Este documento relata um estudo que avaliou o efeito de extratos de três plantas medicinais (Costus pisonis, Achillea millefolium e Plectranthus barbatus) no crescimento micelial de quatro fungos fitopatogênicos (Colletotrichum musae, Colletotrichum gloeosporioides isolado de mamão e cacau, e Colletotrichum lindemuthianum). Todos os extratos apresentaram algum efeito fungitóxico, sendo que o extrato de folhas de P. barbatus foi
Extratos de plantas medicinais inibem fungos fitopatogênicos
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Rev. Bras. Pl. Med., Botucatu, v.10, n.3, p.57-60, 2008.
Recebido para publicação em 14/08/2007
Aceito para publicação em 20/12/2007
Ação antimicrobiana de extratos de plantas medicinais sobre espécies
fitopatogênicas de fungos do gênero Colletotrichum
SILVA, M.B.
1*
; NICOLI,A.
1
; COSTA,A.S.V.
1
; BRASILEIRO, B.G.
1
; JAMAL, C.M.
1
; SILVA, C.A.
1
; PAULAJÚNIOR,
T.J.
2
; TEIXEIRA, H.
2
1
UNIVALE, Rua Israel Pinheiro 2000, 35020-220 - Governador Valadares, MG;
2
EPAMIG-CTZM, Vila Giannetti 47,
36570-000 - Viçosa, MG; *mbarreto@univale.br
RESUMO: Ademanda por produtos agrícolas com baixo nível residual de pesticidas é cada vez
maior. Princípios ativos derivados de metabólitos secundários presentes em extratos de plantas
medicinais podem inibir o desenvolvimento de organismos fitopatogênicos. Este trabalho verificou
o efeito in vitro de extratos das plantas medicinais Costus pisonis (“cana-de-macaco”), Achillea
millefolium (“mil-folhas”) e Pelctranthus barbatus (“boldo-da-terra”) no crescimento micelial dos
fungos Colletotrichum musae (isolado de banana), Colletotrichum gloeosporioides (isolado de
mamão), C. gloeosporioides (isolado de cacau) e Colletotrichum lindemuthianum (isolado de
feijão). Todos os extratos apresentaram algum efeito fungitóxico sobre o crescimento micelial
dos fungos. O extrato de folhas de C. barbatus reduziu o crescimento micelial de C. musae, C.
gloeosporiodes (mamão), C. gloeosporiodes (cacau) e C. lindemuthianum em 82, 49, 47 e 53%,
respectivamente.
Palavras-chave: controle alternativo, antracnose, metabólitos secundários
ABSTRACT: Antimicrobial action of medicinal plant extracts on phytopathogenic species
of Colletotrichum fungus. Agricultural products with low levels of pesticide residues have been
increasingly required by consumers. Active ingredients derived from secondary metabolites and
present in medicinal plant extracts can inhibit the development of plant pathogens. The objective
of this work was to verify the in vitro effect of extracts from the medicinal plants Costus pisonis,
Achillea millefolium and Plectranthus barbatus on the mycelial growth of Colletotrichum musae
(isolated from banana), Colletotrichum gloeosporioides (isolated from papaya), C. gloeosporioides
(isolated from cacao) and Colletotrichum lindemuthianum (isolated from bean). All extracts had
an inhibitory effect on the fungi mycelial growth. Plectranthus barbatus leaf extract reduced the
mycelial growth of C. musae, C. gloeosporiodes (papaya), C. gloeosporiodes (cacao) and C.
lindemuthianum by 82, 49, 47 and 53%, respectively.
Key words: alternative control, anthracnose, secondary metabolites
INTRODUÇÃO
O uso indiscriminado e sem
acompanhamento de defensivos agrícolas
industrializados tem induzido o surgimento de
populações resistentes de patógenos de plantas,
fazendo com que os agricultores aumentem, por sua
conta, a dose dos produtos utilizados, como forma de
manter sob controle as doenças e a viabilidade
econômica da produção. Conseqüentemente, o
desenvolvimentodeprodutosagrícolascombaixonível
residual de pesticidas é cada vez mais demandado.
O uso de produtos derivados da indústria
química no controle de doenças na agricultura
moderna tem sido amplamente questionado pela
sociedade, em decorrência dos efeitos adversos
causados por estes (Koepf et al., 1986; Paula Jr. et
al., 2006). Dentre estes efeitos é possível enumerar
a poluição da água e do ar, a contaminação de
alimentos, o aumento da resistência de patógenos
aos produtos e os seus efeitos sobre as plantas, os
animais e o homem (Souza, 1998). O principal
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problema na utilização de agrotóxicos está ligado,
porém, ao fato de esses produtos serem, muitas
vezes, aplicados em doses excessivas ou de forma
inadequada. Além disso, o desenvolvimento de
produtos sintéticos para controlar doenças é
procedimento trabalhoso e de custo elevado por causa
dos vários testes que são, geralmente, requeridos,
como eficácia, seletividade, toxicologia e impacto ao
ambiente (McLaren, 1986).
Extratos de plantas medicinais têm sido
utilizados com sucesso no controle de fungos
fitopatogênicos (Silva et al., 2006). Metabólitos
secundários de plantas são considerados escórias
ou produtos finais do seu metabolismo e têm
importância para as plantas que os sintetizam. Uma
das funções dessas substâncias é fornecer proteção
às plantas contra o ataque de organismos
patogênicos (Whittaker & Fenny, 1971; Swain, 1977;
McLaren, 1986; Wink, 1988; Taiz & Zeiger, 1991).
Tem sido verificado que a maioria dos extratos de
plantas apresenta propriedades antifúngicas
(Pordesimo & Ilag, 1976; Moore & Atkins, 1977;
Alfenas et al., 1982; Rai & Tripathi, 1984).
Espécies de plantas medicinais têm, em sua
composição química, substâncias biologicamente
ativas que provocam no organismo humano reações
quepodemvariardacuraaoabrandamentodadoença.
Diversas espécies têm sido também testadas para o
controledefitopatógenos.Cruzetal.(1998)verificaram
que o tratamento de sementes de soja com extrato
aquoso de manjericão (Ocimum basilicum), lavanda
(Lavandula officinalis), capim-limão (Cymbopongon
citratus) e eucalipto (Eucaliptus citriodora) reduziu
significativamente a incidência de Penicillium sp. e
de Aspergillus sp. Em sementes. Silva et al. (1999)
verificaram queoextratodequebra-pedra(Phyllanthus
niruri) inibiu a germinação de Fusarium oxysporum.A
atividade nematicida do extrato aquoso de alho (Allium
sativum) contra o nematóide-das-galhas do cafeeiro,
Meloydogine exigua, foi comprovada por Silva et al.
(1999).
Alguns metabólitos isolados ou mesmo
frações de extratos também apresentam atividade
antifúngica. O óleo essencial de cambará (Lantana
aculeata) apresentou atividade contra Aspergillus
flavus, Aspergillus fumigatus, Aspergillus niger, F.
oxysporum, Microspermum gypsum, Penicillium
digitatum, Penicillium notatum e Rhizophus stolonifer
(Saxena & Sharma, 1999). Tetranortriterpenóides
isolados de cedro australiano (Toona ciliata), neem
(Azadirachta indica) e cidra (Citrus medica)
apresentaram atividade contra Puccinia arachidis
(Govindachari et al., 2000).
O presente trabalho verificou o efeito in vitro
do extrato bruto de algumas espécies de plantas
medicinais no crescimento micelial dos fungos
fitopatogênicos Colletotrichum musae (Berk. & M.A.
Curtis)Arx (isolado de banana; anamorfo: Glomerella),
Colletotrichum gloeosporioides (Penz.) Penz. & Sacc.
(isolado de mamão; anamorfo: Glomerella cingulata),
C. gloeosporioides (Penz.) Penz. & Sacc. (isolado
de cacau; anamorfo: G. cingulata) e Colletotrichum
lindemuthianum (Sacc. & Magnus) Briosi & Cavara
(isolado de feijão; anamorfo: Glomerella).
MATERIALE MÉTODO
Plantas de cana-de-macaco (Costus pisonis
Lindl., Zingiberaceae), mil-folhas (Achillea millefolium
L., Asteraceae) e boldo-da-terra [Plectranthus
barbatus (Andr.) Benth, Limiaceae] foram coletadas
e do horto de plantas medicinais da UNIVALE, em
seguida, submetidas à secagem em temperatura
ambiente. Os extratos destas plantas foram obtidos
por maceração, utilizando-se como solvente o etanol.
Posteriormente foram secos foram obtidos pela
eliminação do etanol por evaporação a vácuo e
identificados no banco de extratos do Bioplanta, grupo
de pesquisa em Plantas Medicinais da UNIVALE, sob
os respectivos códigos: Bio40, Bio38 e Bio32.
A partir de folhas e de caules de C. pisonis,
A. millefolium e de P. barbatus foi extraído 1 g de
extrato etanólico, que foi diluído em 5 mL do solvente
orgânico dimetilsulfóxido (DMSO). Visando obter uma
concentração final de 2.000 µL L-1
, após repouso por
uma hora, 0,5 mL do extrato de cada planta medicinal
foi dissolvido em DMSO e vertido em frasco
Erlenmeyer contendo 50 mL de BDA, previamente
autoclavado, cuja temperatura encontrava-se em
48°C. Em seguida, o extrato bruto foi homogeneizado
no meio de cultura e vertido em placas de Petri. Quatro
horas depois, discos de micélio de 0,7 cm de diâmetro
dos fungos C. musae, C. gloeosporioides (mamão),
C. gloeosporioides (cacau) e C. lindemuthianum,
cultivados por sete dias em meio BDA (200 g de
batata, 20 g de dextrose e 15-20 g de ágar), foram
colocados no centro das placas, e mantidos a 25-
30ºC. O crescimento radial médio do micélio foi
avaliado em intervalos de 24h, até um total de 120h
após a repicagem dos fungos (Dhingra & Sinclair,
1985). Utilizou-se o delineamento experimental
inteiramente casualizado, em que cada tratamento
foi repetido cinco vezes. Placas de Petri sem extrato
vegetal contendo meio BDA acrescido do solvente
DMSO (testemunha A) e apenas com BDA
(testemunha B) serviram como controles. Para testar
a confiabilidade dos resultados, o ensaio foi repetido
duas vezes.Após análise de variância, o crescimento
radial médio de cada tratamento foi comparado pelo
Teste de Tukey, a 5% de probabilidade.
RESULTADO E DISCUSSÃO
Todos os extratos avaliados apresentaram
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TABELA 1. Efeito de extratos vegetais brutos de Costus pisonis, Achillea millefolium e Coleus barbatus no crescimento micelial médio (cm) de Colletotrichum
musae (isolado de banana), Colletotrichum gloeosporioides (isolado de mamão), C. gloeosporioides (isolado de cacau) e Colletotrichum lindemuthianum(isolado
de feijão).
1
Valores médios acumulados após 120 h de incubação a 25-30o
C.
2
Médias seguidas das mesmas letras nas colunas não diferem estatisticamente entre si pelo Teste de Tukey (5%).
3
Valores entre parênteses referem-se à sensibilidade média de inibição do crescimento micelial dos fungos (%) pelos extratos vegetais em relação à testemunha A
(placas sem extrato vegetal contendo meio BDA + solvente orgânico DMSO) ou B (placas sem extrato vegetal contendo apenas meio BDA).
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efeitos fungitóxicos variáveis sobre o crescimento
micelialdasespéciesde Colletotrichumspp.(Tabela1).
Os resultados obtidos em placas sem extrato
vegetal contendo BDA+ DMSO (testemunhaA) foram
comparados com os obtidos em placas contendo
apenas BDA (testemunha B) e observou-se que o
solvente orgânico DMSO inibiu o crescimento dos
fungos na concentração utilizada. Dessa forma, a
avaliação do potencial de controle de cada extrato foi
feita considerando-se a testemunhaA.
Os extratos provenientes de folhas e de
caules de P. barbatus apresentaram o maior potencial
fungitóxico comparado aos extratos das outras
espécies testadas.Ambos os extratos de C. barbatus
inibiram de forma similar o crescimento micelial de
C. gloeosporioides isolado de mamão, bem como de
C. musae e C. lindemuthianum; entretanto, o extrato
proveniente de folhas apresentou maior efeito inibidor
em C. gloeosporioidesisolado de cacau do que aquele
proveniente apenas da maceração de caules da
planta. Comparado às testemunhas A e B, o
crescimento de C. gloeosporioides (cacau) foi inibido
tanto pelo extrato de C. pisonis quanto de A.
millefolium. Por outro lado, apenas o extrato de A.
millefolium apresentou efeito inibidor no crescimento
micelial de C. musae.
C. musae foi a espécie que apresentou maior
sensibilidade média aos compostos testados. Seu
crescimento em meio BDA contendo extrato de folhas
de P. barbatus sofreu inibição de 83 e 81%,
comparando-se, respectivamente, às testemunhasA
e B (Tabela 1).
Neste trabalho foram utilizados apenas os
extratos brutos das plantas testadas. Em estudos
futuros, caso sejam utilizadas frações biologicamente
ativas, é possível que haja a potencialização do efeito
fungitóxico dos extratos, especialmente com relação
a C. barbatus. Além da necessidade de demonstrar
o potencial fungitóxico in vivo, estudos adicionais
deverão incluir a caracterização química dos
princípios ativos dos extratos dessas espécies.
CONCLUSÃO
Extratos das plantas medicinais Costus
pisonis (“cana-de-macaco”), Achillea millefolium (“mil-
folhas”) e Plectranthus barbatus (“boldo-da-terra”)
foram capazes de inibir o crescimento micelial de
fungos fitopatogênicos do gênero Colletotrichum. O
extrato de folhas de P. barbatus reduziu o crescimento
micelial de C. musae, C. gloeosporiodes (isolado de
mamão), C. gloeosporiodes (isolado de cacau) e C.
lindemuthianumem82,49,47e53%,respectivamente.
AGRADECIMENTO
Os autores agradecem ao apoio da
FAPEMIG (Belo Horizonte, MG). T.J. Paula Júnior é
bolsista do CNPq.
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