A cultura do awareness e a vanguarda das agências digitais
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comunicação
NEGÓCIOS
A vanguarda do instinto
de sobrevivência
Por IGOR PUGA *
1. A cultura do awareness. Agência de
propaganda é um negócio alicerçado sobre a lembrança. Pouco se produz aqui e no
mundo que não tenha como premissa o critério de sucesso ponderado pelo awareness.
Publicitário bom é o que tem a técnica e/ou
talento de impactar alguém e proporcionar
que essa mensagem perdure. Isso, em parte, preserva o maior legado da nossa profissão, que é a criatividade. Justo e funcional,
apesar de bastante subjetivo.
2. A cultura do flight. Nada é mais publicitário que uma campanha. Aquele trabalho com prazo de validade, data de início e
encerramento. Um intervalo de tempo determinado, muitas vezes escolhido cirurgicamente, baseado em critérios sazonais
dos mais variados. Existe uma lógica limítrofe quando se planeja uma campanha, é
quase um catalisador artificial para cumprir
alguma meta trimestral de anunciante. Não
que não possam ser inspiradoras e engajadoras, mas pensando no consumidor atual
e no mercado anunciante mais complexo
são no mínimo ineficientes e obsoletas como modelo de empenho de investimento.
3. A cultura da execução terceirizada.
Não menos previsível e sintomático é como
o mercado publicitário terceirizou o processo de produção. Num ambiente onde áudio e
vídeo dominam as decisões, nunca faltaram
produtoras capazes de materializar textos,
roteiros e ideias em produtos finais à altura do que criativos e planejadores recomendam aos seus clientes. A parte nociva e oculta
desse vencedor hábito de trabalho é que ele
6 JAN 2014
DIVULGAÇÃO/CAROLINE BITTENCOURT
Polêmicas envolvendo agências
digitais não são novas em nosso mercado. Antes do desfecho
atual que questiona a longevidade e sua própria razão de existir, passamos
por momentos igualmente confusos sobre
o protagonismo das ditas digitais, a euforia
de suas (supostas) inovadoras realizações,
o recorrente questionamento de seu papel
meramente tático e, portanto, inviável como ponto focal dos anunciantes.
Entre poucas certezas, a única aparentemente intocável é que as agências digitais
acabam sendo mais ágeis e rápidas na transformação de seus próprios métodos e estruturas. Se isso será suficiente para mantê-las
como negócios sustentáveis em médio-longo
prazo é difícil de afirmar, mas seu DNA beta — oriundo da própria história do mundo
digital — é uma fonte de referência importante para todo mercado de comunicação.
Há quatro pilares muito sólidos da propaganda que as agências digitais têm tentado mudar gradativamente nos últimos anos.
blinda boa parte das agências da responsabilidade do nível e controle de qualidade do
produto final. É como se orçamento e prazo
fossem os verdadeiros detentores da capacidade de uma entrega qualitativa. Agência de
propaganda virou escritório de arquitetura,
focado em fazer plantas e croquis.
4. A cultura da remuneração fixa. Oriundos de um modelo secular de comissionamento, agências de propaganda ainda usam
o parâmetro da porcentagem de ganho como
referência da saúde de seus próprios balanços.
É bem verdade que há uma enorme parcela
de empresas com remuneração pautada em
hora/homem que permite contratos por fee.
Mas o vínculo com a nomenclatura da palavra agenciar é profunda, tanto que volume e
escala pautam a ponderação do tamanho das
estruturas que justificam esses fees. Muda-se
o método de valoração, mas tenta-se atingir o
mesmo objetivo quantitativo final de receita.
E as agências digitais com isso?
No mundo digital é recorrente o produto
publicitário ser pouco visível e aparentar não
ter valor agregado. É tentador o tema da Big
Data, mas quando é preciso ilustrar exemplos
práticos o desfecho é frustrante. Não há nada menos sexy que duplicar o índice de abertura de um e-mail ou triplicar a clicagem de
um banner sem nenhum artifício de criação.
Alavancar resultados de geração de cadastros ou vendas por mero e inteligente uso de
informações de comportamento e hábitos de
uma audiência e a consequente clusterização disso é conversa divertida só para quem
Performance é
um trabalho
introspectivo,
contínuo e de
bastidores. Não
ganha prêmios, não
chama atenção,
mas é escalável e
gera resultados
comerciais quase
imediatos
gosta de CRM. Performance é um trabalho
introspectivo, contínuo e de bastidores. Não
ganha prêmios, não chama a atenção, mas é
escalável e gera resultados comerciais quase
imediatos. O reconhecimento dos anunciantes é latente e sustenta boa parte das agências
digitais no Brasil e no mundo.
Agências 360 têm hábito distorcido quando abordadas sobre práticas de performance
e controle de ROI. Tendem a achar que esse
é trabalho para agências de marketing direto ou enxergam a compra programática como algo que deve ser conduzido pelos cargos
mais baixos, commoditizando a atividade. O
foco continua no awareness: views nos vídeos
para internet, números de fãs e seguidores em
redes sociais, além de algum engajamento.
Mas as agências digitais não sobrevivem
apenas do oportunismo de agarrarem esse
segmento pouco atraente da comunicação
de performance. A consequência direta é que
quando se trabalha pela geração de negócios
de forma mais direta e imediata, faz menos
sentido que o processo se dê por flights sa
zonais. Bancos ofertam seus produtos diariamente durante todo o ano, fabricantes de
eletrônicos também. Isso desencadeia uma
gestão dos meios digitais perene e contínua,
que pouco consegue ser alinhada à logística
criada em torno das campanhas sazonais de
outros meios de comunicação. Daí vem a dificuldade evidente de uma agência tradicional otimizar seu fluxo de trabalho em prol
de um digital orientado para performance.
Num escopo de trabalho voltado a resultados mais imediatos e aferíveis, a passagem
para remuneração variável é muito mais natural. Como há métricas quantitativas disponíveis em tempo real, não falta motivo para
cumplicidade nos dividendos gerados desses
resultados. É um estímulo para as agências e
o fortalecimento de uma relação custo benefício mais digna para anunciantes.
E, por fim, há a inversão da lógica da terceirização — agências digitais entendem que
boa parte do processo criativo envolve, e muito, a execução. O profissional de tecnologia é
parte fundamental no processo criativo, pois
domina elementos que são até mais úteis antes de uma recomendação do que durante o
processo de materialização. O mesmo vale
quando se trata de conteúdo, lembrando que
na web o especialista na geração de conteúdo precisa e deve estar dentro das estruturas
e não ser um consultor esporádico. A riqueza oriunda do trabalho conjunto com esses
perfis de engenharia e jornalismo é contaminante e muitas vezes proporciona aquela máxima tão desejada: fazer propaganda
que nem parece propaganda.
* Igor Puga é sócio da ID, agência digital
controlada pelo grupo Omnicom