O documento apresenta informações sobre a obra "Lisbela e o Prisioneiro" de Osman Lins, incluindo: 1) Breve biografia do autor; 2) Contexto histórico da produção da peça nos anos 1960; 3) Sinopse da trama centrada na personagem Lisbela que se apaixona pelo funâmbulo Leléu preso na cadeia.
1. 1
Lisbela e o Prisioneiro –1961/63/64Lisbela e o Prisioneiro –1961/63/64
Prof. Welington FernandesProf. Welington Fernandes
Grupo Canastra Real, dir. Ricardo Batista (Cadinho), BH - MG
3. 3
Esboço biográfico de Osman LinsEsboço biográfico de Osman Lins
Osman Lins nasceu em Vitória do Santo Antão (PE), órfão de mãe desde
muito cedo. Aos 16 anos, mudou-se para o Recife, quando trabalha no
Banco do Brasil. Em 1940, casou-se e teve três filhas. Em 1950 ganhou
um concurso literário com o conto "O Eco“. Estreou na ficção com o
romance, "O Visitante", em 1955. Em 1958, estudou dramaturgia (foi
aluno de Suassuna).
Sua 1ª peça a ser encenada foi "Lisbela e o prisioneiro”, 1961.
No início dos anos 1960, viveu na Europa. De volta ao Brasil em 1966,
publicou contos, ensaios e a peça de teatro, "Guerra do Cansa-Cavalo".
Em 1970, tornou-se professor universitário de literatura brasileira.
Defendeu também uma tese de doutoramento sobre o escritor Lima
Barreto. Em 1973, publicou o enigmático e elogiado romance
"Avalovara”.
4. 4
Algumas de suas obras mais importantesAlgumas de suas obras mais importantes
- O visitante, romance, 1955.
- Os gestos, contos, 1957.
- O fiel e a pedra, romance, 1961.
- Marinheiro de primeira viagem, literatura de viagem, 1963.
- Lisbela e o Prisioneiro, teatro, 1963 (SBAT) e 1964 (Letras e Artes)
- Capa-Verde e o Natal, teatro infantil, 1967.
- Guerra sem testemunhas- o escritor, sua condição e a realidade
social, ensaio, 1969.
- Avalovara, romance, 1973.
- Lima Barreto e o espaço romanesco, ensaio, 1976.
- A rainha dos cárceres da Grécia, romance, 1976
- Missa do Galo-Variações sobre o mesmo tema, org. e part., 1977.
- Casos especiais de Osman Lins, novelas adaptadas para a Globo, 1978.
5. 5
Reencontro
Ontem, treze anos depois da sua morte, voltei a me
encontrar com Osman Lins.
O encontro foi no porão de um antigo convento, sob
cujo teto baixo ele encenava a primeira peça do seu
Teatro do Infinito.
A peça, Vitória da dignidade sobre a violência, não tinha
palavras: ele já não precisava delas.
Tampouco disse coisa alguma quando o fui cumprimentar.
Mas o seu sorriso era tão luminoso que eu
acordei.
José Paulo Paes
Singela homenagemSingela homenagem
6. 6
Antonio Candido considera que:
“Osman Lins foi passando do realismo corriqueiro para uma
notável inquietação experimental que o atualizava
incessantemente.
Avalovara representa na literatura brasileira atual um
momento de decisiva modernidade, porque o autor exerce
'uma vigilância constante sobre o seu romance, integrando-o
num rigor só outorgado, via de regra, a algumas formas
poéticas'. (...) se situa numa ambiguidade ilimitada”.
Fortuna críticaFortuna crítica
http://www.letras.ufscar.br/linguasagem/edicao21/artigos/arti
go16.pdf
7. 7
Acerca de Avalovara, prestigiado escritor (contemporâneo de
Osman Lins) Júlio Cortazar declarou o seguinte:
“Se eu tivesse escrito esse livro, poderia passar mais 20 anos
sem fazer mais nada”
Fortuna críticaFortuna crítica
http://www.osman.lins.nom.br/homenagem.asp?id=2
8. 8
Fundada pelos artistas Tônia Carrero, Paulo Autran e Adolfo
Celi, em 1956, a companhia foi formada por ex-integrantes
do TBC. Os princípios do CTCA eram: a interpretação isenta
de estrelismo, a preponderância do texto e a homogeneidade
estética. A busca de novos autores levou a CTCA a criar um
concurso de dramaturgia. (...) A obra vencedora da 2ª edição
do concurso foi Lisbela e o Prisioneiro, de Osman Lins, que
foi dirigida por Celi e Carlos Kroeber, em 1961.
Os textos nitidamente políticos, de grande aceitação, nos
grupos Arena e Oficina, não interessavam ao italiano que
fugira de Mussolini e que recusava qualquer vínculo entre
teatro e política.
Companhia Tônia-Celi-Autran – 1956/1962
10. Tonia Carreiro, A. Celi e Paulo AutranTonia Carreiro, A. Celi e Paulo Autran
11. 11
1961 – A renúncia de Jânio Quadros e a entrada do vice, João
Goulart, deflagra uma crise política no país.
A oposição, (UDN e PSD), acusa Jango, de estar planejando
um golpe de esquerda.
13/03/1964 – João Goulart defende as Reformas de Base;
19/03/1964 – 500 mil pessoas na Marcha da Família com Deus
pela Liberdade.
31/03/1964 – Tropas mineiras e paulistas saem às ruas; João
Goulart foge para o Uruguai;
09/04/1964 – Foi decretado o AI-1, que permitia aos militares
cassar os mandatos dos que se opunham ao regime militar.
Contexto histórico: início da déc de 1960
12. 12
Segundo dados apresentados por Zuenir Ventura na obra
1968 – O ano que não terminou, foram censurados:
“cerca de 500 filmes, 450 peças de teatro, 200 livros, dezenas
de programas de rádio, 100 revistas, mais de 500 letras de
música e uma dúzia de capítulos e sinopses de telenovelas”
A censura desempenhou papel fundamental na implantação e
na consolidação da ditadura, silenciando uns e servindo a
outros. Importante ressaltar que houve abençoados pela
censura, que construíram impérios de comunicações.
A censura: panorama
13. 13
Dias Gomes, que fora censurado pelo DIP, em 1942, voltou a
ser censurado em 1975: na véspera da estreia, a novela ‘Roque
Santeiro’ foi impedida de ser apresentada. A Delegacia de
Ordem Pública e Social (DOPS), descobriu que o dramaturgo
estava a adaptar o texto teatral “O Berço do Herói”, que ele
próprio escrevera em 1963 e cuja estreia (dirigida por
Abujamra) fora proibida em 1965. A história não foi ao ar,
acabou sendo substituída por uma reprise compacta de “Selva
de Pedra”. A obra (na verdade, uma versão dela) só foi
liberada dez anos depois, em 1985, trazendo Lima Duarte no
papel de Sinhozinho Malta, Regina Duarte (Porcina) e José
Wilker (Roque) como protagonistas. A novela tornar-se-ia um
dos maiores sucessos da televisão brasileira.
Casos famosos: Roque Santeiro, de Dias Gomes
16. 16
Sinopse e comentário – Sandra NitriniSinopse e comentário – Sandra Nitrini
Lisbela, filha do Ten. Guedes, delegado da Cadeia de
Santo Antão, forma par amoroso com o funâmbulo
Leléu, um Don Juan nordestino. Esse casal
anticonvencional assume riscos em nome de
sentimentos intensos. Lisbela foge com Leléu, no dia
de seu casamento com Dr. Noêmio, advogado
vegetariano, por isso mesmo, personagem destoante
do meio em que se encontra, alvo de muitas tiradas
cômicas. Ao marido, doutor, representante do
estabelecido e da segurança, a jovem prefere Leléu, o
artista de circo preso, com tudo o que este significa de
risco e subversão dos valores vigentes.
17. 17
Sinopse e comentário – Sandra NitriniSinopse e comentário – Sandra Nitrini
Lisbela é a única mulher que atua em cena; é ela quem
livra Leléu da morte, ao ‘atirar’ em Frederico, quando
este apontava a arma para Leléu. Dessa forma, parece
e julga ter se tornado uma criminosa, colocando o pai
numa situação incômoda. Para livrar a própria filha da
cadeia, este usará expedientes comprometedores para
a lisura de uma autoridade, com o fito de ocultar a
autoria do suposto crime. No entanto, no desfecho da
peça revela-se que Frederico morreu de morte natural.
Por suas ações, Lisbela não apenas renega os
mesquinhos valores, mas também expõe as fraturas da
sociedade patriarcal.
18. 18
- Jaborandi – Soldado e corneteiro
- Testa Seca – Preso
- Citonho – Carcereiro
- Paraíba – Preso
- Ten. Guedes – Delegado
- Leléu – Aramista e prisioneiro (protagonista)
- Juvenal – Soldado
- Heliodoro – Cabo de destacamento
- Lisbela – Filha do Ten. Guedes
- Dr. Noêmio – Advogado, vegetariano e noivo dela
Personagens por ordem de aparição:Personagens por ordem de aparição:
19. 19
- Tãozinho – Vendedor ambulante de passarinhos
- Frederico – Assassino profissional
- Lapiau (José) – Artista de circo. Amigo de Leléu
Personagens sem fala ou apenas mencionados:
- Inaura – Uma adolescente seduzida por Leléu
- Francisquinha – Amante de Tãozinho
- Raimundinho – Abandonado por Francisquinha
- Dois soldados
Personagens por ordem de aparição:Personagens por ordem de aparição:
21. 21
Jaborandi – Aí, o rapazinho fez tãe, tãe, tãe, tãe...
Cada murro! Os bandidos chega viravam.
Testa-Seca – Isso é mentira.
Jaborandi – Mentira o quê? É verdade.
Testa-Seca – É mentira.
Citonho – Eu, por mim, só acreditava se visse.
Jaborandi – E eu não vi?
Citonho – Você viu no cinematógrafo.
Paraíba – E como foi que terminou?
Jaborandi – (...) o artista pegou um revólver no chão e
Jaborandi–soldado, corneteiro, cinéfiloJaborandi–soldado, corneteiro, cinéfilo
22. 22
meteu o dedo. Mas cadê bala? Aí, um bandido
apanhou um garfo (...) e partiu pro rapazinho. Ele foi
recuando(...)e trãe, pulou pela janela do décimo andar.
Citonho – Vai ver que nem morreu nem nada.
Jaborandi – Agora, só na próxima semana. (...)
Testa-Seca – (...) Quando eu cumprir a minha sentença
vou assistir uma série todinha, só pra torcer pela
quadrilha.
Jaborandi – Pois você perde o tempo, porque na
última série, queira ou não queira, os bandidos vão em
cana.
Jaborandi–soldado, corneteiro, cinéfiloJaborandi–soldado, corneteiro, cinéfilo
25. Intertextualidade: ‘El burlador de Sevilla y
convidado de piedra’, C. 1630 – Tirso de Molina
e ‘Don Giovanni’, 1787, de Mozart e Da Ponte
25
26. 26
Lapiau – Mas Leléu, nunca pensei que você ficasse
em cana. Você tinha escapado de tantas.
Testa Seca – De quantas? Isso é que a gente quer
saber. De quantas?
Lapiau – Quem sabe lá? De muitas. Qual foi o erro
aqui, Leléu?
Leléu – Ela não tinha nem dezesseis anos. Quinze
anos somente. E o pior é que eu sabia.
Lapiau – Quinze anos! Foi por isso que você nunca
me disse nada?
Leléu – Foi.
Característica: juanismo – 2º AtoCaracterística: juanismo – 2º Ato
27. 27
Lapiau – E você queria bem a ela?
Leléu – Não. Nem isso. Eu vi um dia quando ela
passou. Tão nova! Aqueles peitos rombudos (...) Aí,
uma voz me disse: “você só tem poder para as
mulheres de 28 anos. Ou de 25. Pra uma assim você
não existe”. Então eu quis provar que isso era mentira.
(...)
Leléu – E depois de tudo, não valeu a pena. (...) te
garanto. Foi tão fácil, menos de oito dias. Qualquer
besta podia ter feito o mesmo. Ela é dessas (...) que
ninguém no mundo pode conquistar, porque já
Característica: juanismo – 2º AtoCaracterística: juanismo – 2º Ato
28. 28
Lisbela – Leléu, por que você é assim? Por que tem
sempre que mudar de ocupação? De nome? Vagando
pelo mundo e trocando de mulher, sem ficar com
nenhuma?
Leléu – É minha sina.
Lisbela – Você quer assim. Não existe um nome que
lhe sirva? Não existe mulher que lhe mereça?
Leléu – Não me largue pilhérias.
Lisbela – Você não está respondendo.
Característica: funambulismo – 2º AtoCaracterística: funambulismo – 2º Ato
29. 29
Leléu – Quando eu era pequeno... Eu nasci num lugar
chamado São José da Coroa Grande. Um dia, a gente
ouviu dizer que o Zepelim ia passar por lá. Foi um
alvoroço! (...) São José – a senhora conhece? – é uma
praia. Devia ser no verão (...) e a noite estava tão
bonita. Eu tinha uns oito anos. Quando vi, foi aquela
beleza atravessando o céu. Me esqueci de tudo e sai
andando atrás daquela claridade. Parece que estou
vendo. Fui andando, fui andando e me perdi. Todos
me procuravam. Eu ouvia aquelas vozes me chamando
longe... E assim tem sido a minha vida, sempre me
perdendo atrás do que é bonito.
Característica: funambulismo – 2º AtoCaracterística: funambulismo – 2º Ato
34. 34
Frederico – Vou lhe dizer, velhinho. Meu nome é Vela
de Libra por causa da minha religiosidade. Toda vez
que sou forçado a sacar a moela de um cristão, vou na
primeira igreja que encontrar, acendo uma vela de
libra e rezo um padre-nosso pela alma dele.
Citonho – Mas sacar a moela, por que? (...)
Frederico – Por encomenda. Pode haver serviço mais
maneiro que matar gente? (...)
Citonho – (...) E você tem mesmo coragem (...), rapaz?
Frederico – Coragem, não tenho não. Eu tenho é
costume.
Frederico – ameaça – 1º AtoFrederico – ameaça – 1º Ato
35. 35
Frederico – Pois foi coragem muita. Você se meteu
entre a cruz e a caldeirinha. Dum lado, os chifres do
boi; do outro, o meu 38. Você podia morrer das duas
mortes.
Leléu – a morte é cobrador sério(...)só recebe uma
vez.
Frederico – Você me parece que é corajoso e sabido. É
bom dever favor a um homem de coragem (...) O que
que você quer em pagamento?
Leléu – Muita bondade sua.
Frederico – Deixe de dengo, rapaz. Manda o serviço.
Frederico – proteção – 1º AtoFrederico – proteção – 1º Ato
37. 37
Heliodoro – Você não sabe que eu não sou sargento?
Por que não chama ‘Cabo Heliodoro’?
Leléu – É porque o senhor tem toda a pinta de
sargento.
Heliodoro – Conversa! (...)
Leléu – O senhor sabe o que eu queria ter, sargento?
A força dos touros. O aprumo de um cavalo puro-
sangue. (...) E livre, (...) como o vento num pasto. (...)
Heliodoro – Você às vezes tem um jeito enfeitado de
falar. Essa é a minha desgraça, não sei dizer uma coisa
desse jeito. (...)
Leléu, a lábia; Heliodoro, o ingênuo – 2º AtoLeléu, a lábia; Heliodoro, o ingênuo – 2º Ato
38. 38
Heliodoro – Você sabe que eu também tenho um fraco
por mulher? (...) Mas (...) tem umas que só podem ter
sido feitas pelo diabo. E é sempre com essas que a
gente se casa, isso é que é de morte.
Leléu – Mas Heliodoro, que tristeza! Eu fazia de você
um homem bem casado!
Heliodoro – Ora, bem casado! A mulher parece um
papagaio.
Leléu – É verde?
Heliodoro – Quisera eu. Fala sem parar, é pior do que
um rádio. (...) Dá até vontade de arranjar outra mulher.
Leléu, a lábia; Heliodoro, o ingênuo – 2º AtoLeléu, a lábia; Heliodoro, o ingênuo – 2º Ato
39. 39
Testa-Seca – Se Lapiau não lhe passar a corda, onde é
que você vai arranjar uma?
Leléu – Com o Ten. Guedes. (forte riso de mofa) Qual
é a graça? Não viram ainda agora o meu falar com a
moça? (...) É ela que vai fazer o pai me dar a corda.
(...) E sabe pra que é que Lapiau vai bancar o frade?
Pra casar de mentira o Cabo Heliodoro. Em paga, o
Cabo vai servir de leva e traz pra mim. (...)
Em seguida, começam a solfejar Vassourinhas.
Entram Citonho e Jaborandi; começam a dançar. De
repente, os presos se calam.(...)
Leléu, instaurador da desordem – 2º AtoLeléu, instaurador da desordem – 2º Ato
40. 40
Ten. Guedes – Sim, senhor. Que falta de anarquia.
Este negócio aqui está virando frege, não é? Você
examinou de verdade essa viola, Citonho?
Cintonho – Examinei, Tenente.
Ten. Guedes – (A Leléu) Então, o cavalheiro também
gosta de música?...
Leléu – E quem é que não gosta, delegado? Quem
canta seus males espanta. (...)
Ten. Guedes – Não gosto que meus presos sejam
incomodados. Quero ver todo mundo satisfeito. (...)
Autoritarismo / Censura – 2º AtoAutoritarismo / Censura – 2º Ato
42. 42
Ten. Guedes – (...) O que que há com a menina? (...)
Lisbela – É sobre as minhas refeições, meu pai. Ele
acha que me alimento mal.
Ten. Guedes – (...) lá em casa, graças a Deus, ninguém
nunca passou fome.
Dr. Noêmio – Não se trata de quantidade, tenente. E
sim de qualidade.
Citonho – Dr. Noêmio, desculpe a indiscrição.
Andaram me falando de uma coisa, mas eu não quis
de maneira nenhuma acreditar. Me disseram que o
senhor é de uma raça que só come folha.
Dr. Noêmio – advogado e vegetariano – 1ºDr. Noêmio – advogado e vegetariano – 1º
AtoAto
43. 43
Dr. Noêmio – advogado e vegetariano – 3ºDr. Noêmio – advogado e vegetariano – 3º
AtoAtoDr. Noêmio – Não, Tenente. O azar que eu digo é (...)
procurar sua noiva e não encontra-la de jeito nenhum.
Ten. Guedes – Como? Não encontra-la? (...) E o
senhor já foi na sua casa?
Dr. Noêmio – Já.
Ten. Guedes – E ela não estava?
Dr. Noêmio – Não. O que eu encontrei foi uma gaiola
aberta, (...) com um bilhetinho assim:
“O passarinho fugiu”. Estou de azar ou não estou?
45. 45
Leléu – (A Heliodoro) Então?...
Heliodoro – Tudo certo... (numa explosão) Mas você
vai morrer, não tem santo que lhe salve. Fui
conversando com a moça, ela me deu os traços do
sujeito que quer lhe degolar. Leléu, o homem é o
mesmo.
Leléu – Que mesmo, senhor?
Heliodoro – O mesmo que queria lhe fazer favor (...).
Leléu – Não.
Heliodoro – É ele. A moça de Coripós deu toda a pinta
do irmão.
Frederico – ambivalência – 2º AtoFrederico – ambivalência – 2º Ato
46. 46
Lisbela tenta proteger Leléu. Ele a corteja – 2º AtoLisbela tenta proteger Leléu. Ele a corteja – 2º Ato
Lisbela – Leléu, vou pedir a meu pai (...) O juiz pode
mandar você para o Recife.
Leléu – Não.
Lisbela – Lá você fica seguro. (...)
Leléu – Não quero ficar longe da senhora. A senhora é
minha paz, dona Lisbela. (...)
Lisbela – Você sabe que eu estou pra casar. (...)
Leléu – A senhora não é noiva no seu coração. (...)
Lisbela – Pois é, eu dei minha palavra e minha mão.
Leléu – (...) a senhora pra mim é a bandeira brasileira.
(...) Sabe que a bandeira grande só recebe o vento se
estiver presa num mastro muito forte?
47. Lisbela tenta proteger Leléu. Ele a corteja – 2º AtoLisbela tenta proteger Leléu. Ele a corteja – 2º Ato
50. 50
Dr. Noêmio – Não é nada disso, Lisbelinha. É minha
esposa e devia estar em casa. Por que você foi?
Lisbela – Porque eu tinha de ir. (...) fui feito um andor,
na frente da procissão.
Dr. Noêmio – Você está variando. Isso é uma
profanação.
Lisbela – Fui com banda de música. Quando vi aquele
passarinho na gaiola... Pensei que minha vida inteira,
se eu ficasse, ia ser assim, vida de triste, de quem
desejou, de quem quis de corpo e alma e, mesmo
assim, não fez. Fui e vou toda vez que ele me chame.
Lisbela – transgressão e liberdade – 3º AtoLisbela – transgressão e liberdade – 3º Ato
52. 52
O que atrai Lisbela em Leléu é a liberdade – 3º AtoO que atrai Lisbela em Leléu é a liberdade – 3º Ato
Dr. Noêmio – E você vai deixar de querer-bem a mim,
Lisbela, pra querer um sujeito como aquele? Um
desclassificado? (...) um joão-ninguém, um vagabundo
Lisbela – Ele não é nada dessas coisas. É um homem,
isto sim.
Dr. Noêmio – Tenente! O senhor sabia disso? (...)
Lisbela – (a Dr. Noêmio) – Eu ia tentar. Ia tentar ser
uma boa esposa pra você. Ia tentar até deixar de comer
carne, ia tomar cuidado pra seu almoço de folhas não
murchar. Mas ele havia dito, que no dia que mandasse
o passarinho, eu devia espera-lo vestida de homem. E
que, se ele chegasse antes, esperava por mim.
54. 54
Frederico – (...) Vamos embora, senhor.
Leléu – Você vai (...) arrancar minha cabeça aqui. Eu
sei que você é irmão de Inaura! (...) O que se fez, se
fez. Você matar-me não vai consertar nada.
Frederico – Para com a tagarelice. (...)
Citonho (colocando-se entre eles) – Não vá não, Leléu
Frederico – Velho, não me tire a paciência. (...) vou
contar até cinco (...) Um... dois... três... (Quando vai
contar quatro,(...) ouve-se um disparo, mas é Vela de
Libra que cai. Entra Lisbela com a arma de Jaborandi)
Leléu – Lisbela! Minha bandeira brasileira!
Lisbela: heroicidade transgressora – 3º AtoLisbela: heroicidade transgressora – 3º Ato
55. 55
Leléu – Dona, vamos embora comigo. Agora sou eu
que quero ir.
Lisbela – Eu matei um homem. (...)
Dr. Noêmio – Ela não vai (...). Ela é minha esposa.
Leléu – A senhora tem de desaparecer (...) Vamos
embora comigo, não me custa mudar outra vez de
nome e de profissão. (...)
Dr. Noêmio – Ele vai lhe abandonar, Lisbela. Como
abandonou as outras.
Lisbela – Não me importa. Quero queimar a minha
vida de uma vez, num fogo muito forte.
Lisbela – atração pela liberdade – 3º AtoLisbela – atração pela liberdade – 3º Ato
56. 56
Lisbela – Quero ir.
Ten. Guedes – Lisbela!
Lisbela – Quero ir. Nunca serei feliz como esta noite,
junto dele ouvindo nas estradas as batidas dos cascos
dos cavalos.
Ten. Guedes – Seja feliz... se puder.
Dr. Noêmio – Tenente! (Lisbela e Leléu só para o
velho Citonho têm um gesto de afeição. Lisbela toma
a mão de Leléu. Vão saindo.)
Citonho – Aqueles dois vão dar certo: é o testo e a
panela.
Ten. Guedes – humanização pelo afeto – 3º AtoTen. Guedes – humanização pelo afeto – 3º Ato
58. InterpretaçãoInterpretação
Alguns pensadores contemporâneos (Zizek, Badiou,
Bauman e Lipovetsky), embora muito diferentes entre
si (e com diferentes propósitos), aproximam-se ao
considerarem o amor constante como uma expressão
da liberdade e como um antídoto para a excessiva
fluidez que caracteriza nossa época.
"Se o desejo quer consumir, o amor quer possuir.
Enquanto a realização do desejo coincide com a
aniquilação de seu objeto, o amor cresce com a
aquisição deste e se realiza na sua durabilidade. Se o
desejo se autodestrói, o amor se autoperpetua” - Bauman
59. Uma história sobre um amor libertárioUma história sobre um amor libertário