O documento discute a produção de mandalas por pacientes esquizofrênicos no Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro. As mandalas mostravam tentativas de ordenação e organização apesar das desintegrações internas causadas pela esquizofrenia, sugerindo uma compensação instintiva do inconsciente. C.G. Jung confirmou que as mandalas exibiam regularidade e tendência a formar unidade, compensando o caos do consciente.
3. Segundo a psiquiatria dominante, a cisão das diferentes funções psíquicas é
uma das características mais importantes da esquizofrenia.
Seria de esperar, muito logicamente, que as cisões internas se refletissem na
produção plástica pela ruptura, pela fragmentação das formas.
Certo, a disjunção, a fragmentação achavam-se frequentemente presentes na
pintura dos esquizofrênicos de Engenho de Dentro.
7. Surpreendentemente com as habituais desintegrações de formas, imagens
circulares ou tendendo ao círculo, algumas irregulares, outras de estrutura
bastante complexa e harmoniosa, impunham sua presença na produção
espontânea dos frequentadores do atelier do hospital psiquiátrico.
A analogia era extraordinariamente próxima entre essas imagens e aquelas
descritas sob a denominação de mandala em textos referentes a religiões
orientais, simbolizando a unidade do ser.
11. Uma escolha de imagens desse
tipo veio constituir um primeiro
álbum do acervo do Museu de
Imagens do Inconsciente.
Ali estava uma documentação
reunida empiricamente, mas as
dúvidas teóricas permaneciam.
Aquelas imagens seriam mesmo
mandalas?
Então, em 1954, a doutora Nise
escreveu uma carta a C.G. Jung,
enviando-lhe algumas fotografias
dessas imagens.
12. Resposta escrita pela colaboradora
de Jung, Aniela Jaffé:
“O professor Jung pede-me para
agradecer-me pelo envio das interessantes
fotografias de mandalas desenhadas por
esquizofrênicos [...]
Observou que os desenhos tem uma
regularidade notável, rara na produção dos
esquizofrênicos, o que demonstra
forte tendência do inconsciente para
formar uma compensação à situação
de caos do consciente.”
14. C.G. Jung define mandala:
“A palavra sânscrita mandala significa círculo, no sentido ordinário dessa
palavra. Na esfera das práticas religiosas e em psicologia refere-se a imagens
circulares que são desenhadas, pintadas, modeladas ou dançadas.
Como fenômeno psicológico aparecem espontâneamente em sonhos, em
certas situações de conflito e em casos de esquizofrenia.
Em tais casos é fácil verificar como o molde rigoroso imposto pela imagem
circular, através da construção de um ponto central, com o qual todas as
coisas vêm relacionar-se ou por um arranjo concêntrico da multiplicidade
desordenada de elementos contraditórios e irreconciliáveis, compensa a
desordem e confusão do estado psíquico.
15. Isso é evidentemente uma
tentativa de auto-cura que não se
origina da reflexão consciente mas
de um impulso instintivo.
Aqui, segundo a pesquisa pelo
método comparativo demonstra, é
feito uso de um esquema
fundamental, de um arquétipo
que, por assim dizer, manifesta-se
em toda parte sem de maneira
nenhuma dever sua existência
individual à tradição, tanto quanto
os instintos que não necessita ter
transmitidos pela tradição.”
17. O Centro Psiquiátrico do Rio de Janeiro contribuiu com numerosas pinturas e
modelagens pertencentes ao acervo do Museu de Imagens do Inconsciente, à
exposição de produções plásticas de esquizofrênicos realizada paralelamente
ao segundo Congresso Internacional de Psiquiatria reunido em Zurique,
setembro de 1957.
20. Jung visitou toda exposição,
detendo-se particularmente na
sala onde se encontravam as
mandalas pintadas pelos
clientes brasileiros fazendo
sobre o assunto comentários e
interpretações.
Nessa ocasião, uma foto fixou
Jung, a mão sobre uma
mandala, apontando-a com o
indicador. Este é um gesto que
por assim dizer resume a
psicologia Junguiana:
Apontar para o centro, o self,
simbolizado pela mandala.
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22. As mandalas aparecem de ordinário logo no período agudo do surto
esquizofrênico, exprimindo tentativas, esboços, projetos de ordenação. No
nosso ateliê esses projetos, configurados em Mandalas incompletas e
indiferenciadas predominam.
Segue-se exemplo de ordenação elementar onde os círculos vão sendo
incorporados a um círculo maior até que seus elementos se organizem em
torno de um centro numa mandala primária, em pinturas de João Heitor.
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26. A procura de um ponto central nas tentativas
instintivas de reconstrução da personalidade
faz-se de maneiras variadas. Algumas vezes a
busca do centro é um complicado recurso
labiríntico ou um caminho em forma de espiral.
28. Em todas as civilizações o
homem planejou aldeias,
vilas e cidades segundo
uma estrutura mandálica,
projeção no mundo externo
de sua estrutura psíquica.
Vila de pescadores - MÉXICO
30. A escala do simbolismo da mandala tem
ainda maiores extensões. É simultaneamente
microcosmos específico para o individuo e
símbolo arquetípico do macrocosmo.
31. O “Planetário de Deus”, segundo Carlos. No centro a
flor de ouro, símbolo do self e da divindade. Em baixo
cruzam-se duas serpentes negras, símbolos da
escuridão e do mal. Esta visão é uma espantosa
mandala macrocósmica, uma imagem do universo.
32. A mandala é símbolo que
exprime a situação total do
individuo e também sua visão
dos cosmos. As mandalas
tradicionais (cristã e budista)
dão grande ênfase à figura que
ocupa o centro – os demais
elementos dispondo-se em
torno dessa figura central.
33.
34. A pintura moderna reflete a situação interna
do homem de nossos dias, sua representação
sofreu grandes transformações.
36. Na arte psicodélica encontramos
também círculos com o centro
não demarcado, de cor unida
ou assinalado apenas por
um ponto que significa o
vazio ou o desconhecido.
37. Mesmo fora da influência de substâncias
psicodélicas, aparecem frequentemente
na arte contemporânea mandalas de
turbilhonante dinamismo.
39. Imagens que evocam
visões cósmicas que, nas
palavras de Pierre Malue:
convidam você a continuar
uma viagem sem fim
através do espaço e do
espirito, sempre além e
mais além.
Erwin Don Osen