por dívida pública elevada provavel-
mente terão apenas uma modesta recupera-
ção. Além disso, as taxas de inflação indicam
um risco razoável de deflação e baixo cresci-
mento. A situação do Japão, por sua vez,
pode prejudicar as exportações, especial-
mente chinesas, com impactos negativos so-
bre o crescimento em 2015. A China en-
frenta desafios estruturais relevantes, asso-
ciados à redução da sua taxa de crescimento
e ao combate à corrupção endêmica, sendo
que as suas perspectivas são particular-
mente relevantes para os exportadores de
commodities da América Latina, da África e
do Oriente Médio. Diversos fatores geopolíti-
cos – conflitos armados na Ucrânia e no Ori-
ente Médio – podem adicionar novos fatores
negativos ao crescimento potencial. Por fim,
as condições nos mercados financeiros glo-
bais vão ficar mais apertadas do que eram
antes do FED anunciar o "taper talk" no pri-
meiro semestre de 2013, traduzindo-se em
maiores custos de empréstimos internacio-
nais, particularmente com a recente volatili-
dade nos mercados emergentes.
No Brasil, após o fracasso da "Nova Matriz
Econômica", adotada entre 2011-2014, os
ajustes insinuados pela nova equipe econô-
mica nas áreas fiscal, monetária, cambial e
institucional devem trazer desafios adicionais
e, quando operacionalizados, permitirão ao
país retomar uma trajetória consistente de
desenvolvimento econômico. Especifica-
mente, esses ajustes passam pela recons-
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trução do tripé macroeconômico – responsa-
bilidade fiscal (sem a agora famosa "contabi-
lidade criativa"), meta de inflação (sem bus-
car o seu teto mas, sim, o seu centro) e câm-
bio flutuante (salvo intervenções pontuais
decorrentes de choques externos adversos)
–, pelo realinhamento de preços relativos,
pelo abandono de subsídios cruzados para
diversos setores – em parte através da polí-
tica de concessão de empréstimos do
BNDES aos "campeões nacionais" –, pela re-
organização da estrutura produtiva e pela for-
mulação e oferta de novos projetos de par-
cerias público-privadas (que permitiram o au-
mento do investimento).
Estados Unidos – Retomada do
Crescimento e Transformação
Estrutural
Em 2014, os Estados Unidos continuaram –
com sucesso – a política de acomodação
monetária com retomada da produção e do
emprego. O ano de 2014 deve apresentar
um crescimento do PIB de 2,2%, a inflação
ao consumidor deve ser de 2,0% (exata-
mente a meta implícita na política monetária
do Federal Reserve Bank - FED), a taxa de
desemprego deve alcançar 6,3% e o déficit
em transações correntes -2,5% do PIB.
O ano encerrado foi marcado por transições
importantes no FED. Primeiro, Bem Ber-
nanke deixou a presidência quando o seu
mandato expirou ao final de janeiro e foi su-
cedido por Janet Yellen, até então, vice-pre-
sidente. Segundo, o Federal Open Market
Committee (FOMC) – responsável pelas ope-
rações de mercado aberto – concluiu com
sucesso o seu programa de compra de ativos
(Quantitative Easing - QE), completando o ta-
pering off do início do ano e estabelecendo
um limite de US$ 4,2 trilhões para a sua car-
teira (apenas US$ 480 bilhões sete anos an-
tes). Além disso, com a economia gradual-
mente convergindo à interpretação do FED
do seu duplo mandato de máximo emprego
e preços estáveis, ele ajustou as suas inten-
ções com relação à sua política de taxa de
juros próxima de zero.
As projeções para 2015 são de crescimento
do PIB de 3,2%, manutenção da taxa de in-
flação ao consumidor (2,0%), redução da
taxa de desemprego para 6,0% e manuten-
ção do déficit em transações correntes (-
2,5% do PIB). Neste cenário, o maior desafio
para a política monetária neste ano pode es-
tar associado ao início do aumento das taxas
de juros, que são mantidas próximas de zero
desde o outono de 2008, após o pânico do
mercado que se seguiu à quebra da Lehman
Brothers. O FOMC manteve, nas reuniões de
setembro e outubro, a meta para a taxa dos
Fed funds entre 0% e 0,25% a.a, sugerindo
que não deve ser desprezada a possibilidade
de manutenção das taxas em vigor, principal-
mente se – apesar do comportamento do PIB
e de desemprego – a taxa de inflação man-
ter-se ao redor da meta de longo prazo de
2,0%.
A principal transformação estrutural nos Es-
tados Unidos, desde o início do segundo se-
mestre de 2007, é o rápido crescimento na
produção doméstica de combustíveis "não
convencionais", impulsionado sobretudo pela
exploração das significantes, mas anterior-
mente inacessíveis, reservas de gás de natu-
ral (principalmente, xisto). Este crescimento
é o produto de avanços na tecnologia de pro-
dução, em particular, uma nova combinação
de perfuração horizontal e fraturamento hi-
dráulico. Com o aumento da produção do-
méstica reduziu-se a dependência de energia
importante, diversificou-se a economia e, em
termos globais, contribuiu de maneira signi-
ficativa para a queda do preço do barril de
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petróleo, com deslocamento importante dos
fluxos de exportação e importação.
O maior desafio do presidente Obama na
condução da economia dos Estados Unidos,
dois anos antes da conclusão do seu se-
gundo mandato, agora é enfrentar a ferrenha
oposição republicana – agora majoritária –
na Câmara dos Deputados e do Senado que
tomou posse nesta semana. São previstos
embates em relação à política de saúde
aprovada pelo presidente em março de 2010
(o Patient Protection and Affordable Care Act,
conhecido como Obamacare), ao anúncio
em dezembro do ano passado do restabele-
cimento de relações diplomáticas com Cuba,
à política de imigração e, ainda, a aprovação
do oleoduto Keystone XL, da TransCanada,
que está há anos sob avaliação da adminis-
tração democrata. Como no passado recente
é muito provável que os conflitos esperados
no Congresso impactem o desempenho eco-
nômico da economia norte-americana.
Zona do Euro e Japão – O Perigo
da Deflação e a Necessidade de
Crescimento
Zona do Euro
A Zona do Euro deve encerrar o ano de 2014
com um crescimento do PIB de 0,7%, uma
inflação ao consumidor de 0,5% (muito
abaixo da meta implícita), uma taxa de de-
semprego de 11,5% e um déficit em transa-
ções correntes de -2,0% do PIB. As dispari-
dades destes indicadores entre os 28 Esta-
dos-Membros da União Europeia (o Euro en-
trou em circulação na Lituânia em
01/01/2015, elevando o número de Esta-
dos-Membros que utilizam a moeda única
para 19) é imensa e continuará no horizonte
próximo.
Em termos gerais, a crise econômica na
Zona do Euro não terá alterações significati-
vas em 2015, apesar de um pouco suavi-
zada. Em 26/07/2012, Mario Draghi, o pre-
sidente do Banco Central Europeu, afirmou
em uma conferência em Londres que faria "o
que fosse necessário" para preservar o Euro.
Esta posição, simples e direta, permitiu a es-
tabilidade monetária e política da região em
um momento de grande pressão. Mas, em
2015 o desafio continua a ser a retomada
do crescimento e o risco de deflação, na me-
dida em que nenhum destes dois problemas
foi subjugado no ano encerrado.
O receio, como observado durante a Grande
Depressão da década de 1930, é que a
queda continuada dos preços induza os con-
sumidores e empresários a postergarem os
seus dispêndios, na medida em que a expec-
tativa é que os preços continuem a cair. Em
um cenário de baixo crescimento, preço do
petróleo em queda e sem outras pressões in-
flacionárias o mais importante desafio do
Banco Central Europeu em 2015 será, sem
dúvida, a possibilidade de deflação.
As medidas anunciadas em 2014, incluindo
taxas sobre os recursos dos bancos deposi-
tados junto ao Banco Central, de modo a in-
duzir o aumento dos empréstimos, não tive-
ram os resultados esperados. A expectativa
é que apenas uma política monetária com
um quantitative easing – semelhante ao ado-
tado nos Estados Unidos nos últimos anos –
seja capaz de produzir os resultados espera-
dos. Até este momento a Alemanha é a res-
ponsável pela mais forte oposição à esta po-
lítica mas, em 2015, pode abandonar esta
posição com a divulgação de novas informa-
ções sobre a fragilidade econômica da re-
gião. Existe, ainda, a expectativa de que a
indecisão com relação à adoção desta polí-
tica pode gerar pânico entre os investidores.
O próprio Bank of England já manifestou em
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diversas oportunidades que a fragilidade da
Zona do Euro é uma das maiores ameaças à
recuperação econômica do Reino Unido.
As projeções para 2015 são sugerem um ce-
nário macroeconômico melhor em relação
ao período recente, com um crescimento do
PIB de 1,2%, inflação de 1,0% (ainda sob
risco de deflação), desemprego de 11,0% e
déficit em transações correntes de -2,0% do
PIB (igual ao ano anterior). Mais uma vez, as
disparidades econômicas acentuadas entre
os países não deve implicar em um cenário
de estabilidade, inclusive política e social.
Em termos individuais, a Espanha e a Grécia
já estão em uma trajetória deflacionária mas
ainda permanece o risco de contágio no res-
tante da região. Mais ainda, as eleições
anunciadas para o início deste ano na Gré-
cia, com possibilidade de vitória da esquerda
– que possui posição radicalmente contrária
ao ajuste econômico dos últimos anos – deve
não apenas trazer mais turbulência a um ce-
nário já bastante complicado mas, principal-
mente, implicar até mesmo na saída do país
da Zona do Euro.
Em termos estruturais, a Zona do Euro en-
frenta três grandes desafios: primeiro, custos
crescentes de energia – que deve ser suavi-
zado com a queda do preço do barril de pe-
tróleo; segundo, baixa velocidade de recupe-
ração da atividade econômica e, terceiro,
queda da produtividade do trabalho (decor-
rente de um mercado de trabalho engessado
por legislação trabalhista e queda do nível de
inovação, principalmente no setor industrial).
Em particular, por exemplo, os custos de-
crescentes da energia na Europa, especial-
mente na Alemanha, estão induzindo um
processo progressivo de transferência para
outras regiões das indústrias intensivas em
energia e, consequentemente, à perda do
primeiro elo da cadeia de valor do setor in-
dustrial. Este é um dos riscos mais importan-
tes ao crescimento e aumento da produtivi-
dade nos países daquela região.
Um termômetro da atual dinâmica econô-
mica da Zona do Euro e dos ajustes que de-
vem ser operacionalizados é a cotação do
euro, que no início deste ano caiu para o seu
menor valor dos últimos nove anos em rela-
ção ao dólar. Sem dúvida nenhuma esta co-
tação reflete, neste momento, as expectati-
vas do mercado com relação à situação po-
lítica da Grécia, que terá impactos sobre a
sua própria sustentabilidade macroeconô-
mica no curto prazo.
Japão
Em 2014, o Japão, a segunda maior econo-
mia da Ásia, deve ter um crescimento do PIB
de 0,8%, uma inflação ao consumidor de
2,5%, uma taxa de desemprego de 3,7% e
um superávit em transações correntes 1,0%
do PIB. O problema estrutural do país (prati-
camente ao longo das últimas duas décadas)
continua sendo o baixo crescimento e o risco
de deflação, apesar das inúmeras tentativas
de redesenho da política macroeconômica
em sucessivos governos.
A política econômica adotada pelo primeiro
ministro Shinzo Abe, eleito em dezembro de
2012 e reeleito em dezembro de 2014 – de-
nominada de Abenomics – tem tido sucesso
em resolver alguns dos principais problemas
da economia japonesa. Esta política está
fundamentada em três elementos, usual-
mente referidos como "as três flechas": polí-
tica monetária agressiva, política fiscal flexí-
vel e uma política estrutural focada no cres-
cimento.
Apesar das iniciativas adotadas o governo ja-
ponês ainda deve buscar outras medidas
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para assegurar o crescimento sustentado, ti-
rar o país de um ciclo deflacionário de mais
de duas décadas e estabilizar as finanças pú-
blicas. Vale observar que, apesar da nova po-
lítica econômica, o Japão teve uma queda da
produção no segundo semestre de 2014,
derivado do impacto do aumento do imposto
sobre vendas em abril e que resultou em
uma queda acentuada no consumo das fa-
mílias.
A meta é uma inflação de 2,0% em 2015
fundamentada em uma política monetária
definida pela expansão da base monetária e
posse de títulos públicos. O Banco Central do
Japão denominou esta política de Quantita-
tive and Qualitative Monetary Easing (QQE).
Os resultados até este momento sugerem
que os mercados financeiros podem ter dei-
xado um equilíbrio deflacionário: os preços
das ações aumentaram, a taxa de câmbio
desvalorizou-se e as taxas de juros de longo
prazo mantiveram-se baixas. Além disso, a
economia apresenta crescimento mais forte
induzido pela demanda doméstica, conju-
gada com queda no desemprego e melhoria
no mercado de trabalho.
A flexibilização quantitativa (quantitative eas-
ing) resultou em significativa depreciação do
iene durante 2013-14, ajudando a aumentar
a competitividade da exportação japonesa e
os lucros das empresas. No entanto, o foco
principal durante o seu próximo mandato
será a implementação convincente de refor-
mas estruturais, uma vez que elas são es-
senciais para aumentar a taxa de cresci-
mento do PIB a médio e a longo prazos.
A menos que o primeiro ministro Abe possa
entregar reformas significativas em breve, as
projeções para 2015 indicam um cenário
macroeconômico relativamente estável em
relação ao ano anterior, com o mesmo cres-
cimento do PIB (0,8%), devido ao efeito ne-
gativo de população em declínio ao longo das
últimas décadas e a necessidade de estabi-
lizar a elevada dívida pública em relação ao
PIB (de 227,0%). A inflação ao consumidor
deve cair para 2,2% (abaixo da desejada), a
taxa de desemprego deve permanecer está-
vel (3,7%), assim como o superávit em tran-
sações correntes (1,0% do PIB).
Brics – Nada em Comum, Além
das Disparidades Econômicas e
Políticas
Rússia
As relações entre a Rússia e Ocidente pas-
sam pelo pior momento da sua história
desde o fim da Guerra Fria e a queda do
Muro de Berlin devido à crise da Ucrânia.
Muitos países ocidentais acusam Moscou de
apoiar com armas e tropas os separatistas
que tomaram o controle de territórios no
leste do país (anexando a Crimeia) e, como
punição, tanto os Estados Unidos como a
União Europeia adotaram sanções econômi-
cas, e pessoais, contra a Rússia.
Desde meados de junho do ano passado, o
preço do barril de petróleo caiu 45% e o ru-
bro desvalorizou-se 39% em relação ao dólar
norte americano. O rubro continuou a cair
apesar do aumento da taxa de juros pelo
Banco Central da Rússia, sendo que os mer-
cados financeiros globais consideram que
não existe compensação para o congela-
mento da liquidez russa: a única saída rea-
lista para o derretimento financeiro da Rússia
é que as sanções impostas pelo Ocidente se-
jam removidas e, para que isso aconteça, ela
deve evacuar a Ucrânia.
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Em 2014, a Rússia deve apresentar um cres-
cimento do PIB de 0,2% (muito próximo da-
quele do Brasil), uma taxa de inflação ao
consumidor de 7,5%, uma taxa de desem-
prego de 6,0% e um superávit em transações
correntes -2,5% do PIB. De fato, a economia
russa está perto de estagnação, com uma
demanda doméstica fraca, sendo que o nível
de confiança dos consumidores e das em-
presas já eram fracos em 2013, devido à
persistência de problemas estruturais.
O aumento dos riscos geopolíticos e o novo
ambiente de incerteza política e sanções ti-
veram um impacto adicional negativo sobre
a atividade econômica através de três ca-
nais: primeiro, a maior volatilidade no mer-
cado de taxa de câmbio e uma significativa
desvalorização da moeda nacional; segundo,
o limitado acesso aos mercados financeiros
internacionais, para os bancos e sociedades
não financeiras e, terceiro, a manutenção da
baixa confiança dos consumidores e das em-
presas sobre as perspectivas de crescimento
futuro.
Existem riscos substanciais para as perspec-
tivas de crescimento da Rússia em 2015-
2016, na medida em que o país precisa de
adequar às sanções internacionais e estabi-
lizar a economia. As projeções para 2015
são de crescimento do PIB de 0,5%, manu-
tenção da taxa de inflação ao consumidor
(7,5%), aumento da taxa de desemprego
para 7,0% e queda do superávit em transa-
ções correntes para 2,9% do PIB. Um cres-
cimento maior dependerá de um aumento
relevante do investimento privado e do nível
de confiança dos agentes econômicos, o que
exigirá a criação de um ambiente de política
previsível e uma agenda de reformas estru-
turais que ataque as restrições internas e ex-
ternas ainda não equacionadas. Em resumo,
estas reformas precisam se concentrar em
melhorar: primeiro, as instituições econômi-
cas para assegurar a estabilidade das finan-
ças públicas; segundo, o nível educacional e
a infraestrutura para tornar os trabalhadores
mais produtivos; e, por fim, o regime de con-
corrência para incentivar o empreendedo-
rismo e as empresas privadas.
Índia
Com uma população de 1,2 bilhões de habi-
tantes e a 10º maior economia do mundo, a
Índia apresenta desde a sua independência,
em 1947, uma das maiores taxas de desen-
volvimento econômico historicamente obser-
vadas. Em 2013, o país estava em crise e,
agora, deve apresentar um dos melhores re-
sultados dentre as economias emergentes,
sendo que esta recuperação é fomentada
pela queda do preço do barril de petróleo – o
país é um grande importador de óleo e gás.
O ano de 2014 deve apresentar um cresci-
mento do PIB de 5,5% (inferior à média his-
tórica dos últimos anos), uma taxa de infla-
ção ao consumidor de 7,9%, uma taxa de
desemprego de 4,0% e um déficit em tran-
sações correntes de -2,2% do PIB.
A eleição em maio de 2014 do primeiro mi-
nistro Narendra Modi – eleito pelo Partido do
Povo Indiano (Bharatiya Janata Party), de di-
reita, com vínculos com a organização naci-
onalista hindu Rashtriya Swayamsevak
Sangh –, foi um evento significativo na Índia.
Ele derrotou o Partido do Congresso, que go-
vernou a Índia por 54 de seus 67 anos de
independência. Ao conquistar a maioria ab-
soluta no parlamento pela primeira vez desde
1984, Modi não precisará fazer alianças para
realizar as mudanças econômicas defendi-
das pelo seu partido.
Em apenas seis meses o novo primeiro mi-
nistro promoveu uma revisão dramática da
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 8
política externa da Índia e do seu perfil glo-
bal. Seu mantra de política externa é triplo:
consolidação geoestratégica no sul da Ásia,
atração de investimento direto estrangeiro e
aspiração a tornar-se uma potência mundial.
Em consonância com esta revisão Japão,
China, Rússia e Austrália estão se tornando
mais importantes para a Índia, enquanto que
os EUA e a Europa estão perdendo terreno.
As pressões inflacionárias caíram fortemente
nos últimos meses e o Banco Central Indiano
já sinalizou um afrouxamento da política mo-
netária no início de 2015. A combinação de
um estímulo monetário com as reformas
econômicas podem implicar no fortaleci-
mento da recuperação da economia indiana
no médio prazo. O governo do primeiro mi-
nistro Modi também ressaltou os investimen-
tos em infraestrutura como uma prioridade
na agenda de reformas econômicas, especi-
almente em energia e transporte.
A combinação das reformas econômicas e
uma política monetária acomodativa do
Banco Central Indiano em 2015 podem via-
bilizar a retomada do crescimento econô-
mico a taxas acima de 7,0% ao ano a partir
de 2017. As projeções para 2015 são de
crescimento do PIB de 6,5%, queda da taxa
de inflação ao consumidor para 7,5% e da
taxa de desemprego para 3,8% e manuten-
ção do déficit em correntes em -2,2% do
PIB.
China
Com uma população de 1,3 bilhões de habi-
tantes a China tornou-se, recentemente, a
segunda maior potência econômica mundial,
atrás apenas dos Estados Unidos. Desde a
introdução das reformas econômicas em
1978, a China transitou de uma economia
centralmente planificada para uma baseada
no mercado, com rápido crescimento econô-
mico e desenvolvimento social. Com o PIB
crescendo à uma taxa média anual de 10,0%
ao longo das últimas décadas, mais de 500
milhões de chineses deixaram a pobreza.
Neste período ela tornou-se a maior exporta-
dora (US$ 2,2 trilhões em 2013, seguida pe-
los Estados Unidos com US$ 1,6 trilhões),
maior detentora de reservas internacionais
(US$ 3,8 trilhões em 2013, seguida pelo Ja-
pão com US$ 1,3 trilhões). Em poucos anos
deve tornar-se, também, um dos maiores ex-
portadores de investimento direto estran-
geiro e um dos poucos países com uma mo-
eda de reserva internacional.
Como qualquer outro país em desenvolvi-
mento, a China enfrenta diversos desafios,
dentre eles: extensa pobreza (segunda maior
população de pobres, apenas atrás da Índia),
elevada desigualdade da renda, rápida urba-
nização, envelhecimento da população, mi-
gração interna da mão-de-obra (para as ci-
dades), sustentabilidade ambiental, conflitos
geopolíticos na região Ásia-Pacífico e corrup-
ção. O objetivo do 12º Plano Quinquenal
(2011-2015) busca solucionar estes desa-
fios, com foco na qualidade de vida da popu-
lação.
A China deve apresentar em 2014 um cres-
cimento do PIB de 7,4% (muito inferior à mé-
dia histórica dos últimos anos mas consis-
tente com a trajetória de queda observada
no último triênio), uma inflação ao consumi-
dor de 2,4%, uma taxa de desemprego de
4,0% e um superávit em transações corren-
tes de 1,8% do PIB. O ano passado foi parti-
cularmente difícil para a economia chinesa,
que buscou adequar o excesso de crédito cri-
ado após a estratégia de "crescimento-a-
todo-custo" adotada após a crise de 2008.
Em termos estruturais a China está, de fato,
moderando o seu ritmo de crescimento em
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função de diversos fatores, de ordem interna
e externa. Primeiro, a recessão, iniciada em
2007 no mercado subprime hipotecário dos
Estados Unidos, expandindo-se para uma
crise de dívida soberana na Zona do Euro e
terminando em uma crise econômico-finan-
ceira global. Segundo, os desequilíbrios
econômicos no mercado imobiliário residen-
cial local, com uma imensa oferta sem de-
manda. Terceiro, as consequências da rá-
pida expansão de crédito no sistema finan-
ceiro a partir de 2009, com o surgimento de
empréstimos problemáticos (ainda não total-
mente identificados).
As projeções para 2015 são de crescimento
do PIB de 7,0% (continuando a trajetória de
queda), manutenção taxa de inflação ao
consumidor (2,4%) e da taxa de desemprego
(4,0%) e aumento do superávit em transa-
ções correntes para 2,0% do PIB. O cresci-
mento mais lento da economia chinesa
neste ano estará, ainda, associado a um
preço mais baixo do barril de petróleo. Assim,
a China irá "exportar deflação" para o resto
do mundo: os preços das mercadorias que
saem da China já estão caindo e esta ten-
dência deve continuar. Os Estados Unidos, a
Europa e a América Latina serão pressiona-
dos por produtos chineses baratos, redu-
zindo a inflação e, na Zona Euro, com possi-
bilidade até mesmo de deflação. Como re-
sultado, os bancos centrais, confrontados
com uma taxa de inflação inferior à meta,
podem ser mais cautelosos sobre o aumento
das taxas de juros, mesmo se suas respecti-
vas economias estiverem crescendo a um
ritmo saudável, arriscando a recriação das
condições que levaram ao surgimento das
bolhas de ativos pré-2007.
Um risco relevante para a economia mundial
é uma desaceleração chinesa mais acentu-
ada do que o esperado, com um cenário de
"pouso forçado" (crescimento do PIB redu-
zido para apenas 5,0% e permanecendo
baixo por um período prolongado). Uma de-
saceleração mais intensa da China reduziria
as exportações de países como a Alemanha,
que vendem máquinas e equipamentos, e
aqueles como o Brasil, que fornecem maté-
rias-primas (em particular, produtos minerais
e agropecuários). Além disso, os preços das
commodities sofreriam declínios ainda mais
significativos, que prejudicariam os países
exportadores de recursos naturais em todo o
mundo (este ano, o Brasil sofreu os efeitos
negativos da queda da cotação do minério de
ferro decorrente, em grande parte, da redu-
ção do crescimento chinês). Em termos ge-
rais, esta desaceleração implicaria em ondas
de choque negativas para o resto do mundo
prejudicando o crescimento, o emprego e as
exportações.
América do Sul – Os Desafios do
Populismo, da Desigualdade e do
Preço do Petróleo
O desenvolvimento da América do Sul (e
mesmo da América Latina) ao longo dos últi-
mos 50 anos é um dos mais curiosos episó-
dios na histórica econômica moderna. Em
1960, o PIB dessa região equivalia a 30%
daquele dos Estados Unidos; em 2010, esta
participação era pouco superior à 20%. As-
sim, não apenas o nível de renda é baixo
mas, ainda, ela ficou relativamente menor.
Este resultado contrasta fortemente com
aquele observado em diversos países da re-
gião da Ásia-Pacífico (em particular, China,
Japão, Índia e Coréia do Sul), que se encon-
travam em estágio de desenvolvimento infe-
rior ou similar. Atualmente, o principal pro-
blema da região é a queda absoluta e relativa
da renda – particularmente, em países como
Argentina, Bolívia, Peru e Venezuela. Além
10. C U R R E N T I S S U E S
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 10
disso, a economia brasileira, a maior da re-
gião (em termos de PIB e população), estag-
nou nos últimos quatro anos, em função de
uma política macroeconômica populista, vo-
luntarista e inconsistente.
Desde o pós-guerra o desempenho econô-
mico da América Latina está associado a ten-
tativas de ajuste – como no caso do Brasil
recente, populistas, voluntaristas e inconsis-
tentes – aos desequilíbrios estruturais e a cri-
ses sucessivas, econômicas e políticas. A
elevada volatilidade da atividade econômica
é um fato nestes países e, de fato, uma das
razões do seu baixo desempenho. Um outro
problema, certamente associado ao anterior,
é a baixa produtividade do trabalho (PIB por
trabalhador) e total dos fatores. Apesar de
todas as tentativas, e dos avanços conquis-
tados, os problemas ainda permanecem e,
consequentemente, a qualidade de vida da
população local é muito inferior àquela que
poderia ser atingida.
A América do Sul deve apresentar em 2014
um crescimento do PIB de apenas 0,9% (in-
ferior à média histórica dos últimos anos),
uma inflação ao consumidor de 9,5%, uma
taxa de desemprego de 6,0% e um déficit em
transações correntes de -2,5% do PIB. As
disparidades entre os países da região são
imensas. A taxa média de crescimento regi-
onal foi determinada, principalmente, pelo
fraco – ou negativo – crescimento de algu-
mas das maiores economias: Argentina (-
0.2%), Brasil (0,2%) e Venezuela (-3.0%).
Comparativamente, o crescimento da Bolívia
foi de 5,2%, da Colômbia, de 4,8%, e do Pa-
raguai e Equador, 4,0%.
As projeções para 2015 são de crescimento
do PIB de 1,5%, taxa de inflação ao consu-
midor de 9,0%, manutenção da taxa de de-
semprego (6,0%) e aumento do déficit em
transações correntes para -2,8% do PIB.
Dois dos principais riscos para a região neste
ano são a deflação na Zona do Euro e a vo-
latilidade em outras economias emergentes
– em particular, na China.
Este crescimento também deve ser bastante
desigual. Para as maiores economias (Brasil,
Chile, Colômbia, Peru e Uruguai), financeira-
mente abertos e exportadores de commodi-
ties, o crescimento médio, deve ficar abaixo
de 4,0%, sendo a menor taxa de cresci-
mento do PIB esperada para o Brasil. Entre
esses países, as condições internas serão
fundamentais para a manutenção da estabi-
lidade neste ano. Por exemplo, o Brasil está
buscando superar os gargalos de oferta que
limitam a expansão da produção e aumen-
tam a taxa de inflação. Para outros exporta-
dores de commodities da região o quadro é
ainda menos favorável. Na Argentina e Vene-
zuela, as pressões sobre a inflação, o sando
em transações correntes e a taxa de câmbio
mercados remontam a 2013 e devem conti-
nuar neste ano.
Além disso, uma taxa de inflação mais baixa
nas economias mais desenvolvidas pode re-
duzir ainda mais as expectativas futuras de
inflação, implicando em um aumento das ta-
xas de juros reais (com taxas de curto prazo
perto de zero). Ainda, o crescimento mais
fraco de outras economias emergentes deve
impactar negativamente os mercados de
commodities, sendo que o esperado au-
mento da demanda global deve ser contra-
balançado por preços de commodities mais
baixos. Por fim, temos os efeitos do término
dos estímulos monetários nos Estados Uni-
dos e o reequilíbrio na China. Cada uma des-
tas variáveis contribui para o aumento da vo-
latilidade macroeconômica global e regional.
Assim, os formuladores de políticas precisa-
rão de arcabouços ágeis, flexíveis e resilien-
tes de modo a mitigar os choques esperados.
11. C U R R E N T I S S U E S
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 11
Neste cenário, a formulação de políticas ma-
croeconômicas consistentes, capazes de ab-
sorver choques, permanece na ordem do dia.
E, por fim, precisam ser adotadas reformas
estruturais para educação, infraestrutura, e
os mercados de produto e de trabalho, de
modo a permitir o crescimento a um ritmo
mais elevado e mais sustentável ao longo do
tempo.
Um tema pontual ao final do ano passado foi
o reatamento de relações diplomáticas entre
Cuba o os Estados Unidos (que removeu um
obstáculo importante no seu relacionamento
com a América Latina), abrindo espaço para
áreas de colaboração mais produtivas. Esta
mudança de política permite o engajamento
dos Estados Unidos em uma agenda muito
mais ampla, incluindo temas como democra-
cia e direitos humanos, inclusão social, com-
petitividade, energia e meio-ambiente. Em
resumo, os Estados Unidos devem fortalecer
o seu soft power na região.
Apesar disto, é possível que alguns países da
região, particularmente a Venezuela, tenham
fortes preocupações com a normalização das
relações diplomáticas entre estes dois paí-
ses. Historicamente, a Venezuela é um im-
portante fornecedor de petróleo para os Es-
tados Unidos apesar da sua participação da
pauta de importações ter declinado nos últi-
mos anos. Além disso, as relações entre eles
têm deteriorado ao longo da última década
e, ainda, a Venezuela lidera um grupo de oito
países (Venezuela, Cuba, Bolívia, Nicarágua,
Dominica, Equador, Antígua e Barbuda e São
Vicente e Granadinas) membros da Aliança
Bolivariana para os Povos da Nossa América
- Tratado de Comércio dos Povos (antiga Al-
ternativa Bolivariana para as Américas -
ALBA) que, em geral, adota posições de po-
lítica externa contrárias aos Estados Unidos.
Desde 2000 a Venezuela fornece petróleo a
Cuba sob condições comerciais bastante
vantajosas, em retorno pelo apoio técnico,
médico e político de Cuba.
A economia venezuelana está em franca de-
terioração e a nova política entre os Estados
Unidos e Cuba pode levar ao seu isolamento
crescente na região. A Venezuela depende
do petróleo para 95,0% das suas reservas
cambiais, importando mais de 70% dos bens
de consumo básico. A queda do preço do
barril de petróleo representa uma restrição
significativa na capacidade do governo em
atender ao consumo básico local e financiar
a sua política diplomática baseada no petró-
leo. Mais ainda, a deterioração desta econo-
mia deve impactar negativamente o soft po-
wer do regime bolivariano na região. Não foi
outro o pedido de "socorro" ao Brasil feito
pelo presidente da Venezuela, Nicolás Ma-
dura, ainda na posse da presidente Dilma.
Brasil – Os Desafios do Ajuste
após o Fracasso da "Nova Matriz
Econômica"
O Brasil é a maior economia da América do
Sul, considerando o tamanho do seu PIB, a
sua área geográfica e a sua população. Mais
ainda, é dotado de extensas reservas de re-
cursos naturais – petróleo, minerais e flores-
tas – e persiste na construção de um sistema
político democrático desde 1985. Em termos
globais é a sétima maior economia, atrás dos
Estados Unidos, China, Japão, Alemanha,
França e Reino Unido, tendo deixado de
avançar posições nos últimos quatro anos.
Apesar de todo o seu potencial, o Brasil
ainda apresenta disparidades regionais signi-
ficativas, especialmente em indicadores so-
ciais como saúde, mortalidade infantil, nutri-
ção, educação, mobilidade e acesso a tec-
nologias de comunicação. Em termos gerais,
12. C U R R E N T I S S U E S
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 12
as regiões Sul e Sudeste possuem indicado-
res econômicos e sociais muito superiores
aquelas do Norte e Nordeste. Mais ainda,
apesar da queda consistente da pobreza nos
últimos 20 anos, ela ainda assola uma par-
cela importante da nossa população, pri-
vando o acesso à educação primária, saúde
básica e nutrição de milhões de brasileiros.
O Brasil, como outras economias emergen-
tes no mesmo estágio de desenvolvimento,
depara-se com uma série de desafios econô-
micos, políticos e sociais de natureza estru-
tural. Estes desafios estão diretamente rela-
cionados à evolução histórica do país, à sua
inserção no sistema mundial de governança
e aos gargalos e disparidades econômicas e
sociais que há séculos definem a sua estru-
tura sociedade. A identificação destes desa-
fios é tarefa muito mais simples do que a de-
cisão política e a alocação de recursos, físi-
cos e financeiros, para a sua superação.
Cabe ao governo – em suas diversas instân-
cias decisórias – hierarquizar as demandas
da sociedade e formular e implantar as es-
tratégias e ações necessárias para superá-
los.
Mais ainda, estes desafios estruturais que
solapam há décadas o nosso desenvolvi-
mento foi potencializado por uma política
econômica nos últimos quatro anos que
comprometeu sobremaneira a capacidade
do país em superá-los. Esta política, materi-
alizada na chamada "Nova Matriz Econômica"
foi elaborada a partir de uma visão ideológica
de afronta à organização dos mercados, à
proteção dos direitos de propriedade e de re-
púdio à convivência harmoniosa com o setor
privado na construção de mecanismos que
permitissem ao país ao menos a manuten-
ção da sua participação relativa no sistema
econômico mundial. Do ponto de vista insti-
tucional a política econômica entre 2011-
2014 pode ser resumida como populista, vo-
luntarista e inconsistente. O seu abandono,
anunciado veladamente durante a campa-
nha eleitoral do ano passado, é prova cabal
da sua insustentabilidade e da necessidade
de se readequar as políticas públicas com o
objetivo de viabilizar o crescimento domés-
tico.
Por fim, cabe observar ainda que, além da
questão estrutural, o Brasil teve eleições ge-
rais no ano passado que, juntamente com a
Copa do Mundo de futebol, acabaram por
prejudicar o seu desempenho econômico. A
teoria econômica estuda, há décadas, os
chamados ciclos político-econômicos, sendo
uma proposição fundamental desta teoria
que os políticos, conhecedores dos efeitos
do momento econômico sobre os votos dos
eleitores, manipulam as variáveis macroeco-
nômicas, com objetivo de serem eleitos (ou
reeleitos). Assim, com a proximidade das
eleições, os principais instrumentos de polí-
tica econômica são direcionados à expansão
da economia. Depois do período eleitoral,
são adotadas medidas contracionistas, a fim
de reverter os efeitos adversos da política ex-
pansionista adotada anteriormente. Este ci-
clo, quando conjugado com os problemas
estruturais, deve demandar medidas ainda
mais fortes.
A expectativa dos mercados – e da popula-
ção em geral – é o reconhecimento pelo exe-
cutivo federal de que a estabilidade macroe-
conômica é condição fundamental para o de-
senvolvimento e a inserção social de milhões
de brasileiros. Essa estabilidade se resume
ao controle da inflação nos níveis observados
nas economias mais desenvolvidas (de 2,0 a
3,0% ao ano), a disciplina fiscal e monetária,
a gestão pública eficiente e a programas so-
ciais focalizados na população mais carente.
É óbvio que intervenções pontuais em deter-
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DELTA ECONOMICS & FINANCE 13
minados setores de atividade e o uso de po-
líticas anticíclicas inteligentes devem ser de-
fendidas. No entanto, isto não deveria impli-
car na adoção generalizada de medidas de
ajustes descontínuas, populistas e de baixa
eficiência e eficácia – apesar de todas as
pressões políticas em sentido contrário. Nas
palavras da presidente da República em sua
diplomação e do ministro da Fazenda em sua
posse, é preciso dar cabo do "sistema patri-
monialista" que assola o país desde o seu
descobrimento.
O cenário atual brasileiro é um dos mais fa-
voráveis do mundo, em praticamente todos
os setores de atividade econômica. É claro
que a crise financeira mundial deve continuar
limitando a produção e o emprego local. No
entanto, a formulação e implantação de po-
líticas públicas inteligentes e a demanda do-
méstica devem mais do que compensar os
seus efeitos negativos e assegurar um cres-
cimento sustentável a taxas mais elevadas.
É preciso, apenas, o abandono de dogmas e
de políticas econômicas ultrapassadas, po-
pulistas e inconsistentes.
Após os ajustes necessários, principalmente
ao longo deste ano, a economia brasileira
deve se recuperar gradualmente após um
longo período de desaceleração, motivada
principalmente por fatores internos, quando
o crescimento do PIB caiu de 7,5%, em
2010, para apenas 0,2% em 2014. Neste
período, a produção industrial e a demanda
por investimentos foram afetadas despropor-
cionalmente. Por outro lado, a demanda ex-
terna se deteriorou num cenário de prolon-
gado enfraquecimento e incerteza nas eco-
nomias desenvolvidas, além da desacelera-
ção das principais economias emergentes,
como a China.
A vulnerabilidade do país ao cenário externo
deve continuar moderada devido às reservas
internacionais que permanecem em patama-
res elevados, à favorável composição da dí-
vida externa, ao montante do investimento
estrangeiro direto que segue financiando
grande parte do déficit nas transações cor-
rentes (apesar deste situar-se ao redor de
3,0% do PIB), ao relativamente baixo nível de
abertura ao comércio internacional quando
comparado a outros emergentes, a pequena
parcela da dívida pública nas mãos de não
residentes, e ao regime de câmbio flutuante.
Mais ainda, o compromisso da nova equipe
econômica com o controle da inflação e a
prudência fiscal – sem "contabilidade cria-
tiva" – devem reduzir a vulnerabilidade da
economia a choques externos e potencializar
o crescimento doméstico. Nas palavras no
novo ministro da Fazenda em seu discurso
de posse, "assim, restam poucas dúvidas de
que, mais uma vez, a democracia brasileira
dá prova de sua excelência, ao reafirmar o
consenso do imperativo da disciplina fiscal
para o crescimento econômico e social e
para o desenvolvimento sustentável." Este
consenso começa a materializar-se com uma
meta de superávit primário de 1,2% do PIB
neste ano e de 2,0% em 2016, obtido com
aumento das receitas, controle das despesas
e melhor gestão da res pública. Em conse-
quência, a dívida bruta do setor público – o
novo indicador de referência, ao invés da dí-
vida líquida – deverá cair no futuro, apesar
dos desafios de preservação do equilíbrio fis-
cal frente à demanda por investimentos e a
pressão popular por mais e melhores servi-
ços.
Neste cenário, e com os anúncios e as ex-
pectativas já formadas, este ano deve mar-
car o início da reconstrução dos fundamen-
tos macroeconômicos da economia brasi-
leiro – formulados originalmente em 1995,
com o Plano Real – preservando-se o pro-
cesso de incluso social da população mais
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carente e implantando, de fato, o combate
ao malfeito.
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Projeções econômicas para 2015
Crescimento do
PIB (%)
Inflação ao consu-
midor (%)
Desemprego
(%)
Déficit em transações
correntes (% do PIB)
Estados Unidos 3,2 2,0 6,0 -2,5
Zona do Euro 1,2 1,0 11,0 -2,0
Japão 0,8 2,2 3,7 1,0
Rússia 0,5 7,5 7,0 2,9
Índia 6,5 7,5 3,8 -2,2
China 7,0 2,4 4,0 2,0
América Latina 1,5 9,0 6,0 -2,8
Brasil 0,8 6,5 7,3 -3,3
Zona do Euro: Alemanha, Áustria, Bélgica, Chipre, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Finlândia, França, Grécia,
Irlanda, Itália, Letônia, Lituânia, Luxemburgo, Malta, Países Baixos e Portugal.
América Latina: Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela.
A projeção da taxa de desemprego para o Brasil é feita com base nos resultados da Pesquisa Nacional por Amostra de
Domicílios Contínua - PNADC, elaborada pelo IBGE.
Fonte: BCE, Banco Mundial, BIS, BIS, Cepal e FMI; análise Delta Economics & Finance.
Avaliação das economias da América do Sul
Política Economia Social Competitividade Doing business
Argentina muito ruim muito ruim ruim muito ruim muito ruim
Bolívia neutro neutro ruim muito ruim muito ruim
Brasil bom ruim ruim ruim ruim
Chile muito bom bom bom bom muito bom
Colômbia neutro neutro muito ruim ruim muito bom
Equador neutro neutro muito ruim ruim ruim
Paraguai neutro neutro neutro muito ruim ruim
Peru bom neutro muito ruim ruim muito bom
Uruguai neutro neutro ruim muito ruim ruim
Venezuela muito ruim muito ruim muito ruim muito ruim muito ruim
Fonte: com base em informações compiladas pelas Nações Unidas, Cepal e FMI; análise Delta Economics & Finance.