Resumo 4
ABSTRACT 5
1. Introdução 6
2. Objectivo Geral 7
2.1. Objectivos específicos 7
2.2. Hipóteses 7
2.3. Metodologia 7
2.4. Métodos 8
2.5. Método bibliográfico 8
2.6. Método dedutivo 8
2.7. Técnicas e instrumentos de pesquisa 8
3. Conceito de empresário e empresa 9
4. Crise económico-financeira empresarial 10
4.1 Causas e consequências da crise empresarial 13
4.2. Empresa produtora de bens e serviços, em crise deve ser liquidada ou recuperada? 15
4.3. Empresa privada de interesse particular em crise deve ser liquidada ou recuperada? 16
4.4. Empresa privada de interesse público em crise, deve ser liquidada ou recuperada? 17
4.5. Empresa pública em crise deve ser liquidada ou recuperada? 18
4.6. Procedimento para recuperação da empresa privada de interesse privado, privada de interesse público) e a pública, em estado de crise económica. 19
5. Procedimento de recuperação judicial e extrajudicial das empresas em crise no direito estrangeiro 21
5.1 O procedimento de recuperação judicial e extrajudicial no direito brasileiro – Direito falimentar e a lei de recuperação 21
5.2 O processo de liquidação extrajudicial de instituições financeiras brasileiras 24
5.3. Procedimento de recuperação nos Estados Unidos - Debtor-in-possession Financing (DIP financing) 28
5.4 O procedimento de recuperação britânico com o “London Approach” 29
6. Direito da empresa em crise e a necessidade da criação de uma lei para a sua recuperação 30
6.1. Premissas Constitucionais do tratamento das empresas em crise 30
6.2 A função social da propriedade e a preservação da empresa 30
6.3. Normas infraconstitucionais - objectivos da Lei da falência 32
6.4. O Princípio da Preservação da Empresa na Constituição 35
6.5. A falência no Código de Processo Civil 36
6.6. Necessidade do desenvolvimento do Direito da Falência 37
7. Reorganização da instituição financeira em Angola 39
8. Necessidade da criação da lei de recuperação judicial e extrajudicial da empresa 40
Conclusão 44
Referências bibliográficas 46
Tecnologias de informação e comunicação no judiciário angolano
DIREITO DA EMPRESA EM CRISE E A NECESSIDADE DA CRIAÇÃO DE UMA LEI PARA A SUA RECUPERAÇÃO JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL
1. Relatório Final apresentado para cumprimento dos requisitos de
avaliação final no módulo de Direito Comercial e das Empresas, no
âmbito do Curso de Mestrado em Direito, na especialidade de Direito
Civil, ministrado no ano lectivo de 2018/2019.
DIREITO DA EMPRESA EM CRISE E A NECESSIDADE
DA CRIAÇÃO DE UMA LEI PARA A SUA RECUPERAÇÃO
JUDICIAL E EXTRAJUDICIAL NO ORDENAMENTO JURIDICO
ANGOLANO
AUTOR: BENILDE AGOSTINHO MALÉ
2. REGENTE DA CADEIRA: Professora Mestre Sofia Vale
Resumo................................................................................................................................. 4
ABSTRACT............................................................................................................................ 5
1. Introdução ...................................................................................................................... 6
2. Objectivo Geral..............................................................................................................7
2.1. Objectivos específicos..........................................................................................................7
2.2. Hipóteses................................................................................................................................. 7
2.3. Metodologia............................................................................................................................ 7
2.4. Métodos ................................................................................................................................... 8
2.5. Método bibliográfico............................................................................................................ 8
2.6. Método dedutivo.................................................................................................................... 8
2.7. Técnicas e instrumentos de pesquisa.............................................................................9
3. Conceito de empresário e empresa........................................................................9
4. Crise económico-financeira empresarial ..........................................................10
4.1 Causas e consequências da crise empresarial............................................................13
4.2. Empresa produtora de bens e serviços, em crise deve ser liquidada ou
recuperada? ................................................................................................................................. 15
4.3. Empresa privada de interesse particular em crise deve ser liquidada ou
recuperada?.................................................................................................................................. 16
4.4. Empresa privada de interesse público em crise, deve ser liquidada ou
recuperada?.................................................................................................................................. 17
4.5. Empresa pública em crise deve ser liquidada ou recuperada?............................18
4.6. Procedimento para recuperação da empresa privada de interesse privado,
privada de interesse público) e a pública, em estado de crise económica...............19
5. Procedimento de recuperação judicial e extrajudicial das empresas em
crise no direito estrangeiro.........................................................................................22
5.1 O procedimento de recuperação judicial e extrajudicial no direito brasileiro –
Direito falimentar e a lei de recuperação...........................................................................22
5.2 O processo de liquidação extrajudicial de instituições financeiras brasileiras
.......................................................................................................................................................... 25
5.3. Procedimento de recuperação nos Estados Unidos - Debtor-in-possession
Financing (DIP financing) ....................................................................................................... 29
2
3. 5.4 O procedimento de recuperação britânico com o “London Approach”.............29
6. Direito da empresa em crise e a necessidade da criação de uma lei para a
sua recuperação .............................................................................................................31
6.1. Premissas Constitucionais do tratamento das empresas em crise.....................31
6.2 A função social da propriedade e a preservação da empresa................................31
6.3. Normas infraconstitucionais - objectivos da Lei da falência.................................32
6.4. O Princípio da Preservação da Empresa na Constituição......................................35
6.5. A falência no Código de Processo Civil.........................................................................36
6.6. Necessidade do desenvolvimento do Direito da Falência......................................37
7. Reorganização da instituição financeira em Angola......................................39
8. Necessidade da criação da lei de recuperação judicial e extrajudicial da
empresa............................................................................................................................. 41
Conclusão .........................................................................................................................44
Referências bibliográficas...........................................................................................46
3
4. Resumo
O tecido empresarial angolano já foi constituído por várias empresas, entre as
quais destacam-se Angonave, hotel Panorama, CAP - Caixa de Crédito Agro-Pecuária
e Pescas. Na mesma senda, isto é depois da crise cambial que teve início em 2014,
várias empresas dos sectores da Construção Civil, petróleos, limpeza, e muito
recentemente operou-se a fusão dos bancos Millenium e Atlântico, e saneamento do
Banco Angolano de Negócios e Comércio (BANC), e o encerramento dos bancos
Mais, Postal e Banc posteriormente, por falta de aumento de capitais1 2
.
Em todo o país, ainda hoje é gritante a angustia dos empresários, em alguns
casos de insolvência, noutros por falta de divisas e afins, como consequência
registam-se várias greves, pelo atraso salarial, tal como é o caso da TCUL -
Transportes Colectivos de Luanda, Hotel da Huíla que foi leiloado, Caminhos de
Ferros de Luanda, e verifica-se o aumento de conflitos laborais registados nos
tribunais, Centro de Resolução de Conflitos Extrajudicial e Inspecção Geral do
Trabalho, resultantes de despedimentos, de incumprimentos no pagamento de salários,
de incumprimento no pagamento de impostos, incluindo com fornecedores e credores
e outros.
Este relatório procurou fixar os conceitos de empresário e empresa,
apresentou breves abordagens sobre a crise económico-financeira empresarial,
apontou as causas e mostrou soluções para que seja ultrapassada, aferiu a medida em
que uma Empresa produtora de bens e de serviços em crise pode ser recuperada ou
liquidada, procurou também analisar as premissas constitucionais e apontou outros
mecanismos legais de tratamento das empresas em crise e procurou trazer à tona
ilustrações a luz do direito das empresas em crise no direito estrangeiro.
Em suma, concluiu-se que há a necessidade de melhorar o Direito da empresa
em crise com a criação da Lei da Recuperação.
Palavras chaves: Empresa, empresário, crise, necessidade e recuperação
judicial e extrajudicial.
1
https://www.google.co.ao/url?
sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=2&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwjvmKnk6IPgAhWtSx
UIHeNeD24QFjABegQICRAB&url=https%3A%2F%2Fopais.co.ao%2Findex.php
%2F2019%2F01%2F04%2Fbna-encerra-banco-mais-e-banco-postal-por-insuficiencia-de-capital
%2F&usg=AOvVaw2OtPcRjJ8Oeyp2Lg1GF4f4, acesso no dia 22 de Janeiro de 2018.
2
https://noticias.sapo.ao/economia/artigos/bna-suspende-administracao-do-banco-banc, acesso no dia
22 de Novembro de 2018.
4
5. ABSTRACT
The Angolan business community has already been constituted by several
companies, among which are Angonave, Panorama Hotel, CAP - Agro-Cattle Bank
and Fisheries. In the same path, this is after the exchange crisis that began in 2014,
several companies in the Civil Construction, oil and cleaning sectors, and very
recently the merger of the Millenium and Atlântico banks and the reorganization of
the Angolan Bank of Business and (BANC), and the closing of banks Mais, Postal
and Banc, for lack of capital increase under the guidance of the National Bank of
Angola (BNA).
Throughout the country, even today, the anguish of entrepreneurs is striking,
in some cases of insolvency, in others because of lack of foreign exchange and the
like, as a result there are several strikes, due to the wage arrears, as is the case of
TCUL - Collective Transport of Luanda, Hotel da Huíla that was auctioned, Luanda
Railways, and there is an increase in labor disputes registered in the courts, the Center
for Extrajudicial Conflict Resolution and the General Inspectorate of Labor resulting
from dismissals, non-compliance with the payment of wages, non-payment of taxes,
including with suppliers and creditors and others.
This report sought to establish the concepts of entrepreneur and company,
presented brief approaches on the economic and financial crisis business, pointed out
the causes and showed solutions to be overcome, checked the extent to which a
company producing goods and services in crisis can be recovered or liquidated, also
sought to analyze the constitutional premises and pointed out other legal mechanisms
for the treatment of companies in crisis and sought to bring to the forefront
illustrations in light of the law of companies in crisis in foreign law. In short, it was
concluded that there is a need to improve the law of the company in crisis with the
creation of the Law of Recovery.
Keywords: Company, entrepreneur, crisis, need and judicial and extrajudicial
recovery.
5
6. 1. Introdução
Formalmente, a empresa considera-se encerrada, se se tratar de comerciante
em nome individual registar a cessação da actividade, mas para as sociedades
comerciais deve haver o registo da dissolução e liquidação da mesma, deste forma,
neste relatório procuramos analisar questões que foram suscitadas no âmbito das aulas
do módulo de Direito Comercial e das Empresas ministradas pela Professora Sofia
Vale, em torno da crise empresarial, que me obrigou a encontrar soluções académicas
sobre o direito da empresa em crise e despertar na sociedade sobre a necessidade da
criação de uma lei para a sua recuperação.
Restou-nos pesquisar e apresentar soluções plausíveis, na medida em que
diante de tal vexata quaestio, importa antes mesmo fazer uma analogia entre o
tratamento da pessoa humana e da colectiva a nível da Constituição da República.
Relativamente, a primeira estão consagrados vários princípios e normas jurídicas que
ajudam na sua tutela, que vão desde a consagração do princípios que protegem a sua
dignidade3
até a proibição da pena de morte4
. A tutela jurídica constitucional da
pessoa humana aparece desde a concepção, nascimento, crescimento, falecimento e
até depois da sua morte.
O que dizer das pessoas colectivas? - apesar de não estar expresso na
Constituição, elas também beneficiam de ampla protecção Constitucional5
e podemos
subentender que é proibida a pena de morte das pessoas colectivas, ou seja as
empresas devem ser protegidas até as últimas consequências e para tal tem de haver
legislação própria.
Naquilo que se infere da Constituição e demais legislações, depreendemos que
não se pode permitir que as pessoas colectivas desapareçam, (faleçam) de ânimo leve,
porquanto é preciso que se adoptem medidas legislativas especiais para que se
aumente o nível de protecção, com vista a conservar o emprego6
, manter o pagamento
3
Artigos 7.º, 31.º, n.º 2, 32.º, n.º 2 in fine, 89.º, n.º 1, 223.º, n.º 2 in fine, e 236.º, al. a) da Constituição
da República.
4
Artigo 59.º e 60.º da Constituição da República.
5
Artigos 2.º, n.º 2, in fine, 14.º, 15.º, 30.º e seguintes, 37.º, n.º 2, 38.º, n.º 2, 40.º, n.º 5, 75.º, n.º 1, 94.º,
95.º, n.º 3, 98.º, n.º 1, e outros da Constituição da República.
6
Cfr. artigo 76.º da Constituição da República; O trabalho é um direito e um dever de todos; Todo o
trabalhador tem direito à formação profissional, justa remuneração, descanso, férias, protecção, higiene
e segurança no trabalho, nos termos da lei; Para assegurar o direito ao trabalho, incumbe ao Estado
promover: a) A implementação de políticas de emprego; b) A igualdade de oportunidades na escolha
da profissão ou género de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado por qualquer tipo
de discriminação; c) A formação académica e o desenvolvimento científico e tecnológico, bem como a
6
7. dos impostos, os fins sociais da empresa, e por fim assegurar que a actividade
desempenhada pela empresa na sociedade contribua para o desenvolvimento
económico e financeiro.
Contudo, apresentamos soluções que evitam a falência/insolvência e passa
necessariamente pela aprovação do Regime jurídico de Recuperação Judicial e
extrajudicial, da falência e insolvência do empresário e da sociedade empresarial,
elaboração de um conjunto sistemático e harmónico de normas jurídicas, cuja
finalidade principal deve ser a reorganização, o saneamento e a recuperação da
empresa (a) económica e financeiramente viável e/ou (b) social, política e
estrategicamente importante, uma vez que as normas do Código de Processo Civil
vigente já não se adequam a nossa realidade.
2. Objectivo Geral
Contribuir para a actualização/modernização do direito comercial e
empresarial de Angola.
2.1. Objectivos específicos
a) Identificar as lacunas legais do direito da empresa;
b) comparar o direito da empresa e dos palops;
c) sugerir alterações complementares no direito da empresa em Angola.
2.2. Hipóteses
a) O actual direito da empresa está desactualizado;
b) O direito da empresa dos países africanos de Língua Oficial Portuguesa e
demais podem contribuir para actualização/modernização do direito da empresa em
Angola;
c) Um direito da empresa modernizado protege melhor as empresas e contribui
na atracção do investimento nacional e estrangeiro.
2.3. Metodologia
Método científico - (metodologia) é compreendida como uma disciplina que
consiste em estudar, compreender e avaliar os vários métodos disponíveis para a
realização de uma pesquisa académica. A Metodologia, em um nível aplicado,
valorização profissional dos trabalhadores; 4. Oempregadora no dever de justa indemnização ao
trabalhador despedido, nos termos da lei.
7
8. examina, descreve e avalia métodos e técnicas de pesquisa que possibilitam a colecta
e o processamento de informações, visando ao encaminhamento e à resolução de
problemas e/ou questões de investigação.
Os autores Lakatos e Marconi acrescentam que, além der ser “uma
sistematização de conhecimentos”, ciência é “um conjunto de proposições
logicamente correlacionadas sobre o comportamento de certos fenómenos que se
deseja estudar7
”.
2.4. Métodos
Os métodos usados são o bibliográfico e indutivo.
2.5. Método bibliográfico
Segundo CHIARA KAIMEN é materializado com base na pesquisa feita com
o intuito de levantar um conhecimento disponível sobre teorias, a fim de analisar,
produzir ou explicar um objecto sendo investigado. A pesquisa bibliográfica visa
então analisar as principais teorias de um tema e pode ser realizada com diferentes
finalidades8
, para o efeito, recolhemos livros, artigos científicos, dissertações de
mestrados, teses de doutoramento, jornais, revistas (online), e com eles retiramos o
necessário para ajudar na fundamentação teórica do trabalho que nos propusemos
apresentar.
2.6. Método dedutivo
É um método responsável pela generalização, isto é, partimos de algo
particular para uma questão mais ampla, mais geral9
.
7
LAKATOS e MARCONI, 2007, p. 80.
8
CHIARA, KAIMEN, et al., 2008.
9
LAKATOS e MARCONI, 2007, p. 86.
8
9. 2.7. Técnicas e instrumentos de pesquisa
Procedemos o levantamento bibliográfico descritivo, bibliográfico em livros,
dissertações de mestrado, teses de doutoramento, documentos, consultas em sites de
Universidades de vários países, com isto analisamos os dados levantados, e aplicamos
os métodos dedutivo, indutivo, através dos quais, partimos de aspectos particulares e
chegamos a conclusões gerais.
Na pesquisa bibliográfica utilizamos manuais de bibliotecas físicas e virtuais,
livrarias, de onde obtivemos informações de livros, revistas, jornais, monografias,
dissertações, teses e relatórios de instituições. Fizemos também recurso à internet
onde visitamos portais de instituições oficiais, órgãos de notícias e de portais pessoais.
3. Conceito de empresário e empresa
Jean Baptiste Say, célebre economista francês, pôs em destaque nos princípios
do seu século passado, uma das novas figuras – o empresário, até então desconhecida.
“O que exerce a mais notável influência na distribuição da riqueza”, diz ele, “é a
capacidade dos directores das indústrias10
”. Por empresa passou-se a compreender não
a cadeia de actos de comércio isolado, mas a organização dos factores de produção,
para a criação ou oferta de bens ou de serviços em massa11
.
Assevera Fábio Bellote Gomes que “empresário é aquele que exerce a
empresa (entendendo-se por esta uma actividade económica organizada), ou seja,
considera-se “empresário quem exerce profissionalmente actividade económica
organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços”12
.
A título exemplificativo o empresário pode ser comparado ao maestro em uma
10
https://www.google.co.ao/url?
sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&cad=rja&uact=8&ved=2ahUKEwih4qaGp4TgAhXJxIU
KHcyNCN4QFjAAegQIAhAB&url=https%3A%2F%2Fericferraz.jusbrasil.com.br%2Fartigos
%2F204368207%2Fconceitos-de-empresa-e-empresario-e-os-principais-tipos-de-empresas-previstos-
no-codigo-civil&usg=AOvVaw1zc8-jEM-NEpLb5QjZv_Ny, acesso no dia 23 de Janeiro de 2019.
11
A actividade do empresário pode ser vista como a de articular os factores de produção, que no
sistema capitalista são quatro: capital, mão-de-obra, insumo e tecnologia. As organizações em que
produzem os bens e serviços necessários ou úteis à vida humana são resultado da acção dos
empresários, ou seja, nascem do aporte de capital – próprio ou alheio –compra de insumos, contratação
de mão de obra e desenvolvimento ou aquisição de tecnologia que realizam. Como exemplo podemos
citar o caso de um empresário, que com seu próprio dinheiro (capital) - compra madeira (insumo),
contrata um carpinteiro (mão de obra), e projecta um novo modelo de janela de madeira (tecnologia),
viabilizando assim o produto no mercado consumidor com preços e qualidades competitivos.
(COELHO, Fábio Ulhoa, p. 01, Manual de Direito Comercial.)
12
GOMES, Fabio Billote, Manual de Direito Comercial de acordo com a nova Lei de Falência e
Recuperação de Empresas, 2.ª ed., São Paulo, Manole, 2007, p. 9.
9
10. orquestra: se, por um lado, não toca especificamente nenhum instrumento musical,
por outro, é responsável pela afinação e harmonia dos sons dos vários instrumentos
integrantes da orquestra, sendo assim responsável pela qualidade das músicas
executadas pela orquestra como um todo13
. Diante disso, pode-se claramente perceber
que a empresa funciona como um elemento catalisador dos factores de produção
existentes na sociedade, sendo o empresário o seu titular.
4. Crise económico-financeira empresarial
A expressão “crise económico-financeira” abrange tanto os males que
impedem o empresário de perseguir o objecto da sua empresa como também a
insuficiência de recursos para o cumprimento das obrigações assumidas.
Em algumas ocasiões, o estado de crise é equiparado à insolvência
empresarial, mas pode englobar também situações de mero desequilíbrio económico-
13
O exercício de actividade económica de forma organizada é que encerra toda a essência conceituai
da empresa. Ao definir o conceito de empresário, cria-se nítida excepção ao não considerar
empresário “quem exerce profissão intelectual, de natureza científica, literária ou artística, ainda com
o concurso de auxiliares ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão constituir elemento de
empresa.
A dúvida toda, como se pode perceber está cingida à correcta classificação de determinadas
actividades de prestação de serviços como actividades empresariais ou não.
Dessa forma, aquelas actividades de prestação de serviços de natureza intelectual, científica, artística
ou literária, ainda que sejam desenvolvidas com o concurso de outras pessoas, somente poderão ser
classificadas como actividades empresariais à medida que seu titular - o empresário - efectivamente
discipline o trabalho de terceiros, em uma clara organização dos meios de produção, que nada mais é
que o elemento de empresa, também chamado de empresarialidade.
Assim, o elemento de empresa implica a organização racional dos factores de produção. O
empresário, como tal, actua na organização dos factores de produção, incluindo-se aqui a
organização da mão-de-obra, na pessoa dos agentes auxiliares da empresa, e os demais factores de
produção reunidos em torno do estabelecimento empresarial.
A empresarialidade é um elemento impessoal, opondo-se assim à pessoalidade, característica da
antiga Teoria dos Actos de Comércio.
Por exemplo, um dentista que atenda seus pacientes em seu consultório, como profissional liberal, não
pode ser tido como empresário.
Agora, tome-se o exemplo de um dentista muito bem-sucedido em sua profissão que, tendo em vista o
crescente número de pacientes, organize uma clínica odontológica de grandes proporções, na qual
trabalhem - sob a sua orientação - diversos profissionais da área odontológica, das mais variadas
especialidades. Além disso, considere-se que a clínica tenha um corpo de funcionários destinado a dar
suporte à sua actividade (prestação de serviços odontológicos), contando assim com médicos,
enfermeiros, analistas, maqueiros, recepcionistas, auxiliares de limpeza, seguranças, e afins, de modo
que o dentista acima referido, e que poderíamos aqui chamar de fundador, não mais atenda
pessoalmente os pacientes, dedicando-se à organização do trabalho dos diversos profissionais
integrantes da clínica.
Nessa hipótese, estará presente o elemento de empresa ou empresarialidade, tornando-se o dentista
fundador um empresário, na medida em que abandone a pessoalidade antes presente nos serviços por
ele prestados, a partir da contratação de auxiliares e de outros profissionais que passem a prestar os
serviços odontológicos que constituem o fim da actividade em questão.
10
11. financeiro ainda não crónico ou situações pré-insolvência14
.
Num esforço de sistematização, Fábio Ulhoa Coelho15
“classifica a crise
empresarial como económica, financeira e patrimonial. No primeiro caso, a crise
adviria de uma retracção considerável dos negócios, atingindo os empresários de
forma geral, determinado segmento ou apenas uma determinada empresa. Outros
autores16
qualificam a crise económica como o resultado da ineficiência na alocação
dos activos da empresa, pois seus concorrentes produzem algo melhor a um custo
menor. Seus activos são incapazes de gerar riquezas suficientes comparativamente aos
seus custos operacionais e ao uso alternativo que poderiam ter. Essa situação
independe da estrutura de capital da empresa ou da existência de credores. Mesmo
que estes desapareçam, o problema persistirá”17
. “No segundo caso, a crise seria
gerada por problemas de liquidez, carecendo a empresa de dinheiro para honrar seus
compromissos mais imediatos. Aqui, o produto das actividades da empresa é
insuficiente para pagar seus credores”18
. Sob outra perspectiva, Kenneth Ayotte e
David A. Skeel, Jr.19
caracterizam uma empresa como financeiramente em crise
14
Cf. CARLI, Andrea. Accordi di ristrutturazione dei debiti ed impresa in crisi. Contratto e impresa,
Milano, ano XXV, n. 2, mar./apr. 2009, p. 415-416. A lei de falências italiana (Régio Decreto n.
267/1942, conforme alterado), em seu art.º 160, último parágrafo, dispõe que por “estado de crise”
deve se entender também, mas não apenas, o estado de insolvência, que ocorre com o inadimplemento
ou outro fato exterior que demonstre que o devedor não mais é capaz de cumprir suas obrigações (art.
5o, segundo parágrafo, da lei falimentar italiana) op. cit. Dias, Leandro Adriano Ribeiro,
Financiamento das empresas em crise, dissertação de Mestrado à Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo, 2012, p. 17.
15
Comentários à Lei de Falências e de recuperação de empresas. 8.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p.
68-69, op. cit. Dias, Leandro Adriano Ribeiro, Financiamento das empresas em crise, dissertação de
Mestrado à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2012, p. 17 a 19.
16
Cf. BAIRD, Douglas G. Bankruptcy's Uncontested Axioms. 108 Yale L.J., 1998-1999, p. 580-581,
op. cit. Dias, Leandro Adriano Ribeiro, Financiamento das empresas em crise, dissertação de Mestrado
à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2012, p. 17.
17
Na mesma esteira, Deborah Kirschbaum, para quem a recaptalização de uma empresa em crise
econômica só faz sentido se houver modificação na forma como seus activos são empregados (A
Recuperação Judicial no Brasil: Governança, Financiamento Extraconcursal e Votação do Plano. 2009.
Tese (Doutorado em Direito Comercial) – Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, São Paulo,
2009, p. 18). op. cit. Dias, Leandro Adriano Ribeiro, Financiamento das empresas em crise, dissertação
de Mestrado à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2012, p. 18.
18
Cf. BAIRD, Douglas G. Bankruptcy's..., p. 580, op. cit. Dias, Leandro Adriano Ribeiro,
Financiamento das empresas em crise, dissertação de Mestrado à Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo, 2012, p. 18.
19
Bankruptcy or Bailouts? 35 J. Corp. L., 2009-2010, p. 473-474. Os autores defendem que a
expressão “oportunidade de investimento” deve ser entendida amplamente. A título de exemplo, num
banco comercial envolveria o financiamento a empresas e indivíduos, enquanto em bancos de
investimento compreenderia a prestação de serviços de assessoria em fusões e aquisições, captação de
recursos e gestão de carteiras, dentre muitas outras actividades, op. cit. Dias, Leandro Adriano Ribeiro,
11
12. quando ela apresenta oportunidades de investimento que podem ser valiosas para os
investidores se forem empreendidas (ou continuadas), mas para as quais a empresa
não consegue obter financiamento.
Contudo, a crise patrimonial equivaleria à insuficiência de activos para atender
ao passivo em aberto, caracterizando o chamado estado de insolvabilidade ou
insolvência clássica, conforme veremos adiante.
Nesta senda, alguns autores20
fazem referência à crise de rigidez, denotando a
falta de adaptação da actividade a mudanças no ambiente externo da empresa, como
evoluções tecnológicas, alterações de hábitos e preferências dos consumidores,
globalização, custos do trabalho e matérias-primas, concorrência e ineficiência do
sistema fiscal. Haveria, ainda, a crise de eficiência, quando uma ou mais áreas da
empresa, por razões diversas, operam abaixo da sua capacidade e rendem menos,
podendo conduzir a outros tipos de crise21
.
Embora constituam fenómenos distintos, as diversas espécies de crise podem
se manifestar em conjunto ou isoladamente,22
e o surgimento de uma delas pode estar
ligado a outra preexistente.23
Muitas vezes, a crise financeira pode revelar uma crise
económica subjacente e servir como alerta aos sócios, administradores ou demais
interessados para que alguma medida seja adoptada, o que seria viabilizado por
Financiamento das empresas em crise, dissertação de Mestrado à Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo, 2012, p. 18.
20
Cf. TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial: Falência e Recuperação de Empresas.
São Paulo: Atlas, 2011, 3 v., p. 2. op. Cit. Dias, Leandro Adriano Ribeiro, Financiamento das
empresas em crise, dissertação de Mestrado à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo,
2012, p. 19.
21
Cf. TOMAZETTE, Marlon, Curso..., p. 2-3. op. Cit. Dias, Leandro Adriano Ribeiro, Financiamento
das empresas em crise, dissertação de Mestrado à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo,
2012, p. 19.
22
Conforme lembra Deborah Kirschbaum, muitas empresas brasileiras ingressaram num estado de
crise financeira não derivada de crise económica após a crise hipotecária norte-americana de 2008, pois
haviam assumido posições especulativas em contratos de derivativos de câmbio e acabaram por registar
enormes perdas que afectaram sua viabilidade (A Recuperação..., p. 16). op. Cit. Dias, Leandro
Adriano Ribeiro, Financiamento das empresas em crise, dissertação de Mestrado à Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo, 2012, p.19.
23
Assim, um restaurante pode não conseguir pagar seus credores porque as pessoas não querem fazer
suas refeições naquele estabelecimento, situação que ilustra uma crise financeira resultante de uma
crise económica. Ao contrário, esse mesmo restaurante pode estar descapitalizado e, para pagar suas
contas, corta os custos da comida e dos serviços, de forma que os fregueses, insatisfeitos, passam a
comer em outro lugar e o restaurante mergulha numa crise económica (cf. BAIRD, Douglas G.
Bankruptcy's..., p. 581). op. Cit. Dias, Leandro Adriano Ribeiro, Financiamento das empresas em crise,
dissertação de Mestrado à Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, 2012, p. 19.
12
13. mecanismos de monitoramento da gestão encorajados pelo direito, de um lado,24
por
outro lado, a crise económica pode existir sem que se manifeste um problema de falta
de caixa, devido à constante obtenção de financiamentos. Normalmente, ambas as
situações ocorrem ao mesmo tempo porque, se uma empresa é ilíquida, mas solvente,
ela pode, ao menos em circunstâncias normais, obter novos financiamentos
oferecendo em garantia seus activos. Porém, considerando que os mercados
financeiros são imperfeitos, é possível para uma empresa ser ilíquida mesmo que
solvente25
.
4.1 Causas e consequências da crise empresarial
As causas da crise empresarial podem ser de várias ordens, desta forma
importa adiantar as intrínsecas, que surgem pela falta de recursos humanos
qualificados, nomeação de órgãos de gestão da empresa por via do nepotismo, que
maior parte dos casos redundam em má-gestão, falta de contabilidade organizada, a
falta de controlo das receitas e despesas, custos de produção elevados, dificuldade na
aquisição matéria prima por conta da crise cambial, custos elevados, que acarretam
desvantagens competitivas, esforços de marketing insuficientes, exagerado nível de
comercialização, com redução da margem de lucro; grandes projectos com custos
subestimados e receitas superestimadas, aquisições frustradas ou incompetência na
gestão pós-aquisição; política financeira com alta alavancagem, excessivo
conservadorismo ou com uso de fontes de financiamento inadequadas, inércia ou
confusão organizacional26
. Entre as últimas há mudanças na demanda, concorrência
de produtos ou preços e variações adversas nos preços dos insumos básicos
(commodities)27
.
24
Cf. KIRSCHBAUM, Deborah. A Recuperação..., p. 17. op. Cit. Dias, Leandro Adriano Ribeiro,
Financiamento das empresas em crise, dissertação de Mestrado à Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo, 2012, p.19.
25
Cf. AYOTTE, Kenneth; SKEEL, JR., David A. Bankruptcy..., p. 483-484. op. Cit. Dias, Leandro
Adriano Ribeiro, Financiamento das empresas em crise, dissertação de Mestrado à Faculdade de
Direito da Universidade de São Paulo, 2012, p.19.
26
Às causas internas podemos acrescentar, v.g., sucessão do controlador, disputas entre sócios, falta de
mão de obra qualificada e obsolescência de equipamentos (cf. LOBO, Jorge. In: TOLEDO, Paulo F. C.
Salles de; ABRÃO, Carlos Henrique (coords.). Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e
Falência. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2010, p. 194).
27
As causas da crise empresarial são inúmeras e já foram objeto de pesquisas empíricas em diversas
partes do mundo. Em 1996, Per Stromberg e Karins S. Thorburn investigaram duzentas e cinquenta e
três empresas suecas, constatando que duzentas e seis delas reportaram como as maiores causas para a
13
14. As causas extrínsecas da crise da empresa decorrem de acções do executivo,
senão vejamos: - Angola atravessou diversos momentos políticos e económicos que
tiveram impactos negativos nas empresas, como foi o caso do longo conflito armado.
Neste momento depara-se com a crise cambial como consequência do bloqueio
externo das transacções de divisas com bancos correspondentes, criação de impostos
extraordinários, mudanças nas políticas cambiais, fiscais e creditícia, liberação das
importações, aumento de tarifas alfandegárias, falta de produção interna suficiente
para a exportação, as restrições bancárias para efeitos de aquisição de cambiais para
efeito de aquisição de produtos no exterior, desta feita demonstramos que existem
factores internos e externos que impulsionam a crise empresarial. “Estes últimos são
vistos numa perspectiva macro-económico como grandes causadores da crise
económica e financeira na maior parte do nosso parque empresarial. Em contrario
sensu é notório que grande parte das empresas em crise os factores são internos”28
.
Stuart Slatter e David Lovett29
arrolam algumas causas da crise sob a
perspectiva de diferentes observadores e ambientes. Dentre eles, destacam-se a
mudança de directores, fracasso no lançamento de produtos, levantamento de novos
recursos para bancar perdas, renegociação ou encerramento de contratos bancários,
diminuição absoluta e relativa do preço das acções, quedas nos lucros, participação no
mercado, pontuação de risco de crédito, liquidez, dividendos e volume de vendas,
atraso na publicação das demonstrações financeiras, perda de empregados-chave, falta
de investimento em novas tecnologias, perda de clientes e contratos importantes,
crise a baixa lucratividade e as decisões negociais equivocadas. Na sequência, trinta e sete empresas
atribuíram a crise à perda de clientes ou de crédito; trinta e cinco apontaram a insolvência de outras
empresas do grupo, mesmo número que relaciona a crise da empresa com a incompetência dos
administradores ou conflitos entre eles. Além disso, foi constatado que nove dessas empresas entraram
em estado de crise após doença ou falecimento do sócio-administrador, em vinte e três casos o elevado
endividamento foi citado como a causa da crise e em doze casos disputas contratuais teriam
atrapalhado as operações da empresa e acarretado a crise. Por fim, dezassete empresas declararam
como principal razão para a crise a prática de condutas fraudulentas por seus administradores (An
Empirical Investigation of Swedish Corporations in Liquidation Bankruptcy. EFI Research Report, July
1996, p. 20. Disponível em: <http://www.sifr.org/PDFs/strombergthorburn(efi1996).pdf>. Acesso em:
02 Agosto. 2018).
28
Sobre este assunto temos os casos da Sonangol, Banco de Poupança e Crédito, Banco de Comércio e
Industria que com base ao trafico de influência perderam algum descontrolo na gestão das receitas e
despesas; para os bancos existem os créditos que foram concedidos até ao momento sem retorno.
(condutas fraudulentas).
29
Como recuperar..., p. 27-51.28 No mesmo sentido, cf. PERIN JUNIOR, Ecio. A dimensão..., p. 175.
14
15. condições comerciais desvantajosas, atraso de pagamentos, declínio de qualidade e
interrupção no fornecimento, fraca gestão do capital de giro, baixa moral e sensação
de medo entre os empregados30
.
Relativamente, as consequências imediatas da crise empresarial podemos
observar: - credores, especialmente o fisco, deixam de ser pagos, salários são
atrasados e dívidas acumuladas, os custos de produção aumentam e diminuem os
clientes. “Num cenário mais agravado, o acesso ao crédito torna-se demasiadamente
restrito. sucessivos inadimplementos, protestos de títulos, surgimento de acções
declarativas de condenação e executivas, bem como inclusão da empresa nos
cadastros de restrição ao crédito”31
.
4.2. Empresa produtora de bens e serviços, em crise deve ser
liquidada ou recuperada?
Partindo do Direito da falência32
ao “Direito da Crise Económica da Empresa,
30
Em nosso entendimento, o gestor deve ter o faro de averiguar e detectar as causas reais da crise
empresarial para que possam ser tomadas medidas adequadas e imediatas; elaborar um estudo de
viabilidade da empresa e desenhar o plano de recuperação.
Naquilo que nos propusemos abordar, o conhecimento das verdadeiras causas pelas quais a empresa
está em crise é o primeiro passo para a constatação de sua viabilidade, bem como das medidas
saneadoras cabiveis, incluindo a concessão de novos financiamentos durante a crise, sejam eles
destinados à manutenção das actividades até a elaboração e apresentação do plano recuperacional aos
credores ou para auxiliar a recuperação da empresa no médio e longo prazo.
31
Cf. MENEZES, Maurício Moreira Mendonça de. Função Sócio-Económica da Empresa em
Recuperação Judicial. 2008. Disponível
em:<http://www.bocater.com.br/artigos/mmm_funcao_soc_econ.pdf>. Acesso no dia 02 de Agosto de
2018.
32
Juridicamente dizendo, direito da falência é uma organização legal e processual de defesa colectiva
dos credores em face da impossibilidade de poder o devedor comum saldar seus compromissos.
Ela pode ser caracterizada como um processo de execução colectiva, decretada judicialmente, dos bens
do devedor comerciante, ao qual concorrem todos os credores para arrecadar o património disponível,
verificar os créditos e saldar o passivo em rateio, observadas as preferências legais.
Pressupostos da falência: para que exista a falência é necessária a concorrência de alguns elementos
que são os seus pressupostos. De acordo com o que prescreve o Direito, os pressupostos do estado de
Falência são os seguintes:
a) Devedor empresário: está sujeito à falência todo e qualquer que exerce actividade empresarial,
sendo empresário aquele que exerce actividade económica organizada para a circulação ou produção de
bens ou serviços. Alguns exemplos são: supermercados, hotéis, fábricas de calçados etc.
b) Insolvência presumida ou confessada do devedor: Ocorre a insolvência quando o devedor está
sujeito à execução de seu património. Para que seja decretada a falência, é necessário que seja
demonstrada a insolvência do devedor.
c) Sentença declaratória de falência: o não cumprimento por parte de um comerciante de uma
obrigação líquida ou a prática de um ou alguns dos actos cria a presunção de insolvência e dá origem a
um estado de falência, porém, juridicamente, há necessidade de um acto judicial que a declare.
15
16. o processo falimentar, concebido pelo génio prolífico dos juristas medievais e
aperfeiçoado no decorrer dos séculos, é, no final do II Milénio, ainda, imprescindível
para disciplinar a ruína e a destruição da empresa unipessoal, unifamiliar ou colectiva.
Entretanto, além do fenómeno patológico da insolvabilidade da empresa, que conduz,
as mais das vezes, à sua dissolução, liquidação e extinção, há outro, menos
corriqueiro, mas, sem dúvida, muito mais importante sob todos os pontos de vista,
que, de há muito, reclama dos comercialistas a elaboração de um conjunto sistemático
e harmónico de normas jurídicas, cuja finalidade principal deve ser a reorganização, o
saneamento e a recuperação da empresa (a) económica e financeiramente viável e/ou
(b) social, política e estrategicamente importante.
Salta as vistas que, se a empresa for económica e financeiramente viável e/ou
social, política e estrategicamente importante, ela não deve perecer, o que muitas
vezes ocorre, infelizmente, por absoluta falta de instrumentos legais capazes de
propiciar o seu reerguimento, o que nos leva a propor uma profunda e radical
transformação na maneira de encarar e enfrentar o problema da insolvabilidade e da
crise económica da empresa privada de interesse particular, da empresa privada de
interesse público e da empresa pública33
.
4.3. Empresa privada de interesse particular em crise deve ser
liquidada ou recuperada?
Se se tratar de empresa privada de interesse particular não há dúvida de que a
empresa infalivelmente insolvável deve ser liquidada com a máxima brevidade
possível, através de um processo de cognição sumária34
, embora preservado o direito
de ampla defesa do devedor e dos credores, com o propósito de resolver dois
Entretanto, isso não quer dizer que antes da declaração judicial não há falência, pois já existe um estado
de fato que é pressuposto do estado de direito a ser declarado pelo juiz. A sentença que declara a
falência se distingue das demais porque não é ela o último ato a encerrar a instância, mas sim, presta-se
a dar início à execução colectiva, convocando todos os credores do falido para nela se habilitarem. Não
tem natureza condenatória, mas não deixa de ser sentença, uma vez que surge após um processo
preliminar, em que cabe ao juiz apreciar o estado de falência para o declarar, ou não. Por tais razões,
alguns doutrinadores a denominam de sentença sui generis e outros, de "anormal", in COELHO, Fábio
Ulhoa. Manual de Direito Comercial. 17ª.ed. São Paulo: Saraiva, 2006.
33
LOBO, Jorge, Direito da Crise Económica da Empresa, Revista da Emerj. V. 1, n.º 3, 1998, p. 156,
ss.
34
GERARDO SANTINI sugere que a liquidação da empresa deve ser objecto do capítulo do Código
de Processo Civil dedicado à “execução colectiva”, ficando o instituto da reorganização para ser
disciplinado em um “estatuto especial da empresa” (Soluciones jurídicas al estado de crisis de la
empresa en los sistemas de economia de mercado, in La Reforma del Derecho de Quiebra, cit., p. 40).
16
17. problemas essenciais da falência, como soem ser, consoante ensino de JOAQUIN
BISBAL MENDEZ35
, a redução dos custos secundários (proceder a uma pronta
relocação dos recursos económicos e financeiros) e a redução dos custos terciários
(minimizar a carga decorrente da administração da Justiça).
Em alguns países, v.g., Estados Unidos da América e Japão, devido (a) à
mobilidade do emprego, (b) ao princípio liberal de que devem ser conservadas e
estimuladas apenas as empresas competitivas e rentáveis, deixando perecer36
as que
não demonstrarem condições razoáveis de rivalizar com a concorrência num mundo
globalizado, e (c) ao facto de que os bens integrantes dos activos das empresas
extintas serão adquiridos e seus clientes atendidos por outras organizações actuando
no mesmo segmento, o Direito positivo, embora possua mecanismos aptos a viabilizar
o saneamento da empresa privada de interesse particular, dá preferência à liquidação37
38
.
4.4. Empresa privada de interesse público em crise, deve ser
liquidada ou recuperada?
Se, entretanto, se tratar de uma empresa privada de interesse público, ainda
que absolutamente insolvável, a solução não pode inspirar-se no princípio jurídico que
impõe a realização do activo para solver o passivo, mas no que dá primazia ao
reerguimento e à preservação da empresa, através dos meios próprios ao Direito
Comercial e a benefícios e incentivos especiais, senão especialíssimos, por razões de
ordem política, económica e social.
35
La empresa en crisis y el derecho de quiebras, Bolonha, 1986, p. 21, apud Lobo, Jorge, Direito da
Crise económica da empresa, p. 158 e seguintes.
36
Além da liquidação coactiva judicial, existem muitas outras formas de extinção da empresa, como,
v.g., a transferência de activos através de arrendamento, cessão total ou parcial de bens, vendas
particulares, fusão, incorporação, denominados na França como restructuration del capital, em geral em
benefício dos concorrentes, que adquirem tais bens.
37
Anote-se, entretanto, que, nos EUA, lei especial permite, desde o momento inicial, a liberação do
devedor de todas as suas dívidas através de discharge, quando os bens do devedor são colocados à
disposição de seus credores, liberando-se o devedor, que então não é eliminado do sistema, daí ser
duplo o objecto da quebra nos EUA: (1) garantir ao devedor a sua liberação, através de um fresch start,
e (2) permitir uma justa divisão dos bens do devedor entre seus credores da mesma categoria,
peculiaridade que distingue o direito americano dos demais, pois, nos EUA, a lei deve prever um fresh
start para os devedores.
38
Apesar de privilegiar a liquidação, os EUA, quando interessa à colectividade, socorre, com auxílio
financeiro especial, as grandes empresas, como aconteceu com a Chrysler e a PAN-AM.
17
18. 4.5. Empresa pública em crise deve ser liquidada ou recuperada?
Na esteira de FORSTHOFF, notável publicista germânico, afirmou que “o
intervencionismo estatal processa-se por dois diferentes modos: - pela modificação
autoritária da ordem social e pela activa e crescente participação do Estado na vida
económica da sociedade, na função de produtor, comerciante ou distribuidor de
bens”39
.
FARJAT professando idêntica concepção, esclarece que as novas funções do
Estado conduziram a várias modificações no plano de sua actuação destacando-se,
dentre elas, a que diz respeito ao surgimento do Estado-empresário40
.
Enquanto ocorriam profundas modificações no campo económico, no jurídico
também se observavam grandes transformações, fruto do empenho dos países
industrializados de procurar uma fórmula de conciliar o direito, estratificado nas leis,
com as abruptas e gigantescas modificações na economia, o que fez ORLANDO
GOMES ponderar o seguinte: “a subordinação da regra do direito com imperativos da
economia passou a ser o primeiro mandamento da política legislativa, tornando-se tão
apertada essa dependência que um escritor francês chegou a afirmar que a lei não se
condiciona mais a uma ideia de justiça, pois se mede por sua utilidade como
instrumento de promoção dos objectivos do desenvolvimento económico”41
.
A intervenção do Estado no domínio das relações económicas ou no domínio
económico faz-se através: - “a) da utilização da lei como instrumento de programação
económica; - b) da substituição de princípios jurídicos e de estruturas jurídicas e – c)
da introdução de novas técnicas ou mudança de função de institutos tradicionais”42
.
Dentre as técnicas utilizadas pelo Estado para intervir no domínio económico,
incluem-se as entidades para-estatais - são pessoas jurídicas de direito privado, criadas
ou autorizadas a funcionar por lei especial para o desempenho de certas funções de
interesse colectivo e de determinadas actividades de interesse público.
Entre as entidades para-estatais, tem lugar de destaque as empresas públicas,
cujo capital social é formado exclusivamente pelo Estado, daí HELY LOPES
39
Traité de Droit Administratif Allemand, trad. de Michel Fromont, Bruxelas, 1969, p. 131. apud
Lobo, Jorge, Direito da Crise Económica da empresa, p. 160 e ss.
40
Le Droit Économique, apud ORLANDO GOMES, in Esquema da Nova Experiência Jurídica, Direito
Económico, Saraiva, 1977, p. 186, apud Lobo, Jorge, Direito da Crise Económica da empresa, p. 161e
ss.
41
Estudo citado, ob. cit., p. 186.
42
ORLANDO GOMES, estudo citado, ob. cit., p. 31.
18
19. MEIRELLES afirmar que a empresa pública “é a empresa estatal por excelência,
constituída e dirigida pelo Estado43
, razão pela qual os alemães a reputam como o
Estado actuando na qualidade de empresário, ombro a ombro com os particulares.
“A empresa pública autónoma é uma criação do Estado. Submete-se,
portanto, a estatuto definido pelo Estado. Sua existência depende do Estado, que a
institui. Precisamente, porém, em virtude dessa instituição, o Estado introduz no
sector de economia pública uma estrutura descentralizada. A conservação dessa
descentralização supõe o respeito à autonomia da empresa pública. Exige que não seja
colocada sob a autoridade hierárquica de órgãos ou agentes do Estado (ministros, por
exemplo). Dentre dos limites de sua carta constitucional a empresa deve decidir
livremente. Com efeito, a autonomia da empresa subsiste se o Estado definir as
obrigações das unidades do sector económico sob a forma de planos gerais. Não é
incompatível com uma participação do Estado, limitada e fixada pelo estatuto da
empresa, na gestão, e atrai a si diferentes formas de controle pelo Estado,
administrativo, financeiro, jurisdicional, parlamentar. Esses controles têm como
finalidade verificar se a empresa está sendo gerida convenientemente. Permitem
corrigir uma administração infeliz ou irregular”44
.
Em resposta sobre a pergunta inicial se a empresa pública em crise deve ser
liquidada ou recuperada? - por motivos e fundamentos ponderáveis, admitir-se a
falência da empresa pública é reconhecer a falência do Estado, por se tratar de
entidade criada por lei especial para atender aos mais diversos interesses colectivos e
públicos. Logo deve ser analisada profundamente a sua liquidação ou recuperação.
4.6. Procedimento para recuperação da empresa privada de
interesse privado, privada de interesse público) e a pública, em estado de
crise económica.
Em título próprio, a lei especial de reorganização deve cuidar da recuperação
da empresa privada de interesse público e da empresa pública, alicerçada nos
seguintes fundamentos:
1.º A reorganização económica, financeira, técnica, tecnológica e gerencial
43
Ob. cit., p. 307.
44
Relatório Final da Conferência da Associação Internacional de Ciências Jurídicas, realizada em
Praga, de 24 de Setembro a 1.º de Outubro de 1958, item III, conclusão XXIV, in RDA 57/492 apud
HELY LOPES MEIRELLES, ob. cit., p. 307/308, apud Lobo, Jorge, Direito da Crise Económica da
empresa, p. 163 e ss.
19
20. deve gozar de prioridade absoluta, ainda que em detrimento de direitos, privilégios e
preferências do devedor e de seus credores.
2.º As soluções para os problemas da empresa devem ser presididas por razões
de ordem económica e social e não jurídico-processual.
3.º As normas reguladoras da reorganização devem inspirar-se nos cânones da
Justiça Distributiva e do Direito Público.
4.º Deve-se fixar como meios de recuperação os comuns ao Direito Comercial
e medidas diversas de administração pública da economia.
5.º Deve-se prever procedimentos administrativos, procedimentos
extrajudiciais e processos judiciais, conforme a solução alvitrada para solver a crise
da empresa.
6.º Lei especial (como acentuado, diferente, por sua natureza, fundamentos,
pressupostos, conteúdo e finalidades, da lei de falências ou de liquidação) deve prever
20
21. um processo judicial de reorganização e um procedimento extrajudicial de
reorganização45
.
7.º Os conflitos de direitos e interesses entre os personagens do drama da
insolvência, inerentes ao processo judicial, devem ser dirimidos pelo Poder Judiciário,
cometendo-se ao juízo Arbitral o deslinde das controvérsias e decorrentes do
procedimento extrajudicial.
8.º As normas, reguladoras do reerguimento, devem, quando se tratar de
processo judicial, ter carácter jurídico-processual e também económico, e, quando se
cuidar de procedimento extrajudicial, carácter apenas económico.
9.º Deve-se preparar uma “magistratura económica”, proba e capaz, consciente
dos seus deveres e responsabilidades, e, para assessorá-la, criar órgãos de supervisão
do processo judicial, formados por credores (comité de credores) e por empregados
(comité de empregados)
10.º Na reorganização extrajudicial, o procedimento deve ser capitaneado por
uma “empresa saneadora”46
, assistida pelos comités de credores e empregados, para
liderar a reorganização judicial.
45
Entre outros, o chamado acordo pré-concursal. Sobre o tema, leia-se o § 4.º, item III, letra A, infra.
46
Como em geral os maiores prejudicados financeiramente com a concordata ou a falência da empresa
são as instituições financeiras públicas e privadas, pensamos que se poderia imaginar a criação de uma
sociedade anónima, em que o capital social seria dividido exclusivamente entre os bancos na proporção
de sua participação no mercado. Constituída a empresa saneadora, com profissionais especializados no
órgão directivo, confiado o conselho de administração a representantes dos accionistas, com pro labore
meramente simbólico ou apenas por sessão do órgão a que comparecessem, ela ficaria encarregada de
acudir as empresas económica e financeiramente viáveis pré-insolventes ou já em estado de
insolvência. A primeira providência da empresa saneadora seria mandar realizar uma auditoria na
empresa deficitária, ao mesmo tempo em que ela própria ficaria encarregada de preparar um estudo
sobre o mercado em que atua a empresa deficitária. Concluída a auditoria e a pesquisa de mercado, a
empresa saneadora prepararia um plano de reorganização da empresa deficitária, baseado,
principalmente: a) na aquisição do controle accionário da empresa deficitária; b) na substituição dos
administradores por pessoas seleccionadas no mercado; c) na composição amigável com fornecedores,
financeiras e empregados, de forma a alongar o perfil da dívida; d) na formação de estoques e captação
de novos clientes. O plano de reorganização poderia prever também: 1) aumento do capital social,
inclusive capitalização de créditos; 2) cessão da empresa, total ou parcial, inclusive para sociedade
constituída pelos credores; 3) associação, fusão, incorporação e cisão da empresa deficitária; 4) cessão,
permuta, locação ou extinção de estabeleci- mentos; 5) venda, locação ou permuta de bens ou direitos;
6) demissão, licença ou redução da jornada de trabalho de empregados. O plano de reorganização
deveria estabelecer prazo para sua execução, prorrogável por deliberação dos membros do conselho de
administração da empresa saneadora, findo o qual, recuperada a empresa, suas acções seriam vendidas
no mercado. Poder-se-ia também pensar na participação da empresa saneadora apenas como uma
prestadora de serviços, quando ficaria responsável pela auditoria e elaboração do plano, a par de um
refinanciamento, ficando o devedor responsável pela composição amigável com os credores.
21
22. 11.º Os interesses das partes envolvidas47
devem ser disciplinados e compostos
segundo os cânones da Justiça comutativa.
12.º A lei especial de reorganização deve fixar, como meios de recuperação, os
comuns ao Direito Comercial.
5. Procedimento de recuperação judicial e extrajudicial das
empresas em crise no direito estrangeiro
5.1 O procedimento de recuperação judicial e extrajudicial no
direito brasileiro – Direito falimentar e a lei de recuperação
A luz da Lei n.º 11000/101, este procedimento só se aplica ao empresário
individual ou sociedade empresarial, excepto as sociedades simples de Advogados,
dentistas etc, aplica-se a supermercados, concessionarias, etc, e são excluídas as
empresa públicas e sociedades de economia mista, a lei da falência não se aplica a
estes na sua totalidade.
Nas empresas públicas o dinheiro público resolve o problema por via de
medidas do executivo.
Os excluídos parcialmente são: instituição financeira, cooperativa de crédito,
sociedade de capitalização, seguros, entidades de previdências complementares,
operadoras de consorcio, plano de saúde ou seja num primeiro momento eles estão
excluídos, se num primeiro momento a empresa financeira estiver em crise vai para
liquidação extrajudicial, se a autoridade competente perceber que já não há mais
solução remete para a via judicial.
O fórum competente da falência e recuperação judicial é o do principal
estabelecimento do devedor (empresário ou sociedade de empresário), sede da
empresa ou local de principal actividade, mas se a sede estiver no exterior então terá
fórum onde tem a filial.
Os credores devem se habilitar no processo de falência ou recuperação o
pagamento dos créditos. Os encargos com o processo não se exigem ao devedor, salvo
47
A própria empresa, os accionistas empresários ou controladores, os accionistas rendeiros, os
accionistas especuladores, os empregados, os fornecedores, os financiadores, os prestadores de
serviços, os consumidores, as empresas controladoras, controladas, coligadas ou associadas (como no
caso de joint venture), o Poder Público e a colectividade.
22
23. as custas judiciais.
Crimes falimentares: acção penal pública incondicionada, não depende de
representação, surge na sentença. O Juiz que decreta a sentença aponta que houve
crime falimentar e remete ao Ministério Público do Tribunal para acusar e remeter em
Juízo ou abertura de inquérito.
O Tribunal competente para julgar o crime é a Sala das Questões Criminais da
mesmas jurisdição do Juiz empresarial.
Legitimidade activa
Quem pode pedir falência? – o próprio devedor ou credor (empresário de
sociedade regular, registada ou de sociedades irregulares).
Se o credor for domiciliado no exterior tem de prestar caução para um possível
indeminização.
Causas de falência:
a) impontualidade injustificada (titulo executivo protestado que ultrapassa 40
salários mínimos, admite litisconsórcio activo);
b) execução frustrada (uma execução frustrada por falta de bens, sujeitos a
penhora, o devedor dever pedir no tribunal certidão constando que ela é frustrada e
juntar ao processo de falência.
Efeitos da Sentença da Falimentar
a) Inabilitação do empresário (o falido fica inabilitado a exercer qualquer
actividade empresarial até a sentença de extinção das obrigações do falido;
b) Nomeação do Administrador Judicial (pessoa jurídica especializada ou
profissional idóneo preferencialmente, como Advogado, contador e economista,
nomeada pelo Juiz, com este trabalho lhe é fixada uma remuneração até 5% do valor
de venda dos bens e até 2% para pequenos empresários).
Com vista a melhor compreensão, a luz da lei acima descrita, pergunta-se: - a
falência da sociedade é a falência dos sócios? – ora, atinge os sócios de
responsabilidade ilimitada, nas sociedade limitadas é só da sociedade.
Imaginemos que se decretou falência e existem contratos celebrados, rescinde-
se ou não?
1.º - Relativamente aos contratos bilaterais ficam a critério do administrador
judicial.
2.º - Relativamente aos contratos de concessão (há extinção da concessão, terá
de fazer nova licitação.
23
24. Como se define a ordem de pagamento?
A ordem de pagamento dos créditos é feita nos termos seguintes:
1.º - A classe dos trabalhadores.
2.º - A classe dos tributários.
3.º - A Classe dos que têm garantia real.
4.º Classe dos quirografares ( fornecedores).
Como se decide a ordem de pagamentos?
Há que se analisar primeiro os que constituíram crédito antes do processo e os
que vêm depois do processo, desta forma os extras recebem primeiro:
1.º Administrador judicial (Trabalhista e acidente de trabalho);
2.º Empréstimo credor.
3. Despesa de administração da massa.
4. Custas.
5. Tributário.
Segundo pagam-se as dividas dos credores com garantia real, e o limite de
pagamento é o valor do bem.
Tributário: privilegio geral - património do devedor e especial – há certos
bens que especialmente podem ser afectos para a garantia do devedor, quirografário
(fornecedores), as multas, e os sócio que emprestou dinheiro na sociedade. Pode
também um credor vender o seu crédito para um terceiro mas vira quirografário
(fornecedor)
A excepção ocorre para os créditos privilegiados, como:
1.º Despesas essenciais (ex. supermercado que usa luz para as máquinas de
refrigeração, neste caso paga-se a luz. Outros exemplos com água, e afins.
2.º Trabalhista (pagar os trabalhadores com limites de cinco salários mínimos)
3.º Restituição (poderá mediante requerimento, o terceiro com bem apreendido
deve pedir judicialmente).
Títulos de crédito típicos: são documentos necessários ao exercício do direito
literal somente produz efeito, serve para pagamento; letra de câmbio, nota
promissória, check e duplicata.
Avalista é garantia em titulo de crédito (o avalista casado tem de ter
autorização do cônjuge, salvo na separação absoluta de bens).
Princípios (literalidade – vale o que está escrito);
24
25. 5.2 O processo de liquidação extrajudicial de instituições financeiras
brasileiras
As instituições financeiras estão sujeitas a um regime de execução concursal
de natureza extrajudicial48
, esse regime não exclui, em carácter absoluto, a falência
dos empresários dessa categoria, que, em determinadas hipóteses, pode ser decretada.
Assim, se a instituição financeira não estiver sob liquidação extrajudicial ou sob
intervenção decretada pelo Banco Central, ela poderá, nas mesmas condições
previstas para os demais exercentes de actividade empresarial, ter a sua falência
decretada judicialmente. Quando houver impontualidade injustificada ou prática de
acto de falência de sua parte, poderão os seus credores requerer a decretação da
quebra. Além disso, estando sob o regime de liquidação extrajudicial ou intervenção,
o Banco Central deve49
, autorizar o oferecimento de pedido judicial da falência da
instituição, que será feito, respectivamente, pelo liquidante ou pelo interventor.
Convivem, dessa forma, os dois regimes. A execução concursal do património
da instituição financeira devedora será feita, conforme o caso, ou pela falência,
segundo os preceitos da respectiva lei, ou pela liquidação extrajudicial. Não há,
conforme alguns doutrinadores pretenderam inicialmente, qualquer
inconstitucionalidade nesta sistemática criada pelo legislador. Com efeito, a existência
da liquidação extrajudicial não importa inobservância do preceito constitucional que
impe de à lei excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão ou ameaça a
direito50
, na medida em que os actos administrativos praticados, seja pelo Banco
Central, seja pelos seus agentes, estão sujeitos ao controle jurisdicional.
A liquidação extrajudicial também não exclui a liquidação ordinária,
disciplinada pelos51
. Este é o procedimento destinado à realização do activo e
pagamento do passivo da instituição financeira dissolvida de pleno direito ou por
decisão judicial52
ao passo que a liquidação extrajudicial é modalidade de execução
concursal.
Tal como acontece no Brasil podemos adoptar o mesmo modelo, segundo o
qual, as instituições financeiras não estão sujeitas à liquidação extrajudicial, uma vez
48
A luz do direito comparado, na forma prevista pela Lei n.º 6.024, de 1974, brasileira.
49
Nos casos delineados pela lei (LILE, arts. 21.º, b, e 12.º, d – legislação brasileira).
50
CF, art. 5o, XXXV), norma supracitada.
51
Cfr. arts. 208 a 218 da LSA, na norma supracitada.
52
Cfr. LSA, art. 206, I e II, da norma supracitada.
25
26. que a União, na qualidade de controladora dessas sociedades, deve proceder à sua
liquidação ordinária, sempre que entender conveniente o encerramento das
actividades por elas desenvolvidas.
Por fim, registe-se que o mesmo regime de liquidação extrajudicial previsto
para as instituições financeiras é também estendido às sociedades integrantes do
sistema de distribuição de títulos ou valores mobiliários, às sociedades correctoras53
seguradoras, de capitalização, às entidades de previdência privada54
e às sociedades
arrendadoras que tenham por objecto exclusivo a exploração de leasing.
Tal como sucede em outras realidades onde existe o instituto da recuperação
extrajudicial, O Banco Central poderá ser o órgão da administração indirecta
competente para a decretação da liquidação extrajudicial de instituições financeiras.
Esta é modalidade de acto administrativo vinculado, de sorte que apenas as hipóteses
devem ser elencadas pela lei própria e socorrendo-se dela poderá aquela decretá-la.
Entre as causas que autorizam a liquidação extrajudicial, é possível prever dois
grupos:
1. Um deles estará relacionado directamente com os fundamentos da execução
do procedimento (a justiça do tratamento paritário dos credores diante da insolvência
patrimonial do devedor); ou seja, poderá verificar o comprometimento da situação
económica ou financeira, especialmente a impontualidade ou a prática de acto de
falência, e prejuízo que sujeite os credores quirografários a um risco anormal.
2. O outro grupo de causas que autoriza a liquidação extrajudicial representa
não um expediente para o tratamento isonômico dos credores, mas, na verdade, uma
sanção administrativa a cargo das autoridades monetárias. São deste grupo as causas a
saber: a violação grave das normas legais ou estatutárias ou das determinações do
Conselho Monetário Nacional ou do Banco Central, bem como o atraso superior a 90
dias para o início da liquidação ordinária, ou a sua morosidade, após a cassação da
autorização para funcionar. Desta forma, a liquidação extrajudicial ganha um perfil
ambíguo, podendo ser utilizada como medida de coibição às infracções dos
administradores de uma instituição financeira, mesmo que esta se encontre
absolutamente salvável.
A liquidação extrajudicial também poderá ser decretada pelo Banco Central a
pedido da própria instituição, representada pelos seus administradores devidamente
53
Cfr. LILE, art.º 52.º.
54
Cfr. Lei n. 10.190/2001, art.º 3.º.
26
27. autorizados pelo estatuto, ou pelo interventor, quando estiver aquela sob o regime de
intervenção.
A decretação da liquidação extrajudicial importará a suspensão das acções
judiciais existentes e na proibição de se intentar novas acções. Afasta-se, assim, a
possibilidade de decretação da falência da instituição liquidanda. Por outro lado, há o
vencimento antecipado e interrompe-se o curso da prescrição de todas as obrigações
de que seja devedora a liquidanda55
.
Finalmente, o acto de decretação torna inexigível a cláusula penal dos
contratos unilaterais antecipadamente vencidos, os juros posteriores à decretação, se
não pago integralmente o passivo, bem como as penas pecuniárias por infracção de
leis penais ou administrativas56
.
A correcção monetária deverá ser devida sobre a totalidade das obrigações da
instituição em liquidação, nos ditames da lei.
A liquidação extrajudicial poderá ser desenvolvida sob o comando do
liquidante nomeado pelo Banco Central, a quem a lei reservará amplos poderes de
administração. Tratar-se-á do órgão da pessoa jurídica liquidanda responsável pela
manifestação de sua vontade e, neste sentido, caber-lhe-á verificar e classificar os
créditos, contratar e demitir funcionários, fixar-lhes os vencimentos, outorgar e
revogar mandato, representar a sociedade em juízo e, enfim, praticar todos os actos
jurídicos em nome da entidade relacionados com a liquidação. Para ultimar os
negócios pendentes ou para onerar ou alienar bens, necessita o liquidante de prévia e
expressa autorização do Banco Central.
O liquidante será investido em suas funções por meio de um termo de posse
lavrado no livro da instituição financeira, e deverão, de imediato, proceder à
arrecadação, por termo, de todos os livros e documentos de interesse para a
administração da massa e determinar o levantamento de balanço geral e inventário de
todos os livros, documentos, dinheiro e bens.
Os administradores em exercício quando da decretação da liquidação deverão
assinar, também, o termo de arrecadação, o balanço geral e o inventário, cabendo-
lhes, ainda, a prestação de informações gerais atinentes à administração, património e
mandatos da instituição57
.
55
Cfr. LILE, art.º 18, b e e.
56
Cfr. LILE, art.º 18, c, d e f.
57
Tal como ocorre nos termos da LILE, art.º 10.º
27
28. Nos 60 dias seguintes à sua posse, o liquidante apresentará ao Banco Central
um relatório contendo:
a) Exame da escrituração, da aplicação dos fundos e disponibilidade e da
situação económico-financeira da instituição;
b) Actos e omissões danosos eventualmente ocorridos, com a correspondente
comprovação;
c) Adopção de medidas convenientes à liquidanda, devidamente justificadas58
.
O prazo para a entrega do relatório poderá ser prorrogado pelo Banco Central. Ao
recebê-lo, este órgão autorizará ou a continuidade da liquidação ou o requerimento da
falência. Esta última alternativa deve ser adoptada se o activo não for sufi ciente para
o pagamento de, pelo menos, metade do passivo quirografário ou se houver indícios
de crime falimentar59
.
Autorizada a continuação da liquidação, o liquidante convocará os credores a
habilitarem os seus créditos, fazendo-o por meio de um aviso no Diário da República
e em jornal de grande circulação (jornal de Angola). Os credores por depósito ou por
letras de câmbio de aceite da instituição financeira estão dispensados de habilitação. É
o próprio liquidante que decide sobre a admissão e classificação dos créditos, cabendo
desta decisão recurso ao Banco Central. Julgados os créditos, o liquidante organizará
o quadro geral de credores, dando-lhe publicidade juntamente com o balanço geral.
No prazo de 10 dias, poderão os interessados oferecer impugnação a ser encaminhada
e decidida pelo Banco Central. Quando este julgar os recursos e as impugnações, o
liquidante publicará novamente o quadro geral, com as eventuais alterações. Os
habilitantes que não se sentirem satisfeitos com a decisão administrativa poderão, nos
30 dias seguintes à publicação da versão definitiva do quadro geral de credores, dar
continuidade às acções que se encontravam suspensas ou propor as que couberem. O
liquidante, sendo cientificado da lide, reservará recursos para a eventualidade de
reconhecimento judicial do crédito60
.
A venda dos bens do activo da instituição será feita por meio de licitação
realizada pelo liquidante, sendo necessária a prévia e expressa autorização do Banco
Central. A venda poderá ser feita a qualquer tempo, independentemente do
58
Tal como ocorre nos termos da LILE, art.º 11.º.
59
Tal como ocorre nos termos da LILE, art.º 21.º, b.
60
Tal como ocorre nos termos da LILE, art.º 27.º
28
29. procedimento de verificação dos créditos61
. A realização do activo por forma diversa
só é cabível no resguardo da economia pública, da poupança privada ou da segurança
nacional, mediante prévia e expressa autorização do Banco Central62
.
À liquidação extrajudicial aplicar-se-á subsidiariamente ao disposto na Lei de
Falências, equiparando-se o liquidante ao administrador judicial, e o Banco Central ao
juiz63
.
5.3. Procedimento de recuperação nos Estados Unidos - Debtor-in-
possession Financing (DIP financing)
Nos Estados Unidos da América, para além de outros é possível financiar as
empresas em recuperação, actualmente, devido à classificação de alto risco para
operações de créditos bancários que é aplicada à empresa que pede a recuperação
judicial, estas não possuem acesso ao crédito bancário. Facto comum é a suspensão de
pagamentos aos credores, com vistas a possuir caixa suficiente para passar pelo
processo judicial, ou seja, a empresa deve antecipar a recuperação judicial. A ideia é a
aplicação do mecanismo que tem sido utilizado nos EUA, o DIP Financing, que
prioriza à sucessão de créditos a fonte de financiamento da empresa em recuperação,
em detrimento, inclusive, dos créditos trabalhistas.
Audiências de gestão: ao invés de simples intimações para manifestação nos
autos, que demandaria extenso lapso temporal até a reunião da manifestação de todas
as partes, o tribunal pode designar audiência com fim de gerir o processo de
recuperação. Dessa forma, o que antes tinha tudo para ser ineficaz, porquanto com o
lapso temporal entre todas as manifestações um activo poderia se tornar desprezível,
passa a adoptar um procedimento que estabelece metas e actividades para todos os
actores da recuperação judicial, tendente a obter rápidos e melhores resultados
práticos aos credores e à empresa em recuperação”64
.
5.4 O procedimento de recuperação britânico com o “London
Approach”
Historicamente, as reestruturações de empresas no Reino Unido utilizam
61
Tal e qual resulta da LILE, art.º 16.º § 1.º.
62
Tal e qual resulta da LILE, art.º 31.º.
63
Tal e qual resulta da LILE, art.º 34.
64
https://morenoadvogados.jusbrasil.com.br/noticias/497175252/boas-praticas-na-recuperacao-de-
empresas-e-tendencias-de-mudancas-na-legislacao
29
30. procedimentos totalmente extrajudiciais pelos quais os principais credores da empresa
em crise se reúnem para negociar a suspensão da cobrança de seus créditos e a
elaboração de um plano de recuperação para o devedor. Esse é o chamado London
Approach65
, todo o processo é elaborado fora dos tribunais como o objectivo de
alcançar acordo, na falta deste o Banco Central da Inglaterra intervém para auxiliar.
Os procedimentos concursais no Reino Unido são regidos primordialmente
pelo Insolvency Act 1986, conforme alterado pelo Enterprise Act 2002. São previstos
um procedimento de recuperação, denominado administration, e três procedimentos
de liquidação, quais sejam, members voluntary winding up, creditors voluntary
winding up e winding up by the court. O pedido para instauração do procedimento
recuperacional (administration application) pode ser feito, em conjunto ou
isoladamente, pela empresa, seus administradores ou por um ou mais credores66
.
Em qualquer dos procedimentos concursais, inclusive o que visa à recuperação
da empresa, os administradores podem ser afastados pelo administrator67
, que possui
amplos poderes para conduzir os negócios e nomear outros administradores. Com
vista a incentivar o uso do administration, a lei britânica permite que o administrator
seja indicado extrajudicialmente pela empresa ou por seus administradores, porém, os
administradores são relutantes ao administration application pela probabilidade de
perderem seus cargos, o que favorece a acção de investidores no sentido de
influenciar as actividades da empresa em crise, extrair concessões e implementar
mudanças em troca de renúncia a determinados direitos ou liberação de novos
recursos para evitar que a empresa tenha que recorrer ao procedimento
recuperacional.
65
Na definição da British Bankers Association, “[t]he London Approach can be summarised as a non
statutory and informal framework introduced with the support of the Bank of England for dealing with
temporary support operations mounted by banks and other lenders to a company or group in financial
difficulties, pending a possible restructuring.” (London Approach. Feb. 2004. Disponível em:
<http://www.bba.org.uk/policy/article/london-approach/fx-and-money-markets-policy/>. Acesso em:
27 dez. 2011.). Tradução nossa: “[a] Abordagem de Londres pode ser resumida como um sistema
privado e informal, introduzido com o ajuda do Banco da Inglaterra para lidar com o auxílio temporário
das operações, elaborado por bancos e outros credores para uma empresa ou grupo em dificuldades
financeiras, na pendência de uma possível reestruturação.” apud DIAS, Leonardo Adriano Ribeiro,
Financiamento das empresas em crise, dissertação de mestrado em Direito pela Universidade de São
Paulo, Brasil, 2012, p. 130.
66
Cfr. DIAS, Leandro, Adriano Ribeiro, Financiamento das empresa em crise, dissertação de
mestrado pela Universidade de São Paulo, Brasil, 2012, p. 130.
67
Insolvency Act 1986, Section 14; Schedule B1, Parágrafo 59, e Schedule 1.
30
31. 6. Direito da empresa em crise e a necessidade da criação de uma lei
para a sua recuperação
6.1. Premissas Constitucionais do tratamento das empresas em crise
A Constituição da República de Angola tutela a função social da propriedade,
princípio orientador da ordem económica68
, e consagra oDireito à livre iniciativa
económica privada empresarial e cooperativa69
, sendo que lei própria promove,
disciplina e protege a actividade económica e os investimentos por parte de pessoas
singulares ou colectivas privadas, nacionais e estrangeiras, a fim de garantir a sua
contribuição para o desenvolvimento do país, defendendo a emancipação económica e
tecnológica dos angolanos e os interesses dos trabalhadores.
6.2 A função social da propriedade e a preservação da empresa
A empresa possui uma importância social na medida em que proporciona a
subsistência das pessoas, produz bens e serviços e arrecada impostos. Além disso,
como observa Fábio Konder Comparato70
, a empresa fixa o comportamento de outras
instituições e mesmo de grupos sociais que viviam fora do seu alcance: escolas,
universidades, hospitais, associações artísticas e clubes desportivos foram tomados
por valores como o utilitarismo, a eficiência técnica, a inovação permanente e a
economicidade dos meios. Alfredo Lamy Filho e José Luiz Bulhões Pedreira71
já
defendiam que a falência de uma grande empresa repercute não apenas sobre os
sócios e credores, mas sobre os empregados e suas famílias, a comunidade em que
vivem, os investidores, fornecedores e a própria economia do país, destacando a
tendência de exclusão dessas empresas da falência.
Não obstante o carácter eminentemente capitalista e neoliberal da nossa
sociedade, a empresa se constitui, actualmente, património de todos, com aguda
conotação social. A empresa traduz um organismo multidisciplinar e faz com que as
regras de consumo se estabeleçam, os impostos sejam arrecadados, a demanda e a
68
Cfr. artigo 37.º, n.º 1, da Constituição da República.
69
Cfr. artigo 38.º da Constituição da República.
70
A reforma da empresa. In: ______. Direito empresarial: estudos e pareceres. São Paulo: Saraiva,
1990, p. 3. apud DIAS, Leonardo Adriano Ribeiro, Financiamento das Empresas em Crise, Dissertação
de Mestrado, Universidade de São Paulo, São Paulo, p. 30.
71
A lei das S.A. (pressupostos, elaboração, aplicação). Rio de Janeiro: Renovar, 1992, p. 187, apud
Dias, Leonardo Adriano Ribeiro, Financiamento das Empresas em Crise, Dissertação de Mestrado,
Universidade de São Paulo, São Paulo, p. 34.
31
32. oferta se regulem, a inflação seja controlada, a sociedade se desenvolva72
.
A empresa hodierna reflecte um interesse social maior, actuando como agente
do desenvolvimento e da estabilidade económica, por isso é dever do Estado sua
manutenção e prosperidade, visando à concretização do bem comum, representado
pelas oportunidades de trabalho, distribuição de riquezas e garantia do adequado fluxo
económico-financeiro, materializado nas inter-relações entre produtores,
intermediários, financiadores e consumidores. Destarte, sempre que viável a
reorganização societária, ainda que com modificações o Estado deve fornecer meios e
condições para que a empresa se recupere.
A sociedade empresarial possui uma função social, pois gera riquezas
económicas, contribuindo para o desenvolvimento social do país. Importante ressaltar
que a extinção de uma empresa acarreta a perda do agregado económico, representado
pelo património intangível da empresa, tais como prospecção de lucros futuros, know-
how, clientela, rede de fornecedores, nome, ponto comercial, reputação, marcas, entre
outros73
.
Ademais, todos os trabalhadores dependem da capacidade de emprego deste
organismo social, portanto, é fácil concluir que o desenvolvimento social de um país
está directamente ligado à capacidade de pagamento de suas empresas. E quanto mais
abundante o mercado de trabalho, menor o desemprego e mais fácil a superação das
crises sociais.
O bom funcionamento das empresas beneficia a consecução dos interesses do
país, com efeito a administração pública depende, fundamentalmente, da geração de
impostos e do adequado funcionamento da máquina arrecadadora, nesta senda é justo
entender que a empresa é fonte produtora, que alimenta o consumo interno e as
exportações, imprescindíveis à uma postura competitiva diante da economia
globalizada.
6.3. Normas infraconstitucionais - objectivos da Lei da falência
Alguns estudos74
revelam haver um crescente interesse na formação de
72
BIOLCHI, 2007, p. XXXVII.
73
ALMEIDA, 2006, p.9.
74
Cf. CLAESSENS, Stijn; KLAPPER, Leora F. Bankruptcy..., p. 2-3, apud Dias, Leonardo Adriano
Ribeiro, Financiamento das Empresas em Crise, Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo,
São Paulo, p. 34.
32
33. sistemas falimentares sob a perspectiva de alocação de recursos, eficiência,
estabilidade, igualdade e justiça.
As diversas legislações de falência que circundam a ordem jurídica agregam
diversas características com vista ao equilíbrio entre diferentes objectivos, visando
proteger os direitos dos credores e de outros interessados na empresa, assim como
evitar a liquidação prematura de empresas viáveis e a imprudência na tomada de
crédito, além da maximização do valor do negócio com o mínimo de custo e perda de
seu valor em funcionamento75
.
A este respeito nos Estados Unidos da América, tem havido vários debates e
Douglas Baird76
identificou duas correntes doutrinárias relacionados aos objectivos da
lei falimentar.
O primeiro grupo, denominado tradicionalistas, apoia-se na casuística e
considera que a lei falimentar exerce um papel especial dentro do ordenamento, com
objectivos substanciais de preservação da empresa e empregos, objectivos esses
importantes e independentes77
.
O segundo grupo, chamado procedimentalistas, acredita que a lei falimentar
deve ter em conta sua interacção com o restante do ordenamento dentro de uma
economia de mercado78
.
Os tradicionalistas, entendem que o sistema falimentar deve viabilizar a
recuperação de empresas que, sem ele, quebrariam, pois que, não há uma preocupação
com os efeitos da lei no comportamento dos agentes ex ante – por ser difícil
identificá-los – mas sim com os direitos e necessidades das partes durante o
procedimento concursal, além disso, consideram que o papel do juiz deve ser flexível
a ponto de permitir adaptação a cada caso concreto, conferindo-lhe discricionariedade
75
Dentre essas características estão o alerta automático quando a empresa precisa recorrer ao
procedimento concursal; a indicação dos legitimados para ingressar com o pedido; a importância dada
ao devedor, credores, administradores e demais interessados na elaboração do plano de recuperação; a
capacidade de manutenção dos administradores; e a existência de um período de suspensão (cf.
CLAESSENS, Stijn; KLAPPER, Leora F. Bankruptcy..., p. 3). apud Dias, Leonardo Adriano Ribeiro,
Financiamento das Empresas em Crise, Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo, São
Paulo, p. 34.
76
Cf. BAIRD, Douglas G. Bankruptcy's..., p. 573-599, apud Dias, Leonardo Adriano Ribeiro,
Financiamento das Empresas em Crise, Dissertação de Mestrado, Universidade de São Paulo, São
Paulo, p. 34.
77
Ibidem, p. 34.
78
Ibidem pp. 576-577.
33
34. suficiente para implementar as políticas sociais relevantes79
.
Por seu turno, os procedimentalistas entendem que a preservação da empresa
não é um bem independente em si mesmo e o papel da lei concursal é assegurar que
os interesses individualistas de credores e demais investidores de capital não causem a
liquidação precipitada da empresa. Sob essa perspectiva, a lei não deve ser inclinada à
falência ou recuperação, mas deve assegurar que os activos sejam empregados em seu
melhor uso e não permitir que uma empresa venha à falência simplesmente, porque
possui credores que não podem ser pagos no vencimento. Ademais, os
procedimentalistas consideram a importância dos efeitos ex ante causados pela lei
falimentar nas decisões de investimento, entendendo que o papel do juiz deve se
limitar ao controle das inclinações e fraquezas das partes, permitindo que elas tomem
suas próprias decisões80
.
Quanto à identificação do estado de crise, para os procedimentalistas, a lei
concursal tem de resolver as crises financeiras e não deve interferir para manter em
actividade empresas em crise económica, as quais são ineficientes e cuja eliminação é
inerente a uma economia de mercado. Já os tradicionalistas não distinguem a crise
económica da financeira, propugnando que o papel da lei concursal é eliminar o rigor
das forças de mercado e conferir uma segunda chance às empresas, dado que os
custos para fechá-las são elevados e sua recuperação deve ser favorecida81
.
A perspectiva procedimentalista está calcada na ideia de eficiência, segundo a
qual os objectivos ex post da lei falimentar devem ser:
a) Maximizar o valor dos activos da empresa, evitando sua dissipação durante
a recuperação e, ao final, realocando-os ao seu maior valor de utilização, o que
implica manter a empresa em actividade (going concern) somente se seu valor
exceder os resultados que seriam obtidos em caso de falência e quando seus activos
forem aproveitados sob estruturas óptimas de capital e governança82
;
79
Op. Cit, p. 577-580.
80
Cf. BAIRD, Douglas G. Bankruptcy's..., p. 576-580.
81
Cf. BAIRD, Douglas G. Bankruptcy's..., p. 581-583. Para os tradicionalistas, o modelo clássico de
empresa consiste na grande organização de capital fechado localizada numa pequena cidade, cuja
quebra traria consequências desastrosas aos fornecedores, que perderiam seu principal cliente, aos
trabalhadores, que ficariam desempregados, e à economia local, que restaria severamente prejudicada.
82
Para atingir esse mister, Aloísio Araújo e Bruno Funchal entendem ser necessário minimizar os
custos diretos e indiretos do processo, cuja duração deve ser a menor possível; ao final do processo,
realocar os activos da empresa em seu maior valor de uso; e escolher o procedimento adequado
(recuperação judicial ou falência) (A nova Lei..., p. 233).
34
35. b) Em caso de posterior insolvência, dividir eficientemente o valor total dos
activos entre todos os participantes, de acordo com a ordem de prioridade de cada um,
pois, desse modo, os agentes serão induzidos a conceder financiamentos às empresas
nos momentos anteriores à crise83
;
Contudo, a lei falimentar deve evitar situações em que há corridas
desordenadas de credores, disciplinado formas coordenadas de reorganização ou
liquidação da empresa e o modo de cumprimento de suas obrigações84
.
6.4. O Princípio da Preservação da Empresa na Constituição
O Estado Democrático de Direito pauta-se, sob sua perspectiva normativa, em
um ordenamento jurídico, qual seja a Constituição, destarte os valores e princípios
constitucionais devem ter sua eficácia reconhecida não somente nas relações entre o
Estado e os indivíduos, mas, outrossim, nas relações inter-individuais, abrigadas no
campo civilística, e por que não na seara do direito de recuperação de empresas85
.
O estudo dos fundamentos do direito da falência surgem da análise e respeito
aos valores dispostos na Carta Magna de 2010, dentre tais fundamentos, destaca-se o
princípio da preservação da empresa. Embora tal princípio não esteja previsto
expressamente na Constituição, é de se verificar tratar-se de um princípio geral não
positivado, consagrado implicitamente no princípio fundamental do valor social da
livre iniciativa86
, e é considerado uma derivação directa da garantia do direito de
propriedade privada e sua imprescindível função social87
, não obstante seja um
princípio constitucional não positivado, cujos efeitos tenham se irradiado no âmbito
público e privado, o princípio da preservação da empresa ainda não teve seu valor
83
Cf. BEBCHUK, Lucian Arye. Chapter 11. Discussion Paper No. 227, 1997, p. 2-3. Disponível em:
<http://papers.ssrn.com/abstract_id=76648>. Acesso no dia 01 de Outubro de 2018; e HART, Oliver.
Different..., p. 4.
84
Conforme esclarece Oliver Hart, em países como Inglaterra, Estados Unidos e no restante da Europa
Ocidental, na ausência de uma lei falimentar, o credor possui duas principais vias legais à sua
disposição: no caso de créditos garantidos, a respectiva garantia é executada. No caso dos créditos sem
garantia, o credor recorre ao juiz para tentar executar alguns ativos do devedor. O problema surge
quando há diversos credores e os activos do devedor não são suficientes para saldar suas obrigações, o
que faz com que cada credor tente ser o primeiro a recuperar seus créditos, gerando uma corrida que
pode acarretar o desmantelamento dos activos da empresa, com perda de valor aos credores
(Different..., p. 2-3).
85
MATTIETTO, 2000, p. 167 apud CASTRO, 2006, p. 34-35.
86
Cfr. artigos 14.º e 38.º, CRA.
87
Cfr. artigo 37.º, CRA, e expressamente conjugados no art.º 89.º e 90.º, CRA, relativo aos
fundamentos da ordem económica.
35
36. reconhecido na doutrina nacional. Por ser mais nitidamente visualizado no Direito
Comercial, tal princípio não é comumente estudado sob o prisma do Direito
Constitucional, no qual sua importância se revela por inteiro, sua significância resta
evidente à medida que o mesmo se presta a equilibrar distorções havidas, permitindo
um maior número de empresas actuando nos mercados, o que favorece a livre
concorrência, assim como possibilita uma gama de escolhas ao consumidor. Isso,
aliado ao facto de diversos postos de trabalho proporcionados pelas empresas
actuantes.
Cabe ressaltar que o direito da falência passou por uma larga evolução, que vai
desde o direito romano, no qual a obrigação era essencialmente pessoal, hoje e cada
vez mais tornou-se importante a criação e desenvolvimento da Lei de Falência e
criação da Lei de Recuperação de Empresas, que introduz na legislação o princípio da
preservação da empresa.
6.5. A falência no Código de Processo Civil
A falência é um processo judicial concursal, conduzido em tribunal sob a
direcção do juiz. A pós o decretamento da falência, procede-se, em regra à verificação
do passivo, à restituição e separação de bens que passam a integrar a massa
insolvente, à liquidação do activo (venda de bens), e ao pagamento dos credores88
.
O estado de falência é a situação do comerciante impossibilitado de cumprir
as suas obrigações; pra ser decretado falido é necessário que se verifiquem
determinados indicadores e se constate essa impossibilidade de forma irreversível.
A recuperação da empresa visa reabilitar a empresa e pode materializar-se
através do uso de diversos procedimentos estabelecidos na lei. É transversal na
lusofonia este entendimento.
Em Angola vigora o Código de Processo Civil89
, estipula-se que o
comerciante, antes de cessar efectivamente os pagamentos a credores ou nos dez dias
seguintes a essa cessação, deve espontaneamente apresentar-se ao tribunal competente
para a declaração de falência (pode ser casual, culposa e fraudulenta), requerendo a
convocação de credores, para tentar chegar a um acordo. Prevê a Concordata e o
Acordo de Credores com o escopo de proteger o crédito do devedor comerciante90
.
88
VALE, Sofia, As Empresas No Direito Angolano, Lições de Direito Comercial, Ed. Gráfica
Maiadouro, Maia, Portugal, 2015, p. 280.
89
Criado por Decreto Lei n.º 44129, de 18 Dezembro 1961 (Código de Processo Civil de 1961).
90
Cfr. Reis Alberto dos, Processos Especiais, Vol. II, Ed. Coimbra, Portugal, 1982, p. 271 a 348.
36
37. É a herança portuguesa!
Algumas leis avulsas (ex: Lei do Investimento Privado) vão consagrando
amiúde alguns preceitos sobre a falência, e insolvência91
.
Em Angola, os instrumentos para a recuperação da empresa são praticamente
inexistentes e no respaldo da Lei encontramos apenas a Concordata e o Acordo de
Credores.
A falência consiste quase exclusivamente na liquidação dos bens (falência-
liquidação), olhando assim, há que se ter algum cuidado, porque, este direito pode
incentivar a má-gestão.
Em 2013, foi criada a Comissão da Reforma da Justiça e do Direito, sob a
égide do Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos, cabendo à Subcomissão da
Reforma do Processo Civil apresentar propostas para a revisão da lei processual92
,
processo que até hoje está em curso, de tal sorte que no momento do encerramento
deste trabalho tive acesso a proposta de LEI QUE APROVA O PROCESSO DE
RECUPERAÇÃO DE EMPRESAS E DA INSOLVÊNCIA93
, já entes porém foi
anunciada por Sua Excelência João Manuel Gonçalves, O Presidente da República, no
discurso de abertura do ano Judicial, ocorrido no dia 14 de Março de 2019, no Salão
Nobre da Administração Municipal do Lobito, isto é na província de Benguela.
6.6. Necessidade do desenvolvimento do Direito da Falência
Atendendo as situações diversas derivadas da crise empresarial surge um novo
direito falimentar fundado no princípio da preservação da empresa, posto que a
perspectiva processualística-liquidatária-solutória da nossa legislação processual Civil
não mais condiz com os princípios do direito falimentar moderno, faz-se necessário a
criação de um instituto que visa à salvaguarda da empresa.
O primeiro a estudar, a relação entre empresa e Direito foi o francês Roger
Houin, que advertiu acerca da necessidade de reformulação da legislação falimentar
francesa para, que se podesse instituir legislativamente o princípio da preservação da
91
mas remetendo sempre para o regime consagrado no 1122.º do Código de Processo Civil e seguintes
e insolvência (não comerciantes 1313.º e seguintes, da norma supracitada).
92
Bernardino, Estevão Augusto, Recuperação e insolvência de empresas na lusofonia, artigo vida
judiciária, p. 40 https://www.bernardinoresende.com/xms/files/Noticias/Artigo_Nov.Dez2015.pdf,
acesso aos 15 de Agosto de 2018.
93
Acesso aos 19 de Março de 2019, por mail recebido por intermédio da Professora Sofia Vale.
37
38. empresa no processo concursal94
.
A continuidade da empresa não é instituto reservado a manter privilégios ou
situações favoráveis a alguns em detrimento dos outros, mas trata-se de salvar o
viável e não garantir o funcionamento a qualquer custo de organismos inertes e não
produtivos, certamente que não se aplicará recursos da comunidade em empresas
nestas situações, haja vista ser imperativo cessar sua actividade, jazendo aí interesse
público na sua não manutenção.
Logo, para se evitar equívocos na prática forense, insta ressaltar que o
princípio da preservação da empresa não representa que todas devam ser preservadas.
Na verdade, esse princípio também representa a imediata liquidação de uma empresa
em situação irremediável de dificuldades, como meio de preservar as demais que
funcionam no sistema95
.
“O instituto da preservação da empresa deve, portanto, ser um instrumento
capaz de proporcionar a tutela da dignidade da pessoa humana em paralelo à busca
pela eficiência económica. A empresa deve buscar, em uma análise ponderada, sob o
auspício do judiciário e de todos os actores envolvidos nesse processo reorganizatório,
a necessária mitigação do conceito de eficiência económica com o princípio da
preservação da empresa como forma de dignificação da pessoa humana, com o
objectivo de preservar o agente económico, respeitar a sua função social, somente
quando tal preservação não gere prejuízos aos demais actuantes no mercado.
O devedor terá de evidenciar a sua capacidade de recuperar a empresa que
atravessa uma crise de liquidez temporária.
Avaliar a viabilidade da mesma é requisito imprescindível, uma vez que a
reorganização de actividades económicas é custosa.
O ónus da reorganização das empresas incide sobre toda a sociedade, haja
vista que os principais agentes económicos repassam aos seus respectivos preços as
taxas de riscos associadas à recuperação judicial ou extrajudicial do devedor”96
.
Estimular a preservação de empresas inviáveis é permitir que os
administradores destas adoptem medidas e realizem investimentos sem os devidos
cuidados, o que leva, invariavelmente ao fracasso e à consequente perda de valor e de
bem-estar.
94
In OLIVEIRA, 2005, p. 236.
95
CASTRO, 2006, p. 34-35.
96
COELHO, 2008, p. 369.
38
39. Somente as empresas viáveis, passíveis de serem recuperadas, devem ser
submetidas à recuperação, minimizando-se os impactos de insolvências individuais
sobre a economia como um todo, bem como limitando os prejuízos gerais e
particulares.
Nesta ordem de ideia, a apreciação da viabilidade não se deve limitar a uma
análise meramente financeira da empresa, deve-se realizar um estudo global,
considerando as reais perspectivas de rentabilidade da mesma97
, analisando-se a
importância social, a mão-de-obra e a tecnologia empregada, os volumes do activo e
passivo, o tempo de existência da empresa e seu porte económico.
Em resumo, existe uma necessidade perene do desenvolvimento do
Direito da Falência, acoplado ao princípio da preservação da empresa, o que constitui
fundamento do direito concursal pátrio, devendo-se, no entanto, analisar
cautelosamente o modo de sua aplicação.
Os operadores do Direito, quais sejam advogados, Ministério Público e juízes
desempenham papel de fundamental importância nesse mister, uma vez que qualquer
desvirtuamento destes fundamentos pode obstar a efectiva preservação da empresa,
seja através da preservação propriamente dita, seja por meio da liquidação imediata.
7. Reorganização da instituição financeira em Angola
No ordenamento jurídico angolano existe a Lei das Instituições
Financeiras que permite o saneamento, a titulo de exemplo o Banco Nacional de
Angola tentou sanear o Banco Angolano de Negócios e Comércio (BANC), e com
isto suspendeu o conselho de administração, nomeou novos administradores
provisórios para referida instituição bancária98
com vista a reorganização mas
infelizmente veio a encerrar.
A medida decorreu do facto dos accionistas não procederem o aumento de
capital, determinado pelo Banco Central99
, que obrigou os bancos angolanos a
elevarem o valor mínimo do capital social de AKZ 2,5 mil milhões para 7.500
milhões de kwanzas (28,4 milhões de euros), até final de 2018, porém julgamos que
dever ser em lei própria.
Contudo, a liquidação extrajudicial determina a extinção da personalidade
97
MACHADO, 2005, p. 29.
98
https://noticias.sapo.ao/economia/artigos/bna-suspende-administracao-do-banco-banc.
99
Aviso número 02/2018 do BNA.
39