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O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA
Porém já cinco Sóis eram passados
Que dali nos partíramos, cortando
Os mares nunca d'outrem navegados,
Prosperamente os ventos assoprando,
Quando ua noite, estando descuidados
Na cortadora proa vigiando,
Ua nuvem que os ares escurece,
Sobre nossas cabeças aparece.
Adamastor
O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA
(…)
MARIDO: Se não fora o capitão,
eu trouxera, a meu quinhão,
um milhão vos certifico.
(…)
AMA: Agora me quero eu rir
disso que me vós dizeis.
Pois que vós vivo viestes,
que quero eu de mais riqueza?
Louvado seja a grandeza
de vós, Senhor que mo trouxestes.
A nau vem bem carregada?
MARIDO: Vem tão doce embandeirada.
AMA: Vamo-la, rogo-vo-lo, ver.
MARIDO: Far-vos-ei nisso prazer?
AMA: Si que estou muito enfadada.
O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA
Pescador da barca bela,
Onde vais pescar com ela,
Que é tão bela,
Ó pescador?
Não vês que a última estrela
No céu nublado se vela?
Colhe a vela,
Ó pescador!
Deita o lanço com cautela,
Que a sereia canta bela...
Mas cautela,
Ó pescador!
Não se enrede a rede nela,
Que perdido é remo e vela
Só de vê-la,
Ó pescador!
Pescador da barca bela,
Inda é tempo, foge dela,
Foge dela,
Ó pescador!
O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA
Horas mortas
(…)
E, enorme, nesta massa irregular
De prédios sepulcrais, com dimensões de montes,
A Dor humana busca os amplos horizontes,
E tem marés, de fel, como um sinistro mar!
“ Aspiro o odor do Mar que embriaga tudo” (Beirão)
O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA
“História Trágico- Marítima”
Lá vai a Nau das Índias à ventura…
A voz do Adamastor como um trovão,
Ao juízo final da perdição
Invoca o negro Abismo a negra Altura
E surge, dum e de outra, horrenda e escura
- Viva, outra vez! A imensa legião
Dos naufrágios que foram e serão
Rompendo o espaço, o tempo e a sepultura…
António Oliveira
O MAR NA LITERATURA PORTUGUES
A largada
Foram então as ânsias e os pinhais Transformados em frágeis caravelas
Que partiam guiadas por sinais Duma agulha inquieta como elas...
Foram então abraços repetidos
À Pátria-Mãe-Viúva que ficava Na areia fria aos gritos e aos gemidos
Pela morte dos filhos que beijava.
Foram então as velas enfunadas Por um sopro viril de reacção
Às palavras cansadas Que se ouviam no cais dessa ilusão.
Foram então as horas no convés
Do grande sonho que mandava ser Cada homem tão firme nos seus pés
Que a nau tremesse sem ninguém tremer.
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  • 1. O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA Porém já cinco Sóis eram passados Que dali nos partíramos, cortando Os mares nunca d'outrem navegados, Prosperamente os ventos assoprando, Quando ua noite, estando descuidados Na cortadora proa vigiando, Ua nuvem que os ares escurece, Sobre nossas cabeças aparece. Adamastor
  • 2. O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA (…) MARIDO: Se não fora o capitão, eu trouxera, a meu quinhão, um milhão vos certifico. (…) AMA: Agora me quero eu rir disso que me vós dizeis. Pois que vós vivo viestes, que quero eu de mais riqueza? Louvado seja a grandeza de vós, Senhor que mo trouxestes. A nau vem bem carregada? MARIDO: Vem tão doce embandeirada. AMA: Vamo-la, rogo-vo-lo, ver. MARIDO: Far-vos-ei nisso prazer? AMA: Si que estou muito enfadada.
  • 3. O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA Pescador da barca bela, Onde vais pescar com ela, Que é tão bela, Ó pescador? Não vês que a última estrela No céu nublado se vela? Colhe a vela, Ó pescador! Deita o lanço com cautela, Que a sereia canta bela... Mas cautela, Ó pescador! Não se enrede a rede nela, Que perdido é remo e vela Só de vê-la, Ó pescador! Pescador da barca bela, Inda é tempo, foge dela, Foge dela, Ó pescador!
  • 4. O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA Horas mortas (…) E, enorme, nesta massa irregular De prédios sepulcrais, com dimensões de montes, A Dor humana busca os amplos horizontes, E tem marés, de fel, como um sinistro mar! “ Aspiro o odor do Mar que embriaga tudo” (Beirão)
  • 5. O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA “História Trágico- Marítima” Lá vai a Nau das Índias à ventura… A voz do Adamastor como um trovão, Ao juízo final da perdição Invoca o negro Abismo a negra Altura E surge, dum e de outra, horrenda e escura - Viva, outra vez! A imensa legião Dos naufrágios que foram e serão Rompendo o espaço, o tempo e a sepultura… António Oliveira
  • 6. O MAR NA LITERATURA PORTUGUES A largada Foram então as ânsias e os pinhais Transformados em frágeis caravelas Que partiam guiadas por sinais Duma agulha inquieta como elas... Foram então abraços repetidos À Pátria-Mãe-Viúva que ficava Na areia fria aos gritos e aos gemidos Pela morte dos filhos que beijava. Foram então as velas enfunadas Por um sopro viril de reacção Às palavras cansadas Que se ouviam no cais dessa ilusão. Foram então as horas no convés Do grande sonho que mandava ser Cada homem tão firme nos seus pés Que a nau tremesse sem ninguém tremer.
  • 7. O MAR NA LITERATURA PORTUGUESA