Bursite: causas, sintomas e tratamento da inflamação das bursas
1. Bursite
Equipe Editorial Bibliomed
"As bursas podem ser definidas como cápsulas protetoras preenchidas com líquido sinovial, presentes em
áreas de fricção ou possível desgaste. O corpo humano possui aproximadamente 160 bursas separando
os ossos dos músculos (bursas profundas) ou da pele e tendões (bursas superficiais)".
Introdução
As bursas profundas surgem durante a vida fetal, ao passo que as bursas superficiais se desenvolvem
meses ou vários anos após o nascimento. É possível que a pressão e fricção sejam um estímulo
necessário para o desenvolvimento das bursas superficiais. Nem todas as bursas se comunicam com o
espaço articular adjacente.
A bursite (inflamação da bursa) pode ter várias etiologias, incluindo trauma agudo, fricção crônica (p.ex.:
lesão por esforços repetitivos), deposição de cristais (p.ex.: gota, pseudogota), infecção e doenças
sistêmicas (p.ex.: artrite reumatóide, espondilite anquilosante, artrite psoriática, esclerodermia, lúpus
eritematoso sistêmico, pancreatite, doença de Whipple, uremia, oxalose, osteoartropatia pulmonar
hipertrófica, e síndrome hipereosinofílica idiopática).
A bursite infecciosa ou séptica pode ser causada por diversas bactérias, micobactérias (tanto cepas
tuberculosas quanto não-tuberculosas) e fungos (especialmente Cândida sp). Entretanto, o
Staphylococcus aureus é o agente mais comum. Os principais fatores predisponentes para bursite séptica
incluem diabetes, corticoterapia, outras causas de imunocomprometimento, uremia, alcoolismo e trauma.
Aproximadamente 85% dos casos de bursite séptica superficial ocorrem em homens. A associação de
bursite com febre e sinais flogísticos locorregionais deve sugerir prontamente a possibilidade bursite
séptica, mas este diagnóstico não pode ser estabelecido apenas com base nas manifestações clínicas.
Os principais diagnósticos diferenciais da bursite incluem artrite reumatóide, celulite e costocondrite.
Exame do Paciente
A maioria dos casos possui um relato de movimentos repetitivos, dor à movimentação (limitando sua
amplitude), edema articular e antecedente de doenças inflamatórias.
Bursite subacromial (subdeltóide)
A bursa subacromial é uma grande estrutura localizada logo abaixo do acrômio e do ligamento
coracoacromial (ao qual está ligada). Via de regra, não se comunica com a articulação do ombro, exceto
em pacientes com ruptura do tendão supraespinhoso.
A bursite subacromial comumente está associada à artrite reumatóide, gota, tuberculose ou outras
infecções, e atividades repetitivas envolvendo elevação do braço. O sintoma mais comum é dor ao longo
do músculo deltóide que desaparece com a abdução do braço.
Bursite do olécrano
A bursa do olécrano localiza-se entre o olécrano e a pele sobrejacente. A bursite do olécrano está
associada a hemodiálise prolongada ("cotovelo dialítico") e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC),
mas a inflamação também pode surgir em pacientes com gota, pseudogota, artrite reumatóide e uremia. A
bursite séptica do olécrano pode ocorrer a partir de ferimentos locais (mesmo microscópicos) ou via
bacteremia (em infecções sistêmicas).
Em geral, a bursite do olécrano não produz derrame articular ou limitações funcionais importantes.
2. Bursite do iliopsoas
A bursa do iliopsoas é a maior bursa do corpo e está localizada anteriormente à articulação do quadril e
ao trocânter menor, logo abaixo do tendão do músculo iliopsoas. Ela se estende superiormente,
adentrando a fossa ilíaca sob o músculo ilíaco. É bilateral em 98% dos adultos.
A bursite do iliopsoas costuma estar associada a distúrbios do quadril (p.ex.: artrite reumatóide,
osteoartrite) e/ou lesões ocupacionais ou recreacionais (p.ex.: corridas). A dor irradia para a face ântero-
medial da coxa até o joelho, piorando com a extensão, abdução e rotação interna do quadril. Em alguns
pacientes, pode-se detectar uma massa ou edema doloroso lateralmente aos vasos femorais. A bursite
pode estender-se até o retroperitônio, causando efeito de massa e até mesmo síndromes compressivas
na virilha ou na pelve.
A bursite séptica do iliopsias é extremamente rara.
Bursite trocantérica
A bursa trocantérica possui componentes superficiais e profundos. A bursa profunda esta localizada entre
o trocânter maior e o tensor da fáscia lata. A bursa superficial localiza-se entre a fáscia lata e a pele.
A bursite trocantérica é mais comum em mulheres de meia idade (quarta à sexta década) e pode estar
associada à artrite reumatóide. Os pacientes acometidos queixam dor crônica, intermitente, com
irradiação para a face lateral da coxa em 40% dos casos. A dor piora com o decúbito ipsilateral ou com a
deambulação (especialmente ao subir escadas) e pode ser reproduzida com a adução do quadril (bursite
superficial) ou com a resistência à abdução (bursite profunda). O edema é raro.
Bursite isquiática
A bursa isquiática localiza-se entre a tuberosidade isquiática e o músculo glúteo maior. A inflamação
comumente decorre de trauma ou longos períodos sentados sobre uma superfície rígida. A dor irradia ao
longo da parte posterior da coxa e pode simular um quadro ciático. Contudo, ela pode ser reproduzida
pressionando-se a tuberosidade isquiática.
Bursite pré-patelar
A bursa pré-patelar localiza-se entre a patela e a pele. A inflamação geralmente é secundária à fricção
constante entre a pele e a patela, podendo ocorrer até 7-10 dias após um trauma local (p.ex.: quedas). O
exame clínico revela um edema quente, bem circunscrito, sobre a margem inferior da patela. Alguns
pacientes podem apresentar crepitação local.
Bursite infrapatelar
A bursa infrapatelar também pode ser dividida em dois componentes (superficial e profundo). O
componente profundo localiza-se entre o ligamento patelar e a face ântero-superior da tíbia. O
componente superficial localiza-se entre o ligamento patelar e a pele.
A bursite infrapatelar superficial é um pouco mais distal que a bursite pré-patelar e o paciente assume
uma postura mais "ereta" quando colocado de joelhos. Pode ser observada em pacientes com gota e
sífilis e, no diagnóstico diferencial, deve-se considerar a possibilidade de doença de Osgood-Schlatter.
A bursite infrapatelar profunda é menos freqüente que a forma superficial. Clinicamente, o paciente não
queixa dor à extensão ou flexão passiva. Contudo, a dor surge nos extremos da flexão e da extensão sob
resistência.
Bursite anserina
A bursa anserina separa as inserções tendinosas dos músculos sartório, grácil e semitendinoso da
superfície subcutânea superior da tíbia. Pacientes com bursite anserina em geral decorre de fricção
repetitiva em mulheres idosas e obesas com antecedente de osteoartrose dos joelhos. Contudo, a
associação com diabetes melito tipo 2 parece ser independente da idade, índice de massa corporal, e
3. duração ou controle do diabetes.
A dor pode irradiar ao longo da face interna da coxa e da panturrilha, acentuando ao subir escadas e nos
extremos de flexão ou extensão. Em alguns pacientes, pode-se palpar uma área hiperestésica na
superfície medial do joelho, aproximadamente 5 cm abaixo da margem articular. Sinais flogísticos locais
são pouco freqüentes.
A bursite anserina pode decorrer de esforços repetitivos em atletas, especialmente em corredores de
longas distâncias, e deve ser diferenciada do estiramento dos ligamentos colaterais e da osteoartrite do
compartimento medial do joelho.
Casos de bursite séptica anserina ainda não foram descritos na literatura médica.
Bursite do calcâneo
Existem duas bursas no local de inserção do tendão de Aquiles. A bursite superficial (posterior) do
calcâneo costuma ocorrer em pacientes com esporões do calcâneo, ou relato de uso prolongado de
sapatos com saltos excessivos ou longas caminhadas (o quadro é relativamente comum em atletas
jovens). A inflamação também pode ser secundária à Tendinite de Aquiles.
A bursa profunda do calcâneo raramente causa problemas.
Exames Complementares
Estudos laboratoriais e de imagem (radiografia, ultrassonografia, tomografia computadorizada,
ressonância nuclear magnética) em geral não são muito úteis no diagnóstico das bursites agudas, exceto
para excluir possíveis diagnósticos diferenciais em pacientes refratários ao tratamento.
Além do exame clínico, a punção aspirativa é a principal ferramenta propedêutica. O procedimento é
seguro até mesmo em pacientes em uso de warfarin / marevan, uma vez que o risco de hemorragia
articular ou de partes moles é pequeno. O líquido aspirado deve ser examinado quanto à presença de
cristais de urato (gota), de pirofosfato (pseudogota) e colesterol (bursite quilosa reumatóide)
A bursite pré-patelar e do olécrano freqüentemente são sépticas e devem sempre ser puncionadas.
Leucometrias acima de 5.000/mm³ podem ser consideradas indicativas de infecção, mesmo quando a
coloração por Gram é negativa.
A cultura do aspirado é o teste diagnóstico conclusivo, ainda que alguns resultados falso-positivos e falso-
negativos possam ocorrer. Estruturas circunjacentes podem desenvolver coleções – que também devem
ser aspiradas e analisadas para diferenciar derrames sépticos daqueles assépticos.
Tratamento
O tratamento das bursites pode ser dividido em (a) Tratamento da bursite asséptica e (b) Tratamento da
bursite séptica.
Bursite asséptica
A maioria dos pacientes com bursite pode ser tratada conservadoramente com repouso, compressas frias
(por 20 minutos, várias vezes ao dia, nas primeiras 24-48h de evolução) e quentes (iniciadas assim que o
processo inflamatório agudo começar a ceder), antiinflamatórios não-esteróides (AINEs), punção
aspirativa (diagnóstica e aliviadora) e injeções intrabursais de corticóides (p.ex.: betametasona,
metilprednisolona), com ou sem anestésicos locais.
As injeções combinadas de corticóides com lidocaina são reservadas para os casos refratários às demais
medidas terapêuticas após 7-14 dias. É preciso tomar muito cuidado para não utilizar este recurso em
pacientes com suspeita de bursite séptica.
Indivíduos com bursites crônicas ou freqüentemente recorrentes podem necessitar de excisão cirúrgica da
4. bursa. A técnica cirúrgica varia de acordo com o local acometido.
Bursite séptica
Pacientes com suspeita de bursite séptica devem receber antibioticoterapia antiestafilocócica até que se
obtenha os resultados das culturas. Felizmente, na maioria das vezes, a abordagem pode ser feita em
nível extra-hospitalar.
A duração da antibioticoterapia varia de acordo com o cenário clínico. Em pacientes com bursite séptica
não-complicada e diagnosticados com até 7 dias de evolução, o líquido da bursa pode ser esterilizado em
4 dias. A punção aspirativa deve ser realizada a cada 1-3 dias, para reduzir a carga bacteriana e avaliar a
esterilização do fluido. A antibioticoterapia deve ser mantida por até 5 dias após o desaparecimento das
bactérias no aspirado.
Infecções em bursas profundas em geral estão associadas a bacteremia e exigem uma antibioticoterapia
mais agressiva e prolongada. Quase sempre é necessário realizar uma drenagem cirúrgica.
Conclusão
As bursas são cápsulas protetoras preenchidas com líquido sinovial, presentes em áreas de fricção ou
possível desgaste. A bursite – inflamação da bursa – pode ter várias etiologias, mas, de um modo geral, é
classificada como profunda ou superficial e asséptica ou séptica. As manifestações e achados ao exame
clínico variam de acordo com o local acometido, a etiologia do processo e a presença de comorbidades
associadas. A punção aspirativa com citometria, citologia e cultura com antibiograma do fluido aspirado é
a principal ferramenta propedêutica complementar, e deve ser empregado para direcionar a abordagem
terapêutica. Bursites assépticas podem ser tratadas com repouso, orientação e antiinflamatórios não-
esteróides (AINEs). Pacientes refratários podem receber infiltrações intrabursais de corticóides e
anestésicos tópicos, contudo, este procedimento está absolutamente contra-indicado naqueles com
suspeita de bursite séptica. Pacientes com bursite séptica devem receber antibioticoterapia
antiestafilocócica até que se obtenha o resultado das culturas. Infecções mais profundas podem requerer
drenagem cirúrgica.
PALAVRAS-CHAVE: bursite, artralgia, artrite, erisipela, derrame articular, osteomielite, antiinflamatórios.
Fonte: http://boasaude.uol.com.br/realce/showdoc.cfm?libdocid=14931&returncatid=1844
data: 30/05/2012