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Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
1. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
1.1. Estado e Administração Pública
O Estado pode ser definido como a organização político-jurídica capaz de impor sua
vontade a todos os que se situam dentro de um determinado território.
E o que seria a Administração Pública? A Administração é uma das facetas da atuação
do Estado, que se revela na vida cotidiana daqueles que estão submetidos ao poder
estatal. Para entender melhor, vamos analisar as funções do Estado
1.2. Funções estatais
As funções estatais podem ser divididas em
a) Função legislativa – é a atividade de criação das normas gerais e abstratas a serem
seguidas por todos; é desempenhada de forma principal pelo Poder Legislativo.
b) Função jurisdicional – é a atividade pela qual se decidem de forma definitiva os
litígios referentes à interpretação e aplicação das normas acima mencionadas; é
desempenhada de forma principal pelo Poder Judiciário.
c) Função administrativa – é a função que nos interessa e que abrange todas as demais
atividades desempenhadas pelo Estado; é exercida de forma preponderante pelo Poder
Executivo.
A função administrativa compreende, portanto, uma variedade enorme de atividades,
tais como: tributação, fiscalização e manutenção da ordem pública, prestação de
serviços à coletividade, incentivos às atividades consideradas de interesse público, etc.
Além disso, também fazem parte dessa função todas as atividades destinadas à
manutenção da estrutura estatal, como os cuidados com o patrimônio dos entes
públicos, o recrutamento e a disciplina dos agentes estatais, a realização de aquisições e
demais contratações que sejam necessárias ao funcionamento da máquina administrativa
etc.
Acho que já entendemos o que é a função administrativa. Porém, conceituá-la é tarefa
dificílima, havendo autores que preferem dizer: é tudo aquilo que não é função
legislativa, nem função jurisdicional.
Vamos fornecer apenas como suporte para avançarmos em nosso conhecimento, a
seguinte definição:
Definição: A função administrativa consiste no exercício de poderes, pelo Estado e seus
agentes, com a finalidade de: a) satisfazer concretamente os interesses essenciais da
coletividade; e b) promover a organização e funcionamento dos órgãos estatais, de
molde a possibilitar o exercício de suas atividades.
 Atenção! Uma informação importante é que, embora a Constituição faça a
separação entre três classes de órgãos, denominados “Poderes” – o Poder
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
Legislativo, o Poder Executivo e o Poder Judiciário – essa divisão não coincide de
forma absoluta com a divisão de funções já mencionada.
Cada “Poder” exerce de forma principal ou típica a função associada a seu nome;
porém, pode praticar atos relacionadas a outra função, de forma secundária ou atípica.
O Poder Executivo e o Poder Judiciário participam da função legislativa, por exemplo,
por meio da iniciativa de leis, conforme previsto na CF. O Poder Legislativo também
exerce funções jurisdicionais, ao julgar os crimes de responsabilidade. (CF, art. 52, I e
II).
Todos os Poderes exercem a função administrativa, na medida em que necessitam se
estruturar para desempenhar suas atividades. O Congresso Nacional quando realiza um
concurso para servidores; o Tribunal de Justiça quando realiza uma licitação para
compra de computadores; o juiz, quando baixa uma norma para disciplinar o horário
dos servidores do cartório – todos são exemplos de exercício de função administrativa
por autoridades legislativas e judiciárias.
1.3. Definição de Administração Pública
Podemos, portanto definir Administração Pública como o exercício, por agentes
estatais, das atividades e tarefas relacionadas à função administrativa (sentido
objetivo ou funcional de Administração Pública)
Sob um outro ângulo, Administração Pública também significa o conjunto de pessoas
jurídicas, órgãos e agentes incumbidos do desempenho da função administrativa
(sentido subjetivo ou orgânico de Administração Pública).
1.4. Usos da palavra Administração
O vocábulo Administração pode ser usado de forma mais específica, para distinguir
diversas situações no âmbito da atuação administrativa. Assim, na linguagem do Direito
Administrativo, temos as seguintes expressões:
Quanto à esfera governamental:
 Administração Federal – se refere à atuação ou às pessoas, órgãos e agentes da
União
 Administração Estadual - se refere à atuação ou às pessoas, órgãos e agentes
dos Estados-membros
 Administração Distrital - se refere à atuação ou às pessoas, órgãos e agentes do
Distrito Federal
 Administração Municipal - se refere à atuação ou às pessoas, órgãos e agentes
dos Municípios
Quanto à forma como é exercida a função administrativa:
 Administração centralizada: quando a função administrativa é exercida
diretamente pelos entes políticos (ou seja, pela União, Estados, Distrito Federal
ou Municípios)
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
 Administração descentralizada: quando a função administrativa é exercida por
meio da outorga ou delegação de poderes – pode se tratar de uma entidade
criada pelo próprio ente político (uma autarquia, por exemplo) ou por um
particular (concessionário de serviços públicos, por exemplo).
Quanto à forma de organização administrativa:
 Administração Direta: expressão consagrada na Constituição, para se referir às
estruturas administrativas internas dos entes políticos.
 Administração Indireta: expressão que abrange as pessoas jurídicas criadas
pelos entes políticos (autarquias, empresas públicas, etc.) Podemos também
tornar mais específica a expressão, ao nos referirmos a uma esfera
governamental determinada. Por exemplo, ao nos referirmos à Administração
Indireta Federal, estamos querendo alcançar apenas as pessoas jurídicas criadas
pela União.
 Administração autárquica: se refere apenas às entidades referidas como
autarquias – que explicaremos mais adiante.
 Administração fundacional: se refere apenas às entidades referidas como
fundações governamentais – que explicaremos mais adiante.
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
2. O REGIME JURÍDICO-ADMINISTRATIVO E OS PRINCÍPIOS DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
2.1. O regime jurídico-administrativo.
Em sua concepção contemporânea, a Administração não é um fim em si mesma. Ela é
um meio de realizar as necessidades da coletividade. Assim, o poder de que ela
dispõe somente pode ser exercido para satisfazer o interesse público.
Os poderes ou competências da Administração são, portanto poderes-deveres. Ou
seja, são sempre associados ao dever de realizar os interesses maiores da coletividade.
Em razão dessa missão da Administração Pública, ela possui um conjunto de princípios
e regras destinado a garantir que ela alcançará seus objetivos: é o regime jurídico-
administrativo.
O regime jurídico-administrativo é um regime diferenciado, feito sob medida para a
Administração Pública. Nele, institutos conhecidos no direito comum – isto é, no direito
que se aplica a todos os indivíduos – ganham uma nova roupagem.
Para entendermos o regime jurídico-administrativo, temos de conhecer dois princípios
básicos da atividade administrativa, relacionados à idéia de interesse público:
 Princípio da indisponibilidade do interesse público, também referido com
princípio da finalidade: tal princípio nos diz que o agente público deve sempre
cuidar da realização do interesse público, não se desviando desse caminho. Viola
esse princípio, por exemplo, o agente público que usa a viatura oficial para
viagem de lazer; ou ainda, o agente que desperdiça recursos públicos com gastos
desnecessários e imotivados.
 Princípio da supremacia do interesse público: serve para justificar a
existência de prerrogativas e privilégios da Administração em relação ao
particular. Tendo em vista que o interesse da coletividade é mais importante que
o interesse dos indivíduos, costuma-se dizer que, quando presente o interesse
público, a Administração se coloca numa posição de superioridade em relação
ao particular.
Esses princípios estão na raiz de uma série de princípios e regras especiais, aplicáveis
à Administração, dando ao regime jurídico-administrativo uma feição muito fácil de
reconhecer. Esses princípios e regras se caracterizam de duas formas:
 Restrições – princípios e regras restritivos impedem ou dificultam o agente
público de atuar com desatenção ao interesse público. Por exemplo: a
necessidade de procedimento licitatório para realizar contratações; a necessidade
de autorização da lei orçamentária para realizar despesas.
 Prerrogativas e privilégios – princípios e regras que dão à Administração um
tratamento especial, diferenciado e superior em relação ao particular. Por
exemplo: a possibilidade de desapropriar um bem de um particular; o poder de
aplicar sanções àqueles que violam as regras de convivência coletiva.
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
Um esquema pode nos auxiliar a memorizar essas informações:
Concluindo:
Definição: o regime jurídico-administrativo é o conjunto de princípios e regras
que, em razão da supremacia e da indisponibilidade do interesse público almejado
pela Administração, confere a ela prerrogativas e privilégios e estabelece
restrições especiais, diferenciando-a dos demais sujeitos de direito
 Atenção! A idéia do regime jurídico-administrativo é a chave de ouro de nossa
disciplina, pois por meio dessa idéia podemos compreender a razão de ser de
vários institutos do Direito Administrativo.
2.2. Os princípios do Direito Administrativo
É inegável a importância do estudo e da compreensão dos princípios em toda e
qualquer área do Direito. Isso porque o Direito não se resume às regras, ou seja,
aquela espécie de norma jurídica pela qual se pode deduzir de maneira relativamente
segura, a prescrição de um comportamento.
 Atenção! Os princípios também têm força normativa. Embora tenham um maior
grau de abstração do que as regras, eles são mais permanentes que elas e dão
consistência e harmonia ao sistema jurídico.
Do ponto de vista prático, os princípios nos dão pistas, indícios, sobre o conteúdo
provável das normas e nos ajudam também a interpretá-las, de maneira que elas sejam
coerentes entre si.
No Direito Administrativo, isso é ainda mais importante, pois não há uma codificação
de normas administrativas. As normas do Direito Administrativo estão na própria
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
Constituição, em leis nacionais e também em leis de cada um dos entes da Federação –
União, Estados, Distrito Federal e Municípios – pois todos têm competência para
legislar sobre suas atividades administrativas. Além disso, existem também as
normas infralegais: as resoluções, regulamentos, portarias, produzidas por cada uma
dessas Administrações.
A harmonização na interpretação e aplicação dessas centenas de normas se faz por meio
do estudo e da compreensão dos princípios.
Alguns dos princípios que estudaremos são explicitamente mencionados na
Constituição Federal, especialmente em seu art. 37. Outros foram positivados em leis
infraconstitucionais. E há também aqueles que, embora não constem explicitamente de
algum texto normativo, são estudados e utilizados na doutrina e na jurisprudência
administrativista.
Os princípios mais importantes são os que constam do caput do art. 37 da CF. Eles
formam um anagrama que permite nossa melhor fixação:
L egalidade
I mpessoalidade
M oralidade
P ublicidade
E iciência
2.2.1. Princípio da legalidade
O princípio da legalidade é um princípio geral que se aplica a todos os ramos do
Direito, mas que tem um tratamento especial no Direito Administrativo. Ele está
consagrado, de modo genérico, no art. 5º da CF/88, aquele que relaciona os Direitos
Fundamentais Individuais e Coletivos:
“Art. 5º... II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei”.
Ele estabelece, portanto, uma limitação para qualquer ação que vise restringir a
liberdade dos cidadãos, mesmo que tal ação seja realizada pelo próprio Estado. O
princípio da legalidade é a coluna fundamental do chamado Estado de Direito, ou seja,
a idéia de que o poder só atua legitimamente quanto autorizado pela norma jurídica
produzida pelo órgão legislativo competente.
Para a Administração, ele está previsto no art. 37, caput da CF, que também faz
referência a outros princípios.
Para o cidadão, a legalidade representa uma garantia de sua liberdade. No Direito
Administrativo, ao contrário, ganha uma feição de limitação para a Administração –
motivo pelo qual acaba ganhando um apelido: legalidade estrita.
Nesta linha, costuma-se dizer que a Administração não apenas deve evitar agir “contra
legem” (contrariamente à lei), “ultra legem” (além do que a lei estabelece), mas
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
somente pode agir “secundum legem”, isto é, segundo a lei. A Administração somente
pode desenvolver a atividade que a lei lhe autorizar, especialmente quando essa
atividade interferir na esfera de liberdade e nos direitos dos indivíduos.
Saliente-se que, nesse contexto, estamos sempre nos referindo à lei em sentido formal,
ou seja, aquela que é produzida por meio do processo legislativo, disciplinado pela
Constituição. O conceito de lei em sentido formal não abrange normas produzidas por
órgãos administrativos, no exercício do chamado poder normativo – que será
explicado no capítulo seguinte.
2.2.2. Princípio da Impessoalidade
O princípio da impessoalidade afirma que a coisa pública – a chamada “res publica” –
não deve ser apropriada ou confundida com os interesses dos agentes que
transitoriamente exercem função pública.
Há dois significados diferentes para esse princípio, sendo que ambos são válidos e se
completam:
 A impossibilidade de confundir a pessoa jurídica estatal e a pessoa do
administrador, promovendo o chamado “culto à pessoa” ou “personalismo” na
Administração. Nesse sentido, a CF/88 tem norma expressa, condenando a
promoção pessoal das autoridades e servidores públicos (art. 37, § 1º).
 O dever de atuação imparcial do administrador público, que não pode
estabelecer diferenças injustificáveis entre os cidadãos, seja para favorecer, seja
para prejudicar. Trata-se, por tanto, de uma decorrência de um princípio mais
amplo, o princípio da isonomia, consagrado no art. 5º, caput e inciso I da
CF/88.
2.2.3. Princípio da moralidade administrativa
Toda atuação administrativa, além de ser legal, deve ser moral. Essa afirmação é
necessária porque, muitas vezes, em um ato sob a aparência de legalidade, se esconde
uma intenção que nada tem a ver com a realização do interesse público.
Por essa razão a doutrina e a jurisprudência administrativista acabaram por consagrar a
idéia de moralidade administrativa como um algo a mais que complementa o princípio
da legalidade, de maneira a garantir que a atuação da Administração não se desvie de
seu objetivo maior: a satisfação do interesse público. A moralidade administrativa está
relacionada aos conceitos de atuação ética, honestidade, boa-fé, lealdade e probidade
no trato da coisa pública.
Tal princípio tem sido muito importante para o controle dos atos da Administração pelo
Poder Judiciário, especialmente aqueles que são dotados de discricionariedade – cujo
conceito abordaremos no capítulo seguinte.
A Constituição também determina a punição dos agentes públicos pelos atos de
improbidade administrativa, expressão que geralmente é associada à idéia de mau uso
dos recursos públicos (vide art. 37, § 4º da CF e Lei nº 8.429/92).
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
O princípio da moralidade – bem como o correlato princípio da impessoalidade – foram
os fundamentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal para a edição da Súmula
Vinculante nº 13, que proibiu a prática do “nepotismo” na Administração Pública,
assim redigida:
A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por
afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor
da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou
assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou,
ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a
Constituição Federal.
2.2.4. Princípio da publicidade
Por cuidar dos interesses da coletividade, o administrador público deve atuar com
transparência. Essa é a expressão que melhor traduz o que é o princípio da
publicidade.
Na Administração Pública, a publicidade é a regra. Somente pode haver atos e
atividades secretas em situações previstas na própria Constituição, como o resguardo da
privacidade do cidadão (art. 5º, X) – por exemplo, no sigilo das informações fornecidas
ao Fisco – e em questões relacionadas à segurança da sociedade e do Estado (art. 5º,
XXXIII).
Por essa razão, todo cidadão têm o direito de conhecer as informações que a
Administração possua a seu respeito, bem como aquelas referentes ao bem-estar da
coletividade (art. 5º XXXIII e XXXIV). A recusa em prestar essas informações pode
ser objeto de uma ação judicial específica – o habeas data, também previsto no art. 5º,
em seu inciso LXII.
Recentemente, tivemos a promulgação de uma lei que busca dar maior efetividade a
essa ideia de transparência – trata-se da Lei nº 12.527/2011, conhecida como Lei de
Acesso às Informações Públicas.
2.2.5. Princípio da eficiência
Esse princípio foi inserido no texto constitucional pela EC 19/98 (conhecida como
Emenda da Reforma Administrativa). Ele determina que a Administração atue de
maneira adequada, com economia de meios e com a agilidade necessária, de modo a
atender de forma efetiva os interesses da coletividade. A lentidão, a omissão, o
desperdício de recursos públicos, a falta de planejamento, são atitudes que ofendem a
esse princípio.
No plano mais prático, esse princípio está relacionado a outras mudanças introduzidas
na CF/88 pela Reforma Administrativa. São elas:
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
 a criação do contrato de gestão e das Agências estatais (CF, art. 37, § 8º)
 a perda de estabilidade pelo mau desempenho do agente público (CF, art. 41, §
1º, III)
 o controle social da Administração Pública (art. 37, § 3º)
 a criação de escolas de formação e aperfeiçoamento de agentes públicos (art.
39, § 2º).
 a aplicação de recursos em programas de produtividade e qualidade no
serviço público (art. 39, § 7)
 o limite de gastos com pessoal, como forma de atuação fiscal responsável (art.
169).
Ele também tem sido invocado para justificar a criação de novas figuras jurídicas, que
buscam dar mais agilidade e economia à Administração. Duas figuras relativamente
recentes exemplificam essa tendência: a licitação por pregão e as parcerias-público-
privadas (PPPs).
2.2.6. Princípio da autotutela
Por esse princípio, a Administração pode corrigir e rever os seus próprios atos, para
adequá-los à legalidade ou para que eles melhor atendam ao interesse público.
Assim, a anulação ou revogação de um ato da Administração não depende de uma
decisão judicial. Está entre os poderes da Administração, o poder de zelar pela
regularidade jurídica e pela adequação de seus atos ao interesse da coletividade. Nesse
sentido, é muito citada a Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal:
A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os
tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo
de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada,
em todos os casos, a apreciação judicial.
2.2.7. Princípio da presunção de legalidade e veracidade dos atos administrativos
Os atos praticados pela Administração têm “fé pública”, ou seja, há uma presunção de
que a atuação administrativa é sempre legal e sempre condizente com a verdade dos
fatos.
Trata-se de uma presunção relativa (presunção juris tantum). Ou seja, o cidadão pode
desfazer o ato ilegal ou corrigir uma afirmação falsa realizada pela Administração.
Porém, cabe a ele o ônus de provar que a Administração se equivocou ou produziu ato
desconforme à lei.
2.2.8. Princípios da razoabilidade e proporcionalidade
O princípio da razoabilidade nos diz que a atuação administrativa deve estar baseada no
bom-senso, na prudência, na coerência ao espírito e à finalidade da lei.
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Semelhante à razoabilidade, o princípio da proporcionalidade se refere à adequação
entre meios e fins na atividade administrativa. Alguns exemplos de ofensa a esse
princípio: a realização de obra dispendiosa, desproporcional ao benefício que trará à
comunidade; ou a aplicação de pena de demissão de um servidor por uma falta
corriqueira, que poderia ser apenada apenas com uma advertência.
Esses princípios serão especialmente importantes na condução do processo
administrativo, sendo que a Lei 9.784/99 (Lei Federal de Processos Administrativos)
reconheceu expressamente a existência desses princípios, em seu art. 2º.
2.2.9. Princípio da motivação
Esse princípio complementa o princípio da publicidade, na medida em que exige que o
agente público, ao praticar o ato, exteriorize os motivos de sua decisão. A motivação
do ato permite seu melhor controle, evitando que se pratiquem atos por motivos ilegais
ou imorais.
Por essa razão a Lei 9.784/99 (Lei Federal de Procedimentos Administrativos), em seu
art. 50, relacionou uma série de atos administrativos, cuja motivação é obrigatória.
Nesses casos, a falta da motivação levará à nulidade do ato.
2.2.10. Princípio da continuidade
O princípio da continuidade nos diz que as atividades da administração não podem ser
interrompidas, devendo atender as necessidades da coletividade, enquanto essas
existirem e com a urgência que a situação requeira.
Esse princípio está na base de algumas regras importantes do Direito Administrativo,
como:
 a maior limitação do direito de greve dos servidores públicos (art. 37, VII da
CF);
 as restrições à paralisação da execução de contratos firmados com a
Administração e o dever de tolerar, durante certo tempo, a inadimplência do ente
administrativo (Lei 8.666/93 – Lei de Licitações, art. 78, incisos V, XIV e XV);
 o poder que a Administração tem de intervir nos seus contratados para garantir
a continuidade das atividades e serviços públicos (Lei 8.666/93 – Lei de
Licitações, art. 58, V; Lei 8.987/95 – Lei de Serviços Públicos, art. 32);
 a impossibilidade de penhora ou qualquer outra constrição dos bens que
estejam sendo utilizados na prestação dos serviços públicos.
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3. PODERES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
É comum que na linguagem jurídica haja referência aos “poderes da Administração
Pública”. Na verdade, o poder do Estado é uno e baseado na Constituição. Porém, há
diversas manifestações do poder estatal e, quando ocorrem no exercício da atividade
administrativa, acabam ganhando o nome de “poderes da Administração”. Vejamos
algumas dessas manifestações:
3.1. Poder normativo
É o poder conferido a autoridades administrativas de editar normas de caráter
derivado, que complementem ou explicitem os comandos da lei em sentido formal.
Essa atribuição é feita pela Constituição ou pela própria lei, tendo em vista a
impossibilidade de que as normas editadas pelo Poder Legislativo sejam capazes de
prever e disciplinar todas as situações que necessitem de algum regramento pelo Poder
Público.
Uma forma especial de poder normativo é o poder regulamentar que a Constituição
Federal atribui ao Chefe do Poder Executivo (art. 84, IV), para que ele edite
regulamentos para a “fiel execução” das leis. Esses regulamentos são editados na forma
de Decretos e geralmente a própria lei estabelece a necessidade de sua regulamentação
pelo Executivo, visto que nem toda a lei depende de regulamentação para produzir
efeitos.
Tanto os regulamentos editados pelo Executivo como as demais normas – resoluções,
portarias, deliberações – produzidas por outras autoridades administrativas estão
sujeitas a determinados requisitos de produção:
 necessidade de competência legal do emissor da norma
 validade condicionada às normas que lhe são superiores (análise de validade
que deve ser feito inclusive perante a lei em sentido formal e perante a própria
Constituição)
 possibilidade de controle pelo Poder Judiciário
 respeito aos princípios da moralidade, proporcionalidade e razoabilidade no
exercício da atividade normativa
 Atenção! Um aspecto controverso do tema é a existência de regulamentos
autônomos no nosso ordenamento. Esse tipo de regulamento dispensa a
existência prévia de lei para atuação normativa do Chefe do Executivo e existe é
figura comum em alguns ordenamentos jurídicos, em que o princípio da
legalidade estrita não é interpretado da mesma forma que no Direito Brasileiro.
Nossa Constituição prevê a possibilidade de disciplina de matéria diretamente
por decreto apenas nas hipóteses contidas no art. 84, IV, alíneas a e b,
introduzidos pela EC 32/2001:
a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar
aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos;
b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos.
3.2. Poder discricionário
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A chamada discricionariedade não é propriamente um poder. Trata-se de uma
característica presente em determinados atos, cuja produção pressupõe certa liberdade
do agente público, na escolha de meios de praticá-lo, de maneira a atingir de forma
mais adequada e eficiente o interesse público.
Em razão dessa característica, consagrou-se a classificação que distingue os atos
administrativos em dois tipos: os atos vinculados e os atos discricionários.
Há vinculação quando a lei já define antecipadamente a decisão a ser tomada no
caso concreto, sendo que o agente administrativo apenas aplica a norma, numa
atividade meramente mecânica. Um exemplo de ato vinculado é aplicação de uma multa
de trânsito, pois todos os elementos necessários para a realização do ato sancionatório já
estão previstos no Código Brasileiro de Trânsito – a conduta infracional, o valor da
multa, o procedimento para aplicá-la, etc. Observe que nesses casos se os agentes
deixarem de cumprir exatamente aquilo que a lei determina, o ato será inválido.
Quando há discricionariedade, ao contrário, a lei deixa ao agente uma margem de
escolha, para que ele adote a solução mais adequada ao interesse público. Essa margem
de escolha costuma ser denominada de mérito do ato, e que compreende as razões de
conveniência e oportunidade que justificam a decisão adotada.
Um exemplo bem claro de discricionariedade é a escolha de uma pessoa para assumir
um cargo de confiança – Ministro de Estado, por exemplo. Somente o Presidente da
República é que pode avaliar quem é a pessoa mais indicada para assumir tal cargo.
Falaremos um pouco mais do assunto, quando estudarmos o controle dos atos
administrativos pelo Poder Judiciário.
3.3. Poder hierárquico
A hierarquia é uma exigência prática para o funcionamento de qualquer estrutura
administrativa. Implica na existência de vários níveis de órgãos: órgãos de comando, de
assessoramento, de execução, todos devendo trabalhar de forma coordenada, sendo que
uns são subalternos a outros.
Assim, o superior exerce o poder hierárquico sobre seu subordinado, que por sua vez
tem o dever de obediência a seu superior. Cabe ressaltar que esse dever não é superior à
idéia de legalidade, não sendo o subordinado obrigado a obedecer a ordens
manifestamente ilegais de seus superiores.
Além de comandar, fiscalizar e corrigir os atos do subordinado, o poder hierárquico
também pressupõe o poder de delegar e avocar atribuições. Sobre o assunto, sugerimos
a leitura da Lei Federal de Procedimentos Administrativos – Lei 9.784/99, em seus
artigos 11 a 15, que tratam desses institutos de forma bastante clara.
A insubordinação de um agente público ao seu superior é falta disciplinar que,
dependendo da gravidade, pode levar à demissão do servidor – vide, nesse sentido, o
art. 132 da Lei nº 8.112/90 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos da União).
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3.4. Poder disciplinar
É o poder de apurar faltas e impor sanções àquelas pessoas que possuem um vínculo
especial com a Administração, em razão da atividade administrativa: servidores
públicos, contratados, concessionários, alunos de escolas públicas, crianças e
adolescentes sob tutela estatal, etc.
Como qualquer atividade sancionatória, o poder disciplinar está sujeito a regras de
exercício e especialmente, à observância dos princípios da ampla defesa e do
contraditório, garantias constitucionais do acusado (art. 5º, LV da CF)
Em razão disso, não existe mais a possibilidade de aplicação imediata de sanções,
conforme se praticou antes da CF/88, na chamada prática processual da “verdade
sabida” (ou seja, constatada diretamente pelo aplicador da sanção e sem oportunidade
de defesa ou contraprova pelo acusado). A atuação disciplinar também está sujeita aos
princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, já mencionados.
3.5. Poder de polícia administrativa
É o nome dado à atuação das autoridades administrativas no sentido de limitar a
atividade dos particulares, visando à manutenção da ordem pública e o bem estar
coletivo.
Devemos distinguir a polícia administrativa, que incide sobre bens, direitos e
atividades, da atividade de polícia judiciária, que é empregada para a persecução dos
ilícitos criminais e incide sobre as pessoas.
A finalidade da polícia administrativa é evitar os danos decorrentes do exercício
abusivo dos direitos pelos particulares, visto que os direitos e faculdades estabelecidos
de forma abstrata no ordenamento devem ser harmonizados em sua fruição concreta
pelos indivíduos. Assim, temos direito de escutar música em nosso carro; porém foge do
razoável que ouçamos música em altíssimo volume, com todas as portas do veículo
abertas, obrigando toda a vizinhança a permanecer acordada.
3.5.1. Obrigações decorrentes da polícia administrativa
Por meio da polícia administrativa, a Administração Pública impõe diversos tipos de
obrigação:
 obrigação de não-fazer – p. ex. a proibição de fumar em determinados
ambientes.
 obrigação de fazer – p. ex. a obrigatoriedade da instalação de equipamentos
de segurança nas edificações.
 obrigação de deixar-fazer (ou suportar), também denominadas sujeições – p.
ex. o dever de permitir o abate de animais contaminados por uma epidemia.
Convém reiterar que a atuação da autoridade administrativa não tem o condão de criar
concretamente, para o particular, obrigações que não estejam abstratamente previstas
em lei, sob pena de ofender o princípio da legalidade, já referido.
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3.5.2. Medidas de polícia administrativa
Uma vez que os particulares descumpram as ordens emanadas pela Administração
Pública, surgem medidas destinadas a reparar a ordem jurídica lesada. São elas:
 Medidas coativas ou cautelares: são providências imediatas adotadas pela
autoridade pública, usando de força, se necessário, para fazer cessar a conduta
irregular. P. ex. a apreensão de equipamentos destinados à caça ou à pesca
ilegal; o embargo de uma obra irregular, etc.
 Sanções: são penalidades aplicadas ao infrator, de maneira a desestimular
condutas danosas à coletividade. P. ex.: multa dos infratores de trânsito;
cassação da licença para praticar determinada atividade; perda de bens
utilizados para práticas ilegais, etc.
Para que sejam impostas, as sanções devem estar expressamente previstas em lei, que
deve conter em linhas gerais os critérios e o procedimento da punição. Imprescindível
que antes da aplicação da sanção seja dado ao acusado o direito de ampla defesa e que
o procedimento sancionatório respeite o princípio do contraditório.
3.5.3. Atributos da polícia administrativa
São citados como atributos da polícia administrativa:
 Discricionariedade: é comum, que ao disciplinar o exercício das atividades de
polícia administrativa, a lei conceda ao agente público certa margem de escolha
para que ele, avaliando a situação concreta, adote a providência mais adequada –
por exemplo, confiando ao agente a gradação da multa a ser aplicada, em vista
da gravidade da infração. Ressalte-se que a discricionariedade não é a regra
absoluta, pois a lei também pode definir a conduta que espera do agente público,
sem dar margem a escolhas por parte deste.
 Coercibilidade: o particular é obrigado a obedecer aos comandos dados pela
Administração no exercício da polícia administrativa, sob pena de sofrer
responsabilização penal pela resistência ao exercício dessa autoridade.
 Auto-executoriedade: é a possibilidade que a Administração tem de realizar
concretamente sua vontade, mesmo com a oposição do particular e sem a
necessidade de intervenção da autoridade judicial. Exemplo: a apreensão de
alimentos impróprios para consumo; a interdição de estabelecimentos
destinados a práticas ilícitas, etc.
3.5.4. Princípios condutores da atividade de polícia administrativa
Ao exercer o poder de polícia, a Administração deve observar:
 tipicidade: embora haja autores que afirmem não existir tipicidade na atividade
sancionatória administrativa – de maneira a diferenciá-la das sanções do Direito
Penal – não há dúvida de que a lei deve prever, de maneira minimamente
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
previsível, qual a conduta que pode ser considerada como infração e quais as
medidas coativas e sanções aplicáveis no exercício do poder de polícia. Isso é
decorrência do princípio da legalidade estrita.
 necessidade e eficácia: a adoção de uma medida de polícia administrativa deve
ser justificada pela necessidade de se evitar um dano real à coletividade e devem
ser empregados os meios mais eficazes e que menor sacrifício causem aos
indivíduos.
 proporcionalidade e razoabilidade: a Administração deve se pautar pelo bom
senso e pela moderação ao restringir a liberdade de atuação dos particulares. O
uso desproporcional das medidas de polícia pode configurar o chamado abuso
de poder por parte da autoridade pública.
3.5.5. Licença e autorização de atividade
Dentre as práticas mais comuns da polícia administrativa está a emissão de atos
destinados a regular de maneira prévia o exercício de atividades pelos particulares.
São eles:
 Autorização de atividade: é o ato unilateral, discricionário e precário por
meio do qual a Administração concede ao particular a possibilidade de
exercer determinada atividade. Geralmente a atividade em questão pode
resultar em algum incômodo ou perigo para a coletividade e, por essa razão,
a lei atribui à autoridade pública a avaliação das circunstâncias, decidindo
sobre a conveniência e oportunidade para deferir o seu exercício. O ato é
precário – isto é, pode a qualquer tempo ser revogado – pelas mesmas
razões. Por exemplo: a autorização para porte de armamento.
 Licença: é o ato unilateral e vinculado pelo qual a Administração faculta
àquele que preencha os requisitos legais o exercício de uma atividade. Aqui,
o ato é vinculado, ou seja, todo aquele que preencher os requisitos da lei tem
o direito a emissão da licença pela Administração, que não poderá recusá-la.
Por exemplo: a licença para conduzir veículo, uma vez que o particular
tenha cumprido os requisitos, passando pelos exames previstos em lei.
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4. ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
Conforme já mencionamos no Capítulo 1, temos uma definição de Administração
Pública em sentido subjetivo, qual seja, o conjunto de pessoas jurídicas, órgãos e
agentes incumbidos do desempenho da função administrativa.
Neste capítulo, vamos estudar um pouco mais quem é o “sujeito” Administração
Pública.
4.1. Pessoas políticas e pessoas administrativas.
Embora o poder estatal seja uno, conforme já dissemos, a evolução do Estado moderno
propiciou a divisão vertical e horizontal da estrutura estatal em diversas entidades.
Assim, nós temos as pessoas políticas, também conhecidas como entes políticos ou
entidades políticas. A própria Constituição Federal é quem reconhece a existência
dessas pessoas jurídicas e atribui a elas competências legislativas e administrativas,
caracterizando assim a sua autonomia política, no espírito do chamado sistema
federativo.
Também há uma divisão horizontal da atividade estatal, por meio da criação das
pessoas, entes ou entidades administrativas, ou seja, pessoas jurídicas cuja criação é
decorrência de lei editada pelo ente político respectivo, para desempenhar alguma
atividade que seja de competência deste. Vamos falar um pouco mais delas a seguir, ao
tratar da chamada Administração Indireta.
4.2. Personalidade jurídica das entidades da Administração
Toda a entidade acima mencionada tem personalidade jurídica, isto é, o ordenamento
jurídico reconhece a elas a capacidade de serem sujeitos de direitos e obrigações.
Nosso sistema jurídico diferencia as pessoas jurídicas em dois grupos, conforme o
regime jurídico a elas aplicável: pessoas jurídicas de direito privado e pessoas
jurídicas de direito público (art. 40 do Código Civil). Estas últimas, por sua vez, são
diferenciadas entre pessoas jurídicas de direito público interno (União, Estados,
Distrito Federal, Territórios, Municípios, autarquias e entidades criadas por lei com essa
natureza) e pessoas jurídicas de direito público externo (os Estados estrangeiros e todas
as pessoas que forem regidas pelo direito internacional público).
As pessoas jurídicas de direito público são aquelas que têm feição tipicamente estatal.
No caso daquelas mencionadas como pessoas jurídicas de direito público interno, elas
são regidas de forma integral pelo chamado regime jurídico-administrativo, já
mencionado anteriormente.
Embora possa parecer estranho, o Poder Público pode criar pessoas jurídicas de direito
privado. É que por vezes é conveniente ou até mesmo obrigatório que pessoas
administrativas sejam criadas com regime jurídico semelhante ao aplicável aos
particulares. A nossa Constituição Federal, por exemplo, ao tratar do desempenho de
atividade econômica pelo Estado, obriga que seja feito por meio de pessoas sujeitas “ao
regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e
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obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários” (art. 173, § 1º, II). Por essa
razão, entidades como a Caixa Econômica Federal e a Petrobrás, embora sejam
estatais são pessoas jurídicas de direito privado.
Para as entidades estatais com personalidade de direito privado não se aplicam todas as
regras do regime jurídico-administrativo, justamente por terem um regime equiparado
ao dos particulares. Em geral, permanecem para elas apenas algumas das restrições –
como a necessidade de realizar concurso público, a fiscalização do uso dos recursos, a
necessidade de licitar.
4.3. Desconcentração e descentralização
Para realizar suas tarefas, a Administração Pública adota técnicas de atribuição de
competência denominadas como desconcentração e descentralização:
 Desconcentração: atribuição de competência a órgãos internos da entidade.
 Descentralização: atribuição de competência a outras pessoas, distintas do ente
político. Pode ser a atribuição a uma pessoa administrativa ou a um particular que
atua em colaboração com a Administração.
4.4. Desconcentração - os órgãos públicos
Chamamos de órgão a unidade de atuação integrante de determinada entidade. Ou seja,
ele é uma estrutura interna¸ que reúne atribuições e agentes públicos responsáveis por
desempenhá-las.
Através de seus órgãos, a pessoa jurídica administrativa expressa sua vontade, no que a
doutrina cunhou de relação de imputação. Ou seja, os agentes públicos que atuam no
órgão manifestam a vontade deste, que é considerada a vontade do próprio Estado.
É importante lembrar que os órgãos não têm personalidade jurídica própria, pois são
apenas uma parcela da pessoa jurídica a qual pertencem. Assim, os atos praticados pelo
agente de determinado órgão geram direitos e obrigações para a própria entidade a qual
o órgão pertença, sendo que, como regra geral, esta é que será legitimada para estar em
juízo em eventual controvérsia que envolva tal relação jurídica.
São órgãos públicos, por exemplo, os Ministérios no âmbito do Executivo Federal e as
Secretarias no âmbito do Executivo Estadual e Municipal, bem como suas divisões
internas (departamentos, diretorias, etc.). O Poder Legislativo e o Poder Judiciário
também são órgãos, com status e garantias especiais atribuídas pela Constituição, para
preservação de sua independência em relação ao Executivo. Internamente também são
divididos em órgãos (comissões, câmaras, juizados, etc.).
4.5. Descentralização
A descentralização, ou seja, a atribuição de competência a outras pessoas, distintas da
pessoa política que detém originariamente a competência, pode se dar pelas seguintes
formas:
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 Descentralização territorial: atribuição de competência genérica a uma pessoa
jurídica de direito público (autarquia territorial) – em nosso país não temos
atualmente exemplos concretos desse tipo de descentralização.
 Descentralização por serviços: atribuição de competência especializada, por
lei, a uma pessoa administrativa (isto é, criada pela própria Administração).
Fala-se aqui em outorga da atividade, para diferenciá-la da delegação,
mencionada abaixo. Por exemplo, a Empresa de Correios e Telégrafos é uma
empresa pública criada pela União para, sob regime descentralizado,
desempenhar o serviço postal.
 Descentralização por colaboração: atribuição de uma competência
especializada a um particular, que atua sob supervisão da Administração. Essa
delegação da atividade pode se dar por lei, por meio de um ato ou de um
contrato administrativo. Por exemplo, as empresas telefônicas que hoje operam
em nosso país são pessoas jurídicas constituídas por particulares e que, sob a
fiscalização da Anatel, prestam o serviço público de telecomunicação.
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5. ATOS ADMINISTRATIVOS
5.1. Definição de ato administrativo
Os atos administrativos são um dos principais temas da disciplina. Para entendê-los,
vamos trabalhar com a seguinte definição:
Definição: O ato administrativo é um ato jurídico produzido com poderes estatais, no
exercício da função administrativa, sob regime jurídico-administrativo.
Logo, por essa definição não são atos administrativos:
 atividades materiais, que não são atos jurídicos, ou seja, não buscam produzir uma
declaração com efeitos jurídicos: ex.: a varrição de uma rua, o atendimento médico
em um hospital público, etc.
 atividades não produzidas com poderes estatais: somente os agentes públicos e
os particulares que atuem sob delegação estatal praticam atos administrativos.
 atividades não exercidas sob a função administrativa: atos produzidos no
exercício de outras funções não são atos administrativos. Por exemplo, os atos
jurisdicionais (sentenças, acórdãos, despachos) e os atos legislativos (votações,
moções, leis).
 atividades que não são produzidas sob regime de direito administrativo: atos
produzidos sob as regras do direito privado não são atos administrativos. P. ex.: a
abertura de conta em um banco, ainda que seja estatal.
5.2. Perfeição, validade e eficácia do ato administrativo
São qualidades do ato jurídico – e também do ato administrativo – que devem ser
analisadas pelo profissional do Direito para compreensão da situação jurídica existente.
 Perfeição: ao contrário do significado comum, não significa ausência de
defeitos. Perfeição na linguagem jurídica tem um sentido de algo que está
completo. Ato perfeito é o que já completou todas as fases de sua produção.
Essa qualidade também é mencionada como existência do ato. Ato imperfeito e
ato inexistente são sinônimos.
 Validade: é a produção do ato sem a ocorrência de vícios. Ato válido é o ato
cujo conteúdo e procedimento de formação estão conformes ao ordenamento
jurídico. O exame da validade se faz através da análise dos elementos do ato –
vide abaixo.
 Eficácia: é a aptidão para produzir os efeitos que se esperam dele. Isso não
tem a ver com a validade do ato, mas sim com a existência de determinados
fatos ou atos capazes de impedir ou de propiciar a produção desses efeitos. A
eficácia se verifica sempre no tempo: um ato pode ser eficaz agora e perder sua
eficácia num momento posterior em razão do advento de um termo (evento
futuro e certo) ou de uma condição (evento futuro e incerto). E vice-versa.
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Consequências dessas qualidades:
 O ato imperfeito é inexistente. Portanto, ele não pode ser analisado quanto à
sua validade e não produz efeitos jurídicos.
 O ato perfeito pode ser válido ou inválido. O ato pode ser válido e não produzir
efeitos, em razão da existência de um termo ou condição que impeçam a
produção desses efeitos.
 Um ato inválido, por sua vez, não deveria ser capaz de produzir efeitos jurídicos.
Porém, em nome do princípio da boa-fé ou da confiança e do princípio da
segurança jurídica, às vezes são mantidos os efeitos de um ato administrativo,
ainda que viciado. Estudaremos isso adiante.
5.3. Elementos ou requisitos de validade do ato administrativo.
A análise jurídica do ato jurídico implica na separação dele em elementos logicamente
distintos – alguns autores preferem se referir a eles como “requisitos de validade”.
Utilizaremos a divisão mais conhecida, em cinco elementos, quais sejam:
1. Sujeito
2. Objeto
3. Forma
4. Motivo
5. Finalidade
 Sujeito ou agente: é a pessoa investida dos poderes legais para a prática do ato
administrativo. Se ele não tiver a competência – ou seja, a atribuição por lei, ato ou
contrato – o ato por ele praticado não é válido.
Para a verificação dos poderes atribuídos ao agente, devem ser analisados os seguintes
aspectos:
 aspecto material: o ato só pode ser praticado se estiver no rol de matérias
atribuídos àquele agente.
 aspecto territorial: deve o agente praticar atos dentro do âmbito espacial
definido na lei ou ato de atribuição de poderes.
 aspecto temporal: o ato deve ter sido produzido durante o tempo em que
vigorava a competência do agente.
Os possíveis vícios relacionados ao elemento sujeito são os seguintes:
A) Incapacidade: o Código Civil regula a capacidade dos sujeitos para a prática
dos atos jurídicos. Porém a incapacidade civil nem sempre viciará o ato
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administrativo. Haverá vício apenas quando para a prática de tal ato for
imprescindível o usa da capacidade volitiva pelo agente.
Também pode ocorrer a incapacidade do agente para a prática de determinados
atos, em razão de sua suspeição ou impedimento – vide a propósito: artigos 18
a 20 da Lei 9.784/99 (Lei Federal de Procedimentos Administrativos).
B) Incompetência: situações em que faltam os poderes para a prática do ato.
São referidas pela doutrina como:
 Usurpação de poder: é a situação do agente sem titulação legal, isto é,
que não se encontra investido em funções públicas e que pratica o ato
como se tivesse tal investidura. Trata-se de conduta criminalmente
tipificada.
 Funcionário de fato: situação em que há uma irregularidade na
investidura do agente, mas este exerce as atribuições com aparente
legalidade.
 Excesso de poder: situação em que o agente, embora tenha a titulação
legal para a prática de atos administrativos, extrapola os poderes que a
lei lhe confere, invadindo a competência de outra autoridade ou
praticando atos não previstos na lei. Pode configurar conduta
criminalmente tipificada como crime de abuso de autoridade (Lei nº
4.898/65).
 Objeto ou conteúdo: é aquilo que o ato declara ou prescreve, aquilo que nos
permite reconhecê-lo como um ato típico. Assim, o objeto de um ato de demissão do
servidor é o rompimento do vínculo de trabalho que o unia à Administração. O objeto
da desapropriação é a transferência forçada da propriedade para o ente expropriante.
Tal como no Direito Privado, o objeto do ato administrativo deve ser lícito, certo,
moral e possível. Vamos entender:
 Licitude: para o Direito Administrativo só são lícitos os objetos que sejam
juridicamente autorizados (legalidade estrita). Um objeto ilícito, por exemplo,
seria a aplicação da pena de confisco pelo não pagamento de um tributo.
 Certeza: está relacionada com o princípio da segurança jurídica que nos diz que
não deve pairar dúvida sobre o sentido das prescrições contidas no ato
administrativo. Um exemplo verídico e espantoso: publicação de um ato
autorizando uma licença a um servidor cujo nome a autoridade desconhecia, pois
estava ilegível.
 Moralidade: vide o que já dissemos, ao tratar dos princípios da Administração
Pública. Exemplo verídico sobre a imoralidade de um objeto: candidato a
prefeito, que celebrou negócio registrado em cartório com o presidente da
Câmara Municipal, visando à nomeação de apadrinhados em troca do apoio
eleitoral.
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 Possibilidade: é pressuposto lógico para a existência do ato. Ela abrange a
possibilidade material e a possibilidade jurídica. Possibilidade material significa
possibilidade de esse objeto ser realizável de fato. A possibilidade jurídica
significa que este objeto pode ser realizado, do ponto de vista da lógica que
existe nas relações jurídicas. Um impossível material: a revogação, por decreto,
da lei da gravidade. Um impossível jurídico: apreender uma pessoa, com base no
poder de polícia.
 Forma: esse elemento abrange:
 a exteriorização do ato administrativo.
 as formalidades e também o procedimento a ser seguido na produção desse
ato.
A forma mais comum de exteriorizar os atos administrativos é a forma escrita, pela
segurança e publicidade que confere aos atos. Mas também são praticados atos por
outras formas, como a gestual (sinais do guarda de trânsito), visuais (sinais de trânsito),
eletrônica, etc.
A não observância da forma prescrita pode levar à anulação do ato por vício formal.
Porém, é importante observar que a forma é instrumental, ou seja, ela é um meio para
que o ato seja conhecido pelos seus destinatários e atinja suas finalidades. Por essa
razão, embora o vício formal possa levar à nulidade do ato, muitas vezes será possível a
correção desse vício e a consequente manutenção dos efeitos do ato (convalidação).
Diz-se, por isso, que a Administração deve atuar, na maior parte das vezes, com
formalismo moderado.
 Motivo: esse elemento tem dois aspectos:
 motivo de fato - é o acontecimento que desencadeia a ação administrativa
 motivo de direito – é o comando normativo previsto para a edição daquele ato.
A ocorrência de um motivo falso ou equivocado pode levar à nulidade do ato.
Não confundir o motivo com a motivação, que é a explicação dos motivos do ato. A
falta de motivação pode ser um vício formal que leva à nulidade do ato, quando a lei a
exige – vide art. 50 da Lei 9.784/99 (Lei Federal de Procedimentos Administrativos).
A importância da motivação se revela também pela adoção unânime pela doutrina e pela
jurisprudência da denominada teoria dos motivos determinantes, pela qual o agente
público, ao expor os motivos adotados para a prática do ato, vincula o ato àqueles
motivos. Se esses se revelarem falsos ou equivocados, será possível a anulação do ato,
mesmo se a lei não exigia a motivação como requisito formal desse ato.
 Finalidade
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É o resultado desejado com a prática do ato, necessariamente voltado à realização de um
interesse público consagrado no ordenamento
O não atendimento a esse requisito gera o vício conhecido como desvio de finalidade
ou desvio de poder, que se caracterizam quando o agente busca um fim que colide com
o interesse público ou que não é próprio daquele ato.
Portanto, são praticados com desvio de finalidades atos que buscam atender a outros
interesses que não os da coletividade – por exemplo, a punição de um servidor público
por motivo de inimizade do superior – ou praticados fora dos objetivos almejados pela
lei para aquele ato – por exemplo, a aplicação de sanções de trânsito com finalidade
arrecadatória.
5.4. Atributos dos atos administrativos
Os atributos ou qualidades que a doutrina costuma atribuir aos atos administrativos são:
 Presunção de legitimidade – já tivemos oportunidade de mencionar, como um
princípio da Administração Pública (cap. 2)
 Imperatividade: é uma característica dos atos em que a Administração exerce
suas prerrogativas, impondo obrigações unilateralmente aos administrados,
criando situações jurídicas independentemente da vontade destes. É o que a
doutrina chama de “poder extroverso” da Administração. É importante
observar que nem todos os atos administrativos possuem essa característica.
 Auto-executoriedade: é o poder de constranger diretamente o particular ao
cumprimento de uma obrigação ou executá-la diretamente, de maneira forçada,
sem a intervenção do Poder Judiciário. É um atributo excepcional, admitido
somente nas situações em que o interesse público não pode ficar à espera da
propositura e apreciação de uma demanda judicial e depende de autorização
implícita ou explícita da lei. Além disso, a auto-executoriedade deve ser sempre
aplicada na medida certa para evitar aquele perigo ou aquela lesão ao interesse
público, respeitando-se o princípio da proporcionalidade.
Exemplos de uso permitido da auto-executoriedade comuns no nosso direito
positivo:
 suspensão de atividade ou interdição de estabelecimento empresarial
que atua de forma irregular;
 remoção ou destruição de coisas em situação irregular, ou que estejam
oferecendo risco à segurança das pessoas;
 apreensão de bens e equipamentos utilizados em infração às normas
administrativas de segurança e salubridade;
 arrombamento de residência, para prestar socorro, entre outras medidas
de caráter urgente e impositivo.
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5.5. Classificação dos atos administrativos
Vejamos agora algumas classificações utilizadas no Direito Administrativo:
 Atos gerais e atos individuais
Essa distinção se baseia na distinção entre destinatários determinados ou
indeterminados do ato administrativo. Atos gerais são aqueles que não têm um
destinatário certo: destinam-se a todos os que se enquadram na situação nele definida.
Ex.: edital de concurso. Atos individuais são aqueles que têm destinatário certo,
definido. Ex. a nomeação de um agente público.
 Atos internos e atos externos
Essa classificação tem por critério a repercussão dos atos. Ato interno é aquele que
somente produz efeitos no âmbito interno da Administração. Por exemplo, circulares e
portarias internas, ordens de serviços, relações de remessa, etc. Ato externo é aquele
que produz efeitos em relação a terceiros. Por essa razão, se costuma dizer que ele deve
ser obrigatoriamente publicado, visto que os interessados têm direito a conhecer o
conteúdo de um ato da Administração que vá atingir seus interesses.
 Atos simples e atos complexos
Essa classificação é baseada no critério do número de vontades que participam para
edição de um ato administrativo. Ato simples é aquele que depende apenas da vontade
de um órgão para produzir seus efeitos. Ex.: a nomeação de um Ministro pelo
Presidente da República. Dentro dos atos simples, há autores fazem a distinção entre: a)
atos singulares: aqueles que são produzidos por um só agente; b) atos colegiais: aqueles
que são produzidos por vários agentes reunidos em um colegiado.
Ato complexo é aquele que depende da vontade de mais de um órgão, ente ou Poder.
Ex.: a nomeação dos Ministros do Supremo Tribunal, pois depende da vontade de dois
Poderes: o Presidente da República escolhe, mas o Legislativo, no caso, o Senado, deve
aprovar essa escolha.
 Atos vinculados e atos discricionários
Essa é a classificação que distingue os atos administrativos conforme a liberdade, a
margem de escolha do agente ao praticá-los. Por esse critério, há dois tipos: os atos
vinculados e os atos discricionários. Já tratamos dessa distinção no cap. 3, item 3.2.
5.6. Extinção do ato administrativo.
Com a extinção, cessam os efeitos do ato administrativo e ele deixa de existir no mundo
jurídico. Essa extinção pode se dar pela ocorrência de fatos jurídicos, como o
implemento de condição resolutiva ou de termo final, ou pelo desaparecimento do
objeto da relação jurídica.
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Mais interessantes são os casos em que a extinção é realizada por um ato de
desfazimento da própria Administração, retirando-o do mundo jurídico. Esses atos de
desfazimento são exercidos com base no poder de autotutela da Administração e são os
seguintes:
 Invalidação ou anulação: é o desfazimento do ato, motivado pela constatação de
que ele foi produzido em desconformidade com a ordem jurídica (ou seja, contém um
vício em um de seus elementos). Geralmente, a anulação do ato é feita de forma
retroativa (ex tunc), desfazendo também todos os seus efeitos, ressalvadas situações já
consumadas e irreversíveis ou que a lei proteja, em homenagem ao princípio da
segurança jurídica (por exemplo, a impossibilidade de repetição de verbas de natureza
alimentar, recebidas de boa-fé).
A anulação pode ser realizada de ofício pela Administração, visto que decorre do dever
de zelar pela legalidade. Todavia, quando a anulação afetar direitos de terceiro, é
necessário que este seja ouvido, em observância das garantias constitucionais do devido
processo legal, da ampla defesa e do contraditório – vide art. 5º, incisos LIV e LV da
CF/88.
Porém, nem todo vício do ato administrativo leva à anulação, pois pode haver a
possibilidade de convalidação do ato, que adiante estudaremos.
 Revogação: é o desfazimento do ato administrativo, com a finalidade de realizar
uma nova escolha, mais adequada ao interesse público, substituindo o ato por outro
mais apropriado ou simplesmente fazendo cessar os seus efeitos em definitivo.
Portanto, o ato de revogação é um ato discricionário. Justamente por isso apenas a
autoridade administrativa competente pode revogar, não sendo permitido ao Poder
Judiciário promover esse desfazimento. Ao Poder Judiciário cabe, quando provocado,
invalidar o ato que apresente vício, não podendo, no exercício de função jurisdicional,
revogar atos de competência da autoridade administrativa.
A revogação produz efeitos não retroativos (ex nunc), pois não há justificativa para
desfazer efeitos válidos já produzidos pelo ato a ser revogado. Se o ato que se deseja
desfazer possui algum vício, a Administração não pode revogá-lo: deverá, sim, anulá-
lo.
Vamos agora observar o seguinte esquema, que compara invalidação e revogação, de
maneira a gravarmos bem suas diferenças:
INVALIDAÇÃO REVOGAÇÃO
Causa: vício do ato Causa: realização de nova escolha, mais
adequada ao interesse público
É ato vinculado: há dever de invalidar É ato discricionário: há escolha em
revogar
É possível a invalidação judicial É impossível a revogação judicial
Opera efeitos retroativos (ex tunc) Opera efeitos não retroativos (ex nunc)
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 Cassação: difere tanto da invalidação quanto da revogação, pois ela é causada por
uma atitude do próprio administrado. É uma sanção aplicada ao administrado,
beneficiado por um ato administrativo, em razão do descumprimento de deveres
jurídicos a ele impostos como condição para o gozo desses benefícios. Ex.: a cassação
da habilitação para dirigir, em razão do excesso de infrações cometidas pelo condutor.
A liberdade em praticar o ato de cassação (se ele é vinculado ou discricionário) e seus
efeitos (retroativos ou não) depende do que dispuser a lei que o regula.
5.7. Convalidação do ato administrativo
A convalidação é o ato que, corrigindo os vícios de ato anterior, permite a sua
manutenção na ordem jurídica. Tal como a anulação, a convalidação também é uma
manifestação do poder de autotutela da Administração e também atua com efeitos
retroativos.
Para que possa ocorrer a convalidação, é necessário que o vício do ato a ser convalidado
seja sanável. Consideram-se sanáveis, em tese, os vícios relativos aos elementos sujeito
(competência) e forma. Porém somente a análise do caso concreto é que permitirá
verificar se o vício em questão é sujeito à correção.
No que tange aos defeitos relativos à competência do sujeito, eles podem ser sanados,
desde que o ato possa ser ratificado, isto é, confirmado pelo órgão competente para a
produção do ato. O exemplo mais conhecido é o da prática de atos por funcionário de
fato, que desde que não haja outros vícios, podem ser ratificados pela autoridade
competente. Também podem ser ratificados os atos praticados indevidamente pelo
subordinado, mas que possam ser confirmados pelo superior hierárquico, a quem
caberia praticá-lo.
Quanto à forma, se o vício formal não afetar a própria existência do ato e tampouco
interferir na certeza e na segurança jurídica em relação ao seu conteúdo ou nas garantias
dos administrados, não há vantagem em promover a invalidação desse ato.
Por último, é importante notar que a Lei nº 9.784/99 (Lei Federal de Procedimentos
Administrativos – art. 11) estabelece como condição da convalidação a inexistência de
lesão ao interesse público e a não ocorrência de prejuízos a terceiros. Portanto, se
ocorrerem tais circunstâncias, a Administração estará impedida de convalidar o ato,
devendo, portanto, anulá-lo.
5.8. Controle jurisdicional do ato administrativo
Em nosso sistema constitucional, vigora o princípio da inafastabilidade do controle
jurisdicional, pelo qual toda lesão ou ameaça a direito está sujeita a controle pelo
Judiciário – art. 5º, inciso XXXV da CF/88.
Com relação aos atos vinculados, isto é, aqueles produzidos como mera aplicação de
um comando legal, esse controle é pleno, ilimitado.
Já com relação ao ato em que haja um aspecto discricionário, onde a lei permitiu ao
agente público realizar uma escolha, se costuma dizer que a decisão judicial não
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poderá questionar o mérito do ato. Ou seja, a autoridade jurisdicional não poderá
analisar a conveniência e/ou oportunidade da prática do ato, visto que essa competência
pertence à autoridade administrativa.
Isso não quer dizer que o uso da discricionariedade estará fora de controle. Caberá ao
Poder Judiciário verificar se o agente público respeitou os limites impostos pela lei,
aplicando-a corretamente em vista a situação concreta. Para isso, o ato será analisado
sob a luz dos princípios da moralidade, da razoabilidade e da proporcionalidade,
dentre outros já explicados no capítulo 2.
Além disso, o julgador poderá constatar o desvio de finalidade, apurando se o agente
buscou alcançar outros interesses que não ou interesse público. Poderá ainda se utilizar
da teoria dos motivos determinantes, já explicada.
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6. ADMINISTRAÇÃO INDIRETA
Conforme já dissemos, a Administração Indireta é o conjunto das pessoas jurídicas
criadas pelos entes políticos. Essas pessoas podem ser criadas para desempenho de
funções tipicamente administrativas ou para o desempenho de atividade econômica
considerada de interesse público.
As espécies existentes são:
 autarquias (compreendendo nessa classe as agências e também as associações
públicas)
 fundações governamentais
 empresas públicas
 sociedades de economia mista
6.1. Traços comuns de todas as entidades da Administração Indireta
Vejamos inicialmente quais são os traços que assemelham todas essas espécies de
entidade:
 Personalidade jurídica própria: são sujeitos de direitos e obrigações, possuem
receita, patrimônio e pessoal próprio, se auto-administram e são encabeçadas por
um dirigente ou corpo diretivo.
 Responsabilidade: elas respondem por seus atos e por suas obrigações. Apenas
em caso de extinção da entidade e incorporação de seu patrimônio pelo ente
político é que este assumirá suas obrigações (responsabilidade subsidiária).
 Necessidade de lei para sua criação: a Constituição Federal (art. 37, XIX)
exige que lei específica seja editada para que haja a criação dessas entidades. No
caso das autarquias, a própria lei é que cria diretamente a entidade. Nos demais
casos a lei autoriza a criação e esta ocorre pela inscrição de seu ato constitutivo
no registro competente, conforme estabelece o Código Civil (art. 45).
 Extinção também por lei: não estão sujeitas à falência nem podem se extinguir
por vontade própria (art. 2º, I da Lei 11.101/2005 – Lei de Falências).
 Finalidade pública: o lucro não é sua finalidade essencial, mas sim a satisfação
do interesse público.
 Especialidade de atuação: somente podem desempenhar as tarefas que a lei
lhes tenha atribuído
 Sujeição aos princípios do direito administrativo estabelecidos no art. 37 da
CF
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 Controle de sua atividade pela entidade criadora – regime de tutela ou
supervisão. Estão vinculadas por esse regime a determinados órgãos da
Administração Direta – como os Ministérios e Secretarias.
 Submetem-se ao controle parlamentar (art. 49, X da CF) e à fiscalização do
Tribunal de Contas (arts. 70 e 71 da CF).
6.2. Autarquia
Conforme conceituação legal, autarquia é o serviço autônomo, criado por lei, com
personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da
Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão
administrativa e financeira descentralizada (Decreto-lei 200/67, art. 5º, I).
Trata-se de pessoa jurídica de direito público, criada diretamente pela lei e que
possui todas as prerrogativas e restrições típicas do regime jurídico-administrativo.
Exemplos de autarquias no âmbito federal: IBAMA, Banco Central, INSS.
As agências são autarquias que têm um regime jurídico especial, que lhes dá maior
autonomia para tomada de decisões no tocante à gestão de sua atividade – veja tópico
adiante.
Também pertencem à espécie as autarquias corporativas, como os Conselhos
profissionais (CRM, CREA, etc.). Elas também têm um regime especial de grande
autonomia e recentemente havia dúvidas quanto à sua natureza jurídica e se de fato
pertencem à Administração Indireta. Hoje, todavia, a doutrina e jurisprudência vêm
afirmando essa natureza e a necessidade de que essas entidades se submetam ao regime
jurídico administrativo.
 Atenção! A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), apesar de considerada
tradicionalmente uma autarquia corporativa e sujeita ao regime jurídico
administrativo, teve sua natureza redefinida por julgamento da ADI 3026-DF,
onde foi caracterizada como entidade sui generis e não sujeita às principais
regras do regime administrativo, estando dispensada de realizar concursos
públicos e de submeter suas contas aos Tribunais de Contas.
6.3. Fundações governamentais
As Fundações governamentais ou fundações públicas são entidades criadas à
semelhança das fundações privadas: trata-se de um patrimônio personalizado,
geralmente instituído para desempenho de atividade no âmbito social: saúde, educação,
cultura, etc.
Tais como as fundações privadas, as fundações governamentais não têm finalidade
lucrativa, sendo que o resultado de eventuais atividades comerciais deve reverter
inteiramente para os fins de sua instituição. Também se beneficiam da imunidade
tributária recíproca (art. 150, § 2º da CF).
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O regime jurídico aplicável às fundações é controverso. Admite-se atualmente a
existência de duas subespécies:
 Fundações governamentais de direito público – que nada mais são do que
uma variação da espécie autarquia.
 Fundações governamentais de direito privado – são parcialmente regidas pelo
direito privado (quanto à constituição, regime de trabalho e previdenciário de
seus agentes, natureza de seus bens, etc.). Aplicam-se a ela, porém, algumas
restrições do regime jurídico-administrativo (obrigatoriedade de concurso
público, licitação, vedação à acumulação de cargos públicos, etc.)
Exemplos de fundação governamental no âmbito federal: Fundação Nacional do Índio
(FUNAI), Fundação Biblioteca Nacional, Fundação Nacional de Arte (FUNARTE).
6.4. Empresa pública
O Poder Público pode criar empresas para desempenhar atividade econômica (art. 173
da CF) ou prestar serviços públicos (art. 175 da CF) em regime similar ao dos
particulares. Tais empresas devem seguir o regime jurídico privado nas suas relações
civis, comerciais, trabalhistas, previdenciárias e tributárias. Não obstante, também se
sujeitam a restrições do regime jurídico-administrativo tais como as fundações de
direito privado.
A empresa pública é a empresa constituída por capital inteiramente público. Admite-
se a sua criação com base em qualquer das formas admitidas no direito empresarial.
Exemplos de empresa pública no âmbito federal: Empresa de Correios e Telégrafos;
Caixa Econômica Federal, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES).
6.5. Sociedade de economia mista
Também se presta ao desempenho de atividade econômica ou à prestação de serviços
públicos em regime similar ao dos particulares. Tal como a empresa pública, também se
rege pelo regime jurídico privado, mantendo algumas sujeições do regime jurídico-
administrativo.
A sociedade de economia mista se distingue da empresa pública basicamente por dois
aspectos:
 Capital com participação privada. Embora o Poder Público detenha o
controle societário (maioria das ações com direito a voto), os particulares
podem ter participação no capital da empresa.
 Forma obrigatória: sociedade anônima. A participação privada impõe essa
forma societária, em vista da necessidade de proteção do acionista privado,
sendo que o regime das S/As é o que melhor atende a esse interesse.
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Exemplos de sociedade de economia mista no âmbito federal: Petrobrás, Banco do
Brasil, Eletrobrás.
6.6. Empresas estatais prestadoras de serviços públicos
É comum que as pessoas de direito privado, especialmente as empresas públicas e
sociedades de economia mista venham a prestar serviços públicos, especialmente
aqueles que são passíveis de tarifação – como transporte, fornecimento de energia
elétrica, telefonia, etc.
Nesse caso, embora elas continuem sendo regidas predominantemente pelo regime
jurídico de direito privado, acabam ganhando algumas características a mais do regime
jurídico-administrativo, em razão da natureza da atividade desempenhada.
O melhor exemplo dessa situação envolve os bens dessas entidades. Embora não
legalmente conceituados como bens públicos, mas sim bens privados, os bens
utilizados para prestação do serviço público passam a ser protegidos, não podendo ser
penhorados, arrestados ou sequestrados – vide nesse sentido a decisão proferida pelo
STF no RE nº 220.906, no tocante à Empresa de Correios e Telégrafos.
6.7. Agências
Embora já tenhamos esgotados as espécies da Administração Indireta, há algumas
figuras que merecem estudo.
As chamadas agências não são uma nova espécie de ente da Administração Indireta,
mas sim uma qualificação e um regime jurídico especial que se estabelece em favor de
uma autarquia ou uma fundação governamental, dando-lhe grande autonomia para
desempenho de suas atribuições.
Tipos de agência:
 Agência reguladora: exercem o poder de polícia sobre determinadas atividades
ou controlam serviços públicos concedidos a terceiros.
 Agência executiva: entidade da administração indireta que, após celebrar
contrato de gestão com a entidade criadora, ganha maior autonomia
administrativa, condicionada à eficiência de resultados
As agências reguladoras são os tipos mais importantes, visto que o modelo das
agências executivas, criado pela Emenda Constitucional nº 19/98 (Reforma
Administrativa), não foi até agora bem utilizado.
Características básicas do regime das agências reguladoras, no modelo federal:
 Colegialidade de sua direção: as agências são dirigidas por um Conselho ou
Diretoria, sendo que os membros desse colegiado possuem mandato fixo e são
nomeados por períodos não-coincidentes. Tudo isso, com a finalidade de dar
maior independência e tecnicidade à atuação da entidade.
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 Estabilidade dos dirigentes: durante o exercício de seu mandato, a destituição
dos dirigentes somente pode ocorrer justificadamente, mediante procedimento
administrativo ou sentença judicial transitada em julgado (Lei 9.986/00 – art.
9º).
 Caráter final de suas decisões técnicas: não são passíveis de modificação pela
entidade controladora. Atualmente, admite-se controle de seus atos apenas
quando: a) ultrapassarem os limites de suas competências institucionais; ou b) se
violarem políticas públicas estabelecidas pela alta direção da Administração
(Chefia do Poder Executivo e Ministérios a que estão vinculadas – Parecer AGU
nº 51/06).
Exemplos de agências reguladoras no âmbito federal: ANEEL (Agência Nacional de
Energia Elétrica), ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações), ANVISA
(Agência Nacional de Vigilância Sanitária).
6.8. Consórcios públicos
Previstos na Lei 11.107/2005, os consórcios públicos são formados pela associação de
entes políticos, que se unem para criar uma pessoa jurídica, à qual será atribuída a
gestão de um serviço público de interesse comum das entidades consorciadas.
A pessoa jurídica formada pode ser de direito público – nesse caso, ganha a
denominação de associação pública, embora a doutrina afirme tratar-se apenas de uma
subespécie de autarquia. Também pode ser constituída com regime de direito privado,
sendo então uma empresa pública ou sociedade de economia mista.
O consórcio público inicia sua constituição por meio de um protocolo de intenções entre
os entes que pretendem se consorciar. Porém, não basta isso: é necessário que ao menos
dois dos entes políticos editem leis ratificadoras do protocolo, de maneira que o
contrato de consórcio seja efetivamente constituído.
Tendo personalidade própria, o consórcio público responde por suas obrigações, sendo
que os entes consorciados responderão subsidiariamente pelas obrigações do consórcio
apenas em caso de extinção ou insuficiência de patrimônio para responder pelas dívidas
contraídas – no que, aliás, não difere das demais entidades da Administração Indireta.
Um exemplo de consórcio público recentemente criado, na modalidade associação
pública, é a Autoridade Pública Olímpica, ratificado em âmbito federal pela Lei nº
12.396/2011.
´
6.9. Tutela da Administração Indireta
É importante frisar que as entidades da Administração Indireta não são subordinadas
hierarquicamente aos órgãos aos quais se vinculam. O vínculo tem o nome de tutela
ou supervisão e é uma forma de controle finalístico, ou seja, voltado para a verificação
dos resultados e do cumprimento das metas estabelecidas pelo ente político.
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As medidas de tutela são estabelecidas pelas leis que regem os entes da Administração
Indireta e pelas legislações instituidoras. As medidas mais comuns são:
 Indicação e nomeação do dirigente ou designação dos representantes
governamentais nas Assembléias Gerais e órgãos de controle da entidade;
 Aprovação da proposta orçamentária anual da entidade, no caso das pessoas
jurídicas de direito público;
 Recebimento de relatórios, boletins e balancetes que permitam acompanhar o
cumprimento das metas da entidade;
 Aprovação das contas, relatórios e balanços da entidade, diretamente ou através
de representantes em seus órgãos de administração e controle;
 Fixação de limites de despesas com pessoal e administração da entidade;
 Fiscalização da legalidade e dos seus atos e da economicidade dos seus gastos;
 Aprovação de planos de trabalho;
 Intervenção na entidade, por motivo de interesse público.
 Atenção! Por não haver hierarquia ou subordinação, a decisão de um
dirigente de entidade da Administração Indireta não está sujeita a recurso para o
órgão ao qual ela se vincula, a menos que a lei expressamente preveja essa
hipótese. Havendo essa previsão, esse recurso costuma ser denominado recurso
hierárquico impróprio, justamente porque não existe hierarquia entre a
autoridade recorrida e a autoridade que apreciará o recurso.
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6.10. Quadro resumo do regime jurídico aplicável às entidades da Administração
Indireta
Autarquias e
Fundações de Dir.
Público
Fundações de Direito Privado Empresas públicas e
Sociedades de Economia
Mista
Regime jurídico
predominante
Direito público Direito privado Direito privado
Criação Diretamente pela lei Autorizada pela lei Autorizada pela lei
Sujeição ao controle por
meio de tutela
Sim Sim Sim
Natureza jurídica de seus
bens
Bens públicos Bens privados Bens privados
Sujeição às normas de
direito financeiro e ao
Controle Externo
(Legislativo e Tribunal de
Contas)
Sim Sim Sim
Admissão de pessoal por
concurso público
Sim Sim Sim
Proibição de acumulação
de cargos pelos servidores
Sim Sim Sim
Sujeição ao princípio da
licitação
Sim Sim Sim Sim
Sujeição dos seus agentes
à Lei de Improbidade, à
Ação Popular e à Ação
Civil Pública
Sim Sim Sim
Sujeição ao Mandado de
Segurança
Sim Sim (quando manejar poderes
tipicamente estatais)
Sim (quando manejar poderes
tipicamente estatais)
Regime estatutário dos
Servidores
Facultativo (cabe à lei
definir)
Não Não
Imunidade Tributária Sim Sim (nos bens, rendas ou
serviços vinculados às
finalidades essenciais)
Não
Responsabilidade objetiva
estatal – art. 37, § 6º
Sim Apenas se prestar serviços
públicos
Apenas se prestar serviços
públicos
Responsabilidade
subsidiária do Estado
Sim Sim Sim
Prescrição qüinqüenal das
obrigações
Sim Sim Sim
Impenhorabilidade dos
bens
Sim Apenas dos bens afetados à
prestação de serviços públicos
Apenas dos bens afetados à
prestação de serviços públicos
Cobrança de dívidas por
precatório
Sim Não Não
Prerrogativas processuais
(arts. 188 e 475, do CPC)
Sim Não Não
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7. PROCESSO ADMINISTRATIVO
7.1. Definição e espécies
Definição: denomina-se processo administrativo a série de atos coordenados, voltados
para a tomada de uma decisão ou solução de uma controvérsia, no âmbito da
Administração pública.
Em nosso estudo, mencionaremos especialmente os princípios e dispositivos da Lei
9.784/99, que regula os processos administrativos no âmbito federal, cuja leitura
recomendamos.
No Direito Administrativo, são empregados diversos tipos de processo, visando a
variadas finalidades. A professora Odete Medauar propõe a classificação abaixo, útil
para entendermos a variedade dos processos administrativos:
 Processos em que há controvérsia ou conflito de interesses:
 Processos de gestão: licitações, concursos públicos etc.
 Processos de outorga: licenciamento, autorização, registro de marcas etc.
 Processos de verificação: verificação de contas, correição etc.
 Processos de revisão: reclamações, petições, impugnações etc.
 Processos em que há acusação:
 Internos: processos disciplinares.
 Externos: sanções aplicadas pelo poder de polícia.
7.2. Princípios do processo administrativo
A Lei 9.784/99 arrola, em seu art. 2º, diversos princípios e diretrizes acerca do processo
administrativo. Destacamos alguns dos princípios e diretrizes mais importantes,
contidos na referida lei ou mencionados pela doutrina:
 Devido processo legal – constante do art. 5º, LIV, da CF, confere aos
administrados o direito de exigir da Administração a observância do
procedimento legal, quando a decisão a ser tomada afetar seus interesses.
 Ampla defesa e contraditório – princípio garantido no art. 5º, LV da CF e no
art. 3º da Lei 9.784/99. O contraditório se revela na prerrogativa do interessado
de ser informado de todos os atos do procedimento e acompanhar a instrução
processual, podendo se manifestar sempre que for dada essa oportunidade à
parte adversa. A ampla defesa pressupõe a produção de todas as provas lícitas,
inclusive o arrolamento e inquirição de testemunhas e a apresentação de peças
de defesa, que devem obrigatoriamente ser apreciadas pela autoridade decisora.
Também pressupõe o direito de ter “vistas” do processo. Cabe citar algumas
normas da Lei 9.784/99 que buscam atender a esse princípio: art. 2º, VII, VIII,
X; 3º, II, III e IV; art. 26; art. 27; art. 28; art. 38; art. 39; art. 41; art. 44;
art. 46).
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Sobre a aplicação desses princípios no processo administrativo, o Supremo
Tribunal Federal editou as seguintes súmulas vinculantes:
Súmula Vinculante nº 3: Nos processos perante o Tribunal de Contas da
União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder
resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o
interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial
de aposentadoria, reforma e pensão.
Súmula Vinculante nº 5: A falta de defesa técnica por advogado no processo
administrativo disciplinar não ofende a Constituição.
 Publicidade – ressalvada as hipóteses de proteção da intimidade e do interesse
social (art. 5º, LX da CF) e da segurança do Estado e da sociedade (art. 5º,
XXXIII) os processos administrativos são acessíveis a todos os cidadãos, por
força desse princípio, consagrado no art. 37, caput da CF e reforçado pelos
artigos 3º, V; 31 e 46 da Lei 9.784/99.
 Impessoalidade – sendo que a lei exige a “objetividade no atendimento ao
interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades”. Por
essa razão, se estabelece situações de impedimento (art. 18) e suspeição do
servidor ou autoridade que atuarem no processo.
O impedimento ocorre em situações de envolvimento direto do agente, sendo
causa absoluta de nulidade do processo. O servidor deve se declarar impedido e
se não o fizer, estará incorrendo em falta grave. Está sob impedimento o agente
que: tenha interesse direto ou indireto na matéria do processo; tenha participado
ou venha a participar como perito, testemunha ou representante, ou se tais
situações ocorrem quanto ao cônjuge, companheiro ou parente e afins até o
terceiro grau; esteja litigando judicial ou administrativamente com o interessado
ou respectivo cônjuge ou companheiro.
A suspeição¸ que consiste em situação de amizade íntima ou inimizade notória
com algum dos interessados ou pessoas que lhe são próximas, deve ser alegada
pela parte interessada e não é causa absoluta de nulidade.
 Motivação – a Lei 9.784/99 dedica um extenso artigo (art. 50) a esse princípio,
determinando que sejam necessariamente motivados os atos que
 neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;
 imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;
 decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;
 dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;
 decidam recursos administrativos;
 decorram de reexame de ofício;
 deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de
pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;
 importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato
administrativo.
Além disso, diz que a motivação deve ser “explícita, clara e congruente,
podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de
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anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão
parte integrante do ato”.
 Oficialidade – princípio que obriga a autoridade a impulsionar o processo,
ainda que não haja provocação do interessado. Diferentemente do processo
judicial, os processos administrativos nem sempre depende de solicitação do
interessado para ser instaurados, podendo ser iniciados de ofício. Tal impulso
oficial também existe na instrução, na decisão e na revisão da decisão – vide Lei
9.784/99: art. 2º, XII; art. 5º; art. 48 e art. 49.
 Formalismo moderado (alguns autores se refere a informalismo) e economia
processual – o processo deve adotar formas simples e econômicas, menos
gravosas aos interessados e com concentração de meios para atingir os seus fins.
Cabe observar que processos em que há competição entre as partes (licitação,
concurso público) ou que há acusação (processos de polícia e disciplinares) o
formalismo é necessariamente maior. Também se permite a convalidação dos
erros sanáveis e o aproveitamento de atos já praticados, que não tenham vício,
em caso de anulação de ato processual. Vide sobre esses princípios, na Lei
9.784: art. 2º, VIII, IX; art. 7º; art. 8º; art. 22; art. 23, parágrafo único; art.
35; art. 55.
 Celeridade – o processo deve ter uma duração razoável, suficiente para garantia
de segurança da parte. Para tanto, deve haver fixação de prazo máximo para a
produção dos atos do processo. Consagrado nos seguintes dispositivos da Lei
9.784/99: art. 24; art. 42; art. 43; art. 49; art. 59, § 1º.
 Não onerosidade – o processo não deve ser oneroso para a parte. Se houver
acusação ou exercício de direitos de cidadania, é vedada a cobrança de taxas
para exercício da defesa ou direito de manifestação – vide na Lei 9.784/99: art.
2º, XI; art. 29, § 2º. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal editou a
seguinte súmula vinculante:
Súmula Vinculante nº 21: É inconstitucional a exigência de depósito ou
arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso
administrativo.
 Razoabilidade e segurança jurídica – a Lei 9.784/99 impõe que no processo
administrativo haja “adequação entre meios e fins, vedada a imposição de
obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente
necessárias ao atendimento do interesse público” (art. 2º, VI) atendendo assim
ao princípio da razoabilidade. Também exige a “interpretação da norma
administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que
se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação” (art. 2º, XIII),
em reconhecimento ao princípio da segurança jurídica.
 Participação popular – aplicável apenas nos processos de tomada de decisão
que afetem os direitos da coletividade – tais como as leis orçamentárias, planos
diretores, licenciamentos ambientais e estudos de impacto ambiental. Na Lei
9.784/99, esse princípio consta dos seguintes dispositivos: arts. 31, 32, 33 e 34.
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7.3. Fases do processo
O processo administrativo compreende as seguintes fases:
 Instauração – pode ser realizada de ofício ou por requerimento do interessado,
dependendo da finalidade a ser atingida pelo processo. O requerimento do
interessado deve ser por escrito, salvo nos casos em que se admitir solicitação
oral. Para atender à economia processual e ao formalismo moderado, a lei
prescreve o uso de modelos ou formulários padronizados e a admissão de
pedidos formulados de forma coletiva, quando houver identidade de pedidos e
fundamentos. Também proíbe à Administração a recusa imotivada de
recebimento de documentos, devendo o servidor orientar o interessado quanto ao
suprimento de eventuais falhas.
 Instrução – nos processos administrativos, a Administração deve buscar a
verdade material. Por essa razão, a autoridade pode se valer de qualquer prova
lícita, produzida por ela própria, pelos interessados e terceiros, para formar a sua
convicção. Isso permite a reformatio in pejus nos processos administrativos (art.
64, par. único da Lei 9.784/99) e a revisão a qualquer tempo da decisão, quando
sobrevierem novos fatos ou circunstâncias relevantes, desconhecidos à época da
decisão (art. 65 da Lei 9.784/99).
Embora a lei atribua ao interessado o ônus de produzir prova dos fatos que tenha
alegado (art. 36), estabelece que os atos devam ser realizados de forma menos
gravosa para este (art. 29, § 2º) e se os elementos de prova estejam de posse da
Administração, cabe a ela requisitá-los de ofício (art. 37). Somente podem ser
recusadas as provas ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias
(art. 38, § 2º). O interessado deve ser comunicado de todos os atos decisórios ou
de produção de elementos probatórios, bem como dos atos que importem em
imposição de deveres, ônus, sanções ou restrições do exercício de direitos (arts.
26 e 28). O não atendimento à intimação não importa em reconhecimento da
verdade dos fatos, nem a renúncia a direitos pelo interessado, que poderá
continuar se defendendo no processo (art. 27).
Depois de colhidas todos os elementos probatórios (documentos, pareceres,
diligências, perícias, testemunhos), é dado direito de manifestação ao interessado
(art. 45). Se o órgão instrutor não for competente para a tomada da decisão,
formulará relatório completo e justificado, propondo a decisão para a autoridade
competente (art. 47).
 Decisão – a Administração tem o dever de decidir o processo em prazo
razoável (art. 48 e art. 49), sendo que pode declarar extinto o processo quando
exaurida sua finalidade ou o objeto da decisão se tornar impossível, inútil ou
prejudicado por fato superveniente (art. 52). A decisão deve ser motivada nos
casos já mencionados, previsto no art. 50. Se o processo for iniciado por
impulso do interessado, ele pode desistir total ou parcialmente do pedido ou
renunciar a direitos disponíveis, mas isso não obriga a Administração a extinguir
o processo, se houver interesse público que justifique o seu prosseguimento (art.
51).
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 Recurso – a lei garante o direito de recurso da parte legítima (vide art. 58),
sendo estabelecida a pluralidade de instâncias (no máximo três), de maneira a
garantir a melhor decisão para o administrado. O recurso é dirigido à autoridade
que decidiu, que poderá rever sua decisão ou encaminhar à autoridade superior
(arts. 56 e 57). Esta poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso, em caso de
justo receio de dano irreparável, embora não esteja obrigada a isso (art. 61). O
recurso não será conhecido em caso de intempestividade, ilegitimidade do
recorrente, incompetência do órgão ao qual se recorreu ou se já esgotada a esfera
administrativa Em caso de direcionamento ao órgão errado, se prevê a devolução
do prazo de recurso. O não conhecimento do recurso não impede a revisão de
ofício do ato ilegal, desde que não tenha ocorrido preclusão administrativa (art.
63). A autoridade, ao apreciar o recurso, poderá confirmar, modificar, anular ou
revogar, total ou parcialmente, a decisão recorrida, se a matéria for de sua
competência (art. 64).
Cabe observar que por força do estabelecimento da Súmula Vinculante,
regulamentada pela Lei 11.417/2006, a autoridade que deixar de aplicar a
orientação contida em súmula vinculante deverá justificar essa decisão,
indicando por que razão o caso concreto não se enquadra nas hipóteses previstas
no verbete editado pelo STF (art. 56, § 3º e 64-A). Caso a parte ajuíze
reclamação ao STF pelo descumprimento da súmula vinculante e ela for
acolhida pelo Tribunal, a autoridade será intimada a rever sua decisão e adequar
as futuras decisões em casos semelhantes, sob pena de responsabilização (art.
64-B).
7.4. Coisa julgada administrativa
Não há propriamente coisa julgada no Direito Administrativo, visto que as decisões
administrativas sempre podem ser revistas no âmbito judicial, carecendo de
definitividade.
Porém, a doutrina utiliza essa expressão para se referir a irretratabilidade de decisões
da Administração, em situação em que ela está impedida de anular ou revogar ato que
tenha praticado.
A Lei 9.784/99 estabeleceu critério objetivo a respeito, aplicável à esfera federal, no que
tange à anulação de atos administrativos:
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram
efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que
foram praticados, salvo comprovada má-fé.
§ 1o
No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da
percepção do primeiro pagamento.
Também se fala em preclusão administrativa quando já esgotado o momento
adequado de produção do ato administrativo, no curso de um processo. Assim, a
autoridade que não reconsiderou sua decisão e encaminhou o recurso do interessado
para apreciação da autoridade superior, não pode mais alterar a sua própria decisão,
visto que ultrapassada a fase adequada para a produção desse ato.
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
Também é comum na esfera administrativa a existência de prazos decadenciais para o
exercício de um poder ou faculdade da Administração, como por exemplo, o prazo de 5
(cinco) anos para constituir o crédito tributário ou o prazo também de cinco anos para
promover a desapropriação de um bem declarado de utilidade pública.
Há ainda prazos chamados de prescricionais, por exemplo, os prazos para que a
administração possa exercer a pretensão de punir administrativamente um servidor
público (vide, por exemplo, art. 142 da Lei 8.112/90).
Por fim, cabe mencionar as situações consumadas ou exauridas, que já não podem
mais ser desfeitas, eventualmente sendo resolvidas por meio de indenizações. Assim, a
Administração não pode revogar ato de demolição que já foi executada; ou cassar
autorização para a prática de um ato, depois que esse já se realizou.
Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo
8. LICITAÇÕES
8.1. Definição
Iniciemos nosso estudo propondo a seguinte definição:
Definição: licitação é o procedimento competitivo, prévio, formal e necessário à
celebração de um contrato entre a Administração e um terceiro.
Analisemos a definição:
 Trata-se de uma competição em que vários sujeitos – os licitantes – disputam a
celebração de um contrato com a Administração. Esta fixará as regras do
certame e critérios para escolha da melhor proposta.
 O formalismo da licitação é típico dos procedimentos competitivos – os
concursos para acesso aos cargos públicos também têm essa característica. É que
todos os participantes têm direito de exigir que os demais cumpram estritamente
as regras da competição.
 É um procedimento prévio e necessário, pois a própria Constituição obriga a
realização da licitação antes de qualquer contratação, ressalvadas as hipóteses
legais de dispensa ou inexigibilidade (art. 37, XXI).
8.2. Objetivos da licitação
Dois objetivos básicos são alcançados por meio da licitação:
 Dar igual oportunidade a todos os que queiram negociar com a Administração
– o que prestigia o princípio da isonomia.
 Escolher a proposta mais vantajosa para a Administração – o que prestigia o
princípio da indisponibilidade do interesse público.
8.3. Tratamento normativo
A obrigatoriedade de licitar é prevista pela própria Constituição Federal, nos seguintes
dispositivos:
Art. 37 (...)
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços,
compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública
que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes...
Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime
de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços
públicos.
Além disso, há as seguintes leis ordinárias que regulam o procedimento licitatório:
Preparatório OAB - USJT - Material de apoio - Direito Administrativo - 1ª parte
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  • 1. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 1. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 1.1. Estado e Administração Pública O Estado pode ser definido como a organização político-jurídica capaz de impor sua vontade a todos os que se situam dentro de um determinado território. E o que seria a Administração Pública? A Administração é uma das facetas da atuação do Estado, que se revela na vida cotidiana daqueles que estão submetidos ao poder estatal. Para entender melhor, vamos analisar as funções do Estado 1.2. Funções estatais As funções estatais podem ser divididas em a) Função legislativa – é a atividade de criação das normas gerais e abstratas a serem seguidas por todos; é desempenhada de forma principal pelo Poder Legislativo. b) Função jurisdicional – é a atividade pela qual se decidem de forma definitiva os litígios referentes à interpretação e aplicação das normas acima mencionadas; é desempenhada de forma principal pelo Poder Judiciário. c) Função administrativa – é a função que nos interessa e que abrange todas as demais atividades desempenhadas pelo Estado; é exercida de forma preponderante pelo Poder Executivo. A função administrativa compreende, portanto, uma variedade enorme de atividades, tais como: tributação, fiscalização e manutenção da ordem pública, prestação de serviços à coletividade, incentivos às atividades consideradas de interesse público, etc. Além disso, também fazem parte dessa função todas as atividades destinadas à manutenção da estrutura estatal, como os cuidados com o patrimônio dos entes públicos, o recrutamento e a disciplina dos agentes estatais, a realização de aquisições e demais contratações que sejam necessárias ao funcionamento da máquina administrativa etc. Acho que já entendemos o que é a função administrativa. Porém, conceituá-la é tarefa dificílima, havendo autores que preferem dizer: é tudo aquilo que não é função legislativa, nem função jurisdicional. Vamos fornecer apenas como suporte para avançarmos em nosso conhecimento, a seguinte definição: Definição: A função administrativa consiste no exercício de poderes, pelo Estado e seus agentes, com a finalidade de: a) satisfazer concretamente os interesses essenciais da coletividade; e b) promover a organização e funcionamento dos órgãos estatais, de molde a possibilitar o exercício de suas atividades.  Atenção! Uma informação importante é que, embora a Constituição faça a separação entre três classes de órgãos, denominados “Poderes” – o Poder
  • 2. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo Legislativo, o Poder Executivo e o Poder Judiciário – essa divisão não coincide de forma absoluta com a divisão de funções já mencionada. Cada “Poder” exerce de forma principal ou típica a função associada a seu nome; porém, pode praticar atos relacionadas a outra função, de forma secundária ou atípica. O Poder Executivo e o Poder Judiciário participam da função legislativa, por exemplo, por meio da iniciativa de leis, conforme previsto na CF. O Poder Legislativo também exerce funções jurisdicionais, ao julgar os crimes de responsabilidade. (CF, art. 52, I e II). Todos os Poderes exercem a função administrativa, na medida em que necessitam se estruturar para desempenhar suas atividades. O Congresso Nacional quando realiza um concurso para servidores; o Tribunal de Justiça quando realiza uma licitação para compra de computadores; o juiz, quando baixa uma norma para disciplinar o horário dos servidores do cartório – todos são exemplos de exercício de função administrativa por autoridades legislativas e judiciárias. 1.3. Definição de Administração Pública Podemos, portanto definir Administração Pública como o exercício, por agentes estatais, das atividades e tarefas relacionadas à função administrativa (sentido objetivo ou funcional de Administração Pública) Sob um outro ângulo, Administração Pública também significa o conjunto de pessoas jurídicas, órgãos e agentes incumbidos do desempenho da função administrativa (sentido subjetivo ou orgânico de Administração Pública). 1.4. Usos da palavra Administração O vocábulo Administração pode ser usado de forma mais específica, para distinguir diversas situações no âmbito da atuação administrativa. Assim, na linguagem do Direito Administrativo, temos as seguintes expressões: Quanto à esfera governamental:  Administração Federal – se refere à atuação ou às pessoas, órgãos e agentes da União  Administração Estadual - se refere à atuação ou às pessoas, órgãos e agentes dos Estados-membros  Administração Distrital - se refere à atuação ou às pessoas, órgãos e agentes do Distrito Federal  Administração Municipal - se refere à atuação ou às pessoas, órgãos e agentes dos Municípios Quanto à forma como é exercida a função administrativa:  Administração centralizada: quando a função administrativa é exercida diretamente pelos entes políticos (ou seja, pela União, Estados, Distrito Federal ou Municípios)
  • 3. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo  Administração descentralizada: quando a função administrativa é exercida por meio da outorga ou delegação de poderes – pode se tratar de uma entidade criada pelo próprio ente político (uma autarquia, por exemplo) ou por um particular (concessionário de serviços públicos, por exemplo). Quanto à forma de organização administrativa:  Administração Direta: expressão consagrada na Constituição, para se referir às estruturas administrativas internas dos entes políticos.  Administração Indireta: expressão que abrange as pessoas jurídicas criadas pelos entes políticos (autarquias, empresas públicas, etc.) Podemos também tornar mais específica a expressão, ao nos referirmos a uma esfera governamental determinada. Por exemplo, ao nos referirmos à Administração Indireta Federal, estamos querendo alcançar apenas as pessoas jurídicas criadas pela União.  Administração autárquica: se refere apenas às entidades referidas como autarquias – que explicaremos mais adiante.  Administração fundacional: se refere apenas às entidades referidas como fundações governamentais – que explicaremos mais adiante.
  • 4. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 2. O REGIME JURÍDICO-ADMINISTRATIVO E OS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA 2.1. O regime jurídico-administrativo. Em sua concepção contemporânea, a Administração não é um fim em si mesma. Ela é um meio de realizar as necessidades da coletividade. Assim, o poder de que ela dispõe somente pode ser exercido para satisfazer o interesse público. Os poderes ou competências da Administração são, portanto poderes-deveres. Ou seja, são sempre associados ao dever de realizar os interesses maiores da coletividade. Em razão dessa missão da Administração Pública, ela possui um conjunto de princípios e regras destinado a garantir que ela alcançará seus objetivos: é o regime jurídico- administrativo. O regime jurídico-administrativo é um regime diferenciado, feito sob medida para a Administração Pública. Nele, institutos conhecidos no direito comum – isto é, no direito que se aplica a todos os indivíduos – ganham uma nova roupagem. Para entendermos o regime jurídico-administrativo, temos de conhecer dois princípios básicos da atividade administrativa, relacionados à idéia de interesse público:  Princípio da indisponibilidade do interesse público, também referido com princípio da finalidade: tal princípio nos diz que o agente público deve sempre cuidar da realização do interesse público, não se desviando desse caminho. Viola esse princípio, por exemplo, o agente público que usa a viatura oficial para viagem de lazer; ou ainda, o agente que desperdiça recursos públicos com gastos desnecessários e imotivados.  Princípio da supremacia do interesse público: serve para justificar a existência de prerrogativas e privilégios da Administração em relação ao particular. Tendo em vista que o interesse da coletividade é mais importante que o interesse dos indivíduos, costuma-se dizer que, quando presente o interesse público, a Administração se coloca numa posição de superioridade em relação ao particular. Esses princípios estão na raiz de uma série de princípios e regras especiais, aplicáveis à Administração, dando ao regime jurídico-administrativo uma feição muito fácil de reconhecer. Esses princípios e regras se caracterizam de duas formas:  Restrições – princípios e regras restritivos impedem ou dificultam o agente público de atuar com desatenção ao interesse público. Por exemplo: a necessidade de procedimento licitatório para realizar contratações; a necessidade de autorização da lei orçamentária para realizar despesas.  Prerrogativas e privilégios – princípios e regras que dão à Administração um tratamento especial, diferenciado e superior em relação ao particular. Por exemplo: a possibilidade de desapropriar um bem de um particular; o poder de aplicar sanções àqueles que violam as regras de convivência coletiva.
  • 5. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo Um esquema pode nos auxiliar a memorizar essas informações: Concluindo: Definição: o regime jurídico-administrativo é o conjunto de princípios e regras que, em razão da supremacia e da indisponibilidade do interesse público almejado pela Administração, confere a ela prerrogativas e privilégios e estabelece restrições especiais, diferenciando-a dos demais sujeitos de direito  Atenção! A idéia do regime jurídico-administrativo é a chave de ouro de nossa disciplina, pois por meio dessa idéia podemos compreender a razão de ser de vários institutos do Direito Administrativo. 2.2. Os princípios do Direito Administrativo É inegável a importância do estudo e da compreensão dos princípios em toda e qualquer área do Direito. Isso porque o Direito não se resume às regras, ou seja, aquela espécie de norma jurídica pela qual se pode deduzir de maneira relativamente segura, a prescrição de um comportamento.  Atenção! Os princípios também têm força normativa. Embora tenham um maior grau de abstração do que as regras, eles são mais permanentes que elas e dão consistência e harmonia ao sistema jurídico. Do ponto de vista prático, os princípios nos dão pistas, indícios, sobre o conteúdo provável das normas e nos ajudam também a interpretá-las, de maneira que elas sejam coerentes entre si. No Direito Administrativo, isso é ainda mais importante, pois não há uma codificação de normas administrativas. As normas do Direito Administrativo estão na própria
  • 6. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo Constituição, em leis nacionais e também em leis de cada um dos entes da Federação – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – pois todos têm competência para legislar sobre suas atividades administrativas. Além disso, existem também as normas infralegais: as resoluções, regulamentos, portarias, produzidas por cada uma dessas Administrações. A harmonização na interpretação e aplicação dessas centenas de normas se faz por meio do estudo e da compreensão dos princípios. Alguns dos princípios que estudaremos são explicitamente mencionados na Constituição Federal, especialmente em seu art. 37. Outros foram positivados em leis infraconstitucionais. E há também aqueles que, embora não constem explicitamente de algum texto normativo, são estudados e utilizados na doutrina e na jurisprudência administrativista. Os princípios mais importantes são os que constam do caput do art. 37 da CF. Eles formam um anagrama que permite nossa melhor fixação: L egalidade I mpessoalidade M oralidade P ublicidade E iciência 2.2.1. Princípio da legalidade O princípio da legalidade é um princípio geral que se aplica a todos os ramos do Direito, mas que tem um tratamento especial no Direito Administrativo. Ele está consagrado, de modo genérico, no art. 5º da CF/88, aquele que relaciona os Direitos Fundamentais Individuais e Coletivos: “Art. 5º... II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. Ele estabelece, portanto, uma limitação para qualquer ação que vise restringir a liberdade dos cidadãos, mesmo que tal ação seja realizada pelo próprio Estado. O princípio da legalidade é a coluna fundamental do chamado Estado de Direito, ou seja, a idéia de que o poder só atua legitimamente quanto autorizado pela norma jurídica produzida pelo órgão legislativo competente. Para a Administração, ele está previsto no art. 37, caput da CF, que também faz referência a outros princípios. Para o cidadão, a legalidade representa uma garantia de sua liberdade. No Direito Administrativo, ao contrário, ganha uma feição de limitação para a Administração – motivo pelo qual acaba ganhando um apelido: legalidade estrita. Nesta linha, costuma-se dizer que a Administração não apenas deve evitar agir “contra legem” (contrariamente à lei), “ultra legem” (além do que a lei estabelece), mas
  • 7. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo somente pode agir “secundum legem”, isto é, segundo a lei. A Administração somente pode desenvolver a atividade que a lei lhe autorizar, especialmente quando essa atividade interferir na esfera de liberdade e nos direitos dos indivíduos. Saliente-se que, nesse contexto, estamos sempre nos referindo à lei em sentido formal, ou seja, aquela que é produzida por meio do processo legislativo, disciplinado pela Constituição. O conceito de lei em sentido formal não abrange normas produzidas por órgãos administrativos, no exercício do chamado poder normativo – que será explicado no capítulo seguinte. 2.2.2. Princípio da Impessoalidade O princípio da impessoalidade afirma que a coisa pública – a chamada “res publica” – não deve ser apropriada ou confundida com os interesses dos agentes que transitoriamente exercem função pública. Há dois significados diferentes para esse princípio, sendo que ambos são válidos e se completam:  A impossibilidade de confundir a pessoa jurídica estatal e a pessoa do administrador, promovendo o chamado “culto à pessoa” ou “personalismo” na Administração. Nesse sentido, a CF/88 tem norma expressa, condenando a promoção pessoal das autoridades e servidores públicos (art. 37, § 1º).  O dever de atuação imparcial do administrador público, que não pode estabelecer diferenças injustificáveis entre os cidadãos, seja para favorecer, seja para prejudicar. Trata-se, por tanto, de uma decorrência de um princípio mais amplo, o princípio da isonomia, consagrado no art. 5º, caput e inciso I da CF/88. 2.2.3. Princípio da moralidade administrativa Toda atuação administrativa, além de ser legal, deve ser moral. Essa afirmação é necessária porque, muitas vezes, em um ato sob a aparência de legalidade, se esconde uma intenção que nada tem a ver com a realização do interesse público. Por essa razão a doutrina e a jurisprudência administrativista acabaram por consagrar a idéia de moralidade administrativa como um algo a mais que complementa o princípio da legalidade, de maneira a garantir que a atuação da Administração não se desvie de seu objetivo maior: a satisfação do interesse público. A moralidade administrativa está relacionada aos conceitos de atuação ética, honestidade, boa-fé, lealdade e probidade no trato da coisa pública. Tal princípio tem sido muito importante para o controle dos atos da Administração pelo Poder Judiciário, especialmente aqueles que são dotados de discricionariedade – cujo conceito abordaremos no capítulo seguinte. A Constituição também determina a punição dos agentes públicos pelos atos de improbidade administrativa, expressão que geralmente é associada à idéia de mau uso dos recursos públicos (vide art. 37, § 4º da CF e Lei nº 8.429/92).
  • 8. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo O princípio da moralidade – bem como o correlato princípio da impessoalidade – foram os fundamentos utilizados pelo Supremo Tribunal Federal para a edição da Súmula Vinculante nº 13, que proibiu a prática do “nepotismo” na Administração Pública, assim redigida: A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou, ainda, de função gratificada na administração pública direta e indireta em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal. 2.2.4. Princípio da publicidade Por cuidar dos interesses da coletividade, o administrador público deve atuar com transparência. Essa é a expressão que melhor traduz o que é o princípio da publicidade. Na Administração Pública, a publicidade é a regra. Somente pode haver atos e atividades secretas em situações previstas na própria Constituição, como o resguardo da privacidade do cidadão (art. 5º, X) – por exemplo, no sigilo das informações fornecidas ao Fisco – e em questões relacionadas à segurança da sociedade e do Estado (art. 5º, XXXIII). Por essa razão, todo cidadão têm o direito de conhecer as informações que a Administração possua a seu respeito, bem como aquelas referentes ao bem-estar da coletividade (art. 5º XXXIII e XXXIV). A recusa em prestar essas informações pode ser objeto de uma ação judicial específica – o habeas data, também previsto no art. 5º, em seu inciso LXII. Recentemente, tivemos a promulgação de uma lei que busca dar maior efetividade a essa ideia de transparência – trata-se da Lei nº 12.527/2011, conhecida como Lei de Acesso às Informações Públicas. 2.2.5. Princípio da eficiência Esse princípio foi inserido no texto constitucional pela EC 19/98 (conhecida como Emenda da Reforma Administrativa). Ele determina que a Administração atue de maneira adequada, com economia de meios e com a agilidade necessária, de modo a atender de forma efetiva os interesses da coletividade. A lentidão, a omissão, o desperdício de recursos públicos, a falta de planejamento, são atitudes que ofendem a esse princípio. No plano mais prático, esse princípio está relacionado a outras mudanças introduzidas na CF/88 pela Reforma Administrativa. São elas:
  • 9. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo  a criação do contrato de gestão e das Agências estatais (CF, art. 37, § 8º)  a perda de estabilidade pelo mau desempenho do agente público (CF, art. 41, § 1º, III)  o controle social da Administração Pública (art. 37, § 3º)  a criação de escolas de formação e aperfeiçoamento de agentes públicos (art. 39, § 2º).  a aplicação de recursos em programas de produtividade e qualidade no serviço público (art. 39, § 7)  o limite de gastos com pessoal, como forma de atuação fiscal responsável (art. 169). Ele também tem sido invocado para justificar a criação de novas figuras jurídicas, que buscam dar mais agilidade e economia à Administração. Duas figuras relativamente recentes exemplificam essa tendência: a licitação por pregão e as parcerias-público- privadas (PPPs). 2.2.6. Princípio da autotutela Por esse princípio, a Administração pode corrigir e rever os seus próprios atos, para adequá-los à legalidade ou para que eles melhor atendam ao interesse público. Assim, a anulação ou revogação de um ato da Administração não depende de uma decisão judicial. Está entre os poderes da Administração, o poder de zelar pela regularidade jurídica e pela adequação de seus atos ao interesse da coletividade. Nesse sentido, é muito citada a Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal: A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial. 2.2.7. Princípio da presunção de legalidade e veracidade dos atos administrativos Os atos praticados pela Administração têm “fé pública”, ou seja, há uma presunção de que a atuação administrativa é sempre legal e sempre condizente com a verdade dos fatos. Trata-se de uma presunção relativa (presunção juris tantum). Ou seja, o cidadão pode desfazer o ato ilegal ou corrigir uma afirmação falsa realizada pela Administração. Porém, cabe a ele o ônus de provar que a Administração se equivocou ou produziu ato desconforme à lei. 2.2.8. Princípios da razoabilidade e proporcionalidade O princípio da razoabilidade nos diz que a atuação administrativa deve estar baseada no bom-senso, na prudência, na coerência ao espírito e à finalidade da lei.
  • 10. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo Semelhante à razoabilidade, o princípio da proporcionalidade se refere à adequação entre meios e fins na atividade administrativa. Alguns exemplos de ofensa a esse princípio: a realização de obra dispendiosa, desproporcional ao benefício que trará à comunidade; ou a aplicação de pena de demissão de um servidor por uma falta corriqueira, que poderia ser apenada apenas com uma advertência. Esses princípios serão especialmente importantes na condução do processo administrativo, sendo que a Lei 9.784/99 (Lei Federal de Processos Administrativos) reconheceu expressamente a existência desses princípios, em seu art. 2º. 2.2.9. Princípio da motivação Esse princípio complementa o princípio da publicidade, na medida em que exige que o agente público, ao praticar o ato, exteriorize os motivos de sua decisão. A motivação do ato permite seu melhor controle, evitando que se pratiquem atos por motivos ilegais ou imorais. Por essa razão a Lei 9.784/99 (Lei Federal de Procedimentos Administrativos), em seu art. 50, relacionou uma série de atos administrativos, cuja motivação é obrigatória. Nesses casos, a falta da motivação levará à nulidade do ato. 2.2.10. Princípio da continuidade O princípio da continuidade nos diz que as atividades da administração não podem ser interrompidas, devendo atender as necessidades da coletividade, enquanto essas existirem e com a urgência que a situação requeira. Esse princípio está na base de algumas regras importantes do Direito Administrativo, como:  a maior limitação do direito de greve dos servidores públicos (art. 37, VII da CF);  as restrições à paralisação da execução de contratos firmados com a Administração e o dever de tolerar, durante certo tempo, a inadimplência do ente administrativo (Lei 8.666/93 – Lei de Licitações, art. 78, incisos V, XIV e XV);  o poder que a Administração tem de intervir nos seus contratados para garantir a continuidade das atividades e serviços públicos (Lei 8.666/93 – Lei de Licitações, art. 58, V; Lei 8.987/95 – Lei de Serviços Públicos, art. 32);  a impossibilidade de penhora ou qualquer outra constrição dos bens que estejam sendo utilizados na prestação dos serviços públicos.
  • 11. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 3. PODERES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA É comum que na linguagem jurídica haja referência aos “poderes da Administração Pública”. Na verdade, o poder do Estado é uno e baseado na Constituição. Porém, há diversas manifestações do poder estatal e, quando ocorrem no exercício da atividade administrativa, acabam ganhando o nome de “poderes da Administração”. Vejamos algumas dessas manifestações: 3.1. Poder normativo É o poder conferido a autoridades administrativas de editar normas de caráter derivado, que complementem ou explicitem os comandos da lei em sentido formal. Essa atribuição é feita pela Constituição ou pela própria lei, tendo em vista a impossibilidade de que as normas editadas pelo Poder Legislativo sejam capazes de prever e disciplinar todas as situações que necessitem de algum regramento pelo Poder Público. Uma forma especial de poder normativo é o poder regulamentar que a Constituição Federal atribui ao Chefe do Poder Executivo (art. 84, IV), para que ele edite regulamentos para a “fiel execução” das leis. Esses regulamentos são editados na forma de Decretos e geralmente a própria lei estabelece a necessidade de sua regulamentação pelo Executivo, visto que nem toda a lei depende de regulamentação para produzir efeitos. Tanto os regulamentos editados pelo Executivo como as demais normas – resoluções, portarias, deliberações – produzidas por outras autoridades administrativas estão sujeitas a determinados requisitos de produção:  necessidade de competência legal do emissor da norma  validade condicionada às normas que lhe são superiores (análise de validade que deve ser feito inclusive perante a lei em sentido formal e perante a própria Constituição)  possibilidade de controle pelo Poder Judiciário  respeito aos princípios da moralidade, proporcionalidade e razoabilidade no exercício da atividade normativa  Atenção! Um aspecto controverso do tema é a existência de regulamentos autônomos no nosso ordenamento. Esse tipo de regulamento dispensa a existência prévia de lei para atuação normativa do Chefe do Executivo e existe é figura comum em alguns ordenamentos jurídicos, em que o princípio da legalidade estrita não é interpretado da mesma forma que no Direito Brasileiro. Nossa Constituição prevê a possibilidade de disciplina de matéria diretamente por decreto apenas nas hipóteses contidas no art. 84, IV, alíneas a e b, introduzidos pela EC 32/2001: a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos; b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos. 3.2. Poder discricionário
  • 12. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo A chamada discricionariedade não é propriamente um poder. Trata-se de uma característica presente em determinados atos, cuja produção pressupõe certa liberdade do agente público, na escolha de meios de praticá-lo, de maneira a atingir de forma mais adequada e eficiente o interesse público. Em razão dessa característica, consagrou-se a classificação que distingue os atos administrativos em dois tipos: os atos vinculados e os atos discricionários. Há vinculação quando a lei já define antecipadamente a decisão a ser tomada no caso concreto, sendo que o agente administrativo apenas aplica a norma, numa atividade meramente mecânica. Um exemplo de ato vinculado é aplicação de uma multa de trânsito, pois todos os elementos necessários para a realização do ato sancionatório já estão previstos no Código Brasileiro de Trânsito – a conduta infracional, o valor da multa, o procedimento para aplicá-la, etc. Observe que nesses casos se os agentes deixarem de cumprir exatamente aquilo que a lei determina, o ato será inválido. Quando há discricionariedade, ao contrário, a lei deixa ao agente uma margem de escolha, para que ele adote a solução mais adequada ao interesse público. Essa margem de escolha costuma ser denominada de mérito do ato, e que compreende as razões de conveniência e oportunidade que justificam a decisão adotada. Um exemplo bem claro de discricionariedade é a escolha de uma pessoa para assumir um cargo de confiança – Ministro de Estado, por exemplo. Somente o Presidente da República é que pode avaliar quem é a pessoa mais indicada para assumir tal cargo. Falaremos um pouco mais do assunto, quando estudarmos o controle dos atos administrativos pelo Poder Judiciário. 3.3. Poder hierárquico A hierarquia é uma exigência prática para o funcionamento de qualquer estrutura administrativa. Implica na existência de vários níveis de órgãos: órgãos de comando, de assessoramento, de execução, todos devendo trabalhar de forma coordenada, sendo que uns são subalternos a outros. Assim, o superior exerce o poder hierárquico sobre seu subordinado, que por sua vez tem o dever de obediência a seu superior. Cabe ressaltar que esse dever não é superior à idéia de legalidade, não sendo o subordinado obrigado a obedecer a ordens manifestamente ilegais de seus superiores. Além de comandar, fiscalizar e corrigir os atos do subordinado, o poder hierárquico também pressupõe o poder de delegar e avocar atribuições. Sobre o assunto, sugerimos a leitura da Lei Federal de Procedimentos Administrativos – Lei 9.784/99, em seus artigos 11 a 15, que tratam desses institutos de forma bastante clara. A insubordinação de um agente público ao seu superior é falta disciplinar que, dependendo da gravidade, pode levar à demissão do servidor – vide, nesse sentido, o art. 132 da Lei nº 8.112/90 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos da União).
  • 13. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 3.4. Poder disciplinar É o poder de apurar faltas e impor sanções àquelas pessoas que possuem um vínculo especial com a Administração, em razão da atividade administrativa: servidores públicos, contratados, concessionários, alunos de escolas públicas, crianças e adolescentes sob tutela estatal, etc. Como qualquer atividade sancionatória, o poder disciplinar está sujeito a regras de exercício e especialmente, à observância dos princípios da ampla defesa e do contraditório, garantias constitucionais do acusado (art. 5º, LV da CF) Em razão disso, não existe mais a possibilidade de aplicação imediata de sanções, conforme se praticou antes da CF/88, na chamada prática processual da “verdade sabida” (ou seja, constatada diretamente pelo aplicador da sanção e sem oportunidade de defesa ou contraprova pelo acusado). A atuação disciplinar também está sujeita aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, já mencionados. 3.5. Poder de polícia administrativa É o nome dado à atuação das autoridades administrativas no sentido de limitar a atividade dos particulares, visando à manutenção da ordem pública e o bem estar coletivo. Devemos distinguir a polícia administrativa, que incide sobre bens, direitos e atividades, da atividade de polícia judiciária, que é empregada para a persecução dos ilícitos criminais e incide sobre as pessoas. A finalidade da polícia administrativa é evitar os danos decorrentes do exercício abusivo dos direitos pelos particulares, visto que os direitos e faculdades estabelecidos de forma abstrata no ordenamento devem ser harmonizados em sua fruição concreta pelos indivíduos. Assim, temos direito de escutar música em nosso carro; porém foge do razoável que ouçamos música em altíssimo volume, com todas as portas do veículo abertas, obrigando toda a vizinhança a permanecer acordada. 3.5.1. Obrigações decorrentes da polícia administrativa Por meio da polícia administrativa, a Administração Pública impõe diversos tipos de obrigação:  obrigação de não-fazer – p. ex. a proibição de fumar em determinados ambientes.  obrigação de fazer – p. ex. a obrigatoriedade da instalação de equipamentos de segurança nas edificações.  obrigação de deixar-fazer (ou suportar), também denominadas sujeições – p. ex. o dever de permitir o abate de animais contaminados por uma epidemia. Convém reiterar que a atuação da autoridade administrativa não tem o condão de criar concretamente, para o particular, obrigações que não estejam abstratamente previstas em lei, sob pena de ofender o princípio da legalidade, já referido.
  • 14. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 3.5.2. Medidas de polícia administrativa Uma vez que os particulares descumpram as ordens emanadas pela Administração Pública, surgem medidas destinadas a reparar a ordem jurídica lesada. São elas:  Medidas coativas ou cautelares: são providências imediatas adotadas pela autoridade pública, usando de força, se necessário, para fazer cessar a conduta irregular. P. ex. a apreensão de equipamentos destinados à caça ou à pesca ilegal; o embargo de uma obra irregular, etc.  Sanções: são penalidades aplicadas ao infrator, de maneira a desestimular condutas danosas à coletividade. P. ex.: multa dos infratores de trânsito; cassação da licença para praticar determinada atividade; perda de bens utilizados para práticas ilegais, etc. Para que sejam impostas, as sanções devem estar expressamente previstas em lei, que deve conter em linhas gerais os critérios e o procedimento da punição. Imprescindível que antes da aplicação da sanção seja dado ao acusado o direito de ampla defesa e que o procedimento sancionatório respeite o princípio do contraditório. 3.5.3. Atributos da polícia administrativa São citados como atributos da polícia administrativa:  Discricionariedade: é comum, que ao disciplinar o exercício das atividades de polícia administrativa, a lei conceda ao agente público certa margem de escolha para que ele, avaliando a situação concreta, adote a providência mais adequada – por exemplo, confiando ao agente a gradação da multa a ser aplicada, em vista da gravidade da infração. Ressalte-se que a discricionariedade não é a regra absoluta, pois a lei também pode definir a conduta que espera do agente público, sem dar margem a escolhas por parte deste.  Coercibilidade: o particular é obrigado a obedecer aos comandos dados pela Administração no exercício da polícia administrativa, sob pena de sofrer responsabilização penal pela resistência ao exercício dessa autoridade.  Auto-executoriedade: é a possibilidade que a Administração tem de realizar concretamente sua vontade, mesmo com a oposição do particular e sem a necessidade de intervenção da autoridade judicial. Exemplo: a apreensão de alimentos impróprios para consumo; a interdição de estabelecimentos destinados a práticas ilícitas, etc. 3.5.4. Princípios condutores da atividade de polícia administrativa Ao exercer o poder de polícia, a Administração deve observar:  tipicidade: embora haja autores que afirmem não existir tipicidade na atividade sancionatória administrativa – de maneira a diferenciá-la das sanções do Direito Penal – não há dúvida de que a lei deve prever, de maneira minimamente
  • 15. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo previsível, qual a conduta que pode ser considerada como infração e quais as medidas coativas e sanções aplicáveis no exercício do poder de polícia. Isso é decorrência do princípio da legalidade estrita.  necessidade e eficácia: a adoção de uma medida de polícia administrativa deve ser justificada pela necessidade de se evitar um dano real à coletividade e devem ser empregados os meios mais eficazes e que menor sacrifício causem aos indivíduos.  proporcionalidade e razoabilidade: a Administração deve se pautar pelo bom senso e pela moderação ao restringir a liberdade de atuação dos particulares. O uso desproporcional das medidas de polícia pode configurar o chamado abuso de poder por parte da autoridade pública. 3.5.5. Licença e autorização de atividade Dentre as práticas mais comuns da polícia administrativa está a emissão de atos destinados a regular de maneira prévia o exercício de atividades pelos particulares. São eles:  Autorização de atividade: é o ato unilateral, discricionário e precário por meio do qual a Administração concede ao particular a possibilidade de exercer determinada atividade. Geralmente a atividade em questão pode resultar em algum incômodo ou perigo para a coletividade e, por essa razão, a lei atribui à autoridade pública a avaliação das circunstâncias, decidindo sobre a conveniência e oportunidade para deferir o seu exercício. O ato é precário – isto é, pode a qualquer tempo ser revogado – pelas mesmas razões. Por exemplo: a autorização para porte de armamento.  Licença: é o ato unilateral e vinculado pelo qual a Administração faculta àquele que preencha os requisitos legais o exercício de uma atividade. Aqui, o ato é vinculado, ou seja, todo aquele que preencher os requisitos da lei tem o direito a emissão da licença pela Administração, que não poderá recusá-la. Por exemplo: a licença para conduzir veículo, uma vez que o particular tenha cumprido os requisitos, passando pelos exames previstos em lei.
  • 16. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 4. ORGANIZAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Conforme já mencionamos no Capítulo 1, temos uma definição de Administração Pública em sentido subjetivo, qual seja, o conjunto de pessoas jurídicas, órgãos e agentes incumbidos do desempenho da função administrativa. Neste capítulo, vamos estudar um pouco mais quem é o “sujeito” Administração Pública. 4.1. Pessoas políticas e pessoas administrativas. Embora o poder estatal seja uno, conforme já dissemos, a evolução do Estado moderno propiciou a divisão vertical e horizontal da estrutura estatal em diversas entidades. Assim, nós temos as pessoas políticas, também conhecidas como entes políticos ou entidades políticas. A própria Constituição Federal é quem reconhece a existência dessas pessoas jurídicas e atribui a elas competências legislativas e administrativas, caracterizando assim a sua autonomia política, no espírito do chamado sistema federativo. Também há uma divisão horizontal da atividade estatal, por meio da criação das pessoas, entes ou entidades administrativas, ou seja, pessoas jurídicas cuja criação é decorrência de lei editada pelo ente político respectivo, para desempenhar alguma atividade que seja de competência deste. Vamos falar um pouco mais delas a seguir, ao tratar da chamada Administração Indireta. 4.2. Personalidade jurídica das entidades da Administração Toda a entidade acima mencionada tem personalidade jurídica, isto é, o ordenamento jurídico reconhece a elas a capacidade de serem sujeitos de direitos e obrigações. Nosso sistema jurídico diferencia as pessoas jurídicas em dois grupos, conforme o regime jurídico a elas aplicável: pessoas jurídicas de direito privado e pessoas jurídicas de direito público (art. 40 do Código Civil). Estas últimas, por sua vez, são diferenciadas entre pessoas jurídicas de direito público interno (União, Estados, Distrito Federal, Territórios, Municípios, autarquias e entidades criadas por lei com essa natureza) e pessoas jurídicas de direito público externo (os Estados estrangeiros e todas as pessoas que forem regidas pelo direito internacional público). As pessoas jurídicas de direito público são aquelas que têm feição tipicamente estatal. No caso daquelas mencionadas como pessoas jurídicas de direito público interno, elas são regidas de forma integral pelo chamado regime jurídico-administrativo, já mencionado anteriormente. Embora possa parecer estranho, o Poder Público pode criar pessoas jurídicas de direito privado. É que por vezes é conveniente ou até mesmo obrigatório que pessoas administrativas sejam criadas com regime jurídico semelhante ao aplicável aos particulares. A nossa Constituição Federal, por exemplo, ao tratar do desempenho de atividade econômica pelo Estado, obriga que seja feito por meio de pessoas sujeitas “ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e
  • 17. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários” (art. 173, § 1º, II). Por essa razão, entidades como a Caixa Econômica Federal e a Petrobrás, embora sejam estatais são pessoas jurídicas de direito privado. Para as entidades estatais com personalidade de direito privado não se aplicam todas as regras do regime jurídico-administrativo, justamente por terem um regime equiparado ao dos particulares. Em geral, permanecem para elas apenas algumas das restrições – como a necessidade de realizar concurso público, a fiscalização do uso dos recursos, a necessidade de licitar. 4.3. Desconcentração e descentralização Para realizar suas tarefas, a Administração Pública adota técnicas de atribuição de competência denominadas como desconcentração e descentralização:  Desconcentração: atribuição de competência a órgãos internos da entidade.  Descentralização: atribuição de competência a outras pessoas, distintas do ente político. Pode ser a atribuição a uma pessoa administrativa ou a um particular que atua em colaboração com a Administração. 4.4. Desconcentração - os órgãos públicos Chamamos de órgão a unidade de atuação integrante de determinada entidade. Ou seja, ele é uma estrutura interna¸ que reúne atribuições e agentes públicos responsáveis por desempenhá-las. Através de seus órgãos, a pessoa jurídica administrativa expressa sua vontade, no que a doutrina cunhou de relação de imputação. Ou seja, os agentes públicos que atuam no órgão manifestam a vontade deste, que é considerada a vontade do próprio Estado. É importante lembrar que os órgãos não têm personalidade jurídica própria, pois são apenas uma parcela da pessoa jurídica a qual pertencem. Assim, os atos praticados pelo agente de determinado órgão geram direitos e obrigações para a própria entidade a qual o órgão pertença, sendo que, como regra geral, esta é que será legitimada para estar em juízo em eventual controvérsia que envolva tal relação jurídica. São órgãos públicos, por exemplo, os Ministérios no âmbito do Executivo Federal e as Secretarias no âmbito do Executivo Estadual e Municipal, bem como suas divisões internas (departamentos, diretorias, etc.). O Poder Legislativo e o Poder Judiciário também são órgãos, com status e garantias especiais atribuídas pela Constituição, para preservação de sua independência em relação ao Executivo. Internamente também são divididos em órgãos (comissões, câmaras, juizados, etc.). 4.5. Descentralização A descentralização, ou seja, a atribuição de competência a outras pessoas, distintas da pessoa política que detém originariamente a competência, pode se dar pelas seguintes formas:
  • 18. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo  Descentralização territorial: atribuição de competência genérica a uma pessoa jurídica de direito público (autarquia territorial) – em nosso país não temos atualmente exemplos concretos desse tipo de descentralização.  Descentralização por serviços: atribuição de competência especializada, por lei, a uma pessoa administrativa (isto é, criada pela própria Administração). Fala-se aqui em outorga da atividade, para diferenciá-la da delegação, mencionada abaixo. Por exemplo, a Empresa de Correios e Telégrafos é uma empresa pública criada pela União para, sob regime descentralizado, desempenhar o serviço postal.  Descentralização por colaboração: atribuição de uma competência especializada a um particular, que atua sob supervisão da Administração. Essa delegação da atividade pode se dar por lei, por meio de um ato ou de um contrato administrativo. Por exemplo, as empresas telefônicas que hoje operam em nosso país são pessoas jurídicas constituídas por particulares e que, sob a fiscalização da Anatel, prestam o serviço público de telecomunicação.
  • 19. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 5. ATOS ADMINISTRATIVOS 5.1. Definição de ato administrativo Os atos administrativos são um dos principais temas da disciplina. Para entendê-los, vamos trabalhar com a seguinte definição: Definição: O ato administrativo é um ato jurídico produzido com poderes estatais, no exercício da função administrativa, sob regime jurídico-administrativo. Logo, por essa definição não são atos administrativos:  atividades materiais, que não são atos jurídicos, ou seja, não buscam produzir uma declaração com efeitos jurídicos: ex.: a varrição de uma rua, o atendimento médico em um hospital público, etc.  atividades não produzidas com poderes estatais: somente os agentes públicos e os particulares que atuem sob delegação estatal praticam atos administrativos.  atividades não exercidas sob a função administrativa: atos produzidos no exercício de outras funções não são atos administrativos. Por exemplo, os atos jurisdicionais (sentenças, acórdãos, despachos) e os atos legislativos (votações, moções, leis).  atividades que não são produzidas sob regime de direito administrativo: atos produzidos sob as regras do direito privado não são atos administrativos. P. ex.: a abertura de conta em um banco, ainda que seja estatal. 5.2. Perfeição, validade e eficácia do ato administrativo São qualidades do ato jurídico – e também do ato administrativo – que devem ser analisadas pelo profissional do Direito para compreensão da situação jurídica existente.  Perfeição: ao contrário do significado comum, não significa ausência de defeitos. Perfeição na linguagem jurídica tem um sentido de algo que está completo. Ato perfeito é o que já completou todas as fases de sua produção. Essa qualidade também é mencionada como existência do ato. Ato imperfeito e ato inexistente são sinônimos.  Validade: é a produção do ato sem a ocorrência de vícios. Ato válido é o ato cujo conteúdo e procedimento de formação estão conformes ao ordenamento jurídico. O exame da validade se faz através da análise dos elementos do ato – vide abaixo.  Eficácia: é a aptidão para produzir os efeitos que se esperam dele. Isso não tem a ver com a validade do ato, mas sim com a existência de determinados fatos ou atos capazes de impedir ou de propiciar a produção desses efeitos. A eficácia se verifica sempre no tempo: um ato pode ser eficaz agora e perder sua eficácia num momento posterior em razão do advento de um termo (evento futuro e certo) ou de uma condição (evento futuro e incerto). E vice-versa.
  • 20. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo Consequências dessas qualidades:  O ato imperfeito é inexistente. Portanto, ele não pode ser analisado quanto à sua validade e não produz efeitos jurídicos.  O ato perfeito pode ser válido ou inválido. O ato pode ser válido e não produzir efeitos, em razão da existência de um termo ou condição que impeçam a produção desses efeitos.  Um ato inválido, por sua vez, não deveria ser capaz de produzir efeitos jurídicos. Porém, em nome do princípio da boa-fé ou da confiança e do princípio da segurança jurídica, às vezes são mantidos os efeitos de um ato administrativo, ainda que viciado. Estudaremos isso adiante. 5.3. Elementos ou requisitos de validade do ato administrativo. A análise jurídica do ato jurídico implica na separação dele em elementos logicamente distintos – alguns autores preferem se referir a eles como “requisitos de validade”. Utilizaremos a divisão mais conhecida, em cinco elementos, quais sejam: 1. Sujeito 2. Objeto 3. Forma 4. Motivo 5. Finalidade  Sujeito ou agente: é a pessoa investida dos poderes legais para a prática do ato administrativo. Se ele não tiver a competência – ou seja, a atribuição por lei, ato ou contrato – o ato por ele praticado não é válido. Para a verificação dos poderes atribuídos ao agente, devem ser analisados os seguintes aspectos:  aspecto material: o ato só pode ser praticado se estiver no rol de matérias atribuídos àquele agente.  aspecto territorial: deve o agente praticar atos dentro do âmbito espacial definido na lei ou ato de atribuição de poderes.  aspecto temporal: o ato deve ter sido produzido durante o tempo em que vigorava a competência do agente. Os possíveis vícios relacionados ao elemento sujeito são os seguintes: A) Incapacidade: o Código Civil regula a capacidade dos sujeitos para a prática dos atos jurídicos. Porém a incapacidade civil nem sempre viciará o ato
  • 21. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo administrativo. Haverá vício apenas quando para a prática de tal ato for imprescindível o usa da capacidade volitiva pelo agente. Também pode ocorrer a incapacidade do agente para a prática de determinados atos, em razão de sua suspeição ou impedimento – vide a propósito: artigos 18 a 20 da Lei 9.784/99 (Lei Federal de Procedimentos Administrativos). B) Incompetência: situações em que faltam os poderes para a prática do ato. São referidas pela doutrina como:  Usurpação de poder: é a situação do agente sem titulação legal, isto é, que não se encontra investido em funções públicas e que pratica o ato como se tivesse tal investidura. Trata-se de conduta criminalmente tipificada.  Funcionário de fato: situação em que há uma irregularidade na investidura do agente, mas este exerce as atribuições com aparente legalidade.  Excesso de poder: situação em que o agente, embora tenha a titulação legal para a prática de atos administrativos, extrapola os poderes que a lei lhe confere, invadindo a competência de outra autoridade ou praticando atos não previstos na lei. Pode configurar conduta criminalmente tipificada como crime de abuso de autoridade (Lei nº 4.898/65).  Objeto ou conteúdo: é aquilo que o ato declara ou prescreve, aquilo que nos permite reconhecê-lo como um ato típico. Assim, o objeto de um ato de demissão do servidor é o rompimento do vínculo de trabalho que o unia à Administração. O objeto da desapropriação é a transferência forçada da propriedade para o ente expropriante. Tal como no Direito Privado, o objeto do ato administrativo deve ser lícito, certo, moral e possível. Vamos entender:  Licitude: para o Direito Administrativo só são lícitos os objetos que sejam juridicamente autorizados (legalidade estrita). Um objeto ilícito, por exemplo, seria a aplicação da pena de confisco pelo não pagamento de um tributo.  Certeza: está relacionada com o princípio da segurança jurídica que nos diz que não deve pairar dúvida sobre o sentido das prescrições contidas no ato administrativo. Um exemplo verídico e espantoso: publicação de um ato autorizando uma licença a um servidor cujo nome a autoridade desconhecia, pois estava ilegível.  Moralidade: vide o que já dissemos, ao tratar dos princípios da Administração Pública. Exemplo verídico sobre a imoralidade de um objeto: candidato a prefeito, que celebrou negócio registrado em cartório com o presidente da Câmara Municipal, visando à nomeação de apadrinhados em troca do apoio eleitoral.
  • 22. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo  Possibilidade: é pressuposto lógico para a existência do ato. Ela abrange a possibilidade material e a possibilidade jurídica. Possibilidade material significa possibilidade de esse objeto ser realizável de fato. A possibilidade jurídica significa que este objeto pode ser realizado, do ponto de vista da lógica que existe nas relações jurídicas. Um impossível material: a revogação, por decreto, da lei da gravidade. Um impossível jurídico: apreender uma pessoa, com base no poder de polícia.  Forma: esse elemento abrange:  a exteriorização do ato administrativo.  as formalidades e também o procedimento a ser seguido na produção desse ato. A forma mais comum de exteriorizar os atos administrativos é a forma escrita, pela segurança e publicidade que confere aos atos. Mas também são praticados atos por outras formas, como a gestual (sinais do guarda de trânsito), visuais (sinais de trânsito), eletrônica, etc. A não observância da forma prescrita pode levar à anulação do ato por vício formal. Porém, é importante observar que a forma é instrumental, ou seja, ela é um meio para que o ato seja conhecido pelos seus destinatários e atinja suas finalidades. Por essa razão, embora o vício formal possa levar à nulidade do ato, muitas vezes será possível a correção desse vício e a consequente manutenção dos efeitos do ato (convalidação). Diz-se, por isso, que a Administração deve atuar, na maior parte das vezes, com formalismo moderado.  Motivo: esse elemento tem dois aspectos:  motivo de fato - é o acontecimento que desencadeia a ação administrativa  motivo de direito – é o comando normativo previsto para a edição daquele ato. A ocorrência de um motivo falso ou equivocado pode levar à nulidade do ato. Não confundir o motivo com a motivação, que é a explicação dos motivos do ato. A falta de motivação pode ser um vício formal que leva à nulidade do ato, quando a lei a exige – vide art. 50 da Lei 9.784/99 (Lei Federal de Procedimentos Administrativos). A importância da motivação se revela também pela adoção unânime pela doutrina e pela jurisprudência da denominada teoria dos motivos determinantes, pela qual o agente público, ao expor os motivos adotados para a prática do ato, vincula o ato àqueles motivos. Se esses se revelarem falsos ou equivocados, será possível a anulação do ato, mesmo se a lei não exigia a motivação como requisito formal desse ato.  Finalidade
  • 23. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo É o resultado desejado com a prática do ato, necessariamente voltado à realização de um interesse público consagrado no ordenamento O não atendimento a esse requisito gera o vício conhecido como desvio de finalidade ou desvio de poder, que se caracterizam quando o agente busca um fim que colide com o interesse público ou que não é próprio daquele ato. Portanto, são praticados com desvio de finalidades atos que buscam atender a outros interesses que não os da coletividade – por exemplo, a punição de um servidor público por motivo de inimizade do superior – ou praticados fora dos objetivos almejados pela lei para aquele ato – por exemplo, a aplicação de sanções de trânsito com finalidade arrecadatória. 5.4. Atributos dos atos administrativos Os atributos ou qualidades que a doutrina costuma atribuir aos atos administrativos são:  Presunção de legitimidade – já tivemos oportunidade de mencionar, como um princípio da Administração Pública (cap. 2)  Imperatividade: é uma característica dos atos em que a Administração exerce suas prerrogativas, impondo obrigações unilateralmente aos administrados, criando situações jurídicas independentemente da vontade destes. É o que a doutrina chama de “poder extroverso” da Administração. É importante observar que nem todos os atos administrativos possuem essa característica.  Auto-executoriedade: é o poder de constranger diretamente o particular ao cumprimento de uma obrigação ou executá-la diretamente, de maneira forçada, sem a intervenção do Poder Judiciário. É um atributo excepcional, admitido somente nas situações em que o interesse público não pode ficar à espera da propositura e apreciação de uma demanda judicial e depende de autorização implícita ou explícita da lei. Além disso, a auto-executoriedade deve ser sempre aplicada na medida certa para evitar aquele perigo ou aquela lesão ao interesse público, respeitando-se o princípio da proporcionalidade. Exemplos de uso permitido da auto-executoriedade comuns no nosso direito positivo:  suspensão de atividade ou interdição de estabelecimento empresarial que atua de forma irregular;  remoção ou destruição de coisas em situação irregular, ou que estejam oferecendo risco à segurança das pessoas;  apreensão de bens e equipamentos utilizados em infração às normas administrativas de segurança e salubridade;  arrombamento de residência, para prestar socorro, entre outras medidas de caráter urgente e impositivo.
  • 24. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 5.5. Classificação dos atos administrativos Vejamos agora algumas classificações utilizadas no Direito Administrativo:  Atos gerais e atos individuais Essa distinção se baseia na distinção entre destinatários determinados ou indeterminados do ato administrativo. Atos gerais são aqueles que não têm um destinatário certo: destinam-se a todos os que se enquadram na situação nele definida. Ex.: edital de concurso. Atos individuais são aqueles que têm destinatário certo, definido. Ex. a nomeação de um agente público.  Atos internos e atos externos Essa classificação tem por critério a repercussão dos atos. Ato interno é aquele que somente produz efeitos no âmbito interno da Administração. Por exemplo, circulares e portarias internas, ordens de serviços, relações de remessa, etc. Ato externo é aquele que produz efeitos em relação a terceiros. Por essa razão, se costuma dizer que ele deve ser obrigatoriamente publicado, visto que os interessados têm direito a conhecer o conteúdo de um ato da Administração que vá atingir seus interesses.  Atos simples e atos complexos Essa classificação é baseada no critério do número de vontades que participam para edição de um ato administrativo. Ato simples é aquele que depende apenas da vontade de um órgão para produzir seus efeitos. Ex.: a nomeação de um Ministro pelo Presidente da República. Dentro dos atos simples, há autores fazem a distinção entre: a) atos singulares: aqueles que são produzidos por um só agente; b) atos colegiais: aqueles que são produzidos por vários agentes reunidos em um colegiado. Ato complexo é aquele que depende da vontade de mais de um órgão, ente ou Poder. Ex.: a nomeação dos Ministros do Supremo Tribunal, pois depende da vontade de dois Poderes: o Presidente da República escolhe, mas o Legislativo, no caso, o Senado, deve aprovar essa escolha.  Atos vinculados e atos discricionários Essa é a classificação que distingue os atos administrativos conforme a liberdade, a margem de escolha do agente ao praticá-los. Por esse critério, há dois tipos: os atos vinculados e os atos discricionários. Já tratamos dessa distinção no cap. 3, item 3.2. 5.6. Extinção do ato administrativo. Com a extinção, cessam os efeitos do ato administrativo e ele deixa de existir no mundo jurídico. Essa extinção pode se dar pela ocorrência de fatos jurídicos, como o implemento de condição resolutiva ou de termo final, ou pelo desaparecimento do objeto da relação jurídica.
  • 25. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo Mais interessantes são os casos em que a extinção é realizada por um ato de desfazimento da própria Administração, retirando-o do mundo jurídico. Esses atos de desfazimento são exercidos com base no poder de autotutela da Administração e são os seguintes:  Invalidação ou anulação: é o desfazimento do ato, motivado pela constatação de que ele foi produzido em desconformidade com a ordem jurídica (ou seja, contém um vício em um de seus elementos). Geralmente, a anulação do ato é feita de forma retroativa (ex tunc), desfazendo também todos os seus efeitos, ressalvadas situações já consumadas e irreversíveis ou que a lei proteja, em homenagem ao princípio da segurança jurídica (por exemplo, a impossibilidade de repetição de verbas de natureza alimentar, recebidas de boa-fé). A anulação pode ser realizada de ofício pela Administração, visto que decorre do dever de zelar pela legalidade. Todavia, quando a anulação afetar direitos de terceiro, é necessário que este seja ouvido, em observância das garantias constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório – vide art. 5º, incisos LIV e LV da CF/88. Porém, nem todo vício do ato administrativo leva à anulação, pois pode haver a possibilidade de convalidação do ato, que adiante estudaremos.  Revogação: é o desfazimento do ato administrativo, com a finalidade de realizar uma nova escolha, mais adequada ao interesse público, substituindo o ato por outro mais apropriado ou simplesmente fazendo cessar os seus efeitos em definitivo. Portanto, o ato de revogação é um ato discricionário. Justamente por isso apenas a autoridade administrativa competente pode revogar, não sendo permitido ao Poder Judiciário promover esse desfazimento. Ao Poder Judiciário cabe, quando provocado, invalidar o ato que apresente vício, não podendo, no exercício de função jurisdicional, revogar atos de competência da autoridade administrativa. A revogação produz efeitos não retroativos (ex nunc), pois não há justificativa para desfazer efeitos válidos já produzidos pelo ato a ser revogado. Se o ato que se deseja desfazer possui algum vício, a Administração não pode revogá-lo: deverá, sim, anulá- lo. Vamos agora observar o seguinte esquema, que compara invalidação e revogação, de maneira a gravarmos bem suas diferenças: INVALIDAÇÃO REVOGAÇÃO Causa: vício do ato Causa: realização de nova escolha, mais adequada ao interesse público É ato vinculado: há dever de invalidar É ato discricionário: há escolha em revogar É possível a invalidação judicial É impossível a revogação judicial Opera efeitos retroativos (ex tunc) Opera efeitos não retroativos (ex nunc)
  • 26. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo  Cassação: difere tanto da invalidação quanto da revogação, pois ela é causada por uma atitude do próprio administrado. É uma sanção aplicada ao administrado, beneficiado por um ato administrativo, em razão do descumprimento de deveres jurídicos a ele impostos como condição para o gozo desses benefícios. Ex.: a cassação da habilitação para dirigir, em razão do excesso de infrações cometidas pelo condutor. A liberdade em praticar o ato de cassação (se ele é vinculado ou discricionário) e seus efeitos (retroativos ou não) depende do que dispuser a lei que o regula. 5.7. Convalidação do ato administrativo A convalidação é o ato que, corrigindo os vícios de ato anterior, permite a sua manutenção na ordem jurídica. Tal como a anulação, a convalidação também é uma manifestação do poder de autotutela da Administração e também atua com efeitos retroativos. Para que possa ocorrer a convalidação, é necessário que o vício do ato a ser convalidado seja sanável. Consideram-se sanáveis, em tese, os vícios relativos aos elementos sujeito (competência) e forma. Porém somente a análise do caso concreto é que permitirá verificar se o vício em questão é sujeito à correção. No que tange aos defeitos relativos à competência do sujeito, eles podem ser sanados, desde que o ato possa ser ratificado, isto é, confirmado pelo órgão competente para a produção do ato. O exemplo mais conhecido é o da prática de atos por funcionário de fato, que desde que não haja outros vícios, podem ser ratificados pela autoridade competente. Também podem ser ratificados os atos praticados indevidamente pelo subordinado, mas que possam ser confirmados pelo superior hierárquico, a quem caberia praticá-lo. Quanto à forma, se o vício formal não afetar a própria existência do ato e tampouco interferir na certeza e na segurança jurídica em relação ao seu conteúdo ou nas garantias dos administrados, não há vantagem em promover a invalidação desse ato. Por último, é importante notar que a Lei nº 9.784/99 (Lei Federal de Procedimentos Administrativos – art. 11) estabelece como condição da convalidação a inexistência de lesão ao interesse público e a não ocorrência de prejuízos a terceiros. Portanto, se ocorrerem tais circunstâncias, a Administração estará impedida de convalidar o ato, devendo, portanto, anulá-lo. 5.8. Controle jurisdicional do ato administrativo Em nosso sistema constitucional, vigora o princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional, pelo qual toda lesão ou ameaça a direito está sujeita a controle pelo Judiciário – art. 5º, inciso XXXV da CF/88. Com relação aos atos vinculados, isto é, aqueles produzidos como mera aplicação de um comando legal, esse controle é pleno, ilimitado. Já com relação ao ato em que haja um aspecto discricionário, onde a lei permitiu ao agente público realizar uma escolha, se costuma dizer que a decisão judicial não
  • 27. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo poderá questionar o mérito do ato. Ou seja, a autoridade jurisdicional não poderá analisar a conveniência e/ou oportunidade da prática do ato, visto que essa competência pertence à autoridade administrativa. Isso não quer dizer que o uso da discricionariedade estará fora de controle. Caberá ao Poder Judiciário verificar se o agente público respeitou os limites impostos pela lei, aplicando-a corretamente em vista a situação concreta. Para isso, o ato será analisado sob a luz dos princípios da moralidade, da razoabilidade e da proporcionalidade, dentre outros já explicados no capítulo 2. Além disso, o julgador poderá constatar o desvio de finalidade, apurando se o agente buscou alcançar outros interesses que não ou interesse público. Poderá ainda se utilizar da teoria dos motivos determinantes, já explicada.
  • 28. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 6. ADMINISTRAÇÃO INDIRETA Conforme já dissemos, a Administração Indireta é o conjunto das pessoas jurídicas criadas pelos entes políticos. Essas pessoas podem ser criadas para desempenho de funções tipicamente administrativas ou para o desempenho de atividade econômica considerada de interesse público. As espécies existentes são:  autarquias (compreendendo nessa classe as agências e também as associações públicas)  fundações governamentais  empresas públicas  sociedades de economia mista 6.1. Traços comuns de todas as entidades da Administração Indireta Vejamos inicialmente quais são os traços que assemelham todas essas espécies de entidade:  Personalidade jurídica própria: são sujeitos de direitos e obrigações, possuem receita, patrimônio e pessoal próprio, se auto-administram e são encabeçadas por um dirigente ou corpo diretivo.  Responsabilidade: elas respondem por seus atos e por suas obrigações. Apenas em caso de extinção da entidade e incorporação de seu patrimônio pelo ente político é que este assumirá suas obrigações (responsabilidade subsidiária).  Necessidade de lei para sua criação: a Constituição Federal (art. 37, XIX) exige que lei específica seja editada para que haja a criação dessas entidades. No caso das autarquias, a própria lei é que cria diretamente a entidade. Nos demais casos a lei autoriza a criação e esta ocorre pela inscrição de seu ato constitutivo no registro competente, conforme estabelece o Código Civil (art. 45).  Extinção também por lei: não estão sujeitas à falência nem podem se extinguir por vontade própria (art. 2º, I da Lei 11.101/2005 – Lei de Falências).  Finalidade pública: o lucro não é sua finalidade essencial, mas sim a satisfação do interesse público.  Especialidade de atuação: somente podem desempenhar as tarefas que a lei lhes tenha atribuído  Sujeição aos princípios do direito administrativo estabelecidos no art. 37 da CF
  • 29. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo  Controle de sua atividade pela entidade criadora – regime de tutela ou supervisão. Estão vinculadas por esse regime a determinados órgãos da Administração Direta – como os Ministérios e Secretarias.  Submetem-se ao controle parlamentar (art. 49, X da CF) e à fiscalização do Tribunal de Contas (arts. 70 e 71 da CF). 6.2. Autarquia Conforme conceituação legal, autarquia é o serviço autônomo, criado por lei, com personalidade jurídica, patrimônio e receita próprios, para executar atividades típicas da Administração Pública, que requeiram, para seu melhor funcionamento, gestão administrativa e financeira descentralizada (Decreto-lei 200/67, art. 5º, I). Trata-se de pessoa jurídica de direito público, criada diretamente pela lei e que possui todas as prerrogativas e restrições típicas do regime jurídico-administrativo. Exemplos de autarquias no âmbito federal: IBAMA, Banco Central, INSS. As agências são autarquias que têm um regime jurídico especial, que lhes dá maior autonomia para tomada de decisões no tocante à gestão de sua atividade – veja tópico adiante. Também pertencem à espécie as autarquias corporativas, como os Conselhos profissionais (CRM, CREA, etc.). Elas também têm um regime especial de grande autonomia e recentemente havia dúvidas quanto à sua natureza jurídica e se de fato pertencem à Administração Indireta. Hoje, todavia, a doutrina e jurisprudência vêm afirmando essa natureza e a necessidade de que essas entidades se submetam ao regime jurídico administrativo.  Atenção! A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), apesar de considerada tradicionalmente uma autarquia corporativa e sujeita ao regime jurídico administrativo, teve sua natureza redefinida por julgamento da ADI 3026-DF, onde foi caracterizada como entidade sui generis e não sujeita às principais regras do regime administrativo, estando dispensada de realizar concursos públicos e de submeter suas contas aos Tribunais de Contas. 6.3. Fundações governamentais As Fundações governamentais ou fundações públicas são entidades criadas à semelhança das fundações privadas: trata-se de um patrimônio personalizado, geralmente instituído para desempenho de atividade no âmbito social: saúde, educação, cultura, etc. Tais como as fundações privadas, as fundações governamentais não têm finalidade lucrativa, sendo que o resultado de eventuais atividades comerciais deve reverter inteiramente para os fins de sua instituição. Também se beneficiam da imunidade tributária recíproca (art. 150, § 2º da CF).
  • 30. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo O regime jurídico aplicável às fundações é controverso. Admite-se atualmente a existência de duas subespécies:  Fundações governamentais de direito público – que nada mais são do que uma variação da espécie autarquia.  Fundações governamentais de direito privado – são parcialmente regidas pelo direito privado (quanto à constituição, regime de trabalho e previdenciário de seus agentes, natureza de seus bens, etc.). Aplicam-se a ela, porém, algumas restrições do regime jurídico-administrativo (obrigatoriedade de concurso público, licitação, vedação à acumulação de cargos públicos, etc.) Exemplos de fundação governamental no âmbito federal: Fundação Nacional do Índio (FUNAI), Fundação Biblioteca Nacional, Fundação Nacional de Arte (FUNARTE). 6.4. Empresa pública O Poder Público pode criar empresas para desempenhar atividade econômica (art. 173 da CF) ou prestar serviços públicos (art. 175 da CF) em regime similar ao dos particulares. Tais empresas devem seguir o regime jurídico privado nas suas relações civis, comerciais, trabalhistas, previdenciárias e tributárias. Não obstante, também se sujeitam a restrições do regime jurídico-administrativo tais como as fundações de direito privado. A empresa pública é a empresa constituída por capital inteiramente público. Admite- se a sua criação com base em qualquer das formas admitidas no direito empresarial. Exemplos de empresa pública no âmbito federal: Empresa de Correios e Telégrafos; Caixa Econômica Federal, Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). 6.5. Sociedade de economia mista Também se presta ao desempenho de atividade econômica ou à prestação de serviços públicos em regime similar ao dos particulares. Tal como a empresa pública, também se rege pelo regime jurídico privado, mantendo algumas sujeições do regime jurídico- administrativo. A sociedade de economia mista se distingue da empresa pública basicamente por dois aspectos:  Capital com participação privada. Embora o Poder Público detenha o controle societário (maioria das ações com direito a voto), os particulares podem ter participação no capital da empresa.  Forma obrigatória: sociedade anônima. A participação privada impõe essa forma societária, em vista da necessidade de proteção do acionista privado, sendo que o regime das S/As é o que melhor atende a esse interesse.
  • 31. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo Exemplos de sociedade de economia mista no âmbito federal: Petrobrás, Banco do Brasil, Eletrobrás. 6.6. Empresas estatais prestadoras de serviços públicos É comum que as pessoas de direito privado, especialmente as empresas públicas e sociedades de economia mista venham a prestar serviços públicos, especialmente aqueles que são passíveis de tarifação – como transporte, fornecimento de energia elétrica, telefonia, etc. Nesse caso, embora elas continuem sendo regidas predominantemente pelo regime jurídico de direito privado, acabam ganhando algumas características a mais do regime jurídico-administrativo, em razão da natureza da atividade desempenhada. O melhor exemplo dessa situação envolve os bens dessas entidades. Embora não legalmente conceituados como bens públicos, mas sim bens privados, os bens utilizados para prestação do serviço público passam a ser protegidos, não podendo ser penhorados, arrestados ou sequestrados – vide nesse sentido a decisão proferida pelo STF no RE nº 220.906, no tocante à Empresa de Correios e Telégrafos. 6.7. Agências Embora já tenhamos esgotados as espécies da Administração Indireta, há algumas figuras que merecem estudo. As chamadas agências não são uma nova espécie de ente da Administração Indireta, mas sim uma qualificação e um regime jurídico especial que se estabelece em favor de uma autarquia ou uma fundação governamental, dando-lhe grande autonomia para desempenho de suas atribuições. Tipos de agência:  Agência reguladora: exercem o poder de polícia sobre determinadas atividades ou controlam serviços públicos concedidos a terceiros.  Agência executiva: entidade da administração indireta que, após celebrar contrato de gestão com a entidade criadora, ganha maior autonomia administrativa, condicionada à eficiência de resultados As agências reguladoras são os tipos mais importantes, visto que o modelo das agências executivas, criado pela Emenda Constitucional nº 19/98 (Reforma Administrativa), não foi até agora bem utilizado. Características básicas do regime das agências reguladoras, no modelo federal:  Colegialidade de sua direção: as agências são dirigidas por um Conselho ou Diretoria, sendo que os membros desse colegiado possuem mandato fixo e são nomeados por períodos não-coincidentes. Tudo isso, com a finalidade de dar maior independência e tecnicidade à atuação da entidade.
  • 32. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo  Estabilidade dos dirigentes: durante o exercício de seu mandato, a destituição dos dirigentes somente pode ocorrer justificadamente, mediante procedimento administrativo ou sentença judicial transitada em julgado (Lei 9.986/00 – art. 9º).  Caráter final de suas decisões técnicas: não são passíveis de modificação pela entidade controladora. Atualmente, admite-se controle de seus atos apenas quando: a) ultrapassarem os limites de suas competências institucionais; ou b) se violarem políticas públicas estabelecidas pela alta direção da Administração (Chefia do Poder Executivo e Ministérios a que estão vinculadas – Parecer AGU nº 51/06). Exemplos de agências reguladoras no âmbito federal: ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações), ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária). 6.8. Consórcios públicos Previstos na Lei 11.107/2005, os consórcios públicos são formados pela associação de entes políticos, que se unem para criar uma pessoa jurídica, à qual será atribuída a gestão de um serviço público de interesse comum das entidades consorciadas. A pessoa jurídica formada pode ser de direito público – nesse caso, ganha a denominação de associação pública, embora a doutrina afirme tratar-se apenas de uma subespécie de autarquia. Também pode ser constituída com regime de direito privado, sendo então uma empresa pública ou sociedade de economia mista. O consórcio público inicia sua constituição por meio de um protocolo de intenções entre os entes que pretendem se consorciar. Porém, não basta isso: é necessário que ao menos dois dos entes políticos editem leis ratificadoras do protocolo, de maneira que o contrato de consórcio seja efetivamente constituído. Tendo personalidade própria, o consórcio público responde por suas obrigações, sendo que os entes consorciados responderão subsidiariamente pelas obrigações do consórcio apenas em caso de extinção ou insuficiência de patrimônio para responder pelas dívidas contraídas – no que, aliás, não difere das demais entidades da Administração Indireta. Um exemplo de consórcio público recentemente criado, na modalidade associação pública, é a Autoridade Pública Olímpica, ratificado em âmbito federal pela Lei nº 12.396/2011. ´ 6.9. Tutela da Administração Indireta É importante frisar que as entidades da Administração Indireta não são subordinadas hierarquicamente aos órgãos aos quais se vinculam. O vínculo tem o nome de tutela ou supervisão e é uma forma de controle finalístico, ou seja, voltado para a verificação dos resultados e do cumprimento das metas estabelecidas pelo ente político.
  • 33. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo As medidas de tutela são estabelecidas pelas leis que regem os entes da Administração Indireta e pelas legislações instituidoras. As medidas mais comuns são:  Indicação e nomeação do dirigente ou designação dos representantes governamentais nas Assembléias Gerais e órgãos de controle da entidade;  Aprovação da proposta orçamentária anual da entidade, no caso das pessoas jurídicas de direito público;  Recebimento de relatórios, boletins e balancetes que permitam acompanhar o cumprimento das metas da entidade;  Aprovação das contas, relatórios e balanços da entidade, diretamente ou através de representantes em seus órgãos de administração e controle;  Fixação de limites de despesas com pessoal e administração da entidade;  Fiscalização da legalidade e dos seus atos e da economicidade dos seus gastos;  Aprovação de planos de trabalho;  Intervenção na entidade, por motivo de interesse público.  Atenção! Por não haver hierarquia ou subordinação, a decisão de um dirigente de entidade da Administração Indireta não está sujeita a recurso para o órgão ao qual ela se vincula, a menos que a lei expressamente preveja essa hipótese. Havendo essa previsão, esse recurso costuma ser denominado recurso hierárquico impróprio, justamente porque não existe hierarquia entre a autoridade recorrida e a autoridade que apreciará o recurso.
  • 34. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 6.10. Quadro resumo do regime jurídico aplicável às entidades da Administração Indireta Autarquias e Fundações de Dir. Público Fundações de Direito Privado Empresas públicas e Sociedades de Economia Mista Regime jurídico predominante Direito público Direito privado Direito privado Criação Diretamente pela lei Autorizada pela lei Autorizada pela lei Sujeição ao controle por meio de tutela Sim Sim Sim Natureza jurídica de seus bens Bens públicos Bens privados Bens privados Sujeição às normas de direito financeiro e ao Controle Externo (Legislativo e Tribunal de Contas) Sim Sim Sim Admissão de pessoal por concurso público Sim Sim Sim Proibição de acumulação de cargos pelos servidores Sim Sim Sim Sujeição ao princípio da licitação Sim Sim Sim Sim Sujeição dos seus agentes à Lei de Improbidade, à Ação Popular e à Ação Civil Pública Sim Sim Sim Sujeição ao Mandado de Segurança Sim Sim (quando manejar poderes tipicamente estatais) Sim (quando manejar poderes tipicamente estatais) Regime estatutário dos Servidores Facultativo (cabe à lei definir) Não Não Imunidade Tributária Sim Sim (nos bens, rendas ou serviços vinculados às finalidades essenciais) Não Responsabilidade objetiva estatal – art. 37, § 6º Sim Apenas se prestar serviços públicos Apenas se prestar serviços públicos Responsabilidade subsidiária do Estado Sim Sim Sim Prescrição qüinqüenal das obrigações Sim Sim Sim Impenhorabilidade dos bens Sim Apenas dos bens afetados à prestação de serviços públicos Apenas dos bens afetados à prestação de serviços públicos Cobrança de dívidas por precatório Sim Não Não Prerrogativas processuais (arts. 188 e 475, do CPC) Sim Não Não
  • 35. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 7. PROCESSO ADMINISTRATIVO 7.1. Definição e espécies Definição: denomina-se processo administrativo a série de atos coordenados, voltados para a tomada de uma decisão ou solução de uma controvérsia, no âmbito da Administração pública. Em nosso estudo, mencionaremos especialmente os princípios e dispositivos da Lei 9.784/99, que regula os processos administrativos no âmbito federal, cuja leitura recomendamos. No Direito Administrativo, são empregados diversos tipos de processo, visando a variadas finalidades. A professora Odete Medauar propõe a classificação abaixo, útil para entendermos a variedade dos processos administrativos:  Processos em que há controvérsia ou conflito de interesses:  Processos de gestão: licitações, concursos públicos etc.  Processos de outorga: licenciamento, autorização, registro de marcas etc.  Processos de verificação: verificação de contas, correição etc.  Processos de revisão: reclamações, petições, impugnações etc.  Processos em que há acusação:  Internos: processos disciplinares.  Externos: sanções aplicadas pelo poder de polícia. 7.2. Princípios do processo administrativo A Lei 9.784/99 arrola, em seu art. 2º, diversos princípios e diretrizes acerca do processo administrativo. Destacamos alguns dos princípios e diretrizes mais importantes, contidos na referida lei ou mencionados pela doutrina:  Devido processo legal – constante do art. 5º, LIV, da CF, confere aos administrados o direito de exigir da Administração a observância do procedimento legal, quando a decisão a ser tomada afetar seus interesses.  Ampla defesa e contraditório – princípio garantido no art. 5º, LV da CF e no art. 3º da Lei 9.784/99. O contraditório se revela na prerrogativa do interessado de ser informado de todos os atos do procedimento e acompanhar a instrução processual, podendo se manifestar sempre que for dada essa oportunidade à parte adversa. A ampla defesa pressupõe a produção de todas as provas lícitas, inclusive o arrolamento e inquirição de testemunhas e a apresentação de peças de defesa, que devem obrigatoriamente ser apreciadas pela autoridade decisora. Também pressupõe o direito de ter “vistas” do processo. Cabe citar algumas normas da Lei 9.784/99 que buscam atender a esse princípio: art. 2º, VII, VIII, X; 3º, II, III e IV; art. 26; art. 27; art. 28; art. 38; art. 39; art. 41; art. 44; art. 46).
  • 36. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo Sobre a aplicação desses princípios no processo administrativo, o Supremo Tribunal Federal editou as seguintes súmulas vinculantes: Súmula Vinculante nº 3: Nos processos perante o Tribunal de Contas da União asseguram-se o contraditório e a ampla defesa quando da decisão puder resultar anulação ou revogação de ato administrativo que beneficie o interessado, excetuada a apreciação da legalidade do ato de concessão inicial de aposentadoria, reforma e pensão. Súmula Vinculante nº 5: A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição.  Publicidade – ressalvada as hipóteses de proteção da intimidade e do interesse social (art. 5º, LX da CF) e da segurança do Estado e da sociedade (art. 5º, XXXIII) os processos administrativos são acessíveis a todos os cidadãos, por força desse princípio, consagrado no art. 37, caput da CF e reforçado pelos artigos 3º, V; 31 e 46 da Lei 9.784/99.  Impessoalidade – sendo que a lei exige a “objetividade no atendimento ao interesse público, vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades”. Por essa razão, se estabelece situações de impedimento (art. 18) e suspeição do servidor ou autoridade que atuarem no processo. O impedimento ocorre em situações de envolvimento direto do agente, sendo causa absoluta de nulidade do processo. O servidor deve se declarar impedido e se não o fizer, estará incorrendo em falta grave. Está sob impedimento o agente que: tenha interesse direto ou indireto na matéria do processo; tenha participado ou venha a participar como perito, testemunha ou representante, ou se tais situações ocorrem quanto ao cônjuge, companheiro ou parente e afins até o terceiro grau; esteja litigando judicial ou administrativamente com o interessado ou respectivo cônjuge ou companheiro. A suspeição¸ que consiste em situação de amizade íntima ou inimizade notória com algum dos interessados ou pessoas que lhe são próximas, deve ser alegada pela parte interessada e não é causa absoluta de nulidade.  Motivação – a Lei 9.784/99 dedica um extenso artigo (art. 50) a esse princípio, determinando que sejam necessariamente motivados os atos que  neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;  imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;  decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;  dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;  decidam recursos administrativos;  decorram de reexame de ofício;  deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;  importem anulação, revogação, suspensão ou convalidação de ato administrativo. Além disso, diz que a motivação deve ser “explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de
  • 37. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato”.  Oficialidade – princípio que obriga a autoridade a impulsionar o processo, ainda que não haja provocação do interessado. Diferentemente do processo judicial, os processos administrativos nem sempre depende de solicitação do interessado para ser instaurados, podendo ser iniciados de ofício. Tal impulso oficial também existe na instrução, na decisão e na revisão da decisão – vide Lei 9.784/99: art. 2º, XII; art. 5º; art. 48 e art. 49.  Formalismo moderado (alguns autores se refere a informalismo) e economia processual – o processo deve adotar formas simples e econômicas, menos gravosas aos interessados e com concentração de meios para atingir os seus fins. Cabe observar que processos em que há competição entre as partes (licitação, concurso público) ou que há acusação (processos de polícia e disciplinares) o formalismo é necessariamente maior. Também se permite a convalidação dos erros sanáveis e o aproveitamento de atos já praticados, que não tenham vício, em caso de anulação de ato processual. Vide sobre esses princípios, na Lei 9.784: art. 2º, VIII, IX; art. 7º; art. 8º; art. 22; art. 23, parágrafo único; art. 35; art. 55.  Celeridade – o processo deve ter uma duração razoável, suficiente para garantia de segurança da parte. Para tanto, deve haver fixação de prazo máximo para a produção dos atos do processo. Consagrado nos seguintes dispositivos da Lei 9.784/99: art. 24; art. 42; art. 43; art. 49; art. 59, § 1º.  Não onerosidade – o processo não deve ser oneroso para a parte. Se houver acusação ou exercício de direitos de cidadania, é vedada a cobrança de taxas para exercício da defesa ou direito de manifestação – vide na Lei 9.784/99: art. 2º, XI; art. 29, § 2º. Recentemente, o Supremo Tribunal Federal editou a seguinte súmula vinculante: Súmula Vinculante nº 21: É inconstitucional a exigência de depósito ou arrolamento prévios de dinheiro ou bens para admissibilidade de recurso administrativo.  Razoabilidade e segurança jurídica – a Lei 9.784/99 impõe que no processo administrativo haja “adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público” (art. 2º, VI) atendendo assim ao princípio da razoabilidade. Também exige a “interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação” (art. 2º, XIII), em reconhecimento ao princípio da segurança jurídica.  Participação popular – aplicável apenas nos processos de tomada de decisão que afetem os direitos da coletividade – tais como as leis orçamentárias, planos diretores, licenciamentos ambientais e estudos de impacto ambiental. Na Lei 9.784/99, esse princípio consta dos seguintes dispositivos: arts. 31, 32, 33 e 34.
  • 38. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 7.3. Fases do processo O processo administrativo compreende as seguintes fases:  Instauração – pode ser realizada de ofício ou por requerimento do interessado, dependendo da finalidade a ser atingida pelo processo. O requerimento do interessado deve ser por escrito, salvo nos casos em que se admitir solicitação oral. Para atender à economia processual e ao formalismo moderado, a lei prescreve o uso de modelos ou formulários padronizados e a admissão de pedidos formulados de forma coletiva, quando houver identidade de pedidos e fundamentos. Também proíbe à Administração a recusa imotivada de recebimento de documentos, devendo o servidor orientar o interessado quanto ao suprimento de eventuais falhas.  Instrução – nos processos administrativos, a Administração deve buscar a verdade material. Por essa razão, a autoridade pode se valer de qualquer prova lícita, produzida por ela própria, pelos interessados e terceiros, para formar a sua convicção. Isso permite a reformatio in pejus nos processos administrativos (art. 64, par. único da Lei 9.784/99) e a revisão a qualquer tempo da decisão, quando sobrevierem novos fatos ou circunstâncias relevantes, desconhecidos à época da decisão (art. 65 da Lei 9.784/99). Embora a lei atribua ao interessado o ônus de produzir prova dos fatos que tenha alegado (art. 36), estabelece que os atos devam ser realizados de forma menos gravosa para este (art. 29, § 2º) e se os elementos de prova estejam de posse da Administração, cabe a ela requisitá-los de ofício (art. 37). Somente podem ser recusadas as provas ilícitas, impertinentes, desnecessárias ou protelatórias (art. 38, § 2º). O interessado deve ser comunicado de todos os atos decisórios ou de produção de elementos probatórios, bem como dos atos que importem em imposição de deveres, ônus, sanções ou restrições do exercício de direitos (arts. 26 e 28). O não atendimento à intimação não importa em reconhecimento da verdade dos fatos, nem a renúncia a direitos pelo interessado, que poderá continuar se defendendo no processo (art. 27). Depois de colhidas todos os elementos probatórios (documentos, pareceres, diligências, perícias, testemunhos), é dado direito de manifestação ao interessado (art. 45). Se o órgão instrutor não for competente para a tomada da decisão, formulará relatório completo e justificado, propondo a decisão para a autoridade competente (art. 47).  Decisão – a Administração tem o dever de decidir o processo em prazo razoável (art. 48 e art. 49), sendo que pode declarar extinto o processo quando exaurida sua finalidade ou o objeto da decisão se tornar impossível, inútil ou prejudicado por fato superveniente (art. 52). A decisão deve ser motivada nos casos já mencionados, previsto no art. 50. Se o processo for iniciado por impulso do interessado, ele pode desistir total ou parcialmente do pedido ou renunciar a direitos disponíveis, mas isso não obriga a Administração a extinguir o processo, se houver interesse público que justifique o seu prosseguimento (art. 51).
  • 39. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo  Recurso – a lei garante o direito de recurso da parte legítima (vide art. 58), sendo estabelecida a pluralidade de instâncias (no máximo três), de maneira a garantir a melhor decisão para o administrado. O recurso é dirigido à autoridade que decidiu, que poderá rever sua decisão ou encaminhar à autoridade superior (arts. 56 e 57). Esta poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso, em caso de justo receio de dano irreparável, embora não esteja obrigada a isso (art. 61). O recurso não será conhecido em caso de intempestividade, ilegitimidade do recorrente, incompetência do órgão ao qual se recorreu ou se já esgotada a esfera administrativa Em caso de direcionamento ao órgão errado, se prevê a devolução do prazo de recurso. O não conhecimento do recurso não impede a revisão de ofício do ato ilegal, desde que não tenha ocorrido preclusão administrativa (art. 63). A autoridade, ao apreciar o recurso, poderá confirmar, modificar, anular ou revogar, total ou parcialmente, a decisão recorrida, se a matéria for de sua competência (art. 64). Cabe observar que por força do estabelecimento da Súmula Vinculante, regulamentada pela Lei 11.417/2006, a autoridade que deixar de aplicar a orientação contida em súmula vinculante deverá justificar essa decisão, indicando por que razão o caso concreto não se enquadra nas hipóteses previstas no verbete editado pelo STF (art. 56, § 3º e 64-A). Caso a parte ajuíze reclamação ao STF pelo descumprimento da súmula vinculante e ela for acolhida pelo Tribunal, a autoridade será intimada a rever sua decisão e adequar as futuras decisões em casos semelhantes, sob pena de responsabilização (art. 64-B). 7.4. Coisa julgada administrativa Não há propriamente coisa julgada no Direito Administrativo, visto que as decisões administrativas sempre podem ser revistas no âmbito judicial, carecendo de definitividade. Porém, a doutrina utiliza essa expressão para se referir a irretratabilidade de decisões da Administração, em situação em que ela está impedida de anular ou revogar ato que tenha praticado. A Lei 9.784/99 estabeleceu critério objetivo a respeito, aplicável à esfera federal, no que tange à anulação de atos administrativos: Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. § 1o No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento. Também se fala em preclusão administrativa quando já esgotado o momento adequado de produção do ato administrativo, no curso de um processo. Assim, a autoridade que não reconsiderou sua decisão e encaminhou o recurso do interessado para apreciação da autoridade superior, não pode mais alterar a sua própria decisão, visto que ultrapassada a fase adequada para a produção desse ato.
  • 40. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo Também é comum na esfera administrativa a existência de prazos decadenciais para o exercício de um poder ou faculdade da Administração, como por exemplo, o prazo de 5 (cinco) anos para constituir o crédito tributário ou o prazo também de cinco anos para promover a desapropriação de um bem declarado de utilidade pública. Há ainda prazos chamados de prescricionais, por exemplo, os prazos para que a administração possa exercer a pretensão de punir administrativamente um servidor público (vide, por exemplo, art. 142 da Lei 8.112/90). Por fim, cabe mencionar as situações consumadas ou exauridas, que já não podem mais ser desfeitas, eventualmente sendo resolvidas por meio de indenizações. Assim, a Administração não pode revogar ato de demolição que já foi executada; ou cassar autorização para a prática de um ato, depois que esse já se realizou.
  • 41. Direito Administrativo – Prof. Carlos José Teixeira de Toledo 8. LICITAÇÕES 8.1. Definição Iniciemos nosso estudo propondo a seguinte definição: Definição: licitação é o procedimento competitivo, prévio, formal e necessário à celebração de um contrato entre a Administração e um terceiro. Analisemos a definição:  Trata-se de uma competição em que vários sujeitos – os licitantes – disputam a celebração de um contrato com a Administração. Esta fixará as regras do certame e critérios para escolha da melhor proposta.  O formalismo da licitação é típico dos procedimentos competitivos – os concursos para acesso aos cargos públicos também têm essa característica. É que todos os participantes têm direito de exigir que os demais cumpram estritamente as regras da competição.  É um procedimento prévio e necessário, pois a própria Constituição obriga a realização da licitação antes de qualquer contratação, ressalvadas as hipóteses legais de dispensa ou inexigibilidade (art. 37, XXI). 8.2. Objetivos da licitação Dois objetivos básicos são alcançados por meio da licitação:  Dar igual oportunidade a todos os que queiram negociar com a Administração – o que prestigia o princípio da isonomia.  Escolher a proposta mais vantajosa para a Administração – o que prestigia o princípio da indisponibilidade do interesse público. 8.3. Tratamento normativo A obrigatoriedade de licitar é prevista pela própria Constituição Federal, nos seguintes dispositivos: Art. 37 (...) XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes... Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Além disso, há as seguintes leis ordinárias que regulam o procedimento licitatório: