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Teoria e prática da. _
J.t
Juan Carlos Vezzulla
Com a colaboração de: Angelo Volpi Neto
. José Ribamar G. Ferreira
Af" Augusta de O. Volpi
Prólogo de: Zulenta Wilde
• 0
riINSTO
DE
MEDIAÇÃO
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
A Mediação é a mais bem sucedida técnica de
solução de conflitos, pois corn ela as pessoas mantêm
todo o controle do . processo, não dependendo de laudos
ou sentenças que nem sempre satisfazem os interesses de
ambas as partes.
mediador é um profissional com uma atuação
muito especial, pois sem decidir, deve ajudar as partes a
inter-relacionarem-se e acharem o melhor caminho para
resolverem seus conflitos satisfatoriantente.
Este livro traz o susténto teórico das técnicas de
mediação, assim como sua aplicação prática, e funda-
mentalmente ensina do mediador como descobrir os
verdadeiros interesses dos clientes envolvidos no litígio.
H
• •
MISTMITO
DE
MEDIAÇÂO
INSTITUTO DE MEDIAÇÃO
Instituto de Mediação, associação sem fins
lucrativos, pretende com a impressão deste livro continu-
ar cum o cumpatenta dos seus objetivos: divulgar a
Mediação e formar 116diadores no Brasil.
Nascido em•'t'uritiba, Paraná, o Instituto de
Mediação, na sua tarefa de difusão nacional da Mediação,
vem promovendo seminários, palestras, cursos e agora,
com esta publicação, seguramente enriquecerá o conhe-
cimento desta técnica usada no mundo todo.
Instituto de Mediação forma parte da
Interamerican Mediation Association.
•000001®600•0000••
Índice
Prólogo - Zulema Wilde 7
Prefácio - Angelo Volpi Neto 11
Introdução 14
Capitulo 1: Das Noções Gerais do Conflito 17
Conflito Inter/Pessoal 17
Os Conflitos Intrapsiquicos 20
fr"? . Conflitos reefs e falsos 24
A Comunicação 24
Escutar, sempre escutar 26
Capítulo 2: Do Cliente 29
A posição, encobrindo os interesses 31
Luta entre pessoas ou discussões sobre problemas 35
Qual é o cliente da Mediação 38
As emoções dos clientes 39
Capítulo 3: 0 Mediador 43
0 que é ser Mediador 43
As técnicas do Mediador 45
Que profissional é o Mediador? 49
Capitulo 4: A inter-relação entre Mediador e cliente 57
Capítulo 5: A Mediação 65
O inicio. Alguém quer tentar solucionar
seu problema corn a Mediação 66
A, Etapa Primeira. A -apresentação do Mediador
a das regras de Mediação 68
Etapa Segunda. Os clientes expõem o problema 72
(1--) - Etapa Terceira. 0 resumo e o primeiro ordenamento dos
problemas 74
Etapa Quarta. A descoberta dos interesses ainda ocultos 75
Etapa Quinta. Gerar idéias para resolver os problemas.
Os acordos parciais 78
Etapa Sexta. Acordo Final 80
A Mediação e o •Notariado - Angelo Volpi Neto 83
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 5
4?
e
e
e
e
•
•
•
e
PRÓLOGO
ZULEMA WILDE
No quisiera que este libro emprendiera au primer viaje por
el mundo, sin conteneren su comienzo una expresión de aliento para
sus autores.
Los conflictos son inevitables en esta vida y admitir que los
métodos usuales de resolución han sido en general inadecuados,
costosos y hasta algunas veces destructivos -, ya representa un
avance.
Pensar en el Conflict° con un espíritu distinto, sin poner la
decisión en manos de °tit, tomando el podersobre la propia vida, es
decir sobre su curso, utilizando nuestra capacidad para eito. Ser
"arquitecto del propio destino", como decla Amado Nervo.
Asimismo, es ejercer el derecho de reconocerse diferentes,
lo que constituye otro valor importante en el mundo que nos rodea.
El fruto del esfurzo comienza a degustarse, no s6lo por la
enorme satisfacción personal de haber sido la sembradora de
inquietudes en estos espíritus perrneables que son el autor y sus
colaboradores, -semillas que han germinado rápida y robustamente,
prueba de eito, este libro-, sino por el ímpetu dado al estudio y difusián
del proceso de la mediación que se hace a través de esta obra.
Ella ayuda a que la mediación se constituya en un instru-
mento eficaz de paz para todos los que la comiencen a utilizar,
alentados por su lectura.
Buenosería que posteriormente los lectores la incorporaran
como bagaje de experiencia, para aplicaria ante otro contratiempo
futuro.
•
•
•
•
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 7
•
PRÓLOGO
•
e
ZULEMA WILDE
Não gostaria que este livro empreendesse sua primeira
viagem pelo mundo, sem conter no seu início uma expressão de
estímulo [Sara seus autores.
Os conflitos são inevitáveis nesta vida e admitir que os
métodos usuais de resolução têm sido em geral inadequados, de alto
custo e até, muitas vezes, destrutivos, representa já um avanço.
Pensar no conflito com espírito diferente, sem botar a
decisão nas mãos de outro, tomando o poder sobre a própria vida, é
decidir seu curso, usando nossa capacidade para isso. Ser "arquiteto
do próprio destino", como dizia Amado Nervo.
Ao mesmo tempo é exercer o direito de se reconhecer
diferente, o que constitui outro valor importante no mundo que nos
rod eia.
O fruto do esforço começa a ser degustado, não só pela
enorme satisfação pessoal de haversido a semeadora de inquietudes
nestes espíritos permeáveis que são o autor e seus colaboradores, -
sementés que têm germinado rápida e robustamente prova disso,
este livro senão pelo ímpeto dado ao estudo e difusão do processo
da mediação que se faz através desta obra.
Ela ajuda que a mediação se constitua num instrumento
eficiente de paz para todos os que comecem a utilizá-la, alentados
por sua leitura.
Seria bom que posteriormente os leitores a incorporassem
como bagagem de experiência, para aplicá-la num outro contratem-
po futuro.
Teoria e Práticada MEDIAÇÃO
9
ZULEMA WILDE
Amagazin
Finalmente, es mi deseo que este esfuerzo también ayude
al cambio del estilo de vida de esta comunidad en esta materia.
8 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
o
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e
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•
o
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e
•
•
• Finalmente, é meu desejo que este esforço ajude também
11/ mudança do estilo de vida desta comunidade, nesta matéria.
PREFÁCIO
ANGELO VOLPI NETO
•
À medida que comecei a tomar contato com a mediação e
entendê-la, não pude acreditar que tal técnica fosse tão desconhe-
cida no Brasil, aí me incluindo. No começo, demorei a entender o que
era, e hoje por experiência, sei da dificuldade de explicar sobre esse
tema a qualquer pessoa.
0 motivo, a meu ver, decorre do fato de tratar-se de algo
realmente desconhecido da nossa cultura, somando - se a um natural
bloqueio ou preconceito.
Invariavelmente, quando falamos de mediação temos que
desfazer confusões com a arbitragem, pois poucos entendem como
Harvard.
•
Há ainda os céticos que acham que a mediação é "ficção
•
científica, ou coisa do outro mundo e que não funciona no Brasil.
•
411 Pois bem, este livro têm a intenção de esclarecer e ensinar
a mediação, Aqueles que se dispuserem a lê-lo e interessar aos que
tenham a mente aberta para seu valor.
Foi o que aconteceu comigo quando .a conheci, vislumbrei
um horizonte inexplorado, uma atividade nobre e gratificante, um
•
•
10. Teoria e Práticada MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 11
pode um conflito ser resolvido por uma terceira pessoa, sem que essa
• dê sua sentença. Junto ao notariado, sinto que muitos estão acostu-
mados a paziguar conflitos em seus ofícios e por isso acham que não
•
há novidade alguma. Na verdade há uma distância bem grande entre
•
"conciliação" e um conjunto de técnicas de mediação, desenvolvidas
•
cientificamente durante anos, notadamente na Universidade de
•
poderoso instrumento de paz social. Uma resposta à crescente
. agressividade em nossa sociedade, aos métodos tradicionais e
carcomidos de solução de conflitos; uma saída honrosa para os
notários; uma luz para os advogados, e a única solução para a justiça.
Quanto à justiça, por mais que a agilizemos, por mais
esforço que possamos fazer, aumentando o número de magistrados,
informatizando-a, jamais daremos resposta aos anseios cia popula-
ção, enquanto tivermos que resolver todos nossos conflitos de forma
judicial. Para os advogados que, perante a opinião pública levam
parte da culpa da morosidade da justiça, quando eles mesmos são os
mais prejudicados, na mediação encontra-se a possibilidade imedia-
ta de, em muitos casos, oferecer uma resposta rápida aos problemas
de seus clientes.
Ao notário, notadamente em nosso país que vem sofrendo
continuamente um desprestígio profissional, uma diminuição de seu
rol de atividades, pode ser o início da curva ascendente, justo no
momento importante em que tem sua atividade, finalmente, regula-
mentada por lei federal.
As experiências vividas em vários países comprovam a
eficiência dessa técnica. A mediação é tão antiga quanto o próprio
conflito. Na cultura oriental é desde muitos séculos o método
preferido para resolver controvérsias. O Japão é um dos países que
possui o menor número de juízes por habitante, e a China possui mais
de um milhão de pessoas treinadas como mediadores.
Nos E.U.A., nos idos dos anos setenta, como um esforço
Inovador para aliviar o sistema de Cortes, o Departamento de Justiça
implantou pianos pilotos de mediação em três cidades americanas:
Atlanta, Kansas e Los Angeles. Em 1980 o Congresso desse país
sentenciou textualmente: "que a inadequação dos mecanismos de
solução de controvérsias nos Estados Unidos era contrária ao bem
estar geral de seu povo". E comprovando o êxito da experiência, a
estendeu a todo o país.
Em conseqüência, seu estudo desenvolveu-se em várias
universidades, com novas técnicas, sendo hoje parte do curso de
Direito das mais renomadas, tais como Harvard, Oxford e Yale. Hoje,
nos EUA a mediação é vista como uma filosofia de vida. Nas escolas
primárias, os alunos são treinados para que resolvam seus conflitos
entre sí mesmos. Acredita-se que dessa forma a sociedade tornar-se-
á menos violenta e mais interativa.
1 2 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 13
demonstrando, no mundo, sua grande eficiência em todos os confli-
tos não criminais, pois, com ela, são as próprias partes que acham as
soluções. 0 mediador somente as ajuda a procurá-las, introduzindo,
com suas técnicas, os critérios e os raciocínios que lhes permitirão
um entendimento melhor. •
A mediação é uma técnica de resolução de conflitos, não'
adversarial, que sem imposições de sentenças ou de laudos, e, corn
um profissional devidamente formado, auxilia as partes a acharem
seus verdadeiros interesses e a preservá-los num acordo criativo/_
onde as duas partes ganhem.
Ao contrário de um judiciário sobrecarregado e demorado,
a mediação propõe, em breve tempo, com baixos custos eprocuran-
do manter o bom relacionamento entre as partes, construir as
soluções que mais as beneficiem. Todas as questões comerciais, . -
cíveis, trabalhistas e familiares podem ser submetidas A—rn—ediação.
Com o uso da mediação o cidadão recupera sua indepen-
dência e o controle de sua vida pessoal, social e produtiva, num
convívio mais racional, adulto e pacífico, trazendo a necessária
liberdade e paz social que todos merecemos.
A mediação respeita o sigilo e a intimidade das partes,_
ajudando-as a solucionar seus conflitos num clima em que se
preservam os laços fundamentais.
A divulgação das técnicas ciq mediação ajudará a mudar a
sociedade que poderá assumir completamente o controle da própria
vida, transformando-a numa sociedade capacitada para gerar rique-
za e elevar, assim, o nível cultural e sócio econômico de seus
membros, pois o homem, conhecedor de seus problemas, é o único
capacitado para solucioná-los.
Teoria e Práticada MEDIAÇÃO 15
••••••••••••••••••••••••••••••••••
INTRODUÇÃO
Juan Carlos Vezzulla
Assistimos às mudanças político-sociais mais importantes
dos últimos tempos. Muitas delas relacionadas ao uso da negociação
e da mediação, marcando a importância destas técnicas no desen-
volvimento das sociedades modernas. Citemos algumas.
A paz, ainda parcial no Oriente Médio alcançada com a
negociação direta ou assistida.
A organização social do sudeste asiático, baseada na
mediação, permitiu-lhe alcançar a eficiência que converteu a região
em um novo centro de poder econômico mundial.
A união regional dos países que demonstra a negociação
poder mais que as guerras por fronteiras.
Esses fatos evidenciam que o uso da negociação e da
mediação estão conseguindo objetivos, jamais esperados antes.
No plano social, os povos não desejam mais governos de
quaisquerideologias que regulamentem excessivamente a atividade
social e comercial dos habitantes: querem assumir as respon-
sabilidades de seus próprios atos, com o direito de, se organizarem
segundo suas próprias regras.
Nascida da necessidade de obter novos modos de inter-
relação, a mediação surge como resposta a essa necessidade de não
querermos mais que decidam por nós, pois estamos preparados para
sermos criativos e procurarmos as nossas próprias soluções para
nossos problemas.
A mediação é a técnica de solução de conflitos que vem
14 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
o
o
0
o
O Instituto de Mediação foi criado como uma organização
sem fins lucrativos para divulgar a mediação e formar mediadores.
Este livro tem como objetivo cumprir com os fins do Instituto de
Mediação e servir como complemento aos interessados em former-
se como mediadores, assim como de introdução para aqueles que
desejem conhecer os princípios dessa técnica.
Está em nossas mãos a mudança da organização social,
pois, pare aplicarmos a mediacão, não dependemos de qualquer lei
_ -
ou regulamentacão oficial, mas tão somente do nosso empenho. Se
queremos ser fortes e competitivos devemos ensinar, elevar nosso
nível profissional e estar preparados para exercer a liberdade de•nos
organizar a fim de resolver nossos próprios conflitos com essas
técnicas.
16 Teoria e Prillica da MEDIAÇÃO
Capítulo I.
DAS NOÇÕES GERAIS
DO CONFLITO
EIREatmailitIESSIEMEL.am
Conflito in
Sendo a mediação uma forma de solução de conflitos
vamos, inicialmente conceituar e classificar os conflitos, para a partir
dai ingressarmos no estudo dos elementos e procedimentos da
mediação.
Quando se fala de conflito, aparece, de forma geral, em
todas as pessoas, uma idéia negativa e assustadora: um claro alerta
de perigo próximo, do.qual têm que se defender.
O homem, como, todos os seres vivos, procura preservar
sua integridade e ela está, de maneira geral, associada ao equilíbrio
alcançadd..Esse equilíbrio, 'como se verá mais adiante, está relacio-
nado com 'a integridade psicofísica, e inclui todas as "posses" ( os
bens materiais possuídos ). Esse "statu quo", ao qual nos aferramos
como a uma tabua de salvação, vê-se em perigo quando a proxi-
midade de urn Conflito nos. ameaça..
O conflito tem sido estudado por diferentes ciências e
técnicas do conhecimento humano. Toda a estratégia militar está
baseada nos conflitos reais e potenciais entre países ou regiões. 0
comércio - internacional baseia-se em interesses confrontados que
podem gerar 'conflitos è ditar regras especiais entre mercados
diversos. A sociologia, assim como a História, estuda com atenção
Teoria ePráticadaMEDIAÇÃO 17
o
e
e
•
e
e
•••••0••••••••••••••••••••••••••••
os conflitos . sociais; e são muitas as teorias que se baseiam na
,existência dos conflitos de classe, de raça e comerciais para explicar
a história e a evolução dos povos.
. Kenneth Boulding,ldefine o conflito como "uma situação de
concorrência, onde as partes estão conscientes da incompatibilidade
de futuras posições potenciais, e na qual cada uma delas deseja
ocupar uma posição incompatível com os desejos da outra". Acres-
centando que a interrelação que se estabelece entre ambas as partes
provoca condutas interativas entrelaçadas, numa- soma de ações
dinãmicas que são aplicadas a todas as interrelações humanas. Age-
se de determinada maneira para se conseguir o que se quer. Isso
provoca naquele que sente esse proceder contrário a seus interesses
uma reação a essa atitude. Que, por sua vez, provoca uma nova
reação na outra pessoa, e assim até
Também podemos deduzir da definição acima: "... ocupar
uma posição incompatível com os desejos da outra", outra chave da
sensação de ameaça que todo conflito acarreta: um sentimento de
invasão. Com resquício animalesco, o homem mantém um conceito
de propriedade, que, embora hoje em dia não mais a demarque com
sua urina, continua defendendo-a com todas as suas forças. A
propriedade não precisa ser material. Pode ser simplesmente um
desejo, em oposição ao desejo de outro, referente a uma posição
que, parafraseando a lei da física, não admite dois desejos numa
mesma posição. Gera-se então a possibilidade de um conflito pelo
simples fato de alguém desejar algo e, ao mesmo tempo, pensarque
outro está desejando o mesmo que ele. 2
Boulding, K. E. Conflict and Defense: A General Theory. Nova York: Harper
and Row, 1962.
2 Esse conflito, que logo veremos como possivelmente falso, é, em muitas
ocasiões, origem de conflitos verdadeiros.
18 Teoria e Práticada MEDIAÇÃO
Tais considerações nos aproximam do estudo da escalada
da violência. que nasce com o medo (com base real ou fantasiada)
e, se vai compondo com ações e reações num crescendo de
•
agressividade.
Rummel 3.. amplia o
estudo do conflito, considerando-o
como "a luta pelo poder que se manifesta na procura de todas as
coisas". Esse autor divide o ciclo de vida do conflito em cinco fases:
1. o conflito latente, 2. o início do conflito, 3. a procura do equilíbrio
do poder, 4. o e. quilíbrio
do poder, 5. a ruptura desse equilíbrio. Tanto
na sua definição quanto na divisão do ciclo vital do conflito, Rummel
comunga com Kenneth Boulding, acrescentando à definição de
conflito, o conceito de poder, e acentuando a interrelação das ações
de um, como resposta às ações do outro.
O
critério de propriedade acima citado, que é definiti-
vamente o
conceito de poder, se vê refletido inclusive nas cinco
etapas propostas por Rummel. Fundamentalmente: nos conflitos• (
entre países. Uma região fronteiriça, que nunca foi muito bem
demarcada, constitui um conflito latente. A aparição de certas
riquezas na região, pode dar início ao conflito. Ambos os países
levarão suas forças armadas à região e juntarão todas as informa-
ções que comprovem sua soberania, tentando ter mais peso que
o
Oponente. Com essas ações o poder se equilibra, recebendo, por
exemplo, cada um deles diversos apoios internacionais, etc. Mas
esse equilíbrio é frágil demais, e qualquer fato pode levar a alguma
ação que produza a sua ruptura, pois o problema original "nunca foi
solucionado.
3
Rummel, R. J. Understanding Conflict and War. Nova York, Wiley, 1976.
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
19
00•00000',‘
•
0COOG
•
•
e
A definição de conflito desses autores tem uma visão
cíclica de gestação, nascimento, desenvolvimento e eclosão, que
envolve uma teoria descritiva evolutiva e que, apontando para sua
manifestação, deixa de lado sua estrutura e sua natureza.
Para nós mediadores, também é interessante a definição
de Deutsch 4 que diz podero conflito se manifestar de duas maneiras:_
o conflito manifesto, que é aberto, ou explícito, e o conflito oculto, que
implícito, oculto ou negado. Esse autor introduz o conceito de
conflito oculto que necessariamente deverá ser estudado, conside-
rando-se as limitações pessoais em conhecer ou perceber o conflito
real.
Resumindo essas definições, podemos convir que o confli-
to consiste em querer assumir posições que entram em oposição aos
desejos de outro, que envolve uma luta pelo poder e que sua
expressão pode ser explícita ou oculta atrás de uma posição ou
discurso encobridor.
Essas apreciações se referem, sobretudo, ao estudo de
conflitos entre países, regiões ou empresas, deixando de lado o
homem singular. 0 nosso cliente.
Os conflitos intra-psíquicos.
Como 0 trabalho do mediador é com pessoas, estejam elas
diretamente envolvidas no conflito ou atuando em representação de
organizações, é de grande importância explorar os estudos psico-
lógicos que foram realizados sobre os conflitos intrapsíquicoss, a
4
Deutsch, Morton: The Resolution of conflict. New Haven: Yale University
Press, 1973.
5 Entre outros Freud Sigmund, Obras Completas, Buenos Aires Ed. Amorrortu,
1976.
partir do início do século XX, que possibilitaram um grande avanço
'na compreensão dos conflitos interpessoais e que esclareceram o
aparecimento de aspectos e motivações ocultas dentro do conflito
manifesto.
0 ideal social de homem racional, equilibrado, dono de sí
e de seus atos, que deu origem As leis e regulamentações sociais,
inclusive em suas exceções6; se vê frágil e até obsoleto diante da
constatação da existência de um psiquismo inconsciente, com
desejos e pensamentos que atuam sobre nossa consciência e
influenciam nossas percepções, pensamentos e atos. 0 psiquismo
inconsciente se manifesta quando uma pessoa expressa seu desejo
de obter determinada coisa e, na realidade, faz tudo ao contrário.
Essa posição contraditória entre um querer consciente e uma condu-
ta contrária, demonstra que, longe de sermos donos de nossos atos,
estamos fragmentados e determinados pelo nosso inconsciente em
suas contradições com nossos desejos e pensamentos conscientes.
Tanto na teoria psicológica economicista, que enfatiza a
origem do conflito no acúmulo de energia e sua necessidade de
expressão, em contradição aos nossos interesses sociais e afetivos;
como na divisão do aparelho psíquico em instâncias opostas (id, ego
e super-ego) aos interesses e desejos encontrados, o conceito de
conflito intrapsíquico foi sempre o de luta por manter um equilíbrio
que assegurasse a ilusão de integridade e de não contradição que,
fundamentalmente, liberasse o sujeito da angústia.
A luta entre a procura- de satisfação das necessidades; o
respeito aos ideais (auto-estima), que podem entrar em contradição
4 Nos menores de idade, nos doentes mentais, permanentes ou temporários,
e nos excepecionais, todos eles inimputáveis ou nos atos praticados sob domlnio de
violenta emoção, com diminuição na pena.
20 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 21
O
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S
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•
•
com essas necessidades; e o que os outros esperam do sujeito (como
.deve ser para ser querido), é a chave do conceito de tensão e conflito
na ótica psicológica e de grande importância de ser compreendido
pelos mediadores. Estes pianos de querer, dever ser e procurar ser
querido serão os que dominarão a comunicação dos problemas e
confundirão os clientes, não só na elaboração dos seus discursos,
mas, também, o próprio saberdo que desejam realmente, equais são
seus interesses.
0 fato de que a cria humana nasce total e absolutamente
indefesa e que precisa, para sobreviver, dos cuidados de um adulto .
que interprete suas necessidades e as satisfaça, gera uma fragmen-
tação originária no ser humano entre suas verdadeiras necessidades
e a interpretação delas feita pelo adulto. Toda mãe e todo pai tem
uma imagem do que será seu filho, baseado nos seus próprios ideais
e desejos inconscientes que determinarão o modelo onde se formará
o flexível e fraco aparelho psíquico infantil. Uma criança sabe que
sobreviverá se for cuidada e protegida pelos adultos, e que o será (ou
seja, terá o carinho deles) se aceitar ser e formar-se nesse molde que
seus pais fabricaram para ela, ao menos até à adolescência. Assim,
junto com sua bagagem constitucional, a criança deverá incorporar
todas as mensagens inconscientes de seus pais, todas as ordens e
recomendações conscientes pronunciadas por eles e toda a informa-
cão que a sociedade introduz nela (educação) como conhecimentos
de uma estrutura do que é esperado dela, no presente e no futuro.
Chamamos a esses três níveis de imposições de "ilusó-
rios", pois dão normas que criam a ilusão, de serem cumpridas, de
assegurara equilíbrio e a ausência de angústia. Esses ilusórios são:
Ilusório pessoal, o ilusório familiar e o ilusório social. Ao mesmo
22 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO .
tempo, esses ilusórios, cheios de preconceitos, limitam tanto a
percepção quanto a ação do ser humano, deixando-o preso e
pressionado por eles.
0 querer ou desejar, na linguagem cotidiana, nos repre-
senta. ldentificamo-nos
com nosso desejo ao ponto de ser com ele
um só. Ser profissional, estar casado com alguém, ser pai ou filho de
tal, ser funcionário
de tal empresa, passa rapidamente a constituir-se
em nossa identidade e conseguimos manter o equilíbrio sempre que
possamos continuar associados a esse desejo-objeto que nos repre-
senta e, ao mesmo tempo, nos identifica. Somos sujeitos, na base de
nosso próprio desejo, e estamos sujeitos precisamente a esse desejo
que defendemos e pelo qual lutamos.
Por isso, o conceito de conflito está associado em todos
nós,
com coisas negativas, precisamente, pela ameaça de fazer-nos
perdera equilíbrio entre todas as forças encontradas em um precário
acordo,que nos dá a ilusão de felicidade.
Se somamos essas contradições internas às outras gera-
das na luta pelo poder, na rivalidade pelos espaços e pela imposição
de nossa vontade, teremos nos aproximado do verdadeiro conceito
de conflito interpessoal, onde duas individualidades, confundidas
pelas próprias limitações intrapsíquicas, se enfrentam por posições
incompatíveis, determinadas pelo desejo de poder mais que o outro,
estruturadas numa posição defensiva, cheia de preconceitos, que
confunde mais do que esclarece os próprios interesses.
Na medida em que o mediador possa transMitir a seus
clientes os aspectos positivos do conflito,' rumo à importância de
aproveitara crescimento e a nova ordem, remarcando o benéfico, e
acalmando a angústia, poderá contar com a colaboração deles e,
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
23
assim, ajudá-los a resolver satisfatoriamente seus problernas.
Conflitos reais e falsos.
Podemos definir, que existe um conflito real se existe uma
real oposição entre os desejos e direitos de uma pessoa é ásOésejos
e_ direitos de outra pessoa ou grupo. Deixamos o nome de fats° para
aqueles conflitos originados por falhe da comunicaçãoque_parce
produzir, ate que as coisassejam aclaradas, uma aparente oPosição.
É fundamental para um mediador ter absolutamente clara
essa diferença, pois, normalmente, a escalada de .violência, a
confusão dos reais interesses de cada parte, e a confusão entre os
verdadeiros problemas e as pessoas entre as quais esses problemas
existem, contêm sempre distorções originadas na falta .de comu-
nicação ou por falhas na escassa comunicação existente .entre as
partes. Por isso é importante que o mediadordomine os conceitos da
teoria da comunicação e saiba da importância da clareza na emissão
da mensagem e as dificuldades que o ser humano tem de escutar
mensagens tal como foram emitidas.
A comunicação.
Toda_cornunicação consta de trés partes: • o emissor, o_ _
canal pelo qual a mensagem é transmitida, , e. o • receptor. Falhas
podern aparecer em qualquer uma ou em todas elas.
É fundamental que o mediador não deixe nada sem escla-
recer, nem da nada por conhecido. 0 jogo de "eu sei que você sabe
que eu sei"tão próprio da comunicação humana, é a "mãe" de muitos
falsos conflitos, que o mediador deve desfazer.
24 Teoria e Prática daMEDiikgÃO
Todos os especialistas em comunicação explicam a impor-
tância de pensar a quem se dirige a mensagem, para poder elaborá-
la segundo a linguagem que sera a mais clara para o receptor. 0
exemplo mais vulgar seria o de não falar em português com alguém
que só fale inglês. Daí, para qualquer outro exemplo, a chave é tomar
em consideração o uso de termos e modos de expressão que serão
compreendidos pelo receptor. Por isso, é muito importante analisar
os ilusórios de cede cliente, para saber como nossa mensagem
atingirá melhor nosso objetivo.
Uma segunda regra exige que confirmemos sempre a boa
recepção da mensagem. Como veremos nos capítulos posteriores,
o mediador deve sempre fazer um resumo do que escutou, para
assegurar-se de ter compreendido corretamente e para que os
clientes também focalizem sua atenção no essencial do problema.
A regra básica da combnicação, fundamental em negocia-
cão e mediação, é a de escutar com atenção. As pessoas estão
acostumadas a dar por entendida qualquer mensagem, ainda antes
de ter sido emitida totalmente: "eu já sei o que você quer, ou vai
dizer, e basear-se rios próprios temores para supõr quais são os
desejos e quais serão os discursos da outra parte. Em geral tentam
interromper, adiantar-se e assim não escutam o que a outra pessoa
desejava transmitir. É fundamental que o mediador introduza a regra
de respeito aos tempos de expressão de cada parte, enfatizando a
importância da escuta atenciosa da outra parte, para que, a sua vez,
ter também assegurado o direito de expressar-se com toda tranqüi-
lidade, com a certeza de ser escutado.
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 25
•
•
•
•
Acland' aponta para uma boa comunicação bilateral:
que as partes se escutem com atenção;
CI que falem com clareza e determinação;
que possuam uma atitude aberta â apresentação de
informação e de idéias novas;
que estejam dispostas a concordar; (eu acrescentaria: a
discordar);
que aceitem os outros como iguais.
mediador, longe de imp& sentenças, impõe regras de
comunicação, inclusive com seu exemplo. Dal a importância de que
as conheça completamente.
Escutar atentamente, inquerir para saber mais, e fazer um
resumo do compreendido, são as regras da comunicação mais
importantes a serem tomadas em conta pelo mediador.
Pois, assim como a responsabilidade dos clientes é a de
discutir o problema; a do mediador 6. a de como discuti-lo.
de ouvi-lo falar; pois é no falar que o homem se revela."
Palavras que têm milhares de anos e que estão esqueci-
das. Como. diz o ditado, temos duas orelhas e uma só boca, para
escutar o dobro do que falamos. É no discurso dos clientes que se
encontram os verdadeiros desejos, de onde se desprendem os
verdadeiros interesses, onde são revelados os medos mais profun-
dos. Em mediação, a escuta atenciosa dos clientes é a chave que
1
nol) abrirá as portas para conhecer e reconhecer os reais interesses e os
, meios de chegar a acordos onde esses interesses sejam respeitados.
O caminho para superar o conflito.
Escutar, sempre escutar.
"É no falar e no agir que a pessoa humana se revela por
aquilo que é. Quando a gente sacode a peneira, ficam nela só os
refugos; assim, os defeitos de um homem aparecem no seu falar.
Como o form prova os vasos do oleiro, assim o homem é provado
em sua conversa. 0 fruto revela como foi cultivada a árvore; assim,
a palavra mostra o coração do homem. Não elogies a ninguém ante
7 Acland, Andrew Floyer. Como utilizar la medicadón para resolver conflictos
en los organizaciones. Paid6s, Buenos Aires - 1993. 8 BIblia: Eclesiástico 27,47
26 Teoria e Preilica da MEDIAÇÃO Tearia'e Pratica da MEDIAÇÃO 27
Capítulo 2.
DO CLIENTE
4••••••••*•••••.••••••••••••:••••••
Quando duas pessoas brigam, o crescimento ou escalada
da violência confunde de tal maneira a comunicação, que já ninguém
sabe com certeza, qual foi a verdadeira causa que deu início à briga.
Que interesses opostos a geraram.
Basta tomar como exemplo a discussão de um casal, onde
a simples reclamação por uma comida fria ou sem tempero, conver-
te-se rapidamente em uma longa briga onde todas as mágoas,
guardadas há tempo, surgem como de uma torneira plenamente
aberta, inundando a conversa e fazendo desaparecer as verdadeiras
razões da origem da discussão. E, o que é mais importante, encobrin-
do a real causa que motivou a agressão.
Além do mais, o que acontece quando um conflito é levado
justiça; todas gS necessárias fórmulas legais, incrementam tanto o
conflito inicial, que pouco ou nada dele, fica como era originariamente.
Quando duas pessoas lutam pelo direito a uma proprieda-
de, as razões objetivas que sustentam com clareza tal direito são as
que as levam a sentar, negociar e, finalmente, chegar a um acordo:
com que parte, ou com que uso da propriedade ficará cada uma
delas. Por que, então sentar-se ; e chegar a um acordo, não
possível?
Tenho apontado as pressões a que é submetido o ser
humano desde o nascimento e 'clue fazem com que o aparelho
psíquico se estruture em uma unidade fragmentada. Somos pessoas,
graças a este constituinte que nos dá a ilusão de ser um e ao mesmo
Teoria e Práticada MEDIAÇÃO 29
•••••••••••••••••••••••••••••••ss••
tempo muitos, nas contradições. Isso é, precisamente, a chave das
falhas `na comunicação com os outros.
Se os clientes não podem dar conta de seus próprios
desejos, como farão para lutar por eles, sem a contradição própria da
irresolução.
Sentem-se agredidos pela intromissão ou a invasão do
desejo de outra pessoã em seu objeto desejado; mas não conseguem
saber com certeza, o que desejam desse objeto ou para que o
desejam.
Lutam com ideais de justiça pelo que consideram sua
propriedade sobre o objeto ou ao menos seu direito sobre ele, mas
desconhecem não somente se é esse seu objeto, senão que parte ou
porção dele é seu ou a que têm direito realmente.
Nesse jogo ilusório de propriedades e direitos, de confu-
sões refletidas de seus próprios conflitos internos, surgem os grandes
conflitos interpesso a is.
Sem me aprofundar aqui, nas identificações que os impul-
sionam a agirem de determinada maneira, confundindo o querer com
aquele dever querer, para serem como o modelo, ou terem o que ele
tem. Esse conjunto de identificações mexe tanto com a conduta e,
fundamentalmente, com a personalidade de uma pessoa, que cria
uma confusão, no sentido de que ela tem a obrigatoriedade de possuir,
ou reagir de uma maneira, quando seu real interesse é outro. Em
problemas familiares aparece com freqüência essa confusão: uma
mulher deseja a sua independência, mas não aceita deixar seus filhos
com seu ex-marido, pois as identificações com a figura de mãe indica
que deve ficar cuidando deles, apesar dos interesses próprios e os dos
filhos, os quais seriam melhor cuidados por quem realmente deseja.
30
Teoria e Práticada MEDIAÇÃO
Repito que é com esse homem, sujeito a todas essas
pressões, que o mediador se enfrenta quando o cliente lhe apresenta
um conflito, seja da ordem familiar ou comercial.
QUe acontece com essas pessoas que não conseguem
explicitar seus interesses, nem ouvir os da outra parte?
Como fazer para descobrir esses interesses reais e desar-
mar um discurso, tão elaborado, quanto 6 de um cliente que briga
pelo que ele acha que são seus direitos?
A posição, encobrindo os interesses.
0 trabalho de escuta das "posições" dos clientes e da
descoberta do latente contido em seu discurso é o mais importante
a ser feito pelo mediador no primeiro momento.
Sabemos que nenhum conflito é como se apresenta na
superfície. Como um iceberg, a parte oculta é muito maior que a
visível.
Os clientes estão acostumados a não serem frontais na
verbalização de. seus interesses. Não estou falando somente do
demandar encobridor do desejo9, mas sim diretamente, de encobrir
a mesma demanda, pois eles pensam que o adversário não deve
saber as verdadeiras razões que o assistem na disputa, com o risco
de perder a possibilidade de ganhá-la.
A sociedade toda está Otruturada na simulação. Social-
mente é de mau gosto dizer diretamente o que se quer, e as pessoas
° Lacam, Jacques. Em toda sua doutrina psicanalltica, diferencia a demanda,
ou seja o discurso com o qual se pede alguma coisa, do real desejo que não pode ser
expressado por ser Inconsciente. A demanda pode ser satisfeita, mas o desejo fica sempre
pressionando em sua insatisfação, dcultando-se na demanda. O que produz a busca
permanente, o demandar permanente, na irrealizaçao do desejo.
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 3 1
numa exposição oral que pouco ou nada terá dos interesses iniciais
que a levaram ao litígio.
Esse discurso armado e estruturado com base em opiniões
de outras pessoas é tão hermético, que sobre ele nada pode ser feito.
É uma repetição continua da mesma alegação que só consegue
reforçar o discurso do oponente, fechando-o na sua posição, que será
tão solidificada quanto a outra.
Derrubar essa posição tão estruturada e inútil para deixar
fluir o verdadeiro interesse, perdido e disfarçado durante a escalada
de violência, é imprescindível no processo de mediação.
Não é possível mediar entre duas pessoas que repetem
sempre o mesmo discurso e que, frente a cada ataque, têm uma
resposta preparada. 0 mediador deve quebrar esse círculo vicioso
com perguntas que conduzam à reflexão e à emergência dos
interesses reais.
Fisher e Ury'°, dizem que não é possível negociar sobre
posições, ou seja, sobre aquele discurso estruturado e fechado que
uma pessoa apresenta como seu objetivo e as razões que o susten-
tam, mas, sobre interesses concretos e reais de cada pessoa.
Essa. posição deve ser quebrada pelo mediador, investi-
gando e questionando para ajudar a parte a refletir procurando, na
ruptura do discurso, - sejam contradições ou outros sinais que
chamem nossa atenção, - investigara emergência do outro discur-
so, o verdadeiro. Assim se procede na mediação com os clientes,
até ajudá-los a descobrir os verdadeiros interesses na causa em
discussão.
004).0000000000.•*00•00600006.6600•
são formadas para disfarçar seus pedidos.
Somos educados na simulação e na desconfiança. Em se
tratando de dinheiro e propriedades, a situação se complica ainda
mais. Se em organizacões sociais, como as dos anglo-saxões,
onde os problemas comerciais e de dinheiro são tratados mais
abertamente, é necessário o uso da mediação para descobriras reais
interesses em jogo, em sociedades latinas como a nossa, essa
necessidade é imperiosa.
Vamos ver como seria a escuta simples de um profissional
do direito, quando um cliente requer seus serviços. Primeiro: vet
- que
leis regulam o
problema apresentado, segundo: que jurisprudência
existe sobre o assunto, e, terceiro: com que incrementar a reivindi-
cação para fazê-la mais aceitável, para que o juiz dite uma sentença
favorável. Normalmente o cliente é sustentado por esse profissional
na sua posição, e seu ódio pelo adversário é incrementado. Recebe
instruções sobre o que dizer e como dizer, tomando mais rígido e
inescrutável
seu verdadeiro interesse original. Obtém informações
numa lingua especial, cheia de termos técnicos, dos quais poucos
são os realmente compreendidos pelo cliente.
Este é um cliente que entrou com um problema
e saiu com
uma complicação semântica na cabeça e sua litigiosidade incre-
mentada. Envolvida num litígio, uma pessoa vai falar tanto dele e
escutar tantos conselhos e recomendações de familiares, amigos e
profissionais
que, dia a dia, esse discurso se verá "enriquecido"
com
inúmeros argumentos e frases feitas, até conseguir solidificar-se
I° Fisher, Rojer and Ury, William. Getting to yes. Peguin Books, Nova York -
1991.
32
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 33
••••••••••••••••••••••••••••••••••
As perguntas chaves são: o quê? e por quê?, sem o intuito
de'culpabilizar, mas desejando saber, conhecer sempre mais. Toda
intervenção do mediador que produza a verbalização de maiores
informações, destravando os medos e as limitações dos clientes,
produzirão um efeito liberador que ampliará a visão dos problemas
e aguçará a criatividade," represada pela cristalização do discurso.
Logicamente nós, mediadores, não pretendemos curar
ninguém, mas é importante ressaltar o efeito liberador que produz
nos clientes a possibilidade de alcançar o conhecimento de seus
próprios interesses, livres das pressões que os confundiam e impe-
diam de saber exatamente o que queriam obter nesse pleito.
Sabemos que um cliente ao falar está expressando um
discurso que contém outro. Que no discurso manifesto há um outro
oculto, ou latente, contido nele.
Com o objetivo de descobrir o latente é que o cliente
começa a ser escutado pelo mediador, com a outra orelha que é a de
investigar como um detetive, ou melhor dito como um mediador, o
verdadeiro discurso do cliente.
• Baseado no sigilo, o mediador procura ganhar a confiança
do cliente, demonstrando-lhe Clue- ele está ai precisamente para
ajudá-lo, e que toda abertura do discurso conduz a obter resultados
melhores. Na confusão do litígio, o único espaço onde o cliente pode
falar com tranqüilidade e desabafar é na sessão de mediação, frente
a frente (face a face) com o mediador.
Com perguntas dirigidas a ampliara questão, a depor toda
posição fechada a novas possibilidades, incentiva-se a criatividade
e se libera o cliente de pressões que pouco ou nada ajudam a
satisfazer seus interesses.
Muitas vezes escutamos alguém expressar sua vontade
para conseguirtal ou qual coisa (por exemplo, separar-se do cônjuge)
e ao mesmo tempo percebemos, através desse discurso, que toda
sua ação está orientada a conseguir o contrário (tentando acordos
que criarão uma dependência onde a separação nunca se concre-
tize)." Apontando essa contradição, o mediador derruba a posição
estruturada no discurso, provocando a emergência dos reais objeti-
vos do cliente. Desarmado, o cliente começa a deixar surgir seu
verdadeiro interesse e com isso facilita a solução do conflito interpes-
soal que o trouxe à mediação.
Luta entre pessoas ou discussões sobre problemas?
Quando duas pessoas brigam, sejam quais forem as ra-
zões, a real causa da dispute deixa rapidamente seu espaço ao
oponente que passa a ser o alvo de todas as agressões. A partir daí,
há um conflito direto com essa pessoa: "Essa pessoa quer me roubar,
essa pessoa quero que é meu", e finalmente essa pessoa passa a ser
a causa de quantas desgraças possam ocorrer.
tão arraigada a cultura adversarial nas sociedades, que
em algumas justiças se autuam os processos com os nomes dos
adversários, com um versus ou urn' contra no meio.
Comumente, se presenciamos uma discUssão entre duas
pessoas, e, interrompendo-as, perguntamos a razão da discussão,
escutaremos delas um grande número de acusações de uma para a
11 É habitual que os clientes expressem apaixonadamente um objetivo e na
pratica façam tudo para ilk, consegui-lo. No filme A Guerra dos Roses, ambos esposos
expressam seu desejo de separaçao, mas os dois fazem tudo para ficar juntos, até que
a morte os separa.
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 35
34
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
utra, culpando-se mutuamente: "por não querer compreender, por
ue o outro é um cabeça dura, por que o outro diz ou fez tal ou qual
oisa". Raramente escutaremos uma síntese do problema que as
wou a discutir.
Essa e" a base da escalada da violência. Personalizando-se a
iscussão cada vez mais, o problema passa a ser "o outro", e não o
roblema real, incrementando-se os sentimentos negativos que um
entirá pelo outro. Chegando-se a perceber um ao outro tão ameaçador
ue, de urn problema em que duas pessoas ou.partes estão envolvidas,
assa-se a uma luta entre adversários, a inimigos de morte.
Da impossibilidade de separar as pessoas dos problemas
ue as confrontam, surge a organização judicial atual, onde é tão
npossível falar entre os oponentes do problema sem brigar, que
,
recisam de um juiz para mantê-los separados que imporá uma
entença à qual devem submeter-se, pela incapacidade de negocia-
em entre eles a melhor solução.
Ao mesmo tempo esta cultura de confundir os problemas
.om as pessoas tem criado a meta de ganhar, como numa guerra, na
iase da destruição do inimigo. 0 conceito de que se "ele ganha eu
lerco", e vice-versa, impediu a possibilidade da negociação direta,
lois o interesse de um, de ficar com tudo, deixa sempre o outro na
itu ação de perda total.
A possibilidade de encaminhar novamente a atenção sobre
verdadeiro objeto, sobre a verdadeira causa da disputa, e centrar
iisso as discussões, leva as partes a um uso comum das palavras
)ara referir-se aos verdadeiros direitos e interesses sobre o objeto do
pal se trata, e a reduzir a agressão entre elas.
"Centralizaras discussões sobre os objetos e deixarde lado
16 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
os problemas pessoais", é a outra regra a ser respeitada e que o
mediador deve impor desde o início, nas sessões de mediação.
Devo aquí apontar que somente quando as partes desejam
alcançar soluções, é que o mediador conseguira impor a regra de
centrar-se nos problemas e deixar de lado as pessoas.
Muitas vezes as pessoas simplesmente inventam proble-
mas para poderem brigar. Nesse caso a mediação somente lhes
servirá para fazer com que vejam a inexistência de problema algum,
fora de seu desejo de brigar, pois não se lhes permitirá continuar a
luta. Os tribunais, nesse caso, oferecem um ambiente mais propício
e lhes proporcionarão maiores satisfações.
É fundamental que o mediador tenha bem . claro, para
transmitir a seus clientes, que a mediação poderá ajudá-los somente
se eles desejam preservar o relacionamento, aprimorá-lo ou ao
menos não prejudicá-lo. Se não existe esse interesse, a mediação
perde a maior de suas forças e os convénios correm risco de ficar
detidos, pela falta do desejo de reconstruir ou preservar o relaciona-
mento anterior à briga, ou recriar um novo relacionamento, já que o
antigo fracassou.
0 mediador pode aceitar, e até é bom que fomente, o
desabafo emocional, mas nunca pode permitir a agressão, e deve
marcar que o objetivo é achar soluções satisfatórias para ambas as
partes.
Repito, pois é fundamental para o processo da mediação:
o mediador deve saber diferenciar quando seus clientes estão
confundindo o problema com uma briga pessoal, porcausa da cultura
adversarial em vigência; de quando o objetivo de seus clientes
simplesmente brigar entre eles, sem outra razão que a de vencer. No
Teoria e Práticada MEDIAÇÃO 37
•
•
e
•
e
o
e
•
e
0•0•••••••••••••••0•••••••••••••••
primeiro caso a insistência em que os clientes focalizem as discus-
sões nos , problemas e não neles mesmos, sera suficiente para
introduzir o respeito nas negociações. No segundo caso, sera melhor
suspendera mediação até que eles acalmem seus ânimos e revejam
seus objetivos.
Oual é o cliente da mediação?
• A mediação, repito, é de grande utilidade nos casos em que
as partes desejam achar soluções onde os interesses de ambas •
sejam respeitados. Onde seja importante preservar e ate aprimorar
o relacionamento, mas nunca piorá-lo.
Outra virtude da mediação é o sigilo. Muitos problemas
comerciais ou familiares requerem um tratamento sem publicidade,
sem transcendência. Quando os clientes desejam achar as soluções
dentro de parâmetros privados, a mediação pode ajudá-los
grandemente.
Uma das exigências fundamentais que o mediador deve
impor no inicio da mediação, é a de que os participantes tenham
representatividade suficiente para expor o problema e decidir as
soluções. A importância do interrelacionamento das partes nas
sessões de mediação, faz com que sejam elas mesmas as que
tomem decisões. A necessidade de consulta com superiores ou
representados, enfraquece a mediação no ponto mais importante
que é o do relacionamento entre as partes e a escuta de seus
interesses e necessidades.
Resumindo: o cliente apto para solucionar seus problemas
38 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
através da mediação é aquele que, capacitado para decidir, deseje
preservar seu relacionamento com o outro, com o objetivo de tomar
decisões que • contemplem a satisfação dos interesses de ambos,
num clima cordial, sem difusão e sem demoras.
As emoções dos clientes.
Temos falado bastante da necessidade do ser humano de
preservar um equilíbrio psíquico, e de como esse equilíbrio se sente
ameaçado com a emergência de um conflito. Um alerta é disparado,
fazendo com que os seres vivos se preparem a enfrentar um perigo,
quando alguma informação recebida pela percepção aponta a exis-
tência de um elemento fora do normal. A primeira reação dos seres
humanos é a de prepararem-se para defender a integridade, seja
física ou psíquica, que se sente ameaçada. Esse primeiro alarme,
sentido como angústia, faz com que o aparelho psíquico se prepare
para defender-se de um perigo, seja ele intrapsíquico ou exterior.
Essa angústia deixa o homem com os sentidos mais alertas para•
reconhecer a realidade e importância do perigo. Essa angústia,
dependendo da comprovação da realidade do perigo, o induzira a
fugir ou a atacar. Após uma possível paralisia temporária.
Um cliente com um conflito está sempre angustiado, por
isso é fundamental que o mediador o ajude a acalmar-se. Essa
angústia converte-se logo em medo, pois, se decide atacar, terá
medo da devolução defensiva da outra parte, e, se foge, o faz
também com medo. Não ha aqui a necessidade de remarcar que o
grande sentimento da paralisia é o medo.
Quando um cliente grita ou agride é porque sente medo, o
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 39
0110•400••00069.G00
mesmo quando para ou foge para não enfrentar o problema. Esse
medo, sentimento próprio de quem sente seu equilíbrio em perigo,
favorece a escalada de violência, levando as partes a confundirem
pessoas com os problemas e a necessidade de construirem o seu
discurso da posição, acreditando que ele seja o melhor escudo
protetor da fragilidade que está sentindo.
0 cliente deve acreditar no mediador e senti-lo protetor.
Ambas as partes devem sentir-se cuidadas pelo mediador. Este deve
demonstrar-lhes sua imparcialidade que implica em marcar os
momentos de injustiça, assim alertá-los quando uma proposta foge
dos critérios de realidade. Deve fazê-los sentir-se à vontade,
compreendidos e cuidados por ele. Isso faz com que o medo e a
angústia diminuam e, logicamente desapareçam as condutas asso-
ciadas a esses sentimentos.
Muitos autores que trabalharam as características e dificulda-
des dos homens para negociar, apontam o medo como o principal
inimigo. 0 medo bloqueia o raciocínio, a afetividade e com isso a
criatividade, valores fundamentais que entram em jogo na mediação.
Um homem ou mulher que chora ou grita ou treme está
pedindo ser socorrido. São sinais que o mediador não deve deixar
passar, sem reconhecimento e compreensão, com frases como:
"Compreendo o que está passando e o quão difícil 6 para o senhor/
a senhora, esta situação. Eu estou .aqui para ajudá-los e facilitar as
coisas ao máximo. Vocês já deram o primeiro passo ao virem até
aqui, que demonstra suá fortaleza e o desejo de solucionar pacifica-
mente este conflito".
Outras vezes a simples pergunta ou sinalização do que
percebemos, são suficintes para ajudar o cliente a se acalmar e
adotar uma posição mais colaboradora.
Certa ,vez teve-se que mediar em uma sociedade com um
grande conflito. Dois dos três sócios queriam efetuar um grande
aumento de capital o que deixava o terceiro, o mais jovem, fora da
igualdade de decisão. Esse jovem ocupava, há seis meses, o lugar
do pai, que havia morrido, tendo então ficado como representante
dos outros herdeiros, uma irmã mais nova e sua mãe.
Os outros dois sócios, um homem e uma mulher, de
aproximadamente a mesma idade do falecido, diziam quereraumen-
tar o capital para comprar maquinários para eles imprescindíveis. Na
realidade, o que queriam era eliminar ou ao menos neutralizar esse
"jovem que, sem saber nada do assunto, atrapalhava o funciona-
mento da sociedade". Logo após iniciada a mediação, ficou claro que
o jovem tinha um excelente preparo para cumprir sua função, e suas
idéias pareciam sensatas. A cada oposição de seus sócios, ele
rebatia com respeito e com muitos conhecimentos e dados, demons-
trando até o desnecessário da compra de tais máquinas.
Após muitas idas e vindas sobre o tema, um dos sócios mais
velhos, a mulher, deixou de falare começou a batersuavemente com
um dedo na tampa da mesa, com um ritmo monótono que parecia o
de um relógio, mas ela aparentava estar totalmente calma. 0 media-
dor dirigiu sua atenção a ela e lhe disse que achava ela muito ansiosa
e se podia expressar o que estava acontecendo. Com raiva disse que
o jovem, queria era matá-los, ao ir contra todos os procedimentos que
tão bem funcionaram até então. A luta de gerações, aqui, era de "vida
ou morte" e o jovem era a clara expressão do envelhecimento e da
morte próxima deles. 0 jovem ficou sem jeito pela afirmação de sua
sócia e replicou que "eles 6 que queriam matá-lo aumentar o capital
.000•14060€0410
. 40 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 41
••••••••••••••••••••••••••••••••••
em cifras que ele não poderia acompanhar". Após um silêncio, o
jovem confessou que, em seu entusiasmo com a novas técnicas que
havia estudado, se esquecia de respeitar a grande experiência de
seus sócios.
aponto inicial de aumento de capital, que tinha atuado como
posição, encobrindo os reais interesses deles, cedeu espaço à discus-
são de como podiam organizar-se para aproveitar ao máximo as
habilidades de cada um, ouvindo-se e respeitando-se mutuamente.
Se este caso não tivesse acudido à mediação, o final teria .
sido bem diferente, pois teria ficado numa discussão sobre aumento
de capital, a que um juiz ou um árbitro teria determinado segundo as
leis vigentes, e o problema real teria ficado sem solução, pois os
temores deles não teriam sido nem ouvidos nem trabalhados.
Esse 6 um bom exemplo de posição encobridora dos
interesses, pois o aumento de capital simplesmente encobria o real
desejo dos sócios mais velhos de frear a atuação do mais novo, e de
conseguirem ser respeitados por ele.
Também o 6, com respeito à confusão de pessoas com
problemas, pois, realmente, o problema não era as pessoas, e, sim,
como achar a maneira de respeitarem-se, uns a outros, e fazer o
trabalho mais prazeiroso e produtivo.
Também exemplifica a importância das emoções dos
clientes que devem ser tomadas em consideração pelo mediador
para que, explicitadas, possam ser uma grande porta de acesso aos
interesses. E, finalmente, um bom exemplo de como, com a media-
ção, os interesses de todos são tomados em consideração e o
resultado final contempla a satisfação deles, em um "ganha, ganha",
de difícil percepção numa primeira visão do problema.
• Capítulo 3.
O MEDIADOR
O que é ser mediador.
Aprofundar-se no conhecimento da mediação é, basica-
mente, estudar qual deve sero comportamento do mediador, pois, de
seu profissionalismo dependerá, em grande proporção, que as partes
achem o caminho do acordo.
Uma das vias mais efetivas para definir o mediador 6
dizendo o que ele não 6.
Vejamos então que o mediador não 6 um juiz porque nem
impõe um veredito, nem tem o poder outorgado pela sociedade para
decidir pelos demais. Porque não se julga com a sabedoria de
conhecer o que 6 justo ou o que 6 melhor para os outros. Mas deve
ter do juiz o respeito das partes, ganho com sua atuação e impar-
cialidade. Diferentemente do juiz, ele não é indicado para as partes
por distribuição ou sorteio das causas, mas escolhido pelas partes.
Também não é um negociador que toma parte na negoci-
ação, como interessado direto dos resultados. Paca o mediador o
importante é que as partes descubram seus verdadeiros interesses
e consigam um mínimo de interrelacionamento para discutirem
esses interesses. Dependerá das partes a corrOirsão da mediação
com um acordo ou não.
Também não é um árbitro que emite um laudo ou decisão.
Aqui merece uma interrupção para indicar, detalhadamente, as
diferenças entre mediação e arbitragem. Na mediação, o mediador,
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 4342 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
••600060000009000•000
ainda que Seja um experto no tema tratado, não pode doutrinar sobre
a questão em discussão. Ele cuida especialmente da interrelação
entre as partes e a descoberta dos interesses reais de cada uma
delas. 0 árbitro não se preocupa com interrelacionamento, senão
com as informações técnicas apresentadas, na base das quais, com
fundamentos em seus conhecimentos específicos, ditará um laudo a
que as partes se comprometeram a aceitar. 0 árbitro nem precisa
conhecerpessoalmente às partes. É suficiente que elas lhe apresen-
tem um relatório de suas posições. Em muitos países do mundo, essa
técnica, que apresenta suas vantagens quando o problema é muito
técnico e precisa da avaliação de um especialista, tem fracassado
porque, ao não contemplar os reais interesses, seu laudo se baseia
em dados técnicos e normalmente dá a razão a um, deixando o outro
descontente. Por isso muitos laudos não são acatados pelo perdedor,
que recorre a justiça, perdendo-se o tempo investido na arbitragem.
É importante ressaltarque igual ao mediador, o árbitro é escolhido de
comum acordo, pelas partes.
Resumindo, o mediador é um terceiro neutral. Conduz,
sem decidir. É neutral em Judo o que seja esperado dele como
intervenção na decisão. E ele como neutral, deve fazer com que as
partes envolvidas participem ativamente, na busca das soluções que
serão as que melhor se ajustem a seus interesses, pois ninguém
melhor do que as próprias partes para decidir sobre si.
Ficar no meio, entre duas pessoas que brigam, sabemos
pelo conhecimento popular, é ficar como o marisco entre a rocha e
o mar, na piordas posições. Mas essa é a posição do mediador, como
atividade profissional, adotada e exercida.
Na mediação tudo deve acontecer entre as partes. 0
mediador é tão somente a parteira, que ajuda a dar à luz os reais
interesses que possibilitarão o acordo final. 0 tempo é marcado pelas
partes e o Mediador não pode urgi-las, nem demorá-las.
As técnicas do mediador.
Vejarrios então quais serão as técnicas que o mediador
deverá dominar para agir eficientemente nesse difícil equilíbrio de
ser neutral, e, ao mesmo tempo, ajudar a dar vida.
Ja temos visto os três aspectos que o mediador não deve_-
nunca deixar de lado, 1) centralizar as discussões nos problemas e
não nas pessoas; 2) investigar os interesses desarmando o discurso
infértil da posição; e 3) prestar muita atenção às emoções dos
clientes para que, apontadas, sejam usadas positivamente na procu-
ra dos reais interesses e não atrapalhem no processo de mediação.
Os mesmos mecanismos psíquicos que levam as pessoas
a deslocarem a atenção do objeto da discussão para os sujeitos que
discutem, e, a armar sobre os reais interesses, posições, que pouco
ou nada conservam deles, são precisamente os mesmos que as
levam a fantasiar valores e situações fora da realidade que sempre
dificultam a posibilidade de acordos satisfatórios.
Por isso é importante que os valores e critérios objetivos
entrem nas discussões, pois, considerados, vão pesar sobre qual-
quer petição descabida e recolocarão as partes em um enqua-
dramento realista. 'Esse procedimento facilitará o encontro de acor-
dos satisfatórios para ambas as partes. É este o 40 aspecto a ser
tomado em conta pelo mediador.
Entre esses valores e critérios objetivos, que os advogados
e
outros profissionais de cada parte informam a seus clientes, se
44 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
45
incluiriam os possíveis resultados de uma sentença judicial, no caso
de que recorram à justiça.
0 mediador não pode comunicar esses valores e critérios
objetivos, pois seria uma ingerência fora de lugar, mas deve questio-
nar as partes para dirigí-las a fazerem aparecer esse conhecimento
nas sessões de mediação.
Perguntas como, "o senhor/ a senhora sabe quais são os
valores das propriedades na vizinhança?", ou, "seu advogado o
informou qual poderia ser a opinião de um juiz neste caso?" trazem
os critérios de realidade que tanto precisamos, sem comprometer a•
posição do mediador.
É importante que o mediador saiba que todas as pressões
a que estão submetidos os clientes, distorcem a realidade gerando
não uma irrealidade, mas uma realidade psíquica que, muitas vezes,
tem mais força do que a realidade mesma.
Não é tão simples como parece, que com a aparição de
critérios de realidade, ou seja valores reais, o cliente modificasse sua
posição. Não esqueçamos qué tbda avaliação está cheia de outros
valores, psíquicos e sentimentais, que pesam, e que a sua vez tem,
por si, peso dificilmente quantificável objetivamente.
Uma 'casa ou empresa ou participação societária, pode ter
um valor, para o vendedor, que 6 fundamental investigar, pois pode
haver outros interesses que ele está traduzindo em dinheiro mas que
podem ser compensados de outrojeito, porque o comprador não lhes
dá a mesma importância quali ficada em valores monetários que o
vendedor. Jardins, até murais em paredes, ou marcas que, em
muitas mediações, constituem uma grande parte da diferença de
valores, podem ser deixados fora da operação, convencionando-se
46 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
pelo resto, um preço conveniente para ambas as partes.
Dois clientes não podiam chegar a um acordo sobre o valor
de uma propriedade rural, pois o preço de mercado, que o comprador
oferecia era muito inferior ao pedido pelo vendedor. Ambos estavam
interessados em concluir a negociação, mas a diferença era enorme
e não podiam continuar barganhando sobre valores sem conseguir
resultado algum. Consultado, pedi para cada urn deles para decom-
por a propriedade em diferentes aspectos ou partes que para eles
tivessem valores significativos. Assim, a lista dos dois constou da
quantidade de campo, de cabeças de gado, de objetos dentro do
campo para a exploração leiteira, a casa para os trabalhadores, etc,
que coincidiam quase totalmente nos valores. A grande diferença
constava do valor da casa principal, e do nome da propriedade, que
o vendedor avaliava e o comprador nem tomava em consideração.
Questionados sobre esses dois pontos, apareceu que a diferença
com respeito A casa estava na avaliação de um mural pintado por um
grande pintor mexicano que, hospedado nessa casa, muitos anos
atrás, tinha deixado como presente a lembrança de sua estada nessa
propriedade. Essa pintura, de altíssima quotação no mercado de arte,
nada significava para o comprador, alheio As artes e que nem
pensava em morar nessa casa. S6 essa consideração da pintura
constituía os trinta por cento do preço total, pedido pelo vendedor.
A outra grande diferença era o nome da propriedade que
dava também nome a uma marca de leite de pouca produção, porém
muito prestigiada na região. Esse nome significava uns vinte por
cento da avaliação total do vendedor.
Finalmente, o comprador se ofereceu a retirar o muro com
a pintura, com todo cuidado, assegurando todos os meios, para
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 47
•e
e
•e
e
e
a
o
e
e
o
o
•
eg)
o
e
e
trasladá-la a um museu que a compraria do vendedor. Também a
marca (nome da propriedade) ficou fora da operação, pois o compra-
dor nem pensava usá-la e o vendedor tinha um vizinho interessado
nela. Assim os valores se equipararam e a venda se concretizou.
Nem sempre esses valores são tão facilmente comprova-
dos como no exemplo, mas, se numa mediação o mediador aceita
que se continue sempre discutindo sobre o mesmo ponto, sem abrir
a analisaros "porquês" de cada posição, nunca se concluirá o acordo.
Os negociadores chamam a este processo de "ampliação
do bolo", pois se abre, em análise parcial de cada parte, o objeto da
negociação, ampliando-se o todo em partes que nem sempre são
contempladas. Ao decomporem-se em partes, os interesses parciais
aparecem mais claramente e é mais fácil satisfazê-los.
Quando as fantasias dos clientes super-estimam valor,
sem razões objetivas que o sustentem, com essa análise, a fantasia
normalmente se desfaz ou encontra sua compensação em outros
valores. Por exemplo, numa divisão societária, com diferentes
apreciações sobre o valor da empresa, foi compensado, acrescen-
tando-se ao empreendimento o nome do sócio que vendia sua
participação. Com isso ele se assegurava ficar na memória da
sociedade como o iniciador do projeto.
Sejam realidades psicológicas, ou realidades avaliadas em
forma diferente, o importante é abrir à análise, acrescentar os
elementos em discussão, e não permanecer com o pacote fechado
numa discussão estéril.
A grande importância que os afetos e a personalidade dos
clientes têm nos resultados da mediação, fez com que muitos autores
tentassem classificá-los.
48 Teoria e Práticada MEDIAÇÃO
Muitos negociadores norte-americanos apontam uma série
de características de personalidade e a forma de agir com cada uma
delas para obter resultados positivos.
Esses esquemas, criados pela psicologia fenoménica, não
fazem mais do que colocar preconceitos onde deveriam existir
dúvidas, interrogações e preocupações em conhecer como é real-
mente e o que deseja esse cliente que nos consulta.
Encerrar um cliente dentro de um estereótipo psicológico
ignorá-lo como pessoa única e exclusiva.
One profissional é o mediador?
0 mediador inaugura, com seu agir, um novo tipo de
profissional. Para delinear seu perfil temos que recorrer, mais uma
vez, ao que o mediador não é.
O mediador não pode agir como o advogado, que escuta o
cliente pensando pas leis que enquadram o caso apresentado, e na
jurisprudência existente. Ainda a lei seja o limite de todos, ela é fria
demais para conter todas as particularidades dos clientes; e sua letra
é para ser interpretada segundo a ocasião. 0 cliente da mediação
deve ser ciente dela e de suas interpretações, com o.assessoramento
de seu advogado.
Outra diferença importante é que o advogado está acostu-
mado a apoiar e sustentar a posição de seu cliente, parcializando a
visão do problema. Sabemos muito bem que todo cliente parcializa
seu discurso, apoiado nas suas razões. Se ficamos nisso e apoiamos
uma parte só do problema, perderemos a outra parte da verdade. 0
mediador não pode confundir, nisso, sua função com a do advogado
Teoria e Práticada MEDIAÇÃO
•
49 •
•
1•••••••••••••••••••••••••••••••0••
e deve sempre ser imparcial e tomar em consideração a totalidade
da situação.
Também não pode agir como o psicólogo que escuta com
objetivo terapêutico. Ainda que muitas técnicas psicológicas do
mediador sejam tomadas da psicologia, sua aplicação é muito
diferente. O psicólogo investiga para conhecera passado e liberar o
paciente da sua repetição. 0 mediador investiga para conhecer os
reais interesses e não pretende exercer nenhum procedimento
terapêutico, senão didático, ao ensinar com sua intervenção, urn
modo de interrelactonar-se com a outra parte, mais benéfico _e
inteligente.
Também se diferencia do atuar do medico, que escuta os
sintomas para construir um diagnóstico. Porque, ainda que o media-
dor com sua escuta especial vá construindo um diagnóstico dos
aspectos "doentes" da negociação, não age com fins terapêuticos,
nem isola do "corpo" do problema os "órgãos" que perturbam o todo.
Devo marcar que muitas vezes, sim, é como a do médico
a função do mediador de decompor o problema em partes, para que
os clientes possam ir resolvendo-as numa ordem de _crescente
complexidade. Nesse sentido a atuação do mediador se assemelha-
ria mais à do médico chinês que toma o organismo como um todo e
descobre a origem da perda do equilíbrio desse todo, numa parte
dele, e age para restaurar esse equilíbrio. Mas, é muito importante
diferenciar que o mediador não introduz nem terapêutica, nem •
medicina. Somente questiona para que um novo equilíbrio seja
instaurado no relacionamento das partes, num planejamento de
aproximação ao problema. Equilíbrio que só os clientes conhecem e
que com total liberdade instauram se assim o desejam.
50 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
Mais uma vez, o mediador está situado numa posição
incômoda que não corresponde a nenhuma das profissões já existen-
tes, e, sim, nesta nova no Brasil, a de mediador.
O mediadordeve falar para conseguir que o cliente fale, e,
sobretudo, para que o cliente se questione. É esse outro ponto_ _
importante que o diferencia: o pensamento de que só o cliente sabe
o que é melhor para ele. Não adianta ser profissional de grande
experiência, se isso não nos conduz a investigar para chegar ao
verdadeiro conhecimento de nossos clientes.
Temos descrito como o ser humano é um ser cindido, e que
a presença do inconsciente no consciente se manifesta no próprio
discurso do cliente.
0 cliente se expressa com suas palavras e gestos.
Compreendê-lo é ouvi-lo. Ele apresenta problemas pessoais que não
devemos transportar a outros clientes. Devemos diferenciá-lo em
sua característica pessoal e única.
0 homem de que trata a mediação, não é o homem seguro
de si, coerente, senão um homem fragmentado, cheio de contradi-
. ções e de dificuldades no reconhecimento de seus desejos. E não
estou falando só do cliente que recorre à mediação por problemas
familiares, senão também dos clientes que consultam por problemas
comerciais e de qualquer outra espécie. O homenise envolve com
seus afetos, suas contradições, enfim, corn todas suas característi-
cas, em qualquer uma das suas atividades.
Pensemos num clientelue nos consulta pela dissolução de
uma sociedade. Sente seus direitos em perigo, seu sócio como seu
adversário e teme que o resultado não seja benéfico para ele. Já
discutiu o bastante com seu sócio e chegou à conclusão que a
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 51
sociedade não é mais possível, embora o capital, tempo e esforço
investidos não possam serjogados pela janela. Esse homem está tão
envolvido emocionalmente quanto um homem que tem problemas
familiares.
Eis aqui o grande trabalho do mediador:
perceber estrutural -
mente
cada homem ou mulher como únicos e exclusivos, sendo seu
-
_
discurso o único que pode dar conta dele, servindo
os esquemas da
psicopatologia exclusivamente como artifícios úteis ao estudo do
aparelho psíquico e não
A sua aplicação direta ao cliente porque
o
reduziria a esse mesmo esquema, impedindo uma verdadeira escuta
de sua individualidade.
A escalada de violência que acompanha todo litígio com-
promete o homem na sua totalidade. E os problemas que se
apresentam A mediação não são
problemas simples, porque
senão
já teriam sido resolvidos em
negociação direta entre as partes, ou
entre os advogados que as
assistem.
Se chegam A mediação é
porque precisam
de um profissional que saiba atuar frente ao
complexo da situação. Esses homems e mulheres estão tão compro-
metidos com o
problema, que precisam proteger-se dele, armando
estruturas defensivas e gerando estratégias
onde sua personalidade
e todos seus preconceitos, ilusões e temores entram em jogo.
0 homem para defender sua integridade, elabora sintomas
que aparentemente o o protegem
da angústia, mas na realidade o
confundem ainda mais.
0
discurso do cliente estará tão cheio de todos esses pre-
-
_ .
.colLceitos, ideais, ilusões e temores que o devemos desarticulqr para .
desativar os bloqueios que impedem a emergência dos reais
interesses.
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
52
É só no discurso do cliente que surge a informação, e nosso
trabalho como mediadores, é o de descobrir as possíveis vias de
'acesso aos seus reais interesses, eliminando as pedras que o próprio
:mecanismo defensivo do cliente irá botando no caminho.
Essa escuta especial apontará as portas de acesso, nas
partes do discurso onde apareçam contradições, negações desne-
cessárias, lapsus e outros equívocos ou esquecimentos que indi-
quem uma fresta por onde se possa investigar o oculto.
0 cliente está comunicando algo sem dizê-lo. Com toda a
profissionalidade o registramos para discretamente questionar sobre
esse ponto, fazendo de conta que não compreendemos totalmente.
Remarcamos essa fresta para que o cliente fale dela e deixe surgir
o oculto. É uma informação, que mediador e cliente precisam
escutar, para reconhecerem melhor quais são os desejos e inte-
resses verdadeiros que o cliente comunica ocultando.
Todo homem que sente emoções fortes, onde socialmente
se indica que não deve senti-las, é um homem armado. Armado e
protegido. Sabemos que a melhor proteção que um cliente tem é o
discurso estruturado da posição. E, lamentavelmente, também sabe-
mos que o pior para resolver problemas é enfrentarmo-nos com
clientes fechados em suas posições.
Por isso o mediador deve gerar confiança e respeito, para elo
que se acredite nele e assim conseguir que o cliente se abra com 0
franqueza, sem medo de sertraido, expondo suas fraquezas, seguro e
de que elas não serão usadas contra si mesmo. 40
0 cliente só confia quando se sente ouvido e compreen-
dido. 0 compreendemos, quando reconhecemos os fracassos dos c)
mecanismos defensivos que ele usa para se proteger e podemos ir
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 53 410
••••••••••••••••••••••••••••••••••
desarmando-os para obter o surgimento de um discurso mais ligado
ao queréalmente lhe acontece.
Enumerar-a série de mecanismos defensivos estudados
pela Psicologia sei-ia criar mais uma armadilha para o mediador,
pois, de que nos serve•conhecer esses mecanismos e deixar de
escutar o cliente para reconhecê-los no seu discurso? Estaríamos
novamente errando o caminho.
t:Jrridio_p -CM marcará o ponto onde é
necessária a nossa intervenção: sinais que o cliente vai dando;
contradições entre o discurso e os gestos; interrup_ções no discurso;
inflexões de voz; negação que afirma, etc. Com nossa atuação o
_
liberaremos dessas pressões e ele p6derá começar a falar, mais
livremente, do que lhe está acontecendo.
Essa é a razão do uso das entrevistas a sós com cada uma
das partes (caucus)), com o compromisso de absoluto sigilo, pois,
uma vez colbcado o problema, o que queremos é investigar a fundo
com cada uma delas o verdadeiro interesse. A sós com o mediador,
o cliente poderá expressar-se mais à vontade.
Porque o mediador deve ter bem claro que a mulher ou o
homem que o consulta está envolvido numa série de compromissos
consigo e com o seu ideal, pelos quais o.conflito.que o traz tem para
ele um significado muito mais amplo. Significa sua autoestima, o
. . _
carinho e respeito de sua família e de seus colegas de seus
. _
superiores. e o_reçonhe5imento de que esta agindo A altura das
_
circunstancias. Tudo isto deixa-o confuso e incapacitado para com-..
preender o que realmente deseja e que resultado será o melhor.
Todas estas dificuldades para decidir contribuíram para
que a sociedade, durante tanto tempo, precisasse depositar num
terceiro a responsabilidade de decidirsobre seus próprios problemas,
pois, deixarque um terceiro decide por nós, nos libera da responsabili-, :•-
dade e da angustia da decisão.
0 mundo tem passado por grandes mudanças e ainda
continua.
Essas mudanças também se produzem no plano indivi-
dual, e a aparição da mediação como uma nova forma de solucionar
nossos conflitos interperssoais 6,* sem dúvida, um claro indício.
Nós, mediadores, temos a responsabilidade de conduzir
essa mudança e devemos fazê-lo com cuidado e dedicação. Não
podemos errar em nosso trabalho como mediadores, com o risco de
abortar uma das mais brilhantes técnicas que muito pode ajudar
sociedade.
Se o cliente que consulta é um homem ou uma mulher
fragmentado e inseguro de si, o mediadortambém o 6, e por isso deve
ser consciente dessa condição e cuidar pare que, no exercício de sua
atividade evite, tanto quanto possível, os efeitos prejudiciais de um
comportamento ou atividades inadequados.
Estamos determinados, clientes e mediadores, porprecon-
ceitos pessoais, familiares e sociais que nos levam a simpatizar com
uma pessoa mais que com outra, acreditar mais em Lima pessoa que
em outra. 0 mediador deve estar alerta não só aos mecanismos:
defensivcs dos clientes, senão aos própriós. Enquanto escuta deve_ . _ _
também questionar-se sobre o cfue está sentincio_e pepsando,_pa,ra
dominar esses pensamept6s. clientes. a_carninh65
e soluções que são os do mediador e não os dos clientes.
54 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 55
e
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e
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e
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o
G
o
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o
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e
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o
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o
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Capítulo 4.
A INTER-RELAÇÃO ENTRE
MEDIADOR E CLIENTE.
JA temos abordado as técnicas que devem ser usadas para
guiar os clientes a reconhecerem seus interesses e a . poderem
discutir, para chegarem a possíveis acordos onde esses interesses
sejam respeitados. Mas há uma especial informação que recebemos
dos clientes e que não procede diretamente de seus discursos, nem
de seus gestos ou contradições e, ao mesmo tempo, está contida em
tudo isso. Normalmente chamamos de "intuição" ou de "experiência
profissional" essa. idéia ou apreciação spbre p_cliente, que nos
aparece como uma ocorrência, e que, bem usada, nos serve muito
no progresso ou avanço da mediação. Até, às vezes, é salvadora, nos
momentos de estancamento do processo de mediação.
É importante que nos aproximemos a uma explicação mais
cientifica dessa "intuição", para que possamos usá-la com mais
seletividade e critério. Para isso os conceitos transferência e
contratransferência são os que melhor explicam este mecanisaa. .
Em psicanálise, chama-se transfefaizasz¡et.cisrlaaa.
sias idéias que ocorrem no paciente, durante o trabalho terapêutico,
a respeito da fipura do terapeuta Ele passa a ser investido com os
atributos de um olajeldniejjor e anterior do paciente, com quem teve
um modo relacional, real ou imaginário, que o paciente, inconsciente-
mente, quer repetir.
Essa transferência tem como 'aspecto positivo a possibili-
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
57
8
I••••••••••••••••••••••••••••••••••
dade de se apresentar para ser analisada e deixar o paciente livre
dessa repetição compulsiva. Mas ao perder-se, com sua aparição, a
dimensão de trabalho terapêutico, transforma-se em negativa ao
opor resistência a esse trabalho.
Em clientes enfraquecidos psiquicamente, por estarem
atravessando um conflito, podem apresentar-se situações transferen-
ciais sobre o mediador. Estas situações se delatam quando o cliente
expressa, com atitudes ou comentários, uma imagem do mediador,
alheia ao seu comportamento e personalidade reais.
É fundamental Clue o mediador, na primeira etapa, -se
•
apresente, assegurando aos clientes confiabilidade e neutralidade,
assim como o suficiente profissionalismo para que os clientes
possam trabalhar certos de sua eficácia. Quando o cliente expressa
ao mediador sua satisfação exageradamente, porsentir-se protegido
ou cuidado por ele, com respeito ao outro em litígio, pode estar
significando uma transferência que o mediador deve saber neutrali-
zar através de frases de apoio a que se sinta compreendido e frases
de limite, ao reiterar-lhes que as diias partes serão assistidas por ele,
por igual.
Os clientes intentarão, acostumados ao modelo de litígio,
onde cada um deve convencera um terceiro que decide (juiz), de sua
verdade, "comprar/conquistar" ao mediador par a . que o favoreça. ,::-
Esta atitude tanto pode ser através do intento de sedução como de ::-.-
comovê-lo, mostrando-se vítima, coitada, que precisa de socorro.
Outras vezes tomam atitudes mais agressivas através de ameaças -
de abandonar a mediação, tentando ferir o orgulho profissional do
mediador, ou com a direta ameaça de desprestigiá-lo, corn uma
alusão aos comentários negativos que de seu trabalho seriam feitos,
58 Teoria e Práticada MEDIAÇÃO
caso o mediador não os "favoreça" .
Todas estas atitudes, muito alheias da situação de media-
ção e do papel de neutralidade do profissional mediador, são
expressões de uma transferência, em que se procura fazer com que
ele atue como uma figura forte, paternal ou maternalmente, prote-
gendo, amparando, e ate reivindicativamente, fazendo "justiça"
maneira do héroi salvador.
Outra maneira de possível transferencia se manifesta
através de atitudes de desconfiança e de ceticismo. O mediadordeve
ter especial cuidado com essas expressões e neutralizá-las, porque
elas podem conter reais dúvidas com respeito ao profissional, assim
como desejos inconscientes do cliente de procurar "apanhar/ser
castigado" e chegar a acordos onde seja danificado, para continuar
mantendo compulsivamente a sua idéia de que todos querem
prejudicá-lo, imaginando-se sempre vitimado.
Todas essas atitudes devem ser neutralizadas através da
necessária repetição das regras da mediação: que são os clientes
que devem descobrir, defender e harmonizarseus interesses corn os
da outra parte.
mediadordeve ser um terceiro neutral que, fundamental-_ .
mente estejá tercerizando 12, introduzindo continuamente, o modo de
interrelação que deve existir, entre seus cliente, de respeito, _de
expressão e de escuta, e de harmonização dos interesses de ambos,
por isso que aigumas vezes .o mediador intervém, reforçando a
12 Quando falamos de tercerizar, é assumindo que o modo de inter-relaciona-
mento de duas pessoas é tercerizado pela relação em si. 0 matrimônio é a tercerizaclo
de um casal. Os modos em que dois comerciantes tern levado seu relacionamento
comercial os terceriza. 0 mediador com seu agir introduzentieziEftenentes uma nova
tercenzarao, a de respeito e mútua compreensão.
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 59
000di•••00•9000040000@s300000000000
defesa dos interesses de um dos clientes, sempre através de
perguntas, direcionadas a obter o incremento de uma oposição
enfraquecida ou a abertura de uma posição estruturada e autoritária
demais.
0 maior cuidado que o mediador deve ter na sua interven-
ção é analisar se a mesma está guiada, por exemplo, por uma real
falta de luta de uma das partes em defesa dos seus interesses, ou por
questões pessoais do próprio mediador, que se tem comprometido,
inconscientemente, com a defesa de um dos clientes em detrimento
do outro.
Eis aqui, que o mediador deve cuidar especialmente da sua
contratransfèrencia. Assim chamada, em psicanálise, os pensa-
mentos e sentimentos ocorridos no terapeuta, durante o trabalho
terapêutico. A contratransferéncia tem seus aspectos negativos e
positivos e sempre deve ser conhecida e neutralizada pelo terapeuta.
Seu aspeto negativo é que o mesmo profissional confunde
seu papel terapêutico, num intento inconsciente, de reiterarsituações
não resolvidas da sua história pessoal, passando a envolver-se numa
trama ou representação cênica, onde os papeis de paciente e
terapeuta se diluem numa "re-apresentação" de outro relacionamen-
to entre outros personagens.
Seja porque caia vítima da sedução de um dos pacientes
ou por caraterísticas próprias, uma confusão dessas assegura o
fracasso da terapia.
Ao mesmo tempo a análise dos pensamentos, sentimentos
e associações em geral, que aparecem no terapeuta durante o
trabalho com um paciente pode ser de grande utilidade, ao permitir-
lhe compreender processos psíquicos do paciente, não expressados
60 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
no discurso, mas contidos nele.
No mediador sempre surgem sentimentos e pensamentos
no transcurso da mediação, referentes aos seus clientes. Elesdevem
ser bem conhecidos pelo mediadorpara diferenciar os originados por
seus preconceitos e associações psíquicas pessoais, que limitarão
seu trabalho, daqueles que contribuirão com luz na compreensão de
seus clientes e que, explicitados, podem ajudá-lo, e muito, no
processo de mediação.
Podemos deduzirque a transferência na mediação sempre
negativa e deve ser neutralizada corn a reafirmação da terceriza-
cão estrutural que o mesmo trabalho de mediação impõe. Não estou
falando do bom "raport" necessário entre clientes e profissional, mas
do intento de confundir o mediador com outra figura.
Não sucede o mesmo com a contratransferência, que pode
ser enormemente negativa quando se origina das limitações psíqui-
cas do mediador ou de grande ajuda, quando vem em nosso socorro
contribuindo com novas informações sobre nossos clientes.
O profissional mediador tem que ter o necessário auto-
conhecimento para diferenciar, rapidamente, se o que Hie ocorre,
com relação a seus clientes, está limitando-o na compreensão do
problema ou está lhe trazendo conhecimentos importantes sobre
eles.
Igualmente, toda informação que apareça, contratransferen-
cialmente, no mediador, deve .este, apresentá-la a seus clientes
como investigação e questionamento, nunca como afirmação, pois,
o importante é que os próprios clientes cheguem A descoberta dessa
informação e A sua confirmação, e não que a recebam como um
dogma emanado do mediador.
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 61
•
•
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Vejamos um exemplo para ilustrar a contratransferência.
Um casal se apresenta à mediação para resolver seu
divórcio. Ele se apresenta bem vestido, como um executivo, que era,
com pele bronzeada e atitudes sérias e firmes. Ela, usando roupas
muito simples, embora de muito boa qualidade, expressando-se com
termos cultos e falando pausadamente, apresentava-se como quem
insistia na separação e aceitava qualquer condição que ele impuses-
se.
Comecei a sentir, cada vez que ela falava, muita pena por
ela e, ao mesmo tempo, nenhum desejo dê ajudá-la, junto de uma
insistente desconfiança na veracidade da sua posição. Ao refletir
sobre isso e estar certo de que não se originava de nenhum
preconceito ou especial inclinação psíquica minha, concluí que era
importante investigar se esses pensamentos e sensações que eu
tinha correspondiam a uma modalidade especial de relacionar-se da
mulher. Num momento em que ela repetiu sua frase preferida: "que
ele decida", aproveitei para perguntar-lhe, se ela habitualmente
despertava sentimentos de compaixão entre seus amigos. Imedia-
tamente ela deixou de falar, ficando numa atitude reflexiva, enquanto
ele, deixando a sua postura rígida, relaxou-se e começou a falar de
como todos os amigos deles estavam sempre tomando partido por
ela, tentando protegê-la, enquanto ele era acusado de ser quem
dominava a situação toda e abusava disso. Com voz emocionada,
ele confessou que, na realidade, quando estavam a sós, ela pro-
gramava como deviam ser todas as coisas e que ele só se apre-
sentava como o porta-voz dessas decisões, que ela não assumia,
mas dizia aceitar. Ela reagiu, levantando a cabeça, e com olhos
brilhantes, sorriu e explicou que considerava ser o homem quem
devia assumir as decisões e apontar os objetivos de um casal e que,
como seu marido era fraco e indeciso, ela teve que assumir esse
papel, com o cuidado para que ninguém o percebesse, para, segundo
ela, cuidar da imagem masculina de seu marido.
Eu os fiz compreenderem que essa simulação não era mais
necessária e que, desde aquele momento em diante deviam ser os
dois como realmente eram, já que suas vidas começariam a ser
individuais e a cada um deles corresponderia dirigi-la de forma
pessoal.
A mediação era o melhor espaço para começar a se
mostrarem e assumirem a reflexão e decisão da separação em
conjunto, mas como duas individualidades.
Desde aquele momento ela começaria cada tema dizendo
como deveria ser resolvido e ele, sem pressões, começou a divergir
com muito critério. Ao início ela surpreendeu-se da capacidade dele de
pensar e de dissentir, e de confessar que não o tinha antes feito para
não gerardiscussões que podiam Fê-los levado à ruptura, mas, agora,
que a decisão de separação tinha sido tomada e que o jogo tinha sido
descoberto, ele sentía-se livre para dizer o que pensava e desejava.
Como se vê neste exemplo, é fundamental que o mediador
se questione sobre os pensamentos e as emoções relativas a seus
clientes, que lhe aparecem, para conduzir com sucésso a mediação.
Esse uso da contratransferência deve ser exercitado conti-
nuamente, pois será a experiência que assegurará ao mediador a
eficácia de seu uso.
Faz-se necessário reiterar o alerta sobre os aspetos nega-
tivos da contratransferência, quando se origiha em limitações psíqui-
cas do mediador.
62 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Práticada MEDIAÇÃO 63
000000000ir00000000eDO1000•
- Muitos mediadores tentam assumir um papel rígido com
seus clientes, pretendendo que a distância operativa profissional
possa protegê-los de interferir negativamente na mediação.
Considero que a pouca experiência inicial deve guiar um
mediador a ser muito cauteloso e formal, mas, na medida em que
possa adquirir confiança, é fundamental que extraia informação da
contratransferência para enriquecer seu trabalho, fazendo-o mais
criativo e aprofundar-se na condução de seus clientes na busca de
soluções mais realistas e portanto, mais duradouras.
0 conhecimento de todos os pensamentos e emoções é
fundamentaI.Se o mediador não possui a técnica para utilizá-los, deve
então neutralizá-los para que não incidam em demasia no seu trabalho.
Todos estamos envolvidos em tramas de preconceitos e
prejulgamentos conscientes e inconscientes. Os que operam, limi-
tando-nos enormemente, são os esquemas inconscientes que fomos
incorporando ao longo de nossa vida e que, sem conhecê-los, guiam
nossas ações, pensamentos e sentimentos.
É habitual entre os advogados dizer-se que tal ou qual juiz,
a cargo de uma causa, tem inclinações favoráveis ou contrárias ao
caso que conduzem. Também escutamos isso de todos os profis-
sionais que têm predisposição a atuar e reagir de determinada
maneira, em alguns casos, de forma muito previsível.
O mediadortem a obrigação de conhecer suas tendências
melhor do que ninguém, porque deve guiar aos outros a liberarem-
se de preconceitos e a encontrarem caminhos criativos para solu-
cionarem seus conflitos.
Compreendidos e aplicados, esses conceitos dão
estruturalmente ao mediadoros meios para cumprirmelhorsua missão.
64
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
Capítulo 5.
A MEDIAÇÃO
•-• •
0 procedimento da mediação deve ser flexível, contem-
plando as necessidades e os tempos necessários dos clientes para
interrelacionar-se e poder, finalmente, chegar ou não a um acordo._
Podemos saber como começar (semelhante A partida de
xadrez), mas nunca como continuará, nem muito menos como
culminará. Cada cliente é um mundo especial e, segundo isso, o
mediador tomará tal ou qual caminho dentro das regras de não-.,
impósição e imparcialidade.
Como a mediação deve ficar liberada de rituais e de
demarcações excessivas, somente indicar-se-ão estruturas (unida-
des de tempo e objetivo) ou passos possíveis. Com plena conciência
de que em muitas mediações se pularão etapas e em outras nos
deteremos, e ate, em muitos casos, voltaremos a etapas já ultrapas-
sadas.
Sem serfundamental, é importante o meio ou local onde se
desenvolverá a_medipção.. Dependendo do tipo de mediação, o
importante é que seja num ambiente confortável. Muitos mediadores
Impõem a mesa redonda sem lugares predeterminados, o que até
permite ao mediador ver se as partes se sentam próximas ou muito
separadas; se deixam um espaço para o mediador entre elas ou n5o.
Outros mediadores1 3 preferem poltronas e cadeiras espalhadas pela
1994.
13 Lulz Fernando Gevaerd, Mediaçào de Conflitos. Cima, Rio de Janeiro,
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 65
••••••••••••••••••••••••••••••••••
sala, sem aparentemente muito ordem, para que os clientes esco-
lham a que seja mais confortável para eles. Este sistema é mais
propício para mediações familiares, mas realmente pode ser aplica-
do de modo geral.
O importante é que não existam mesas ou poltronas que
signifiquem oposição ou diferenciação de poderes, nem locais muito
rígidos que não favoreçam a espontaneidade e a descontração.
Muitos mediadores, atuando em função social, são solici-
tados para mediar em centros comunitários, sedes de clubes e até
em empresas sem nenhum preparo especial." 0 mediador deve
tomar em consideração o ambiente, mas é ele quem deve criar o
clima propício. Ou seja, em síntese, o mediador pode realizar a
mediação em qualquer âmbito onde as partes possam sentar-se
(estar confortáveis) e falar sem temores".
O início. Alzuém quer tentar solucionar
seu problema com a mediação.
Hoje em dia, quando no Brasil, a mediação ainda não tem
uma divulgação tão importante, são os advogados que aconselham
seus clientes recorrerem a um mediador para dar uma solução
satisfatória a seus conflitos.
Em outros países do mundo, onde já tem se espalhado esta
técnica de solução de conflitos, podem ser os clientes mesmo que
procurem diretamente um mediador por referências de conhecidos
"Andrew Floyer Acland. C6mo utilizar la Mediaci6n para resolver Conflictos
en las organizaciones. Paidós, Buenos Aires, 1993.
IS Em nosso serviço de mediação na Defensoria Pública do Paraná, media-
mos numa sala de aulas, o que também possibilita que os estagiários assistam como
ouvintes.
66 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
ou de outros' profissionais. Mas sempre assessorados por um advo-
gado.
Em países onde a mediação já é obrigatória e forma parte
da seqüência antes de chegar ao juízo, muitos clientes assessorados
pelos seus advogados preferem recorrer a mediadores privados,
antes de correr o risco de, por turno ou sorteio, ter a obrigatoriedade
de aceitar um profissional que pode não lhes agradar.
Considera-se fundamental que um cliente consulte um
advogado antes de recorrer a qualquer técnica para solucionar seu
conflito, pois ele é quem esta especialmente treinado para informar
se a mediação éo melhorcaminho para esse problema em particular.
Além disso, o advogado vai fornecer um importante critério de
realidade, a lei e a jurisprudência nas quais o juiz se basearia para
ditar sua decisão.
Os critérios que advogados e clientes devem tornar em
consideração para escolher a mediação são os seguintes:
eosição e direitos, de ambas as partes, equilibrados.
Necessidade de siqi10. e celeridade na solução do con-
flito.
Desejosie mantel., aprimorar ou, ao menos, não deterio-
rar9 relacionamento. .
Compromisso afetivo muito .importante corn o proble:
ma, a ser resolvido num clima que contenha e canalize
essas emoções.
Que não envolva ou trate delito.
Podemos dizer que a maioria dos conflitos apresentados a
um advogado cumprem com um ou mais desses requisitos.
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 67
0004060••
6000000000000000001.0•011)0•
Nos países onde a mediação vem funcionando há muito
tempo, uma porcentagem superiora setenta porcento dos casos, que
antes, recorriam à justiça, são resolvidos pela mediação.
Nesses países já se incluem nas cláusulas contratuais de
muitos convênios, a obrigatoriedade de recorrer à mediação, em
caso de não cumprimento ou problemas no cumprimento do contrato.
Assim, muitas empresas preservam o sigilo, cuidam do relaciona-
mento com outras empresas, poupando tempo e. dinheiro. Além
disso, a inclusão da obrigatoriedade da mediação nos contratos de
trabalho fornece, à empresa e funcionário, a certeza de serem
escutados e atendidos nos seus problemas.
A mediação é um procedimento e, como tal, se constitui de
uma seqüência de atos em uma certa direção. Embora não seja um
procedimento inflexível, ela se faz cobrindo, em geral, seis etapas.
•
Etapa Primeira. A apresentação do mediador
e das regras da mediação.
0 mediador é um profissional que cobra por hora trabalha.-
. da, isso faz com que as regras sejam impostas antes de qualquer
outra coisa para que os clientes, cientes de seu funcionamento, não
percam tempo tentando repetir modos já conhecidos por eles das
técnicas adversariais. Em resumo não percam tempo em brigas
estéreis.
Muitos .mediadores exigem a entrega prévia à primeira
entrevista, de um relatório contendo os fatos maisimporiantes_do
problema em discussão Pessoalmente acho muito importante que
o primeiro contato com o problema seja escutado diretamente da
68
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
boca dos clientes 16. É por isso que aponto a primeira etapa como a
apresentação do mediador e das técnicas da mediação, embora
outros autores a nomeiem em segundo- lugar.
É fundamental que a apresentação seja breve e clara, pois
os clientes estão ansiosos por começar a falar de seus problemas.
Mas, repito, a apresentação não pode ser adiada, pois é o momento
de expor regras que os clientes normalmente não conhecem e
deverão conhecer desde o primeiro instante.
0 mediador deve agradecer -A presença dos clientes e
ressaltar o positivo de terem escolhido esse meio pacífico para tratar
seus problemas. Um breve resumo dos_antececlentes pessoais do. _ _
mediador pode ser útil se os clientes, nos telefonemas que fizeram
para marcar entrevista, manifestaram seu interesse na pessoa do
mediador alguma dúvida.
É muito importante conhecer.a origem exata dos. plientes,
oprieio pelo qual entraram em contato.conosco,_e ate as palavras que
usaram para pedir uma entrevista. Por isso deve-se treinar a secre-
tária para que registre as perguntas e saiba o que responder em cada
caso. Uma boa introdução telefônica poupa tempo e malentendidos.
Muitos mediadores assumem pessoalmente a marcação da primeira
entrevista para estarem certos da informação a ser ministrada. Isso
tem o inconveniente de parcializar o primeiro contato com uma só
parte, epode ser entendida pela outra parte como sendo o mediador
um profissional do oponente. Difei:ente é o caso de um procura para
16 A necessidade de estar bem Informado antes da primeira sessão de
mediação, passa a ser necesárla quando o problema a discutir tem muitos antecedentes,
comci nos problemas entre paises. (Caso Rio de la Plata, ou Israel-Palses Árabes)
Também quando o problema é tão técnico que contém muitos estudos e informes de
peritos.
Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 69
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Teoria Mediação 40

  • 1. Teoria e prática da. _ J.t Juan Carlos Vezzulla Com a colaboração de: Angelo Volpi Neto . José Ribamar G. Ferreira Af" Augusta de O. Volpi Prólogo de: Zulenta Wilde • 0 riINSTO DE MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO A Mediação é a mais bem sucedida técnica de solução de conflitos, pois corn ela as pessoas mantêm todo o controle do . processo, não dependendo de laudos ou sentenças que nem sempre satisfazem os interesses de ambas as partes. mediador é um profissional com uma atuação muito especial, pois sem decidir, deve ajudar as partes a inter-relacionarem-se e acharem o melhor caminho para resolverem seus conflitos satisfatoriantente. Este livro traz o susténto teórico das técnicas de mediação, assim como sua aplicação prática, e funda- mentalmente ensina do mediador como descobrir os verdadeiros interesses dos clientes envolvidos no litígio. H • • MISTMITO DE MEDIAÇÂO INSTITUTO DE MEDIAÇÃO Instituto de Mediação, associação sem fins lucrativos, pretende com a impressão deste livro continu- ar cum o cumpatenta dos seus objetivos: divulgar a Mediação e formar 116diadores no Brasil. Nascido em•'t'uritiba, Paraná, o Instituto de Mediação, na sua tarefa de difusão nacional da Mediação, vem promovendo seminários, palestras, cursos e agora, com esta publicação, seguramente enriquecerá o conhe- cimento desta técnica usada no mundo todo. Instituto de Mediação forma parte da Interamerican Mediation Association.
  • 2. •000001®600•0000•• Índice Prólogo - Zulema Wilde 7 Prefácio - Angelo Volpi Neto 11 Introdução 14 Capitulo 1: Das Noções Gerais do Conflito 17 Conflito Inter/Pessoal 17 Os Conflitos Intrapsiquicos 20 fr"? . Conflitos reefs e falsos 24 A Comunicação 24 Escutar, sempre escutar 26 Capítulo 2: Do Cliente 29 A posição, encobrindo os interesses 31 Luta entre pessoas ou discussões sobre problemas 35 Qual é o cliente da Mediação 38 As emoções dos clientes 39 Capítulo 3: 0 Mediador 43 0 que é ser Mediador 43 As técnicas do Mediador 45 Que profissional é o Mediador? 49 Capitulo 4: A inter-relação entre Mediador e cliente 57 Capítulo 5: A Mediação 65 O inicio. Alguém quer tentar solucionar seu problema corn a Mediação 66 A, Etapa Primeira. A -apresentação do Mediador a das regras de Mediação 68 Etapa Segunda. Os clientes expõem o problema 72 (1--) - Etapa Terceira. 0 resumo e o primeiro ordenamento dos problemas 74 Etapa Quarta. A descoberta dos interesses ainda ocultos 75 Etapa Quinta. Gerar idéias para resolver os problemas. Os acordos parciais 78 Etapa Sexta. Acordo Final 80 A Mediação e o •Notariado - Angelo Volpi Neto 83 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 5 4? e e e e • • • e
  • 3. PRÓLOGO ZULEMA WILDE No quisiera que este libro emprendiera au primer viaje por el mundo, sin conteneren su comienzo una expresión de aliento para sus autores. Los conflictos son inevitables en esta vida y admitir que los métodos usuales de resolución han sido en general inadecuados, costosos y hasta algunas veces destructivos -, ya representa un avance. Pensar en el Conflict° con un espíritu distinto, sin poner la decisión en manos de °tit, tomando el podersobre la propia vida, es decir sobre su curso, utilizando nuestra capacidad para eito. Ser "arquitecto del propio destino", como decla Amado Nervo. Asimismo, es ejercer el derecho de reconocerse diferentes, lo que constituye otro valor importante en el mundo que nos rodea. El fruto del esfurzo comienza a degustarse, no s6lo por la enorme satisfacción personal de haber sido la sembradora de inquietudes en estos espíritus perrneables que son el autor y sus colaboradores, -semillas que han germinado rápida y robustamente, prueba de eito, este libro-, sino por el ímpetu dado al estudio y difusián del proceso de la mediación que se hace a través de esta obra. Ella ayuda a que la mediación se constituya en un instru- mento eficaz de paz para todos los que la comiencen a utilizar, alentados por su lectura. Buenosería que posteriormente los lectores la incorporaran como bagaje de experiencia, para aplicaria ante otro contratiempo futuro. • • • • Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 7
  • 4. • PRÓLOGO • e ZULEMA WILDE Não gostaria que este livro empreendesse sua primeira viagem pelo mundo, sem conter no seu início uma expressão de estímulo [Sara seus autores. Os conflitos são inevitáveis nesta vida e admitir que os métodos usuais de resolução têm sido em geral inadequados, de alto custo e até, muitas vezes, destrutivos, representa já um avanço. Pensar no conflito com espírito diferente, sem botar a decisão nas mãos de outro, tomando o poder sobre a própria vida, é decidir seu curso, usando nossa capacidade para isso. Ser "arquiteto do próprio destino", como dizia Amado Nervo. Ao mesmo tempo é exercer o direito de se reconhecer diferente, o que constitui outro valor importante no mundo que nos rod eia. O fruto do esforço começa a ser degustado, não só pela enorme satisfação pessoal de haversido a semeadora de inquietudes nestes espíritos permeáveis que são o autor e seus colaboradores, - sementés que têm germinado rápida e robustamente prova disso, este livro senão pelo ímpeto dado ao estudo e difusão do processo da mediação que se faz através desta obra. Ela ajuda que a mediação se constitua num instrumento eficiente de paz para todos os que comecem a utilizá-la, alentados por sua leitura. Seria bom que posteriormente os leitores a incorporassem como bagagem de experiência, para aplicá-la num outro contratem- po futuro. Teoria e Práticada MEDIAÇÃO 9 ZULEMA WILDE Amagazin Finalmente, es mi deseo que este esfuerzo también ayude al cambio del estilo de vida de esta comunidad en esta materia. 8 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO o o e e o o o o o e o o e e • o e • • e
  • 5. • • • Finalmente, é meu desejo que este esforço ajude também 11/ mudança do estilo de vida desta comunidade, nesta matéria. PREFÁCIO ANGELO VOLPI NETO • À medida que comecei a tomar contato com a mediação e entendê-la, não pude acreditar que tal técnica fosse tão desconhe- cida no Brasil, aí me incluindo. No começo, demorei a entender o que era, e hoje por experiência, sei da dificuldade de explicar sobre esse tema a qualquer pessoa. 0 motivo, a meu ver, decorre do fato de tratar-se de algo realmente desconhecido da nossa cultura, somando - se a um natural bloqueio ou preconceito. Invariavelmente, quando falamos de mediação temos que desfazer confusões com a arbitragem, pois poucos entendem como Harvard. • Há ainda os céticos que acham que a mediação é "ficção • científica, ou coisa do outro mundo e que não funciona no Brasil. • 411 Pois bem, este livro têm a intenção de esclarecer e ensinar a mediação, Aqueles que se dispuserem a lê-lo e interessar aos que tenham a mente aberta para seu valor. Foi o que aconteceu comigo quando .a conheci, vislumbrei um horizonte inexplorado, uma atividade nobre e gratificante, um • • 10. Teoria e Práticada MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 11 pode um conflito ser resolvido por uma terceira pessoa, sem que essa • dê sua sentença. Junto ao notariado, sinto que muitos estão acostu- mados a paziguar conflitos em seus ofícios e por isso acham que não • há novidade alguma. Na verdade há uma distância bem grande entre • "conciliação" e um conjunto de técnicas de mediação, desenvolvidas • cientificamente durante anos, notadamente na Universidade de •
  • 6. poderoso instrumento de paz social. Uma resposta à crescente . agressividade em nossa sociedade, aos métodos tradicionais e carcomidos de solução de conflitos; uma saída honrosa para os notários; uma luz para os advogados, e a única solução para a justiça. Quanto à justiça, por mais que a agilizemos, por mais esforço que possamos fazer, aumentando o número de magistrados, informatizando-a, jamais daremos resposta aos anseios cia popula- ção, enquanto tivermos que resolver todos nossos conflitos de forma judicial. Para os advogados que, perante a opinião pública levam parte da culpa da morosidade da justiça, quando eles mesmos são os mais prejudicados, na mediação encontra-se a possibilidade imedia- ta de, em muitos casos, oferecer uma resposta rápida aos problemas de seus clientes. Ao notário, notadamente em nosso país que vem sofrendo continuamente um desprestígio profissional, uma diminuição de seu rol de atividades, pode ser o início da curva ascendente, justo no momento importante em que tem sua atividade, finalmente, regula- mentada por lei federal. As experiências vividas em vários países comprovam a eficiência dessa técnica. A mediação é tão antiga quanto o próprio conflito. Na cultura oriental é desde muitos séculos o método preferido para resolver controvérsias. O Japão é um dos países que possui o menor número de juízes por habitante, e a China possui mais de um milhão de pessoas treinadas como mediadores. Nos E.U.A., nos idos dos anos setenta, como um esforço Inovador para aliviar o sistema de Cortes, o Departamento de Justiça implantou pianos pilotos de mediação em três cidades americanas: Atlanta, Kansas e Los Angeles. Em 1980 o Congresso desse país sentenciou textualmente: "que a inadequação dos mecanismos de solução de controvérsias nos Estados Unidos era contrária ao bem estar geral de seu povo". E comprovando o êxito da experiência, a estendeu a todo o país. Em conseqüência, seu estudo desenvolveu-se em várias universidades, com novas técnicas, sendo hoje parte do curso de Direito das mais renomadas, tais como Harvard, Oxford e Yale. Hoje, nos EUA a mediação é vista como uma filosofia de vida. Nas escolas primárias, os alunos são treinados para que resolvam seus conflitos entre sí mesmos. Acredita-se que dessa forma a sociedade tornar-se- á menos violenta e mais interativa. 1 2 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 13
  • 7. demonstrando, no mundo, sua grande eficiência em todos os confli- tos não criminais, pois, com ela, são as próprias partes que acham as soluções. 0 mediador somente as ajuda a procurá-las, introduzindo, com suas técnicas, os critérios e os raciocínios que lhes permitirão um entendimento melhor. • A mediação é uma técnica de resolução de conflitos, não' adversarial, que sem imposições de sentenças ou de laudos, e, corn um profissional devidamente formado, auxilia as partes a acharem seus verdadeiros interesses e a preservá-los num acordo criativo/_ onde as duas partes ganhem. Ao contrário de um judiciário sobrecarregado e demorado, a mediação propõe, em breve tempo, com baixos custos eprocuran- do manter o bom relacionamento entre as partes, construir as soluções que mais as beneficiem. Todas as questões comerciais, . - cíveis, trabalhistas e familiares podem ser submetidas A—rn—ediação. Com o uso da mediação o cidadão recupera sua indepen- dência e o controle de sua vida pessoal, social e produtiva, num convívio mais racional, adulto e pacífico, trazendo a necessária liberdade e paz social que todos merecemos. A mediação respeita o sigilo e a intimidade das partes,_ ajudando-as a solucionar seus conflitos num clima em que se preservam os laços fundamentais. A divulgação das técnicas ciq mediação ajudará a mudar a sociedade que poderá assumir completamente o controle da própria vida, transformando-a numa sociedade capacitada para gerar rique- za e elevar, assim, o nível cultural e sócio econômico de seus membros, pois o homem, conhecedor de seus problemas, é o único capacitado para solucioná-los. Teoria e Práticada MEDIAÇÃO 15 •••••••••••••••••••••••••••••••••• INTRODUÇÃO Juan Carlos Vezzulla Assistimos às mudanças político-sociais mais importantes dos últimos tempos. Muitas delas relacionadas ao uso da negociação e da mediação, marcando a importância destas técnicas no desen- volvimento das sociedades modernas. Citemos algumas. A paz, ainda parcial no Oriente Médio alcançada com a negociação direta ou assistida. A organização social do sudeste asiático, baseada na mediação, permitiu-lhe alcançar a eficiência que converteu a região em um novo centro de poder econômico mundial. A união regional dos países que demonstra a negociação poder mais que as guerras por fronteiras. Esses fatos evidenciam que o uso da negociação e da mediação estão conseguindo objetivos, jamais esperados antes. No plano social, os povos não desejam mais governos de quaisquerideologias que regulamentem excessivamente a atividade social e comercial dos habitantes: querem assumir as respon- sabilidades de seus próprios atos, com o direito de, se organizarem segundo suas próprias regras. Nascida da necessidade de obter novos modos de inter- relação, a mediação surge como resposta a essa necessidade de não querermos mais que decidam por nós, pois estamos preparados para sermos criativos e procurarmos as nossas próprias soluções para nossos problemas. A mediação é a técnica de solução de conflitos que vem 14 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
  • 8. o o 0 o O Instituto de Mediação foi criado como uma organização sem fins lucrativos para divulgar a mediação e formar mediadores. Este livro tem como objetivo cumprir com os fins do Instituto de Mediação e servir como complemento aos interessados em former- se como mediadores, assim como de introdução para aqueles que desejem conhecer os princípios dessa técnica. Está em nossas mãos a mudança da organização social, pois, pare aplicarmos a mediacão, não dependemos de qualquer lei _ - ou regulamentacão oficial, mas tão somente do nosso empenho. Se queremos ser fortes e competitivos devemos ensinar, elevar nosso nível profissional e estar preparados para exercer a liberdade de•nos organizar a fim de resolver nossos próprios conflitos com essas técnicas. 16 Teoria e Prillica da MEDIAÇÃO Capítulo I. DAS NOÇÕES GERAIS DO CONFLITO EIREatmailitIESSIEMEL.am Conflito in Sendo a mediação uma forma de solução de conflitos vamos, inicialmente conceituar e classificar os conflitos, para a partir dai ingressarmos no estudo dos elementos e procedimentos da mediação. Quando se fala de conflito, aparece, de forma geral, em todas as pessoas, uma idéia negativa e assustadora: um claro alerta de perigo próximo, do.qual têm que se defender. O homem, como, todos os seres vivos, procura preservar sua integridade e ela está, de maneira geral, associada ao equilíbrio alcançadd..Esse equilíbrio, 'como se verá mais adiante, está relacio- nado com 'a integridade psicofísica, e inclui todas as "posses" ( os bens materiais possuídos ). Esse "statu quo", ao qual nos aferramos como a uma tabua de salvação, vê-se em perigo quando a proxi- midade de urn Conflito nos. ameaça.. O conflito tem sido estudado por diferentes ciências e técnicas do conhecimento humano. Toda a estratégia militar está baseada nos conflitos reais e potenciais entre países ou regiões. 0 comércio - internacional baseia-se em interesses confrontados que podem gerar 'conflitos è ditar regras especiais entre mercados diversos. A sociologia, assim como a História, estuda com atenção Teoria ePráticadaMEDIAÇÃO 17 o e e • e e
  • 9. •••••0•••••••••••••••••••••••••••• os conflitos . sociais; e são muitas as teorias que se baseiam na ,existência dos conflitos de classe, de raça e comerciais para explicar a história e a evolução dos povos. . Kenneth Boulding,ldefine o conflito como "uma situação de concorrência, onde as partes estão conscientes da incompatibilidade de futuras posições potenciais, e na qual cada uma delas deseja ocupar uma posição incompatível com os desejos da outra". Acres- centando que a interrelação que se estabelece entre ambas as partes provoca condutas interativas entrelaçadas, numa- soma de ações dinãmicas que são aplicadas a todas as interrelações humanas. Age- se de determinada maneira para se conseguir o que se quer. Isso provoca naquele que sente esse proceder contrário a seus interesses uma reação a essa atitude. Que, por sua vez, provoca uma nova reação na outra pessoa, e assim até Também podemos deduzir da definição acima: "... ocupar uma posição incompatível com os desejos da outra", outra chave da sensação de ameaça que todo conflito acarreta: um sentimento de invasão. Com resquício animalesco, o homem mantém um conceito de propriedade, que, embora hoje em dia não mais a demarque com sua urina, continua defendendo-a com todas as suas forças. A propriedade não precisa ser material. Pode ser simplesmente um desejo, em oposição ao desejo de outro, referente a uma posição que, parafraseando a lei da física, não admite dois desejos numa mesma posição. Gera-se então a possibilidade de um conflito pelo simples fato de alguém desejar algo e, ao mesmo tempo, pensarque outro está desejando o mesmo que ele. 2 Boulding, K. E. Conflict and Defense: A General Theory. Nova York: Harper and Row, 1962. 2 Esse conflito, que logo veremos como possivelmente falso, é, em muitas ocasiões, origem de conflitos verdadeiros. 18 Teoria e Práticada MEDIAÇÃO Tais considerações nos aproximam do estudo da escalada da violência. que nasce com o medo (com base real ou fantasiada) e, se vai compondo com ações e reações num crescendo de • agressividade. Rummel 3.. amplia o estudo do conflito, considerando-o como "a luta pelo poder que se manifesta na procura de todas as coisas". Esse autor divide o ciclo de vida do conflito em cinco fases: 1. o conflito latente, 2. o início do conflito, 3. a procura do equilíbrio do poder, 4. o e. quilíbrio do poder, 5. a ruptura desse equilíbrio. Tanto na sua definição quanto na divisão do ciclo vital do conflito, Rummel comunga com Kenneth Boulding, acrescentando à definição de conflito, o conceito de poder, e acentuando a interrelação das ações de um, como resposta às ações do outro. O critério de propriedade acima citado, que é definiti- vamente o conceito de poder, se vê refletido inclusive nas cinco etapas propostas por Rummel. Fundamentalmente: nos conflitos• ( entre países. Uma região fronteiriça, que nunca foi muito bem demarcada, constitui um conflito latente. A aparição de certas riquezas na região, pode dar início ao conflito. Ambos os países levarão suas forças armadas à região e juntarão todas as informa- ções que comprovem sua soberania, tentando ter mais peso que o Oponente. Com essas ações o poder se equilibra, recebendo, por exemplo, cada um deles diversos apoios internacionais, etc. Mas esse equilíbrio é frágil demais, e qualquer fato pode levar a alguma ação que produza a sua ruptura, pois o problema original "nunca foi solucionado. 3 Rummel, R. J. Understanding Conflict and War. Nova York, Wiley, 1976. Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 19
  • 10. 00•00000',‘ • 0COOG • • e A definição de conflito desses autores tem uma visão cíclica de gestação, nascimento, desenvolvimento e eclosão, que envolve uma teoria descritiva evolutiva e que, apontando para sua manifestação, deixa de lado sua estrutura e sua natureza. Para nós mediadores, também é interessante a definição de Deutsch 4 que diz podero conflito se manifestar de duas maneiras:_ o conflito manifesto, que é aberto, ou explícito, e o conflito oculto, que implícito, oculto ou negado. Esse autor introduz o conceito de conflito oculto que necessariamente deverá ser estudado, conside- rando-se as limitações pessoais em conhecer ou perceber o conflito real. Resumindo essas definições, podemos convir que o confli- to consiste em querer assumir posições que entram em oposição aos desejos de outro, que envolve uma luta pelo poder e que sua expressão pode ser explícita ou oculta atrás de uma posição ou discurso encobridor. Essas apreciações se referem, sobretudo, ao estudo de conflitos entre países, regiões ou empresas, deixando de lado o homem singular. 0 nosso cliente. Os conflitos intra-psíquicos. Como 0 trabalho do mediador é com pessoas, estejam elas diretamente envolvidas no conflito ou atuando em representação de organizações, é de grande importância explorar os estudos psico- lógicos que foram realizados sobre os conflitos intrapsíquicoss, a 4 Deutsch, Morton: The Resolution of conflict. New Haven: Yale University Press, 1973. 5 Entre outros Freud Sigmund, Obras Completas, Buenos Aires Ed. Amorrortu, 1976. partir do início do século XX, que possibilitaram um grande avanço 'na compreensão dos conflitos interpessoais e que esclareceram o aparecimento de aspectos e motivações ocultas dentro do conflito manifesto. 0 ideal social de homem racional, equilibrado, dono de sí e de seus atos, que deu origem As leis e regulamentações sociais, inclusive em suas exceções6; se vê frágil e até obsoleto diante da constatação da existência de um psiquismo inconsciente, com desejos e pensamentos que atuam sobre nossa consciência e influenciam nossas percepções, pensamentos e atos. 0 psiquismo inconsciente se manifesta quando uma pessoa expressa seu desejo de obter determinada coisa e, na realidade, faz tudo ao contrário. Essa posição contraditória entre um querer consciente e uma condu- ta contrária, demonstra que, longe de sermos donos de nossos atos, estamos fragmentados e determinados pelo nosso inconsciente em suas contradições com nossos desejos e pensamentos conscientes. Tanto na teoria psicológica economicista, que enfatiza a origem do conflito no acúmulo de energia e sua necessidade de expressão, em contradição aos nossos interesses sociais e afetivos; como na divisão do aparelho psíquico em instâncias opostas (id, ego e super-ego) aos interesses e desejos encontrados, o conceito de conflito intrapsíquico foi sempre o de luta por manter um equilíbrio que assegurasse a ilusão de integridade e de não contradição que, fundamentalmente, liberasse o sujeito da angústia. A luta entre a procura- de satisfação das necessidades; o respeito aos ideais (auto-estima), que podem entrar em contradição 4 Nos menores de idade, nos doentes mentais, permanentes ou temporários, e nos excepecionais, todos eles inimputáveis ou nos atos praticados sob domlnio de violenta emoção, com diminuição na pena. 20 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 21
  • 11. O • • • • S • • • • • • • com essas necessidades; e o que os outros esperam do sujeito (como .deve ser para ser querido), é a chave do conceito de tensão e conflito na ótica psicológica e de grande importância de ser compreendido pelos mediadores. Estes pianos de querer, dever ser e procurar ser querido serão os que dominarão a comunicação dos problemas e confundirão os clientes, não só na elaboração dos seus discursos, mas, também, o próprio saberdo que desejam realmente, equais são seus interesses. 0 fato de que a cria humana nasce total e absolutamente indefesa e que precisa, para sobreviver, dos cuidados de um adulto . que interprete suas necessidades e as satisfaça, gera uma fragmen- tação originária no ser humano entre suas verdadeiras necessidades e a interpretação delas feita pelo adulto. Toda mãe e todo pai tem uma imagem do que será seu filho, baseado nos seus próprios ideais e desejos inconscientes que determinarão o modelo onde se formará o flexível e fraco aparelho psíquico infantil. Uma criança sabe que sobreviverá se for cuidada e protegida pelos adultos, e que o será (ou seja, terá o carinho deles) se aceitar ser e formar-se nesse molde que seus pais fabricaram para ela, ao menos até à adolescência. Assim, junto com sua bagagem constitucional, a criança deverá incorporar todas as mensagens inconscientes de seus pais, todas as ordens e recomendações conscientes pronunciadas por eles e toda a informa- cão que a sociedade introduz nela (educação) como conhecimentos de uma estrutura do que é esperado dela, no presente e no futuro. Chamamos a esses três níveis de imposições de "ilusó- rios", pois dão normas que criam a ilusão, de serem cumpridas, de assegurara equilíbrio e a ausência de angústia. Esses ilusórios são: Ilusório pessoal, o ilusório familiar e o ilusório social. Ao mesmo 22 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO . tempo, esses ilusórios, cheios de preconceitos, limitam tanto a percepção quanto a ação do ser humano, deixando-o preso e pressionado por eles. 0 querer ou desejar, na linguagem cotidiana, nos repre- senta. ldentificamo-nos com nosso desejo ao ponto de ser com ele um só. Ser profissional, estar casado com alguém, ser pai ou filho de tal, ser funcionário de tal empresa, passa rapidamente a constituir-se em nossa identidade e conseguimos manter o equilíbrio sempre que possamos continuar associados a esse desejo-objeto que nos repre- senta e, ao mesmo tempo, nos identifica. Somos sujeitos, na base de nosso próprio desejo, e estamos sujeitos precisamente a esse desejo que defendemos e pelo qual lutamos. Por isso, o conceito de conflito está associado em todos nós, com coisas negativas, precisamente, pela ameaça de fazer-nos perdera equilíbrio entre todas as forças encontradas em um precário acordo,que nos dá a ilusão de felicidade. Se somamos essas contradições internas às outras gera- das na luta pelo poder, na rivalidade pelos espaços e pela imposição de nossa vontade, teremos nos aproximado do verdadeiro conceito de conflito interpessoal, onde duas individualidades, confundidas pelas próprias limitações intrapsíquicas, se enfrentam por posições incompatíveis, determinadas pelo desejo de poder mais que o outro, estruturadas numa posição defensiva, cheia de preconceitos, que confunde mais do que esclarece os próprios interesses. Na medida em que o mediador possa transMitir a seus clientes os aspectos positivos do conflito,' rumo à importância de aproveitara crescimento e a nova ordem, remarcando o benéfico, e acalmando a angústia, poderá contar com a colaboração deles e, Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 23
  • 12. assim, ajudá-los a resolver satisfatoriamente seus problernas. Conflitos reais e falsos. Podemos definir, que existe um conflito real se existe uma real oposição entre os desejos e direitos de uma pessoa é ásOésejos e_ direitos de outra pessoa ou grupo. Deixamos o nome de fats° para aqueles conflitos originados por falhe da comunicaçãoque_parce produzir, ate que as coisassejam aclaradas, uma aparente oPosição. É fundamental para um mediador ter absolutamente clara essa diferença, pois, normalmente, a escalada de .violência, a confusão dos reais interesses de cada parte, e a confusão entre os verdadeiros problemas e as pessoas entre as quais esses problemas existem, contêm sempre distorções originadas na falta .de comu- nicação ou por falhas na escassa comunicação existente .entre as partes. Por isso é importante que o mediadordomine os conceitos da teoria da comunicação e saiba da importância da clareza na emissão da mensagem e as dificuldades que o ser humano tem de escutar mensagens tal como foram emitidas. A comunicação. Toda_cornunicação consta de trés partes: • o emissor, o_ _ canal pelo qual a mensagem é transmitida, , e. o • receptor. Falhas podern aparecer em qualquer uma ou em todas elas. É fundamental que o mediador não deixe nada sem escla- recer, nem da nada por conhecido. 0 jogo de "eu sei que você sabe que eu sei"tão próprio da comunicação humana, é a "mãe" de muitos falsos conflitos, que o mediador deve desfazer. 24 Teoria e Prática daMEDiikgÃO Todos os especialistas em comunicação explicam a impor- tância de pensar a quem se dirige a mensagem, para poder elaborá- la segundo a linguagem que sera a mais clara para o receptor. 0 exemplo mais vulgar seria o de não falar em português com alguém que só fale inglês. Daí, para qualquer outro exemplo, a chave é tomar em consideração o uso de termos e modos de expressão que serão compreendidos pelo receptor. Por isso, é muito importante analisar os ilusórios de cede cliente, para saber como nossa mensagem atingirá melhor nosso objetivo. Uma segunda regra exige que confirmemos sempre a boa recepção da mensagem. Como veremos nos capítulos posteriores, o mediador deve sempre fazer um resumo do que escutou, para assegurar-se de ter compreendido corretamente e para que os clientes também focalizem sua atenção no essencial do problema. A regra básica da combnicação, fundamental em negocia- cão e mediação, é a de escutar com atenção. As pessoas estão acostumadas a dar por entendida qualquer mensagem, ainda antes de ter sido emitida totalmente: "eu já sei o que você quer, ou vai dizer, e basear-se rios próprios temores para supõr quais são os desejos e quais serão os discursos da outra parte. Em geral tentam interromper, adiantar-se e assim não escutam o que a outra pessoa desejava transmitir. É fundamental que o mediador introduza a regra de respeito aos tempos de expressão de cada parte, enfatizando a importância da escuta atenciosa da outra parte, para que, a sua vez, ter também assegurado o direito de expressar-se com toda tranqüi- lidade, com a certeza de ser escutado. Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 25
  • 13. • • • • Acland' aponta para uma boa comunicação bilateral: que as partes se escutem com atenção; CI que falem com clareza e determinação; que possuam uma atitude aberta â apresentação de informação e de idéias novas; que estejam dispostas a concordar; (eu acrescentaria: a discordar); que aceitem os outros como iguais. mediador, longe de imp& sentenças, impõe regras de comunicação, inclusive com seu exemplo. Dal a importância de que as conheça completamente. Escutar atentamente, inquerir para saber mais, e fazer um resumo do compreendido, são as regras da comunicação mais importantes a serem tomadas em conta pelo mediador. Pois, assim como a responsabilidade dos clientes é a de discutir o problema; a do mediador 6. a de como discuti-lo. de ouvi-lo falar; pois é no falar que o homem se revela." Palavras que têm milhares de anos e que estão esqueci- das. Como. diz o ditado, temos duas orelhas e uma só boca, para escutar o dobro do que falamos. É no discurso dos clientes que se encontram os verdadeiros desejos, de onde se desprendem os verdadeiros interesses, onde são revelados os medos mais profun- dos. Em mediação, a escuta atenciosa dos clientes é a chave que 1 nol) abrirá as portas para conhecer e reconhecer os reais interesses e os , meios de chegar a acordos onde esses interesses sejam respeitados. O caminho para superar o conflito. Escutar, sempre escutar. "É no falar e no agir que a pessoa humana se revela por aquilo que é. Quando a gente sacode a peneira, ficam nela só os refugos; assim, os defeitos de um homem aparecem no seu falar. Como o form prova os vasos do oleiro, assim o homem é provado em sua conversa. 0 fruto revela como foi cultivada a árvore; assim, a palavra mostra o coração do homem. Não elogies a ninguém ante 7 Acland, Andrew Floyer. Como utilizar la medicadón para resolver conflictos en los organizaciones. Paid6s, Buenos Aires - 1993. 8 BIblia: Eclesiástico 27,47 26 Teoria e Preilica da MEDIAÇÃO Tearia'e Pratica da MEDIAÇÃO 27
  • 14. Capítulo 2. DO CLIENTE 4••••••••*•••••.••••••••••••:•••••• Quando duas pessoas brigam, o crescimento ou escalada da violência confunde de tal maneira a comunicação, que já ninguém sabe com certeza, qual foi a verdadeira causa que deu início à briga. Que interesses opostos a geraram. Basta tomar como exemplo a discussão de um casal, onde a simples reclamação por uma comida fria ou sem tempero, conver- te-se rapidamente em uma longa briga onde todas as mágoas, guardadas há tempo, surgem como de uma torneira plenamente aberta, inundando a conversa e fazendo desaparecer as verdadeiras razões da origem da discussão. E, o que é mais importante, encobrin- do a real causa que motivou a agressão. Além do mais, o que acontece quando um conflito é levado justiça; todas gS necessárias fórmulas legais, incrementam tanto o conflito inicial, que pouco ou nada dele, fica como era originariamente. Quando duas pessoas lutam pelo direito a uma proprieda- de, as razões objetivas que sustentam com clareza tal direito são as que as levam a sentar, negociar e, finalmente, chegar a um acordo: com que parte, ou com que uso da propriedade ficará cada uma delas. Por que, então sentar-se ; e chegar a um acordo, não possível? Tenho apontado as pressões a que é submetido o ser humano desde o nascimento e 'clue fazem com que o aparelho psíquico se estruture em uma unidade fragmentada. Somos pessoas, graças a este constituinte que nos dá a ilusão de ser um e ao mesmo Teoria e Práticada MEDIAÇÃO 29
  • 15. •••••••••••••••••••••••••••••••ss•• tempo muitos, nas contradições. Isso é, precisamente, a chave das falhas `na comunicação com os outros. Se os clientes não podem dar conta de seus próprios desejos, como farão para lutar por eles, sem a contradição própria da irresolução. Sentem-se agredidos pela intromissão ou a invasão do desejo de outra pessoã em seu objeto desejado; mas não conseguem saber com certeza, o que desejam desse objeto ou para que o desejam. Lutam com ideais de justiça pelo que consideram sua propriedade sobre o objeto ou ao menos seu direito sobre ele, mas desconhecem não somente se é esse seu objeto, senão que parte ou porção dele é seu ou a que têm direito realmente. Nesse jogo ilusório de propriedades e direitos, de confu- sões refletidas de seus próprios conflitos internos, surgem os grandes conflitos interpesso a is. Sem me aprofundar aqui, nas identificações que os impul- sionam a agirem de determinada maneira, confundindo o querer com aquele dever querer, para serem como o modelo, ou terem o que ele tem. Esse conjunto de identificações mexe tanto com a conduta e, fundamentalmente, com a personalidade de uma pessoa, que cria uma confusão, no sentido de que ela tem a obrigatoriedade de possuir, ou reagir de uma maneira, quando seu real interesse é outro. Em problemas familiares aparece com freqüência essa confusão: uma mulher deseja a sua independência, mas não aceita deixar seus filhos com seu ex-marido, pois as identificações com a figura de mãe indica que deve ficar cuidando deles, apesar dos interesses próprios e os dos filhos, os quais seriam melhor cuidados por quem realmente deseja. 30 Teoria e Práticada MEDIAÇÃO Repito que é com esse homem, sujeito a todas essas pressões, que o mediador se enfrenta quando o cliente lhe apresenta um conflito, seja da ordem familiar ou comercial. QUe acontece com essas pessoas que não conseguem explicitar seus interesses, nem ouvir os da outra parte? Como fazer para descobrir esses interesses reais e desar- mar um discurso, tão elaborado, quanto 6 de um cliente que briga pelo que ele acha que são seus direitos? A posição, encobrindo os interesses. 0 trabalho de escuta das "posições" dos clientes e da descoberta do latente contido em seu discurso é o mais importante a ser feito pelo mediador no primeiro momento. Sabemos que nenhum conflito é como se apresenta na superfície. Como um iceberg, a parte oculta é muito maior que a visível. Os clientes estão acostumados a não serem frontais na verbalização de. seus interesses. Não estou falando somente do demandar encobridor do desejo9, mas sim diretamente, de encobrir a mesma demanda, pois eles pensam que o adversário não deve saber as verdadeiras razões que o assistem na disputa, com o risco de perder a possibilidade de ganhá-la. A sociedade toda está Otruturada na simulação. Social- mente é de mau gosto dizer diretamente o que se quer, e as pessoas ° Lacam, Jacques. Em toda sua doutrina psicanalltica, diferencia a demanda, ou seja o discurso com o qual se pede alguma coisa, do real desejo que não pode ser expressado por ser Inconsciente. A demanda pode ser satisfeita, mas o desejo fica sempre pressionando em sua insatisfação, dcultando-se na demanda. O que produz a busca permanente, o demandar permanente, na irrealizaçao do desejo. Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 3 1
  • 16. numa exposição oral que pouco ou nada terá dos interesses iniciais que a levaram ao litígio. Esse discurso armado e estruturado com base em opiniões de outras pessoas é tão hermético, que sobre ele nada pode ser feito. É uma repetição continua da mesma alegação que só consegue reforçar o discurso do oponente, fechando-o na sua posição, que será tão solidificada quanto a outra. Derrubar essa posição tão estruturada e inútil para deixar fluir o verdadeiro interesse, perdido e disfarçado durante a escalada de violência, é imprescindível no processo de mediação. Não é possível mediar entre duas pessoas que repetem sempre o mesmo discurso e que, frente a cada ataque, têm uma resposta preparada. 0 mediador deve quebrar esse círculo vicioso com perguntas que conduzam à reflexão e à emergência dos interesses reais. Fisher e Ury'°, dizem que não é possível negociar sobre posições, ou seja, sobre aquele discurso estruturado e fechado que uma pessoa apresenta como seu objetivo e as razões que o susten- tam, mas, sobre interesses concretos e reais de cada pessoa. Essa. posição deve ser quebrada pelo mediador, investi- gando e questionando para ajudar a parte a refletir procurando, na ruptura do discurso, - sejam contradições ou outros sinais que chamem nossa atenção, - investigara emergência do outro discur- so, o verdadeiro. Assim se procede na mediação com os clientes, até ajudá-los a descobrir os verdadeiros interesses na causa em discussão. 004).0000000000.•*00•00600006.6600• são formadas para disfarçar seus pedidos. Somos educados na simulação e na desconfiança. Em se tratando de dinheiro e propriedades, a situação se complica ainda mais. Se em organizacões sociais, como as dos anglo-saxões, onde os problemas comerciais e de dinheiro são tratados mais abertamente, é necessário o uso da mediação para descobriras reais interesses em jogo, em sociedades latinas como a nossa, essa necessidade é imperiosa. Vamos ver como seria a escuta simples de um profissional do direito, quando um cliente requer seus serviços. Primeiro: vet - que leis regulam o problema apresentado, segundo: que jurisprudência existe sobre o assunto, e, terceiro: com que incrementar a reivindi- cação para fazê-la mais aceitável, para que o juiz dite uma sentença favorável. Normalmente o cliente é sustentado por esse profissional na sua posição, e seu ódio pelo adversário é incrementado. Recebe instruções sobre o que dizer e como dizer, tomando mais rígido e inescrutável seu verdadeiro interesse original. Obtém informações numa lingua especial, cheia de termos técnicos, dos quais poucos são os realmente compreendidos pelo cliente. Este é um cliente que entrou com um problema e saiu com uma complicação semântica na cabeça e sua litigiosidade incre- mentada. Envolvida num litígio, uma pessoa vai falar tanto dele e escutar tantos conselhos e recomendações de familiares, amigos e profissionais que, dia a dia, esse discurso se verá "enriquecido" com inúmeros argumentos e frases feitas, até conseguir solidificar-se I° Fisher, Rojer and Ury, William. Getting to yes. Peguin Books, Nova York - 1991. 32 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 33
  • 17. •••••••••••••••••••••••••••••••••• As perguntas chaves são: o quê? e por quê?, sem o intuito de'culpabilizar, mas desejando saber, conhecer sempre mais. Toda intervenção do mediador que produza a verbalização de maiores informações, destravando os medos e as limitações dos clientes, produzirão um efeito liberador que ampliará a visão dos problemas e aguçará a criatividade," represada pela cristalização do discurso. Logicamente nós, mediadores, não pretendemos curar ninguém, mas é importante ressaltar o efeito liberador que produz nos clientes a possibilidade de alcançar o conhecimento de seus próprios interesses, livres das pressões que os confundiam e impe- diam de saber exatamente o que queriam obter nesse pleito. Sabemos que um cliente ao falar está expressando um discurso que contém outro. Que no discurso manifesto há um outro oculto, ou latente, contido nele. Com o objetivo de descobrir o latente é que o cliente começa a ser escutado pelo mediador, com a outra orelha que é a de investigar como um detetive, ou melhor dito como um mediador, o verdadeiro discurso do cliente. • Baseado no sigilo, o mediador procura ganhar a confiança do cliente, demonstrando-lhe Clue- ele está ai precisamente para ajudá-lo, e que toda abertura do discurso conduz a obter resultados melhores. Na confusão do litígio, o único espaço onde o cliente pode falar com tranqüilidade e desabafar é na sessão de mediação, frente a frente (face a face) com o mediador. Com perguntas dirigidas a ampliara questão, a depor toda posição fechada a novas possibilidades, incentiva-se a criatividade e se libera o cliente de pressões que pouco ou nada ajudam a satisfazer seus interesses. Muitas vezes escutamos alguém expressar sua vontade para conseguirtal ou qual coisa (por exemplo, separar-se do cônjuge) e ao mesmo tempo percebemos, através desse discurso, que toda sua ação está orientada a conseguir o contrário (tentando acordos que criarão uma dependência onde a separação nunca se concre- tize)." Apontando essa contradição, o mediador derruba a posição estruturada no discurso, provocando a emergência dos reais objeti- vos do cliente. Desarmado, o cliente começa a deixar surgir seu verdadeiro interesse e com isso facilita a solução do conflito interpes- soal que o trouxe à mediação. Luta entre pessoas ou discussões sobre problemas? Quando duas pessoas brigam, sejam quais forem as ra- zões, a real causa da dispute deixa rapidamente seu espaço ao oponente que passa a ser o alvo de todas as agressões. A partir daí, há um conflito direto com essa pessoa: "Essa pessoa quer me roubar, essa pessoa quero que é meu", e finalmente essa pessoa passa a ser a causa de quantas desgraças possam ocorrer. tão arraigada a cultura adversarial nas sociedades, que em algumas justiças se autuam os processos com os nomes dos adversários, com um versus ou urn' contra no meio. Comumente, se presenciamos uma discUssão entre duas pessoas, e, interrompendo-as, perguntamos a razão da discussão, escutaremos delas um grande número de acusações de uma para a 11 É habitual que os clientes expressem apaixonadamente um objetivo e na pratica façam tudo para ilk, consegui-lo. No filme A Guerra dos Roses, ambos esposos expressam seu desejo de separaçao, mas os dois fazem tudo para ficar juntos, até que a morte os separa. Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 35 34 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
  • 18. utra, culpando-se mutuamente: "por não querer compreender, por ue o outro é um cabeça dura, por que o outro diz ou fez tal ou qual oisa". Raramente escutaremos uma síntese do problema que as wou a discutir. Essa e" a base da escalada da violência. Personalizando-se a iscussão cada vez mais, o problema passa a ser "o outro", e não o roblema real, incrementando-se os sentimentos negativos que um entirá pelo outro. Chegando-se a perceber um ao outro tão ameaçador ue, de urn problema em que duas pessoas ou.partes estão envolvidas, assa-se a uma luta entre adversários, a inimigos de morte. Da impossibilidade de separar as pessoas dos problemas ue as confrontam, surge a organização judicial atual, onde é tão npossível falar entre os oponentes do problema sem brigar, que , recisam de um juiz para mantê-los separados que imporá uma entença à qual devem submeter-se, pela incapacidade de negocia- em entre eles a melhor solução. Ao mesmo tempo esta cultura de confundir os problemas .om as pessoas tem criado a meta de ganhar, como numa guerra, na iase da destruição do inimigo. 0 conceito de que se "ele ganha eu lerco", e vice-versa, impediu a possibilidade da negociação direta, lois o interesse de um, de ficar com tudo, deixa sempre o outro na itu ação de perda total. A possibilidade de encaminhar novamente a atenção sobre verdadeiro objeto, sobre a verdadeira causa da disputa, e centrar iisso as discussões, leva as partes a um uso comum das palavras )ara referir-se aos verdadeiros direitos e interesses sobre o objeto do pal se trata, e a reduzir a agressão entre elas. "Centralizaras discussões sobre os objetos e deixarde lado 16 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO os problemas pessoais", é a outra regra a ser respeitada e que o mediador deve impor desde o início, nas sessões de mediação. Devo aquí apontar que somente quando as partes desejam alcançar soluções, é que o mediador conseguira impor a regra de centrar-se nos problemas e deixar de lado as pessoas. Muitas vezes as pessoas simplesmente inventam proble- mas para poderem brigar. Nesse caso a mediação somente lhes servirá para fazer com que vejam a inexistência de problema algum, fora de seu desejo de brigar, pois não se lhes permitirá continuar a luta. Os tribunais, nesse caso, oferecem um ambiente mais propício e lhes proporcionarão maiores satisfações. É fundamental que o mediador tenha bem . claro, para transmitir a seus clientes, que a mediação poderá ajudá-los somente se eles desejam preservar o relacionamento, aprimorá-lo ou ao menos não prejudicá-lo. Se não existe esse interesse, a mediação perde a maior de suas forças e os convénios correm risco de ficar detidos, pela falta do desejo de reconstruir ou preservar o relaciona- mento anterior à briga, ou recriar um novo relacionamento, já que o antigo fracassou. 0 mediador pode aceitar, e até é bom que fomente, o desabafo emocional, mas nunca pode permitir a agressão, e deve marcar que o objetivo é achar soluções satisfatórias para ambas as partes. Repito, pois é fundamental para o processo da mediação: o mediador deve saber diferenciar quando seus clientes estão confundindo o problema com uma briga pessoal, porcausa da cultura adversarial em vigência; de quando o objetivo de seus clientes simplesmente brigar entre eles, sem outra razão que a de vencer. No Teoria e Práticada MEDIAÇÃO 37 • • e • e o e • e
  • 19. 0•0•••••••••••••••0••••••••••••••• primeiro caso a insistência em que os clientes focalizem as discus- sões nos , problemas e não neles mesmos, sera suficiente para introduzir o respeito nas negociações. No segundo caso, sera melhor suspendera mediação até que eles acalmem seus ânimos e revejam seus objetivos. Oual é o cliente da mediação? • A mediação, repito, é de grande utilidade nos casos em que as partes desejam achar soluções onde os interesses de ambas • sejam respeitados. Onde seja importante preservar e ate aprimorar o relacionamento, mas nunca piorá-lo. Outra virtude da mediação é o sigilo. Muitos problemas comerciais ou familiares requerem um tratamento sem publicidade, sem transcendência. Quando os clientes desejam achar as soluções dentro de parâmetros privados, a mediação pode ajudá-los grandemente. Uma das exigências fundamentais que o mediador deve impor no inicio da mediação, é a de que os participantes tenham representatividade suficiente para expor o problema e decidir as soluções. A importância do interrelacionamento das partes nas sessões de mediação, faz com que sejam elas mesmas as que tomem decisões. A necessidade de consulta com superiores ou representados, enfraquece a mediação no ponto mais importante que é o do relacionamento entre as partes e a escuta de seus interesses e necessidades. Resumindo: o cliente apto para solucionar seus problemas 38 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO através da mediação é aquele que, capacitado para decidir, deseje preservar seu relacionamento com o outro, com o objetivo de tomar decisões que • contemplem a satisfação dos interesses de ambos, num clima cordial, sem difusão e sem demoras. As emoções dos clientes. Temos falado bastante da necessidade do ser humano de preservar um equilíbrio psíquico, e de como esse equilíbrio se sente ameaçado com a emergência de um conflito. Um alerta é disparado, fazendo com que os seres vivos se preparem a enfrentar um perigo, quando alguma informação recebida pela percepção aponta a exis- tência de um elemento fora do normal. A primeira reação dos seres humanos é a de prepararem-se para defender a integridade, seja física ou psíquica, que se sente ameaçada. Esse primeiro alarme, sentido como angústia, faz com que o aparelho psíquico se prepare para defender-se de um perigo, seja ele intrapsíquico ou exterior. Essa angústia deixa o homem com os sentidos mais alertas para• reconhecer a realidade e importância do perigo. Essa angústia, dependendo da comprovação da realidade do perigo, o induzira a fugir ou a atacar. Após uma possível paralisia temporária. Um cliente com um conflito está sempre angustiado, por isso é fundamental que o mediador o ajude a acalmar-se. Essa angústia converte-se logo em medo, pois, se decide atacar, terá medo da devolução defensiva da outra parte, e, se foge, o faz também com medo. Não ha aqui a necessidade de remarcar que o grande sentimento da paralisia é o medo. Quando um cliente grita ou agride é porque sente medo, o Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 39
  • 20. 0110•400••00069.G00 mesmo quando para ou foge para não enfrentar o problema. Esse medo, sentimento próprio de quem sente seu equilíbrio em perigo, favorece a escalada de violência, levando as partes a confundirem pessoas com os problemas e a necessidade de construirem o seu discurso da posição, acreditando que ele seja o melhor escudo protetor da fragilidade que está sentindo. 0 cliente deve acreditar no mediador e senti-lo protetor. Ambas as partes devem sentir-se cuidadas pelo mediador. Este deve demonstrar-lhes sua imparcialidade que implica em marcar os momentos de injustiça, assim alertá-los quando uma proposta foge dos critérios de realidade. Deve fazê-los sentir-se à vontade, compreendidos e cuidados por ele. Isso faz com que o medo e a angústia diminuam e, logicamente desapareçam as condutas asso- ciadas a esses sentimentos. Muitos autores que trabalharam as características e dificulda- des dos homens para negociar, apontam o medo como o principal inimigo. 0 medo bloqueia o raciocínio, a afetividade e com isso a criatividade, valores fundamentais que entram em jogo na mediação. Um homem ou mulher que chora ou grita ou treme está pedindo ser socorrido. São sinais que o mediador não deve deixar passar, sem reconhecimento e compreensão, com frases como: "Compreendo o que está passando e o quão difícil 6 para o senhor/ a senhora, esta situação. Eu estou .aqui para ajudá-los e facilitar as coisas ao máximo. Vocês já deram o primeiro passo ao virem até aqui, que demonstra suá fortaleza e o desejo de solucionar pacifica- mente este conflito". Outras vezes a simples pergunta ou sinalização do que percebemos, são suficintes para ajudar o cliente a se acalmar e adotar uma posição mais colaboradora. Certa ,vez teve-se que mediar em uma sociedade com um grande conflito. Dois dos três sócios queriam efetuar um grande aumento de capital o que deixava o terceiro, o mais jovem, fora da igualdade de decisão. Esse jovem ocupava, há seis meses, o lugar do pai, que havia morrido, tendo então ficado como representante dos outros herdeiros, uma irmã mais nova e sua mãe. Os outros dois sócios, um homem e uma mulher, de aproximadamente a mesma idade do falecido, diziam quereraumen- tar o capital para comprar maquinários para eles imprescindíveis. Na realidade, o que queriam era eliminar ou ao menos neutralizar esse "jovem que, sem saber nada do assunto, atrapalhava o funciona- mento da sociedade". Logo após iniciada a mediação, ficou claro que o jovem tinha um excelente preparo para cumprir sua função, e suas idéias pareciam sensatas. A cada oposição de seus sócios, ele rebatia com respeito e com muitos conhecimentos e dados, demons- trando até o desnecessário da compra de tais máquinas. Após muitas idas e vindas sobre o tema, um dos sócios mais velhos, a mulher, deixou de falare começou a batersuavemente com um dedo na tampa da mesa, com um ritmo monótono que parecia o de um relógio, mas ela aparentava estar totalmente calma. 0 media- dor dirigiu sua atenção a ela e lhe disse que achava ela muito ansiosa e se podia expressar o que estava acontecendo. Com raiva disse que o jovem, queria era matá-los, ao ir contra todos os procedimentos que tão bem funcionaram até então. A luta de gerações, aqui, era de "vida ou morte" e o jovem era a clara expressão do envelhecimento e da morte próxima deles. 0 jovem ficou sem jeito pela afirmação de sua sócia e replicou que "eles 6 que queriam matá-lo aumentar o capital .000•14060€0410 . 40 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 41
  • 21. •••••••••••••••••••••••••••••••••• em cifras que ele não poderia acompanhar". Após um silêncio, o jovem confessou que, em seu entusiasmo com a novas técnicas que havia estudado, se esquecia de respeitar a grande experiência de seus sócios. aponto inicial de aumento de capital, que tinha atuado como posição, encobrindo os reais interesses deles, cedeu espaço à discus- são de como podiam organizar-se para aproveitar ao máximo as habilidades de cada um, ouvindo-se e respeitando-se mutuamente. Se este caso não tivesse acudido à mediação, o final teria . sido bem diferente, pois teria ficado numa discussão sobre aumento de capital, a que um juiz ou um árbitro teria determinado segundo as leis vigentes, e o problema real teria ficado sem solução, pois os temores deles não teriam sido nem ouvidos nem trabalhados. Esse 6 um bom exemplo de posição encobridora dos interesses, pois o aumento de capital simplesmente encobria o real desejo dos sócios mais velhos de frear a atuação do mais novo, e de conseguirem ser respeitados por ele. Também o 6, com respeito à confusão de pessoas com problemas, pois, realmente, o problema não era as pessoas, e, sim, como achar a maneira de respeitarem-se, uns a outros, e fazer o trabalho mais prazeiroso e produtivo. Também exemplifica a importância das emoções dos clientes que devem ser tomadas em consideração pelo mediador para que, explicitadas, possam ser uma grande porta de acesso aos interesses. E, finalmente, um bom exemplo de como, com a media- ção, os interesses de todos são tomados em consideração e o resultado final contempla a satisfação deles, em um "ganha, ganha", de difícil percepção numa primeira visão do problema. • Capítulo 3. O MEDIADOR O que é ser mediador. Aprofundar-se no conhecimento da mediação é, basica- mente, estudar qual deve sero comportamento do mediador, pois, de seu profissionalismo dependerá, em grande proporção, que as partes achem o caminho do acordo. Uma das vias mais efetivas para definir o mediador 6 dizendo o que ele não 6. Vejamos então que o mediador não 6 um juiz porque nem impõe um veredito, nem tem o poder outorgado pela sociedade para decidir pelos demais. Porque não se julga com a sabedoria de conhecer o que 6 justo ou o que 6 melhor para os outros. Mas deve ter do juiz o respeito das partes, ganho com sua atuação e impar- cialidade. Diferentemente do juiz, ele não é indicado para as partes por distribuição ou sorteio das causas, mas escolhido pelas partes. Também não é um negociador que toma parte na negoci- ação, como interessado direto dos resultados. Paca o mediador o importante é que as partes descubram seus verdadeiros interesses e consigam um mínimo de interrelacionamento para discutirem esses interesses. Dependerá das partes a corrOirsão da mediação com um acordo ou não. Também não é um árbitro que emite um laudo ou decisão. Aqui merece uma interrupção para indicar, detalhadamente, as diferenças entre mediação e arbitragem. Na mediação, o mediador, Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 4342 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO
  • 22. ••600060000009000•000 ainda que Seja um experto no tema tratado, não pode doutrinar sobre a questão em discussão. Ele cuida especialmente da interrelação entre as partes e a descoberta dos interesses reais de cada uma delas. 0 árbitro não se preocupa com interrelacionamento, senão com as informações técnicas apresentadas, na base das quais, com fundamentos em seus conhecimentos específicos, ditará um laudo a que as partes se comprometeram a aceitar. 0 árbitro nem precisa conhecerpessoalmente às partes. É suficiente que elas lhe apresen- tem um relatório de suas posições. Em muitos países do mundo, essa técnica, que apresenta suas vantagens quando o problema é muito técnico e precisa da avaliação de um especialista, tem fracassado porque, ao não contemplar os reais interesses, seu laudo se baseia em dados técnicos e normalmente dá a razão a um, deixando o outro descontente. Por isso muitos laudos não são acatados pelo perdedor, que recorre a justiça, perdendo-se o tempo investido na arbitragem. É importante ressaltarque igual ao mediador, o árbitro é escolhido de comum acordo, pelas partes. Resumindo, o mediador é um terceiro neutral. Conduz, sem decidir. É neutral em Judo o que seja esperado dele como intervenção na decisão. E ele como neutral, deve fazer com que as partes envolvidas participem ativamente, na busca das soluções que serão as que melhor se ajustem a seus interesses, pois ninguém melhor do que as próprias partes para decidir sobre si. Ficar no meio, entre duas pessoas que brigam, sabemos pelo conhecimento popular, é ficar como o marisco entre a rocha e o mar, na piordas posições. Mas essa é a posição do mediador, como atividade profissional, adotada e exercida. Na mediação tudo deve acontecer entre as partes. 0 mediador é tão somente a parteira, que ajuda a dar à luz os reais interesses que possibilitarão o acordo final. 0 tempo é marcado pelas partes e o Mediador não pode urgi-las, nem demorá-las. As técnicas do mediador. Vejarrios então quais serão as técnicas que o mediador deverá dominar para agir eficientemente nesse difícil equilíbrio de ser neutral, e, ao mesmo tempo, ajudar a dar vida. Ja temos visto os três aspectos que o mediador não deve_- nunca deixar de lado, 1) centralizar as discussões nos problemas e não nas pessoas; 2) investigar os interesses desarmando o discurso infértil da posição; e 3) prestar muita atenção às emoções dos clientes para que, apontadas, sejam usadas positivamente na procu- ra dos reais interesses e não atrapalhem no processo de mediação. Os mesmos mecanismos psíquicos que levam as pessoas a deslocarem a atenção do objeto da discussão para os sujeitos que discutem, e, a armar sobre os reais interesses, posições, que pouco ou nada conservam deles, são precisamente os mesmos que as levam a fantasiar valores e situações fora da realidade que sempre dificultam a posibilidade de acordos satisfatórios. Por isso é importante que os valores e critérios objetivos entrem nas discussões, pois, considerados, vão pesar sobre qual- quer petição descabida e recolocarão as partes em um enqua- dramento realista. 'Esse procedimento facilitará o encontro de acor- dos satisfatórios para ambas as partes. É este o 40 aspecto a ser tomado em conta pelo mediador. Entre esses valores e critérios objetivos, que os advogados e outros profissionais de cada parte informam a seus clientes, se 44 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 45
  • 23. incluiriam os possíveis resultados de uma sentença judicial, no caso de que recorram à justiça. 0 mediador não pode comunicar esses valores e critérios objetivos, pois seria uma ingerência fora de lugar, mas deve questio- nar as partes para dirigí-las a fazerem aparecer esse conhecimento nas sessões de mediação. Perguntas como, "o senhor/ a senhora sabe quais são os valores das propriedades na vizinhança?", ou, "seu advogado o informou qual poderia ser a opinião de um juiz neste caso?" trazem os critérios de realidade que tanto precisamos, sem comprometer a• posição do mediador. É importante que o mediador saiba que todas as pressões a que estão submetidos os clientes, distorcem a realidade gerando não uma irrealidade, mas uma realidade psíquica que, muitas vezes, tem mais força do que a realidade mesma. Não é tão simples como parece, que com a aparição de critérios de realidade, ou seja valores reais, o cliente modificasse sua posição. Não esqueçamos qué tbda avaliação está cheia de outros valores, psíquicos e sentimentais, que pesam, e que a sua vez tem, por si, peso dificilmente quantificável objetivamente. Uma 'casa ou empresa ou participação societária, pode ter um valor, para o vendedor, que 6 fundamental investigar, pois pode haver outros interesses que ele está traduzindo em dinheiro mas que podem ser compensados de outrojeito, porque o comprador não lhes dá a mesma importância quali ficada em valores monetários que o vendedor. Jardins, até murais em paredes, ou marcas que, em muitas mediações, constituem uma grande parte da diferença de valores, podem ser deixados fora da operação, convencionando-se 46 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO pelo resto, um preço conveniente para ambas as partes. Dois clientes não podiam chegar a um acordo sobre o valor de uma propriedade rural, pois o preço de mercado, que o comprador oferecia era muito inferior ao pedido pelo vendedor. Ambos estavam interessados em concluir a negociação, mas a diferença era enorme e não podiam continuar barganhando sobre valores sem conseguir resultado algum. Consultado, pedi para cada urn deles para decom- por a propriedade em diferentes aspectos ou partes que para eles tivessem valores significativos. Assim, a lista dos dois constou da quantidade de campo, de cabeças de gado, de objetos dentro do campo para a exploração leiteira, a casa para os trabalhadores, etc, que coincidiam quase totalmente nos valores. A grande diferença constava do valor da casa principal, e do nome da propriedade, que o vendedor avaliava e o comprador nem tomava em consideração. Questionados sobre esses dois pontos, apareceu que a diferença com respeito A casa estava na avaliação de um mural pintado por um grande pintor mexicano que, hospedado nessa casa, muitos anos atrás, tinha deixado como presente a lembrança de sua estada nessa propriedade. Essa pintura, de altíssima quotação no mercado de arte, nada significava para o comprador, alheio As artes e que nem pensava em morar nessa casa. S6 essa consideração da pintura constituía os trinta por cento do preço total, pedido pelo vendedor. A outra grande diferença era o nome da propriedade que dava também nome a uma marca de leite de pouca produção, porém muito prestigiada na região. Esse nome significava uns vinte por cento da avaliação total do vendedor. Finalmente, o comprador se ofereceu a retirar o muro com a pintura, com todo cuidado, assegurando todos os meios, para Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 47
  • 24. •e e •e e e a o e e o o • eg) o e e trasladá-la a um museu que a compraria do vendedor. Também a marca (nome da propriedade) ficou fora da operação, pois o compra- dor nem pensava usá-la e o vendedor tinha um vizinho interessado nela. Assim os valores se equipararam e a venda se concretizou. Nem sempre esses valores são tão facilmente comprova- dos como no exemplo, mas, se numa mediação o mediador aceita que se continue sempre discutindo sobre o mesmo ponto, sem abrir a analisaros "porquês" de cada posição, nunca se concluirá o acordo. Os negociadores chamam a este processo de "ampliação do bolo", pois se abre, em análise parcial de cada parte, o objeto da negociação, ampliando-se o todo em partes que nem sempre são contempladas. Ao decomporem-se em partes, os interesses parciais aparecem mais claramente e é mais fácil satisfazê-los. Quando as fantasias dos clientes super-estimam valor, sem razões objetivas que o sustentem, com essa análise, a fantasia normalmente se desfaz ou encontra sua compensação em outros valores. Por exemplo, numa divisão societária, com diferentes apreciações sobre o valor da empresa, foi compensado, acrescen- tando-se ao empreendimento o nome do sócio que vendia sua participação. Com isso ele se assegurava ficar na memória da sociedade como o iniciador do projeto. Sejam realidades psicológicas, ou realidades avaliadas em forma diferente, o importante é abrir à análise, acrescentar os elementos em discussão, e não permanecer com o pacote fechado numa discussão estéril. A grande importância que os afetos e a personalidade dos clientes têm nos resultados da mediação, fez com que muitos autores tentassem classificá-los. 48 Teoria e Práticada MEDIAÇÃO Muitos negociadores norte-americanos apontam uma série de características de personalidade e a forma de agir com cada uma delas para obter resultados positivos. Esses esquemas, criados pela psicologia fenoménica, não fazem mais do que colocar preconceitos onde deveriam existir dúvidas, interrogações e preocupações em conhecer como é real- mente e o que deseja esse cliente que nos consulta. Encerrar um cliente dentro de um estereótipo psicológico ignorá-lo como pessoa única e exclusiva. One profissional é o mediador? 0 mediador inaugura, com seu agir, um novo tipo de profissional. Para delinear seu perfil temos que recorrer, mais uma vez, ao que o mediador não é. O mediador não pode agir como o advogado, que escuta o cliente pensando pas leis que enquadram o caso apresentado, e na jurisprudência existente. Ainda a lei seja o limite de todos, ela é fria demais para conter todas as particularidades dos clientes; e sua letra é para ser interpretada segundo a ocasião. 0 cliente da mediação deve ser ciente dela e de suas interpretações, com o.assessoramento de seu advogado. Outra diferença importante é que o advogado está acostu- mado a apoiar e sustentar a posição de seu cliente, parcializando a visão do problema. Sabemos muito bem que todo cliente parcializa seu discurso, apoiado nas suas razões. Se ficamos nisso e apoiamos uma parte só do problema, perderemos a outra parte da verdade. 0 mediador não pode confundir, nisso, sua função com a do advogado Teoria e Práticada MEDIAÇÃO • 49 • •
  • 25. 1•••••••••••••••••••••••••••••••0•• e deve sempre ser imparcial e tomar em consideração a totalidade da situação. Também não pode agir como o psicólogo que escuta com objetivo terapêutico. Ainda que muitas técnicas psicológicas do mediador sejam tomadas da psicologia, sua aplicação é muito diferente. O psicólogo investiga para conhecera passado e liberar o paciente da sua repetição. 0 mediador investiga para conhecer os reais interesses e não pretende exercer nenhum procedimento terapêutico, senão didático, ao ensinar com sua intervenção, urn modo de interrelactonar-se com a outra parte, mais benéfico _e inteligente. Também se diferencia do atuar do medico, que escuta os sintomas para construir um diagnóstico. Porque, ainda que o media- dor com sua escuta especial vá construindo um diagnóstico dos aspectos "doentes" da negociação, não age com fins terapêuticos, nem isola do "corpo" do problema os "órgãos" que perturbam o todo. Devo marcar que muitas vezes, sim, é como a do médico a função do mediador de decompor o problema em partes, para que os clientes possam ir resolvendo-as numa ordem de _crescente complexidade. Nesse sentido a atuação do mediador se assemelha- ria mais à do médico chinês que toma o organismo como um todo e descobre a origem da perda do equilíbrio desse todo, numa parte dele, e age para restaurar esse equilíbrio. Mas, é muito importante diferenciar que o mediador não introduz nem terapêutica, nem • medicina. Somente questiona para que um novo equilíbrio seja instaurado no relacionamento das partes, num planejamento de aproximação ao problema. Equilíbrio que só os clientes conhecem e que com total liberdade instauram se assim o desejam. 50 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Mais uma vez, o mediador está situado numa posição incômoda que não corresponde a nenhuma das profissões já existen- tes, e, sim, nesta nova no Brasil, a de mediador. O mediadordeve falar para conseguir que o cliente fale, e, sobretudo, para que o cliente se questione. É esse outro ponto_ _ importante que o diferencia: o pensamento de que só o cliente sabe o que é melhor para ele. Não adianta ser profissional de grande experiência, se isso não nos conduz a investigar para chegar ao verdadeiro conhecimento de nossos clientes. Temos descrito como o ser humano é um ser cindido, e que a presença do inconsciente no consciente se manifesta no próprio discurso do cliente. 0 cliente se expressa com suas palavras e gestos. Compreendê-lo é ouvi-lo. Ele apresenta problemas pessoais que não devemos transportar a outros clientes. Devemos diferenciá-lo em sua característica pessoal e única. 0 homem de que trata a mediação, não é o homem seguro de si, coerente, senão um homem fragmentado, cheio de contradi- . ções e de dificuldades no reconhecimento de seus desejos. E não estou falando só do cliente que recorre à mediação por problemas familiares, senão também dos clientes que consultam por problemas comerciais e de qualquer outra espécie. O homenise envolve com seus afetos, suas contradições, enfim, corn todas suas característi- cas, em qualquer uma das suas atividades. Pensemos num clientelue nos consulta pela dissolução de uma sociedade. Sente seus direitos em perigo, seu sócio como seu adversário e teme que o resultado não seja benéfico para ele. Já discutiu o bastante com seu sócio e chegou à conclusão que a Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 51
  • 26. sociedade não é mais possível, embora o capital, tempo e esforço investidos não possam serjogados pela janela. Esse homem está tão envolvido emocionalmente quanto um homem que tem problemas familiares. Eis aqui o grande trabalho do mediador: perceber estrutural - mente cada homem ou mulher como únicos e exclusivos, sendo seu - _ discurso o único que pode dar conta dele, servindo os esquemas da psicopatologia exclusivamente como artifícios úteis ao estudo do aparelho psíquico e não A sua aplicação direta ao cliente porque o reduziria a esse mesmo esquema, impedindo uma verdadeira escuta de sua individualidade. A escalada de violência que acompanha todo litígio com- promete o homem na sua totalidade. E os problemas que se apresentam A mediação não são problemas simples, porque senão já teriam sido resolvidos em negociação direta entre as partes, ou entre os advogados que as assistem. Se chegam A mediação é porque precisam de um profissional que saiba atuar frente ao complexo da situação. Esses homems e mulheres estão tão compro- metidos com o problema, que precisam proteger-se dele, armando estruturas defensivas e gerando estratégias onde sua personalidade e todos seus preconceitos, ilusões e temores entram em jogo. 0 homem para defender sua integridade, elabora sintomas que aparentemente o o protegem da angústia, mas na realidade o confundem ainda mais. 0 discurso do cliente estará tão cheio de todos esses pre- - _ . .colLceitos, ideais, ilusões e temores que o devemos desarticulqr para . desativar os bloqueios que impedem a emergência dos reais interesses. Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 52 É só no discurso do cliente que surge a informação, e nosso trabalho como mediadores, é o de descobrir as possíveis vias de 'acesso aos seus reais interesses, eliminando as pedras que o próprio :mecanismo defensivo do cliente irá botando no caminho. Essa escuta especial apontará as portas de acesso, nas partes do discurso onde apareçam contradições, negações desne- cessárias, lapsus e outros equívocos ou esquecimentos que indi- quem uma fresta por onde se possa investigar o oculto. 0 cliente está comunicando algo sem dizê-lo. Com toda a profissionalidade o registramos para discretamente questionar sobre esse ponto, fazendo de conta que não compreendemos totalmente. Remarcamos essa fresta para que o cliente fale dela e deixe surgir o oculto. É uma informação, que mediador e cliente precisam escutar, para reconhecerem melhor quais são os desejos e inte- resses verdadeiros que o cliente comunica ocultando. Todo homem que sente emoções fortes, onde socialmente se indica que não deve senti-las, é um homem armado. Armado e protegido. Sabemos que a melhor proteção que um cliente tem é o discurso estruturado da posição. E, lamentavelmente, também sabe- mos que o pior para resolver problemas é enfrentarmo-nos com clientes fechados em suas posições. Por isso o mediador deve gerar confiança e respeito, para elo que se acredite nele e assim conseguir que o cliente se abra com 0 franqueza, sem medo de sertraido, expondo suas fraquezas, seguro e de que elas não serão usadas contra si mesmo. 40 0 cliente só confia quando se sente ouvido e compreen- dido. 0 compreendemos, quando reconhecemos os fracassos dos c) mecanismos defensivos que ele usa para se proteger e podemos ir Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 53 410
  • 27. •••••••••••••••••••••••••••••••••• desarmando-os para obter o surgimento de um discurso mais ligado ao queréalmente lhe acontece. Enumerar-a série de mecanismos defensivos estudados pela Psicologia sei-ia criar mais uma armadilha para o mediador, pois, de que nos serve•conhecer esses mecanismos e deixar de escutar o cliente para reconhecê-los no seu discurso? Estaríamos novamente errando o caminho. t:Jrridio_p -CM marcará o ponto onde é necessária a nossa intervenção: sinais que o cliente vai dando; contradições entre o discurso e os gestos; interrup_ções no discurso; inflexões de voz; negação que afirma, etc. Com nossa atuação o _ liberaremos dessas pressões e ele p6derá começar a falar, mais livremente, do que lhe está acontecendo. Essa é a razão do uso das entrevistas a sós com cada uma das partes (caucus)), com o compromisso de absoluto sigilo, pois, uma vez colbcado o problema, o que queremos é investigar a fundo com cada uma delas o verdadeiro interesse. A sós com o mediador, o cliente poderá expressar-se mais à vontade. Porque o mediador deve ter bem claro que a mulher ou o homem que o consulta está envolvido numa série de compromissos consigo e com o seu ideal, pelos quais o.conflito.que o traz tem para ele um significado muito mais amplo. Significa sua autoestima, o . . _ carinho e respeito de sua família e de seus colegas de seus . _ superiores. e o_reçonhe5imento de que esta agindo A altura das _ circunstancias. Tudo isto deixa-o confuso e incapacitado para com-.. preender o que realmente deseja e que resultado será o melhor. Todas estas dificuldades para decidir contribuíram para que a sociedade, durante tanto tempo, precisasse depositar num terceiro a responsabilidade de decidirsobre seus próprios problemas, pois, deixarque um terceiro decide por nós, nos libera da responsabili-, :•- dade e da angustia da decisão. 0 mundo tem passado por grandes mudanças e ainda continua. Essas mudanças também se produzem no plano indivi- dual, e a aparição da mediação como uma nova forma de solucionar nossos conflitos interperssoais 6,* sem dúvida, um claro indício. Nós, mediadores, temos a responsabilidade de conduzir essa mudança e devemos fazê-lo com cuidado e dedicação. Não podemos errar em nosso trabalho como mediadores, com o risco de abortar uma das mais brilhantes técnicas que muito pode ajudar sociedade. Se o cliente que consulta é um homem ou uma mulher fragmentado e inseguro de si, o mediadortambém o 6, e por isso deve ser consciente dessa condição e cuidar pare que, no exercício de sua atividade evite, tanto quanto possível, os efeitos prejudiciais de um comportamento ou atividades inadequados. Estamos determinados, clientes e mediadores, porprecon- ceitos pessoais, familiares e sociais que nos levam a simpatizar com uma pessoa mais que com outra, acreditar mais em Lima pessoa que em outra. 0 mediador deve estar alerta não só aos mecanismos: defensivcs dos clientes, senão aos própriós. Enquanto escuta deve_ . _ _ também questionar-se sobre o cfue está sentincio_e pepsando,_pa,ra dominar esses pensamept6s. clientes. a_carninh65 e soluções que são os do mediador e não os dos clientes. 54 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 55
  • 28. e e e e e e o G o e e o e e e e o e e e o e Capítulo 4. A INTER-RELAÇÃO ENTRE MEDIADOR E CLIENTE. JA temos abordado as técnicas que devem ser usadas para guiar os clientes a reconhecerem seus interesses e a . poderem discutir, para chegarem a possíveis acordos onde esses interesses sejam respeitados. Mas há uma especial informação que recebemos dos clientes e que não procede diretamente de seus discursos, nem de seus gestos ou contradições e, ao mesmo tempo, está contida em tudo isso. Normalmente chamamos de "intuição" ou de "experiência profissional" essa. idéia ou apreciação spbre p_cliente, que nos aparece como uma ocorrência, e que, bem usada, nos serve muito no progresso ou avanço da mediação. Até, às vezes, é salvadora, nos momentos de estancamento do processo de mediação. É importante que nos aproximemos a uma explicação mais cientifica dessa "intuição", para que possamos usá-la com mais seletividade e critério. Para isso os conceitos transferência e contratransferência são os que melhor explicam este mecanisaa. . Em psicanálise, chama-se transfefaizasz¡et.cisrlaaa. sias idéias que ocorrem no paciente, durante o trabalho terapêutico, a respeito da fipura do terapeuta Ele passa a ser investido com os atributos de um olajeldniejjor e anterior do paciente, com quem teve um modo relacional, real ou imaginário, que o paciente, inconsciente- mente, quer repetir. Essa transferência tem como 'aspecto positivo a possibili- Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 57 8
  • 29. I•••••••••••••••••••••••••••••••••• dade de se apresentar para ser analisada e deixar o paciente livre dessa repetição compulsiva. Mas ao perder-se, com sua aparição, a dimensão de trabalho terapêutico, transforma-se em negativa ao opor resistência a esse trabalho. Em clientes enfraquecidos psiquicamente, por estarem atravessando um conflito, podem apresentar-se situações transferen- ciais sobre o mediador. Estas situações se delatam quando o cliente expressa, com atitudes ou comentários, uma imagem do mediador, alheia ao seu comportamento e personalidade reais. É fundamental Clue o mediador, na primeira etapa, -se • apresente, assegurando aos clientes confiabilidade e neutralidade, assim como o suficiente profissionalismo para que os clientes possam trabalhar certos de sua eficácia. Quando o cliente expressa ao mediador sua satisfação exageradamente, porsentir-se protegido ou cuidado por ele, com respeito ao outro em litígio, pode estar significando uma transferência que o mediador deve saber neutrali- zar através de frases de apoio a que se sinta compreendido e frases de limite, ao reiterar-lhes que as diias partes serão assistidas por ele, por igual. Os clientes intentarão, acostumados ao modelo de litígio, onde cada um deve convencera um terceiro que decide (juiz), de sua verdade, "comprar/conquistar" ao mediador par a . que o favoreça. ,::- Esta atitude tanto pode ser através do intento de sedução como de ::-.- comovê-lo, mostrando-se vítima, coitada, que precisa de socorro. Outras vezes tomam atitudes mais agressivas através de ameaças - de abandonar a mediação, tentando ferir o orgulho profissional do mediador, ou com a direta ameaça de desprestigiá-lo, corn uma alusão aos comentários negativos que de seu trabalho seriam feitos, 58 Teoria e Práticada MEDIAÇÃO caso o mediador não os "favoreça" . Todas estas atitudes, muito alheias da situação de media- ção e do papel de neutralidade do profissional mediador, são expressões de uma transferência, em que se procura fazer com que ele atue como uma figura forte, paternal ou maternalmente, prote- gendo, amparando, e ate reivindicativamente, fazendo "justiça" maneira do héroi salvador. Outra maneira de possível transferencia se manifesta através de atitudes de desconfiança e de ceticismo. O mediadordeve ter especial cuidado com essas expressões e neutralizá-las, porque elas podem conter reais dúvidas com respeito ao profissional, assim como desejos inconscientes do cliente de procurar "apanhar/ser castigado" e chegar a acordos onde seja danificado, para continuar mantendo compulsivamente a sua idéia de que todos querem prejudicá-lo, imaginando-se sempre vitimado. Todas essas atitudes devem ser neutralizadas através da necessária repetição das regras da mediação: que são os clientes que devem descobrir, defender e harmonizarseus interesses corn os da outra parte. mediadordeve ser um terceiro neutral que, fundamental-_ . mente estejá tercerizando 12, introduzindo continuamente, o modo de interrelação que deve existir, entre seus cliente, de respeito, _de expressão e de escuta, e de harmonização dos interesses de ambos, por isso que aigumas vezes .o mediador intervém, reforçando a 12 Quando falamos de tercerizar, é assumindo que o modo de inter-relaciona- mento de duas pessoas é tercerizado pela relação em si. 0 matrimônio é a tercerizaclo de um casal. Os modos em que dois comerciantes tern levado seu relacionamento comercial os terceriza. 0 mediador com seu agir introduzentieziEftenentes uma nova tercenzarao, a de respeito e mútua compreensão. Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 59
  • 30. 000di•••00•9000040000@s300000000000 defesa dos interesses de um dos clientes, sempre através de perguntas, direcionadas a obter o incremento de uma oposição enfraquecida ou a abertura de uma posição estruturada e autoritária demais. 0 maior cuidado que o mediador deve ter na sua interven- ção é analisar se a mesma está guiada, por exemplo, por uma real falta de luta de uma das partes em defesa dos seus interesses, ou por questões pessoais do próprio mediador, que se tem comprometido, inconscientemente, com a defesa de um dos clientes em detrimento do outro. Eis aqui, que o mediador deve cuidar especialmente da sua contratransfèrencia. Assim chamada, em psicanálise, os pensa- mentos e sentimentos ocorridos no terapeuta, durante o trabalho terapêutico. A contratransferéncia tem seus aspectos negativos e positivos e sempre deve ser conhecida e neutralizada pelo terapeuta. Seu aspeto negativo é que o mesmo profissional confunde seu papel terapêutico, num intento inconsciente, de reiterarsituações não resolvidas da sua história pessoal, passando a envolver-se numa trama ou representação cênica, onde os papeis de paciente e terapeuta se diluem numa "re-apresentação" de outro relacionamen- to entre outros personagens. Seja porque caia vítima da sedução de um dos pacientes ou por caraterísticas próprias, uma confusão dessas assegura o fracasso da terapia. Ao mesmo tempo a análise dos pensamentos, sentimentos e associações em geral, que aparecem no terapeuta durante o trabalho com um paciente pode ser de grande utilidade, ao permitir- lhe compreender processos psíquicos do paciente, não expressados 60 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO no discurso, mas contidos nele. No mediador sempre surgem sentimentos e pensamentos no transcurso da mediação, referentes aos seus clientes. Elesdevem ser bem conhecidos pelo mediadorpara diferenciar os originados por seus preconceitos e associações psíquicas pessoais, que limitarão seu trabalho, daqueles que contribuirão com luz na compreensão de seus clientes e que, explicitados, podem ajudá-lo, e muito, no processo de mediação. Podemos deduzirque a transferência na mediação sempre negativa e deve ser neutralizada corn a reafirmação da terceriza- cão estrutural que o mesmo trabalho de mediação impõe. Não estou falando do bom "raport" necessário entre clientes e profissional, mas do intento de confundir o mediador com outra figura. Não sucede o mesmo com a contratransferência, que pode ser enormemente negativa quando se origina das limitações psíqui- cas do mediador ou de grande ajuda, quando vem em nosso socorro contribuindo com novas informações sobre nossos clientes. O profissional mediador tem que ter o necessário auto- conhecimento para diferenciar, rapidamente, se o que Hie ocorre, com relação a seus clientes, está limitando-o na compreensão do problema ou está lhe trazendo conhecimentos importantes sobre eles. Igualmente, toda informação que apareça, contratransferen- cialmente, no mediador, deve .este, apresentá-la a seus clientes como investigação e questionamento, nunca como afirmação, pois, o importante é que os próprios clientes cheguem A descoberta dessa informação e A sua confirmação, e não que a recebam como um dogma emanado do mediador. Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 61
  • 31. • • • • • • • • • Vejamos um exemplo para ilustrar a contratransferência. Um casal se apresenta à mediação para resolver seu divórcio. Ele se apresenta bem vestido, como um executivo, que era, com pele bronzeada e atitudes sérias e firmes. Ela, usando roupas muito simples, embora de muito boa qualidade, expressando-se com termos cultos e falando pausadamente, apresentava-se como quem insistia na separação e aceitava qualquer condição que ele impuses- se. Comecei a sentir, cada vez que ela falava, muita pena por ela e, ao mesmo tempo, nenhum desejo dê ajudá-la, junto de uma insistente desconfiança na veracidade da sua posição. Ao refletir sobre isso e estar certo de que não se originava de nenhum preconceito ou especial inclinação psíquica minha, concluí que era importante investigar se esses pensamentos e sensações que eu tinha correspondiam a uma modalidade especial de relacionar-se da mulher. Num momento em que ela repetiu sua frase preferida: "que ele decida", aproveitei para perguntar-lhe, se ela habitualmente despertava sentimentos de compaixão entre seus amigos. Imedia- tamente ela deixou de falar, ficando numa atitude reflexiva, enquanto ele, deixando a sua postura rígida, relaxou-se e começou a falar de como todos os amigos deles estavam sempre tomando partido por ela, tentando protegê-la, enquanto ele era acusado de ser quem dominava a situação toda e abusava disso. Com voz emocionada, ele confessou que, na realidade, quando estavam a sós, ela pro- gramava como deviam ser todas as coisas e que ele só se apre- sentava como o porta-voz dessas decisões, que ela não assumia, mas dizia aceitar. Ela reagiu, levantando a cabeça, e com olhos brilhantes, sorriu e explicou que considerava ser o homem quem devia assumir as decisões e apontar os objetivos de um casal e que, como seu marido era fraco e indeciso, ela teve que assumir esse papel, com o cuidado para que ninguém o percebesse, para, segundo ela, cuidar da imagem masculina de seu marido. Eu os fiz compreenderem que essa simulação não era mais necessária e que, desde aquele momento em diante deviam ser os dois como realmente eram, já que suas vidas começariam a ser individuais e a cada um deles corresponderia dirigi-la de forma pessoal. A mediação era o melhor espaço para começar a se mostrarem e assumirem a reflexão e decisão da separação em conjunto, mas como duas individualidades. Desde aquele momento ela começaria cada tema dizendo como deveria ser resolvido e ele, sem pressões, começou a divergir com muito critério. Ao início ela surpreendeu-se da capacidade dele de pensar e de dissentir, e de confessar que não o tinha antes feito para não gerardiscussões que podiam Fê-los levado à ruptura, mas, agora, que a decisão de separação tinha sido tomada e que o jogo tinha sido descoberto, ele sentía-se livre para dizer o que pensava e desejava. Como se vê neste exemplo, é fundamental que o mediador se questione sobre os pensamentos e as emoções relativas a seus clientes, que lhe aparecem, para conduzir com sucésso a mediação. Esse uso da contratransferência deve ser exercitado conti- nuamente, pois será a experiência que assegurará ao mediador a eficácia de seu uso. Faz-se necessário reiterar o alerta sobre os aspetos nega- tivos da contratransferência, quando se origiha em limitações psíqui- cas do mediador. 62 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Teoria e Práticada MEDIAÇÃO 63
  • 32. 000000000ir00000000eDO1000• - Muitos mediadores tentam assumir um papel rígido com seus clientes, pretendendo que a distância operativa profissional possa protegê-los de interferir negativamente na mediação. Considero que a pouca experiência inicial deve guiar um mediador a ser muito cauteloso e formal, mas, na medida em que possa adquirir confiança, é fundamental que extraia informação da contratransferência para enriquecer seu trabalho, fazendo-o mais criativo e aprofundar-se na condução de seus clientes na busca de soluções mais realistas e portanto, mais duradouras. 0 conhecimento de todos os pensamentos e emoções é fundamentaI.Se o mediador não possui a técnica para utilizá-los, deve então neutralizá-los para que não incidam em demasia no seu trabalho. Todos estamos envolvidos em tramas de preconceitos e prejulgamentos conscientes e inconscientes. Os que operam, limi- tando-nos enormemente, são os esquemas inconscientes que fomos incorporando ao longo de nossa vida e que, sem conhecê-los, guiam nossas ações, pensamentos e sentimentos. É habitual entre os advogados dizer-se que tal ou qual juiz, a cargo de uma causa, tem inclinações favoráveis ou contrárias ao caso que conduzem. Também escutamos isso de todos os profis- sionais que têm predisposição a atuar e reagir de determinada maneira, em alguns casos, de forma muito previsível. O mediadortem a obrigação de conhecer suas tendências melhor do que ninguém, porque deve guiar aos outros a liberarem- se de preconceitos e a encontrarem caminhos criativos para solu- cionarem seus conflitos. Compreendidos e aplicados, esses conceitos dão estruturalmente ao mediadoros meios para cumprirmelhorsua missão. 64 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO Capítulo 5. A MEDIAÇÃO •-• • 0 procedimento da mediação deve ser flexível, contem- plando as necessidades e os tempos necessários dos clientes para interrelacionar-se e poder, finalmente, chegar ou não a um acordo._ Podemos saber como começar (semelhante A partida de xadrez), mas nunca como continuará, nem muito menos como culminará. Cada cliente é um mundo especial e, segundo isso, o mediador tomará tal ou qual caminho dentro das regras de não-., impósição e imparcialidade. Como a mediação deve ficar liberada de rituais e de demarcações excessivas, somente indicar-se-ão estruturas (unida- des de tempo e objetivo) ou passos possíveis. Com plena conciência de que em muitas mediações se pularão etapas e em outras nos deteremos, e ate, em muitos casos, voltaremos a etapas já ultrapas- sadas. Sem serfundamental, é importante o meio ou local onde se desenvolverá a_medipção.. Dependendo do tipo de mediação, o importante é que seja num ambiente confortável. Muitos mediadores Impõem a mesa redonda sem lugares predeterminados, o que até permite ao mediador ver se as partes se sentam próximas ou muito separadas; se deixam um espaço para o mediador entre elas ou n5o. Outros mediadores1 3 preferem poltronas e cadeiras espalhadas pela 1994. 13 Lulz Fernando Gevaerd, Mediaçào de Conflitos. Cima, Rio de Janeiro, Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 65
  • 33. •••••••••••••••••••••••••••••••••• sala, sem aparentemente muito ordem, para que os clientes esco- lham a que seja mais confortável para eles. Este sistema é mais propício para mediações familiares, mas realmente pode ser aplica- do de modo geral. O importante é que não existam mesas ou poltronas que signifiquem oposição ou diferenciação de poderes, nem locais muito rígidos que não favoreçam a espontaneidade e a descontração. Muitos mediadores, atuando em função social, são solici- tados para mediar em centros comunitários, sedes de clubes e até em empresas sem nenhum preparo especial." 0 mediador deve tomar em consideração o ambiente, mas é ele quem deve criar o clima propício. Ou seja, em síntese, o mediador pode realizar a mediação em qualquer âmbito onde as partes possam sentar-se (estar confortáveis) e falar sem temores". O início. Alzuém quer tentar solucionar seu problema com a mediação. Hoje em dia, quando no Brasil, a mediação ainda não tem uma divulgação tão importante, são os advogados que aconselham seus clientes recorrerem a um mediador para dar uma solução satisfatória a seus conflitos. Em outros países do mundo, onde já tem se espalhado esta técnica de solução de conflitos, podem ser os clientes mesmo que procurem diretamente um mediador por referências de conhecidos "Andrew Floyer Acland. C6mo utilizar la Mediaci6n para resolver Conflictos en las organizaciones. Paidós, Buenos Aires, 1993. IS Em nosso serviço de mediação na Defensoria Pública do Paraná, media- mos numa sala de aulas, o que também possibilita que os estagiários assistam como ouvintes. 66 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO ou de outros' profissionais. Mas sempre assessorados por um advo- gado. Em países onde a mediação já é obrigatória e forma parte da seqüência antes de chegar ao juízo, muitos clientes assessorados pelos seus advogados preferem recorrer a mediadores privados, antes de correr o risco de, por turno ou sorteio, ter a obrigatoriedade de aceitar um profissional que pode não lhes agradar. Considera-se fundamental que um cliente consulte um advogado antes de recorrer a qualquer técnica para solucionar seu conflito, pois ele é quem esta especialmente treinado para informar se a mediação éo melhorcaminho para esse problema em particular. Além disso, o advogado vai fornecer um importante critério de realidade, a lei e a jurisprudência nas quais o juiz se basearia para ditar sua decisão. Os critérios que advogados e clientes devem tornar em consideração para escolher a mediação são os seguintes: eosição e direitos, de ambas as partes, equilibrados. Necessidade de siqi10. e celeridade na solução do con- flito. Desejosie mantel., aprimorar ou, ao menos, não deterio- rar9 relacionamento. . Compromisso afetivo muito .importante corn o proble: ma, a ser resolvido num clima que contenha e canalize essas emoções. Que não envolva ou trate delito. Podemos dizer que a maioria dos conflitos apresentados a um advogado cumprem com um ou mais desses requisitos. Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 67
  • 34. 0004060•• 6000000000000000001.0•011)0• Nos países onde a mediação vem funcionando há muito tempo, uma porcentagem superiora setenta porcento dos casos, que antes, recorriam à justiça, são resolvidos pela mediação. Nesses países já se incluem nas cláusulas contratuais de muitos convênios, a obrigatoriedade de recorrer à mediação, em caso de não cumprimento ou problemas no cumprimento do contrato. Assim, muitas empresas preservam o sigilo, cuidam do relaciona- mento com outras empresas, poupando tempo e. dinheiro. Além disso, a inclusão da obrigatoriedade da mediação nos contratos de trabalho fornece, à empresa e funcionário, a certeza de serem escutados e atendidos nos seus problemas. A mediação é um procedimento e, como tal, se constitui de uma seqüência de atos em uma certa direção. Embora não seja um procedimento inflexível, ela se faz cobrindo, em geral, seis etapas. • Etapa Primeira. A apresentação do mediador e das regras da mediação. 0 mediador é um profissional que cobra por hora trabalha.- . da, isso faz com que as regras sejam impostas antes de qualquer outra coisa para que os clientes, cientes de seu funcionamento, não percam tempo tentando repetir modos já conhecidos por eles das técnicas adversariais. Em resumo não percam tempo em brigas estéreis. Muitos .mediadores exigem a entrega prévia à primeira entrevista, de um relatório contendo os fatos maisimporiantes_do problema em discussão Pessoalmente acho muito importante que o primeiro contato com o problema seja escutado diretamente da 68 Teoria e Prática da MEDIAÇÃO boca dos clientes 16. É por isso que aponto a primeira etapa como a apresentação do mediador e das técnicas da mediação, embora outros autores a nomeiem em segundo- lugar. É fundamental que a apresentação seja breve e clara, pois os clientes estão ansiosos por começar a falar de seus problemas. Mas, repito, a apresentação não pode ser adiada, pois é o momento de expor regras que os clientes normalmente não conhecem e deverão conhecer desde o primeiro instante. 0 mediador deve agradecer -A presença dos clientes e ressaltar o positivo de terem escolhido esse meio pacífico para tratar seus problemas. Um breve resumo dos_antececlentes pessoais do. _ _ mediador pode ser útil se os clientes, nos telefonemas que fizeram para marcar entrevista, manifestaram seu interesse na pessoa do mediador alguma dúvida. É muito importante conhecer.a origem exata dos. plientes, oprieio pelo qual entraram em contato.conosco,_e ate as palavras que usaram para pedir uma entrevista. Por isso deve-se treinar a secre- tária para que registre as perguntas e saiba o que responder em cada caso. Uma boa introdução telefônica poupa tempo e malentendidos. Muitos mediadores assumem pessoalmente a marcação da primeira entrevista para estarem certos da informação a ser ministrada. Isso tem o inconveniente de parcializar o primeiro contato com uma só parte, epode ser entendida pela outra parte como sendo o mediador um profissional do oponente. Difei:ente é o caso de um procura para 16 A necessidade de estar bem Informado antes da primeira sessão de mediação, passa a ser necesárla quando o problema a discutir tem muitos antecedentes, comci nos problemas entre paises. (Caso Rio de la Plata, ou Israel-Palses Árabes) Também quando o problema é tão técnico que contém muitos estudos e informes de peritos. Teoria e Prática da MEDIAÇÃO 69