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Porque dependemos da
geodiversidade?
Os bens e benefícios que obtemos da
geodiversidade são essenciais à sobrevivência e
bem-estar, tanto dos seres humanos como de toda
a biodiversidade. A diversidade geológica contribui
para os serviços que a natureza presta.
José Brilha 15 de Outubro de 2022, 7:02
Os seres humanos utilizam recursos naturais desde sempre. A
designação de algumas fases da pré-história humana está mesmo
relacionada com os materiais que eram usados no fabrico de artefactos:
as idades da pedra, do cobre, do bronze e do ferro. A época histórica que
actualmente atravessamos já tem sido designada por idade do silício,
numa alusão ao intenso uso deste composto no fabrico de equipamentos
electrónicos. Mas a verdade é que, de alguma forma, pode dizer-se que
estamos ainda na idade da pedra, uma vez que continuamos
dependentes dos recursos minerais e energéticos para fabricar os bens
de que necessitamos com o objectivo de providenciar bem-estar e
prosperidade social.
Em Outubro, celebrou-se, pela primeira vez, o Dia Internacional da
Geodiversidade, aprovado em 2021 pela 41ª Conferência Geral da
UNESCO. Esta data será comemorada todos os anos, sempre a 6 de
Outubro, com a finalidade de sensibilizar a sociedade para o importante
papel que a geodiversidade tem como garante de sobrevivência e bem-
estar, tanto dos seres humanos como de toda a biodiversidade.
A geodiversidade corresponde à variedade de elementos não vivos da
natureza, nomeadamente minerais, rochas, fósseis, solos, formas de
relevo e paisagens, assim como processos activos de que são exemplos o
vulcanismo e a erosão. Este é o primeiro de cinco artigos que pretendem
assinalar a importância da geodiversidade.
Desde a década de 1970 que designamos os bens e benefícios provindos
da natureza por “serviços de ecossistemas”
. Esta designação é hoje
habitualmente usada para referir apenas os serviços obtidos a partir da
biodiversidade, deixando de lado a componente não viva dos
ecossistemas que é, em larga medida, assegurada pela geodiversidade.
Talvez um termo que se prestaria a um menor afunilamento do conceito
subjacente fosse o de “serviços da natureza”
, como aliás chegou a ser
proposto na referida década.
Os bens e benefícios que obtemos da natureza – tanto da sua
componente viva como não viva – são, principalmente, de quatro tipos:
regulação, suporte, aprovisionamento e serviço cultural. Vejamos então
como os elementos que compõem a geodiversidade contribuem para
cada um destes tipos de serviços.
Contributo para os serviços de regulação
No planeta Terra decorrem, desde há pelo menos 4300 milhões de anos
(idade mais antiga determinada até hoje em cristais de zircão da
Austrália), inúmeros processos que interagem e se autorregulam, criando
sistemas que proporcionam condições indispensáveis à existência de
vida, incluindo da espécie humana. A geodiversidade participa e
desempenha um papel crucial em muitos destes sistemas, como é o caso
do ciclo da água.
De toda a água doce que existe no planeta, cerca de 69% encontra-se
sob a forma de gelo nas calotes polares e nos glaciares, 30% circula em
aquíferos (rochas que, em profundidade, armazenam água nos seus
poros e fracturas) e apenas 1% se encontra à superfície em cursos de
água e lagos. Os aquíferos são assim um dos principais componentes do
ciclo da água, constituindo um elemento fundamental para o
abastecimento humano e a sobrevivência de outros seres vivos, com
destaque para os aquíferos em regiões áridas. A circulação da água nos
aquíferos e nos solos tem ainda um efeito de filtragem, contribuindo para
garantir a qualidade da água.
Um outro exemplo do papel da geodiversidade na regulação dos
ecossistemas relaciona-se com o controle natural de inundações. As
dunas litorais são acumulações de areia que evitam a entrada do mar
sobre as zonas continentais. De igual modo, as planícies de inundação de
rios e os estuários contribuem para que, em períodos em que o nível dos
rios sobe devido à ocorrência de precipitação elevada a montante, a água
se disperse por uma maior superfície, diminuindo deste modo a sua
velocidade de escoamento e contribuindo para reduzir eventuais danos e
perdas sobre outros sistemas naturais e infra-estruturas construídas
pelos seres humanos.
Contributo para os serviços de suporte
Ficamos maravilhados com a diversidade de fauna e flora no planeta, mas,
frequentemente, esquecemo-nos de que os ecossistemas resultam de
uma ligação estreita entre a geodiversidade e os seres vivos que nela
habitam. Esta relação, no entanto, foi há muito reconhecida: Alexander
von Humboldt (1769–1859), por exemplo, foi um dos primeiros a notar a
interdependência entre vegetação e altitude.
As dunas contribuem para atenuar os efeitos da acção do mar nas zonas litorais, como aqui na costa a sul de
Viana do Castelo Renato Henriques
A altitude de um local relaciona-se com o tipo e a idade das rochas aí
existentes, bem como com os efeitos da tectónica de placas que, ao
longo da história da Terra, levaram a sucessivos levantamentos de
cadeias montanhosas (orogenias), intercalados com fases erosivas que
arrasam as montanhas formadas.
A presença de grifos nas arribas de Miranda do Douro ou nas vertentes
do Tejo, nas Portas de Ródão, deve-se ao facto de estas aves nidificarem
em escarpas rochosas constituídas por materiais mais resistentes à
erosão, como é o caso de granitos e quartzitos, respectivamente. Em
grutas do Parque Natural das Serras de Aires e Candeeiros existem
espécies únicas que só se desenvolvem em habitats muito específicos,
condicionados pela geodiversidade, num processo de interdependência
ainda não totalmente conhecido. A geodiversidade é, assim, o suporte
fundamental para a vida de grande parte da biodiversidade terrestre.
No caso da espécie humana, também a geodiversidade se revela
imprescindível na construção das infra-estruturas características da
sociedade actual, apesar de esta circunstância passar, em geral,
despercebida. São rochas com os níveis de resistência adequados que
permitem a edificação de habitações, redes viárias e ferroviárias,
barragens e portos em superfícies suficientemente estáveis e duradouras.
É também nas rochas que armazenamos gás natural – e, no futuro,
possivelmente, hidrogénio –, que enterramos os resíduos radioactivos
produzidos nas centrais nucleares e construímos aterros onde
depositamos toneladas de resíduos domésticos e industriais.
Contributo para os serviços de aprovisionamento
São inúmeros os exemplos de como a geodiversidade oferece materiais
essenciais aos ecossistemas e aos seres humanos, em particular. Desde
logo, disponibilizando uma série de produtos utilizados na nossa
alimentação, como o sal (nada mais do que os vestígios de minerais que
se foram dissolvendo a partir das rochas ao longo de milhões de anos) ou
a água. Relativamente às plantas, as rochas e os minerais fornecem
nutrientes que são incorporados na biomassa produzida – caso do azoto,
potássio, cálcio, ferro, e outros – e que são posteriormente consumidos
pelos seres vivos. Já a maioria dos materiais de construção – cimento,
tijolos, aço, vidro – são fabricados a partir de rochas e minerais, assim
como o são todas as ligas metálicas, muitos produtos farmacêuticos,
fertilizantes e componentes destinados à indústria electrónica.
São as escarpas inacessíveis de quartzito que permitem a nidificação de grifos no Monumento Natural das
Portas de Ródão José Brilha
E a sociedade actual não seria possível sem a utilização de recursos
minerais energéticos: quer consideremos a combustão de
hidrocarbonetos (petróleo, gás natural, carvão) – que desejamos que seja,
um dia, pretérita e desnecessária –, quer avancemos na transição
energética com a utilização de energias renováveis como a água, o sol ou
o vento, em barragens, painéis e aerogeradores, o certo é que, por
enquanto, ambas as situações só são possíveis recorrendo à exploração
de rochas e minerais.
Central Fotovoltaica de Alcoutim: os painéis, que contribuem para produzir electricidade com baixas emissões
de carbono, necessitam para o seu fabrico de vários minerais de onde se obtêm elementos químicos como o
ferro, cobre, alumínio, silício, prata, níquel, zinco, cádmio, gálio e telúrio Nuno Ferreira Santos
Contributo para os serviços culturais
Por fim, a geodiversidade disponibiliza ainda um conjunto de benefícios
relacionados com aspectos culturais da nossa sociedade. Refira-se, a
título de exemplo, a explicação dada pela cultura popular às pegadas de
dinossáurios do Monumento Natural da Pedra da Mua: estas
representariam as marcas deixadas nas camadas calcárias do Cabo
Espichel pelas patas de uma mula que transportava a Virgem Maria ao
topo do promontório. Esta lenda acabou mesmo por servir de inspiração à
pintura dos painéis de azulejos existentes na Ermida da Memória, datada
do século XV.
As colunas de basalto no Pico da Ana Ferreira são um dos principais atractivos turísticos da ilha de Porto Santo
José Brilha
Alguns relevos rochosos são usados para actividades de lazer, como a
escalada em escarpas idênticas à da Meadinha, no Parque Nacional da
Peneda-Gerês. Há também formações geológicas que possuem um valor
estético tal que se convertem em atractivos turísticos, como as colunas
de basalto no Pico da Ana Ferreira, na ilha de Porto Santo, as inúmeras
caldeiras vulcânicas nas ilhas dos Açores ou a recortada costa algarvia da
Ponta da Piedade, em Lagos.
O casario granítico de Sortelha, assim como as muralhas que a rodeiam, reflectem a geodiversidade local José
Brilha
A construção de monumentos históricos e habitações com valor
patrimonial recorre habitualmente à rocha que existe em maior
abundância no seu entorno. A geodiversidade local está assim
directamente associada à identidade cultural dos territórios, como é bem
representativa a marca “Aldeias de Xisto”.
Finalmente, uma referência ao papel da geodiversidade no ensino e na
investigação em geociências: é devido à comunidade geocientífica que
conhecemos as características e impactos dos vários tipos de erupções
vulcânicas, que reconhecemos os ritmos de subida e descida do nível do
mar registados nas rochas, que sabemos o modo como os glaciares
moldam as paisagens, como os oceanos interagem com os continentes,
como se formam as montanhas, ou quando surgiu a vida na Terra e como
esta evoluiu. Todo este conhecimento é crucial para que a humanidade
consiga dar resposta a alguns dos maiores desafios que tem hoje pela
frente, como é o caso da crise ecológica relacionada, em grande parte,
com a mudança climática e a perda de biodiversidade.
Agradecimentos a Luís Lopes e Teresa Salomé Mota pela leitura e revisão
crítica do texto
Geólogo da Universidade do Minho e membro da Associação
Portuguesa de Geólogos
Aprender a viver com o que temos
Tudo o que usamos, se não tiver uma origem
orgânica, é feito a partir de matérias-primas
minerais. Para fabricar um telemóvel, por exemplo,
são usados mais de 60 elementos químicos, todos
concentrados a partir de minerais explorados em
vários países. Este é o segundo texto, de cinco,
dedicado à importância da geodiversidade.
José Brilha 22 de Outubro de 2022, 7:08
Roosevelt Cassio/Reuters
Sejamos claros: os seres humanos são completamente dependentes
deste planeta e não é previsível que, nas décadas mais próximas, seja
possível explorar recursos minerais em outros corpos do sistema solar.
Tudo o que usamos, se não tiver uma origem orgânica, é feito a partir de
matérias-primas minerais. Isto significa que teremos de gerir com
sabedoria, responsabilidade e respeitando os limites naturais, os recursos
geológicos existentes, desde os mais escassos e não renováveis, até aos
mais abundantes.
A humanidade encontra-se perante um problema complexo para o qual
será necessário contar com o conhecimento científico produzido pelos
geocientistas. Estamos no único corpo do sistema solar que, até à data,
demonstrou ter capacidade para albergar seres humanos e que nos
disponibiliza um conjunto finito de recursos que têm de servir uma
população crescente.
As Nações Unidas prevêem que seremos 8000 milhões a 15 de Novembro
de 2022 e estimam que este número continuará a crescer até cerca de
11.000 milhões, no final deste século, quando este crescimento,
previsivelmente, estabilizará. Na realidade, a taxa anual de crescimento da
população está já a decrescer, tendo atingido o seu máximo em 1968
(2,1%) e prevendo-se que seja de 0,1% em 2100.
O aumento da população humana confronta-nos com o consumo
crescente de recursos, não só porque há mais seres humanos no planeta,
mas porque muitos deles têm vindo, felizmente, a desfrutar de padrões de
bem-estar económico e social necessários a uma vida confortável e
simultaneamente mais longa.
Actualmente, 54% da população mundial tem saneamento básico e
tratamento de efluentes (era apenas 28% em 2000) e 74% tem acesso a
água de qualidade (62% também em 2000); o número de pessoas sem
acesso a electricidade reduziu-se em 59% nos últimos 20 anos e, em 200
anos, a taxa de população alfabetizada passou de 12% para 85%.
Geradores eólicos perto de Amesterdão, Países Baixos Yves Herman/Reuters
Esta evolução não é independente do facto de 85% da população mundial
viver em zonas urbanas (dados de 2015 da Comissão Europeia),
tendência que se vai acentuar. Todavia, é preciso não esquecer que há
ainda um longo caminho a percorrer até que todos os seres humanos
vejam satisfeitos o direito de ter uma vida digna.
Sabia que...
... a construção de painéis fotovoltaicos para um parque solar com uma
área de um quilómetro quadrado necessita de 11 toneladas de prata.
Actualmente, em cada ano, um cidadão europeu consome cerca de 14
toneladas de matérias-primas e produz cinco toneladas de resíduos.
Vejamos alguns exemplos:
Para fabricar uma bateria de 100 kWh para um automóvel eléctrico
são necessários dez quilos de lítio, processado a partir de minerais
(espodumena, ambligonite, lepidolite e petalite) ou de soluções
salinas. A mesma quantidade que é necessária para produzir as
baterias de dez mil telemóveis;
A construção de painéis fotovoltaicos para um parque solar com uma
área de um quilómetro quadrado necessita de 11 toneladas de prata.
Estima-se que, até 2050, a mineração tenha de aumentar 500% de
modo a satisfazer a procura exponencial por tecnologias
descarbonizadas;
São necessárias 67 toneladas de cobre para um único aerogerador
instalado ao largo da costa (off-shore), para as quais foi necessário
remover 50 mil toneladas de rocha e solo (cerca de cinco vezes o
peso da Torre Eiffel). Actualmente, existem cerca de 150 milhões de
toneladas de cobre nas redes eléctricas de todo o mundo;
Para produzir um telemóvel são utilizados mais de 60 elementos
químicos diferentes (arsénio, cobre, gálio, ouro, paládio, platina,
prata, tungsténio, lítio, cobalto, etc.), todos eles concentrados a partir
de minerais explorados em vários países do mundo;
O nylon e o poliéster usados na indústria têxtil, assim como as
diversas variedades de plástico usadas em inúmeros produtos, são
derivados do petróleo, um recurso geológico que tem muito mais
aplicações para além da produção de combustíveis;
Na produção do papel são usados diversos minerais como o talco, a
caulinite, a barite e o feldspato;
Alguns medicamentos e terapias médicas recorrem a elementos
químicos (antimónio, ferro, lítio, zinco, urânio, entre muitos outros)
extraídos de minerais;
A construção de infra-estruturas como casas, hospitais, escolas,
barragens, pontes, túneis e estradas necessita de milhões de
toneladas de rochas e minerais.
Este breve apanhado de exemplos é bem ilustrativo do desafio que temos
pela frente. Como a quantidade de recursos geológicos não aumenta e
sua demanda vai crescer nas próximas décadas, inclusive alguns até
recentemente nunca utilizados, temos a humanidade perante um
problema de difícil, mas urgente solução. E é óbvio que essa solução não
pode passar pelo aumento desenfreado da exploração de recursos
geológicos, até porque alguns destes recursos são raros, obrigando ao
seu transporte por milhares de quilómetros, à custa do consumo de
grandes quantidades de combustíveis fósseis.
A solução tem de passar por uma estratégia definida e posta em prática a
diversos níveis, que não comprometa o bem-estar da humanidade e seja
ambientalmente responsável, de acordo com o estipulado pelos
objectivos do desenvolvimento sustentável definidos pelas Nações
Unidas:
Mudar o actual modelo de produção e consumo para um outro
designado por “economia circular”
. Os produtos devem ser usados ao
máximo até esgotar o seu ciclo de vida, fazendo com que seja
necessário produzir menos e originar menor quantidade de resíduos;
Implementar de forma efectiva a reciclagem, reutilização e redução,
contribuindo, assim, para o decréscimo da exploração de recursos
geológicos e diminuindo, simultaneamente, o consumo de energia;
Incentivar a investigação em geociências de modo a descobrirmos
novas jazidas minerais e melhorar os métodos para a sua exploração,
reduzindo ao máximo os impactos ambientais negativos associados a
esta actividade;
É, aliás, importante continuar a investigação científica e tecnológica
de modo a permitir encontrar soluções que sejam menos exigentes
do ponto de vista da necessidade de utilização de recursos minerais
e energéticos.
Uma parte desta estratégia vai para além da definição de políticas e
legislação, devendo integrar uma componente de educação ambiental
que contribua para que cada cidadão esteja ciente da dependência que
temos da geodiversidade e, deste modo, contribuirmos também
individualmente para uma melhor gestão dos recursos naturais.
Durante o primeiro semestre de 2021, foram registados 5,4 milhões de
carros novos na União Europeia, para os quais terão sido necessários
muitos milhões de toneladas de matérias-primas minerais. Será que todos
estes novos veículos são mesmo imprescindíveis para assegurar as
necessidades de transporte dos seus proprietários?
No Centro Ciência Viva do Lousal (Grândola), os visitantes são confrontados com a necessidade de recursos
minerais para garantir a produção dos objectos que usamos no dia-a-dia DR
E, nos últimos dez anos, triplicou em todo o mundo o número de novos
telemóveis vendidos: hoje, são cerca de 1500 milhões todos os anos.
Acresce o facto de que, quanto maior for o desenvolvimento tecnológico
de um produto ou serviço, maior é a diversidade de minerais necessários
para a sua produção. Pensemos nos actuais 5G e na Internet das Coisas e
constatamos que a apregoada desmaterialização está assente numa
intensa utilização de matérias-primas minerais.
A poupança, reciclagem e reutilização de todo o tipo de produtos são não
só necessárias para diminuir a necessidade de exploração de recursos
minerais, como encontra justificações de natureza política, ética e social.
A recente ocupação da Ucrânia pela Rússia, que levou à imposição de
sanções económicas por parte da comunidade internacional, alertou o
público em geral e os responsáveis políticos para um aspecto que os
geólogos há muito conhecem. Os recursos geológicos estão distribuídos
no planeta em resultado de processos ocorridos desde há muitos milhões
de anos e a sua localização não obedece a tratados políticos ou questões
administrativas.
Desde logo se tomou consciência de que a União Europeia está
dependente do gás natural da Rússia, mas ainda pouco se fez notar que a
Rússia é um país exportador de muitos outros recursos minerais
necessários ao resto do mundo e que, a qualquer momento, pode ser
interrompido o seu fornecimento aos mercados internacionais. A Rússia
está no top 3 dos principais países produtores de recursos como níquel,
tungsténio, alumínio, antimónio, arsénio, gálio, germânio, terras-raras,
telúrio, ouro, paládio, platina, ródio, asbestos, diamante, potássio, enxofre,
carvão, gás natural e petróleo.
Podem ser dados outros exemplos de recursos minerais que se
encontram, quase exclusivamente, “nas mãos” de um único país,
deixando o mercado internacional na sua dependência, como é o caso da
China, que detém cerca de 80% da exploração de terras-raras, essenciais
para a indústria electrónica, ou da República Democrática do Congo, com
60% da extracção de cobalto, imprescindível para as actuais baterias de
veículos eléctricos, computadores portáteis e telemóveis.
Exploração de terras-raras na cidade de Baotou, na região autónoma da Mongólia Interior, na China David
Gray/Reuters
Um outro aspecto que devemos considerar no que toca à proveniência de
alguns dos minerais necessários para fabricar bens muitas vezes
acessíveis apenas aos países mais ricos, tem a ver com aspectos sociais e
ambientais. Alguns destes recursos são explorados em países onde não
existe regulamentação ambiental ou laboral, onde são praticados baixos
salários e onde existem péssimas condições de trabalho e de segurança,
ocorrendo muitas vezes exploração de trabalho infantil e condições
objectivas de moderna escravatura. Os recursos minerais extraídos
nestas condições, mais baratos de acordo com a actual lógica de
mercado, são depois transportados para outros países onde são
incorporados em todo o tipo de produtos que nos são apresentados de
forma reluzente nas prateleiras das lojas e em atractivas campanhas
publicitárias, estimulando uma sociedade de consumo desnecessária,
ambiental e socialmente danosa e injusta.
É, pois, crucial que todos, decisores políticos e cidadãos, colectiva e
individualmente, estejamos conscientes das problemáticas ligadas à
geodiversidade e à utilização de recursos geológicos, de modo a que
possamos tomar decisões justas suportadas no conhecimento existente.
Agradecimentos a Luís Lopes e Teresa Salomé Mota pela leitura e revisão
crítica do texto
Geólogo da Universidade do Minho e membro da Associação
Portuguesa de Geólogos
Como organizar o nosso território
tendo em conta a geodiversidade?
Um conhecimento geológico detalhado da
superfície e do subsolo é essencial para ordenar e
planear o território. Em Portugal não há mapas
geológicos actualizados em escalas adequadas
para o efeito.
José Brilha 29 de Outubro de 2022, 11:06
Em 1950, 30% da população mundial vivia em cidades, valor que
actualmente atinge os 55% e prevendo-se que seja de 68% em 2050. As
pessoas tendem a concentrar-se em cidades cada vez maiores e
localizadas, em geral, perto de zonas litorais. Existem actualmente 37
megacidades (as Nações Unidas consideram megacidades as que
albergam mais de dez milhões de habitantes), a maior parte localizadas
na Ásia, prevendo-se que, até final desta década, o número total chegue a
41.
O aumento do número de megacidades tem sido muito rápido: basta
considerarmos que existiam apenas nove megacidades em 1985, o que
corresponde a um aumento de quatro vezes em menos de 40 anos.
Em Portugal não existem megacidades, mas a distribuição da população
no território nacional não é homogénea. Os resultados provisórios dos
Censos 2021, publicados pelo Instituto Nacional de Estatística, revelam
que a população na zona Norte e na Área Metropolitana de Lisboa
corresponde a 62% do total da população em Portugal.
Os dados revelam ainda que, à excepção do Algarve (3,7%) e Área
Metropolitana de Lisboa (1,7%), todas as outras regiões registam uma
variação negativa da população em relação a 2011 (o Alentejo com menos
6,9% e a Região Autónoma da Madeira com menos 6,4% destacam-se
pelas maiores perdas).
Sabemos igualmente que a população tende a concentrar-se no litoral.
Acresce o facto de o turismo em Portugal ter um grande peso na
economia, o que implica que, em determinados períodos do ano, o
número de pessoas no país mais do que duplica, aumentando a pressão
sobre os recursos naturais e as infra-estruturas. O Instituto Nacional de
Estatística estima que, em 2019, o número de chegadas ao país de
turistas não residentes tenha atingido os 24,6 milhões.
Considerando este cenário em que grande parte da população humana a
nível nacional, mas também mundial, tende a concentrar-se em cidades
cada vez maiores, é prioritária a importância que o planeamento e
ordenamento do território apresentam em áreas urbanas. De que modo a
geodiversidade é importante enquanto base técnica e científica para as
tomadas de decisão relativamente a políticas territoriais? Vejamos alguns
exemplos.
Abastecimento de água
A maior parte da água doce disponível para consumo humano encontra-
se armazenada em poros e fracturas de rochas, até profundidades que
podem alcançar algumas centenas de metros. Estas rochas, designadas
por aquíferos, são os armazéns naturais da água subterrânea e que, em
média, contêm até 30 vezes mais água do que aquela que se encontra em
rios, lagos e outros cursos de água, ou seja, à superfície.
Tratando-se de grandes reservas de água doce, normalmente de boa
qualidade e menos sujeita às variações anuais de precipitação, exige-se
que haja uma boa gestão das águas subterrâneas, evitando o seu uso
para fins não essenciais, particularmente quando existe um agravamento
das condições de seca e desertificação, em especial no Sul do país.
Assim, por exemplo, é surpreendente que os cerca de 100 campos de
golfe existentes em Portugal sejam regados maioritariamente com água
subterrânea, sendo que na zona de Lisboa este valor atinge 76% e no
Algarve 50%.
Construção de infra-estruturas
A decisão da localização de infra-estruturas como pontes, aeroportos,
barragens, estradas e vias ferroviárias deve ter em conta as
características geológicas locais e os processos naturais associados.
Algumas das chamadas de atenção feitas por geólogos acerca do
projecto para o novo aeroporto no Montijo têm que ver com a
probabilidade de ocorrência de fenómenos relacionados com a
geodiversidade: inundação face a uma tendência de aumento do nível do
mar ou em resultado de tsunami e perigosidade sísmica.
Mais de 50% do lixo produzido em Portugal é colocado num dos 43
aterros para deposição de resíduos não perigosos. A selecção de locais
para a instalação de novos aterros sanitários tem de ter em conta, entre
outras, as características topográficas, geológicas e hidrogeológicas dos
terrenos, uma vez que estas vão condicionar as opções de construção
dos aterros e de gestão do eventual risco de contaminação. Em países em
que a inumação dos cadáveres é a prática habitual, como é o caso de
Portugal, a localização dos cemitérios deve também ter em conta as
características geológicas, devendo ser privilegiados solos espessos de
natureza arenosa com permeabilidade adequada e nível freático baixo.
Cheias, inundações, movimentos de vertente e
erosão costeira
Apesar de os processos fluviais serem bem conhecidos dos geólogos,
paradoxalmente são inúmeros os exemplos de construção de edifícios e
infra-estruturas em locais com muito elevada probabilidade de serem
afectados por cheias, inundações e movimentos de vertente
(desabamentos, deslizamento de blocos, etc.), com a consequente
possibilidade de perda de vidas humanas e materiais.
A 1 de Novembro de 2015 registou-se uma vítima mortal e danos
materiais estimados em 15-20 milhões de euros quando Albufeira foi
atingida por uma inundação, em resultado de um planeamento urbanístico
que não teve em atenção a dinâmica dos processos naturais. No mesmo
ano, a Agência Portuguesa do Ambiente identificou 22 zonas críticas de
alto risco de cheias no Continente, cinco nos Açores e 27 na Madeira,
muitas das quais agravadas pela existência de edificações e infra-
estruturas em locais onde nunca deveriam ter sido construídas, tendo em
conta a geodiversidade.
Inundação a 1 de Novembro de 2015 no centro de Albufeira Filipe Farinha/STILLS
Décadas de completa desorganização na gestão do território, muitas
vezes sob a complacência da administração pública nacional e local,
levaram igualmente a uma ocupação desregulada do litoral, ignorando o
conhecimento científico existente no país sobre dinâmica costeira.
Consequentemente, todos os anos são gastos dezenas de milhões de
euros em intervenções paliativas no litoral português para tentar travar a
erosão costeira, que, em resultado da mudança climática, tem tendência
para se agravar.
Actividade vulcânica e sísmica
Em território português, é no arquipélago dos Açores que a actividade
vulcânica pode condicionar o ordenamento territorial. É absolutamente
vital ter um bom conhecimento geológico e vulcanológico do arquipélago,
de modo a identificar quais as ilhas e os potenciais locais onde a
actividade vulcânica pode vir a afectar seriamente pessoas e infra-
estruturas.
Já a existência de actividade sísmica significativa estende-se ao território
continental e, apesar da imprevisibilidade do momento da ocorrência de
sismos, os geólogos podem monitorizar as falhas com potencial de gerar
estes fenómenos cujos efeitos negativos podem ser particularmente
gravosos nas zonas mais populosas do país.
O papel da administração pública
Estes são alguns exemplos elucidativos de como o conhecimento
geológico detalhado da superfície e do subsolo é essencial para realizar
um bom ordenamento e planeamento do território. Só com uma
caracterização pormenorizada da geodiversidade poderemos decidir para
onde fazer a expansão de uma cidade, onde se pode construir um
hospital ou uma estrada, ou por onde deve passar uma via férrea. Só
conhecendo o território se pode ordená-lo e geri-lo o melhor possível.
Infelizmente, Portugal apresenta aqui uma lacuna com efeitos
gravíssimos: a ausência de mapas geológicos actualizados, em escalas
adequadas para o efeito. Esta lamentável situação é uma das
consequências do desinvestimento do Estado no conhecimento geológico
do país, bem demonstrativo da ignorância que existe sobre o papel da
geodiversidade no combate aos enormes desafios ambientais que temos
pela frente.
O actual Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), herdeiro dos
Serviços Geológicos criados em Portugal em meados do século XIX (uma
das primeiras instituições do género na Europa e no mundo), ao longo dos
seus 15 anos de actividade não tem demonstrado capacidade para ser o
que se exige no século XXI de uma instituição pública dedicada à
geologia, apresentando um quadro de pessoal técnico e científico exíguo
devido à aposentação dos mais experientes e à escassa contratação de
jovens, a que se somam insuficientes condições materiais, sendo hoje
uma das mais débeis instituições do tipo quando comparada com as suas
congéneres europeias, apesar do meritório esforço e dedicação dos
profissionais que ainda permanecem no activo.
Atendendo ainda que os municípios têm diversas e importantes
atribuições em termos de ordenamento e planeamento territorial, é
igualmente gravoso que, entre os 308 municípios portugueses, os que
estão dotados de geólogos nos seus quadros técnicos não ultrapasse o
número de dedos de uma mão!
Portugal tem inúmeros problemas resultantes, directa e indirectamente,
de um ordenamento territorial pouco estruturado e que raramente teve
em conta a geodiversidade. Há construções e infra-estruturas em locais
onde não deveriam existir, há um gasto exagerado de água doce potável
em usos que não o justificam e não temos ainda um conhecimento
pormenorizado do potencial do território em termo de recursos naturais, o
que conduz, por vezes, a decisões casuísticas que inviabilizam as
melhores soluções a médio-longo prazo.
Agradecimentos a Luís Lopes e Teresa Salomé Mota pela leitura e revisão
crítica do texto
Geólogo da Universidade do Minho e membro da Associação
Portuguesa de Geólogos
Portugal, um território de
geodiversidade
Uma das principais razões pelas quais Portugal é um
país com forte atracção de turistas é, directa e
indirectamente, a sua geodiversidade. Vejamos
como é constituída a geodiversidade do país.
José Brilha 5 de Novembro de 2022, 7:37
A geodiversidade em Portugal é elevada ou baixa? Encontra-se distribuída
de forma homogénea por todo o país ou há regiões com maior diversidade
geológica do que outras? E como se reflecte a geodiversidade nas
paisagens e na cultura do país?
Numa viagem do Minho ao Algarve, e não esquecendo os Açores e a
Madeira, é fácil constatar que Portugal é um país de elevada
geodiversidade: observem-se as diferenças na paisagem e no relevo ou
repare-se nas rochas com que são construídas as casas tradicionais em
zonas rurais. A geodiversidade é, directa e indirectamente, uma das
principais razões pelas quais Portugal é um país com forte atracção
turística, apesar de não existir uma percepção generalizada de que os
elementos naturais de um país, assim como alguns culturais, são
condicionados pela geodiversidade existente.
Vamos então conhecer como é constituída a geodiversidade em Portugal,
um exercício arriscado e necessariamente não exaustivo, dada a limitação
no número de palavras disponíveis para este texto.
Rochas
Começamos pelas rochas, provavelmente aquilo que todos associam,
desde logo, à geologia. Existe em Portugal uma grande variedade de
rochas representativas dos três grupos principais: magmáticas ou ígneas,
metamórficas e sedimentares (ver mapa em baixo).
Na metade Norte da parte continental, predominam as rochas
magmáticas intrusivas (formadas pelo arrefecimento do magma em
profundidade). Os granitos, e suas variedades, são, provavelmente, das
rochas mais conhecidas: com cerca de 300 milhões de anos, são há muito
usadas na construção de monumentos como o Bom Jesus, em Braga, a
Torre dos Clérigos, no Porto, ou a Sé Catedral, na Guarda, e na edificação
do casario tradicional em aldeias como Soajo ou Monsanto, entre muitas
outras. Existem outras rochas magmáticas intrusivas no país, como
dioritos, gabros e sienitos.
Aldeia do Soajo Anna Costa
Para observarmos a diversidade de rochas magmáticas extrusivas
(formadas pelo arrefecimento do magma à superfície), teremos de visitar
os arquipélagos dos Açores e da Madeira, apesar de no Continente
também existirem rochas basálticas na zona de Lisboa, Mafra, Rio Maior e
Lagos. Nas ilhas ocorrem, por exemplo, basaltos, andesitos, traquitos,
tufos vulcânicos, ignimbritos e piroclastos como bombas, lapili e cinzas.
Lava encordoada na ilha do Pico, Açores José Brilha
As rochas metamórficas ocupam uma boa parte de Trás-os-Montes, Beira
Alta e Alentejo. São rochas tão diversas como xisto, quartzito, mármore e
gnaisse, formadas em profundidade por modificação de rochas pré-
existentes, devido a um aumento de temperatura e pressão.
Rochas metamórficas dobradas na Praia da Foz dos Ouriços, Almograve José Brilha
A rocha mais antiga em Portugal é metamórfica: trata-se de um granulito,
em Bragança, com cerca de 1100 milhões de anos (ainda relativamente
jovem se compararmos com os 4600 milhões de anos da idade da Terra).
Nesta região, e na zona de Macedo de Cavaleiros, ocorrem rochas
metamórficas exóticas, como anfibolitos e metaperidotitos, que
resultaram do metamorfismo de rochas pré-existentes que formaram uma
antiga bacia oceânica e que, devido a movimentos tectónicos, se
deslocaram sobre a crusta continental permitindo a sua observação à
superfície (processo de obducção).
Convém recordar os menos familiarizados com temas de geologia que,
com base na teoria da tectónica de placas que enquadra actualmente
todo o conhecimento geológico, a distribuição das massas continentais
varia ao longo do tempo geológico. Assim, por exemplo, quando nos
referimos a uma rocha metamórfica com cerca de 300 milhões de anos,
temos de pensar que a área que hoje identificamos como “Portugal”
estava localizada perto da linha do equador, e nela existiam florestas
tropicais húmidas luxuriantes (que deram origem ao carvão que foi
explorado, até há algumas décadas, em São Pedro da Cova e no Pejão).
Finalmente, as rochas sedimentares, formadas à superfície pela
acumulação de sedimentos em ambientes marinho, fluvial e lagunar,
ocupam grande parte das regiões litorais ocidental (a sul de Aveiro) e
meridional, e das bacias dos rios Tejo e Sado. De uma forma geral, são as
rochas mais recentes do país (formadas durante os últimos 220 milhões
de anos) e apresentam igualmente uma grande variedade, como
calcários, margas, arenitos e conglomerados.
Também estas rochas têm uma forte representação no património cultural
português; basta referir, como exemplos, os calcários usados na calçada
portuguesa ou nos mosteiros dos Jerónimos e da Batalha, ou os arenitos
avermelhados que conferem ao castelo de Silves um aspecto distinto.
Directamente relacionados com os vários tipos de rochas, temos os solos;
também eles fazem parte da geodiversidade. Os solos resultam da lenta
transformação das rochas à superfície da Terra, condicionada pelo clima e
pela topografia.
Existindo uma grande variedade de rochas, a que se aliam diferenças
climáticas e de relevo entre Norte e Sul, litoral e interior do país, vamos
encontrar uma diversidade de solos com características bem distintas
(solos podzolizados, halomórficos, mólicos, litólicos, argiluviados,
calcários, entre outros). Por exemplo, os solos são mais argilosos no Sul
do país, mas mais ácidos e com maior teor de carbono orgânico no Norte.
Minerais
Para além dos vários minerais que formam cada uma das rochas (quartzo,
feldspato, mica, calcite, olivina, anfíbola, entre muitos outros), existem
concentrações de minerais em alguns locais, resultantes de determinados
processos geológicos.
No grupo dos minerais metálicos estão documentadas mineralizações de,
por exemplo, chumbo, cobalto, cobre, crómio, estanho, ferro, lítio,
manganês, níquel, ouro, prata, terras-raras, titânio, tungsténio, urânio e
zinco.
Quanto a minerais não metálicos, existem registos de asbesto, apatite,
bário, caulino, diatomito, feldspato, flúor, grafite, quartzo, talco, entre
outros.
Alguns destes minerais são, ou podem vir a ser, explorados para fins
económicos de forma a satisfazer as necessidades da vida humana, tema
já abordado em texto anterior.
Fósseis
Os fósseis correspondem a qualquer registo de vida do passado
geológico preservado em rochas (ossos, dentes, pegadas, pistas de
locomoção...). São testemunhos cruciais que permitem reconstituir a
origem da vida no planeta e a sua evolução até à biodiversidade hoje
existente.
Os fósseis mais antigos encontrados em Portugal terão cerca de 539
milhões de anos: são associações de microalgas preservadas em rochas
metamórficas na região de Monfortinho-Salvaterra do Extremo. A
diversidade dos fósseis mais antigos é muito grande e inclui um vasto
conjunto de organismos, como trilobites, braquiópodes, bivalves,
gastrópodes, equinodermes, graptólitos e esponjas, que habitaram os
oceanos há 400-500 milhões de anos. Na zona de Gondomar, foram
identificados fósseis de plantas continentais e insectos com cerca de 300
milhões de anos.
Nas rochas formadas entre há cerca de 200 e 100 milhões de anos, existe
uma grande variedade de fósseis de organismos marinhos (amonites,
braquiópodes, bivalves, gasterópodes, corais, equinodermes, crinóides,
foraminíferos, entre outros) e também de grandes animais que viviam nas
zonas litorais e perto da costa, como os dinossauros e outros répteis
antepassados dos actuais crocodilos. Só na região da Lourinhã já foram
identificadas mais de dez espécies de dinossauros, algumas das quais
ainda só conhecidas em Portugal.
Fósseis de embrião de dinossauro da Lourinhã José Brilha
Todo este conjunto de rochas ricas em fósseis ocorre basicamente no
litoral entre o Cabo Mondego e o Cabo Espichel, incluindo as zonas das
serras do Sicó, Aire e Candeeiros, e em alguns sectores do litoral algarvio.
De salientar ainda os fósseis de espécies ancestrais de rinocerontes,
elefantes, hipopótamos e leopardos em rochas com menos de um milhão
de anos no vale do Tejo e litoral alentejano. Nos Açores, ilha de Santa
Maria, estão também documentados inúmeros fósseis de algas,
moluscos, equinodermes, braquiópodes, crustáceos, ostracodes,
cetáceos e seláceos, formados durante os últimos cinco milhões de anos.
Na ilha da Madeira, a ocorrência de fósseis é mais limitada, mas também
existem exemplos de algas, equinodermes, bivalves e corais.
Relevo
O relevo e as paisagens são, possivelmente, a face mais visível da
geodiversidade. O relevo de uma região está largamente condicionado
pelo tipo de rocha predominante e pela existência de estruturas
geológicas como falhas e fracturas. Claramente, a metade Norte do país
é, de um modo geral, mais montanhosa do que a metade Sul,
característica que se reflecte no tipo de clima dominante.
Na previsão meteorológica para Portugal Continental, é habitual
escutarmos que, a norte do sistema Montejunto-Estrela, há maior
probabilidade de ocorrer céu nublado e precipitação do que a sul. As
formas de relevo (geoformas) podem ser caraterizadas a diversas escalas
e, como já foi referido, dependem muito do tipo de rocha.
Por exemplo, nas serras do Gerês e da Estrela, temos toda uma variedade
de geoformas graníticas (blocos arredondados, pias, etc.) e nas serras de
Aire e Candeeiros encontramos uma diversidade de formas cársicas
(dolinas, grutas, etc.). No litoral Sul alentejano e cabo de São Vicente, as
imponentes falésias litorais contrastam com o relevo aplanado das costas
baixas nas zonas de Melides, Mira ou Aveiro.
Água
A circulação da água nos poros e fracturas das rochas provoca a lenta
dissolução de alguns dos seus minerais, dando origem a água com uma
composição química condicionada pelo tipo de minerais que foram sendo
dissolvidos. Apesar de, por definição, a água ser insípida, certamente
todos conseguimos sentir a diferença entre uma água com origem na
serra granítica do Gerês e outra proveniente da serra de Monchique, onde
o sienito nefelínico é a rocha dominante.
A circulação da água ao longo de falhas e fracturas profundas dá origem a
água muitas vezes quente e com propriedades medicinais nas cerca de
50 termas do Continente e ilhas. O tipo de água que existe num
determinado local é, assim, mais uma manifestação da geodiversidade da
região.
Processos geológicos
Uma última nota relativa aos processos geológicos activos que ocorrem a
uma velocidade e numa escala que é facilmente apreendida pelos seres
humanos e que também fazem parte da geodiversidade. No caso de
Portugal, referimo-nos a fenómenos vulcânicos (nos Açores), actividade
sísmica, movimentos de vertente (desabamentos, deslizamento de
blocos, etc.), erosão costeira, dinâmica fluvial e inundações, entre outros,
que ocorrem um pouco por todo o país.
Com (apenas) 92.225 quilómetros quadrados de superfície terrestre,
Portugal encontra-se, em termos de área, na posição 109 entre 195
países. Não temos ainda conhecimento suficiente para construir uma lista
dos países com maior geodiversidade, mas certamente que o resumo
muito incompleto aqui apresentado dá boas pistas para adivinhar a
posição de Portugal nessa lista.
Geólogo da Universidade do Minho e membro da Associação
Portuguesa de Geólogos
Agradecimentos a Luís Lopes e Teresa Salomé Mota pela leitura e revisão
crítica do texto
Para uma conservação de toda a
natureza
Porque é necessário conservar rochas, já que, para
muitas pessoas, estas aparentam possuir grande
resistência?
José Brilha 12 de Novembro de 2022, 6:55
Na falésia da Nazaré afloram rochas com 80-90 milhões de anos que ajudam a entender os eventos geológicos
ocorridos durante o período Cretácico Paulo Pereira
Nos quatro textos anteriores, procurámos dar a conhecer o conceito de
geodiversidade, de que modo os elementos e processos que a constituem
são essenciais para assegurar as condições de vida e bem-estar de seres
humanos e não humanos, o papel da geodiversidade na organização do
território e a geodiversidade em Portugal. Neste quinto e último texto
iremos desvendar alguns dos elementos da geodiversidade existentes em
Portugal que possuem carácter excepcional e que devem, por isso, ser
protegidos. Mas será que as leis de conservação da natureza asseguram
a protecção adequada destes elementos? E valerá mesmo a pena
preocuparmo-nos em “proteger umas rochas”?
O Parque Nacional de Yellowstone, criado em 1872 nos Estados Unidos da
América, é considerado o primeiro parque nacional do mundo. Trata-se de
uma região vulcânica, onde terá ocorrido uma das maiores erupções de
sempre e onde existe a maior concentração de géisers activos do mundo
(cerca de 500). Só passado um século Portugal daria os primeiros passos
no estabelecimento de áreas protegidas, com a criação, em 1971, do
Parque Nacional da Peneda-Gerês. Também neste domínio começámos
tarde...
A conservação da natureza faz parte do conjunto de políticas públicas de
qualquer país. Em Portugal, o Instituto da Conservação da Natureza e das
Florestas (ICNF) é a autoridade nacional que tem por missão acompanhar
e assegurar a execução das políticas de conservação da natureza. O
Regime Jurídico da Conservação da Natureza e da Biodiversidade
(RJCNB) e a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e
Biodiversidade 2030 (ENCNB) constituem as bases principais que
suportam as políticas públicas de conservação da natureza em Portugal
continental (as regiões autónomas dos Açores e Madeira têm legislação
própria). Serão estes instrumentos adequados para conservar a
geodiversidade?
Vamos primeiro definir o que significa “conservar a geodiversidade”
. Na
verdade, não podemos nem queremos proteger toda a geodiversidade,
uma vez que, diariamente e em todo o mundo, necessitamos extrair
milhões de toneladas de recursos geológicos essenciais para o nosso
bem-estar.
Porém, existem alguns elementos que fazem parte da geodiversidade e
que apresentam características especiais que lhes conferem um valor
excepcional e que devem, portanto, ser conservados.
Por exemplo, fará sentido usar um calcário com fósseis raros de uma
espécie já extinta para fazer cimento e assim perdermos a possibilidade
de melhor compreender como evoluiu a vida no nosso planeta? Será
razoável abrir uma nova estrada exactamente sobre rochas que mostram
evidências dos efeitos das mudanças climáticas ocorridas nos últimos
milhares de anos, deixando de parte a possibilidade de aprendermos com
o passado para melhor nos adaptarmos às mudanças em curso? Faz
sentido construir um armazém industrial no único local onde existe um
determinado mineral que nos permite obter dados sobre processos
geológicos que aconteceram há milhões de anos a uma dezena de
quilómetros de profundidade?
Património geológico
Estes elementos da geodiversidade com um valor especial que os tornam
únicos constituem o que se designa por “património geológico” e os
locais onde eles ocorrem são os geossítios. O desafio é então o de
seleccionar, entre toda a variedade de elementos geológicos, quais os
que devem ser protegidos e porquê. Para tal, é absolutamente crucial
proceder a um inventário do património geológico para que o sector
público possa assegurar a protecção dos seus elementos mais
significativos, o que se designa por “geoconservação”
.
O inventário do património geológico português reúne mais de 300 geossítios por todo o país: as diferentes
cores correspondem aos diversos temas geológicos na base da selecção dos geossítios (os mapas de Portugal
Continental e Regiões Autónomas estão a diferentes escalas)
A comunidade geocientífica nacional produziu, há cerca de uma década,
um inventário sistemático do património geológico português, tendo
identificado mais de 300 geossítios com base no seu valor científico e na
sua relevância nacional e internacional (disponível aqui).
Este inventário foi cedido ao ICNF para que fossem implementadas
medidas de conservação e gestão desses geossítios. Infelizmente, até ao
momento, este instrumento fundamental para a conservação da natureza
não foi ainda alvo de qualquer atenção por parte do ICNF, deixando assim
este património geológico em risco de ser destruído e/ou vandalizado.
Já em 2018, a ENCNF reconhecia que “apesar de existir um inventário do
património geológico português, não foram tomadas medidas para a sua
gestão. É necessário proceder à delimitação detalhada dos geossítios,
identificar o respectivo grau de conservação e os geoindicadores que
possam ser usados na sua monitorização e ainda definir usos potenciais
para garantir a utilização sustentável do património geológico por parte da
sociedade”
.
No Parque Nacional da Peneda-Gerês são inúmeros os exemplos notáveis de relevo granítico de montanha
Renato Henriques
Ameaças ao património geológico
Poder-se-á perguntar porque é necessário conservar rochas, já que, para
muitas pessoas, estas aparentam possuir grande resistência, pelo que
não parecem existir ameaças que as possam afectar. Na verdade, não é
bem assim. A erosão natural pode degradar, em poucos anos, a superfície
das rochas. É o caso, por exemplo, dos geossítios com pegadas de
dinossauros onde, na ausência de qualquer medida de gestão, as marcas
das pegadas se tornam cada vez mais imperceptíveis e vão assim
perdendo as características que lhes conferem o seu valor científico.
A maior parte das ameaças são, porém, antrópicas, começando pelo
desconhecimento da sociedade sobre o que é património geológico e
qual a sua importância. A colheita ilegal de fósseis e minerais que
alimentam redes internacionais de contrabando leva à destruição de
muitos geossítios e à impossibilidade de serem realizados estudos
científicos pioneiros, no caso de serem comercializadas espécimes
desconhecidos para a ciência. Quando alguém compra um mineral ou um
fóssil será que se preocupa em saber se o mesmo terá sido obtido de
forma legal pelo vendedor?
A ausência de legislação apropriada para garantir a protecção de
geossítios é outra das ameaças. Em Portugal, só os geossítios que estão
em áreas protegidas, uma minoria, possuem algum tipo de protecção; os
restantes podem ser destruídos ou vandalizados sem qualquer
consequência para quem o faz. São também ameaças a ausência de
políticas públicas de geoconservação e a sua não implementação, assim
como a inoperância das instituições que têm a responsabilidade de gerir o
património natural do país.
Muitos geossítios são ainda afectados pela construção de infra-estruturas
(estradas, edificações variadas, barragens). Ao contrário do que
acontece, e bem, com vestígios arqueológicos, se for descoberto
qualquer tipo de elemento geológico raro durante a construção de uma
infra-estrutura, nada obriga à interrupção dos trabalhos para análise dos
achados.
A pressão turística em alguns geossítios é também habitualmente referida
como sendo uma ameaça ao património geológico. Um exemplo óbvio é o
caso da visitação em grutas calcárias que deve ser controlado e
monitorizado, porque o mero efeito da respiração dos visitantes sobre a
atmosfera confinada da gruta pode influenciar os mecanismos de
precipitação química responsáveis pela formação de estalactites e
estalagmites.
Relevância internacional
Para demonstrar a elevada importância do património geológico
português, basta referir o reconhecimento já feito por organismos
internacionais. Um dos requisitos para a UNESCO conferir o título de
Geoparque Mundial a uma determinada área é o facto de esta possuir
património geológico de relevância internacional. É o caso dos cinco
Geoparques Mundiais da UNESCO portugueses: Açores, Arouca, Estrela,
Naturtejo e Terras de Cavaleiros. Em cada um deles existem geossítios
onde fósseis, rochas e formas de relevo têm valor científico internacional.
Uma breve nota para lembrar que a UNESCO atribui classificações
distintas ao património natural, que não devem ser confundidas: Reserva
da Biosfera, Património Mundial e Geoparque Mundial.
Formações jurássicas no Cabo Mondego, um dos dois locais em Portugal que são referências internacionais
para a escala de tempo geológico José Brilha
A União Internacional das Ciências Geológicas é o organismo oficial
responsável pelo estabelecimento da escala de tempo geológico. Tal
como estamos habituados a dividir o tempo em séculos, anos, meses,
semanas, dias, horas, minutos e segundos, também os geólogos fazem
uma divisão do tempo geológico.
Assim, os 4600 milhões de anos da idade da Terra são divididos em eons,
eras, períodos, épocas e idades. Estas divisões do tempo geológico estão
materializadas em formações rochosas dispersas pelo planeta,
seleccionadas pelos geólogos depois de anos de investigação científica.
Em Portugal, existem duas destas formações que são referências
mundiais do tempo geológico e que representam: uma o início da Idade
Bajociano (há 170,3 milhões de anos) e outra o início da Idade Toarciano
(há 182,7 milhões de anos), ambas pertencentes ao período Jurássico. A
primeira localiza-se no Cabo Mondego e a segunda na península de
Peniche. Estas formações geológicas são, obviamente, mais dois
geossítios de relevância internacional existentes em território nacional.
No dia 28 de Outubro passado, por ocasião das celebrações do seu 60º
aniversário, a União Internacional das Ciências Geológicas ratificou a lista
dos primeiros 100 sítios de património geológico de relevância
internacional, da qual constam três geossítios portugueses: o vulcão dos
Capelinhos na ilha do Faial, nos Açores; as trilobites gigantes de Arouca; e
a discordância entre o Paleozóico e o Mesozóico exposta nas falésias da
Ponta do Telheiro, no litoral de Vila do Bispo.
Em cinco dos sete monumentos naturais podem ser observadas pegadas de dinossauro como aqui em
Ourém/Torres Novas, local habitualmente conhecido como Pedreira do Galinha José Brilha
Em Portugal Continental existem cinco categorias de áreas protegidas:
Parque Nacional, Parque Natural, Reserva Natural, Paisagem Protegida e
Monumento Natural. Apesar das áreas protegidas das primeiras quatro
categorias terem sido criadas sem ter tido em conta especificamente a
protecção de geossítios, o inventário revelou a sua existência em algumas
destas áreas. Já a criação dos sete Monumentos Naturais de âmbito
nacional actualmente existentes foi feita com o intuito de protecção de
património geológico:
Cabo Mondego (formações geológicas jurássicas);
Carenque (pegadas de dinossauro);
Lagosteiros (pegadas de dinossauro);
Pedra da Mua (pegadas de dinossauro);
Pedreira do Avelino (pegadas de dinossauro);
Pegadas de Dinossauros de Ourém/Torres Novas (habitualmente
referido como Pedreira do Galinha);
Portas de Ródão (feições geomorfológicas).
Para além destes, existem ainda Monumentos Naturais Locais
classificados e geridos por municípios com a finalidade de proteger
património geológico, como acontece, por exemplo, em Alenquer, Arouca,
Bragança e Viana do Castelo. Os municípios têm revelado um crescente
interesse pela geoconservação, como, aliás, o demonstram os prémios
atribuídos, desde 2004, no âmbito do concurso anual destinado a
autarquias e promovido pelo grupo português da Associação
Internacional para a Conservação do Património Geológico (ProGEO).
Conclui-se assim uma série de cinco artigos que pretenderam assinalar a
comemoração, pela primeira vez, do Dia Internacional da Geodiversidade
(6 de Outubro). E porque não aproveitar para conhecer um dos muitos
geossítios em Portugal e assim celebrar a geodiversidade?
Agradecimentos a Luís Lopes e Teresa Salomé Mota pela leitura e revisão
crítica do texto
Geólogo da Universidade do Minho e membro da Associação
Portuguesa de Geólogos

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Recurso Casa das Ciências: Geodiversidade, um bem comum

  • 1.
  • 2. Porque dependemos da geodiversidade? Os bens e benefícios que obtemos da geodiversidade são essenciais à sobrevivência e bem-estar, tanto dos seres humanos como de toda a biodiversidade. A diversidade geológica contribui para os serviços que a natureza presta. José Brilha 15 de Outubro de 2022, 7:02 Os seres humanos utilizam recursos naturais desde sempre. A designação de algumas fases da pré-história humana está mesmo relacionada com os materiais que eram usados no fabrico de artefactos: as idades da pedra, do cobre, do bronze e do ferro. A época histórica que actualmente atravessamos já tem sido designada por idade do silício, numa alusão ao intenso uso deste composto no fabrico de equipamentos
  • 3. electrónicos. Mas a verdade é que, de alguma forma, pode dizer-se que estamos ainda na idade da pedra, uma vez que continuamos dependentes dos recursos minerais e energéticos para fabricar os bens de que necessitamos com o objectivo de providenciar bem-estar e prosperidade social. Em Outubro, celebrou-se, pela primeira vez, o Dia Internacional da Geodiversidade, aprovado em 2021 pela 41ª Conferência Geral da UNESCO. Esta data será comemorada todos os anos, sempre a 6 de Outubro, com a finalidade de sensibilizar a sociedade para o importante papel que a geodiversidade tem como garante de sobrevivência e bem- estar, tanto dos seres humanos como de toda a biodiversidade. A geodiversidade corresponde à variedade de elementos não vivos da natureza, nomeadamente minerais, rochas, fósseis, solos, formas de relevo e paisagens, assim como processos activos de que são exemplos o vulcanismo e a erosão. Este é o primeiro de cinco artigos que pretendem assinalar a importância da geodiversidade. Desde a década de 1970 que designamos os bens e benefícios provindos da natureza por “serviços de ecossistemas” . Esta designação é hoje habitualmente usada para referir apenas os serviços obtidos a partir da biodiversidade, deixando de lado a componente não viva dos ecossistemas que é, em larga medida, assegurada pela geodiversidade. Talvez um termo que se prestaria a um menor afunilamento do conceito subjacente fosse o de “serviços da natureza” , como aliás chegou a ser proposto na referida década. Os bens e benefícios que obtemos da natureza – tanto da sua componente viva como não viva – são, principalmente, de quatro tipos: regulação, suporte, aprovisionamento e serviço cultural. Vejamos então como os elementos que compõem a geodiversidade contribuem para cada um destes tipos de serviços. Contributo para os serviços de regulação
  • 4. No planeta Terra decorrem, desde há pelo menos 4300 milhões de anos (idade mais antiga determinada até hoje em cristais de zircão da Austrália), inúmeros processos que interagem e se autorregulam, criando sistemas que proporcionam condições indispensáveis à existência de vida, incluindo da espécie humana. A geodiversidade participa e desempenha um papel crucial em muitos destes sistemas, como é o caso do ciclo da água. De toda a água doce que existe no planeta, cerca de 69% encontra-se sob a forma de gelo nas calotes polares e nos glaciares, 30% circula em aquíferos (rochas que, em profundidade, armazenam água nos seus poros e fracturas) e apenas 1% se encontra à superfície em cursos de água e lagos. Os aquíferos são assim um dos principais componentes do ciclo da água, constituindo um elemento fundamental para o abastecimento humano e a sobrevivência de outros seres vivos, com destaque para os aquíferos em regiões áridas. A circulação da água nos aquíferos e nos solos tem ainda um efeito de filtragem, contribuindo para garantir a qualidade da água. Um outro exemplo do papel da geodiversidade na regulação dos ecossistemas relaciona-se com o controle natural de inundações. As dunas litorais são acumulações de areia que evitam a entrada do mar sobre as zonas continentais. De igual modo, as planícies de inundação de rios e os estuários contribuem para que, em períodos em que o nível dos rios sobe devido à ocorrência de precipitação elevada a montante, a água se disperse por uma maior superfície, diminuindo deste modo a sua velocidade de escoamento e contribuindo para reduzir eventuais danos e perdas sobre outros sistemas naturais e infra-estruturas construídas pelos seres humanos. Contributo para os serviços de suporte Ficamos maravilhados com a diversidade de fauna e flora no planeta, mas, frequentemente, esquecemo-nos de que os ecossistemas resultam de uma ligação estreita entre a geodiversidade e os seres vivos que nela
  • 5. habitam. Esta relação, no entanto, foi há muito reconhecida: Alexander von Humboldt (1769–1859), por exemplo, foi um dos primeiros a notar a interdependência entre vegetação e altitude. As dunas contribuem para atenuar os efeitos da acção do mar nas zonas litorais, como aqui na costa a sul de Viana do Castelo Renato Henriques A altitude de um local relaciona-se com o tipo e a idade das rochas aí existentes, bem como com os efeitos da tectónica de placas que, ao longo da história da Terra, levaram a sucessivos levantamentos de cadeias montanhosas (orogenias), intercalados com fases erosivas que arrasam as montanhas formadas. A presença de grifos nas arribas de Miranda do Douro ou nas vertentes do Tejo, nas Portas de Ródão, deve-se ao facto de estas aves nidificarem em escarpas rochosas constituídas por materiais mais resistentes à erosão, como é o caso de granitos e quartzitos, respectivamente. Em grutas do Parque Natural das Serras de Aires e Candeeiros existem espécies únicas que só se desenvolvem em habitats muito específicos, condicionados pela geodiversidade, num processo de interdependência ainda não totalmente conhecido. A geodiversidade é, assim, o suporte fundamental para a vida de grande parte da biodiversidade terrestre.
  • 6. No caso da espécie humana, também a geodiversidade se revela imprescindível na construção das infra-estruturas características da sociedade actual, apesar de esta circunstância passar, em geral, despercebida. São rochas com os níveis de resistência adequados que permitem a edificação de habitações, redes viárias e ferroviárias, barragens e portos em superfícies suficientemente estáveis e duradouras. É também nas rochas que armazenamos gás natural – e, no futuro, possivelmente, hidrogénio –, que enterramos os resíduos radioactivos produzidos nas centrais nucleares e construímos aterros onde depositamos toneladas de resíduos domésticos e industriais. Contributo para os serviços de aprovisionamento São inúmeros os exemplos de como a geodiversidade oferece materiais essenciais aos ecossistemas e aos seres humanos, em particular. Desde logo, disponibilizando uma série de produtos utilizados na nossa alimentação, como o sal (nada mais do que os vestígios de minerais que se foram dissolvendo a partir das rochas ao longo de milhões de anos) ou a água. Relativamente às plantas, as rochas e os minerais fornecem nutrientes que são incorporados na biomassa produzida – caso do azoto, potássio, cálcio, ferro, e outros – e que são posteriormente consumidos pelos seres vivos. Já a maioria dos materiais de construção – cimento, tijolos, aço, vidro – são fabricados a partir de rochas e minerais, assim como o são todas as ligas metálicas, muitos produtos farmacêuticos, fertilizantes e componentes destinados à indústria electrónica.
  • 7. São as escarpas inacessíveis de quartzito que permitem a nidificação de grifos no Monumento Natural das Portas de Ródão José Brilha E a sociedade actual não seria possível sem a utilização de recursos minerais energéticos: quer consideremos a combustão de hidrocarbonetos (petróleo, gás natural, carvão) – que desejamos que seja, um dia, pretérita e desnecessária –, quer avancemos na transição energética com a utilização de energias renováveis como a água, o sol ou o vento, em barragens, painéis e aerogeradores, o certo é que, por enquanto, ambas as situações só são possíveis recorrendo à exploração de rochas e minerais. Central Fotovoltaica de Alcoutim: os painéis, que contribuem para produzir electricidade com baixas emissões de carbono, necessitam para o seu fabrico de vários minerais de onde se obtêm elementos químicos como o ferro, cobre, alumínio, silício, prata, níquel, zinco, cádmio, gálio e telúrio Nuno Ferreira Santos Contributo para os serviços culturais Por fim, a geodiversidade disponibiliza ainda um conjunto de benefícios relacionados com aspectos culturais da nossa sociedade. Refira-se, a título de exemplo, a explicação dada pela cultura popular às pegadas de
  • 8. dinossáurios do Monumento Natural da Pedra da Mua: estas representariam as marcas deixadas nas camadas calcárias do Cabo Espichel pelas patas de uma mula que transportava a Virgem Maria ao topo do promontório. Esta lenda acabou mesmo por servir de inspiração à pintura dos painéis de azulejos existentes na Ermida da Memória, datada do século XV. As colunas de basalto no Pico da Ana Ferreira são um dos principais atractivos turísticos da ilha de Porto Santo José Brilha Alguns relevos rochosos são usados para actividades de lazer, como a escalada em escarpas idênticas à da Meadinha, no Parque Nacional da Peneda-Gerês. Há também formações geológicas que possuem um valor estético tal que se convertem em atractivos turísticos, como as colunas de basalto no Pico da Ana Ferreira, na ilha de Porto Santo, as inúmeras caldeiras vulcânicas nas ilhas dos Açores ou a recortada costa algarvia da Ponta da Piedade, em Lagos.
  • 9. O casario granítico de Sortelha, assim como as muralhas que a rodeiam, reflectem a geodiversidade local José Brilha A construção de monumentos históricos e habitações com valor patrimonial recorre habitualmente à rocha que existe em maior abundância no seu entorno. A geodiversidade local está assim directamente associada à identidade cultural dos territórios, como é bem representativa a marca “Aldeias de Xisto”. Finalmente, uma referência ao papel da geodiversidade no ensino e na investigação em geociências: é devido à comunidade geocientífica que conhecemos as características e impactos dos vários tipos de erupções vulcânicas, que reconhecemos os ritmos de subida e descida do nível do mar registados nas rochas, que sabemos o modo como os glaciares moldam as paisagens, como os oceanos interagem com os continentes, como se formam as montanhas, ou quando surgiu a vida na Terra e como esta evoluiu. Todo este conhecimento é crucial para que a humanidade consiga dar resposta a alguns dos maiores desafios que tem hoje pela frente, como é o caso da crise ecológica relacionada, em grande parte, com a mudança climática e a perda de biodiversidade. Agradecimentos a Luís Lopes e Teresa Salomé Mota pela leitura e revisão crítica do texto Geólogo da Universidade do Minho e membro da Associação Portuguesa de Geólogos
  • 10. Aprender a viver com o que temos Tudo o que usamos, se não tiver uma origem orgânica, é feito a partir de matérias-primas minerais. Para fabricar um telemóvel, por exemplo, são usados mais de 60 elementos químicos, todos concentrados a partir de minerais explorados em vários países. Este é o segundo texto, de cinco, dedicado à importância da geodiversidade. José Brilha 22 de Outubro de 2022, 7:08 Roosevelt Cassio/Reuters Sejamos claros: os seres humanos são completamente dependentes deste planeta e não é previsível que, nas décadas mais próximas, seja possível explorar recursos minerais em outros corpos do sistema solar. Tudo o que usamos, se não tiver uma origem orgânica, é feito a partir de matérias-primas minerais. Isto significa que teremos de gerir com sabedoria, responsabilidade e respeitando os limites naturais, os recursos
  • 11. geológicos existentes, desde os mais escassos e não renováveis, até aos mais abundantes. A humanidade encontra-se perante um problema complexo para o qual será necessário contar com o conhecimento científico produzido pelos geocientistas. Estamos no único corpo do sistema solar que, até à data, demonstrou ter capacidade para albergar seres humanos e que nos disponibiliza um conjunto finito de recursos que têm de servir uma população crescente. As Nações Unidas prevêem que seremos 8000 milhões a 15 de Novembro de 2022 e estimam que este número continuará a crescer até cerca de 11.000 milhões, no final deste século, quando este crescimento, previsivelmente, estabilizará. Na realidade, a taxa anual de crescimento da população está já a decrescer, tendo atingido o seu máximo em 1968 (2,1%) e prevendo-se que seja de 0,1% em 2100. O aumento da população humana confronta-nos com o consumo crescente de recursos, não só porque há mais seres humanos no planeta, mas porque muitos deles têm vindo, felizmente, a desfrutar de padrões de bem-estar económico e social necessários a uma vida confortável e simultaneamente mais longa. Actualmente, 54% da população mundial tem saneamento básico e tratamento de efluentes (era apenas 28% em 2000) e 74% tem acesso a água de qualidade (62% também em 2000); o número de pessoas sem acesso a electricidade reduziu-se em 59% nos últimos 20 anos e, em 200 anos, a taxa de população alfabetizada passou de 12% para 85%.
  • 12. Geradores eólicos perto de Amesterdão, Países Baixos Yves Herman/Reuters Esta evolução não é independente do facto de 85% da população mundial viver em zonas urbanas (dados de 2015 da Comissão Europeia), tendência que se vai acentuar. Todavia, é preciso não esquecer que há ainda um longo caminho a percorrer até que todos os seres humanos vejam satisfeitos o direito de ter uma vida digna. Sabia que... ... a construção de painéis fotovoltaicos para um parque solar com uma área de um quilómetro quadrado necessita de 11 toneladas de prata. Actualmente, em cada ano, um cidadão europeu consome cerca de 14 toneladas de matérias-primas e produz cinco toneladas de resíduos. Vejamos alguns exemplos: Para fabricar uma bateria de 100 kWh para um automóvel eléctrico são necessários dez quilos de lítio, processado a partir de minerais (espodumena, ambligonite, lepidolite e petalite) ou de soluções salinas. A mesma quantidade que é necessária para produzir as
  • 13. baterias de dez mil telemóveis; A construção de painéis fotovoltaicos para um parque solar com uma área de um quilómetro quadrado necessita de 11 toneladas de prata. Estima-se que, até 2050, a mineração tenha de aumentar 500% de modo a satisfazer a procura exponencial por tecnologias descarbonizadas; São necessárias 67 toneladas de cobre para um único aerogerador instalado ao largo da costa (off-shore), para as quais foi necessário remover 50 mil toneladas de rocha e solo (cerca de cinco vezes o peso da Torre Eiffel). Actualmente, existem cerca de 150 milhões de toneladas de cobre nas redes eléctricas de todo o mundo; Para produzir um telemóvel são utilizados mais de 60 elementos químicos diferentes (arsénio, cobre, gálio, ouro, paládio, platina, prata, tungsténio, lítio, cobalto, etc.), todos eles concentrados a partir de minerais explorados em vários países do mundo; O nylon e o poliéster usados na indústria têxtil, assim como as diversas variedades de plástico usadas em inúmeros produtos, são derivados do petróleo, um recurso geológico que tem muito mais aplicações para além da produção de combustíveis; Na produção do papel são usados diversos minerais como o talco, a caulinite, a barite e o feldspato; Alguns medicamentos e terapias médicas recorrem a elementos químicos (antimónio, ferro, lítio, zinco, urânio, entre muitos outros) extraídos de minerais; A construção de infra-estruturas como casas, hospitais, escolas, barragens, pontes, túneis e estradas necessita de milhões de toneladas de rochas e minerais. Este breve apanhado de exemplos é bem ilustrativo do desafio que temos pela frente. Como a quantidade de recursos geológicos não aumenta e sua demanda vai crescer nas próximas décadas, inclusive alguns até recentemente nunca utilizados, temos a humanidade perante um problema de difícil, mas urgente solução. E é óbvio que essa solução não pode passar pelo aumento desenfreado da exploração de recursos geológicos, até porque alguns destes recursos são raros, obrigando ao
  • 14. seu transporte por milhares de quilómetros, à custa do consumo de grandes quantidades de combustíveis fósseis. A solução tem de passar por uma estratégia definida e posta em prática a diversos níveis, que não comprometa o bem-estar da humanidade e seja ambientalmente responsável, de acordo com o estipulado pelos objectivos do desenvolvimento sustentável definidos pelas Nações Unidas: Mudar o actual modelo de produção e consumo para um outro designado por “economia circular” . Os produtos devem ser usados ao máximo até esgotar o seu ciclo de vida, fazendo com que seja necessário produzir menos e originar menor quantidade de resíduos; Implementar de forma efectiva a reciclagem, reutilização e redução, contribuindo, assim, para o decréscimo da exploração de recursos geológicos e diminuindo, simultaneamente, o consumo de energia; Incentivar a investigação em geociências de modo a descobrirmos novas jazidas minerais e melhorar os métodos para a sua exploração, reduzindo ao máximo os impactos ambientais negativos associados a esta actividade; É, aliás, importante continuar a investigação científica e tecnológica de modo a permitir encontrar soluções que sejam menos exigentes do ponto de vista da necessidade de utilização de recursos minerais e energéticos. Uma parte desta estratégia vai para além da definição de políticas e legislação, devendo integrar uma componente de educação ambiental que contribua para que cada cidadão esteja ciente da dependência que temos da geodiversidade e, deste modo, contribuirmos também individualmente para uma melhor gestão dos recursos naturais. Durante o primeiro semestre de 2021, foram registados 5,4 milhões de carros novos na União Europeia, para os quais terão sido necessários muitos milhões de toneladas de matérias-primas minerais. Será que todos estes novos veículos são mesmo imprescindíveis para assegurar as necessidades de transporte dos seus proprietários?
  • 15. No Centro Ciência Viva do Lousal (Grândola), os visitantes são confrontados com a necessidade de recursos minerais para garantir a produção dos objectos que usamos no dia-a-dia DR E, nos últimos dez anos, triplicou em todo o mundo o número de novos telemóveis vendidos: hoje, são cerca de 1500 milhões todos os anos. Acresce o facto de que, quanto maior for o desenvolvimento tecnológico de um produto ou serviço, maior é a diversidade de minerais necessários para a sua produção. Pensemos nos actuais 5G e na Internet das Coisas e constatamos que a apregoada desmaterialização está assente numa intensa utilização de matérias-primas minerais. A poupança, reciclagem e reutilização de todo o tipo de produtos são não só necessárias para diminuir a necessidade de exploração de recursos minerais, como encontra justificações de natureza política, ética e social. A recente ocupação da Ucrânia pela Rússia, que levou à imposição de sanções económicas por parte da comunidade internacional, alertou o público em geral e os responsáveis políticos para um aspecto que os geólogos há muito conhecem. Os recursos geológicos estão distribuídos no planeta em resultado de processos ocorridos desde há muitos milhões de anos e a sua localização não obedece a tratados políticos ou questões administrativas. Desde logo se tomou consciência de que a União Europeia está dependente do gás natural da Rússia, mas ainda pouco se fez notar que a Rússia é um país exportador de muitos outros recursos minerais necessários ao resto do mundo e que, a qualquer momento, pode ser interrompido o seu fornecimento aos mercados internacionais. A Rússia
  • 16. está no top 3 dos principais países produtores de recursos como níquel, tungsténio, alumínio, antimónio, arsénio, gálio, germânio, terras-raras, telúrio, ouro, paládio, platina, ródio, asbestos, diamante, potássio, enxofre, carvão, gás natural e petróleo. Podem ser dados outros exemplos de recursos minerais que se encontram, quase exclusivamente, “nas mãos” de um único país, deixando o mercado internacional na sua dependência, como é o caso da China, que detém cerca de 80% da exploração de terras-raras, essenciais para a indústria electrónica, ou da República Democrática do Congo, com 60% da extracção de cobalto, imprescindível para as actuais baterias de veículos eléctricos, computadores portáteis e telemóveis. Exploração de terras-raras na cidade de Baotou, na região autónoma da Mongólia Interior, na China David Gray/Reuters Um outro aspecto que devemos considerar no que toca à proveniência de alguns dos minerais necessários para fabricar bens muitas vezes acessíveis apenas aos países mais ricos, tem a ver com aspectos sociais e ambientais. Alguns destes recursos são explorados em países onde não existe regulamentação ambiental ou laboral, onde são praticados baixos
  • 17. salários e onde existem péssimas condições de trabalho e de segurança, ocorrendo muitas vezes exploração de trabalho infantil e condições objectivas de moderna escravatura. Os recursos minerais extraídos nestas condições, mais baratos de acordo com a actual lógica de mercado, são depois transportados para outros países onde são incorporados em todo o tipo de produtos que nos são apresentados de forma reluzente nas prateleiras das lojas e em atractivas campanhas publicitárias, estimulando uma sociedade de consumo desnecessária, ambiental e socialmente danosa e injusta. É, pois, crucial que todos, decisores políticos e cidadãos, colectiva e individualmente, estejamos conscientes das problemáticas ligadas à geodiversidade e à utilização de recursos geológicos, de modo a que possamos tomar decisões justas suportadas no conhecimento existente. Agradecimentos a Luís Lopes e Teresa Salomé Mota pela leitura e revisão crítica do texto Geólogo da Universidade do Minho e membro da Associação Portuguesa de Geólogos
  • 18. Como organizar o nosso território tendo em conta a geodiversidade? Um conhecimento geológico detalhado da superfície e do subsolo é essencial para ordenar e planear o território. Em Portugal não há mapas geológicos actualizados em escalas adequadas para o efeito. José Brilha 29 de Outubro de 2022, 11:06 Em 1950, 30% da população mundial vivia em cidades, valor que actualmente atinge os 55% e prevendo-se que seja de 68% em 2050. As pessoas tendem a concentrar-se em cidades cada vez maiores e localizadas, em geral, perto de zonas litorais. Existem actualmente 37 megacidades (as Nações Unidas consideram megacidades as que albergam mais de dez milhões de habitantes), a maior parte localizadas na Ásia, prevendo-se que, até final desta década, o número total chegue a
  • 19. 41. O aumento do número de megacidades tem sido muito rápido: basta considerarmos que existiam apenas nove megacidades em 1985, o que corresponde a um aumento de quatro vezes em menos de 40 anos. Em Portugal não existem megacidades, mas a distribuição da população no território nacional não é homogénea. Os resultados provisórios dos Censos 2021, publicados pelo Instituto Nacional de Estatística, revelam que a população na zona Norte e na Área Metropolitana de Lisboa corresponde a 62% do total da população em Portugal. Os dados revelam ainda que, à excepção do Algarve (3,7%) e Área Metropolitana de Lisboa (1,7%), todas as outras regiões registam uma variação negativa da população em relação a 2011 (o Alentejo com menos 6,9% e a Região Autónoma da Madeira com menos 6,4% destacam-se pelas maiores perdas). Sabemos igualmente que a população tende a concentrar-se no litoral. Acresce o facto de o turismo em Portugal ter um grande peso na economia, o que implica que, em determinados períodos do ano, o número de pessoas no país mais do que duplica, aumentando a pressão sobre os recursos naturais e as infra-estruturas. O Instituto Nacional de Estatística estima que, em 2019, o número de chegadas ao país de turistas não residentes tenha atingido os 24,6 milhões. Considerando este cenário em que grande parte da população humana a nível nacional, mas também mundial, tende a concentrar-se em cidades cada vez maiores, é prioritária a importância que o planeamento e ordenamento do território apresentam em áreas urbanas. De que modo a geodiversidade é importante enquanto base técnica e científica para as tomadas de decisão relativamente a políticas territoriais? Vejamos alguns exemplos. Abastecimento de água
  • 20. A maior parte da água doce disponível para consumo humano encontra- se armazenada em poros e fracturas de rochas, até profundidades que podem alcançar algumas centenas de metros. Estas rochas, designadas por aquíferos, são os armazéns naturais da água subterrânea e que, em média, contêm até 30 vezes mais água do que aquela que se encontra em rios, lagos e outros cursos de água, ou seja, à superfície. Tratando-se de grandes reservas de água doce, normalmente de boa qualidade e menos sujeita às variações anuais de precipitação, exige-se que haja uma boa gestão das águas subterrâneas, evitando o seu uso para fins não essenciais, particularmente quando existe um agravamento das condições de seca e desertificação, em especial no Sul do país. Assim, por exemplo, é surpreendente que os cerca de 100 campos de golfe existentes em Portugal sejam regados maioritariamente com água subterrânea, sendo que na zona de Lisboa este valor atinge 76% e no Algarve 50%. Construção de infra-estruturas A decisão da localização de infra-estruturas como pontes, aeroportos, barragens, estradas e vias ferroviárias deve ter em conta as características geológicas locais e os processos naturais associados. Algumas das chamadas de atenção feitas por geólogos acerca do projecto para o novo aeroporto no Montijo têm que ver com a probabilidade de ocorrência de fenómenos relacionados com a geodiversidade: inundação face a uma tendência de aumento do nível do mar ou em resultado de tsunami e perigosidade sísmica. Mais de 50% do lixo produzido em Portugal é colocado num dos 43 aterros para deposição de resíduos não perigosos. A selecção de locais para a instalação de novos aterros sanitários tem de ter em conta, entre outras, as características topográficas, geológicas e hidrogeológicas dos terrenos, uma vez que estas vão condicionar as opções de construção dos aterros e de gestão do eventual risco de contaminação. Em países em que a inumação dos cadáveres é a prática habitual, como é o caso de
  • 21. Portugal, a localização dos cemitérios deve também ter em conta as características geológicas, devendo ser privilegiados solos espessos de natureza arenosa com permeabilidade adequada e nível freático baixo. Cheias, inundações, movimentos de vertente e erosão costeira Apesar de os processos fluviais serem bem conhecidos dos geólogos, paradoxalmente são inúmeros os exemplos de construção de edifícios e infra-estruturas em locais com muito elevada probabilidade de serem afectados por cheias, inundações e movimentos de vertente (desabamentos, deslizamento de blocos, etc.), com a consequente possibilidade de perda de vidas humanas e materiais. A 1 de Novembro de 2015 registou-se uma vítima mortal e danos materiais estimados em 15-20 milhões de euros quando Albufeira foi atingida por uma inundação, em resultado de um planeamento urbanístico que não teve em atenção a dinâmica dos processos naturais. No mesmo ano, a Agência Portuguesa do Ambiente identificou 22 zonas críticas de alto risco de cheias no Continente, cinco nos Açores e 27 na Madeira, muitas das quais agravadas pela existência de edificações e infra- estruturas em locais onde nunca deveriam ter sido construídas, tendo em conta a geodiversidade.
  • 22. Inundação a 1 de Novembro de 2015 no centro de Albufeira Filipe Farinha/STILLS Décadas de completa desorganização na gestão do território, muitas vezes sob a complacência da administração pública nacional e local, levaram igualmente a uma ocupação desregulada do litoral, ignorando o conhecimento científico existente no país sobre dinâmica costeira. Consequentemente, todos os anos são gastos dezenas de milhões de euros em intervenções paliativas no litoral português para tentar travar a erosão costeira, que, em resultado da mudança climática, tem tendência para se agravar. Actividade vulcânica e sísmica Em território português, é no arquipélago dos Açores que a actividade vulcânica pode condicionar o ordenamento territorial. É absolutamente vital ter um bom conhecimento geológico e vulcanológico do arquipélago, de modo a identificar quais as ilhas e os potenciais locais onde a actividade vulcânica pode vir a afectar seriamente pessoas e infra- estruturas. Já a existência de actividade sísmica significativa estende-se ao território continental e, apesar da imprevisibilidade do momento da ocorrência de
  • 23. sismos, os geólogos podem monitorizar as falhas com potencial de gerar estes fenómenos cujos efeitos negativos podem ser particularmente gravosos nas zonas mais populosas do país. O papel da administração pública Estes são alguns exemplos elucidativos de como o conhecimento geológico detalhado da superfície e do subsolo é essencial para realizar um bom ordenamento e planeamento do território. Só com uma caracterização pormenorizada da geodiversidade poderemos decidir para onde fazer a expansão de uma cidade, onde se pode construir um hospital ou uma estrada, ou por onde deve passar uma via férrea. Só conhecendo o território se pode ordená-lo e geri-lo o melhor possível. Infelizmente, Portugal apresenta aqui uma lacuna com efeitos gravíssimos: a ausência de mapas geológicos actualizados, em escalas adequadas para o efeito. Esta lamentável situação é uma das consequências do desinvestimento do Estado no conhecimento geológico do país, bem demonstrativo da ignorância que existe sobre o papel da geodiversidade no combate aos enormes desafios ambientais que temos pela frente. O actual Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG), herdeiro dos Serviços Geológicos criados em Portugal em meados do século XIX (uma das primeiras instituições do género na Europa e no mundo), ao longo dos seus 15 anos de actividade não tem demonstrado capacidade para ser o que se exige no século XXI de uma instituição pública dedicada à geologia, apresentando um quadro de pessoal técnico e científico exíguo devido à aposentação dos mais experientes e à escassa contratação de jovens, a que se somam insuficientes condições materiais, sendo hoje uma das mais débeis instituições do tipo quando comparada com as suas congéneres europeias, apesar do meritório esforço e dedicação dos profissionais que ainda permanecem no activo. Atendendo ainda que os municípios têm diversas e importantes atribuições em termos de ordenamento e planeamento territorial, é
  • 24. igualmente gravoso que, entre os 308 municípios portugueses, os que estão dotados de geólogos nos seus quadros técnicos não ultrapasse o número de dedos de uma mão! Portugal tem inúmeros problemas resultantes, directa e indirectamente, de um ordenamento territorial pouco estruturado e que raramente teve em conta a geodiversidade. Há construções e infra-estruturas em locais onde não deveriam existir, há um gasto exagerado de água doce potável em usos que não o justificam e não temos ainda um conhecimento pormenorizado do potencial do território em termo de recursos naturais, o que conduz, por vezes, a decisões casuísticas que inviabilizam as melhores soluções a médio-longo prazo. Agradecimentos a Luís Lopes e Teresa Salomé Mota pela leitura e revisão crítica do texto Geólogo da Universidade do Minho e membro da Associação Portuguesa de Geólogos
  • 25. Portugal, um território de geodiversidade Uma das principais razões pelas quais Portugal é um país com forte atracção de turistas é, directa e indirectamente, a sua geodiversidade. Vejamos como é constituída a geodiversidade do país. José Brilha 5 de Novembro de 2022, 7:37 A geodiversidade em Portugal é elevada ou baixa? Encontra-se distribuída de forma homogénea por todo o país ou há regiões com maior diversidade geológica do que outras? E como se reflecte a geodiversidade nas paisagens e na cultura do país? Numa viagem do Minho ao Algarve, e não esquecendo os Açores e a Madeira, é fácil constatar que Portugal é um país de elevada geodiversidade: observem-se as diferenças na paisagem e no relevo ou
  • 26. repare-se nas rochas com que são construídas as casas tradicionais em zonas rurais. A geodiversidade é, directa e indirectamente, uma das principais razões pelas quais Portugal é um país com forte atracção turística, apesar de não existir uma percepção generalizada de que os elementos naturais de um país, assim como alguns culturais, são condicionados pela geodiversidade existente. Vamos então conhecer como é constituída a geodiversidade em Portugal, um exercício arriscado e necessariamente não exaustivo, dada a limitação no número de palavras disponíveis para este texto. Rochas Começamos pelas rochas, provavelmente aquilo que todos associam, desde logo, à geologia. Existe em Portugal uma grande variedade de rochas representativas dos três grupos principais: magmáticas ou ígneas, metamórficas e sedimentares (ver mapa em baixo).
  • 27. Na metade Norte da parte continental, predominam as rochas magmáticas intrusivas (formadas pelo arrefecimento do magma em profundidade). Os granitos, e suas variedades, são, provavelmente, das rochas mais conhecidas: com cerca de 300 milhões de anos, são há muito usadas na construção de monumentos como o Bom Jesus, em Braga, a Torre dos Clérigos, no Porto, ou a Sé Catedral, na Guarda, e na edificação do casario tradicional em aldeias como Soajo ou Monsanto, entre muitas outras. Existem outras rochas magmáticas intrusivas no país, como dioritos, gabros e sienitos.
  • 28. Aldeia do Soajo Anna Costa Para observarmos a diversidade de rochas magmáticas extrusivas (formadas pelo arrefecimento do magma à superfície), teremos de visitar os arquipélagos dos Açores e da Madeira, apesar de no Continente também existirem rochas basálticas na zona de Lisboa, Mafra, Rio Maior e Lagos. Nas ilhas ocorrem, por exemplo, basaltos, andesitos, traquitos, tufos vulcânicos, ignimbritos e piroclastos como bombas, lapili e cinzas.
  • 29. Lava encordoada na ilha do Pico, Açores José Brilha As rochas metamórficas ocupam uma boa parte de Trás-os-Montes, Beira Alta e Alentejo. São rochas tão diversas como xisto, quartzito, mármore e gnaisse, formadas em profundidade por modificação de rochas pré- existentes, devido a um aumento de temperatura e pressão.
  • 30. Rochas metamórficas dobradas na Praia da Foz dos Ouriços, Almograve José Brilha A rocha mais antiga em Portugal é metamórfica: trata-se de um granulito, em Bragança, com cerca de 1100 milhões de anos (ainda relativamente jovem se compararmos com os 4600 milhões de anos da idade da Terra). Nesta região, e na zona de Macedo de Cavaleiros, ocorrem rochas metamórficas exóticas, como anfibolitos e metaperidotitos, que resultaram do metamorfismo de rochas pré-existentes que formaram uma antiga bacia oceânica e que, devido a movimentos tectónicos, se deslocaram sobre a crusta continental permitindo a sua observação à superfície (processo de obducção). Convém recordar os menos familiarizados com temas de geologia que, com base na teoria da tectónica de placas que enquadra actualmente todo o conhecimento geológico, a distribuição das massas continentais varia ao longo do tempo geológico. Assim, por exemplo, quando nos referimos a uma rocha metamórfica com cerca de 300 milhões de anos, temos de pensar que a área que hoje identificamos como “Portugal” estava localizada perto da linha do equador, e nela existiam florestas tropicais húmidas luxuriantes (que deram origem ao carvão que foi explorado, até há algumas décadas, em São Pedro da Cova e no Pejão). Finalmente, as rochas sedimentares, formadas à superfície pela acumulação de sedimentos em ambientes marinho, fluvial e lagunar, ocupam grande parte das regiões litorais ocidental (a sul de Aveiro) e meridional, e das bacias dos rios Tejo e Sado. De uma forma geral, são as rochas mais recentes do país (formadas durante os últimos 220 milhões de anos) e apresentam igualmente uma grande variedade, como calcários, margas, arenitos e conglomerados. Também estas rochas têm uma forte representação no património cultural português; basta referir, como exemplos, os calcários usados na calçada portuguesa ou nos mosteiros dos Jerónimos e da Batalha, ou os arenitos avermelhados que conferem ao castelo de Silves um aspecto distinto. Directamente relacionados com os vários tipos de rochas, temos os solos;
  • 31. também eles fazem parte da geodiversidade. Os solos resultam da lenta transformação das rochas à superfície da Terra, condicionada pelo clima e pela topografia. Existindo uma grande variedade de rochas, a que se aliam diferenças climáticas e de relevo entre Norte e Sul, litoral e interior do país, vamos encontrar uma diversidade de solos com características bem distintas (solos podzolizados, halomórficos, mólicos, litólicos, argiluviados, calcários, entre outros). Por exemplo, os solos são mais argilosos no Sul do país, mas mais ácidos e com maior teor de carbono orgânico no Norte. Minerais Para além dos vários minerais que formam cada uma das rochas (quartzo, feldspato, mica, calcite, olivina, anfíbola, entre muitos outros), existem concentrações de minerais em alguns locais, resultantes de determinados processos geológicos. No grupo dos minerais metálicos estão documentadas mineralizações de, por exemplo, chumbo, cobalto, cobre, crómio, estanho, ferro, lítio, manganês, níquel, ouro, prata, terras-raras, titânio, tungsténio, urânio e zinco. Quanto a minerais não metálicos, existem registos de asbesto, apatite, bário, caulino, diatomito, feldspato, flúor, grafite, quartzo, talco, entre outros. Alguns destes minerais são, ou podem vir a ser, explorados para fins económicos de forma a satisfazer as necessidades da vida humana, tema já abordado em texto anterior. Fósseis Os fósseis correspondem a qualquer registo de vida do passado geológico preservado em rochas (ossos, dentes, pegadas, pistas de locomoção...). São testemunhos cruciais que permitem reconstituir a
  • 32. origem da vida no planeta e a sua evolução até à biodiversidade hoje existente. Os fósseis mais antigos encontrados em Portugal terão cerca de 539 milhões de anos: são associações de microalgas preservadas em rochas metamórficas na região de Monfortinho-Salvaterra do Extremo. A diversidade dos fósseis mais antigos é muito grande e inclui um vasto conjunto de organismos, como trilobites, braquiópodes, bivalves, gastrópodes, equinodermes, graptólitos e esponjas, que habitaram os oceanos há 400-500 milhões de anos. Na zona de Gondomar, foram identificados fósseis de plantas continentais e insectos com cerca de 300 milhões de anos. Nas rochas formadas entre há cerca de 200 e 100 milhões de anos, existe uma grande variedade de fósseis de organismos marinhos (amonites, braquiópodes, bivalves, gasterópodes, corais, equinodermes, crinóides, foraminíferos, entre outros) e também de grandes animais que viviam nas zonas litorais e perto da costa, como os dinossauros e outros répteis antepassados dos actuais crocodilos. Só na região da Lourinhã já foram identificadas mais de dez espécies de dinossauros, algumas das quais ainda só conhecidas em Portugal.
  • 33. Fósseis de embrião de dinossauro da Lourinhã José Brilha Todo este conjunto de rochas ricas em fósseis ocorre basicamente no litoral entre o Cabo Mondego e o Cabo Espichel, incluindo as zonas das serras do Sicó, Aire e Candeeiros, e em alguns sectores do litoral algarvio. De salientar ainda os fósseis de espécies ancestrais de rinocerontes, elefantes, hipopótamos e leopardos em rochas com menos de um milhão de anos no vale do Tejo e litoral alentejano. Nos Açores, ilha de Santa Maria, estão também documentados inúmeros fósseis de algas, moluscos, equinodermes, braquiópodes, crustáceos, ostracodes, cetáceos e seláceos, formados durante os últimos cinco milhões de anos. Na ilha da Madeira, a ocorrência de fósseis é mais limitada, mas também existem exemplos de algas, equinodermes, bivalves e corais. Relevo O relevo e as paisagens são, possivelmente, a face mais visível da geodiversidade. O relevo de uma região está largamente condicionado pelo tipo de rocha predominante e pela existência de estruturas
  • 34. geológicas como falhas e fracturas. Claramente, a metade Norte do país é, de um modo geral, mais montanhosa do que a metade Sul, característica que se reflecte no tipo de clima dominante. Na previsão meteorológica para Portugal Continental, é habitual escutarmos que, a norte do sistema Montejunto-Estrela, há maior probabilidade de ocorrer céu nublado e precipitação do que a sul. As formas de relevo (geoformas) podem ser caraterizadas a diversas escalas e, como já foi referido, dependem muito do tipo de rocha. Por exemplo, nas serras do Gerês e da Estrela, temos toda uma variedade de geoformas graníticas (blocos arredondados, pias, etc.) e nas serras de Aire e Candeeiros encontramos uma diversidade de formas cársicas (dolinas, grutas, etc.). No litoral Sul alentejano e cabo de São Vicente, as imponentes falésias litorais contrastam com o relevo aplanado das costas baixas nas zonas de Melides, Mira ou Aveiro. Água A circulação da água nos poros e fracturas das rochas provoca a lenta dissolução de alguns dos seus minerais, dando origem a água com uma composição química condicionada pelo tipo de minerais que foram sendo dissolvidos. Apesar de, por definição, a água ser insípida, certamente todos conseguimos sentir a diferença entre uma água com origem na serra granítica do Gerês e outra proveniente da serra de Monchique, onde o sienito nefelínico é a rocha dominante. A circulação da água ao longo de falhas e fracturas profundas dá origem a água muitas vezes quente e com propriedades medicinais nas cerca de 50 termas do Continente e ilhas. O tipo de água que existe num determinado local é, assim, mais uma manifestação da geodiversidade da região. Processos geológicos Uma última nota relativa aos processos geológicos activos que ocorrem a
  • 35. uma velocidade e numa escala que é facilmente apreendida pelos seres humanos e que também fazem parte da geodiversidade. No caso de Portugal, referimo-nos a fenómenos vulcânicos (nos Açores), actividade sísmica, movimentos de vertente (desabamentos, deslizamento de blocos, etc.), erosão costeira, dinâmica fluvial e inundações, entre outros, que ocorrem um pouco por todo o país. Com (apenas) 92.225 quilómetros quadrados de superfície terrestre, Portugal encontra-se, em termos de área, na posição 109 entre 195 países. Não temos ainda conhecimento suficiente para construir uma lista dos países com maior geodiversidade, mas certamente que o resumo muito incompleto aqui apresentado dá boas pistas para adivinhar a posição de Portugal nessa lista. Geólogo da Universidade do Minho e membro da Associação Portuguesa de Geólogos Agradecimentos a Luís Lopes e Teresa Salomé Mota pela leitura e revisão crítica do texto
  • 36. Para uma conservação de toda a natureza Porque é necessário conservar rochas, já que, para muitas pessoas, estas aparentam possuir grande resistência? José Brilha 12 de Novembro de 2022, 6:55 Na falésia da Nazaré afloram rochas com 80-90 milhões de anos que ajudam a entender os eventos geológicos ocorridos durante o período Cretácico Paulo Pereira Nos quatro textos anteriores, procurámos dar a conhecer o conceito de geodiversidade, de que modo os elementos e processos que a constituem são essenciais para assegurar as condições de vida e bem-estar de seres humanos e não humanos, o papel da geodiversidade na organização do território e a geodiversidade em Portugal. Neste quinto e último texto iremos desvendar alguns dos elementos da geodiversidade existentes em Portugal que possuem carácter excepcional e que devem, por isso, ser protegidos. Mas será que as leis de conservação da natureza asseguram a protecção adequada destes elementos? E valerá mesmo a pena preocuparmo-nos em “proteger umas rochas”?
  • 37. O Parque Nacional de Yellowstone, criado em 1872 nos Estados Unidos da América, é considerado o primeiro parque nacional do mundo. Trata-se de uma região vulcânica, onde terá ocorrido uma das maiores erupções de sempre e onde existe a maior concentração de géisers activos do mundo (cerca de 500). Só passado um século Portugal daria os primeiros passos no estabelecimento de áreas protegidas, com a criação, em 1971, do Parque Nacional da Peneda-Gerês. Também neste domínio começámos tarde... A conservação da natureza faz parte do conjunto de políticas públicas de qualquer país. Em Portugal, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) é a autoridade nacional que tem por missão acompanhar e assegurar a execução das políticas de conservação da natureza. O Regime Jurídico da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (RJCNB) e a Estratégia Nacional de Conservação da Natureza e Biodiversidade 2030 (ENCNB) constituem as bases principais que suportam as políticas públicas de conservação da natureza em Portugal continental (as regiões autónomas dos Açores e Madeira têm legislação própria). Serão estes instrumentos adequados para conservar a geodiversidade? Vamos primeiro definir o que significa “conservar a geodiversidade” . Na verdade, não podemos nem queremos proteger toda a geodiversidade, uma vez que, diariamente e em todo o mundo, necessitamos extrair milhões de toneladas de recursos geológicos essenciais para o nosso bem-estar. Porém, existem alguns elementos que fazem parte da geodiversidade e que apresentam características especiais que lhes conferem um valor excepcional e que devem, portanto, ser conservados. Por exemplo, fará sentido usar um calcário com fósseis raros de uma espécie já extinta para fazer cimento e assim perdermos a possibilidade de melhor compreender como evoluiu a vida no nosso planeta? Será razoável abrir uma nova estrada exactamente sobre rochas que mostram evidências dos efeitos das mudanças climáticas ocorridas nos últimos
  • 38. milhares de anos, deixando de parte a possibilidade de aprendermos com o passado para melhor nos adaptarmos às mudanças em curso? Faz sentido construir um armazém industrial no único local onde existe um determinado mineral que nos permite obter dados sobre processos geológicos que aconteceram há milhões de anos a uma dezena de quilómetros de profundidade? Património geológico Estes elementos da geodiversidade com um valor especial que os tornam únicos constituem o que se designa por “património geológico” e os locais onde eles ocorrem são os geossítios. O desafio é então o de seleccionar, entre toda a variedade de elementos geológicos, quais os que devem ser protegidos e porquê. Para tal, é absolutamente crucial proceder a um inventário do património geológico para que o sector público possa assegurar a protecção dos seus elementos mais significativos, o que se designa por “geoconservação” .
  • 39. O inventário do património geológico português reúne mais de 300 geossítios por todo o país: as diferentes cores correspondem aos diversos temas geológicos na base da selecção dos geossítios (os mapas de Portugal Continental e Regiões Autónomas estão a diferentes escalas) A comunidade geocientífica nacional produziu, há cerca de uma década, um inventário sistemático do património geológico português, tendo identificado mais de 300 geossítios com base no seu valor científico e na sua relevância nacional e internacional (disponível aqui).
  • 40. Este inventário foi cedido ao ICNF para que fossem implementadas medidas de conservação e gestão desses geossítios. Infelizmente, até ao momento, este instrumento fundamental para a conservação da natureza não foi ainda alvo de qualquer atenção por parte do ICNF, deixando assim este património geológico em risco de ser destruído e/ou vandalizado. Já em 2018, a ENCNF reconhecia que “apesar de existir um inventário do património geológico português, não foram tomadas medidas para a sua gestão. É necessário proceder à delimitação detalhada dos geossítios, identificar o respectivo grau de conservação e os geoindicadores que possam ser usados na sua monitorização e ainda definir usos potenciais para garantir a utilização sustentável do património geológico por parte da sociedade” . No Parque Nacional da Peneda-Gerês são inúmeros os exemplos notáveis de relevo granítico de montanha Renato Henriques Ameaças ao património geológico Poder-se-á perguntar porque é necessário conservar rochas, já que, para
  • 41. muitas pessoas, estas aparentam possuir grande resistência, pelo que não parecem existir ameaças que as possam afectar. Na verdade, não é bem assim. A erosão natural pode degradar, em poucos anos, a superfície das rochas. É o caso, por exemplo, dos geossítios com pegadas de dinossauros onde, na ausência de qualquer medida de gestão, as marcas das pegadas se tornam cada vez mais imperceptíveis e vão assim perdendo as características que lhes conferem o seu valor científico. A maior parte das ameaças são, porém, antrópicas, começando pelo desconhecimento da sociedade sobre o que é património geológico e qual a sua importância. A colheita ilegal de fósseis e minerais que alimentam redes internacionais de contrabando leva à destruição de muitos geossítios e à impossibilidade de serem realizados estudos científicos pioneiros, no caso de serem comercializadas espécimes desconhecidos para a ciência. Quando alguém compra um mineral ou um fóssil será que se preocupa em saber se o mesmo terá sido obtido de forma legal pelo vendedor? A ausência de legislação apropriada para garantir a protecção de geossítios é outra das ameaças. Em Portugal, só os geossítios que estão em áreas protegidas, uma minoria, possuem algum tipo de protecção; os restantes podem ser destruídos ou vandalizados sem qualquer consequência para quem o faz. São também ameaças a ausência de políticas públicas de geoconservação e a sua não implementação, assim como a inoperância das instituições que têm a responsabilidade de gerir o património natural do país. Muitos geossítios são ainda afectados pela construção de infra-estruturas (estradas, edificações variadas, barragens). Ao contrário do que acontece, e bem, com vestígios arqueológicos, se for descoberto qualquer tipo de elemento geológico raro durante a construção de uma infra-estrutura, nada obriga à interrupção dos trabalhos para análise dos achados. A pressão turística em alguns geossítios é também habitualmente referida como sendo uma ameaça ao património geológico. Um exemplo óbvio é o
  • 42. caso da visitação em grutas calcárias que deve ser controlado e monitorizado, porque o mero efeito da respiração dos visitantes sobre a atmosfera confinada da gruta pode influenciar os mecanismos de precipitação química responsáveis pela formação de estalactites e estalagmites. Relevância internacional Para demonstrar a elevada importância do património geológico português, basta referir o reconhecimento já feito por organismos internacionais. Um dos requisitos para a UNESCO conferir o título de Geoparque Mundial a uma determinada área é o facto de esta possuir património geológico de relevância internacional. É o caso dos cinco Geoparques Mundiais da UNESCO portugueses: Açores, Arouca, Estrela, Naturtejo e Terras de Cavaleiros. Em cada um deles existem geossítios onde fósseis, rochas e formas de relevo têm valor científico internacional. Uma breve nota para lembrar que a UNESCO atribui classificações distintas ao património natural, que não devem ser confundidas: Reserva da Biosfera, Património Mundial e Geoparque Mundial.
  • 43. Formações jurássicas no Cabo Mondego, um dos dois locais em Portugal que são referências internacionais para a escala de tempo geológico José Brilha A União Internacional das Ciências Geológicas é o organismo oficial responsável pelo estabelecimento da escala de tempo geológico. Tal como estamos habituados a dividir o tempo em séculos, anos, meses, semanas, dias, horas, minutos e segundos, também os geólogos fazem uma divisão do tempo geológico. Assim, os 4600 milhões de anos da idade da Terra são divididos em eons, eras, períodos, épocas e idades. Estas divisões do tempo geológico estão materializadas em formações rochosas dispersas pelo planeta, seleccionadas pelos geólogos depois de anos de investigação científica. Em Portugal, existem duas destas formações que são referências mundiais do tempo geológico e que representam: uma o início da Idade Bajociano (há 170,3 milhões de anos) e outra o início da Idade Toarciano (há 182,7 milhões de anos), ambas pertencentes ao período Jurássico. A primeira localiza-se no Cabo Mondego e a segunda na península de Peniche. Estas formações geológicas são, obviamente, mais dois geossítios de relevância internacional existentes em território nacional. No dia 28 de Outubro passado, por ocasião das celebrações do seu 60º aniversário, a União Internacional das Ciências Geológicas ratificou a lista dos primeiros 100 sítios de património geológico de relevância internacional, da qual constam três geossítios portugueses: o vulcão dos Capelinhos na ilha do Faial, nos Açores; as trilobites gigantes de Arouca; e a discordância entre o Paleozóico e o Mesozóico exposta nas falésias da Ponta do Telheiro, no litoral de Vila do Bispo.
  • 44. Em cinco dos sete monumentos naturais podem ser observadas pegadas de dinossauro como aqui em Ourém/Torres Novas, local habitualmente conhecido como Pedreira do Galinha José Brilha Em Portugal Continental existem cinco categorias de áreas protegidas: Parque Nacional, Parque Natural, Reserva Natural, Paisagem Protegida e Monumento Natural. Apesar das áreas protegidas das primeiras quatro categorias terem sido criadas sem ter tido em conta especificamente a protecção de geossítios, o inventário revelou a sua existência em algumas destas áreas. Já a criação dos sete Monumentos Naturais de âmbito nacional actualmente existentes foi feita com o intuito de protecção de património geológico: Cabo Mondego (formações geológicas jurássicas); Carenque (pegadas de dinossauro); Lagosteiros (pegadas de dinossauro); Pedra da Mua (pegadas de dinossauro); Pedreira do Avelino (pegadas de dinossauro); Pegadas de Dinossauros de Ourém/Torres Novas (habitualmente referido como Pedreira do Galinha); Portas de Ródão (feições geomorfológicas).
  • 45. Para além destes, existem ainda Monumentos Naturais Locais classificados e geridos por municípios com a finalidade de proteger património geológico, como acontece, por exemplo, em Alenquer, Arouca, Bragança e Viana do Castelo. Os municípios têm revelado um crescente interesse pela geoconservação, como, aliás, o demonstram os prémios atribuídos, desde 2004, no âmbito do concurso anual destinado a autarquias e promovido pelo grupo português da Associação Internacional para a Conservação do Património Geológico (ProGEO). Conclui-se assim uma série de cinco artigos que pretenderam assinalar a comemoração, pela primeira vez, do Dia Internacional da Geodiversidade (6 de Outubro). E porque não aproveitar para conhecer um dos muitos geossítios em Portugal e assim celebrar a geodiversidade? Agradecimentos a Luís Lopes e Teresa Salomé Mota pela leitura e revisão crítica do texto Geólogo da Universidade do Minho e membro da Associação Portuguesa de Geólogos