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1
Marco Aurélio Bicalho de Abreu Chagas
CONTOS CURTOS, DEZ-CONTOS
(para ler duas vezes)
2
INOPORTUNA E TEMERÁRIA
As duas quando estão juntas as intimidades
são devassadas e ambulam de boca em boca
disputadas pela curiosidade alheia.
Sob sua influência aquela pessoa era impelida
a falar e agir irrefletidamente, sem acerto nem
responsabilidade.
Ela, imperativamente, obrigava a outra a falar
em excesso, expondo, prematuramente,
projetos e propósitos.
Esse comportamento imprudente não lhe
agradava e por mais esforço que fazia para
fugir disso, sentia-se incapaz e sem forças
para tal.
Essa convivência a estava prejudicando em
suas atividades diárias, principalmente, em
seu trabalho e relações com os semelhantes.
Decididamente, para preservar sua moral e
pudor teria que por um fim àquele
relacionamento nada saudável.
A atitude inoportuna da «amiga» não
contribuía de forma alguma para o cultivo da
fidelidade, imprescindível a uma convivência
salutar.
3
Compreendeu que se não desse um basta
àquela permissibilidade perderia
irreversivelmente o controle de seu foro
íntimo.
Sim, estamos falando daquela que leva ao
que a acolhe, a exteriorizar inveteradamente o
que pertence ao âmbito privado, fazendo-o
«viver fora de si mesmo». Seu nome é
indiscrição.
______________________
INAMOLDÁVEL
Era colocado, algumas vezes, em situações
incômodas e submetido a dolorosas
experiências se descolocando amiúde. Desse
modo vivia em desacordo com a realidade que
o rodeia.
Ela o fazia se rebelar contra as situações ou
acontecimentos adversos e a reagir contra
toda idéia que tendia a modificar sua rígida
postura.
Sob sua influência, ele pretendia impor aos
demais o seu modo de ser, de pensar ou de
sentir, sem oferecer nenhuma flexibilidade de
sua parte, dificultando sobremaneira a sua
vida de relação.
4
Ele não mais aguenta aqueles transtornos a
que ela o submetia. Estava decidido a mudar,
fugir da comodidade e vencer os obstáculos,
pondo à prova a fortaleza e a têmpera.
Assim afastou de vez do seu caminho aquela
que se constituía num sério obstáculo ao
desenvolvimento de sua vida, a
inadaptabilidade.
______________________________
CAPRICHOSA
Ela apareceu na infância dele e se fortalecia
com o afago dos pais que, inadvertidamente,
consentiam, solícitos, os caprichos veementes
do filho.
Sob sua influência, não via e nem ouvia outra
coisa além do que ele admitia.
Quando alguém discordava de sua maneira
de encarar as coisas ela aparecia e fazia valer
sua autoridade, desagradando-o.
Intransigente, não admitia a possibilidade de
um equívoco.
Em companhia dela produzia atritos
verdadeiramente lamentáveis no trato com os
demais.
5
Ela, em sua argúcia, se valia de disfarces,
como força de vontade, constância ou
empenho, para influenciá-lo a pretender
alcançar o almejado, preso da teimosia e da
cegueira.
Ela, quando agia, o levava a não admitir, em
hipótese alguma, variantes nem retificações
de nenhuma espécie.
O desgosto experimentado por sua causa, o
fez imaginar transformá-la «em empenho
consciente da vontade».
Para quem ainda não adivinhou, seu nome é
obstinação.
______________________________
BONECA INFLADA
O desejo de ser admitida e o prazer pela
lisonja não escondiam a forte influência que
sofria daquela companhia que conhecera em
sua infância.
Em sua presença era impelida a inferiorizar os
outros e a ressaltar sua figura exaltando-a,
festejando os méritos ou qualidades próprios.
6
Diante de um êxito ou acerto ela se
pronunciava.
As faculdades da inteligência tinham o seu
livre exercício comprometido, causando sérios
prejuízos e levando ao descrédito aquela que
estava sob seu jugo.
Ela afetava seriamente não só sua palavra,
mas também a atitude e o gesto,
obscurecendo a mente e impedindo que ela
visse e sentisse honestamente a justa medida
do próprio conceito.
Agradava-lhe, sob seu manto envolvente e
impetuoso, que os demais fossem modestos e
dispostos a suportar sua vanglória.
E a envolvia de tal modo que ela se afastava
da realidade e isso a impedia de alcançar um
lugar de preferência entre os seus
semelhantes, porque incitada por ela, nunca o
poderia ocupar, pois ficticiamente realçava as
próprias qualidades.
Ao lado dela não era espontânea e se sentia
incômoda e insegura nos lugares que
frequentava.
Ofuscada como estava, sentiu que não
poderia continuar assim comprometendo a
sua liberdade e imbuída de uma força de
7
vontade, resolveu mudar o curso das coisas e
romper de vez com ela, abandonando-a em
sua jactância.
Nunca mais ela se atreveu a procurá-la.
Certamente referimo-nos à vaidade, a que
«fecha o entendimento e prostra a faculdade
de raciocinar ante a auto-estima levada à
exaltação e até ao paroxismo.»
_______________________
UFANOSO
Dizia-se um virtuoso.
Realmente, essa crença respondia a um
hábito arraigado em sua personalidade.
Dissimuladamente fazia gala de valores,
diminuindo seus méritos, buscando
surpreender a boa fé do próximo.
Esse mal hábito o inferiorizava, com o fim que
tem em vista de fazer alarde de uma virtude.
Esse nefasto hábito que o influenciava o
estava tornando em um hipócrita da virtude
exaltada, porque o levava a ocultar o lobo sob
a pele do cordeiro.
8
Pena que esse hábito não atuava sozinho. O
seu comparsa não menos negativo e
dominante, juntos comprometiam a
autenticidade de sua conduta.
Romper com esse hábito não é tão fácil como
parece, porque sua precípua função é
enganar, enganando o próprio que está sob
sua influência.
Insuportável estava ficando aquele
artificialismo, que ostentava algo que não
possuía e assim resolveu não continuar
alimentando o pensamento que gerava aquele
abominável defeito, procurando ser verídico e
leal de sua expressão ética, em empenho
tenaz, contrapondo-se à falsa humildade.
________________________
RAREZA CONTRADITÓRIA
Ele a herdou.
Ela paralisava os recursos ativos de sua
vontade e o mergulhava numa passividade
nociva, afetando sua psicologia.
Ele se tornava improdutivo e inábil para
qualquer função de responsabilidade, embora
fosse normalmente dotado e capaz.
9
Diante dela, faltavam-lhe interesse e iniciativa
e se deixava levar pelo inveterado costume de
não fazer nada.
Lembrou-se de que quando criança
experimentava uma espécie de preguiça.
Nada que exigisse esforço o atraia. Detestava
quando sua mãe o obriga a realizar os
deveres escolares e toda tarefa de casa era
feita com desagrado.
Na idade adulta o quadro se agravou.
Experimentava uma completa apatia e o
embotamento o debilitava, mergulhando numa
vida vegetativa e rotineira.
Era incapaz de cumprir com suas obrigações
satisfatoriamente, sentindo, por isso, a
desconfiança dos demais e o pouco valor que
davam aos serviços que prestava.
Certa vez se viu vítima indireta de um
desfalque. porque um mal intencionado,
valendo-se de sua debilidade consumou um
atentado ao patrimônio alheio, envolvendo-o.
Num determinado momento de sua vida, viu
que essa inação e falta de interesse com que
encarava suas possibilidades, deveriam
desaparecer do cenário, pois necessitava
progredir e não poderia mais permanecer
naquele estado de estancamento.
10
Pensou então nas funestas consequências
que ela, essa herança maldita, acarretava e
buscou dentro de si forças para sair de sua
inabilitação.
E rompendo com aquela herança, alimentou a
esperança de se ver livre daquele infortúnio e
reagiu firmemente, desembaraçando-se desse
defeito hereditário chamado indolência, com
decisão no comportamento,
autodeterminação.
_____________________
TRANSFORMISTA
Foi na infância que a encontrei. Estava
transvestida de rebeldia.
Eu a confundia muitas vezes com outra.
Na idade adulta recordei-me muito dela e a
encontrei em várias circunstâncias da vida
íntima e de relação e diante das leis
estabelecidas.
O que a fazia se rebelar, lembro-me bem, era
a imposição, o acatamento cego a ordens,
indicação ou encargo.
11
Ela influenciava sobre o meu ânimo levando-
me à indisciplina, a perder a confiança em
mim depositada.
Acatava suas diretivas, temendo perder ou
diminuir a minha autonomia.
Ela sempre se mostrava contrária ao bom
procedimento.
Sua rebeldia era empecilho ao acatamento
inteligente a normas, regras, deveres e leis.
Dessa forma, sua presença, comprometia a
harmonia dentro da convivência com os
demais.
Sob sua influência, quantas vezes, deixei de
acatar uma ordem que eu mesmo me tinha
imposto, de cumprir com a palavra
empenhada e de atender ao pensamento que
engendrou uma iniciativa e a minha vontade
de levá-la á cabo!
Sem falar das ocasiões, em que ao lado dela,
defraudei um anelo, não ouvi um conselho,
não atendi à minha sensatez, que reclamava
moderação.
Esta é a desobediência. Quem não a quer
afastar de si?
_______________________
12
DE TEMPERAMENTO ÁSPERO
Ela gosta de se esconder, às vezes, por trás
de uma modalidade aparentemente calma e
sob uma aparência jovial.
Oculta dentro de si um descontentamento que
pode aflorar por qualquer circunstância
propícia.
Poder-se-ia dizer que é uma alergia mental
que provoca frequentes crises de ânimo.
Quando ele está em sua companhia,
experimenta um descontrole mental. Torna-se
presa fácil da violência, por mais educação
que transpareça.
Ele percebeu que a inveja a induz a provocar
a reação violenta do ânimo. Recordou-se de
um fato que comprova isso. Quando Arthur,
seu colega, foi promovido no trabalho,
alcançando um triunfo invejável, ele,
influenciado por ela, certamente,
experimentou internamente uma reação
injustificável.
Essa «característica tão pouco favorável e
que põe em guarda todos aqueles que
convivem com a pessoa que revelou ser sua
vítima», é a irritabilidade.
__________________
13
OUSADIA É O QUE FALTA
A coibição é o resultado inevitável de sua
influência despótica.
Ela prejudica quase sempre o valor das
próprias aptidões, ao estender os seus
tentáculos, envolvendo ao que está em seu
círculo de influência.
Quem está sob seu domínio experimenta
mórbido temor ao fracasso, ao ridículo, ao
desacerto, só de imaginar que está exposto
ao olhar alheio.
Teme não saber se expressar com exatidão
aquilo que pensa ou sente ao se colocar
diante de outros.
Ela encontrou na infância um ambiente
propício para se desenvolver, ao ser
submetida a um trato repressivo, que coíbia
sua espontaneidade, pois esse procedimento
austero, desenvolveu nela o complexo de
temor, vergonha e covardia.Na infância ela se
fazia presente, quando o adulto cortava-lhe
rispidamente o uso da palavra, quando
procurava expressar o que pensava ou lhe
ocorria. Envergonhá-la ou confundi-la,
caçoando de suas expressões ou argumentos
eram algumas das tantas atitudes dos maiores
14
que contribuíam para o aumento dessa
coibição.
Ela assume frequentemente características de
complexo de inferioridade, como
consequência da falta de confiança e si
mesmo.
Ele, no intuito de se ver livre dela procurava
se valer de pensamentos de entusiasmo,
otimismo e coragem.
Ela o impedia de se comunicar e fazer valer o
seu juízo, colocando-o em inferioridade de
condições ante os demais.
Influenciado por ela, não se colocava à
vontade entre os semelhantes e se sentia um
covarde e medroso.
Ela é má companheira e quanto antes livrar-se
dela, constitui para ele uma meta a ser
alcançada, não importando o quanto custe,
contando que livre de seu império, possa agir
com inteireza e desenvoltura.
Fora, você, inibição.
_______________________
15
UM POUCO DE ARROGÂNCIA...
Falta nela sentimentos humanitários e aos que
domina os torna insensíveis.
O estado de embriaguez de ficção que a
envolve a faz conhecida como a negação da
sensatez, o reverso da compaixão.
Seu rosto na juventude e também na infância
já era conhecido, embora manifeste seu
absolutismo e força quando quem,
influenciado por ela, assume um cargo
importante, uma função de mando ou a posse
de riquezas ou de outros bens materiais.
Conheci certa vez um cidadão que assumiu
um cargo de privilégio no governo e não
demorou muito foi assediado por ela que o fez
ostentar essa posição e o persuadia a fazer
valer a categoria investida, a hierarquia
atingida e o poder que ostentava.
Mas, paradoxalmente, sua cara, também, se
faz visível em pessoas de condições
modestas que circunstancialmente se rebelam
ante a autoridade de seus superiores quando
se vêem em funções de maior
responsabilidade e num misto de arrogância,
de altivez e de desdém, que conteve, talvez,
durante sua forçada situação de dependência.
16
Ele sob a influência dela não tolera que outros
desconheçam seus méritos e se mortifica
quando não é tido em conta ou não é
considerado como pretende.
Ela tem uma cúmplice arisca e quando ambas
arquitetam suas artimanhas produzem seres
astutos e matreiros.
Quem se submete a seus caprichos
manifesta-se com violência e sua palavra é
lacerante.
O atingido por ela é ambicioso e não mede
esforços para aspirar ao trono material,
valendo de meios pouco dignos e em
detrimento do próximo.
Ela o faz ver miragens ao estimular a que sua
imaginação projete a própria figura no altar do
endeusamento pessoal.
Falamos aqui nada menos que da soberba,
pintada aqui com tintas bem fortes que
ressaltaram até onde pode chegar essa
embriaguez manifestada no início desse
relato.
______________________
17
«SUJEIRINHA»
Ele fisicamente tinha boa aparência,
entretanto era desleixado e desalinhado,
produzindo repulsa por onde passava.
Teve uma infância descuidada e na juventude
sofreu padecimentos e desilusões que deram
origem a esse grave defeito.
Dificilmente inspirava um bom conceito,
embora possuísse méritos que por influência
dessa falha não eram valorizados.
Faltava-lhe higiene mental e isso repercutia,
por exemplo, no uso de palavras que
revelavam que sua mente não estava limpa.
Quem está submetido ao seu império, dentre
outras atitudes depressivas, usa de palavras
que ferem a moral, mente com a intenção de
menosprezar ou difamar o semelhante.
Ele revela falta de escrúpulos na pessoa que
o mantém sob seu domínio.
Quem é sua vítima empobrece sua figura
tanto no aspecto físico como no moral e
espiritual.
18
Guardar circunspecção e compostura não
está nos planos dele, o desasseio, esse
personagem deplorável e sem esmero.
__________________
«SURMENAGE»
Que distraído ele era! Ela indubitavelmente
era a responsável por isso.
Era sua companheira desde tenra idade.
Esquecido, quando pequeno, tinha como
aliado o descuido dos maiores, que não o
incentivava ao cultivo das disciplinas do
estudo fazendo-o variar de conduta.
Essa desatenção aliada à aversão pelo estudo
contribuiu para que ela tomasse posse dele e
passasse a dominá-lo.
Ele agia maquinalmente sob a influência
dessa companhia indesejável.
A influência dela em sua juventude e em sua
vida adulta foi tão nociva que comprometeu
sua possibilidade de ampliação da própria
capacidade.
Victor prisioneiro dela se movia e atuava
«indeliberadamente, quase sempre em
19
obediência à lei cíclica» que lhe «permite
desempenhar uma função por simples
repetição de movimentos, mas sem pensar no
que realiza, daí resultando sempre situações
incômodas, transtornos, perdas de tempo...»
Godofredo, também, atingido por ela, não
controlava, como deveria, suas determinações
e ia de um lado para outro, instado «por
necessidades e obrigações habituais, mas
com a atenção ausente», seja porque as
subjugava alguma ideia atraente, seja porque
um pesar as invade, ou por se deixar
«absorver habitualmente por qualquer
circunstância relacionada com sua vida.»
Ele que, às vezes se envolvia com ela,
pensava e fazia muitas coisas sem se
recordar depois porque as pensou ou fez.
Ela em alguns casos surge devido ao uso
intenso que se faz da faculdade de recordar,
em face do carregamento excessivo das
funções, promovendo o esgotamento da
célula cerebral.
Ela o fazia se desconectar com a própria vida.
Sentia em sua presença que flutuava no
espaço mental, sem se fixar em nada.
20
Ela o levava ao esquecimento e, assim, não
retinha os «elementos úteis e de valor
positivo» para sua vida.
Expusemos aqui algumas das influência
maléficas da falta de memória.
____________________
UMA INFLAÇÃO PERMANENTE
Ela se acreditava ser objeto de admiração
entre seus semelhantes. Revestia-se de
méritos imaginários.
Ele, sob a influência dela, achava-se
possuidor de dons e aptidões que não tinha.
Sua personalidade inflada o fazia se prezar
em demasia e ela o levava a se mostrar fora
de foco ante o olhar dos demais.
Ela o conduzia vertiginosamente ao engano,
fazendo-o crer ser o que em verdade não é.
Para ficar livre dessa escravidão a que ela o
submetida, entendeu que deveria propiciar a
si mesmo a possibilidade de ser realmente,
mas nunca por ostentação, «senão como
exigência da própria condição de ser racional
e consciente.»
21
Essa não é outra persona non grata,
conhecida pela alcunha de presunção.
__________________________
ASAS DE CERA
Essa pessoa tinha a deplorável característica
de contradizer e sustentar com teimosia o
pouco que sabe ou sabe mal.
Não conseguia aprofundar uma idéia e era
confuso em seus pensamentos, sem falar de
sua carência de luzes e sua ignorância
alimentava o seu amor próprio exacerbado.
Temia que se pensasse ou falasse mal de sua
pessoa.
Sua companhia não era nada agradável. Ela
tergiversava palavras e intenções, levando-a a
uma série de equívocos.
Ela só escutava a si mesma ou não entendia o
que era dito para seu bem. Como faze-la,
então, compreender que deveria mudar esse
modo deformado de ser?
Sob sua influência, dificilmente se pode atuar
com sensatez e inteligência ou adotar um
comportamento mais reflexivo e judicioso.
22
Quem se deixa levar por ela esgrime,
pretendendo convencer, critérios que quase
nunca lhe pertencem e, pior ainda,
desconhece os seus fundamentos.
Ele muitas vezes, assediado por ela,
enganava-se facilmente e se melindrava à
menor insinuação ou atitude que toque seu
amor próprio.
Detê-la no início de qualquer relacionamento
que se pretenda ter com ela é o mais
recomendável, sob pena de se tornar uma
afecção crônica. Afastar-se da necedade se
faz mister, por conseguinte, para se defender
dessa propensão defeituosa.
_________________
DESABRIDO
Ele quando próximo dela, não dava outra: se
fazia descortês e insociável.
Conhecida por desdenhosa e indiferente,
posturas que adotava no convívio com os que
se acercavam a ela.
Os seus pensamentos desalinhados, ora
pessimistas, ora depressivos comprometiam o
seu humor variável e que, naturalmente,
desagradava.
23
Nas rodas de amigos, sob a pressão dela, ele
raramente coincidia com os estados plácidos
ou alegres desses ambientes.
Ele estava percebendo que ela o fazia ser
mais artificial do que natural em suas atitudes
e gestos e isso não estava bem, pensava.
Ela se auto-adulava, alimentada por estímulos
artificiais surgidos de sua característica
imaginativa.
Notava-se que, quem influenciado por ela,
olhava os outros por cima do ombro, por força
de um desdém, baseado na ilusão, com a qual
convivia preferentemente.
Claro que ele, manejado por ela não era nem
um pouco feliz e, por isso, sofria «o forte e
instrutivo golpe da realidade, destinado a
corrigir o rumo de seus pensamentos.»
Eram, não tenho dúvidas, os efeitos nocivos
da displicência.
__________________________
OBSESSÃO
Hoje ela é mais conhecida do que nunca. O
avanço tecnológico, a luta contra o relógio em
24
prol da subsistência, o declínio da moral e as
inúmeras dificuldades enfrentadas, ao sobre-
excitarem o ânimo formam um clima propício
para o aparecimento dessa que aqui iremos
desenhar.
O influenciado por ela explodi diante de
qualquer demora não perdoando ninguém.
Quem não viveu a situação de estar frente ao
balcão e do lado de dentro o funcionário
indolente e despreocupado e, avassalado por
ela, não explodiu «durante a espera excitado
por sua ostentosa passividade?»
Seguramente, nestes casos - adverte a
Logosofia - se conseguiria mais, antecipando
estas palavras: «Disponho de tempo, senhor.
Atenda-me quando puder», pois é comum
encontrar no ânimo dos seres humanos certo
prurido de fazer o contrário daquilo que lhes é
pedido.»
Ele, dominado por ela, diante de qualquer
espera aquilo se transformava numa tragédia
grega, criando a «angústia do tempo», sem
falar na agitação interna experimentada
nessas situações.
Sob sua influência, também, se afligia na
expectativa de uma notícia, uma resposta
25
importante, uma solução, e outras situações
pendentes semelhantes.
O sofrimento moral e físico nesses casos era
evidente naquele atingido por ela.
Ele, sob seu comando, experimentava uma
grande dificuldade para entender «que cada
coisa requer seu tempo» e, principalmente,
que «os que lhe prestam seu concurso ou o
secundam em seus esforços nem sempre
podem ou estão dispostos a seguir o ritmo»
que ela lhe obriga impingir.
Eis, por fim, a pergunta: «Que ganhamos por
sermos impacientes?»
_____________________
QUE FRAQUEZA!
Ufa! Não aguento mais.
Ela é fonte tributária do instinto.
Embebido por ela, o ânimo se relaxa e a
capacidade vital da pessoa fica seriamente
afetada.
Quando, sob sua tutela, ele cede com
facilidade ante a menor pressão do instinto e
do pensamento sedutor, promovendo sérios
26
estragos na vontade, obrigando-o a reincidir
na prática de inúmeras transgressões.
Ela provocava nele o enfraquecimento de sua
fortaleza, diante da ausência de energia nas
determinações do ânimo, em face de um
obstáculo ou ante o vigor da resistência
alheia.
Por vezes ele, influenciado por ela, se via
impotente diante das paixões e sua razão se
neutralizava e se submetia à sua fascinante
influência.
Muitos, sob o seu jugo, a consideravam uma
válvula de escape do instinto, buscando, de
certa forma, com isso, dissimular sua ação
nociva, consentindo com suas travessuras.
Sinceramente ela é uma ladra, que rouba
daqueles que caem em sua teia muito tempo
e energia, sobretudo quando ela se
«singulariza pela entrega total da pessoa às
demandas do instinto, enchendo-se de
vícios.»
Afastar-se o quanto antes da debilidade é o
que se deve buscar em salvaguarda de um
sentido de defesa, de reabilitação ou
reconstituinte.
_____________________
27
INOPORTUNO
Gostava de aconselhar a todos,
principalmente, quando supunha que alguém
estivesse passando por dificuldades e lá vai
ele se oferecer, sem reparar, sequer, que não
lhe pediram qualquer ajuda ou conselho.
A pessoa que está sob seu domínio alimenta
um desejo ardente de saber, simplesmente,
por curiosidade, o que pensam, dizem ou
fazem os demais.
Ele, embora, não tenha maus sentimentos,
mas sua atitude de fazer o papel de
alcoviteiro, era recriminado e sofria a repulsa
daqueles que conviviam com ele.
Demonstrava em seu comportamento uma
falta de tino e de tato manifestadas ao se
envolver repetidamente em assuntos que não
diziam respeito a ele.
Não tinha tirocínio, pois, infelizmente, ele não
percebia que com tais atitudes desmerecia
seu conceito, que sua palavra era tida com
prevenção e reservas e, lamentavelmente,
sua conduta chocava a todos ao seu redor,
por mais bem intencionada que parecesse.
Ele sempre era visto de braços dados com
outra, e ambos, por afinidade, eram
causadores de intervenções importunas que
28
acarretavam inúmeros contratempos e
complicações causando o malogro de planos
e projetos em pleno desenvolvimento.
Júlia, em certa feita, vítima dele, se introduziu,
indiscretamente, onde não fora chamada, e
sofreu sérios prejuízos e, decidiu depois disso,
nunca mais se aproximar dele. Outro,
transmitiu a alguém uma palavra, incentivado
por ele, sem medir as consequências do dito
e, também, enfrentou uma censura que lhe
causou um incômodo e prejuízo sem par.
Que impressão se pode ter de uma pessoa
que está constantemente se imiscuindo na
vida alheia?
Evidentemente que é uma péssima
impressão. Assim não se deve tardar em
eliminar de nosso convívio esse que não é
outro, senão o intrometimento.
_________________________
ARREDIA À ORDEM
Encontra-se incubada no ânimo sob os
auspícios do instinto. Esse era o seu recinto
de origem.
Ela se mostrava invariavelmente rebelde em
face do ordenamento da vida, naturalmente,
imposto pela convivência humana.
29
Aquele que era influenciado por seus
atrativos, via debilitados consideravelmente os
seus mais caros propósitos.
Ela é como outras, encontrada na infância;
sempre arredia à ordem e bons hábitos.
Era a primeira em influir para dissociar as
idéias, provocando entre elas forte
antagonismo. A rebeldia era o seu alimento
predileto.
Aquele inebriado por ela confunde-a com
liberdade e, sob o pretexto de defendê-la,
«despreza as leis e normas que regem a vida
civil, e até se vangloria disto, pretendendo
demonstrar, sem dúvida, que é dono absoluto
de sua vontade.»
Ela considera a disciplina a imagem tediosa
da submissão. Detesta toda idéia de ordem.
O apossado dela tem sérias dificuldade de
cumprir com os seus afazeres diários, porque
sob seu governo e influência, pouco vale ser
ativo, porque ela «subtrai ao esforço grande
parte de energia».
O perigo maior é que ela, em suas investidas,
não atua só. Ela faz parte de uma quadrilha
30
formada por no mínimo cinco comparsas,
altamente ágeis e violentos.
Seja como for, não convém mais ceder aos
fascinantes argumentos da aqui revelada
indisciplina.
________________________
POUCO AMISTOSA
Sufocar os sentimentos é o seu intento.
Ele, infelizmente, inebriado, se jogou em seus
braços, e se converteu «em um maníaco,
encerrado no estreito círculo da própria
inclemência mental.»
Sempre o ouvíamos dizer: «Não aguento seu
gênio.»
Ela tornou o seu caráter acre e sombrio e o
impelia ao isolamento.
Ele fugia «do contato com seus semelhantes e
estes, do seu, porque a ninguém agrada uma
modalidade áspera e pouco amistosa.»
Ao lado dela, ele era vítima de rechaço, pois
os demais não se mostravam satisfeitos a sua
frente.
31
Ela se arrepiava e abominava o bom humor, a
tolerância e a alegria, porque se
contrapunham a sua atitude tirana.
Retirar esse peso de cima é o que tanto se
busca, aliviando a carga representada pela
aspereza.
____________________
ALMA PEQUENA
Poderíamos apelidá-lo de matusalém, pois
«remonta a idades primitivas.»
Tem feições pré-históricas e pode ter sido
muito útil, talvez, na idade da pedra,
alimentado pelo instinto de conservação,
sobressalente naqueles primórdios.
O dominado por ele, embora confundido,
comumente, por sentimento, em verdade não
o é, ao contrário, «luta com seus próprios
sentimentos quando, em determinadas
circunstâncias, estes pretendem abrandar-lhe
o coração, endurecido, precisamente, pelo
domínio que o instinto exerce sobre ele.»
Ela é, comprovadamente, produto inveterado
do instinto, «último dos marcos humanos afim
com a animalidade, que sugere quão
32
necessário é trocar os estados inferiores pelos
de natureza elevada.»
Paulo, envolvido por ele, não conseguia
compreender que «o acúmulo de bens
exclusivamente materiais agrava a transição
que se verifica nele ao cessar a vida».
Ele, ao atuar, lamentavelmente, corrói os mais
nobres sentimentos de sua vítima. O afetado
experimenta um forte desequilíbrio, «uma
multiplicação de desejos que jamais se
satisfazem ou só se satisfazem em parte.»
Antônio sentiu na pele sua influência. Em uma
festa, experimentou subitamente o desejo
ambicioso de ser o mais admirado ou o que
mais poderia se destacar.
Em outra circunstância, ainda influenciado por
ele, «sentiu dentro de si a força que se opõe a
algum gesto desinteressado», ou, em outro
momento, « ao se ver diante de uma apetitosa
mesa, o impulso incontido de escolher o
melhor bocado.»
O acossado por ele considera a vida um
comércio e põe preço, naturalmente, o mais
baixo em tudo, influenciado pela idéia de que
«o que escamoteia com habilidade os valores
que anseia para si, tira mais vantagens.»
33
Estamos tratando aqui desse incômodo e
mesquinho personagem chamado egoismo.
____________________________
DESARRANJADA
Ela é avessa a um método. Considera que a
disposição sistemática das coisas a tiraniza,
privando-a da liberdade de fazer o quanto lhe
apraz.
Alberto, influenciado por ela, não conseguia
manter no lugar suas roupas ou objetos de
uso diário.
Ela é sócia da negligência e «concorrem
ambas ao mesmo fim.»
Quem está sob sua influência vê seus projetos
ameaçados, porque não consegue executá-
los a contento.
Ela não é outra senão a desordem.
_____________________
NADA SUAVE E DISSONANTE
São vítimas dela aquelas pessoas de
temperamento inquieto, impaciente e violento.
34
Também os que por incultura não
conseguiram limar as asperezas de seu
caráter sofrem sua influência.
O que está sob sua batuta sai de tom e
desafina no concerto da convivência e produz
perturbação nos que o rodeiam.
Interessante é que os afetados por ela,
paradoxalmente, podem ser pessoas afetivas
e cordiais e contar, naturalmente, com muito
boas condições morais.
O atingido por ela tem muita dificuldade de
conviver em harmonia.
Quem foi tomado por ela gesticula e se
movimenta de forma intempestiva. Tem
atitudes impróprias e manifesta toda sua
rudeza, provocando um desconcerto
generalizado.
Quem se sentiria bem diante dessa que se
mostra tão abominável e desconcertante?.
Quem não quer se manter distante da
brusquidão?!
__________________________
35
SEM MODERAÇÃO
Ela o envolvia de tal modo que ele não
conseguia controlar e regular seus apetites
passionais.
Transformava-se num autômato, incapaz de
enfrentar ou anular sua influência perniciosa.
«Quem a suporta carece de governo sobre
seus atos, faltos de ética que reclama a
convivência normal entre os seres humanos.»
Naturalmente que ninguém suporta sua
presença por muito tempo. Há que ter muita
vontade para suplantar a intemperança.
______________________
ABSENTISMO
O atingido por ela submerge-se numa
passividade tal que não lhe importa nada de
quanto lhe possa acontecer, bom ou mau,
triste ou alegre.
Esse adormecimento do ânimo é tão
prejudicial que afasta da preocupação, do
acossado por ela, a sorte de filhos, esposa e
demais seres queridos.
36
Ela dentre suas mórbidas características, em
alguns casos, sobressai as suicidas,
principalmente quando afeta a saúde, que «se
desatende ou se descuida com menosprezo
da própria vida.»
Quem se envolve com ela «acusa falta de
sentimentos humanitários», revelada na
atitude de «podendo fazer o bem, passam de
longe pela miséria, necessidade e dor
alheias.»
A atenção do molestado por ela desaparece,
praticamente, nos casos mais aguçados, em
virtude da falta de estímulos que a promovem.
A sua frieza se «assemelha eloquentemente
ao mutismo da tumba.» Estamos falando,
precisamente, da indiferença, que nos
mantém estranhos ao que acontece na
humanidade.
______________________
COMICHÃO
Ora, ela é insaciável. E quem experimenta o
seu trato se sente inferiorizado em suas
qualidades e condições.
37
Dentre os prejuízos que provoca naquele que
está sob seu jugo salienta-se o desvio da
capacidade de criação da inteligência.
Ele influenciado por ela se empenhava
desmedidamente na tarefa única de atender
exclusivamente os seus afãs de lucro e posse.
Ele enlevado por ela tinha os seus sentidos
açulados a um desejar contínuo das coisas.
O afetado por ela é atacado por uma coceira
insuportável, mas que nele engendra um
prazer mórbido e, por isso não faz nada por
eliminá-la.
Ela influi poderosamente no ânimo dele que é
provocado obstinadamente a ir em «busca de
maiores bens ou de novas e alucinantes
posses, sem titubear no que arrisca.»
Dentre muitos que sofrem sua influência estão
aqueles que desejam «com ardor o alheio
sem consegui-lo nunca.»
Com isso vimos surgir nas pessoas o
ressentido com sua sorte e também com o seu
destino, lamentando seu abandono e
acusando o destino «de favorecer com
excesso os demais, deixando-os de lado.»
38
Como muitas marginais ela não ataca só,
forma com outras uma quadrilha quase que
imbatível, provando em suas investidas
maiores estragos.
Ela vicia as faculdades da inteligência e da
sensibilidade de suas vítimas e passa a
exercer pleno domínio sobre suas vidas,
«vendo-se por esta causa aparecer, em
inumeráveis casos, como principal instigadora
de feitos delituosos: espoliações, fraudes,
furtos, violências.»
Livrar-se, portanto, das acometidas desta
bandida se faz necessário, máxime se se
recorda que a vida «não foi feita para
amontoar riquezas materiais e, menos ainda,
para aviltá-la com inspirações de cobiça.»
________________________
CHARLA
Aqueles dedicados às letras e à educação -
nem todos - a confundem com uma bela e
erudita virtude e, pasmem, a cultivam com
esmero.
O acossado por ela fala com excesso, sem
«um controle que lhe permita ajustar o uso da
palavra às exigências do tempo e à
oportunidade em que o faz.»
39
Há os que a escutam de bom grado, porém
outros dissimulam seu «aborrecimento e seu
incômodo, enquanto esperam que se lhe
esgote o tema ou que o emudeça
providencialmente o cansaço.»
Alguns oradores, principalmente, certos
ditadores, se vangloriam de seus aparentes
atributos e se dizem aficionados por ela.
Quem está sob seu domínio se deleita ao dar
«curso livre a seu desenfreado palavrório,
escutando-se a si mesmo com incontida
euforia, compraz-se da admiração que
desperta ou crê despertar no auditório.»
É interessante observar que as pessoas
ocupadas e ativas fogem dela; as sensatas e
formais a evitam.
Quem teve o desprazer de aguentá-la uma
vez «não se dispõe a ser sua vítima
novamente.»
O atingido por ela costuma repetir a mesma
coisa muitas vezes sem se dar conta de que
isso irrita qualquer um.
O mais grave de tudo é que quem está sob
seu poder ditatorial é incapaz de perceber o
desagradável e pedante que é seu linguajar.
40
Dizem que ela anda de braço dado com o
ócio, sob a justificativa de que «quem fala
muito não pode empregar seu tempo em fazer
algo útil.»
Há um ditado popular que a define bem:
«quem fala demais dá bom dia a cavalo». O
pobre do animal não tem nada a ver com má
reputação dessa infeliz.
Pessoas que gozam de bom conceito e são
ativas, afetadas por ela, «falam até pelos
cotovelos».
Quer saber se você é vítima desse algoz,
então, responda: «minha conversa é útil?
Serve em realidade para algo? Não estarei
abusando da paciência alheia? Não estarei
malgastando meu tempo e o dos demais?»
Procure falar menos e pensar mais, assim
você estará se afastando definitivamente da
verborragia, «recordando que o excesso de
palavras soa vazio e que ninguém toma a
sério a quem fala muito. Se alguma vez diz
algo importante, corre o risco de passar
despercebido.»
Convém aqui transcrever a necessária
advertência: « As palavras não se devem
41
esbanjar, porque poderiam faltar, quando
se necessite que seu peso influa em
alguma decisiva circunstância da vida.»
________________________
EXSUDAÇÃO MENTAL
Ele é um veneno. Condena sua vítima a uma
prolongada tortura.
Aprisionado por ele, o infeliz não se recorda
dos fatos e coisas que o beneficiaram e lhe
fizeram experimentar satisfação e o encheram
de alegria. Ao contrário, se lembra, isso sim,
«com ânimo sombrio, de quantos lhe foram
adversos.»
Esse desditado, envolvido por ele, se alimenta
do ódio e vê seus sentimentos corroídos,
«sem reparar que o mal que anseia para os
outros se volta contra ele centuplicadamente».
O envenenado por ele é incapaz de deixar de
ouvir as falsas razões que o assistem e
aconselham. Fica à espreita aguardando na
surdina e com dissimulada atitude a ocasião
propícia de retribuir o mal que a seu juízo lhe
fizeram. O seu sarcasmo é tal que «qualquer
desgraça, qualquer contratempo que recaia
sobre a pessoa alvo de seu despeito, equivale
42
para ele ao prazer que haveria de oferecer-lhe
a própria vingança.»
Lamentavelmente o que se deixa levar por ele
se desqualifica e denota «inferioridade moral»,
sem falarmos de que não admite a
intervenção do sentimento, lesando, por
conseguinte, sua sensibilidade.
Havendo tempo, aconselha-se não dar cabida
ao rancor, pois «é preferível ser credor e não
devedor».
______________________
INFORMAL
Não há dúvida, ela foi atingida por ele ao se
constatar que está se descuidando do dever,
da palavra empenhada e do compromisso
contraído, denotando falta de
responsabilidade e também de escrúpulo.
Que pena, porque por sua causa ela está
deixando de cumprir com muitos dos fins que
se propõe para seu bem!
Com isso, influenciada com está por ele,
perde a confiança que os seu lhe depositam,
deixa de inspirar respeito, porque, em
realidade, demonstra não «respeitar as
próprias determinações»
43
Ela ao se comprometer com ele deixou de
honrar a sua palavra e não soube mais se
valer de meios eficazes para conciliar
situações adversas, «sem deixar por isso de
gozar de absoluta liberdade».
Distanciar-se dele e depois eliminá-lo de sua
vida é o que se deve fazer, porque não se
deve favorecer mais as demonstrações do
descumprimento.
___________________________
FRENÉTICA
Atuava involuntária e irreflexivamente, sem
qualquer domínio e muito apaixonado, quando
sofria os acessos dela.
Ela o excitava de tal modo que ele não tinha
tempo de elaborar acabadamente seus juízos
ou suas decisões. Seu ânimo junto dela
ficava, vamos dizer, a-ca-lo-ra-do.
Seus gestos e atos impensados eram, sob
sua influência, arrebatos de uma volubilidade
que impressionavam, envolvidos por uma
fogosidade cheia de entusiasmo insuflados
por desejos e paixões incontidos.
44
Ela influía até em suas palavras e ações que
eram promovidas pela «precipitação, pela
violência ou pela impetuosidade»
Os que conviviam com ele testemunhavam
frequentes desabafos quando presa dela,
para aquietar seus nervos e seu ânimo, razão
pela qual seus arrebatos intempestivos
amiúde causavam surpresa.
Notava-se que ela, quando se impunha,
anulava nele «também a moderação e o
equilíbrio que deveria caracterizar sempre as
ações».
«Desarraigar a veemência é tão necessário ao
veículo psicológico humano como o é, para o
automóvel a troca de uma peça defeituosa do
motor. Em ambos os casos melhora a
marcha.»
_________________________
ESTREITEZA
A rigidez, a dureza e a inflexibilidade são
características do afetado por ela. O afeto ao
semelhante sofre opressão.
Ele, quando sob o domínio dela, demonstra
ser um pobre de espírito e cria ao seu redor
um ambiente de hostilidade.
45
Ela o transforma em um antipático, pouco
cortes e desapiedado, dificultando uma
convivência harmônica.
Sua atuação é tão elástica que «degenerou
em perseguições sociais, políticas, religiosas
e ideológicas, abrindo abismos profundos
entre homens e povos.»
Abandoná-la é conveniente, porque os
pesares que ocasionam não estão nos planos
de ninguém.
Ele quando a acompanha deixa transparecer
uma «inveterada falta de respeito às idéías,
ao afazer e comportamento alheios.»
Ela não é outra, senão a intolerância.
_____________________
NARCISO
Ele desperta em quem o envolve um amor
desmedido pela personalidade, sob a
influência por tudo o que é material.
Claro que com esse amor abrasador conduz
a quem domina à egolatria, e causa
constantemente a sua descolocação onde
quer que atue.
46
Ele esquece por completo a reciprocidade do
amor quando se vê envolvido por ele e se
embriaga com os «acentos da admiração que
a si tributa.»
Ele tem muito de passional e instintivo.
Ele fecha o entendimento às objeções da
sensibilidade e impede bruscamente a
comunicação dele com sua consciência.
Esse inimigo é conhecido pelo nome de amor-
próprio.
__________________
INSISTENTE
Ela se apresenta sob o manto de obstrução
mental. O vitimado se aferra à idéia ou opinião
que a custa de muito esforço conseguiu
formar e não se dispõe a mudar.
Procura se entrincheirar detrás de sua
convicção ainda que seja errônea.
Ela, por sua vez, agindo nele inibe as
faculdades de sua inteligência.
Sua vítima experimenta dureza de caráter,
com grande influência sobre o ânimo e se
47
sente limitado, comprometendo sua maneira
de viver e encarar a vida.
Combater a teimosia significará o
abrandamento do caráter.
______________________
ATORDOA E PARALISA
Ele dava crédito fácil a tudo aquilo que ouvia
sem se prevenir contra o erro ou a falsidade.
Aceitava tudo sem prévia participação de seu
entendimento. Esse inequivocamente, estava
dopado por ela.
O que a acolhia era vítima dos excessos de
confiança no próximo, aceitando tudo de boa
fé.
A pessoa que é atingida por seus argumentos
se entrega submissa à sugestão alheia e se
sente ingênua.
As ciladas armadas por ela contemplam a
candidez de sua vítima e põem em perigo a
independência do ser.
Ele não consultava o próprio juízo e dando
ouvidos à voz sedutora do engano, aceitava
passivamente o alheio, renunciando ao
legítimo direito de pensar.
48
O certo é que não é necessário «chegar à
sabedoria para eliminar a credulidade.»
___________________
DESUNE
Ele tinha o inveterado hábito de postergar e
até malograr toda ideia, projeto ou plano que,
porventura, tencionava levar à prática. Para o
bom observador ele, certamente, estava, com
essa atitude, sendo vitimado por ela.
Sua desorganização e irresponsabilidade
formavam um ambiente adequado para as
investidas dela que submete a pessoa a uma
«permanente mudança, manifestada na
facilidade com que interrompe sua dedicação
a uma coisa para dedicar-se a outra, variando
continuamente seus motivos de interesse.»
Ele quando estava envolvido por ela, era
incapaz de dar continuidade aos processos
que punha em marcha, desaproveitando o
tempo, e com isso anulava os esforços que
empreendia para a consecução de algo.
Ela transtornava sua vida e, com isso, sentia
um grande vazio e instabilidade.
49
Ela sempre dava um exemplo inverso ao da
natureza, porque esta consuma
ininterruptamente nela os processos que
fazem possível a existência.
Ao sentir «murchar o verdor dos estímulos
ligados ao esforço e ao tempo em prol das
esperanças e objetivos que formam o cabedal
mais apreciável da vida», pode estar certo que
você está diante da inconstância.
__________________
FINGIDA
Dissimulador. Aparentava ser o que não era.
Vivia de aparências. Esse era o perfil daquele
que um dia sofreu terrivelmente a
ascendência dela.
Ela era horrível. Até seu nome inspira
rechaço. Não conheço alguém que se sinta
bem em pronunciá-lo.
Quem está sob seu comando deplorável
nunca diz o que pensa ou sente. Não é veraz
nem sincero. É um embusteiro. E não fica
nisso. O absorvido por ela sente um prazer
mórbido de enganar o outro em sua boa fé.
50
Os seus vassalos nunca conseguem edificar,
isso é notório, nada permanente, «tanto em
amizades quanto em feitos importantes da
vida.»
Olha, ela também como outras é encontrada
na infância, e ali acha «cômodo meio para seu
desenvolvimento nos ambientes pouco
depurados, onde falta sempre o bom
exemplo.»
O que é dominado por ela é um fingido e com
facilidade seduz ao mais incauto que cai em
suas garras e cede «à sugestão de sua
palavra.»
Ela, em algumas pessoas não passa de «um
recurso que usam ocasionalmente para
granjear a simpatia ou o favor alheios.»
Ela deve ser decididamente abandonada
porque é inútil. Estamos desenhando aqui,
com cores bem vivas, a hipocrisia.
_________________________
INQUIRIDORA
Um impulso instintivo o leva a atuar
caprichosamente mantendo «a pessoa
51
sempre ávida de informação e atenta ao que
menos deveria importar-lhe.»
Ela quando exercia o seu domínio sobre ele, o
conduzia à indiscrição e ao intrometimento.
A sede de informação naquele envolvido por
ela era doentio porque ele era capaz de lançar
mão de qualquer recurso, sem ter em vista se
é de todo lícito ou honesto.
Quando ele procurava vigiar este, seguir
aquele, perguntar, inquirir, escutar
conversações, com o maior interesse ainda
que fossem reservadas, revelava claramente
que ela era o pivô desse seu comportamento
suspeito e desagradável.
Ele, nesse estado de submissão a ela,
ocupava-se de todos, menos dele próprio.
Abandoná-la se avizinhava como única
medida que ele percebia para fugir à
influência nefasta dela, porque de outras
vezes tentou acalmá-la em seus impulsos e o
efeito foi a sensação que sentiu de um
efêmero deleite voltando ela, após alguns
instantes, com forças redobradas e
inoportunamente chamava-o às práticas
libidinosas de antes.
52
Ela há de desaparecer por inanição, porque
somente assim ele deixará de atender aos
inoportunos chamados da curiosidade.
________________________
CRIAVA DEMÉRITO
Ele se prezava e atribuía a si um talento
invisível.
Ela, em contrapartida, apossando-se dele, o
tornava presunçoso e volúvel.
Ele se aproximou dela ainda na infância e a
atração mútua vem dessa época, porque
ainda pequeno era alvo de adulações e
lisonjas.
Ela quando estava junto dele impedia que
seus amigos se aproximassem e lhe
acarretava desprestígio.
Ele achava difícil suportar essa convivência
adversa que lhe causava sérios prejuízos,
mas para se livrar dela ele teria que estar
disposto a emendar seu modo de ser, e isso
não era muito fácil de se fazer.
Ele não era obrigado a estar com ela por toda
sua vida. Esse convívio não podia mais
53
continuar, para o seu próprio bem. Uma
atitude tinha que ser tomada.
Necessitava sair do estancamento em que
vivia e se dispor decididamente a abandoná-la
de vez de seu relacionamento, a fim de
alcançar objetivos mais amplos para sua
limitada vida. Para isso, faltava-lhe
determinação e um pouco de empenho.
Ela, ao contrário, ao lado dele, detestava a
simplicidade que às vezes ele demonstrava no
trato com os demais. Queria vê-lo sobre um
pedestal envolto em méritos ilusórios.
Ele, por sua vez, cada vez mais empenhado
em afastá-la para sempre de si, passou a
observá-la mais atentamente e surpreendê-la
cada vez que intentava se manifestar.
Com isso, a contemplava em toda sua
fealdade, e isso aguçava nele a resolução
agora inquebrantável de expulsar a fatuidade,
tão indesejável hóspede.
___________________
DETERIORA
Sua vontade ficava literalmente relaxada e via
que seus bons propósitos estavam seriamente
ameaçados, quando ela se achegava.
54
Quando ela o envolvia, havia nele
instabilidade em seu pensar e sentir,
manifestando abertamente uma inobjetável
ausência de consideração para com sua
própria vida.
Ele, nesse estado de embriaguez, tinha
grande dificuldade de cumprir com seus
deveres, tanto físicos, como morais e os do
espírito.
Sentia-se, ao advertir sua presença, um certo
retardo e abandono.
Ela, como má conselheira, induzia-o «a
trabalhar inoportunamente, com demora e
sem pôr no que faz atenção nem cuidado.»
Ele era muito prejudicado por essa má
companhia, porque era constantemente
levado a repetidos fracassos. Com ela, ele
postergava tudo, «pelo prazer que lhe induz
sua atitude despreocupada e irresponsável.»
Ora, ninguém, em sã consciência tem que
suportar o prejudicial predomínio da
negligência. Isso é preciso ser dito aqui.
__________________________
55
«LOCUS SUPLICI»
Duro e contumaz ele era, caráter influenciado
por aquela que não o deixava em paz.
Ela, embora, aparentemente, saudável,
conduzia-o à intransigência, endurecendo a
sua região sensível.
Ela submetia seus nobres sentimentos a um
silêncio atroz.
Sua fisionomia sofria também as nocivas
influências de seu convívio.
A situação criada por ela era tão desagradável
que ele não conseguia cultivar sequer um
sentimento de conciliação, porque se anulava
pela força dessa convivência.
Ela não conjugava o verbo abrandar em seus
relacionamentos. Atrás dele outra atuava
solapadamente aqui já desmascarada.
Todos sabiam que «o excesso de zelo no
desempenho de suas funções, sejam estas
públicas ou privadas», denotava que ela
estava por trás disso.
Temos o exemplo daquele chefe de escritório,
dominado por ela, que adotou a postura
«ante o informe desfavorável sobre a conduta
56
de um de seus empregados, urgido pelo afã
de aplicar-lhe um corretivo, não se detém em
averiguações que comprovem a exatidão da
versão recebida e, sem ver nem ouvir mais
nada, sanciona o subordinado, vítima talvez
de um erro ou, o que seria pior, de alguma
calúnia.»
Ela, como outras desclassificadas, anda em
turma e, em suas andanças está
acompanhada de sua irmã siamesa aqui,
também, perfilada.
Ela, impertinentemente, o obrigava a fiar
unicamente em seu juízo, fazendo-o dissentir
com frequência do juízo alheio. Nesse estado
não «acede a considerar viáveis outras
opiniões que não as próprias a respeito de
uma questão.»
Pensamentos construtivos não tinham chance
nenhuma de agirem e se moverem com
liberdade nele, quando no cumprimento de
seus encargos diários, porque ela os
paralisava.
Saulo, em uma reunião de trabalho, quando
várias pessoas procuravam elucidar um
assunto, sob sua influência, pretendeu impor
com certo absolutismo seus pontos de vista.
Sua posição inflexível e nada conciliadora,
não repara que, variando convenientemente o
57
enfoque, seu juízo sobre o que se estava
considerando poderia mudar total ou
parcialmente, pondo-se a tom com as demais
opiniões.
Ela é mesmo nociva, porque, o inabilitava,
quando atuava em consequência dela, para
«superar as limitações de seu juízo,
condenando-o ao equívoco.»
Ele se entregava docilmente a ela, em face de
sua influência sutil. Essa sutileza é tamanha
que ele ao reagir contra um ou outro de seus
semelhantes aos quais tachava de rígidos,
não se apercebia que o que via neles «não
era mais que a própria rigidez.»
Interessante que ele possuidor de belas
qualidade as via empalidecidas em virtude de
seu temperamento duro, influenciado por ela.
Ele não mais podia com a própria
intransigência fomentada por ela, que não lhe
agradava e nem aos que com ele tratavam.
Quem não quer ser amplo e compreensivo em
toda a extensão da palavra? Então sugerimos
que se liberte o quanto antes da opressão que
sofre por causa de rigidez.
____________________
58
ENGANADORA
Avesso à intenção de humilhar era o que
ocultava ele quando sofria as pressões dela.
Diminuir a estatura dos demais era seu maior
deleite ao estar subjugado a ela.
Ela o fazia insuportável diante do atrevimento
e presunção que inveteradamente
manifestava ao emitir seus pontos de vista ou
dar soluções a problemas ou situações que
não dominava.
Ela o enganava abertamente ao fazê-lo «crer
que possui dotes e prerrogativas
consideráveis.»
É a petulância «um dos piores recursos para
impor um conceito de si mesmo, porque nessa
forma ninguém o admite.»
_________________________
PROPENSÕES:
SEDUTORA
Confiava piamente no que lhe era dito ou
proposto, quando sofria a tentação dela. Não
se detinha a discriminar e não se previnia
59
contra possíveis intenções ocultas no
pensamento de outros.
Em certas ocasiões, ela aparecia e ele se
enfeitiçava ficando desguarnecido à mercê do
embuste e, no fundo, era enubriado pela
ambição.
Ela se alimentava, em seu intento, do ócio e
da tendência dele de se atrair pelo fácil,
daquilo que não lhe custava qualquer esforço.
Ele sonolento, incapaz de reagir era
finalmente seduzido por ela e assim se
deixava envolver, atraindo para si todas as
consequências dessa atitude.
«Não se entregar à ilusão e confiar mais em si
mesmo do que nos outros» é a estratégia
mais eficaz para neutralizar essa tendência ao
engano.
_______________________
«PUXA-SACO»
Neuro carecia de méritos próprios, era
inescrupuloso e para encobrir sua condição
precária mostrava-se submisso aos seus
superiores ou a outras pessoas de quem
esperava algum benefício, valendo-se dela.
60
Caudilho, de outro lado, necessitava dela e a
buscava para se ver elogiado e por mera
especulação e conveniência.
Ela não pode ser confundida «com a
admiração, os gestos aprobatórios ou a
emotiva gratidão que podem suscitar na alma
dos seres as palavras, os pensamentos e as
obras de uma pessoa.»
Há os que são refratários a ela e não a
recebem, era o que acontecia com Hermes,
pessoa íntegra e que conquistara com o
«próprio esforço um lugar de honra entre seus
semelhantes.»
O que busca a forma mais natural e agradável
de se expressar, certamente, não atrairá para
perto dela a sua presença repugnante.
E quem consciente do «próprio valor» não
anulará a influência dessa propensão a
adular?
____________________
FÚTIL
A falta de conteúdo e uma vida carente de
incentivos superiores foi o que bastou para
que ela se manifestasse na existência daquela
pessoa vazia e angustiada.
61
Ela se sentia bem e atuava com intensidade
junto aos que não pensam com seriedade e
não têm um real conceito da vida e de seus
valores.
O influenciado por ela acredita «que o que
entretém um instante é o que realmente
importa.»
Desligar-se dela voluntariamente e a tempo é
o melhor que se pode fazer para não sofrer os
prejuízos que ela pode lhe causar.
Quem não quer deixar de «ser indiferente
para ocupar um lugar de preferência na
própria vida»?
Nesse esforço «cada um encontrará, não
duvidamos, incentivos de inestimável valor,
que suprirão com eficácia aqueles outros que
levam à frivolidade.»
________________________
DISFARCE
Ele estava à beira da falência, mas ela o
persuadia a fingir despreocupação diante de
seu estado real de insolvência, com atitudes
contrárias a sua realidade.
62
Ela o obrigava a viver de aparências, porque
reinava na superficialidade.
Ela se usava dele e tornava sua vida artificial
e o situava fora da realidade.
Ela era espert em desenvolver em sua vítima
«a arte de ocultar difíceis situações pessoais,
aparentando o contrário do que sucede.»
É bom fazer aqui a ressalva de que «não cabe
censurar aqui as pessoas que lançam mão
destes recursos para evitar a deprimente
situação de ter de confessar aos demais o
transe que atravessam.»
Fazer da dissimulação um hábito é um convite
a se desconceituar.
______________________
DESCUMPRIDOR
Quem abusava dela se dava mal. Alguns a
usavam valendo-se de mentiras e outros, para
«ocultarem a própria inoperância.»
Ela, em suas atuações, «anda de braços
dados com a irresponsabilidade».
Muitas vezes quem a sustenta é a vaidade.
Ela, com a chancela da audácia, se constitui
num «meio para surpreender a boa fé do
63
próximo» em benefício do que está sob seu
credenciamento.
Euprom, um negociante, audaz, envolvido por
ela, planejou um negócio enganoso e o
difundiu para atrair os crédulos, que
recorreram a ele sonhando em aumentar suas
economias.
Ela obrigava sua vítima a empenhar a palavra,
comprometendo, dessa forma, sua vida futura.
Quando sob o domínio dela, ele não
conseguia cumprir com seus compromissos,
era tachado de «desmemoriado» por todos
que exigiam o seu cumprimento.
Aqui estamos comentando o que acontece
com quem se predispõe a prometer.
__________________
FRUTO DA INCULCAÇÃO
O adormecimento temporário da mente é o
sintoma característico de quem está envolvido
por ela, com efeitos danosos para a sua alma,
ocorrendo a negação da cordura e do bom
tino.
64
Ele sob o envolvimento dela não gostava de
estudar e se expunha com facilidade ao
engano.
O dominado por ela se apegava a uma ideia e
não conseguia se colocar numa posição
ampla e sem preconceitos.
Ela ao influenciá-lo desde a infância, criou-lhe
um problema dos mais difíceis que deveria
enfrentar quando adulto: «o problema da
própria capacitação e experiência na
condução da vida», especialmente no que diz
respeito à sua parte moral e espiritual.
Na verdade, nunca foi vantajoso para ele tê-la
ao seu lado, porque ele se sentia inseguro
diante de questões que envolviam inquietudes
existenciais.
A claudicação de sua inteligência era visível
nele em virtude desse conluio.
Sim. É justamente de quem estamos falando,
da propensão a crer.
______________________
VOLÚVEL
Quem padece de sua influência apresenta
uma acentuada volubilidade.
65
Ele com sua característica imaginativa e
tendente ao excesso de fantasia, encontrava
nela uma companheira ideal e que o
dominava totalmente.
Ela o envolvia de tal forma que ele somente
via «o fácil e o formoso de tudo quanto se
reflete como projeto»
Ela como num passe de magia o impedia de
perceber a verdadeira face das coisas.
Ao se entregar a ela, ele era «seduzido pelos
artifícios da imaginação, cujo canto de sereia
é o procursor do engano.»
Ao ser afetado por ela, ele experimentava
uma insegurança a cada vez que se afastava
do real e positivo. Ela, efetivamente, era
capaz de pôr em perigo o seu equilíbrio moral
e material.
Lembrei-me aqui daquela pessoa que
alentada por ela na perspectiva fantasiosa de
aumentar seus lucros os seus negócios,
terminou por comprometer todos os seus
bens e até, por fim, sua honra.
Ela pode ser comparada «a essas efêmeras e
diminutas mariposas que parecem nascer
espontaneamente à volta de um foco
66
luminoso, pois, do mesmo modo que elas,
morta uma surge outra, como se o homem
necessitasse de semelhante engano para
estimular sua vida.»
Quem não consegue suportar as suas
investidas é muitas vezes conduzido ao
suicído, porque não conseguiram superar sua
temerária aventura.
Estamos falando aqui da ilusão que, «ao
transgredir os cânones da realidade, expõe
sempre a desenlaces pouco felizes.»
____________________
BAIXAS PAIXÕES
Ele é levado à excitação quando está sob sua
influência eminentemente instintiva e
passional. Sob a influência dela sua vontade
experimenta um relaxamento nocivo e se vê
embriagado por coisas passageiras e
efêmeras.
Ele ao lado dela se deleitava com certas
leituras libidinosas e conversas indecorosas,
sem falar de que gostavam de música
excitante e películas «luxuriosamente» cruas.
Adamastor, sua vítima, arrebatado por sua
influência avassaladora, chegou a abandonar
67
a família em «troca de uma vida ruidosa e
desordenada.»
Outro, sob sua nefasta influência, foi
«sugestionado pelo jogo, se entregou a ele
sem reparos de consciência, disposto a expor-
se totalmente.»
Há a história daquele que influenciado por ela,
se destruiu e sacrificou seus mais caros afetos
pelos prazeres que lhe proporcionou o álcool
e, finalmente, a do outro que manchou sua
reputação e honra «por uma vida econômica
fácil e pródiga em luxos e prazeres.»
Quem não quer neutralizar esta propensão ao
deleite dos sentidos?
____________________
MISANTROPIA
Ela apareceu em sua vida quando ele se via
presa do ceticismo e da indiferença.
Ele a procurou quando perdeu definitivamente
a fé nas pessoas e em suas possibilidade.
Alguns inibidos, de escassa capacidade,
reservados e asperos, por caracteristicas são
vitimados por ela.
68
Ela procura levar suas vítimas a se afastarem
do convívio com os demais.
O influenciado por ela é convidado a procurar
um retiro psicológico e ficar sozinho.
Com isso se torna estranho e intratável.
«Sobram razões para pensar que quem se
empenha em viver» assim é, «além de
insociável, egoísta, pois não toma
conhecimento das aflições e problemas da
humanidade, em cujo contato está obrigado a
viver por lei natural.»
Não podemos de deixar que ela, a propensão
ao isolamento, nos tire a grande prerrogativa
de convivermos com os demais, porque é tão
necessária e útil a todos «como a mobilidade
para evitar o entorpecimento de seus
membros».
___________________
SUPERESTIMAÇÃO
O que se deixa dominar por ela tem a sua
imaginação atuando descontroladamente.
Quem se vê envolvido por ela agiganta o
volume das coisas, seduzido, naturalmente,
«pelo afã de impressionar, de assombrar, de
chamar a atenção.»
69
Ele que se encontra sob sua influência
«experimenta invariavelmente o desejo de ser
acreditado e, quando o consegue, sente-se
invadido pela emoção torpe e vulgar de um
triunfo frívolo.»
Todos que se vêem aprisionados pela
tendência ao exagero querem paulatinamente
afastá-la de seus arrebatos que comprometem
negativamente o seu estado de ânimo.
___________________________
LIMITADO
Ele invariavelmente, diante de um problema
ou situação difícil que enfrentava, incentivado
por ela, corria em busca de socorro, «livrando-
se assim do esforço que a circunstância lhe
exige», valendo-se, portanto, «da mente
alheia, não da própria, para sair da situação.»
«Sinal evidente de mediocridade, desde que,
sob sua influência, o indivíduo espanta ou
rechaça tudo o que lhe demanda um maior
uso de suas energias volitivas e priva-se de
exercitar a própria aptidão na prossecução de
novos objetivos.»
70
Sua vida sob a tutela dessa companhia era
rotineira, carente de aspirações e confiava ao
acaso suas parcas conquistas.
Ele, quando ela se fazia presente,
experimentava uma inabilidade para resolver
por si suas dificuldades e para procurar
«maiores possibilidades de desenvolvimento
na vida.»
É lamentável dizer isso, mas «a propensão ao
fácil tira força da vontade, porque a mantém
pouco menos que imóvel, impedindo o homem
em consequência, de forjar determinações
que o conduzam a posições mais vantajosas.»
_________________________
DESPREZADO
Ele se mostrava incapaz, envolvido por ela, de
«manter em constante atividade as faculdades
da inteligência e o exercício dos
pensamentos.»
Ela criava nele um desprezo pela vida, como
se cada dia vivido acentuasse um oculto
rancor para com a própria pessoa.
O vitimado por ela demonstra não ter apreço
pela vida, porque não experimenta a alegria
de viver.
71
Ela a propensão ao abandono que acabamos
de considerar, manifesta o problema crucial
da decadência moral que assola a
humanidade.
___________________
INSIPIDEZ
«A ela se lança levado pelo prurido de fazer-
se prevalecer em qualquer tema que lhe dê
motivo para sustentar seus pontos de vista.»
Ela sempre o está convidando a se opor aos
demais, com a finalidade de deixar mal o
contendor.
Geralmente o afetado por ela «procura criar
objeções a qualquer raciocínio, por acertado
que seja, usando todos os meios ao seu
alcance para destacar ou fazer prevalecer o
próprio, atitude que o particulariza como
presunçoso e pouco considerado para com
seus semelhantes.»
Ela o fazia perder tempo. Tempo que poderia
ser aproveitado em algo útil.
Ela quando estava no comando fazia-o falar
descontroladamente e se valer de
«argumentos discursivos e sofísticos.»
72
Advertimos porém que «não se pode negar o
caráter construtivo que tem a discussão -
aqui tratada -, quando os que nela intervém
procuram confirmar algum acerto ou se
mostram permeáveis ao reconhecimento de
um erro manifestado pela opinião contrária.»
__________________
PROSTRAÇÃO
Ele se sentia incapaz para enfrentar situações
penosas. Não compreendia, por mais que
tentasse, o que lhe sucedia e estava convicto
de que as causas de seus infortúnios eram
alheias a suas culpas. Para os bons
observadores, ela estava se manifestando
nele ao vê-lo nesse estado.
Ela o procurava exato naqueles instantes em
que ele sofria forte pressão de
acontecimentos adversos.
Ela presente não lhe oferecia qualquer
perspectiva de reverdecer nele as esperanças
e de manter vivo o anelo de um futuro melhor.
Livrar-se o quanto antes dela era a palavra de
ordem, porque nada pior do que a angustia
que ela o fazia sentir pela vida, além de
prostrá-lo na esterilidade.
73
Livre a alma do desalento, mal que cada um
deve «afastar de si definitivamente.»
____________________
DESDITA
Diante de dificuldades, problemas ou
acontecimentos ingratos que deveria enfrentar
lá estava ela.
Ela muitas vezes vinha acompanhada por
«um pensamento obsessivo, que lhe faz ver
todos os seus males como irreparáveis e seus
problemas impossíveis de resolver.»
Ele não a resistia e se impacientava e se via
inseguro e era atingido por um grande
descontrole mental e, por fim explodia. Nesse
ponto o afetado por ela acusava «um sensível
debilitamento da vontade.»
Ela quando estava envolvendo sua vida abatia
o seu ânimo e quabrantava sua moral,
deixando-o sem forças para transmitir a sua
vida vigor e valentia.
Tratamos nesse relato da propensão ao
desespero.
________________
74
OCIOSIDADE
Ele afetado por ela perdia-se em abstrações
estéreis. Ela não permitia que ele
desenvolvesse qualquer atividade mental
consciente. Ele com ela ao seu lado vivia
distraído.
Ela tirava dele suas defesas, porque ela
subtraia de sua observação múltiplos detalhes
importantíssimos quando se tratava de tomar
uma resolução, formar um juízo, extrair uma
conclusão, decidir uma conduta.
Ela o persuadia a «acolher com temerária
ingenuidade qualquer versão que escuta
desprevenido de seus riscos.»
Outra não é a propensão de que estamos
falando aqui, senão aquela à desatenção.
__________________
TIRANA
Ela se pronunciava através de uma violenta
reação do ânimo. Predomina nele o
descontrole mental.
A pessoa dominada por ela não tem atitudes
serenas e se mostra violenta e furiosa,
75
terminando por «afastar de si os semelhantes,
fato que mostra às claras o agravamento do
mal.»
Ele sob a influência dela não se continha e
permanecia à mercê de seus arrebatamentos.
As consequências, sempre ingratas, da
influência dela em seu temperamento, o
obrigava a rever suas atitudes intempestivas e
violentas e munido de uma forte força de
vontade decidir afastá-la de seu convívio.
«Livrar-se da ira é retirar do caminho um dos
tantos suplícios internos que mantêm a vida
em permanente angústia e contrariedade.»
______________________
ARTIFICIOSA
Atraído pela parte artificiosa dela, ele preferia
confiar em temerários desenlaces, que poucas
vezes resutaram favoráveis.
Impossibilitado de conquistar por seu méritos
o que desejava, por flagrante incapacidade
umas vezes e por desproporção entre as
ambições e as aptidões para pô-las ao
alcance, outras, ele se via envolvido por ela e
76
imaginava que poderia concretizar seus
desejos, solucionar seus problemas ou
converter-se da noite para o dia em
privilegiado da sorte.
Quem confia nela «põe nisto boa parte de
especulação, pois tende a fazer o menos
possível em favor de suas necessidades ou
aspirações.»
Ele em um determinado momento realizou
uma operação comercial - orientado por ela -
«sem prévio exame criterioso dos problemas
que essas questões envolvem e sem
assegurar-se da forma de enfrentar eventuais
reveses».
Em uma ocasião, ele empreendeu uma longa
viagem e orientado mais uma vez por ela não
colocou o seu veículo em condições para
cumprir a jornada.
E assim em outras circunstância de sua vida
confiou nela piamente e, pretendeu «sair de
uma enfermidade sem fazer de sua parte
nada para dela se livrar»; adiantou ou
comprometeu «valores, confiando em que
haverão de se multiplicar prodigiosamente»;
confiou «no jogo para remediar suas precárias
economias.»
77
O certo é que ele, sob o fascínio dela, chegou
a arriscar tudo sem pensar nas
consequências.
Quem não quer esperar tudo da própria
capacidade? Então convém o mais cedo
possível livrar-se da influência da propensão a
confiar no acaso.
_________________________
MALEDICÊNCIA
Ela o desqualificava e quando estava junto
dele se fazia acompanhar de outras más
companhias de muito baixo nível.
Em sua infância já convivia com ela e sua
influência era tal nessa tenra idade que
costumava censurar levianamente o que os
outros diziam ou faziam. Ela o estimulava a
por apelidos disparatadamente em seu
coleguinhas, além de influenciá-lo em outras
atitudes nocivas como: acusar, «sem reparos,
seus irmãozinhos e companheiros de escola
ou de brinquedo.»
Ele, também na idade adulta, algumas vezes
voltou a revê-la e teve com ela algum
relacionamento que o levou a se deleitar com
78
«a murmuração, com a censura ou com a
maledicência.»
A pressão que ele sofria dela o fazia emitir um
juízo sobre o semelhante com má intenção.
Deve-se combater com grande tenacidade
essa propensão ao vitupério aqui tratada.
____________________
DEPRIMENTE
O afetado por ela se expõe «a malograr as
prerrogativas naturais que o assistem, porque
seu próprio mal afasta de si os estímulos
necessários para torná-las efetivas.»
Ela o deprimia e debilitava sua vontade.
Persuadido por ela, ele se situava por
momentos longe da realidade e manifestava a
tendência a «ver tudo com o olhar
obscurecido, talvez por recôndito despeito, e
sua mente se povoava de tristes vaticínios
que jamais se cumprem.»
Ela o fazia apático e não mais sentia gosto
pela vida. Tornava-o inepto e insensível aos
estímulos que a vida «lhe oferece para que
desfrute de seus bens com alegria.»
79
Ao lado dela o descontentamento tomou conta
dele.
Geralmente o dominado por ela «termina seus
dias renegando seu destino, ainda quando
tenha dependido só de seu esforço e
determinação que esse destino lhe houvesse
sido propício.»
Essa é a propensão ao pessimismo.
________________________
DESENFREIO
Aquele influenciado por ela «tende à
desconsideração de toda norma ou princípio
ético e sensível.»
O que se vê atacado por essa tendência «não
tem idéía clara a respeito da liberdade com
que pretende reger-se, ou não sabe que
liberdade significa também respeito,
comedimento, dignidade, considerando-a tão
somente quando tolera o abuso e o
desenfreio.»
O afetado por ela tem dificuldade de
«defender sua vida contra a tremenda
avalança de estímulos negativos da hora
presente.»
80
Cuida-se aqui da propensão à
licenciosidades.
_______________________
INDOLÊNCIA
Ele quando ela o envolve se vê indolente.
Preocupações e responsabilidades são
esquecidas.
Ela tira dele «eficiência no estudo e no
trabalho, porque o ser não persevera nem se
esforça na atenção que tais atividades
reclamam.»
Ela o leva agir com ligeireza, despreocupação
e irresponsabilidade.
Interessante que alguns atingidos por ela são
detentores de aptidões.
Muitos a levam às costas da infância à
maturidade. Ela o expõe «a sofrer
consequências muito variadas, desde as que
provêm de sua atuação nos meios que
frequenta, traduzidas em demérito para sua
pessoa, até aquelas que resultam de fatos
mais graves e irreparáveis, por não ter levado
81
em conta detalhes ou não ter feito
oportunamente aquilo que pudesse evitá-los.»
Desterrar a propensão ao descuido é o que
todos esperam, em face dos benefícios que
isso pode trazer para a vida.
_______________________
ÍNDICE
CONTOS CURTOS, DEZ-CONTOS.
(para ler duas vezes)
01 - INOPORTUNA E TEMERÁRIA
02 - INAMOLDÁVEL
03 - CAPRICHOSA
04 - BONECA INFLADA
04 - UFANOSO
05 - RAREZA CONTRADITÓRIA
06 - TRANSFORMISTA
07 - DE TEMPERAMENTO ÁSPERO
08 - OUSADIA É O QUE FALTA
09 - UM POUCO DE ARROGÂNCIA...
10 - «SUJEIRINHA»
11 - FALTA DE MEMÓRIA
12 - UMA INFLAÇÃO PERMANENTE
13 - ASAS DE CERA
14 - DESABRIDO
15 - OBSESSÃO
16 - QUE FRAQUEZA!
17 - INOPORTUNO
82
18 - ARREDIA À ORDEM
19 - POUCO AMISTOSA
20 - ALMA PEQUENA
21 - DESARRANJADA
22 - NADA SUAVE E DISSONANTE
23 - SEM MODERAÇÃO
24 - ABSENTISMO
25 - COMICHÃO
26 - CHARLA
27 - EXSUDAÇÃO MENTAL
28 - FORMAL
29 - FRENÉTICA
30 - ESTREITEZA
31 - NARCISO
32 - INSISTENTE
33 - ATORDOA E PARALISA
34 - DESUNE
35 - FINGIDA
36 - INQUIRIDORA
37 - CRIAVA DEMÉRITO
38 - DETERIORA
39 - «LOCUS SUPLICI»
____________________
PROPENSÕES:
01 - SEDUTORA
02 - «PUXA-SACO»
03 - FÚTIL
04 - DISFARCE
05 - DESCUMPRIDOR
83
06 - FRUTO DA INCULCAÇÃO
07 - VOLÚVEL
08 - BAIXAS PAIXÕES
09 - MISANTROPIA
10 - SUPERESTIMAÇÃO
11 - LIMITADO
12 - DESPREZADO
13 - INSIPIDEZ
14 - PROSTRAÇÃO
15 - DESDITA
16 - OCIOSIDADE
17 - TIRANA
18 - ARTIFICIOSA
19 - MALEDICÊNCIA
20 - DEPRIMENTE
21 - DESENFREIO
22 - INDOLÊNCIA
NOTAS DO AUTOR
Esse trabalho foi inspirado no livro
DEFICIÊNCIAS E PROPENSÕES DO SER
HUMANO, de Carlos Bernardo González
Pecotche.
Os trechos entre aspas são transcrições
desse citado livro.

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  • 1. 1 Marco Aurélio Bicalho de Abreu Chagas CONTOS CURTOS, DEZ-CONTOS (para ler duas vezes)
  • 2. 2 INOPORTUNA E TEMERÁRIA As duas quando estão juntas as intimidades são devassadas e ambulam de boca em boca disputadas pela curiosidade alheia. Sob sua influência aquela pessoa era impelida a falar e agir irrefletidamente, sem acerto nem responsabilidade. Ela, imperativamente, obrigava a outra a falar em excesso, expondo, prematuramente, projetos e propósitos. Esse comportamento imprudente não lhe agradava e por mais esforço que fazia para fugir disso, sentia-se incapaz e sem forças para tal. Essa convivência a estava prejudicando em suas atividades diárias, principalmente, em seu trabalho e relações com os semelhantes. Decididamente, para preservar sua moral e pudor teria que por um fim àquele relacionamento nada saudável. A atitude inoportuna da «amiga» não contribuía de forma alguma para o cultivo da fidelidade, imprescindível a uma convivência salutar.
  • 3. 3 Compreendeu que se não desse um basta àquela permissibilidade perderia irreversivelmente o controle de seu foro íntimo. Sim, estamos falando daquela que leva ao que a acolhe, a exteriorizar inveteradamente o que pertence ao âmbito privado, fazendo-o «viver fora de si mesmo». Seu nome é indiscrição. ______________________ INAMOLDÁVEL Era colocado, algumas vezes, em situações incômodas e submetido a dolorosas experiências se descolocando amiúde. Desse modo vivia em desacordo com a realidade que o rodeia. Ela o fazia se rebelar contra as situações ou acontecimentos adversos e a reagir contra toda idéia que tendia a modificar sua rígida postura. Sob sua influência, ele pretendia impor aos demais o seu modo de ser, de pensar ou de sentir, sem oferecer nenhuma flexibilidade de sua parte, dificultando sobremaneira a sua vida de relação.
  • 4. 4 Ele não mais aguenta aqueles transtornos a que ela o submetia. Estava decidido a mudar, fugir da comodidade e vencer os obstáculos, pondo à prova a fortaleza e a têmpera. Assim afastou de vez do seu caminho aquela que se constituía num sério obstáculo ao desenvolvimento de sua vida, a inadaptabilidade. ______________________________ CAPRICHOSA Ela apareceu na infância dele e se fortalecia com o afago dos pais que, inadvertidamente, consentiam, solícitos, os caprichos veementes do filho. Sob sua influência, não via e nem ouvia outra coisa além do que ele admitia. Quando alguém discordava de sua maneira de encarar as coisas ela aparecia e fazia valer sua autoridade, desagradando-o. Intransigente, não admitia a possibilidade de um equívoco. Em companhia dela produzia atritos verdadeiramente lamentáveis no trato com os demais.
  • 5. 5 Ela, em sua argúcia, se valia de disfarces, como força de vontade, constância ou empenho, para influenciá-lo a pretender alcançar o almejado, preso da teimosia e da cegueira. Ela, quando agia, o levava a não admitir, em hipótese alguma, variantes nem retificações de nenhuma espécie. O desgosto experimentado por sua causa, o fez imaginar transformá-la «em empenho consciente da vontade». Para quem ainda não adivinhou, seu nome é obstinação. ______________________________ BONECA INFLADA O desejo de ser admitida e o prazer pela lisonja não escondiam a forte influência que sofria daquela companhia que conhecera em sua infância. Em sua presença era impelida a inferiorizar os outros e a ressaltar sua figura exaltando-a, festejando os méritos ou qualidades próprios.
  • 6. 6 Diante de um êxito ou acerto ela se pronunciava. As faculdades da inteligência tinham o seu livre exercício comprometido, causando sérios prejuízos e levando ao descrédito aquela que estava sob seu jugo. Ela afetava seriamente não só sua palavra, mas também a atitude e o gesto, obscurecendo a mente e impedindo que ela visse e sentisse honestamente a justa medida do próprio conceito. Agradava-lhe, sob seu manto envolvente e impetuoso, que os demais fossem modestos e dispostos a suportar sua vanglória. E a envolvia de tal modo que ela se afastava da realidade e isso a impedia de alcançar um lugar de preferência entre os seus semelhantes, porque incitada por ela, nunca o poderia ocupar, pois ficticiamente realçava as próprias qualidades. Ao lado dela não era espontânea e se sentia incômoda e insegura nos lugares que frequentava. Ofuscada como estava, sentiu que não poderia continuar assim comprometendo a sua liberdade e imbuída de uma força de
  • 7. 7 vontade, resolveu mudar o curso das coisas e romper de vez com ela, abandonando-a em sua jactância. Nunca mais ela se atreveu a procurá-la. Certamente referimo-nos à vaidade, a que «fecha o entendimento e prostra a faculdade de raciocinar ante a auto-estima levada à exaltação e até ao paroxismo.» _______________________ UFANOSO Dizia-se um virtuoso. Realmente, essa crença respondia a um hábito arraigado em sua personalidade. Dissimuladamente fazia gala de valores, diminuindo seus méritos, buscando surpreender a boa fé do próximo. Esse mal hábito o inferiorizava, com o fim que tem em vista de fazer alarde de uma virtude. Esse nefasto hábito que o influenciava o estava tornando em um hipócrita da virtude exaltada, porque o levava a ocultar o lobo sob a pele do cordeiro.
  • 8. 8 Pena que esse hábito não atuava sozinho. O seu comparsa não menos negativo e dominante, juntos comprometiam a autenticidade de sua conduta. Romper com esse hábito não é tão fácil como parece, porque sua precípua função é enganar, enganando o próprio que está sob sua influência. Insuportável estava ficando aquele artificialismo, que ostentava algo que não possuía e assim resolveu não continuar alimentando o pensamento que gerava aquele abominável defeito, procurando ser verídico e leal de sua expressão ética, em empenho tenaz, contrapondo-se à falsa humildade. ________________________ RAREZA CONTRADITÓRIA Ele a herdou. Ela paralisava os recursos ativos de sua vontade e o mergulhava numa passividade nociva, afetando sua psicologia. Ele se tornava improdutivo e inábil para qualquer função de responsabilidade, embora fosse normalmente dotado e capaz.
  • 9. 9 Diante dela, faltavam-lhe interesse e iniciativa e se deixava levar pelo inveterado costume de não fazer nada. Lembrou-se de que quando criança experimentava uma espécie de preguiça. Nada que exigisse esforço o atraia. Detestava quando sua mãe o obriga a realizar os deveres escolares e toda tarefa de casa era feita com desagrado. Na idade adulta o quadro se agravou. Experimentava uma completa apatia e o embotamento o debilitava, mergulhando numa vida vegetativa e rotineira. Era incapaz de cumprir com suas obrigações satisfatoriamente, sentindo, por isso, a desconfiança dos demais e o pouco valor que davam aos serviços que prestava. Certa vez se viu vítima indireta de um desfalque. porque um mal intencionado, valendo-se de sua debilidade consumou um atentado ao patrimônio alheio, envolvendo-o. Num determinado momento de sua vida, viu que essa inação e falta de interesse com que encarava suas possibilidades, deveriam desaparecer do cenário, pois necessitava progredir e não poderia mais permanecer naquele estado de estancamento.
  • 10. 10 Pensou então nas funestas consequências que ela, essa herança maldita, acarretava e buscou dentro de si forças para sair de sua inabilitação. E rompendo com aquela herança, alimentou a esperança de se ver livre daquele infortúnio e reagiu firmemente, desembaraçando-se desse defeito hereditário chamado indolência, com decisão no comportamento, autodeterminação. _____________________ TRANSFORMISTA Foi na infância que a encontrei. Estava transvestida de rebeldia. Eu a confundia muitas vezes com outra. Na idade adulta recordei-me muito dela e a encontrei em várias circunstâncias da vida íntima e de relação e diante das leis estabelecidas. O que a fazia se rebelar, lembro-me bem, era a imposição, o acatamento cego a ordens, indicação ou encargo.
  • 11. 11 Ela influenciava sobre o meu ânimo levando- me à indisciplina, a perder a confiança em mim depositada. Acatava suas diretivas, temendo perder ou diminuir a minha autonomia. Ela sempre se mostrava contrária ao bom procedimento. Sua rebeldia era empecilho ao acatamento inteligente a normas, regras, deveres e leis. Dessa forma, sua presença, comprometia a harmonia dentro da convivência com os demais. Sob sua influência, quantas vezes, deixei de acatar uma ordem que eu mesmo me tinha imposto, de cumprir com a palavra empenhada e de atender ao pensamento que engendrou uma iniciativa e a minha vontade de levá-la á cabo! Sem falar das ocasiões, em que ao lado dela, defraudei um anelo, não ouvi um conselho, não atendi à minha sensatez, que reclamava moderação. Esta é a desobediência. Quem não a quer afastar de si? _______________________
  • 12. 12 DE TEMPERAMENTO ÁSPERO Ela gosta de se esconder, às vezes, por trás de uma modalidade aparentemente calma e sob uma aparência jovial. Oculta dentro de si um descontentamento que pode aflorar por qualquer circunstância propícia. Poder-se-ia dizer que é uma alergia mental que provoca frequentes crises de ânimo. Quando ele está em sua companhia, experimenta um descontrole mental. Torna-se presa fácil da violência, por mais educação que transpareça. Ele percebeu que a inveja a induz a provocar a reação violenta do ânimo. Recordou-se de um fato que comprova isso. Quando Arthur, seu colega, foi promovido no trabalho, alcançando um triunfo invejável, ele, influenciado por ela, certamente, experimentou internamente uma reação injustificável. Essa «característica tão pouco favorável e que põe em guarda todos aqueles que convivem com a pessoa que revelou ser sua vítima», é a irritabilidade. __________________
  • 13. 13 OUSADIA É O QUE FALTA A coibição é o resultado inevitável de sua influência despótica. Ela prejudica quase sempre o valor das próprias aptidões, ao estender os seus tentáculos, envolvendo ao que está em seu círculo de influência. Quem está sob seu domínio experimenta mórbido temor ao fracasso, ao ridículo, ao desacerto, só de imaginar que está exposto ao olhar alheio. Teme não saber se expressar com exatidão aquilo que pensa ou sente ao se colocar diante de outros. Ela encontrou na infância um ambiente propício para se desenvolver, ao ser submetida a um trato repressivo, que coíbia sua espontaneidade, pois esse procedimento austero, desenvolveu nela o complexo de temor, vergonha e covardia.Na infância ela se fazia presente, quando o adulto cortava-lhe rispidamente o uso da palavra, quando procurava expressar o que pensava ou lhe ocorria. Envergonhá-la ou confundi-la, caçoando de suas expressões ou argumentos eram algumas das tantas atitudes dos maiores
  • 14. 14 que contribuíam para o aumento dessa coibição. Ela assume frequentemente características de complexo de inferioridade, como consequência da falta de confiança e si mesmo. Ele, no intuito de se ver livre dela procurava se valer de pensamentos de entusiasmo, otimismo e coragem. Ela o impedia de se comunicar e fazer valer o seu juízo, colocando-o em inferioridade de condições ante os demais. Influenciado por ela, não se colocava à vontade entre os semelhantes e se sentia um covarde e medroso. Ela é má companheira e quanto antes livrar-se dela, constitui para ele uma meta a ser alcançada, não importando o quanto custe, contando que livre de seu império, possa agir com inteireza e desenvoltura. Fora, você, inibição. _______________________
  • 15. 15 UM POUCO DE ARROGÂNCIA... Falta nela sentimentos humanitários e aos que domina os torna insensíveis. O estado de embriaguez de ficção que a envolve a faz conhecida como a negação da sensatez, o reverso da compaixão. Seu rosto na juventude e também na infância já era conhecido, embora manifeste seu absolutismo e força quando quem, influenciado por ela, assume um cargo importante, uma função de mando ou a posse de riquezas ou de outros bens materiais. Conheci certa vez um cidadão que assumiu um cargo de privilégio no governo e não demorou muito foi assediado por ela que o fez ostentar essa posição e o persuadia a fazer valer a categoria investida, a hierarquia atingida e o poder que ostentava. Mas, paradoxalmente, sua cara, também, se faz visível em pessoas de condições modestas que circunstancialmente se rebelam ante a autoridade de seus superiores quando se vêem em funções de maior responsabilidade e num misto de arrogância, de altivez e de desdém, que conteve, talvez, durante sua forçada situação de dependência.
  • 16. 16 Ele sob a influência dela não tolera que outros desconheçam seus méritos e se mortifica quando não é tido em conta ou não é considerado como pretende. Ela tem uma cúmplice arisca e quando ambas arquitetam suas artimanhas produzem seres astutos e matreiros. Quem se submete a seus caprichos manifesta-se com violência e sua palavra é lacerante. O atingido por ela é ambicioso e não mede esforços para aspirar ao trono material, valendo de meios pouco dignos e em detrimento do próximo. Ela o faz ver miragens ao estimular a que sua imaginação projete a própria figura no altar do endeusamento pessoal. Falamos aqui nada menos que da soberba, pintada aqui com tintas bem fortes que ressaltaram até onde pode chegar essa embriaguez manifestada no início desse relato. ______________________
  • 17. 17 «SUJEIRINHA» Ele fisicamente tinha boa aparência, entretanto era desleixado e desalinhado, produzindo repulsa por onde passava. Teve uma infância descuidada e na juventude sofreu padecimentos e desilusões que deram origem a esse grave defeito. Dificilmente inspirava um bom conceito, embora possuísse méritos que por influência dessa falha não eram valorizados. Faltava-lhe higiene mental e isso repercutia, por exemplo, no uso de palavras que revelavam que sua mente não estava limpa. Quem está submetido ao seu império, dentre outras atitudes depressivas, usa de palavras que ferem a moral, mente com a intenção de menosprezar ou difamar o semelhante. Ele revela falta de escrúpulos na pessoa que o mantém sob seu domínio. Quem é sua vítima empobrece sua figura tanto no aspecto físico como no moral e espiritual.
  • 18. 18 Guardar circunspecção e compostura não está nos planos dele, o desasseio, esse personagem deplorável e sem esmero. __________________ «SURMENAGE» Que distraído ele era! Ela indubitavelmente era a responsável por isso. Era sua companheira desde tenra idade. Esquecido, quando pequeno, tinha como aliado o descuido dos maiores, que não o incentivava ao cultivo das disciplinas do estudo fazendo-o variar de conduta. Essa desatenção aliada à aversão pelo estudo contribuiu para que ela tomasse posse dele e passasse a dominá-lo. Ele agia maquinalmente sob a influência dessa companhia indesejável. A influência dela em sua juventude e em sua vida adulta foi tão nociva que comprometeu sua possibilidade de ampliação da própria capacidade. Victor prisioneiro dela se movia e atuava «indeliberadamente, quase sempre em
  • 19. 19 obediência à lei cíclica» que lhe «permite desempenhar uma função por simples repetição de movimentos, mas sem pensar no que realiza, daí resultando sempre situações incômodas, transtornos, perdas de tempo...» Godofredo, também, atingido por ela, não controlava, como deveria, suas determinações e ia de um lado para outro, instado «por necessidades e obrigações habituais, mas com a atenção ausente», seja porque as subjugava alguma ideia atraente, seja porque um pesar as invade, ou por se deixar «absorver habitualmente por qualquer circunstância relacionada com sua vida.» Ele que, às vezes se envolvia com ela, pensava e fazia muitas coisas sem se recordar depois porque as pensou ou fez. Ela em alguns casos surge devido ao uso intenso que se faz da faculdade de recordar, em face do carregamento excessivo das funções, promovendo o esgotamento da célula cerebral. Ela o fazia se desconectar com a própria vida. Sentia em sua presença que flutuava no espaço mental, sem se fixar em nada.
  • 20. 20 Ela o levava ao esquecimento e, assim, não retinha os «elementos úteis e de valor positivo» para sua vida. Expusemos aqui algumas das influência maléficas da falta de memória. ____________________ UMA INFLAÇÃO PERMANENTE Ela se acreditava ser objeto de admiração entre seus semelhantes. Revestia-se de méritos imaginários. Ele, sob a influência dela, achava-se possuidor de dons e aptidões que não tinha. Sua personalidade inflada o fazia se prezar em demasia e ela o levava a se mostrar fora de foco ante o olhar dos demais. Ela o conduzia vertiginosamente ao engano, fazendo-o crer ser o que em verdade não é. Para ficar livre dessa escravidão a que ela o submetida, entendeu que deveria propiciar a si mesmo a possibilidade de ser realmente, mas nunca por ostentação, «senão como exigência da própria condição de ser racional e consciente.»
  • 21. 21 Essa não é outra persona non grata, conhecida pela alcunha de presunção. __________________________ ASAS DE CERA Essa pessoa tinha a deplorável característica de contradizer e sustentar com teimosia o pouco que sabe ou sabe mal. Não conseguia aprofundar uma idéia e era confuso em seus pensamentos, sem falar de sua carência de luzes e sua ignorância alimentava o seu amor próprio exacerbado. Temia que se pensasse ou falasse mal de sua pessoa. Sua companhia não era nada agradável. Ela tergiversava palavras e intenções, levando-a a uma série de equívocos. Ela só escutava a si mesma ou não entendia o que era dito para seu bem. Como faze-la, então, compreender que deveria mudar esse modo deformado de ser? Sob sua influência, dificilmente se pode atuar com sensatez e inteligência ou adotar um comportamento mais reflexivo e judicioso.
  • 22. 22 Quem se deixa levar por ela esgrime, pretendendo convencer, critérios que quase nunca lhe pertencem e, pior ainda, desconhece os seus fundamentos. Ele muitas vezes, assediado por ela, enganava-se facilmente e se melindrava à menor insinuação ou atitude que toque seu amor próprio. Detê-la no início de qualquer relacionamento que se pretenda ter com ela é o mais recomendável, sob pena de se tornar uma afecção crônica. Afastar-se da necedade se faz mister, por conseguinte, para se defender dessa propensão defeituosa. _________________ DESABRIDO Ele quando próximo dela, não dava outra: se fazia descortês e insociável. Conhecida por desdenhosa e indiferente, posturas que adotava no convívio com os que se acercavam a ela. Os seus pensamentos desalinhados, ora pessimistas, ora depressivos comprometiam o seu humor variável e que, naturalmente, desagradava.
  • 23. 23 Nas rodas de amigos, sob a pressão dela, ele raramente coincidia com os estados plácidos ou alegres desses ambientes. Ele estava percebendo que ela o fazia ser mais artificial do que natural em suas atitudes e gestos e isso não estava bem, pensava. Ela se auto-adulava, alimentada por estímulos artificiais surgidos de sua característica imaginativa. Notava-se que, quem influenciado por ela, olhava os outros por cima do ombro, por força de um desdém, baseado na ilusão, com a qual convivia preferentemente. Claro que ele, manejado por ela não era nem um pouco feliz e, por isso, sofria «o forte e instrutivo golpe da realidade, destinado a corrigir o rumo de seus pensamentos.» Eram, não tenho dúvidas, os efeitos nocivos da displicência. __________________________ OBSESSÃO Hoje ela é mais conhecida do que nunca. O avanço tecnológico, a luta contra o relógio em
  • 24. 24 prol da subsistência, o declínio da moral e as inúmeras dificuldades enfrentadas, ao sobre- excitarem o ânimo formam um clima propício para o aparecimento dessa que aqui iremos desenhar. O influenciado por ela explodi diante de qualquer demora não perdoando ninguém. Quem não viveu a situação de estar frente ao balcão e do lado de dentro o funcionário indolente e despreocupado e, avassalado por ela, não explodiu «durante a espera excitado por sua ostentosa passividade?» Seguramente, nestes casos - adverte a Logosofia - se conseguiria mais, antecipando estas palavras: «Disponho de tempo, senhor. Atenda-me quando puder», pois é comum encontrar no ânimo dos seres humanos certo prurido de fazer o contrário daquilo que lhes é pedido.» Ele, dominado por ela, diante de qualquer espera aquilo se transformava numa tragédia grega, criando a «angústia do tempo», sem falar na agitação interna experimentada nessas situações. Sob sua influência, também, se afligia na expectativa de uma notícia, uma resposta
  • 25. 25 importante, uma solução, e outras situações pendentes semelhantes. O sofrimento moral e físico nesses casos era evidente naquele atingido por ela. Ele, sob seu comando, experimentava uma grande dificuldade para entender «que cada coisa requer seu tempo» e, principalmente, que «os que lhe prestam seu concurso ou o secundam em seus esforços nem sempre podem ou estão dispostos a seguir o ritmo» que ela lhe obriga impingir. Eis, por fim, a pergunta: «Que ganhamos por sermos impacientes?» _____________________ QUE FRAQUEZA! Ufa! Não aguento mais. Ela é fonte tributária do instinto. Embebido por ela, o ânimo se relaxa e a capacidade vital da pessoa fica seriamente afetada. Quando, sob sua tutela, ele cede com facilidade ante a menor pressão do instinto e do pensamento sedutor, promovendo sérios
  • 26. 26 estragos na vontade, obrigando-o a reincidir na prática de inúmeras transgressões. Ela provocava nele o enfraquecimento de sua fortaleza, diante da ausência de energia nas determinações do ânimo, em face de um obstáculo ou ante o vigor da resistência alheia. Por vezes ele, influenciado por ela, se via impotente diante das paixões e sua razão se neutralizava e se submetia à sua fascinante influência. Muitos, sob o seu jugo, a consideravam uma válvula de escape do instinto, buscando, de certa forma, com isso, dissimular sua ação nociva, consentindo com suas travessuras. Sinceramente ela é uma ladra, que rouba daqueles que caem em sua teia muito tempo e energia, sobretudo quando ela se «singulariza pela entrega total da pessoa às demandas do instinto, enchendo-se de vícios.» Afastar-se o quanto antes da debilidade é o que se deve buscar em salvaguarda de um sentido de defesa, de reabilitação ou reconstituinte. _____________________
  • 27. 27 INOPORTUNO Gostava de aconselhar a todos, principalmente, quando supunha que alguém estivesse passando por dificuldades e lá vai ele se oferecer, sem reparar, sequer, que não lhe pediram qualquer ajuda ou conselho. A pessoa que está sob seu domínio alimenta um desejo ardente de saber, simplesmente, por curiosidade, o que pensam, dizem ou fazem os demais. Ele, embora, não tenha maus sentimentos, mas sua atitude de fazer o papel de alcoviteiro, era recriminado e sofria a repulsa daqueles que conviviam com ele. Demonstrava em seu comportamento uma falta de tino e de tato manifestadas ao se envolver repetidamente em assuntos que não diziam respeito a ele. Não tinha tirocínio, pois, infelizmente, ele não percebia que com tais atitudes desmerecia seu conceito, que sua palavra era tida com prevenção e reservas e, lamentavelmente, sua conduta chocava a todos ao seu redor, por mais bem intencionada que parecesse. Ele sempre era visto de braços dados com outra, e ambos, por afinidade, eram causadores de intervenções importunas que
  • 28. 28 acarretavam inúmeros contratempos e complicações causando o malogro de planos e projetos em pleno desenvolvimento. Júlia, em certa feita, vítima dele, se introduziu, indiscretamente, onde não fora chamada, e sofreu sérios prejuízos e, decidiu depois disso, nunca mais se aproximar dele. Outro, transmitiu a alguém uma palavra, incentivado por ele, sem medir as consequências do dito e, também, enfrentou uma censura que lhe causou um incômodo e prejuízo sem par. Que impressão se pode ter de uma pessoa que está constantemente se imiscuindo na vida alheia? Evidentemente que é uma péssima impressão. Assim não se deve tardar em eliminar de nosso convívio esse que não é outro, senão o intrometimento. _________________________ ARREDIA À ORDEM Encontra-se incubada no ânimo sob os auspícios do instinto. Esse era o seu recinto de origem. Ela se mostrava invariavelmente rebelde em face do ordenamento da vida, naturalmente, imposto pela convivência humana.
  • 29. 29 Aquele que era influenciado por seus atrativos, via debilitados consideravelmente os seus mais caros propósitos. Ela é como outras, encontrada na infância; sempre arredia à ordem e bons hábitos. Era a primeira em influir para dissociar as idéias, provocando entre elas forte antagonismo. A rebeldia era o seu alimento predileto. Aquele inebriado por ela confunde-a com liberdade e, sob o pretexto de defendê-la, «despreza as leis e normas que regem a vida civil, e até se vangloria disto, pretendendo demonstrar, sem dúvida, que é dono absoluto de sua vontade.» Ela considera a disciplina a imagem tediosa da submissão. Detesta toda idéia de ordem. O apossado dela tem sérias dificuldade de cumprir com os seus afazeres diários, porque sob seu governo e influência, pouco vale ser ativo, porque ela «subtrai ao esforço grande parte de energia». O perigo maior é que ela, em suas investidas, não atua só. Ela faz parte de uma quadrilha
  • 30. 30 formada por no mínimo cinco comparsas, altamente ágeis e violentos. Seja como for, não convém mais ceder aos fascinantes argumentos da aqui revelada indisciplina. ________________________ POUCO AMISTOSA Sufocar os sentimentos é o seu intento. Ele, infelizmente, inebriado, se jogou em seus braços, e se converteu «em um maníaco, encerrado no estreito círculo da própria inclemência mental.» Sempre o ouvíamos dizer: «Não aguento seu gênio.» Ela tornou o seu caráter acre e sombrio e o impelia ao isolamento. Ele fugia «do contato com seus semelhantes e estes, do seu, porque a ninguém agrada uma modalidade áspera e pouco amistosa.» Ao lado dela, ele era vítima de rechaço, pois os demais não se mostravam satisfeitos a sua frente.
  • 31. 31 Ela se arrepiava e abominava o bom humor, a tolerância e a alegria, porque se contrapunham a sua atitude tirana. Retirar esse peso de cima é o que tanto se busca, aliviando a carga representada pela aspereza. ____________________ ALMA PEQUENA Poderíamos apelidá-lo de matusalém, pois «remonta a idades primitivas.» Tem feições pré-históricas e pode ter sido muito útil, talvez, na idade da pedra, alimentado pelo instinto de conservação, sobressalente naqueles primórdios. O dominado por ele, embora confundido, comumente, por sentimento, em verdade não o é, ao contrário, «luta com seus próprios sentimentos quando, em determinadas circunstâncias, estes pretendem abrandar-lhe o coração, endurecido, precisamente, pelo domínio que o instinto exerce sobre ele.» Ela é, comprovadamente, produto inveterado do instinto, «último dos marcos humanos afim com a animalidade, que sugere quão
  • 32. 32 necessário é trocar os estados inferiores pelos de natureza elevada.» Paulo, envolvido por ele, não conseguia compreender que «o acúmulo de bens exclusivamente materiais agrava a transição que se verifica nele ao cessar a vida». Ele, ao atuar, lamentavelmente, corrói os mais nobres sentimentos de sua vítima. O afetado experimenta um forte desequilíbrio, «uma multiplicação de desejos que jamais se satisfazem ou só se satisfazem em parte.» Antônio sentiu na pele sua influência. Em uma festa, experimentou subitamente o desejo ambicioso de ser o mais admirado ou o que mais poderia se destacar. Em outra circunstância, ainda influenciado por ele, «sentiu dentro de si a força que se opõe a algum gesto desinteressado», ou, em outro momento, « ao se ver diante de uma apetitosa mesa, o impulso incontido de escolher o melhor bocado.» O acossado por ele considera a vida um comércio e põe preço, naturalmente, o mais baixo em tudo, influenciado pela idéia de que «o que escamoteia com habilidade os valores que anseia para si, tira mais vantagens.»
  • 33. 33 Estamos tratando aqui desse incômodo e mesquinho personagem chamado egoismo. ____________________________ DESARRANJADA Ela é avessa a um método. Considera que a disposição sistemática das coisas a tiraniza, privando-a da liberdade de fazer o quanto lhe apraz. Alberto, influenciado por ela, não conseguia manter no lugar suas roupas ou objetos de uso diário. Ela é sócia da negligência e «concorrem ambas ao mesmo fim.» Quem está sob sua influência vê seus projetos ameaçados, porque não consegue executá- los a contento. Ela não é outra senão a desordem. _____________________ NADA SUAVE E DISSONANTE São vítimas dela aquelas pessoas de temperamento inquieto, impaciente e violento.
  • 34. 34 Também os que por incultura não conseguiram limar as asperezas de seu caráter sofrem sua influência. O que está sob sua batuta sai de tom e desafina no concerto da convivência e produz perturbação nos que o rodeiam. Interessante é que os afetados por ela, paradoxalmente, podem ser pessoas afetivas e cordiais e contar, naturalmente, com muito boas condições morais. O atingido por ela tem muita dificuldade de conviver em harmonia. Quem foi tomado por ela gesticula e se movimenta de forma intempestiva. Tem atitudes impróprias e manifesta toda sua rudeza, provocando um desconcerto generalizado. Quem se sentiria bem diante dessa que se mostra tão abominável e desconcertante?. Quem não quer se manter distante da brusquidão?! __________________________
  • 35. 35 SEM MODERAÇÃO Ela o envolvia de tal modo que ele não conseguia controlar e regular seus apetites passionais. Transformava-se num autômato, incapaz de enfrentar ou anular sua influência perniciosa. «Quem a suporta carece de governo sobre seus atos, faltos de ética que reclama a convivência normal entre os seres humanos.» Naturalmente que ninguém suporta sua presença por muito tempo. Há que ter muita vontade para suplantar a intemperança. ______________________ ABSENTISMO O atingido por ela submerge-se numa passividade tal que não lhe importa nada de quanto lhe possa acontecer, bom ou mau, triste ou alegre. Esse adormecimento do ânimo é tão prejudicial que afasta da preocupação, do acossado por ela, a sorte de filhos, esposa e demais seres queridos.
  • 36. 36 Ela dentre suas mórbidas características, em alguns casos, sobressai as suicidas, principalmente quando afeta a saúde, que «se desatende ou se descuida com menosprezo da própria vida.» Quem se envolve com ela «acusa falta de sentimentos humanitários», revelada na atitude de «podendo fazer o bem, passam de longe pela miséria, necessidade e dor alheias.» A atenção do molestado por ela desaparece, praticamente, nos casos mais aguçados, em virtude da falta de estímulos que a promovem. A sua frieza se «assemelha eloquentemente ao mutismo da tumba.» Estamos falando, precisamente, da indiferença, que nos mantém estranhos ao que acontece na humanidade. ______________________ COMICHÃO Ora, ela é insaciável. E quem experimenta o seu trato se sente inferiorizado em suas qualidades e condições.
  • 37. 37 Dentre os prejuízos que provoca naquele que está sob seu jugo salienta-se o desvio da capacidade de criação da inteligência. Ele influenciado por ela se empenhava desmedidamente na tarefa única de atender exclusivamente os seus afãs de lucro e posse. Ele enlevado por ela tinha os seus sentidos açulados a um desejar contínuo das coisas. O afetado por ela é atacado por uma coceira insuportável, mas que nele engendra um prazer mórbido e, por isso não faz nada por eliminá-la. Ela influi poderosamente no ânimo dele que é provocado obstinadamente a ir em «busca de maiores bens ou de novas e alucinantes posses, sem titubear no que arrisca.» Dentre muitos que sofrem sua influência estão aqueles que desejam «com ardor o alheio sem consegui-lo nunca.» Com isso vimos surgir nas pessoas o ressentido com sua sorte e também com o seu destino, lamentando seu abandono e acusando o destino «de favorecer com excesso os demais, deixando-os de lado.»
  • 38. 38 Como muitas marginais ela não ataca só, forma com outras uma quadrilha quase que imbatível, provando em suas investidas maiores estragos. Ela vicia as faculdades da inteligência e da sensibilidade de suas vítimas e passa a exercer pleno domínio sobre suas vidas, «vendo-se por esta causa aparecer, em inumeráveis casos, como principal instigadora de feitos delituosos: espoliações, fraudes, furtos, violências.» Livrar-se, portanto, das acometidas desta bandida se faz necessário, máxime se se recorda que a vida «não foi feita para amontoar riquezas materiais e, menos ainda, para aviltá-la com inspirações de cobiça.» ________________________ CHARLA Aqueles dedicados às letras e à educação - nem todos - a confundem com uma bela e erudita virtude e, pasmem, a cultivam com esmero. O acossado por ela fala com excesso, sem «um controle que lhe permita ajustar o uso da palavra às exigências do tempo e à oportunidade em que o faz.»
  • 39. 39 Há os que a escutam de bom grado, porém outros dissimulam seu «aborrecimento e seu incômodo, enquanto esperam que se lhe esgote o tema ou que o emudeça providencialmente o cansaço.» Alguns oradores, principalmente, certos ditadores, se vangloriam de seus aparentes atributos e se dizem aficionados por ela. Quem está sob seu domínio se deleita ao dar «curso livre a seu desenfreado palavrório, escutando-se a si mesmo com incontida euforia, compraz-se da admiração que desperta ou crê despertar no auditório.» É interessante observar que as pessoas ocupadas e ativas fogem dela; as sensatas e formais a evitam. Quem teve o desprazer de aguentá-la uma vez «não se dispõe a ser sua vítima novamente.» O atingido por ela costuma repetir a mesma coisa muitas vezes sem se dar conta de que isso irrita qualquer um. O mais grave de tudo é que quem está sob seu poder ditatorial é incapaz de perceber o desagradável e pedante que é seu linguajar.
  • 40. 40 Dizem que ela anda de braço dado com o ócio, sob a justificativa de que «quem fala muito não pode empregar seu tempo em fazer algo útil.» Há um ditado popular que a define bem: «quem fala demais dá bom dia a cavalo». O pobre do animal não tem nada a ver com má reputação dessa infeliz. Pessoas que gozam de bom conceito e são ativas, afetadas por ela, «falam até pelos cotovelos». Quer saber se você é vítima desse algoz, então, responda: «minha conversa é útil? Serve em realidade para algo? Não estarei abusando da paciência alheia? Não estarei malgastando meu tempo e o dos demais?» Procure falar menos e pensar mais, assim você estará se afastando definitivamente da verborragia, «recordando que o excesso de palavras soa vazio e que ninguém toma a sério a quem fala muito. Se alguma vez diz algo importante, corre o risco de passar despercebido.» Convém aqui transcrever a necessária advertência: « As palavras não se devem
  • 41. 41 esbanjar, porque poderiam faltar, quando se necessite que seu peso influa em alguma decisiva circunstância da vida.» ________________________ EXSUDAÇÃO MENTAL Ele é um veneno. Condena sua vítima a uma prolongada tortura. Aprisionado por ele, o infeliz não se recorda dos fatos e coisas que o beneficiaram e lhe fizeram experimentar satisfação e o encheram de alegria. Ao contrário, se lembra, isso sim, «com ânimo sombrio, de quantos lhe foram adversos.» Esse desditado, envolvido por ele, se alimenta do ódio e vê seus sentimentos corroídos, «sem reparar que o mal que anseia para os outros se volta contra ele centuplicadamente». O envenenado por ele é incapaz de deixar de ouvir as falsas razões que o assistem e aconselham. Fica à espreita aguardando na surdina e com dissimulada atitude a ocasião propícia de retribuir o mal que a seu juízo lhe fizeram. O seu sarcasmo é tal que «qualquer desgraça, qualquer contratempo que recaia sobre a pessoa alvo de seu despeito, equivale
  • 42. 42 para ele ao prazer que haveria de oferecer-lhe a própria vingança.» Lamentavelmente o que se deixa levar por ele se desqualifica e denota «inferioridade moral», sem falarmos de que não admite a intervenção do sentimento, lesando, por conseguinte, sua sensibilidade. Havendo tempo, aconselha-se não dar cabida ao rancor, pois «é preferível ser credor e não devedor». ______________________ INFORMAL Não há dúvida, ela foi atingida por ele ao se constatar que está se descuidando do dever, da palavra empenhada e do compromisso contraído, denotando falta de responsabilidade e também de escrúpulo. Que pena, porque por sua causa ela está deixando de cumprir com muitos dos fins que se propõe para seu bem! Com isso, influenciada com está por ele, perde a confiança que os seu lhe depositam, deixa de inspirar respeito, porque, em realidade, demonstra não «respeitar as próprias determinações»
  • 43. 43 Ela ao se comprometer com ele deixou de honrar a sua palavra e não soube mais se valer de meios eficazes para conciliar situações adversas, «sem deixar por isso de gozar de absoluta liberdade». Distanciar-se dele e depois eliminá-lo de sua vida é o que se deve fazer, porque não se deve favorecer mais as demonstrações do descumprimento. ___________________________ FRENÉTICA Atuava involuntária e irreflexivamente, sem qualquer domínio e muito apaixonado, quando sofria os acessos dela. Ela o excitava de tal modo que ele não tinha tempo de elaborar acabadamente seus juízos ou suas decisões. Seu ânimo junto dela ficava, vamos dizer, a-ca-lo-ra-do. Seus gestos e atos impensados eram, sob sua influência, arrebatos de uma volubilidade que impressionavam, envolvidos por uma fogosidade cheia de entusiasmo insuflados por desejos e paixões incontidos.
  • 44. 44 Ela influía até em suas palavras e ações que eram promovidas pela «precipitação, pela violência ou pela impetuosidade» Os que conviviam com ele testemunhavam frequentes desabafos quando presa dela, para aquietar seus nervos e seu ânimo, razão pela qual seus arrebatos intempestivos amiúde causavam surpresa. Notava-se que ela, quando se impunha, anulava nele «também a moderação e o equilíbrio que deveria caracterizar sempre as ações». «Desarraigar a veemência é tão necessário ao veículo psicológico humano como o é, para o automóvel a troca de uma peça defeituosa do motor. Em ambos os casos melhora a marcha.» _________________________ ESTREITEZA A rigidez, a dureza e a inflexibilidade são características do afetado por ela. O afeto ao semelhante sofre opressão. Ele, quando sob o domínio dela, demonstra ser um pobre de espírito e cria ao seu redor um ambiente de hostilidade.
  • 45. 45 Ela o transforma em um antipático, pouco cortes e desapiedado, dificultando uma convivência harmônica. Sua atuação é tão elástica que «degenerou em perseguições sociais, políticas, religiosas e ideológicas, abrindo abismos profundos entre homens e povos.» Abandoná-la é conveniente, porque os pesares que ocasionam não estão nos planos de ninguém. Ele quando a acompanha deixa transparecer uma «inveterada falta de respeito às idéías, ao afazer e comportamento alheios.» Ela não é outra, senão a intolerância. _____________________ NARCISO Ele desperta em quem o envolve um amor desmedido pela personalidade, sob a influência por tudo o que é material. Claro que com esse amor abrasador conduz a quem domina à egolatria, e causa constantemente a sua descolocação onde quer que atue.
  • 46. 46 Ele esquece por completo a reciprocidade do amor quando se vê envolvido por ele e se embriaga com os «acentos da admiração que a si tributa.» Ele tem muito de passional e instintivo. Ele fecha o entendimento às objeções da sensibilidade e impede bruscamente a comunicação dele com sua consciência. Esse inimigo é conhecido pelo nome de amor- próprio. __________________ INSISTENTE Ela se apresenta sob o manto de obstrução mental. O vitimado se aferra à idéia ou opinião que a custa de muito esforço conseguiu formar e não se dispõe a mudar. Procura se entrincheirar detrás de sua convicção ainda que seja errônea. Ela, por sua vez, agindo nele inibe as faculdades de sua inteligência. Sua vítima experimenta dureza de caráter, com grande influência sobre o ânimo e se
  • 47. 47 sente limitado, comprometendo sua maneira de viver e encarar a vida. Combater a teimosia significará o abrandamento do caráter. ______________________ ATORDOA E PARALISA Ele dava crédito fácil a tudo aquilo que ouvia sem se prevenir contra o erro ou a falsidade. Aceitava tudo sem prévia participação de seu entendimento. Esse inequivocamente, estava dopado por ela. O que a acolhia era vítima dos excessos de confiança no próximo, aceitando tudo de boa fé. A pessoa que é atingida por seus argumentos se entrega submissa à sugestão alheia e se sente ingênua. As ciladas armadas por ela contemplam a candidez de sua vítima e põem em perigo a independência do ser. Ele não consultava o próprio juízo e dando ouvidos à voz sedutora do engano, aceitava passivamente o alheio, renunciando ao legítimo direito de pensar.
  • 48. 48 O certo é que não é necessário «chegar à sabedoria para eliminar a credulidade.» ___________________ DESUNE Ele tinha o inveterado hábito de postergar e até malograr toda ideia, projeto ou plano que, porventura, tencionava levar à prática. Para o bom observador ele, certamente, estava, com essa atitude, sendo vitimado por ela. Sua desorganização e irresponsabilidade formavam um ambiente adequado para as investidas dela que submete a pessoa a uma «permanente mudança, manifestada na facilidade com que interrompe sua dedicação a uma coisa para dedicar-se a outra, variando continuamente seus motivos de interesse.» Ele quando estava envolvido por ela, era incapaz de dar continuidade aos processos que punha em marcha, desaproveitando o tempo, e com isso anulava os esforços que empreendia para a consecução de algo. Ela transtornava sua vida e, com isso, sentia um grande vazio e instabilidade.
  • 49. 49 Ela sempre dava um exemplo inverso ao da natureza, porque esta consuma ininterruptamente nela os processos que fazem possível a existência. Ao sentir «murchar o verdor dos estímulos ligados ao esforço e ao tempo em prol das esperanças e objetivos que formam o cabedal mais apreciável da vida», pode estar certo que você está diante da inconstância. __________________ FINGIDA Dissimulador. Aparentava ser o que não era. Vivia de aparências. Esse era o perfil daquele que um dia sofreu terrivelmente a ascendência dela. Ela era horrível. Até seu nome inspira rechaço. Não conheço alguém que se sinta bem em pronunciá-lo. Quem está sob seu comando deplorável nunca diz o que pensa ou sente. Não é veraz nem sincero. É um embusteiro. E não fica nisso. O absorvido por ela sente um prazer mórbido de enganar o outro em sua boa fé.
  • 50. 50 Os seus vassalos nunca conseguem edificar, isso é notório, nada permanente, «tanto em amizades quanto em feitos importantes da vida.» Olha, ela também como outras é encontrada na infância, e ali acha «cômodo meio para seu desenvolvimento nos ambientes pouco depurados, onde falta sempre o bom exemplo.» O que é dominado por ela é um fingido e com facilidade seduz ao mais incauto que cai em suas garras e cede «à sugestão de sua palavra.» Ela, em algumas pessoas não passa de «um recurso que usam ocasionalmente para granjear a simpatia ou o favor alheios.» Ela deve ser decididamente abandonada porque é inútil. Estamos desenhando aqui, com cores bem vivas, a hipocrisia. _________________________ INQUIRIDORA Um impulso instintivo o leva a atuar caprichosamente mantendo «a pessoa
  • 51. 51 sempre ávida de informação e atenta ao que menos deveria importar-lhe.» Ela quando exercia o seu domínio sobre ele, o conduzia à indiscrição e ao intrometimento. A sede de informação naquele envolvido por ela era doentio porque ele era capaz de lançar mão de qualquer recurso, sem ter em vista se é de todo lícito ou honesto. Quando ele procurava vigiar este, seguir aquele, perguntar, inquirir, escutar conversações, com o maior interesse ainda que fossem reservadas, revelava claramente que ela era o pivô desse seu comportamento suspeito e desagradável. Ele, nesse estado de submissão a ela, ocupava-se de todos, menos dele próprio. Abandoná-la se avizinhava como única medida que ele percebia para fugir à influência nefasta dela, porque de outras vezes tentou acalmá-la em seus impulsos e o efeito foi a sensação que sentiu de um efêmero deleite voltando ela, após alguns instantes, com forças redobradas e inoportunamente chamava-o às práticas libidinosas de antes.
  • 52. 52 Ela há de desaparecer por inanição, porque somente assim ele deixará de atender aos inoportunos chamados da curiosidade. ________________________ CRIAVA DEMÉRITO Ele se prezava e atribuía a si um talento invisível. Ela, em contrapartida, apossando-se dele, o tornava presunçoso e volúvel. Ele se aproximou dela ainda na infância e a atração mútua vem dessa época, porque ainda pequeno era alvo de adulações e lisonjas. Ela quando estava junto dele impedia que seus amigos se aproximassem e lhe acarretava desprestígio. Ele achava difícil suportar essa convivência adversa que lhe causava sérios prejuízos, mas para se livrar dela ele teria que estar disposto a emendar seu modo de ser, e isso não era muito fácil de se fazer. Ele não era obrigado a estar com ela por toda sua vida. Esse convívio não podia mais
  • 53. 53 continuar, para o seu próprio bem. Uma atitude tinha que ser tomada. Necessitava sair do estancamento em que vivia e se dispor decididamente a abandoná-la de vez de seu relacionamento, a fim de alcançar objetivos mais amplos para sua limitada vida. Para isso, faltava-lhe determinação e um pouco de empenho. Ela, ao contrário, ao lado dele, detestava a simplicidade que às vezes ele demonstrava no trato com os demais. Queria vê-lo sobre um pedestal envolto em méritos ilusórios. Ele, por sua vez, cada vez mais empenhado em afastá-la para sempre de si, passou a observá-la mais atentamente e surpreendê-la cada vez que intentava se manifestar. Com isso, a contemplava em toda sua fealdade, e isso aguçava nele a resolução agora inquebrantável de expulsar a fatuidade, tão indesejável hóspede. ___________________ DETERIORA Sua vontade ficava literalmente relaxada e via que seus bons propósitos estavam seriamente ameaçados, quando ela se achegava.
  • 54. 54 Quando ela o envolvia, havia nele instabilidade em seu pensar e sentir, manifestando abertamente uma inobjetável ausência de consideração para com sua própria vida. Ele, nesse estado de embriaguez, tinha grande dificuldade de cumprir com seus deveres, tanto físicos, como morais e os do espírito. Sentia-se, ao advertir sua presença, um certo retardo e abandono. Ela, como má conselheira, induzia-o «a trabalhar inoportunamente, com demora e sem pôr no que faz atenção nem cuidado.» Ele era muito prejudicado por essa má companhia, porque era constantemente levado a repetidos fracassos. Com ela, ele postergava tudo, «pelo prazer que lhe induz sua atitude despreocupada e irresponsável.» Ora, ninguém, em sã consciência tem que suportar o prejudicial predomínio da negligência. Isso é preciso ser dito aqui. __________________________
  • 55. 55 «LOCUS SUPLICI» Duro e contumaz ele era, caráter influenciado por aquela que não o deixava em paz. Ela, embora, aparentemente, saudável, conduzia-o à intransigência, endurecendo a sua região sensível. Ela submetia seus nobres sentimentos a um silêncio atroz. Sua fisionomia sofria também as nocivas influências de seu convívio. A situação criada por ela era tão desagradável que ele não conseguia cultivar sequer um sentimento de conciliação, porque se anulava pela força dessa convivência. Ela não conjugava o verbo abrandar em seus relacionamentos. Atrás dele outra atuava solapadamente aqui já desmascarada. Todos sabiam que «o excesso de zelo no desempenho de suas funções, sejam estas públicas ou privadas», denotava que ela estava por trás disso. Temos o exemplo daquele chefe de escritório, dominado por ela, que adotou a postura «ante o informe desfavorável sobre a conduta
  • 56. 56 de um de seus empregados, urgido pelo afã de aplicar-lhe um corretivo, não se detém em averiguações que comprovem a exatidão da versão recebida e, sem ver nem ouvir mais nada, sanciona o subordinado, vítima talvez de um erro ou, o que seria pior, de alguma calúnia.» Ela, como outras desclassificadas, anda em turma e, em suas andanças está acompanhada de sua irmã siamesa aqui, também, perfilada. Ela, impertinentemente, o obrigava a fiar unicamente em seu juízo, fazendo-o dissentir com frequência do juízo alheio. Nesse estado não «acede a considerar viáveis outras opiniões que não as próprias a respeito de uma questão.» Pensamentos construtivos não tinham chance nenhuma de agirem e se moverem com liberdade nele, quando no cumprimento de seus encargos diários, porque ela os paralisava. Saulo, em uma reunião de trabalho, quando várias pessoas procuravam elucidar um assunto, sob sua influência, pretendeu impor com certo absolutismo seus pontos de vista. Sua posição inflexível e nada conciliadora, não repara que, variando convenientemente o
  • 57. 57 enfoque, seu juízo sobre o que se estava considerando poderia mudar total ou parcialmente, pondo-se a tom com as demais opiniões. Ela é mesmo nociva, porque, o inabilitava, quando atuava em consequência dela, para «superar as limitações de seu juízo, condenando-o ao equívoco.» Ele se entregava docilmente a ela, em face de sua influência sutil. Essa sutileza é tamanha que ele ao reagir contra um ou outro de seus semelhantes aos quais tachava de rígidos, não se apercebia que o que via neles «não era mais que a própria rigidez.» Interessante que ele possuidor de belas qualidade as via empalidecidas em virtude de seu temperamento duro, influenciado por ela. Ele não mais podia com a própria intransigência fomentada por ela, que não lhe agradava e nem aos que com ele tratavam. Quem não quer ser amplo e compreensivo em toda a extensão da palavra? Então sugerimos que se liberte o quanto antes da opressão que sofre por causa de rigidez. ____________________
  • 58. 58 ENGANADORA Avesso à intenção de humilhar era o que ocultava ele quando sofria as pressões dela. Diminuir a estatura dos demais era seu maior deleite ao estar subjugado a ela. Ela o fazia insuportável diante do atrevimento e presunção que inveteradamente manifestava ao emitir seus pontos de vista ou dar soluções a problemas ou situações que não dominava. Ela o enganava abertamente ao fazê-lo «crer que possui dotes e prerrogativas consideráveis.» É a petulância «um dos piores recursos para impor um conceito de si mesmo, porque nessa forma ninguém o admite.» _________________________ PROPENSÕES: SEDUTORA Confiava piamente no que lhe era dito ou proposto, quando sofria a tentação dela. Não se detinha a discriminar e não se previnia
  • 59. 59 contra possíveis intenções ocultas no pensamento de outros. Em certas ocasiões, ela aparecia e ele se enfeitiçava ficando desguarnecido à mercê do embuste e, no fundo, era enubriado pela ambição. Ela se alimentava, em seu intento, do ócio e da tendência dele de se atrair pelo fácil, daquilo que não lhe custava qualquer esforço. Ele sonolento, incapaz de reagir era finalmente seduzido por ela e assim se deixava envolver, atraindo para si todas as consequências dessa atitude. «Não se entregar à ilusão e confiar mais em si mesmo do que nos outros» é a estratégia mais eficaz para neutralizar essa tendência ao engano. _______________________ «PUXA-SACO» Neuro carecia de méritos próprios, era inescrupuloso e para encobrir sua condição precária mostrava-se submisso aos seus superiores ou a outras pessoas de quem esperava algum benefício, valendo-se dela.
  • 60. 60 Caudilho, de outro lado, necessitava dela e a buscava para se ver elogiado e por mera especulação e conveniência. Ela não pode ser confundida «com a admiração, os gestos aprobatórios ou a emotiva gratidão que podem suscitar na alma dos seres as palavras, os pensamentos e as obras de uma pessoa.» Há os que são refratários a ela e não a recebem, era o que acontecia com Hermes, pessoa íntegra e que conquistara com o «próprio esforço um lugar de honra entre seus semelhantes.» O que busca a forma mais natural e agradável de se expressar, certamente, não atrairá para perto dela a sua presença repugnante. E quem consciente do «próprio valor» não anulará a influência dessa propensão a adular? ____________________ FÚTIL A falta de conteúdo e uma vida carente de incentivos superiores foi o que bastou para que ela se manifestasse na existência daquela pessoa vazia e angustiada.
  • 61. 61 Ela se sentia bem e atuava com intensidade junto aos que não pensam com seriedade e não têm um real conceito da vida e de seus valores. O influenciado por ela acredita «que o que entretém um instante é o que realmente importa.» Desligar-se dela voluntariamente e a tempo é o melhor que se pode fazer para não sofrer os prejuízos que ela pode lhe causar. Quem não quer deixar de «ser indiferente para ocupar um lugar de preferência na própria vida»? Nesse esforço «cada um encontrará, não duvidamos, incentivos de inestimável valor, que suprirão com eficácia aqueles outros que levam à frivolidade.» ________________________ DISFARCE Ele estava à beira da falência, mas ela o persuadia a fingir despreocupação diante de seu estado real de insolvência, com atitudes contrárias a sua realidade.
  • 62. 62 Ela o obrigava a viver de aparências, porque reinava na superficialidade. Ela se usava dele e tornava sua vida artificial e o situava fora da realidade. Ela era espert em desenvolver em sua vítima «a arte de ocultar difíceis situações pessoais, aparentando o contrário do que sucede.» É bom fazer aqui a ressalva de que «não cabe censurar aqui as pessoas que lançam mão destes recursos para evitar a deprimente situação de ter de confessar aos demais o transe que atravessam.» Fazer da dissimulação um hábito é um convite a se desconceituar. ______________________ DESCUMPRIDOR Quem abusava dela se dava mal. Alguns a usavam valendo-se de mentiras e outros, para «ocultarem a própria inoperância.» Ela, em suas atuações, «anda de braços dados com a irresponsabilidade». Muitas vezes quem a sustenta é a vaidade. Ela, com a chancela da audácia, se constitui num «meio para surpreender a boa fé do
  • 63. 63 próximo» em benefício do que está sob seu credenciamento. Euprom, um negociante, audaz, envolvido por ela, planejou um negócio enganoso e o difundiu para atrair os crédulos, que recorreram a ele sonhando em aumentar suas economias. Ela obrigava sua vítima a empenhar a palavra, comprometendo, dessa forma, sua vida futura. Quando sob o domínio dela, ele não conseguia cumprir com seus compromissos, era tachado de «desmemoriado» por todos que exigiam o seu cumprimento. Aqui estamos comentando o que acontece com quem se predispõe a prometer. __________________ FRUTO DA INCULCAÇÃO O adormecimento temporário da mente é o sintoma característico de quem está envolvido por ela, com efeitos danosos para a sua alma, ocorrendo a negação da cordura e do bom tino.
  • 64. 64 Ele sob o envolvimento dela não gostava de estudar e se expunha com facilidade ao engano. O dominado por ela se apegava a uma ideia e não conseguia se colocar numa posição ampla e sem preconceitos. Ela ao influenciá-lo desde a infância, criou-lhe um problema dos mais difíceis que deveria enfrentar quando adulto: «o problema da própria capacitação e experiência na condução da vida», especialmente no que diz respeito à sua parte moral e espiritual. Na verdade, nunca foi vantajoso para ele tê-la ao seu lado, porque ele se sentia inseguro diante de questões que envolviam inquietudes existenciais. A claudicação de sua inteligência era visível nele em virtude desse conluio. Sim. É justamente de quem estamos falando, da propensão a crer. ______________________ VOLÚVEL Quem padece de sua influência apresenta uma acentuada volubilidade.
  • 65. 65 Ele com sua característica imaginativa e tendente ao excesso de fantasia, encontrava nela uma companheira ideal e que o dominava totalmente. Ela o envolvia de tal forma que ele somente via «o fácil e o formoso de tudo quanto se reflete como projeto» Ela como num passe de magia o impedia de perceber a verdadeira face das coisas. Ao se entregar a ela, ele era «seduzido pelos artifícios da imaginação, cujo canto de sereia é o procursor do engano.» Ao ser afetado por ela, ele experimentava uma insegurança a cada vez que se afastava do real e positivo. Ela, efetivamente, era capaz de pôr em perigo o seu equilíbrio moral e material. Lembrei-me aqui daquela pessoa que alentada por ela na perspectiva fantasiosa de aumentar seus lucros os seus negócios, terminou por comprometer todos os seus bens e até, por fim, sua honra. Ela pode ser comparada «a essas efêmeras e diminutas mariposas que parecem nascer espontaneamente à volta de um foco
  • 66. 66 luminoso, pois, do mesmo modo que elas, morta uma surge outra, como se o homem necessitasse de semelhante engano para estimular sua vida.» Quem não consegue suportar as suas investidas é muitas vezes conduzido ao suicído, porque não conseguiram superar sua temerária aventura. Estamos falando aqui da ilusão que, «ao transgredir os cânones da realidade, expõe sempre a desenlaces pouco felizes.» ____________________ BAIXAS PAIXÕES Ele é levado à excitação quando está sob sua influência eminentemente instintiva e passional. Sob a influência dela sua vontade experimenta um relaxamento nocivo e se vê embriagado por coisas passageiras e efêmeras. Ele ao lado dela se deleitava com certas leituras libidinosas e conversas indecorosas, sem falar de que gostavam de música excitante e películas «luxuriosamente» cruas. Adamastor, sua vítima, arrebatado por sua influência avassaladora, chegou a abandonar
  • 67. 67 a família em «troca de uma vida ruidosa e desordenada.» Outro, sob sua nefasta influência, foi «sugestionado pelo jogo, se entregou a ele sem reparos de consciência, disposto a expor- se totalmente.» Há a história daquele que influenciado por ela, se destruiu e sacrificou seus mais caros afetos pelos prazeres que lhe proporcionou o álcool e, finalmente, a do outro que manchou sua reputação e honra «por uma vida econômica fácil e pródiga em luxos e prazeres.» Quem não quer neutralizar esta propensão ao deleite dos sentidos? ____________________ MISANTROPIA Ela apareceu em sua vida quando ele se via presa do ceticismo e da indiferença. Ele a procurou quando perdeu definitivamente a fé nas pessoas e em suas possibilidade. Alguns inibidos, de escassa capacidade, reservados e asperos, por caracteristicas são vitimados por ela.
  • 68. 68 Ela procura levar suas vítimas a se afastarem do convívio com os demais. O influenciado por ela é convidado a procurar um retiro psicológico e ficar sozinho. Com isso se torna estranho e intratável. «Sobram razões para pensar que quem se empenha em viver» assim é, «além de insociável, egoísta, pois não toma conhecimento das aflições e problemas da humanidade, em cujo contato está obrigado a viver por lei natural.» Não podemos de deixar que ela, a propensão ao isolamento, nos tire a grande prerrogativa de convivermos com os demais, porque é tão necessária e útil a todos «como a mobilidade para evitar o entorpecimento de seus membros». ___________________ SUPERESTIMAÇÃO O que se deixa dominar por ela tem a sua imaginação atuando descontroladamente. Quem se vê envolvido por ela agiganta o volume das coisas, seduzido, naturalmente, «pelo afã de impressionar, de assombrar, de chamar a atenção.»
  • 69. 69 Ele que se encontra sob sua influência «experimenta invariavelmente o desejo de ser acreditado e, quando o consegue, sente-se invadido pela emoção torpe e vulgar de um triunfo frívolo.» Todos que se vêem aprisionados pela tendência ao exagero querem paulatinamente afastá-la de seus arrebatos que comprometem negativamente o seu estado de ânimo. ___________________________ LIMITADO Ele invariavelmente, diante de um problema ou situação difícil que enfrentava, incentivado por ela, corria em busca de socorro, «livrando- se assim do esforço que a circunstância lhe exige», valendo-se, portanto, «da mente alheia, não da própria, para sair da situação.» «Sinal evidente de mediocridade, desde que, sob sua influência, o indivíduo espanta ou rechaça tudo o que lhe demanda um maior uso de suas energias volitivas e priva-se de exercitar a própria aptidão na prossecução de novos objetivos.»
  • 70. 70 Sua vida sob a tutela dessa companhia era rotineira, carente de aspirações e confiava ao acaso suas parcas conquistas. Ele, quando ela se fazia presente, experimentava uma inabilidade para resolver por si suas dificuldades e para procurar «maiores possibilidades de desenvolvimento na vida.» É lamentável dizer isso, mas «a propensão ao fácil tira força da vontade, porque a mantém pouco menos que imóvel, impedindo o homem em consequência, de forjar determinações que o conduzam a posições mais vantajosas.» _________________________ DESPREZADO Ele se mostrava incapaz, envolvido por ela, de «manter em constante atividade as faculdades da inteligência e o exercício dos pensamentos.» Ela criava nele um desprezo pela vida, como se cada dia vivido acentuasse um oculto rancor para com a própria pessoa. O vitimado por ela demonstra não ter apreço pela vida, porque não experimenta a alegria de viver.
  • 71. 71 Ela a propensão ao abandono que acabamos de considerar, manifesta o problema crucial da decadência moral que assola a humanidade. ___________________ INSIPIDEZ «A ela se lança levado pelo prurido de fazer- se prevalecer em qualquer tema que lhe dê motivo para sustentar seus pontos de vista.» Ela sempre o está convidando a se opor aos demais, com a finalidade de deixar mal o contendor. Geralmente o afetado por ela «procura criar objeções a qualquer raciocínio, por acertado que seja, usando todos os meios ao seu alcance para destacar ou fazer prevalecer o próprio, atitude que o particulariza como presunçoso e pouco considerado para com seus semelhantes.» Ela o fazia perder tempo. Tempo que poderia ser aproveitado em algo útil. Ela quando estava no comando fazia-o falar descontroladamente e se valer de «argumentos discursivos e sofísticos.»
  • 72. 72 Advertimos porém que «não se pode negar o caráter construtivo que tem a discussão - aqui tratada -, quando os que nela intervém procuram confirmar algum acerto ou se mostram permeáveis ao reconhecimento de um erro manifestado pela opinião contrária.» __________________ PROSTRAÇÃO Ele se sentia incapaz para enfrentar situações penosas. Não compreendia, por mais que tentasse, o que lhe sucedia e estava convicto de que as causas de seus infortúnios eram alheias a suas culpas. Para os bons observadores, ela estava se manifestando nele ao vê-lo nesse estado. Ela o procurava exato naqueles instantes em que ele sofria forte pressão de acontecimentos adversos. Ela presente não lhe oferecia qualquer perspectiva de reverdecer nele as esperanças e de manter vivo o anelo de um futuro melhor. Livrar-se o quanto antes dela era a palavra de ordem, porque nada pior do que a angustia que ela o fazia sentir pela vida, além de prostrá-lo na esterilidade.
  • 73. 73 Livre a alma do desalento, mal que cada um deve «afastar de si definitivamente.» ____________________ DESDITA Diante de dificuldades, problemas ou acontecimentos ingratos que deveria enfrentar lá estava ela. Ela muitas vezes vinha acompanhada por «um pensamento obsessivo, que lhe faz ver todos os seus males como irreparáveis e seus problemas impossíveis de resolver.» Ele não a resistia e se impacientava e se via inseguro e era atingido por um grande descontrole mental e, por fim explodia. Nesse ponto o afetado por ela acusava «um sensível debilitamento da vontade.» Ela quando estava envolvendo sua vida abatia o seu ânimo e quabrantava sua moral, deixando-o sem forças para transmitir a sua vida vigor e valentia. Tratamos nesse relato da propensão ao desespero. ________________
  • 74. 74 OCIOSIDADE Ele afetado por ela perdia-se em abstrações estéreis. Ela não permitia que ele desenvolvesse qualquer atividade mental consciente. Ele com ela ao seu lado vivia distraído. Ela tirava dele suas defesas, porque ela subtraia de sua observação múltiplos detalhes importantíssimos quando se tratava de tomar uma resolução, formar um juízo, extrair uma conclusão, decidir uma conduta. Ela o persuadia a «acolher com temerária ingenuidade qualquer versão que escuta desprevenido de seus riscos.» Outra não é a propensão de que estamos falando aqui, senão aquela à desatenção. __________________ TIRANA Ela se pronunciava através de uma violenta reação do ânimo. Predomina nele o descontrole mental. A pessoa dominada por ela não tem atitudes serenas e se mostra violenta e furiosa,
  • 75. 75 terminando por «afastar de si os semelhantes, fato que mostra às claras o agravamento do mal.» Ele sob a influência dela não se continha e permanecia à mercê de seus arrebatamentos. As consequências, sempre ingratas, da influência dela em seu temperamento, o obrigava a rever suas atitudes intempestivas e violentas e munido de uma forte força de vontade decidir afastá-la de seu convívio. «Livrar-se da ira é retirar do caminho um dos tantos suplícios internos que mantêm a vida em permanente angústia e contrariedade.» ______________________ ARTIFICIOSA Atraído pela parte artificiosa dela, ele preferia confiar em temerários desenlaces, que poucas vezes resutaram favoráveis. Impossibilitado de conquistar por seu méritos o que desejava, por flagrante incapacidade umas vezes e por desproporção entre as ambições e as aptidões para pô-las ao alcance, outras, ele se via envolvido por ela e
  • 76. 76 imaginava que poderia concretizar seus desejos, solucionar seus problemas ou converter-se da noite para o dia em privilegiado da sorte. Quem confia nela «põe nisto boa parte de especulação, pois tende a fazer o menos possível em favor de suas necessidades ou aspirações.» Ele em um determinado momento realizou uma operação comercial - orientado por ela - «sem prévio exame criterioso dos problemas que essas questões envolvem e sem assegurar-se da forma de enfrentar eventuais reveses». Em uma ocasião, ele empreendeu uma longa viagem e orientado mais uma vez por ela não colocou o seu veículo em condições para cumprir a jornada. E assim em outras circunstância de sua vida confiou nela piamente e, pretendeu «sair de uma enfermidade sem fazer de sua parte nada para dela se livrar»; adiantou ou comprometeu «valores, confiando em que haverão de se multiplicar prodigiosamente»; confiou «no jogo para remediar suas precárias economias.»
  • 77. 77 O certo é que ele, sob o fascínio dela, chegou a arriscar tudo sem pensar nas consequências. Quem não quer esperar tudo da própria capacidade? Então convém o mais cedo possível livrar-se da influência da propensão a confiar no acaso. _________________________ MALEDICÊNCIA Ela o desqualificava e quando estava junto dele se fazia acompanhar de outras más companhias de muito baixo nível. Em sua infância já convivia com ela e sua influência era tal nessa tenra idade que costumava censurar levianamente o que os outros diziam ou faziam. Ela o estimulava a por apelidos disparatadamente em seu coleguinhas, além de influenciá-lo em outras atitudes nocivas como: acusar, «sem reparos, seus irmãozinhos e companheiros de escola ou de brinquedo.» Ele, também na idade adulta, algumas vezes voltou a revê-la e teve com ela algum relacionamento que o levou a se deleitar com
  • 78. 78 «a murmuração, com a censura ou com a maledicência.» A pressão que ele sofria dela o fazia emitir um juízo sobre o semelhante com má intenção. Deve-se combater com grande tenacidade essa propensão ao vitupério aqui tratada. ____________________ DEPRIMENTE O afetado por ela se expõe «a malograr as prerrogativas naturais que o assistem, porque seu próprio mal afasta de si os estímulos necessários para torná-las efetivas.» Ela o deprimia e debilitava sua vontade. Persuadido por ela, ele se situava por momentos longe da realidade e manifestava a tendência a «ver tudo com o olhar obscurecido, talvez por recôndito despeito, e sua mente se povoava de tristes vaticínios que jamais se cumprem.» Ela o fazia apático e não mais sentia gosto pela vida. Tornava-o inepto e insensível aos estímulos que a vida «lhe oferece para que desfrute de seus bens com alegria.»
  • 79. 79 Ao lado dela o descontentamento tomou conta dele. Geralmente o dominado por ela «termina seus dias renegando seu destino, ainda quando tenha dependido só de seu esforço e determinação que esse destino lhe houvesse sido propício.» Essa é a propensão ao pessimismo. ________________________ DESENFREIO Aquele influenciado por ela «tende à desconsideração de toda norma ou princípio ético e sensível.» O que se vê atacado por essa tendência «não tem idéía clara a respeito da liberdade com que pretende reger-se, ou não sabe que liberdade significa também respeito, comedimento, dignidade, considerando-a tão somente quando tolera o abuso e o desenfreio.» O afetado por ela tem dificuldade de «defender sua vida contra a tremenda avalança de estímulos negativos da hora presente.»
  • 80. 80 Cuida-se aqui da propensão à licenciosidades. _______________________ INDOLÊNCIA Ele quando ela o envolve se vê indolente. Preocupações e responsabilidades são esquecidas. Ela tira dele «eficiência no estudo e no trabalho, porque o ser não persevera nem se esforça na atenção que tais atividades reclamam.» Ela o leva agir com ligeireza, despreocupação e irresponsabilidade. Interessante que alguns atingidos por ela são detentores de aptidões. Muitos a levam às costas da infância à maturidade. Ela o expõe «a sofrer consequências muito variadas, desde as que provêm de sua atuação nos meios que frequenta, traduzidas em demérito para sua pessoa, até aquelas que resultam de fatos mais graves e irreparáveis, por não ter levado
  • 81. 81 em conta detalhes ou não ter feito oportunamente aquilo que pudesse evitá-los.» Desterrar a propensão ao descuido é o que todos esperam, em face dos benefícios que isso pode trazer para a vida. _______________________ ÍNDICE CONTOS CURTOS, DEZ-CONTOS. (para ler duas vezes) 01 - INOPORTUNA E TEMERÁRIA 02 - INAMOLDÁVEL 03 - CAPRICHOSA 04 - BONECA INFLADA 04 - UFANOSO 05 - RAREZA CONTRADITÓRIA 06 - TRANSFORMISTA 07 - DE TEMPERAMENTO ÁSPERO 08 - OUSADIA É O QUE FALTA 09 - UM POUCO DE ARROGÂNCIA... 10 - «SUJEIRINHA» 11 - FALTA DE MEMÓRIA 12 - UMA INFLAÇÃO PERMANENTE 13 - ASAS DE CERA 14 - DESABRIDO 15 - OBSESSÃO 16 - QUE FRAQUEZA! 17 - INOPORTUNO
  • 82. 82 18 - ARREDIA À ORDEM 19 - POUCO AMISTOSA 20 - ALMA PEQUENA 21 - DESARRANJADA 22 - NADA SUAVE E DISSONANTE 23 - SEM MODERAÇÃO 24 - ABSENTISMO 25 - COMICHÃO 26 - CHARLA 27 - EXSUDAÇÃO MENTAL 28 - FORMAL 29 - FRENÉTICA 30 - ESTREITEZA 31 - NARCISO 32 - INSISTENTE 33 - ATORDOA E PARALISA 34 - DESUNE 35 - FINGIDA 36 - INQUIRIDORA 37 - CRIAVA DEMÉRITO 38 - DETERIORA 39 - «LOCUS SUPLICI» ____________________ PROPENSÕES: 01 - SEDUTORA 02 - «PUXA-SACO» 03 - FÚTIL 04 - DISFARCE 05 - DESCUMPRIDOR
  • 83. 83 06 - FRUTO DA INCULCAÇÃO 07 - VOLÚVEL 08 - BAIXAS PAIXÕES 09 - MISANTROPIA 10 - SUPERESTIMAÇÃO 11 - LIMITADO 12 - DESPREZADO 13 - INSIPIDEZ 14 - PROSTRAÇÃO 15 - DESDITA 16 - OCIOSIDADE 17 - TIRANA 18 - ARTIFICIOSA 19 - MALEDICÊNCIA 20 - DEPRIMENTE 21 - DESENFREIO 22 - INDOLÊNCIA NOTAS DO AUTOR Esse trabalho foi inspirado no livro DEFICIÊNCIAS E PROPENSÕES DO SER HUMANO, de Carlos Bernardo González Pecotche. Os trechos entre aspas são transcrições desse citado livro.