Superstições e escravidão em fazenda de café no Brasil do século XIX
1. “Os negros”:
Temática: superstição cabocla e regional. – O causo.
Narrador personagem x Narratário: Jonas. – conto
metalinguístico (22 capítulos).
Espaço: região de cafezais.
Conflito inicial: “Dum preto velho que foi escravo
do defunto capitão Aleixo, fundador da fazenda, ouvi
coisas de arrepiar...” – Chuva x Casa assombrada.
“Também abobeiras viçavam na tapera, galgando
vitoriosas pelos espeques para enfolharem no alto,
entremeio das ripas e caibros a nu. Suas flores
grandalhudas, tão caras às mamangavas,
manchavam d’amarelo pálido o tom cru da folhagem
ver-negra”. – Descrição do espaço e uso de termos
coloquiais.
A construção do suspense: - “Cinco e meia. É tarde.
Em vez de Alonso, temos que gramar o Aleixo. E
dormir com as bruxas, mais a alma do capitão
infernal”.
“Era o casarão clássico das antigas fazendas
negreiras”.
Personificação: “a “casa-grande” se erguia”.
A superstição regional: - “Descabeçada” do moço.
Pra mim, castigo de Deus. Os filhos pagam a
ruindade dos pais, e o capitão Aleixo, Deus que me
perdoe, foi mau, mau, inteirado. Tinha fama! Aqui
em dez léguas de roda, quem queria ameaçar um
negro reinador era só dizer: “Espera, diabo, que te
vendo pro capitão Aleixo”. O negro ficava que nem
uma seda!...Mas o que ele fez os filhos pagaram.
Eram quatro: Sinhozinho, o mais velho, que morreu
“masgaiado” num trem; nhá zabelinha...
Uso de termos coloquiais: - “Suzinho, suzinho!” A
merência morreu faz três anos. Os filhos, não sei
deles. Criança é como ave: cria pena, avoa. O mundo
é grande – andam pelo mundo avoando...
Situação fantástica: Encontrei Jonas no mesmo
lugar, absorto em frente à casa. Estás louco, rapaz?
Não comeres tu, que estavas de fome, e ficares aí
como perereca diante da cascavel?
Inútil. Era um corpo largado da alma. Era um homem
“vazio de si próprio!” Assombrado com o fenômeno,
concentrei todas as minhas forças e, ajudado pelo
Bento, trouxe-o para casa.
A ironia com as superstições: E depois vem cá
arrastar correntes pelos corredores, hein? Como é
pobre a imaginativa popular! Sempre e em toda parte
a mesma ária das correntes arrastadas!
No caso da Liduína... era uma bonita crioula aqui da
fazenda. Muito viva, desde bem criança passou da
senzala pra casa-grande, como mucama de
sinhazinha Zabé... Isso foi... deve fazer sessenta anos,
antes da guerra do Paraguai. Eu era moleque novo e
trabalhava aqui dentro, no terreiro. Via tudo. A
mucama, uma vez que Sinhazinha Zabé veio da corte
passar as férias na roça, protegeu o namoro dela com
um portuguesinho, e foi então...
Pela madrugada começou Jonas a falar sozinho,
como quem se recorda. Mas não era o meu Jonas
quem falava – era o “outro”.
Presença da imigração: Narração do espírito de
Jonas.
Escravidão: Aportamos em África para recolher
pretos d’Angola, metidos nos porões como fardos de
couro suado comcarne viva por dentro.
Pobre criatura! Tinha alma irmã da minha e foi
compreender su’alma que pela primeira vez alcancei
todo o horror da escravidão.
Lépida, mimosa, travessa, a gentil crioula enfeixava
em si toda a artimanha da raça perseguida – e todo
gênio do sexo escravizado à prepotência do homem.
Mudança na estrutura literária: Português x
caboclo: “Eram duas, Inês, a caçula, e Isabel, a mais
velha, lindas meninas de luxo, radiosas de mocidade.
Eu as via de longe, como nobres figuras de romance,
inacessíveis, e lembro-me do efeito que naquele
sertão bruto, asselvajado pela escravaria retinta, fazia
a presença das meninas ricas, sempre vestidas à moda
da corte. Eram princesinhas de conto de fadas que só
provocavamuma atitude: adoração”.
Erotismo: graça com que ela, de cabeça eguida, boca
entreaberta, apresentava os pequeninos seios ao jato
das águas... os sustos e gritinhos nervosos quando
gravetos derivantes lhe esfrolavam a epiderme. Os
mergulhos de sereia na bacia e o emergir do corpo
aljofrado de espuma...
A segregação social além da condição racial:
Todavia, apesar de branco e livre, que abismo me
separava da filha do fazendeiro! Eu era pobre. Era
um subalterno. Era nada.
Caráter romântico: O ar embriagava, tanto era o
perfume nele solto. Abelhas aos milhares, e colibris,
zumbiam e esfuziavam numa delírio orgíaco. Era a
festa anual do mel.
A personalidade em conflito:
- Mas é um subalterno! – alegava o orgulho.
- Qu’importa, se é um moço rico de bons
sentimentos? – retorquiu a Natureza.
- E bem pode ser que fidalgo!... – acrescentava,
insinuante, a fantasia.
Reversão do perfil romântico: “Os sapos no brejal
coaxavam melancólicos”.
O amor através do olhar da escrava: “Tio Adão
diz que o amor é doença. Que a gente tem sarampo,
catapora, tosse comprida, caxumba e amor – cada
doença no tempo”.
O imigrante: “Só quem emigrou sabe a dor do fruto
arrancado à árvore”.
Capitão Aleixo – sadismo: Com o tempo
desenvolveu-se nele a crueldade inútil. Não limitava
a impor castigos: ia presenciá-los. Gozava de ver a
carne humana avergoar-se aos golpes do couro cru.
- Olhe! A tua noivinha é aquela parede...
Compreendi tudo: iam emparedar-me vivo...
Ruptura da história: Aqui se interrompe a história
do “outro”, como a ouvi naquela horrorosa noite.
Repito que não a ouvi assim, nessa ordem literária,
mas murmurada em solilóquio, aos arrancos, às vezes
entre soluços, outras numcicio imperceptível.
Era “ele” outra vez. O “outro” fugira com as trevas
da noite.