Um retrato da Cultura Brasileira da Era Vargas ao Regime Militar
1. UM RETRATO DA CULTURA DO BRAISL DA ERA
VARGAS AO REGIME MILITAR
A Cultura na Era Vargas
Apesar do forte controle do DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), o Brasil
conheceu uma intensa vida artística e cultura nos anos 1930 e 1940. O rádio, com seus programas
de auditórios, musicais e novelas, tornou-se um dos divertimentos preferidos da população. O
Repórter Esso e o programa oficial, A Hora do Brasil, eram responsáveis pelas notícias do país e
do mundo. O segundo foi usado insistentemente na propaganda e na veiculação das ideias do
regime. Além disso, o rádio representou um importante veículo para a divulgação da música
popular brasileira. Cantores como Orlando Silva, Francisco Alves, Vicente Celestino, Carmem
Miranda, Emilinha Borba, Marlene e muitos outros se popularizaram graças às ondas do rádio.
A valorização do samba deu-se em virtude do rádio, dos desfiles oficiais das escolas e dos
bailes nos clubes. Dorival Caymmi passou a ser reconhecido nacionalmente. Ary Barroso também
fez sucesso. A Rádio Nacional colocou no ar uma das futuras paixões nacionais: a novela.
Na literatura, importantes obras foram lançadas, tais como “Vidas Secas”, de Graciliano
Ramos; “A estrela sobe”, de Marques Rebelo; “Perto do coração selvagem”, de Clarice Lispector; e
“Terras do sem fim”, de Jorge Amado.
O arquiteto Oscar Niemeyer, cujo projeto arquitetônico mais famoso é Brasília, colocou em
prática suas ideias inovadoras com a construção do Conjunto da Pampulha, em Belo Horizonte,
contratada pelo então prefeito Juscelino Kubitschek.
Em São Paulo, o recém-construído estádio do Pacaembu ficou superlotado para a
apresentação de um dos espetáculos mais populares do país: o futebol. O teatro de revista, com
suas vedetes, e as salas de cinema, com as musas de Hollywood e do cinema nacional,
completavam a gama de entretenimento dos principais centros urbanos.
O INC (Instituto Nacional do Cinema), órgão criado pelo governo Vargas, obrigou a
apresentação de pelo menos um filme nacional por ano nas salas de projeção, o que contribuiu
para o nascimento de companhias como a Atlântida e a Cinédia.
A Cultura na República Populista (1946-1964)
O período populista foi rico em manifestações culturais. Uma das características da
época foi a politização dos debates sobre cultura e da própria produção cultural.
O Centro Popular de Cultura (CPC), nascido na União Nacional dos Estudantes,
por exemplo, discutia a relação entre sociedade, cultura e política. Na ótica que acabou
prevalecendo no Centro, toda produção cultural deveria estar afinada com as propostas
políticas revolucionárias, do contrário era considerada alienada e inconsequente. A cultura
a serviço da revolução agindo como agente conscientizador das massas. O “engajamento”
da arte na ação revolucionária foi particularmente intenso no teatro, através do Teatro de
Arena.
O Cinema Novo, principalmente as obras de Glauber Rocha, retratou criticamente
a situação de miséria material e cultural da população brasileira.
Na música, a revolução estética representada pela bossa-nova, da época de
Juscelino, teve continuidade com o tropicalismo, incorporando elementos da música pop
internacional.
Após 1968, o Regime Militar endureceu a repressão e estreitou a vigilância sobre a
produção cultural.
2. A Cultura dos Anos 60 e 70
As manifestações culturais dos anos 60 e 70 refletiram as diferentes fases
conflituosas dessas épocas.
O cinema brasileiro nas décadas de 60, diferente da década de 50 que produzia
filmes à imagem do modelo hollywoodiano, produziram filmes como “O Pagador de
Promessas” e “O Cangaceiro”, reconhecidos internacionalmente.
Foi também nos anos 60 que um grupo de jovens intelectuais-cineastas
começaram a discutir um novo caminho estético e político para retratar os problemas do
Brasil. Nasceu desta forma o Cinema Novo. Diretores como Nelson Pereira dos Santos
(Vidas Secas), Rui Guerra (Os Fuzis), e, principalmente, Glauber Rocha (Deus e o Diabo
na Terra do Sol, O Santo Guerreiro Contra o Dragão da Maldade, Terra em Transe – este
último que representou uma proposta tropicalista para o cinema brasileiro) reconhecidos
internacionalmente, utilizaram-se de manifestações da nossa cultura popular e nacional,
muitas vezes de forma alegórica, como base para a elaboração de suas obras que
denunciavam as nossas desigualdades sociais e ressaltavam as nossas especificidades
culturais. O Cinema Novo trazia o lema: uma ideia na cabeça e uma câmara na mão.
Em 1962, a União Nacional dos estudantes (UNE) criou o Centro Popular de
Cultura (CPC), que se propunha entender a oposição cultural entre um Brasil atrasado
(agrário) e um Brasil moderno (industrializado). Esse movimento exerceu grande influência
sobre jovens universitários que se “convertiam” em artistas e músicos. Nascia assim o
conceito de arte engajada politicamente. A arte deveria ser uma arma política para
combater o poder burguês.
Essa concepção influenciou o teatro surgindo o movimento do Teatro de Arena
(“Arena conta Zumbi” e “Morte e Vida Severina”) com Augusto Boal, Gianfrancesco
Guarnieri (autor de “Eles não usam Black tie”) e Oduwaldo Vianna Filho; o Teatro Opinião,
tendo a frente o diretor José Celso Martinez; o Grupo Opinião que promovia espetáculos
musicais politicamente engajados, protestando contra o regime militar. Na mesma estava a
música de protesto, na qual se destacaram nomes como Chico Buarque de Holanda, Edu
Lobo, Geraldo Vandré entre outros.
A Música Popular Brasileira na verdade já vinha se transformando desde a
passagem dos anos 50 para os anos 60. Refletindo o processo de urbanização e
modernização, nascia o gênero, mundialmente conhecido, da Bossa Nova. Esse gênero
era fruto da produção de jovens da classe média urbana do Rio de Janeiro. Eles cantavam
sua realidade, próxima de pequenos problemas existenciais e amorosos, afastando-se de
temas tradicionais da música popular como a malandragem, próprios do samba do morro.
Era a vez dos banquinhos, cantinhos e violões.
Praticamente ao mesmo tempo nasceu o movimento conhecido como Jovem
Guarda que, com artistas como Roberto Carlos, Wanderléia e Erasmo Carlos, repetiam de
forma fiel, aqui, o que acontecia com o rock dos Beatles na Inglaterra. O Iê, Iê, Iê, como
ficou conhecido o gênero, não tinha nenhum comprometimento político.
No entanto, foi no fim dos anos 60 e começo dos anos 70 que a MPB sofreu uma
transformação estética marcante. Trata-se do chamado movimento Tropicalista
(representado por Caetano Veloso, Gilberto Gil, Gal Costa, Tom Zé, Os Mutantes (grupo
do qual fazia parte Rita Lee) e outros; que emprestava elementos vindos da cultura pop
americana e misturava-os com a tradição da vanguarda, vinda do movimento da Semana
de Arte Moderna (tentativa de retomar os princípios antropofágicos de Oswald de Andrade)
somada à poesia concretista, dos irmãos Campos e as letras de Torquato Neto. Esse
movimento expôs, sem preconceito, todas as influências da MPB, de Luís Gonzaga a
Vicente Celestino. O tropicalismo digeriu e recriou todas as possibilidades oferecidas pela
música brasileira e internacional. Os artistas que participaram do tropicalismo queriam
entender o país em que viviam e comunicar-se com o povo, mas de um modo diferente
3. daquele proposto pelo CPC da UNE. Nesse aspecto, toda essa atividade intelectual e
artística estavam mescladas de política e os principais artistas acabaram sendo presos e
exilados.
A música brasileira dos anos 60 e 70 não viveu apenas da Jovem Guarda e do
Tropicalismo. Os Festivais da TV Record também empolgaram as plateias e abriram
espaço para artistas como Chico Buarque de Holanda, Elis Regina, Gilberto Gil, Jair
Rodrigues, Edu Lobo, Carlos Lira, Caetano Veloso e muitos outros. Outro espaço
importante para a música brasileira foi o programa O Fino da Bossa, apresentado também
na TV Record e que mostrava o melhor do samba e da Bossa Nova.
Concluindo: “Em meio ao período da ditadura militar, em que imperava a censura
aos meios de comunicação de massa e a repressão aos opositores do regime, o contexto
histórico, artístico e cultural é bastante rico e criativo com o aparecimento de diversas
manifestações.(...) Poucas décadas foram tão criativas – e ao mesmo tempo tão marcadas
pela repressão – como a década de 1960. Em todo o planeta, os jovens protestaram contra
um mundo burocratizado e vazio de conteúdo. E, valendo-se das mais diferentes formas de
manifestação, procuraram recriar outros laços sociais, outras razões para ficarem juntos e
outros signos (sinais) de reconhecimento”.(Myriam Becho & Patrícia R. Braick. História
das cavernas ao Terceiro Milênio. Ed. Moderna.)