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Misérias morais da imprensa brasileira
Flavio Farah*
Introdução
O presente texto contém críticas à imprensa brasileira. Por essa razão, é conveniente que eu faça, de
início, alguns esclarecimentos, para evitar mal-entendidos:
1) Sou democrata. Isto significa que sou partidário: a) do princípio da soberania popular; b) da for-
ma republicana de Estado;1
c) do regime representativo; d) do sufrágio universal, com pluralida-
de de candidatos e de partidos; e) da temporariedade dos mandatos eletivos, com limitação do
direito de reeleição; f) da separação dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário; g) da igual-
dade de todos perante a lei; h) da limitação das prerrogativas dos governantes; i) da existência
de um conjunto de direitos e garantias individuais e coletivos, tais como os relacionados no arti-
go 5º da Constituição Federal; j) da proteção dos direitos das minorias.
2) Também sou partidário: a) da valorização do trabalho humano; b) da livre iniciativa; c) da justi-
ça social; d) da propriedade privada; e) da função social da propriedade; f) da livre concorrência;
g) da defesa do consumidor; h) da redução das desigualdades regionais e sociais; i) da busca do
pleno emprego; j) da reforma do Estado; k) da Ética.
3) Sou partidário da liberdade de Imprensa. Isto significa que não aceito o controle externo dos ór-
gãos de comunicação. Não obstante, defendo o direito de se criticar jornalistas e órgãos jornalís-
ticos, bem como aceito que a Justiça intervenha em disputas relativas ao assunto, quando houver
conflito entre os direitos previstos nos incisos IV e X do artigo 5º da Constituição Federal.
Este texto contém críticas específicas a órgãos de imprensa específicos, bem como questionamentos
sobre aspectos específicos do funcionamento da Imprensa em geral. Essas críticas não significam
uma condenação genérica a qualquer órgão de imprensa, muito menos uma condenação à Imprensa
livre como instituição social.
Feitas essas ressalvas, passo aos questionamentos.
A perigosa mistura de informação com opinião
A revista Veja possui o epíteto “revista semanal de informação”, que lhe foi atribuído por seu cria-
dor, o falecido jornalista Roberto Civita, presidente do grupo Abril. Desde o primeiro número da
revista, esse qualificativo aparecia impresso logo abaixo do nome “Veja”, na seção de expediente.
Embora o epíteto tenha sido suprimido a partir da edição 1.265, de 9 de dezembro de 1992, Civita
continuou a referir-se a seu semanário desse modo, como por exemplo, em suas memórias, cujo re-
sumo foi publicado na edição 2.324, de 5 de junho de 2013.
O qualificativo “revista semanal de informação” sugere que Veja praticaria exclusivamente os gêne-
ros jornalísticos informativos, quais sejam, nota, notícia, reportagem e entrevista, deixando de lado
ou minimizando os gêneros opinativos: editorial, comentário, artigo, resenha/crítica, coluna, carta,
crônica. Não é, porém, o que acontece. A revista Veja inaugurou, no Brasil, um novo gênero jorna-
lístico: a reportagem opinativa. Para se entender em que consiste esse novo gênero textual do jor-
nalismo e qual o seu significado, é conveniente relembrar os conceitos de fato, opinião, reportagem
e texto opinativo.
Fato. Fato é algo que tem existência objetiva, isto é, algo cuja existência independe da pessoa que
o menciona. Os fatos podem ser demonstrados e não estão sujeitos a contestação. No campo jorna-
lístico, fato é aquilo que aconteceu. Os fatos representam a verdade, a realidade da vida.
Opinião. Opinião é a avaliação dos fatos por meio de um ponto de vista. Cada pessoa avalia um
fato influenciada por seus valores, crenças e experiências individuais, criando sua própria opinião.
Ao contrário dos fatos, uma opinião nunca será uma verdade absoluta, pois pessoas diferentes terão
pontos de vista divergentes sobre o mesmo evento. As opiniões podem ser expressas de forma isola-
da – como aquelas que expressam interesses, preferências ou gostos de um indivíduo – ou estar fun-
damentadas em argumentos. Todavia, mesmo que uma opinião seja alicerçada em um raciocínio ló-
gico coerente, outros indivíduos poderão construir raciocínios diversos para chegar a conclusões di-
ferentes e até opostas sobre o mesmo fato.
Reportagem. Reportagem é o relato ampliado de um acontecimento. A reportagem vai muito além
da notícia, que consiste na simples narração de um acontecimento. A notícia geralmente é escrita a
partir das informações enviadas para as redações dos órgãos de imprensa pelas agencias noticiosas
ou por outras fontes, ao passo que, na reportagem, o jornalista vai até o local para apurar os fatos.
Além de uma descrição dos acontecimentos, geralmente a reportagem contém:
 Detalhes dos fatos;
 Declarações dos envolvidos;
 Depoimentos de testemunhas e de fontes especializadas;
 Dados estatísticos;
 Fotografias.
Em adição aos elementos acima mencionados, é comum que a reportagem contenha também uma
interpretação dos fatos. Interpretar um fato significa acrescentar-lhe três dimensões: 1) suas causas,
origens ou antecedentes; 2) as circunstâncias em que o fato ocorreu, isto é, seu contexto social ge-
ral; 3) suas possíveis consequências, implicações, perspectivas ou desdobramentos. A interpretação
visa dar significado e sentido às ocorrências relatadas sem emitir uma opinião, mas fornecendo ao
leitor elementos suficientes para que ele próprio crie seu ponto de vista sobre os acontecimentos.
Texto opinativo. O texto opinativo recebe esse nome porque seu autor emite uma opinião sobre o
assunto em pauta, ou seja, formula um juizo de valor emitindo uma avaliação subjetiva que qualifi-
ca o acontecimento como bom ou mau, desejável ou indesejável, expressando um sentimento de
aceitação ou de rejeição em relação a ele. O texto opinativo tem por finalidade influenciar e conven-
cer o leitor, buscando sua adesão aos pontos de vista nele defendidos.
Um texto opinativo digno do nome, isto é, um texto opinativo que não seja meramente um panfleto
de propaganda, não pode conter observações superficiais, teses padronizadas ou opiniões gratuitas,
tampouco limitar-se a expressar sentimentos de surpresa, admiração ou indignação. O verdadeiro
texto opinativo contém um raciocínio lógico apoiado em argumentos consistentes que justifiquem
as teses defendidas pelo autor. Esses argumentos podem ser dados estatísticos, exemplos, pesquisas,
fatos comprováveis, citações ou depoimentos de especialistas, ou ainda comparações entre fatos, si-
tuações, épocas ou lugares diferentes.
Temos então que, idealmente, uma reportagem opinativa seria aquela que contém os principais ele-
mentos da reportagem, combinados às opiniões e ao raciocínio lógico típicos do texto opinativo.
Com base nesses conceitos, concluimos que Veja não é uma revista semanal de informação, mas
sim, uma revista semanal de informação e opinião. Nos jornais, a informação contida nas notícias
mantém-se separada da opinião, que vem expressa nos editoriais, ao passo que, nas reportagens opi-
nativas de Veja e de outras revistas semanais, a informação aparece misturada à opinião do autor da
matéria. A principal consequência desse embaralhamento é uma dificuldade muito maior do leitor
para identificar os fatos e separá-los das opiniões de quem escreve. Neste ponto, contudo, pode-se
perguntar: por que devemos nos preocupar com isso? Em uma reportagem opinativa, qual a impor-
tância de se identificar claramente o que é fato e o que é opinião? A resposta exige um entendimen-
to sobre a razão de ser da Imprensa.
Em uma sociedade democrática, a missão da Imprensa compõe-se de duas grandes tarefas: primei-
ro, noticiar os acontecimentos, mantendo o público informado sobre os fatos. Essa função informa-
tiva, porém, não se esgota no puro e simples relato dos acontecimentos, mas se estende à sua análi-
se e interpretação, para tornar compreensíveis os aspectos mais complexos da realidade. A função
informativa também pressupõe a fiscalização e a investigação relativas à atuação dos agentes públi-
cos e dos agentes privados que com eles se relacionam.
A segunda grande tarefa da Imprensa é atuar como formadora da opinião pública. Nesse mister, a
Imprensa, ao emitir opinião sobre os acontecimentos, presta serviço essencial, difundindo conheci-
mentos e contribuindo para a formação do senso crítico dos membros da sociedade, exercendo fun-
ção educativa. Dentro do papel de formador de opinião, insere-se também a atuação como agente
mobilizador, defendendo certas causas e mobilizando pessoas a agirem em favor destas.
Quando se fala sobre a missão da Imprensa, todavia, não se pode esquecer que estamos tratando de
uma instituição social, ou seja, a Imprensa constitui-se de um conjunto de organizações destinadas
a satisfazer necessidades sociais. A sociedade está de acordo com a existência da Imprensa porque
a considera benéfica ao corpo social. Esse é o fundamento moral de sua existência. As organizações
jornalísticas são autorizadas a funcionar pela sociedade e operam sob formas permitidas pela socie-
dade. Isto significa que a Imprensa não existe por direito próprio, mas sim, porque a sociedade de-
seja que exista. Como instituição social, a finalidade da Imprensa é beneficiar a sociedade, defen-
dendo seus interesses.
Por outro lado, as organizações jornalísticas, em sua grande maioria, constituem-se como empresas,
ou seja, como organizações econômicas que dependem de seus próprios meios para sobreviver. Tão
logo uma empresa é constituída, sua principal preocupação passa a ser a própria sobrevivência. As
empresas jornalísticas concorrem entre si para angariar leitores e anunciantes. Assim, quando um
órgão de Imprensa defende valores como a democracia, a propriedade privada ou a livre iniciativa
em nome do interesse público, esse órgão está defendendo também, indiretamente, sua própria so-
brevivência, isto é, seus interesses particulares. Esses interesses, porém, devem ser considerados le-
gítimos porque, primeiro, a sociedade deseja que as empresas jornalísticas sobrevivam; segundo,
porque não se pode exigir que uma empresa não lute pela própria sobrevivência, não se pode espe-
rar que uma organização econômica assista passivamente ao próprio desaparecimento.
O problema surge quando os órgãos de imprensa rompem os limites morais. Muitas vezes, na ânsia
de defender valores como os mencionados acima, ou movidos por sentimentos menos nobres; para
obter prestígio para si e/ou para sua organização, ou até mesmo para obter vantagens ou benefícios
indevidos, dirigentes, editores ou repórteres de entidades jornalísticas atuam de forma antiética, ela-
borando e publicando reportagens viciadas ou ofendendo a honra das pessoas. Reportagens viciadas
são aquelas que contêm raciocínios falsos, contradições, incoerências, generalizações indevidas,
opiniões com aparência de fatos, opiniões sem argumentos, exageros, distorções, insinuações ou pu-
ra invenção dos fatos, acusações sem provas, insinuações ou perguntas feitas com acentuação mali-
ciosa, frases com duplo sentido (meias-verdades) ou frases retiradas do contexto em que foram ditas
para alterar seu sentido. Em tais condições, a não diferenciação entre fato e opinião torna mais difí-
cil que o leitor perceba os vícios das reportagens opinativas.
Uma reportagem viciada
Exemplo de reportagem viciada, que confunde em vez de esclarecer, e que induz o leitor ao erro
por meio de raciocínios pretensamente lógicos, é aquela que foi publicada pela revista Veja sob o
título “Espionagem no porto”, e que leva o seguinte subtítulo: “Disfarçados de portuários, quatro
agentes da Abin – o serviço secreto do governo – foram presos sob suspeita de bisbilhotar a vida
do governador Eduardo Campos, pré-candidato à Presidência da República”.2
A matéria informa que os agentes, disfarçados de portuários, estavam no estacionamento do Porto
de Suape, no Recife, quando foram abordados por seguranças. De acordo com a reportagem, “Apre-
sentaram documentos falsos e se disseram operários. Acionada logo depois, a PM entrou em cena.
Diante dos policiais, os espiões admitiram que eram agentes da Abin, que estavam cumprindo mis-
são sigilosa e pediram que não fossem feitos registros oficiais da detenção.”
Primeiro questionamento. Refere-se a esta frase constante do subtítulo da reportagem: “... presos
sob suspeita de bisbilhotar a vida do governador ...”. O inciso LXI do art. 5º da Constituição Fede-
ral estabelece que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem judicial (mandado de
prisão). A reportagem não menciona nenhum mandado de prisão – que normalmente é cumprido
por policiais civis – mas cita a presença de policiais militares no local, levando à conclusão de que
os agentes foram presos por estes. O caso, portanto, seria de flagrante delito. Teriam os agentes sido
presos por (art. 307 do Código Penal) falsa identidade? Ou por (art. 304 do Código Penal) uso de
documento falso? Se a razão foi o cometimento de um desses crimes, ou de ambos, então a prisão
teria sido legal, caso contrário, os policiais teriam prendido ilegalmente os agentes. Em qualquer hi-
pótese, porém, conclui-se que a frase entre aspas mencionada no início deste parágrafo – tão absur-
da que se torna ridícula, mas poderosa em seus efeitos sobre o leitor desatento – não tem nenhuma
relação com a verdadeira causa da prisão dos agentes, tendo sido fabricada pelos autores da reporta-
gem com o objetivo de incutir no público a ideia de que o governo está usando a ABIN para violar,
com fins políticos, a vida privada do governador de Pernambuco. Essa, provavelmente, é a razão
pela qual o texto silencia sobre a legalidade da prisão. A esse respeito, reportagem posterior informa
que os agentes foram detidos e interrogados durante mais de duas horas por um coronel da Polícia
Militar.3
Ocorre que o interrogatório de civis presos é de competência da polícia civil, devendo o
preso ser entregue à autoridade competente, ou seja, ao delegado de polícia.4
A PM, portanto, não
poderia ter interrogado os agentes, muito menos mantê-los detidos durante mais de duas horas.
Segundo questionamento. Diz respeito à Lei 9.883/99, que instituiu o Sistema Brasileiro de Inteli-
gência e criou a ABIN – Agência Brasileira de Inteligência. Em seu art. 3º, parágrafo único, e em
seu art. 4º, inciso I, a lei estabelece que as atividades de inteligência poderão fazer uso de técnicas e
meios sigilosos, e que compete à ABIN planejar e executar ações, inclusive sigilosas, relativas à ob-
tenção e análise de dados para a produção de conhecimentos destinados a assessorar o Presidente da
República. Em tais condições, será que a autorização de uso do sigilo, constante da Lei 9.883/99,
implica permissão aos agentes da ABIN para adotar identidade falsa e usar documentos falsos? Se a
resposta for afirmativa, então os agentes não cometeram crime. Se for negativa, por que os agentes
não foram levados à presença do delegado para lavratura do auto de prisão em flagrante?
Terceiro questionamento. Como podem os autores da reportagem afirmar, com absoluta certeza e
desfaçatez, que o objetivo dos agentes era “bisbilhotar” a vida – vida particular, supõe-se – do go-
vernador de Pernambuco? Como poderiam esses agentes fazer tal coisa indo ao Porto de Suape –
um local público – e lá permanecendo? A certa altura, os repórteres afirmam que os agentes “pre-
tendiam mapear eventuais relações espúrias entre Campos e o setor privado.” Logo a seguir, porém,
desmentem-se a si próprios, declarando que “Não se sabe se esse era exatamente o objetivo dos es-
piões”.
Quarto questionamento. A reportagem contém a informação de que um dos agentes é vereador em
Jaboatão dos Guararapes. Os autores então concluem: “Nada mais natural. Edmilson Silva tem uma
dupla jornada de trabalho. (...) Durante o dia, como vereador, é um defensor das liberdades. Às es-
curas, como araponga, une-se aos colegas de repartição para violá-las.” A que liberdades os repórte-
res se referem? Às liberdades públicas? Quais liberdades foram violadas pelos agentes? Liberdades
de quem? Como essas liberdades foram violadas? Parece que os repórteres se aproveitaram do pro-
vável desconhecimento do público sobre o termo jurídico “liberdades” para dar a aparência de ver-
dade incontestável a uma afirmativa genérica feita sem base e, por isso mesmo, leviana. Aliás, será
que os próprios jornalistas conhecem ao certo o significado desse termo?
Quinto questionamento. No subtítulo, os autores da reportagem se referem aos detidos como
“agentes”, termo técnico neutro que designa uma das categorias de servidores públicos da ABIN.
Daí por diante, os agentes são qualificados em várias passagens do texto como “espiões”, palavra
que sugere uma atividade ilícita. No início da reportagem, a missão dos agentes é dita “clandestina”,
termo cujo sentido aponta para uma ação ilegal. A reportagem, porém, não consegue demonstrar
qual a ilicitude cometida pelos agentes.
Conclusão. Os fatos são os seguintes: disfarçados de portuários, quatro agentes da Abin, que porta-
vam documentos falsos, foram detidos pela PM no porto de Suape, no Recife, e interrogados por
mais de duas horas por um coronel da corporação. O resto da reportagem é fantasia. O texto man-
tém-se no terreno das insinuações, jamais mostrando uma relação lógica entre a conduta dos agentes
e a tese central da reportagem, de que eles estavam investigando a vida privada do governador
Eduardo Campos.
Ofensas gratuitas
Folha de São Paulo. O juiz André Pinto, da 36ª Vara Cível do Rio de Janeiro, condenou a jornalis-
ta Eliane Cantanhêde e o jornal Folha de S. Paulo a pagar R$ 35 mil de indenização por danos mo-
rais ao juiz Luiz Roberto Ayoub, titular da 1ª Vara Empresarial. No texto “O lado podre da hipocri-
sia”, Eliane Cantanhêde, que assina uma coluna diária na Folha, reproduz uma afirmação que atri-
bui à ministra-chefe da Casa Civil: “O governo não vai se submeter à decisão de um juiz de quinta”,
referindo-se ao desempenho de Ayoub no processo de falência e recuperação judicial da Varig. Em
seguida, a colunista conclui: “Já que a lei não vale nada e o juiz é „de quinta‟, dá-se um jeito na lei e
no juiz. Assim, o juiz Luiz Roberto Ayoub aproximou-se do governo e parou de contrariar o presi-
dente, o compadre do presidente e a ministra. Abandonou o „falso moralismo‟ e passou a contrariar
a lei”. O juiz Ayoub considerou a afirmação como uma acusação de prevaricação e parcialidade.
O juiz André Pinto rejeitou os argumentos da defesa. “Não se trata de mera opinião proferida com
base na liberdade de expressão, como pretendem fazer crer as rés, mas de grave acusação contra o
magistrado, onde lhe é imputada a prática de ato ilícito e de cunho extremamente lesivo à personali-
dade”, sentenciou.5
Posteriormente, a 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro,
por unanimidade, não só confirmou a decisão de 1ª instância como aumentou o valor da indenização
para R$ 100 mil.6
A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, rejeitou o recurso dos
réus.7
A seguir, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, negou seguimento
ao recurso extraordinário interposto pelos condenados e, ato contínuo, rejeitou o agravo (pedido de
revisão) interposto contra sua própria decisão.8
Veja. A revista Veja publicou reportagem sob o título “Distribuição de mentiras”, sobre a crise pro-
vocada pelos boatos de extinção do Bolsa-Família. No fim do texto, está escrito o seguinte: “A pre-
sidente Dilma já apelidou um grupo de auxiliares mais próximos (...) de “três porquinhos”. Desta
vez, foram os patetas (grifo adicionado) que roubaram a cena.”9
Roberto Civita: um homem ingênuo?
A edição 2.324, de 5 de junho de 2013, da revista Veja, traz uma matéria intitulada “Uma vida de-
dicada à verdade”, de autoria de Eurípedes Alcântara, na qual o jornalista discorre sobre o legado de
Roberto Civita, falecido presidente do grupo Abril e criador da revista Veja. Outra matéria na mes-
ma edição, sob a epígrafe “Memórias de um editor”, contém um resumo das memórias inacabadas
de Civita.
Segundo Alcântara, uma das frases de Civita era: “A espécie humana nunca decepciona”, e essa era
“uma das poucas searas onde ele permitia que seu inquebrantável otimismo desse lugar a um conti-
do desprezo pelo próximo”.10
A frase irônica de Civita expressa o pessimismo de quem espera sem-
pre pelo pior, traduz a decepção de seu autor com a humanidade em geral, com o ser humano, que
estaria sempre pronto a executar algum ato abominável. Outro pensamento de Civita, segundo Al-
cântara: “Os jornalistas não levam nenhuma vantagem em mentir. Isso acaba logo ou abrevia a car-
reira deles. (...) Então existe sempre a possibilidade de que um jornalista nosso, bem selecionado,
bem treinado e bem pago, esteja com a maior parte da verdade”.11
Será que Civita, portador de um “contido desprezo pelo próximo”, acreditava mesmo que os jorna-
listas constituem uma classe à parte, constituida de santidades completamente imunes às misérias
humanas? Será possível que ele ignorasse que a História registra numerosos casos de fraudes come-
tidas por profissionais de Imprensa? Vejamos alguns desses casos.
1) Em maio de 2003, o jornal The New York Times publicou matéria relatando as fraudes que o
jornalista Jayson Blair cometera durante os quatro anos em que trabalhou no matutino. Blair foi
acusado de inventar histórias, plagiar textos de outros jornais e falsificar declarações de entre-
vistados. Blair foi demitido e as 600 reportagens de sua autoria foram analisadas por uma equipe
especialmente formada com essa missão.12
2) Em 2004, o jornal USA Today revelou que o ex-repórter do jornal Jack Kelley tinha inventado
pelo menos oito grandes reportagens. Uma comissão foi formada para ler e apurar mais de
720 matérias escritas por ele no período de 1993 a 2003, o que resultou na constatação de que
pelo menos oito reportagens eram “fabricadas”. Uma delas, inclusive, foi finalista do famoso
prêmio Pulitzer de jornalismo.13
3) O tablóide dominical britânico News of the World, de 168 anos de vida e tiragem de 2,8 milhões
de exemplares a cada domingo, foi fechado em julho de 2011 pela empresa que o controlava de-
vido ao envolvimento do jornal em um escândalo de escutas telefônicas ilegais. As acusações de
que funcionários do jornal estariam envolvidos em interceptação ilegal de comunicações telefô-
nicas começaram a surgir em 2006. No ano seguinte, a Justiça condenou à prisão Clive Good-
man, correspondente para assuntos da família real, bem como o investigador Glenn Mulcaire,
funcionário do jornal, devido ao grampo ilegal de telefones de membros da realeza.14
4) A jornalista Janet Cooke, quando era repórter do jornal Washington Post, devolveu o prêmio
Pulitzer, que ganhara em 1981 por uma reportagem sobre um garoto viciado em heroína, depois
de confessar que a história tinha sido inventada e que o personagem não existia de fato.15
Será possível que Civita realmente acreditasse que todos, absolutamente todos os jornalistas da edi-
tora Abril, apenas pelo fato de serem “bem selecionados, bem treinados e bem pagos”, eram e são
anjos de candura, inocência e retidão?
Logo depois que Blair foi desmascarado, o New York Times criou uma comissão para recomendar
medidas destinadas a garantir a qualidade e integridade do trabalho na redação. Uma delas foi a ve-
rificação aleatória de artigos que contêm citações de fontes anônimas. A checagem é feita pelo edi-
tor de qualidade – cargo também criado após o episódio Jayson Blair – com o objetivo de verificar
se algum editor responsável pelo repórter que assina o texto conhece a identidade da fonte utiliza-
da.16
Na mesma época, no jornal Folha de São Paulo, a então editora-executiva, Eleonora de Luce-
na, também por causa do escândalo no jornal norte-americano, distribuiu um comunicado interno
aos jornalistas com o seguinte teor: “O emprego de informações „off the record‟ está banalizado no
jornal. É preciso redobrar os cuidados na apuração e os controles na edição de notícias obtidas desse
modo. Sempre que solicitados, repórteres devem comunicar a origem dessas informações aos seus
superiores hierárquicos. Estes, conhecendo a identidade das fontes que são mantidas no anonimato,
devem cuidar da manutenção do sigilo.(...)”17
Que providências Civita, por sua vez, tomou para reduzir o risco de ocorrência de fraudes jornalís-
ticas nos veículos da Editora Abril? Que medidas ele tomou para implantar uma Auditoria Edito-
rial? Aparentemente nenhuma, porque ele acreditava que “Os jornalistas não levam nenhuma vanta-
gem em mentir.” De acordo com Alcântara, Civita “costumava discutir o encaminhamento das ma-
térias principais de Veja, mas nunca pedia para ler uma reportagem antes de sua publicação”.18
Exi-
gia tão somente dos editores da revista que seu trabalho expressasse a “busca honesta da verdade”.19
Será que ele, pelo menos, verificava periodicamente se a verdade estava de fato sendo buscada, e
buscada honestamente? Ou considerava desnecessária essa verificação? A esse respeito, vale relatar
um caso em que Veja foi condenada a pagar indenização por danos morais.
Segundo notícia de 07.06.13, a revista Veja e as jornalistas Mônica Weinberg e Camila Pereira de-
vem indenizar o professor de História Paulo Fioravanti, de Porto Alegre, em R$ 80 mil por danos
morais. A determinação é da 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que
confirmou sentença de primeiro grau.20
Partes da sentença de origem são reproduzidas a seguir:21
“(...) O exame dos elementos produzidos na causa põe em evidência o abuso pelos réus da liberdade
de expressão e de crítica, considerado, para esse efeito, o próprio teor da publicação supostamente
veiculadora de lesão ao patrimônio moral do demandante.
“A matéria intitulada ironicamente como “Prontos para o Século XIX”, publicada na Revista VEJA,
edição nº 2074, de 20 de agosto de 2008, conforme se vê das fls. (...) da publicação de fl. (...), en-
quadra o autor como sendo professor que incute ideologias anacrônicas e preconceitos esquerdistas
nos alunos, com a justificativa de “incentivar a cidadania” (transcrevendo a expressão na forma em
que foi empregada).
“Fato incontroverso que houve autorização da escola para que o repórter Marcos Todeschini acom-
panhasse 50 minutos de aula ministrada pelo autor, gravada na ocasião (...), e retornasse, um ano
depois, para tirar fotografias do autor a fim de acompanhar a reportagem.
“O que acontece é que o requerente foi surpreendido com os termos da publicação, após acreditar
estar cedendo a aula de história dada para uma turma da 5ª serie para que a revista elaborasse uma
matéria positiva sobre o ensino desenvolvido na escola.
“Ao contrário, o autor foi qualificado como professor de história do Colégio Anchieta, instituição
de ensino que figura entre as melhores do país, conforme sustentou a própria reportagem à fl. (...) da
publicação, como exemplo de „tendência prevalecente entre professores brasileiros de esquerdizar a
cabeça das crianças.‟
“O que a publicação deixou de registrar é que o requerente ministrava aula sobre a Revolução In-
dustrial, século XVIII, estabelecendo relações entre o passado e o presente, a fim de estimular a
atenção e o raciocínio dos alunos. Forçou, a reportagem, ao afirmar a ideologia política do autor e
estereotipá-lo como esquerdista por conta de seu método de ensino, desconsiderando os seus mais
de 15 anos como professor e a tradição da escola, transpondo a fronteira da veracidade e da infor-
mação.
“Ainda, inverídica a afirmação constante na reportagem de que a disciplina acabou da maneira rela-
tada. Extrai-se da gravação juntada à fl. (...), que a aula foi baseada em um questionário respondido
pelos alunos, em que o professor, ora autor, comentava as respostas.
“A repercussão da matéria foi tamanha, que a direção do Colégio Anchieta divulgou nota de repú-
dio à reportagem nos jornais Zero Hora, Correio do Povo, O Sul e Jornal do Comércio (...). O mes-
mo foi feito pelo Sindicato dos Professores do Rio Grande do Sul (...), pais (...) e alunos da institui-
ção de ensino (...), que se solidarizaram à causa do autor.
“Da mesma forma, depreende-se do depoimento das testemunhas Alexandre José Vitalini Paranhos
(...), Ana Cláudia Klein Ferreira (...) e Clorinda Elsa da Silva Biegler (...), pertencentes ao corpo do-
cente do Colégio Anchieta, que os termos da reportagem são incompatíveis com a retidão profissio-
nal e pessoal do autor, bem como os danos causados aos seus direitos personalíssimos.
“Assim, tenho que o conteúdo da matéria jornalística, além de ácido, áspero e duro, evidencia a prá-
tica ilícita contra a honra subjetiva do ofendido. A reportagem, a partir do momento que qualifica o
autor como esquerdista, com viés, de resto, pejorativo, sem a autorização do demandante, extrapola
os limites da liberdade de imprensa.
“(...) No caso, a informação buscada foi distorcida e manipulada, sendo colocada na reportagem
de forma descontextualizada, objetivando unicamente corroborar a ideia lançada da “esquerdiza-
ção do ensino” que também seria praticada pelo demandante. (grifo adicionado) A revista está
pressupondo que os pais são omissos e não sabem o que os filhos estão aprendendo na escola. Da
mesma forma, a publicação é agressiva ao afirmar que os professores levam mais a sério a doutrina-
ção esquerdista do que o ensino das matérias em classe, induzindo o leitor a entender que o autor
deve ser incluido como este tipo de profissional.
“A crítica jornalística, desse modo, configura abuso de direito constitucional, na medida em que os
réus, na condição de formadores de opinião, repassaram à sociedade informação manipulada para
o bem interesse da publicação. O interesse social, no caso, foi sobrepujado pelo interesse pessoal,
financeiro ou político da revista, que envolveu o autor, sem o seu consentimento. (grifo adicionado)
“Tenho que a publicação, na medida em que qualifica o autor como esquerdista e questiona o seu
método de ensino, é meramente especulativa e inexata. O que mais causa espanto é o fato de os
réus terem escondido tanto da escola, como do requerente, o verdadeiro intuito da colheita de in-
formações, que colocam em cheque a personalidade e os anos de profissão desempenhado pelo
autor junto à comunidade.” (grifo adicionado)
Considerando os termos da sentença acima transcritos, na reportagem intitulada “Prontos para o
Século XIX”, pela qual Veja foi condenada em primeira e segunda instâncias, será que houve uma
“busca honesta da verdade”?
Afinal, seria Roberto Civita um homem dissimulado ou simplesmente ingênuo? Minha tendência
seria enquadrá-lo na primeira opção, não fossem duas afirmativas perdidas no meio de suas memó-
rias. A primeira: “Sempre gostei disso: aperto de mão, a palavra dada, o fio de bigode, olhos nos
olhos”.22
A segunda: “Havia uma preponderância da esquerda, dentro da redação, e alguns jornalis-
tas da equipe chegaram a ter militância política clandestina, com vida dupla, naqueles chamados
anos de chumbo. Sinceramente, eu não percebi. Só me dei conta mais tarde. Vou admitir: eu não me
considerava uma pessoa politicamente ingênua, mas eu era”.23
Minha conclusão é que Roberto Civita era um homem ingênuo, tão inacreditavelmente ingênuo que
jamais poderia ter ocupado os cargos que ocupou.
A imprensa que omite informações e manipula os leitores
Introdução
A imprensa tem condenado pessoas de modo sumário, considerando-as como criminosas, sem lhes
dar o direito de defesa e violando o princípio da presunção de inocência inscrito na Constituição.
O modo como a imprensa tem feito isso é pela divulgação de informações que constam dos inquéri-
tos policiais, informações que consistem em supostos indícios, de supostos crimes, cometidos por
supostos suspeitos. Essas pessoas são consideradas culpadas antes mesmo que tenham sido conde-
nadas, julgadas ou sequer denunciadas à Justiça pelo promotor. A imprensa costuma divulgar esse
tipo de informação com grande destaque, em forma de manchete. Posteriormente, se confirmada a
inocência das pessoas citadas nas investigações, nada será noticiado a respeito, e se for, será – no
caso dos jornais – por meio de uma pequena nota de canto de página que dificilmente será notada
pelo leitor. Quando essa divulgação é feita pelas revistas semanais e o “suspeito” protesta contra a
violação de seus direitos ou contra acusações que considera falsas ou deturpadas, seu protesto ou
não é publicado ou é publicado na seção “dos leitores”, onde tem maior probabilidade de passar
despercebido porque a seção é pouco lida e porque o protesto se mistura às outras mensagens, pu-
blicadas em letra miuda pela revista. É assim que os órgãos de imprensa violam repetidamente um
dos direitos constitucionais do cidadão, o direito de resposta proporcional à ofensa.24
Minha tese é que a divulgação de informações sobre pessoas citadas em inquéritos policiais viola
o princípio constitucional da presunção de inocência. A razão está na natureza do inquérito policial,
que vale examinar. Inquérito policial é uma investigação realizada pela polícia civil com dois obje-
tivos: a) confirmar a materialidade do crime, isto é, verificar se houve realmente um crime e quais
suas circunstâncias, e b) buscar indícios de autoria, ou seja, identificar o possível autor, para que o
promotor público possa denunciá-lo ao juiz. O inquérito policial não faz parte do processo penal
nem é conduzido pelo Poder Judiciário. Trata-se de um procedimento administrativo informativo
que antecede a ação penal propriamente dita, e que é realizado por um órgão do Poder Executivo.
No inquérito policial, não existe acusado, pois, a princípio, não se sabe sequer se houve um crime, e
ainda que o delegado de polícia conclua que houve um delito, esse será apenas o parecer da autori-
dade policial, pois quem decide se o fato constitui crime não é o delegado de polícia, nem mesmo o
promotor, mas apenas o juiz. E mesmo que o juiz decida que houve crime, ele poderá rejeitar a indi-
cação feita pela autoridade policial em relação a quem é o possível autor. Assim, antes que o juiz
diga que houve um crime e que há indícios de que fulano de tal é o possível autor, legalmente não
há nada. Somente se o juiz aceitar a denúncia do promotor é que haverá um processo e um acusado.
Em tais condições, para se observar o princípio da presunção de inocência durante o inquérito poli-
cial, não se deve tratar ninguém como réu, nem mesmo como suspeito ou investigado, porque o in-
quérito não é instaurado para investigar quem quer que seja, isto é, não existe inquérito policial
contra uma pessoa, mas sim, para apurar a ocorrência de um possível delito. Se as pessoas citadas
em um inquérito devem ser consideradas inocentes até que haja uma decisão definitiva da Justiça,
então elas estão na mesma condição de todas as outras, e seu nome não deveria ser divulgado em
nenhuma hipótese, salvo para fins de captura em caso de decretação da prisão preventiva.
O caso
O caso relatado a seguir é exemplo de como um órgão de imprensa – o jornal O Estado de São Pau-
lo – e os jornalistas autores das respectivas matérias, a pretexto de zelar pelo interesse público:
 Trataram como criminoso uma pessoa citada em inquérito policial;
 Omitiram informações do público;
 Desobedeceram o princípio do pluralismo jornalístico;
 Desobedeceram o princípio do interesse público na divulgação de informações;
 Violaram a Constituição e a Lei;
 Violaram o Código de Ética e Autorregulamentação da ANJ – Associação Nacional de Jornais;
 Violaram o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros.
O caso em questão é a operação Faktor, anteriormente denominada Boi Barrica, nome dado a uma
investigação da Polícia Federal. O personagem central, um empresário, tem dois fatores contra si: é
filho de um conhecido político e tem contra si vários supostos indícios apurados durante o inquérito
policial. Escolhi o caso desse empresário exatamente porque não tenho nada a favor dele. Trata-se
de Fernando Sarney, filho de José Sarney, hoje ex-senador, ex-governador do Maranhão, ex-presi-
dente do Senado e ex-Presidente da República.
O que “O Estado” noticiou
1) Gravação liga Sarney a atos secretos. (22.07.09) Uma sequencia de diálogos gravados pela
Polícia Federal com autorização judicial, durante a Operação Boi Barrica, revela a prática de
nepotismo explícito pela família Sarney no Senado e amarra o presidente da Casa, José Sarney
(PMDB-AP), ao ex-diretor-geral Agaciel Maia na prestação de favores concedidos por meio de
atos secretos.25
2) Desembargador censura ‘O Estado’ no caso Sarney. (31.07.09) O desembargador Dácio
Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), proibiu o jornal “O
Estado de São Paulo” de publicar reportagens que contenham informações da Operação Faktor,
mais conhecida como Boi Barrica. O recurso judicial, que pôs o jornal sob censura, foi
apresentado pelo empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney
(PMDB-AP).26
3) Nunca faria campanha para censurar, diz Fernando Sarney. (03.08.09) Em nota enviada à
imprensa nesta segunda-feira, 3, Fernando Sarney disse que nunca fez uma campanha para cen-
surar meios de comunicação. (...) Leia na íntegra a nota enviada por Fernando Sarney: “(...)
sempre defendi a liberdade de imprensa e a livre manifestação de opinião, e jamais promoveria
ou apoiaria qualquer iniciativa que pudesse ser interpretada como censura. É lamentável, por-
tanto, que uma decisão judicial que simplesmente exige o respeito a garantias constitucionais
inerentes a todo cidadão – intimidade, privacidade, honra e imagem – esteja sendo apresentada
como forma de censura à imprensa, que vem divulgando, ilicitamente, informações sob sigilo
expressamente imposto pelo Judiciário. Ao recorrer à Justiça contra o que considero uma injus-
tiça e uma violência contra mim e a minha família, apenas defendi direitos que me são assegu-
rados pela Constituição. Considerar o uso de um direito legítimo como uma maneira de impor
censura à imprensa não passa de tentativa de distorcer os fatos. Atenciosamente, Fernando
Sarney”27
4) Polícia Federal indicia filho de Sarney por lavagem de dinheiro. (16.07.09) Filho do presi-
dente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o empresário Fernando (...) Sarney foi interrogado
nesta quarta-feira, 15, por pelo menos seis horas na Superintendência da Polícia Federal do Ma-
ranhão, em São Luís, no âmbito da Operação Boi Barrica. Saiu indiciado por lavagem de dinhei-
ro, tráfico de influência e formação de quadrilha.28
5) Desembargador nega liminar do ‘Estadão’ contra censura. (13.08.09) O desembargador
Waldir Leôncio Cordeiro Lopes Júnior, da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito
Federal (TJ-DF), rejeitou nesta quinta-feira, 13, um pedido de liminar feito pelo jornal „O Esta-
do de São Paulo‟ para que fosse liberada a publicação de reportagens sobre Fernando Sarney, fi-
lho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), no âmbito da Operação Boi Barrica. Lo-
pes Júnior, invocando prudência, deixou para deliberar acerca do mandado apenas depois que
receber informações do próprio Dácio Vieira e o parecer da Procuradoria de Justiça. “Malgrado
o inconformismo do impetrante com a decisão judicial impugnada, está sendo observado o devi-
do processo de direito”, assinalou o desembargador. Segundo ele, “o rito do mandado de segu-
rança é célere, por isso é mais prudente que se aguarde para deferir ou não a providência reque-
rida no momento do julgamento do writ (mandado), quando a questão estará madura”.29
6) Recurso contra censura ao ‘Estado’ chega ao Supremo. (18.11.09) A batalha do Estado para
se desvencilhar da mordaça que o cala há 110 dias chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Por meio de um recurso denominado reclamação (...), protocolado ontem de manhã na mais alta
instância do Judiciário, a defesa do jornal ataca (...) o decreto de censura baixado pelo desem-
bargador Dácio Vieira, da 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF).
Para (...) [o advogado de „O Estado‟], o TJ-DF “desacatou” o histórico julgamento do STF que
culminou com a revogação da Lei de Imprensa, do regime autoritário. (...)”.30
7) STF rejeita recurso e censura ao ‘Estado’ continua em vigor. (10.12.09) O Supremo
Tribunal Federal (STF), por 6 votos a 3, arquivou nesta quinta-feira, 10, a reclamação em que os
advogados do Estado pediam o fim da proibição ao jornal de publicar reportagens sobre a Ope-
ração Boi Barrica, que investigou o empresário Fernando Sarney (...). Com isso, fica mantida a
censura imposta no fim de julho pelo desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do
Distrito Federal e Territórios (TJ-DF). De acordo com a ala do Supremo vencedora no julga-
mento desta quinta, a decisão judicial do TJ-DF de censurar o jornal baseou-se na Constituição e
na legislação que trata de interceptações telefônicas. Portanto, não haveria referência à Lei de
Imprensa e ao julgamento de abril do STF. Por esse entendimento, não caberia reclamação ao
Supremo por suposto desrespeito à decisão da corte.31
8) Polícia Federal indicia Fernando Sarney pelo crime de evasão de divisas. (07.05.10) A Polí-
cia Federal indiciou nesta sexta-feira, 7, o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do
Senado, José Sarney (PMDB-AP), pelo crime de evasão de divisas. Ano passado, ele já havia si-
do indiciado por formação de quadrilha, gestão de instituição financeira irregular, falsidade
ideológica e lavagem de dinheiro.32
9) STJ anula provas contra filho de Sarney. (17.09.11) O Superior Tribunal de Justiça (STJ)
anulou as provas colhidas durante a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, que investigou
suspeitas de crimes cometidos por integrantes da família do presidente do Senado, José Sarney
(PMDB-AP). Os ministros da 6ª Turma do STJ consideraram ilegais interceptações telefônicas
feitas durante as investigações. (...) Com a anulação das interceptações ficam comprometidas
outras provas obtidas posteriormente, resultantes de quebras de sigilo bancário e fiscal. (...) Com
as escutas e informações sobre movimentação financeira, a PF abriu cinco inquéritos e apontou
indícios de tráfico de influência no governo federal, formação de quadrilha, desvio e lavagem de
dinheiro.33
O que “O Estado” não noticiou e o que ficou oculto
1) Em 1º de novembro de 2006, o COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras do Mi-
nistério da Fazenda – enviou à Polícia Federal um RIF – Relatório de Inteligência Financeira –
dando conta de movimentação financeira atípica nas contas-correntes bancárias de algumas pes-
soas físicas e jurídicas, entre elas Fernando Sarney. No ofício que acompanhou o Relatório, o
COAF destacou que a) movimentações financeiras atípicas não podem, necessariamente, ser
consideradas ilícitas (grifo adicionado), b) as informações constantes do RIF são classificadas
como confidenciais, nos termos da Lei 8.159/91, ficando o destinatário responsável pela sua pre-
servação, c) não se recomenda a inclusão do RIF em inquéritos ou processos. A partir dessa co-
municação, no dia 22 de novembro a Polícia Federal instaurou o Inquérito nº 001/2007, a fim de
investigar as referidas movimentações.
2) Em setembro de 2007, a TV Mirante, de propriedade de Fernando Sarney, recebeu, de um audi-
tor da Receita Federal, um Termo de Intimação Fiscal. Foi estabelecido um prazo de cinco dias
para que o empresário fornecesse os Livros Diário e Razão do ano calendário de 2006 com exer-
cício em 2007 e os documentos relativos aos fatos contábeis registrados nos livros da emissora
de televisão, retransmissora da Rede Globo no Maranhão.
3) Após o pedido da Receita Federal, os advogados do empresário impetraram mandado de segu-
rança junto à 1ª Vara da Justiça Federal do Maranhão para ter acesso ao inquérito policial em
que Fernando Sarney, na condição de sócio da TV Mirante, faria parte. Na petição, os advoga-
dos destacaram que “há fundadas suspeitas de que o sigilo de dados do paciente, seus sócios e
advogados esteja sendo violado pela Polícia Federal (...)” (grifo adicionado) Embora o art. 7º,
inciso XIV, da Lei 8.906/94, estabeleça que o advogado tem direito de examinar autos de inqué-
rito em qualquer repartição policial, o pedido foi negado em primeiro grau e também pelo Tribu-
nal Regional Federal da 1ª Região, sob a justificativa de que o processo estava em plena tramita-
ção e que o sigilo era necessário para o sucesso das investigações. Contra essas decisões, a defe-
sa de Fernando Sarney impetrou habeas-corpus no STJ. Em 19.12.07, o ministro Napoleão Nu-
nes concedeu liminar para que os advogados tivessem acesso ao inquérito e, em 10.09.08, o mi-
nistro Paulo Gallotti confirmou a concessão do habeas-corpus.
4) Agentes públicos permitiram que o jornal „O Estado de São Paulo‟ tivesse acesso ao conteudo
das comunicações telefônicas interceptadas com autorização judicial. Ocorre que, de acordo
com o art. 8º da Lei 9.296/96, é obrigatória a preservação do sigilo “das diligências, gravações e
transcrições respectivas.” Por outro lado, de acordo com o art. 151, § 1º, inciso II, do Código Pe-
nal, a divulgação indevida de comunicações telefônicas é crime punido com detenção de um a
seis meses, ou multa. Em outras palavras, agentes públicos em tese cometeram um crime ao per-
mitir a divulgação do conteudo de comunicações telefônicas de Fernando Sarney interceptadas
com autorização judicial.
5) O „Estado‟ deixou de noticiar que: a) Fernando Sarney, por intermédio de seu advogado, pediu
providências ao Ministério Público Federal do Maranhão para apurar o vazamento dos diálogos
da Operação Boi Barrica;34
b) O corregedor-geral da Justiça Federal deu 48 horas para que o
corregedor do Tribunal Regional Federal da 1ª Região informasse quais as providências tomadas
em relação ao vazamento de conversas telefônicas no inquérito relativo à Boi Barrica.35
O jornal
não noticiou esses fatos porque, se o fizesse, ficaria claro que o „Estado‟ foi beneficiário e cúm-
plice de uma grave irregularidade, para não dizer de um crime.
6) O „Estado‟ violou o princípio da pluralidade jornalística, segundo o qual todo órgão de imprensa
tem o dever de assegurar a seu público o acesso a todas as interpretações e opiniões a respeito de
um mesmo fato, ainda que opostas.36
O jornal violou esse princípio ao divulgar apenas depoi-
mentos de personalidades e entidades que condenavam a “censura” ao „Estado‟ na operação Boi
Barrica, no intuito de fazer o público crer, erroneamente, que essa condenação era unânime.37, 38
Em contraste, outros órgãos de comunicação publicaram depoimentos que põem por terra a falsa
unanimidade que o „Estado‟ tentou criar. Por exemplo, o site Consultor Jurídico publicou o arti-
go intitulado “Censura do jornal O Estado de S. Paulo é discutível”, de autoria de Francisco Ce-
sar Pinheiro Rodrigues, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo.39
O jor-
nal Folha de São Paulo, por sua vez, publicou o artigo intitulado “Coletar provas sem driblar a
Constituição”, de Antônio Carlos de Almeida Castro, advogado criminalista. Subtítulo do artigo:
“Quando a PF [Polícia Federal] e o MP [Ministério Público] praticam abusos, acatados por jui-
zes voluntariosos, ocorre muito mais do que uma injustiça contra o cidadão investigado”.40
Ao
fazer pouco caso do pluralismo jornalístico, o „Estado‟ violou o preceito nº 5 do Código de Ética
e Autorregulamentação da ANJ – Associação Nacional de Jornais.41
7) Os jornalistas do „Estado‟ violaram os seguintes preceitos do Código de Ética dos Jornalistas
Brasileiros:
“Art. 6º É dever do jornalista:
(...)
VIII – respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão;
(...)
X – defender os princípios constitucionais e legais, base do estado democrático de direito;
(...)
Art 9º A presunção de inocência é um dos fundamentos da atividade jornalística.” 42
8) A notícia “Gravação liga Sarney a atos secretos” se inicia com a frase “Uma sequencia de diálo-
gos gravados pela Polícia Federal com autorização judicial ...”. A frase foi fabricada com o obje-
tivo de induzir o público a concluir que era legítima não apenas a interceptação das comunica-
ções telefônicas mas também a divulgação do respectivo conteúdo. O „Estado‟ redigiu esta no-
tícia com a finalidade de ocultar a ilegalidade – da qual foi beneficiário e cúmplice – da divulga-
ção das comunicações telefônicas interceptadas com autorização judicial.
9) A notícia “Polícia Federal indicia filho de Sarney por lavagem de dinheiro” contém a informa-
ção de que “Fernando (...) Sarney foi interrogado (...) por pelo menos seis horas na Superinten-
dência da Polícia Federal do Maranhão, em São Luís (...)”. Se ele depôs durante seis horas, com
certeza apresentou argumentos de defesa e provavelmente documentos que demonstrassem sua
inocência. É de se supor que o „Estado‟ tinha acesso ao depoimento. O jornal, porém, não publi-
cou uma linha sequer sobre a defesa apresentada por Fernando Sarney.
10)A Lei 9.296/96 assim dispõe:
“(...)
Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer
das seguintes hipóteses:
I – não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;
(...)”
O significado do dispositivo reproduzido acima é que a interceptação de comunicações telefôni-
cas não pode ser a primeira diligência em uma investigação criminal. Primeiro, é preciso inves-
tigar. Se forem descobertas evidências de que houve crime, bem como indícios de autoria, então
a polícia poderá pedir autorização para interceptar comunicações telefônicas que reforcem as
evidências colhidas.
Esse procedimento, porém, não foi seguido no caso da operação Boi Barrica. A Polícia Federal
pediu autorização para interceptar comunicações telefônicas exclusivamente com base no RIF
recebido do COAF. Ocorre que movimentações financeiras atípicas não são indício de crime.
Não obstante, a Justiça autorizou a escuta, cujo prazo foi prorrogado 18 (dezoito) vezes. É por
essa razão que o STJ decretou a nulidade das provas assim obtidas. No caso, o juiz federal do
Maranhão que autorizou a escuta desobedeceu a lei.
11)Em 21.09.11, o „Estado‟ publicou a seguinte notícia: “Processo que anulou provas da PF na Boi
Barrica correu em tempo recorde”.43
Nessa notícia, o jornal afirma que, enquanto a duração do
processo da Boi Barrica no STJ foi de nove meses, o da operação Satiagraha tramitou durante
um ano e oito meses e o da operação Castelo de Areia levou cerca de dois anos. O jornal, porém,
não informa qual foi o critério utilizado para definir a duração dos processos. Se considerarmos
que a duração de um processo no STJ vai da data de seu registro até a data da decisão dos juizes,
então o prazo do processo em questão foi realmente de nove meses. Se o término da duração,
porém, for definido como a data de publicação do acórdão, então o processo da Boi Barrica tra-
mitou durante um ano. Ademais, a notícia em pauta não leva em conta que uma possível razão
para a tramitação mais célere de um processo é a repetição, ou seja, quando os juízes decidem
repetidamente causas semelhantes, as decisões tendem a tornar-se progressivamente mais rápi-
das. No caso, tratava-se do terceiro processo de anulação de provas ilegais. Mais grave, porém, é
que o próprio título da notícia, bem como os dados nela contidos, insinuam que os ministros do
STJ decidiram o processo rapidamente porque tinham interesses escusos no assunto.
12)Em 07.03.10, o „Estado‟ reproduziu notícia do jornal Folha de São Paulo, segundo a qual “Do-
cumentos enviados ao governo brasileiro por autoridades chinesas comprovam (grifo adiciona-
do) que o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-
AP), mantém uma conta corrente no exterior não declarada à Receita Federal.”44
No dia seguin-
te, o desmentido: “China não confirma conta de filho de Sarney (...).”45
Na ânsia de atacar Fer-
nando Sarney e, por tabela, seu pai, o jornal desobedeceu um dos princípios basilares do jorna-
lismo, que é a confirmação da notícia antes de sua publicação. Ao deixar de confirmar previa-
mente a informação, o „Estado‟ publicou uma notícia falsa, desonrando a confiança recebida dos
leitores. O jornal, porém, sequer deu-se ao trabalho de se desculpar.
13)A Imprensa é uma instituição social que existe para satisfazer uma necessidade social específica,
a necessidade de informação. Em tais condições, o direito que tem a Imprensa de informar não é
autônomo nem se destina a beneficiar a própria Imprensa, mas constitui um acessório do direito
principal, que é o direito de a sociedade ser informada sobre os fatos. O direito de informar só
existe em função do direito de ser informado, de obter a informação.46
O principal critério de de-
cisão sobre o que deve ser informado é o interesse público. A sociedade deixa, tacitamente, a
critério dos órgãos de comunicação a decisão sobre quais são as notícias de interesse público a
serem publicadas. Dizer, porém, que a sociedade tem o direito de ser informada significa dizer
que os cidadãos têm a prerrogativa de abrir mão desse direito. Isto significa que a sociedade po-
de decidir que não deseja receber determinados tipos de informação para melhor resguardar seus
próprios interesses. Foi o que aconteceu no caso das comunicações telefônicas. A Constituição
Federal, que foi elaborada e aprovada pelos legítimos representantes da sociedade brasileira, es-
tabeleceu como regra o sigilo das comunicações, sigilo que só poderá ser quebrado com autori-
zação judicial, na forma da lei. E tão sério foi considerado esse sigilo que sua violação foi carac-
terizada como crime. Em tais circunstâncias, os órgãos de imprensa não tem o direito de desobe-
decer a vontade do povo. No presente caso, nenhum jornalista pode alegar interesse público para
divulgar o conteudo de comunicações telefônicas interceptadas porque nesse caso, excepcional-
mente, devido a uma expressa determinação constitucional e legal, o interesse público reside
justamente no oposto, que é a não veiculação da informação.
14)Embora a lei defina como crime a quebra do sigilo das comunicações telefônicas sem autoriza-
ção judicial ou a violação do segredo de justiça, não se costuma processar criminalmente o jor-
nalista por essas ocorrências em virtude do entendimento de que a responsabilidade por manter
o sigilo cabe exclusivamente ao agente público; o jornalista não é, portanto, co-autor do delito.
No campo da moral, porém, será ética a publicação da informação? Se o profissional pensasse,
ainda que de forma equivocada, estar cumprindo o dever de informar, poder-se-ia desculpá-lo.
Ocorre que os órgãos de imprensa a) sabem que o interesse público está na não veiculação de in-
formações que a lei considera sigilosas; b) usam rotineiramente esses vazamentos de informação
para produzir “furos” de reportagem que lhes rendem prestígio, leitores e anunciantes. Conclui-
se, portanto, que tais vazamentos são publicados não por dever, mas por interesse. Por outro la-
do, o auxílio dos meios de comunicação tem sido decisivo para que os agentes públicos come-
tam impunemente os crimes de quebra de sigilo de comunicações telefônicas e de violação de
segredo de justiça. A publicação dessas informações, portanto, é, no mínimo, imoral.
Conclusão
Por que me dei ao trabalho de defender Fernando Sarney?
Não defendi Fernando Sarney. O que eu defendi foi:
 O princípio constitucional da presunção de inocência;
 O princípio constitucional do sigilo das comunicações telefônicas;
 O respeito à Lei e à Ética jornalística;
 O princípio constitucional do pluralismo e o consequente princípio do pluralismo jornalístico;
 O princípio jornalístico da confirmação da notícia antes de sua publicação.
Eu me dei ao trabalho de dissecar a operação Boi Barrica porque repudio a ocultação de informa-
ções pela imprensa e porque me recuso a ser manipulado por qualquer veículo de comunicação. Eu
repudio o costume repugnante dos órgãos de imprensa de tentar lucrar satisfazendo o prazer tam-
bém repugnante e até doentio que muitas pessoas sentem ao ver notícias de crimes, desgraças, aci-
dentes e sangue.
Conclusão
No Brasil, pode-se dizer que o direito do consumidor está razoavelmente desenvolvido no tocante
ao consumo de produtos e serviços em geral. Muitas companhias, principalmente as de maior porte,
possuem Códigos de Ética contendo um capítulo de Relações com os Clientes, bem como Comitês
de Ética para fiscalizar o cumprimento do Código. Os consumidores, por sua vez, já possuem uma
consciência razoável a respeito de seus direitos. Em termos de legislação, temos o Código de Defe-
sa do Consumidor, criado em 1990. Do ponto de vista estrutural, temos órgãos como os PROCONs,
o IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, a Comissão de Defesa do Consumidor da
OAB – Ordem dos Advogados do Brasil e o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do
Ministério da Justiça. Na internet, existem sites de defesa do consumidor, tais como o Reclame
Aqui.
Em contraste, quando se trata do consumo de notícias, constatamos que a Ética da imprensa, o grau
de consciência do público sobre seus direitos e o grau de desenvolvimento das instituições encarre-
gadas de fiscalizar a mídia se encontram em estado embrionário. As empresas de comunicação não
possuem Códigos de Ética Jornalística, muito menos Comitês de Ética Jornalística. Do ponto de
vista estrutural, não temos órgãos públicos ou privados de fiscalização do trabalho da imprensa. Na
internet, dispomos apenas de dois sites de crítica do trabalho noticioso, sites esses praticamente des-
conhecidos: o Observatório da Imprensa e o Instituto Gutenberg. A consequência é que as empresas
jornalísticas não apenas são muito menos fiscalizadas do que as outras empresas mas também resis-
tem em discutir a Ética da imprensa porque isto significaria questioná-las do ponto de vista moral.
Os jornalistas se consideram como os “fiscais” nomeados pela sociedade para vigiar a honestidade
dos agentes públicos. Por essa razão, seria embaraçoso para as empresas de comunicação se a socie-
dade tomasse consciência de que, no seio da classe jornalística, existem indivíduos e empresas com
as mesmas misérias morais de outras empresas e categorias profissionais.
O estágio incipiente de consciência do público consumidor de notícias se explica, primeiro, pelo
baixo grau de instrução da população brasileira como um todo. Em 2011, o número médio de anos
de estudo dos brasileiros era de apenas 7,3 anos.47
Isto significa que, em média, o brasileiro não tem
sequer a escolaridade correspondente ao ensino fundamental completo. Em segundo lugar, a cons-
ciência do brasileiro como consumidor de notícias é baixa em razão do baixo grau de informação da
população. O índice de leitura de jornais, no Brasil, em 2009, era de apenas 53,5 exemplares por mil
habitantes, o que nos colocava em 95º lugar em uma relação de 177 países. Em comparação, na
Noruega, que era o 3º colocado, o índice era 10 vezes maior, de 538 exemplares por mil habitan-
tes.48
Em outras palavras, na Noruega, em cada 100 habitantes cerca de 50 lêem jornais, ao passo
que aqui, de cada 100 habitantes apenas 5 têm esse hábito. Outro fator que determina a baixa cons-
ciência dos consumidores brasileiros de notícias é a falta de pensamento crítico.49
Por fim, um
quarto fator a explicar nosso baixo grau de consciência como consumidores de notícias é a falta de
noções básicas do jornalismo como a diferença entre fato e opinião e a diferença entre gêneros jor-
nalísticos informativos e opinativos. Apesar dessas dificuldades, a população vêm se tornando mais
cética em relação à imprensa. O grau de confiança dos brasileiros nos meios de comunicação, em
uma escala de 0 a 100, caiu de 71 em 2009 para 60 em 2012, uma queda de cerca de 15%.50, 51
Alguns órgãos de comunicação se aproveitam do baixo grau de consciência jornalística do público
para abusar da liberdade de imprensa. Para demonstrar “compromisso apenas com o público”, os
meios de comunicação tratam a vida das pessoas com sumária indiferença, violando seus direitos e
passando por cima da Constituição, das leis e dos Códigos de Ética da profissão. Muitos profissio-
nais da imprensa, por sua própria iniciativa ou sob orientação ou costume dos órgãos em que traba-
lham, abusam do direito de informar, muitas vezes causando danos irreparáveis às suas vítimas.
A imprensa costuma divulgar informações sobre quaisquer pessoas citadas em inquéritos policiais,
sob o argumento de que tais informações são de interesse público. Ao tratá-las como suspeitas, a
imprensa faz com que tais pessoas sejam consideradas culpadas pela opinião pública antes mesmo
que tenham sido condenadas, julgadas ou sequer denunciadas pelo promotor.
A imprensa exerce um verdadeiro poder social, pois tem capacidade de formar opiniões e idéias,
mas também é capaz de violar direitos alheios e de causar danos às pessoas. É por essa razão que a
Constituição impõe limites à liberdade de imprensa, pois não se pode admitir que qualquer veículo
de comunicação social agrida os direitos da personalidade. Nenhum direito é absoluto e o direito de
informar não foge à regra.
A ideia de limitação da liberdade de imprensa, porém, não é aceita por alguns órgãos de comunica-
ção, que resistem a qualquer cerceamento do processo de busca e divulgação de informações “de in-
teresse público”. A esse respeito, veja-se a seguinte passagem – surpreendente e inquietante – ex-
traida do Manual da Redação do jornal Folha de São Paulo:
“A Folha não reconhece legitimidade em nenhuma restrição, legal ou ilegal, que se faça à liberda-
de de imprensa. Mas reconhece como legítima a possibilidade de reparação, determinada em juízo,
por calúnia, difamação ou injúria, exceto quando veiculada no exercício do dever de informar.”52
A passagem acima, da forma como está redigida, leva à conclusão de que a „Folha‟ não respeita se-
quer a Constituição, e de que o jornal se concede a si próprio o direito de cometer calúnia, difama-
ção e injúria, desde que no exercício do “dever de informar”. Em outras palavras, a „Folha‟ se atri-
bui uma inviolabilidade igual à dos deputados e senadores, que é fixada pela Constituição.
Nesse quadro de verdadeira desobediência civil, as empresas jornalísticas também se recusam a res-
peitar o sigilo legal que possuem certas informações, bem como o segredo de justiça. Os órgãos de
imprensa sempre se referem àquelas informações como “sigilosas” mas nunca mencionam o fato de
que se trata de um sigilo estabelecido em lei. Considerada como o “quarto poder”, a imprensa, no
Brasil, tem se recusado a obedecer a Constituição e as leis. Esse é um fato muito grave. A continuar
assim, o quarto poder se transformará em um poder situado acima dos outros três.
NOTAS
1
A meu ver, a forma monárquica de Estado contémelementos não democráticos.
2
MARQUES, Hugo e Rodrigo Rangel. “Espionagemno porto”. Revista Veja, ed. 2326, (46)25, 19 de junho de 2013,
pp. 56-59.
3
BONIN, Robson e Hugo Marques. “E agora, general?”. Revista Veja, ed. 2327, (46)26, 26 de junho de 2013, p. 94.
4
Constituição Federal, art. 144, § 4º. Código de Processo Penal, arts. 4º e 304.
5
CARDOSO, Maurício. “Jornalista é condenada a indenizar juiz”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2010-mar-
03/folha-jornalista-sao-condenados-ofensas-juiz-varig
6
ITO, Marina. “TJ-RJ aumenta indenização em ação contra a Folha”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2010-dez-
20/tj-rio-aumenta-indenizacao-juiz-acao-folha
7
“Jornal e jornalista devem indenizar juiz do caso Varig”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2012-ago-08/folha-
eliane-cantanhede-pagar-100-mil-juiz-varig
8
STF. ARE 739806 / RJ – Rio de Janeiro. Recurso extraordinário comagravo. Disp. em:
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28%28ARE+739806+%29%29+NAO+S%2
EPRES%2E&base=baseMonocraticas
9
BONIN, Robson e Adriano Ceolin. “Distribuição de mentiras”. Revista Veja, ed. 2324, (46)23, 5 de junho de 2013,
pp. 64-65.
10
ALCÂNTARA, Eurípedes. “Uma vida dedicada à verdade”. Revista Veja, ed. 2324, (46)23, 5 de junho de 2013,
p. 90.
11
ALCÂNTARA, Eurípedes. Idem. p. 92.
12
RIVERA, Lourdes Maria Alvarez. “Os jornais paulistas depois do caso Jayson Blair”. Disp. em:
http://www.eca.usp.br/pjbr/arquivos/ensaios5_a.htm
13
NOGUEIRA, Luís Artur. “5 escândalos que abalaram a mídia internacional”. Disp. em:
http://exame.abril.com.br/mundo/noticias/5-escandalos-que-envolveram-a-midia-internacional?p=4#4
14
“Entenda o escândalo dos grampos envolvendo o News of the World”. Disp. em:
http://noticias.uol.com.br/bbc/2011/07/19/entenda-o-escandalo-dos-grampos-envolvendo-o-news-of-the-world.jhtm
15
RIVERA, Lourdes Maria Alvarez. Idem.
16
Observatório da Imprensa. “Para lembrar (e não repetir) Jayson Blair”. Disp. em:
http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/para-lembrar-e-nao-repetir-jayson-blair
17
AJZENBERG, Bernardo. “Domesticar o „off‟ ”. Disp. em:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ombudsma/om2007200303.htm
18
ALCÂNTARA, Eurípedes. Idem. p. 88.
19
ALCÂNTARA, Eurípedes. Idem. p. 92.
20
“Veja terá de indenizar professor por criar estereótipo”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2013-jun-07/revista-
veja-indenizar-professor-liga-lo-estereotipo
21
“Apelação civel”. 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Disp. em:
http://s.conjur.com.br/dl/tjrs-mantem-condenacao-veja-jornalistas.pdf
22
MARANHÃO, Carlos. “Memórias de umeditor”. Revista Veja, ed. 2324, (46)23, 5 de junho de 2013, p. 101.
23
MARANHÃO, Carlos. Idem. p. 99.
24
Constituição Federal, artigo 5º, inciso V.
25
RANGEL, Rodrigo. “Gravação liga Sarney a atos secretos”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,gravacao-liga-sarney-a-atos-secretos,406401,0.htm
26
RECONDO, Felipe. “Desembargador censura 'O Estado' no caso Sarney”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,desembargador-censura-o-estado-no-caso-sarney,411764,0.htm
27
Jornal O Estado de São Paulo. “Nunca faria campanha para censurar, diz Fernando Sarney”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,nunca-faria-campanha-para-censurar-diz-fernando-sarney,412992,0.htm
28
Jornal O Estado de São Paulo. “Polícia Federal indicia Sarney por lavagemde dinheiro”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,policia-federal-indicia-filho-de-sarney-por-lavagem-de-
dinheiro,403568,0.htm
29
Jornal O Estado de São Paulo. “Desembargador nega liminar do 'Estadão' contra censura”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,desembargador-nega-liminar-do-estadao-contra-censura,418374,0.htm
30
MACEDO, Fausto. “Recurso contra censura ao „Estado‟ chega ao Supremo”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,recurso-contra-censura-ao-estado-chega-ao-supremo,468127,0.htm
31
GALLUCCI, Mariangela e Felipe Recondo. “STF rejeita recurso e censura ao „Estado‟ continua emvigor”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,stf-rejeita-recurso-e-censura-ao-estado-continua-em-vigor,480133,0.htm
32
Jornal O Estado de São Paulo. “Polícia Federal indicia Fernando Sarney pelo crime de evasão de divisas”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,policia-federal-indicia-fernando-sarney-pelo-crime-de-evasao-de-
divisas,548642,0.htm
33
GALLUCCI, Mariangela. “STJ anula provas contra filho de Sarney”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,stj-anula-provas-contra-filho-de-sarney,773843,0.htm
34
BONIN, Robson. “Fernando Sarney pede providências sobre vazamento de diálogos”. Disp. em:
http://g1.globo.com/Noticias/Politica/0,,MUL1244482-5601,00-
FERNANDO+SARNEY+PEDE+PROVIDENCIAS+SOBRE+VAZAMENTO+DE+DIALOGOS.html
35
Site Consultor Jurídico. “TRF-1 terá de investigar vazamento de grampo”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2009-
jul-27/trf-investigar-vazamento-dialogo-entre-sarney-filho
36
O princípio do pluralismo jornalístico decorre do disposto no Preâmbulo e no art. 1º, inciso V, da Constituição
Federal.
37
Jornal O Estado de São Paulo. “Entidades denunciam censura prévia contra 'O Estado'”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,entidades-denunciam-censura-previa-contra-o-estado,411948,0.htm
38
COLON, Leandro. “Senadores repudiam censura feita ao 'O Estado'”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,senadores-repudiam-censura-feita-ao-o-estado,412017,0.htm
39
RODRIGUES, Francisco Cesar Pinheiro. “Censura do jornal O Estado de S. Paulo é discutível”. Disp. em:
http://www.conjur.com.br/2011-ago-18/censura-jornal-estado-paulo-nao-existe
40
CASTRO, Antônio Carlos de Almeida. “Coletar provas semdriblar a Constituição”. Disp. em:
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz0610201107.htm
41
Associação Nacional de Jornais. Código de Ética e Autorregulamentação. Disp. em: http://www.anj.org.br/quem-
somos/codigo-de-etica
42
Federação Nacional dos Jornalistas. Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros. Disp. em:
http://www.fenaj.org.br/federacao/cometica/codigo_de_etica_dos_jornalistas_brasileiros.pdf
43
RECONDO, Felipe. “Processo que anulou provas da PF na Boi Barrica correu emtempo recorde”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,processo-que-anulou-provas-da-pf-na-boi-barrica-correu-em-tempo-
recorde--,775302,0.htm
44
Jornal O Estado de São Paulo. “Filho de Sarney não declara conta que temno exterior”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,filho-de-sarney-nao-declara-conta-que-tem-no-exterior,520730,0.htm
45
Jornal O Estado de São Paulo. “China não confirma conta de filho de Sarney, diz Tuma Jr.”. Disp. em:
http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,china-nao-confirma-conta-de-filho-de-sarney-diz-tuma-jr,521011,0.htm
46
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 2001. p. 250.
47
IBGE. PNAD 2011 – Tabela 3.3 – Número médio de anos de estudo das pessoas de 10 anos ou mais de idade, por
Grandes Regiões, segundo o sexo e os grupos de idade – 2009/2011. Disp. em:
ftp://ftp.ibge.gov.br/Trabalho_e_Rendimento/Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_Domicilios_anual/2011/tabelas_p
df/sintese_ind_3_3.pdf
48
Associação Nacional de Jornais. Leitura de Jornais no Mundo. Disp. em: http://www.anj.org.br/a-industria-
jornalistica/leitura-de-jornais-no-mundo
49
Pensamento crítico é a investigação da veracidade de uma sentença. A finalidade do pensamento crítico é reconhecer
os enganos ou erros a que somos submetidos no dia-a-dia, impedindo que sejamos manipulados pelo grande número
de informações confusas, contraditórias ou mesmo falsas que recebemos diariamente. A ideia do pensamento crítico é
questionar tudo aquilo que se lê ou que se ouve.
50
IBOPE. “Índice de Confiança Social mostra que o brasileiro está menos confiante”. Disp. em:
http://www.ibope.com.br/pt-
br/noticias/Paginas/%C3%8Dndice%20de%20Confian%C3%A7a%20Social%20mostra%20que%20o%20brasileiro
%20est%C3%A1%20menos%20confiante.aspx
51
IBOPE. “Confiança do brasileiro no STF é maior do que na Justiça”. Disp. em: http://www.ibope.com.br/pt-
br/noticias/Paginas/Confianca-do-brasileiro-no-STF-e-maior-do-que-na-Justica.aspx
52
Jornal Folha de São Paulo. Manual da Redação – Projeto Folha. Disp. em:
http://www1.folha.uol.com.br/folha/circulo/manual_projeto_l.htm
*Flavio Farah é Mestre em Administração de Empresas, Professor Universitário e autor do livro “Ética na gestão
de pessoas”. Contato: farah@flaviofarah.com.

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Misérias morais da imprensa brasileira

  • 1. Misérias morais da imprensa brasileira Flavio Farah* Introdução O presente texto contém críticas à imprensa brasileira. Por essa razão, é conveniente que eu faça, de início, alguns esclarecimentos, para evitar mal-entendidos: 1) Sou democrata. Isto significa que sou partidário: a) do princípio da soberania popular; b) da for- ma republicana de Estado;1 c) do regime representativo; d) do sufrágio universal, com pluralida- de de candidatos e de partidos; e) da temporariedade dos mandatos eletivos, com limitação do direito de reeleição; f) da separação dos poderes Legislativo, Executivo e Judiciário; g) da igual- dade de todos perante a lei; h) da limitação das prerrogativas dos governantes; i) da existência de um conjunto de direitos e garantias individuais e coletivos, tais como os relacionados no arti- go 5º da Constituição Federal; j) da proteção dos direitos das minorias. 2) Também sou partidário: a) da valorização do trabalho humano; b) da livre iniciativa; c) da justi- ça social; d) da propriedade privada; e) da função social da propriedade; f) da livre concorrência; g) da defesa do consumidor; h) da redução das desigualdades regionais e sociais; i) da busca do pleno emprego; j) da reforma do Estado; k) da Ética. 3) Sou partidário da liberdade de Imprensa. Isto significa que não aceito o controle externo dos ór- gãos de comunicação. Não obstante, defendo o direito de se criticar jornalistas e órgãos jornalís- ticos, bem como aceito que a Justiça intervenha em disputas relativas ao assunto, quando houver conflito entre os direitos previstos nos incisos IV e X do artigo 5º da Constituição Federal. Este texto contém críticas específicas a órgãos de imprensa específicos, bem como questionamentos sobre aspectos específicos do funcionamento da Imprensa em geral. Essas críticas não significam uma condenação genérica a qualquer órgão de imprensa, muito menos uma condenação à Imprensa livre como instituição social. Feitas essas ressalvas, passo aos questionamentos. A perigosa mistura de informação com opinião A revista Veja possui o epíteto “revista semanal de informação”, que lhe foi atribuído por seu cria- dor, o falecido jornalista Roberto Civita, presidente do grupo Abril. Desde o primeiro número da revista, esse qualificativo aparecia impresso logo abaixo do nome “Veja”, na seção de expediente. Embora o epíteto tenha sido suprimido a partir da edição 1.265, de 9 de dezembro de 1992, Civita continuou a referir-se a seu semanário desse modo, como por exemplo, em suas memórias, cujo re- sumo foi publicado na edição 2.324, de 5 de junho de 2013. O qualificativo “revista semanal de informação” sugere que Veja praticaria exclusivamente os gêne- ros jornalísticos informativos, quais sejam, nota, notícia, reportagem e entrevista, deixando de lado ou minimizando os gêneros opinativos: editorial, comentário, artigo, resenha/crítica, coluna, carta, crônica. Não é, porém, o que acontece. A revista Veja inaugurou, no Brasil, um novo gênero jorna- lístico: a reportagem opinativa. Para se entender em que consiste esse novo gênero textual do jor-
  • 2. nalismo e qual o seu significado, é conveniente relembrar os conceitos de fato, opinião, reportagem e texto opinativo. Fato. Fato é algo que tem existência objetiva, isto é, algo cuja existência independe da pessoa que o menciona. Os fatos podem ser demonstrados e não estão sujeitos a contestação. No campo jorna- lístico, fato é aquilo que aconteceu. Os fatos representam a verdade, a realidade da vida. Opinião. Opinião é a avaliação dos fatos por meio de um ponto de vista. Cada pessoa avalia um fato influenciada por seus valores, crenças e experiências individuais, criando sua própria opinião. Ao contrário dos fatos, uma opinião nunca será uma verdade absoluta, pois pessoas diferentes terão pontos de vista divergentes sobre o mesmo evento. As opiniões podem ser expressas de forma isola- da – como aquelas que expressam interesses, preferências ou gostos de um indivíduo – ou estar fun- damentadas em argumentos. Todavia, mesmo que uma opinião seja alicerçada em um raciocínio ló- gico coerente, outros indivíduos poderão construir raciocínios diversos para chegar a conclusões di- ferentes e até opostas sobre o mesmo fato. Reportagem. Reportagem é o relato ampliado de um acontecimento. A reportagem vai muito além da notícia, que consiste na simples narração de um acontecimento. A notícia geralmente é escrita a partir das informações enviadas para as redações dos órgãos de imprensa pelas agencias noticiosas ou por outras fontes, ao passo que, na reportagem, o jornalista vai até o local para apurar os fatos. Além de uma descrição dos acontecimentos, geralmente a reportagem contém:  Detalhes dos fatos;  Declarações dos envolvidos;  Depoimentos de testemunhas e de fontes especializadas;  Dados estatísticos;  Fotografias. Em adição aos elementos acima mencionados, é comum que a reportagem contenha também uma interpretação dos fatos. Interpretar um fato significa acrescentar-lhe três dimensões: 1) suas causas, origens ou antecedentes; 2) as circunstâncias em que o fato ocorreu, isto é, seu contexto social ge- ral; 3) suas possíveis consequências, implicações, perspectivas ou desdobramentos. A interpretação visa dar significado e sentido às ocorrências relatadas sem emitir uma opinião, mas fornecendo ao leitor elementos suficientes para que ele próprio crie seu ponto de vista sobre os acontecimentos. Texto opinativo. O texto opinativo recebe esse nome porque seu autor emite uma opinião sobre o assunto em pauta, ou seja, formula um juizo de valor emitindo uma avaliação subjetiva que qualifi- ca o acontecimento como bom ou mau, desejável ou indesejável, expressando um sentimento de aceitação ou de rejeição em relação a ele. O texto opinativo tem por finalidade influenciar e conven- cer o leitor, buscando sua adesão aos pontos de vista nele defendidos. Um texto opinativo digno do nome, isto é, um texto opinativo que não seja meramente um panfleto de propaganda, não pode conter observações superficiais, teses padronizadas ou opiniões gratuitas, tampouco limitar-se a expressar sentimentos de surpresa, admiração ou indignação. O verdadeiro texto opinativo contém um raciocínio lógico apoiado em argumentos consistentes que justifiquem as teses defendidas pelo autor. Esses argumentos podem ser dados estatísticos, exemplos, pesquisas, fatos comprováveis, citações ou depoimentos de especialistas, ou ainda comparações entre fatos, si- tuações, épocas ou lugares diferentes.
  • 3. Temos então que, idealmente, uma reportagem opinativa seria aquela que contém os principais ele- mentos da reportagem, combinados às opiniões e ao raciocínio lógico típicos do texto opinativo. Com base nesses conceitos, concluimos que Veja não é uma revista semanal de informação, mas sim, uma revista semanal de informação e opinião. Nos jornais, a informação contida nas notícias mantém-se separada da opinião, que vem expressa nos editoriais, ao passo que, nas reportagens opi- nativas de Veja e de outras revistas semanais, a informação aparece misturada à opinião do autor da matéria. A principal consequência desse embaralhamento é uma dificuldade muito maior do leitor para identificar os fatos e separá-los das opiniões de quem escreve. Neste ponto, contudo, pode-se perguntar: por que devemos nos preocupar com isso? Em uma reportagem opinativa, qual a impor- tância de se identificar claramente o que é fato e o que é opinião? A resposta exige um entendimen- to sobre a razão de ser da Imprensa. Em uma sociedade democrática, a missão da Imprensa compõe-se de duas grandes tarefas: primei- ro, noticiar os acontecimentos, mantendo o público informado sobre os fatos. Essa função informa- tiva, porém, não se esgota no puro e simples relato dos acontecimentos, mas se estende à sua análi- se e interpretação, para tornar compreensíveis os aspectos mais complexos da realidade. A função informativa também pressupõe a fiscalização e a investigação relativas à atuação dos agentes públi- cos e dos agentes privados que com eles se relacionam. A segunda grande tarefa da Imprensa é atuar como formadora da opinião pública. Nesse mister, a Imprensa, ao emitir opinião sobre os acontecimentos, presta serviço essencial, difundindo conheci- mentos e contribuindo para a formação do senso crítico dos membros da sociedade, exercendo fun- ção educativa. Dentro do papel de formador de opinião, insere-se também a atuação como agente mobilizador, defendendo certas causas e mobilizando pessoas a agirem em favor destas. Quando se fala sobre a missão da Imprensa, todavia, não se pode esquecer que estamos tratando de uma instituição social, ou seja, a Imprensa constitui-se de um conjunto de organizações destinadas a satisfazer necessidades sociais. A sociedade está de acordo com a existência da Imprensa porque a considera benéfica ao corpo social. Esse é o fundamento moral de sua existência. As organizações jornalísticas são autorizadas a funcionar pela sociedade e operam sob formas permitidas pela socie- dade. Isto significa que a Imprensa não existe por direito próprio, mas sim, porque a sociedade de- seja que exista. Como instituição social, a finalidade da Imprensa é beneficiar a sociedade, defen- dendo seus interesses. Por outro lado, as organizações jornalísticas, em sua grande maioria, constituem-se como empresas, ou seja, como organizações econômicas que dependem de seus próprios meios para sobreviver. Tão logo uma empresa é constituída, sua principal preocupação passa a ser a própria sobrevivência. As empresas jornalísticas concorrem entre si para angariar leitores e anunciantes. Assim, quando um órgão de Imprensa defende valores como a democracia, a propriedade privada ou a livre iniciativa em nome do interesse público, esse órgão está defendendo também, indiretamente, sua própria so- brevivência, isto é, seus interesses particulares. Esses interesses, porém, devem ser considerados le- gítimos porque, primeiro, a sociedade deseja que as empresas jornalísticas sobrevivam; segundo, porque não se pode exigir que uma empresa não lute pela própria sobrevivência, não se pode espe- rar que uma organização econômica assista passivamente ao próprio desaparecimento.
  • 4. O problema surge quando os órgãos de imprensa rompem os limites morais. Muitas vezes, na ânsia de defender valores como os mencionados acima, ou movidos por sentimentos menos nobres; para obter prestígio para si e/ou para sua organização, ou até mesmo para obter vantagens ou benefícios indevidos, dirigentes, editores ou repórteres de entidades jornalísticas atuam de forma antiética, ela- borando e publicando reportagens viciadas ou ofendendo a honra das pessoas. Reportagens viciadas são aquelas que contêm raciocínios falsos, contradições, incoerências, generalizações indevidas, opiniões com aparência de fatos, opiniões sem argumentos, exageros, distorções, insinuações ou pu- ra invenção dos fatos, acusações sem provas, insinuações ou perguntas feitas com acentuação mali- ciosa, frases com duplo sentido (meias-verdades) ou frases retiradas do contexto em que foram ditas para alterar seu sentido. Em tais condições, a não diferenciação entre fato e opinião torna mais difí- cil que o leitor perceba os vícios das reportagens opinativas. Uma reportagem viciada Exemplo de reportagem viciada, que confunde em vez de esclarecer, e que induz o leitor ao erro por meio de raciocínios pretensamente lógicos, é aquela que foi publicada pela revista Veja sob o título “Espionagem no porto”, e que leva o seguinte subtítulo: “Disfarçados de portuários, quatro agentes da Abin – o serviço secreto do governo – foram presos sob suspeita de bisbilhotar a vida do governador Eduardo Campos, pré-candidato à Presidência da República”.2 A matéria informa que os agentes, disfarçados de portuários, estavam no estacionamento do Porto de Suape, no Recife, quando foram abordados por seguranças. De acordo com a reportagem, “Apre- sentaram documentos falsos e se disseram operários. Acionada logo depois, a PM entrou em cena. Diante dos policiais, os espiões admitiram que eram agentes da Abin, que estavam cumprindo mis- são sigilosa e pediram que não fossem feitos registros oficiais da detenção.” Primeiro questionamento. Refere-se a esta frase constante do subtítulo da reportagem: “... presos sob suspeita de bisbilhotar a vida do governador ...”. O inciso LXI do art. 5º da Constituição Fede- ral estabelece que ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem judicial (mandado de prisão). A reportagem não menciona nenhum mandado de prisão – que normalmente é cumprido por policiais civis – mas cita a presença de policiais militares no local, levando à conclusão de que os agentes foram presos por estes. O caso, portanto, seria de flagrante delito. Teriam os agentes sido presos por (art. 307 do Código Penal) falsa identidade? Ou por (art. 304 do Código Penal) uso de documento falso? Se a razão foi o cometimento de um desses crimes, ou de ambos, então a prisão teria sido legal, caso contrário, os policiais teriam prendido ilegalmente os agentes. Em qualquer hi- pótese, porém, conclui-se que a frase entre aspas mencionada no início deste parágrafo – tão absur- da que se torna ridícula, mas poderosa em seus efeitos sobre o leitor desatento – não tem nenhuma relação com a verdadeira causa da prisão dos agentes, tendo sido fabricada pelos autores da reporta- gem com o objetivo de incutir no público a ideia de que o governo está usando a ABIN para violar, com fins políticos, a vida privada do governador de Pernambuco. Essa, provavelmente, é a razão pela qual o texto silencia sobre a legalidade da prisão. A esse respeito, reportagem posterior informa que os agentes foram detidos e interrogados durante mais de duas horas por um coronel da Polícia Militar.3 Ocorre que o interrogatório de civis presos é de competência da polícia civil, devendo o preso ser entregue à autoridade competente, ou seja, ao delegado de polícia.4 A PM, portanto, não poderia ter interrogado os agentes, muito menos mantê-los detidos durante mais de duas horas.
  • 5. Segundo questionamento. Diz respeito à Lei 9.883/99, que instituiu o Sistema Brasileiro de Inteli- gência e criou a ABIN – Agência Brasileira de Inteligência. Em seu art. 3º, parágrafo único, e em seu art. 4º, inciso I, a lei estabelece que as atividades de inteligência poderão fazer uso de técnicas e meios sigilosos, e que compete à ABIN planejar e executar ações, inclusive sigilosas, relativas à ob- tenção e análise de dados para a produção de conhecimentos destinados a assessorar o Presidente da República. Em tais condições, será que a autorização de uso do sigilo, constante da Lei 9.883/99, implica permissão aos agentes da ABIN para adotar identidade falsa e usar documentos falsos? Se a resposta for afirmativa, então os agentes não cometeram crime. Se for negativa, por que os agentes não foram levados à presença do delegado para lavratura do auto de prisão em flagrante? Terceiro questionamento. Como podem os autores da reportagem afirmar, com absoluta certeza e desfaçatez, que o objetivo dos agentes era “bisbilhotar” a vida – vida particular, supõe-se – do go- vernador de Pernambuco? Como poderiam esses agentes fazer tal coisa indo ao Porto de Suape – um local público – e lá permanecendo? A certa altura, os repórteres afirmam que os agentes “pre- tendiam mapear eventuais relações espúrias entre Campos e o setor privado.” Logo a seguir, porém, desmentem-se a si próprios, declarando que “Não se sabe se esse era exatamente o objetivo dos es- piões”. Quarto questionamento. A reportagem contém a informação de que um dos agentes é vereador em Jaboatão dos Guararapes. Os autores então concluem: “Nada mais natural. Edmilson Silva tem uma dupla jornada de trabalho. (...) Durante o dia, como vereador, é um defensor das liberdades. Às es- curas, como araponga, une-se aos colegas de repartição para violá-las.” A que liberdades os repórte- res se referem? Às liberdades públicas? Quais liberdades foram violadas pelos agentes? Liberdades de quem? Como essas liberdades foram violadas? Parece que os repórteres se aproveitaram do pro- vável desconhecimento do público sobre o termo jurídico “liberdades” para dar a aparência de ver- dade incontestável a uma afirmativa genérica feita sem base e, por isso mesmo, leviana. Aliás, será que os próprios jornalistas conhecem ao certo o significado desse termo? Quinto questionamento. No subtítulo, os autores da reportagem se referem aos detidos como “agentes”, termo técnico neutro que designa uma das categorias de servidores públicos da ABIN. Daí por diante, os agentes são qualificados em várias passagens do texto como “espiões”, palavra que sugere uma atividade ilícita. No início da reportagem, a missão dos agentes é dita “clandestina”, termo cujo sentido aponta para uma ação ilegal. A reportagem, porém, não consegue demonstrar qual a ilicitude cometida pelos agentes. Conclusão. Os fatos são os seguintes: disfarçados de portuários, quatro agentes da Abin, que porta- vam documentos falsos, foram detidos pela PM no porto de Suape, no Recife, e interrogados por mais de duas horas por um coronel da corporação. O resto da reportagem é fantasia. O texto man- tém-se no terreno das insinuações, jamais mostrando uma relação lógica entre a conduta dos agentes e a tese central da reportagem, de que eles estavam investigando a vida privada do governador Eduardo Campos. Ofensas gratuitas Folha de São Paulo. O juiz André Pinto, da 36ª Vara Cível do Rio de Janeiro, condenou a jornalis- ta Eliane Cantanhêde e o jornal Folha de S. Paulo a pagar R$ 35 mil de indenização por danos mo- rais ao juiz Luiz Roberto Ayoub, titular da 1ª Vara Empresarial. No texto “O lado podre da hipocri- sia”, Eliane Cantanhêde, que assina uma coluna diária na Folha, reproduz uma afirmação que atri-
  • 6. bui à ministra-chefe da Casa Civil: “O governo não vai se submeter à decisão de um juiz de quinta”, referindo-se ao desempenho de Ayoub no processo de falência e recuperação judicial da Varig. Em seguida, a colunista conclui: “Já que a lei não vale nada e o juiz é „de quinta‟, dá-se um jeito na lei e no juiz. Assim, o juiz Luiz Roberto Ayoub aproximou-se do governo e parou de contrariar o presi- dente, o compadre do presidente e a ministra. Abandonou o „falso moralismo‟ e passou a contrariar a lei”. O juiz Ayoub considerou a afirmação como uma acusação de prevaricação e parcialidade. O juiz André Pinto rejeitou os argumentos da defesa. “Não se trata de mera opinião proferida com base na liberdade de expressão, como pretendem fazer crer as rés, mas de grave acusação contra o magistrado, onde lhe é imputada a prática de ato ilícito e de cunho extremamente lesivo à personali- dade”, sentenciou.5 Posteriormente, a 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por unanimidade, não só confirmou a decisão de 1ª instância como aumentou o valor da indenização para R$ 100 mil.6 A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, por sua vez, rejeitou o recurso dos réus.7 A seguir, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, negou seguimento ao recurso extraordinário interposto pelos condenados e, ato contínuo, rejeitou o agravo (pedido de revisão) interposto contra sua própria decisão.8 Veja. A revista Veja publicou reportagem sob o título “Distribuição de mentiras”, sobre a crise pro- vocada pelos boatos de extinção do Bolsa-Família. No fim do texto, está escrito o seguinte: “A pre- sidente Dilma já apelidou um grupo de auxiliares mais próximos (...) de “três porquinhos”. Desta vez, foram os patetas (grifo adicionado) que roubaram a cena.”9 Roberto Civita: um homem ingênuo? A edição 2.324, de 5 de junho de 2013, da revista Veja, traz uma matéria intitulada “Uma vida de- dicada à verdade”, de autoria de Eurípedes Alcântara, na qual o jornalista discorre sobre o legado de Roberto Civita, falecido presidente do grupo Abril e criador da revista Veja. Outra matéria na mes- ma edição, sob a epígrafe “Memórias de um editor”, contém um resumo das memórias inacabadas de Civita. Segundo Alcântara, uma das frases de Civita era: “A espécie humana nunca decepciona”, e essa era “uma das poucas searas onde ele permitia que seu inquebrantável otimismo desse lugar a um conti- do desprezo pelo próximo”.10 A frase irônica de Civita expressa o pessimismo de quem espera sem- pre pelo pior, traduz a decepção de seu autor com a humanidade em geral, com o ser humano, que estaria sempre pronto a executar algum ato abominável. Outro pensamento de Civita, segundo Al- cântara: “Os jornalistas não levam nenhuma vantagem em mentir. Isso acaba logo ou abrevia a car- reira deles. (...) Então existe sempre a possibilidade de que um jornalista nosso, bem selecionado, bem treinado e bem pago, esteja com a maior parte da verdade”.11 Será que Civita, portador de um “contido desprezo pelo próximo”, acreditava mesmo que os jorna- listas constituem uma classe à parte, constituida de santidades completamente imunes às misérias humanas? Será possível que ele ignorasse que a História registra numerosos casos de fraudes come- tidas por profissionais de Imprensa? Vejamos alguns desses casos. 1) Em maio de 2003, o jornal The New York Times publicou matéria relatando as fraudes que o jornalista Jayson Blair cometera durante os quatro anos em que trabalhou no matutino. Blair foi acusado de inventar histórias, plagiar textos de outros jornais e falsificar declarações de entre- vistados. Blair foi demitido e as 600 reportagens de sua autoria foram analisadas por uma equipe especialmente formada com essa missão.12
  • 7. 2) Em 2004, o jornal USA Today revelou que o ex-repórter do jornal Jack Kelley tinha inventado pelo menos oito grandes reportagens. Uma comissão foi formada para ler e apurar mais de 720 matérias escritas por ele no período de 1993 a 2003, o que resultou na constatação de que pelo menos oito reportagens eram “fabricadas”. Uma delas, inclusive, foi finalista do famoso prêmio Pulitzer de jornalismo.13 3) O tablóide dominical britânico News of the World, de 168 anos de vida e tiragem de 2,8 milhões de exemplares a cada domingo, foi fechado em julho de 2011 pela empresa que o controlava de- vido ao envolvimento do jornal em um escândalo de escutas telefônicas ilegais. As acusações de que funcionários do jornal estariam envolvidos em interceptação ilegal de comunicações telefô- nicas começaram a surgir em 2006. No ano seguinte, a Justiça condenou à prisão Clive Good- man, correspondente para assuntos da família real, bem como o investigador Glenn Mulcaire, funcionário do jornal, devido ao grampo ilegal de telefones de membros da realeza.14 4) A jornalista Janet Cooke, quando era repórter do jornal Washington Post, devolveu o prêmio Pulitzer, que ganhara em 1981 por uma reportagem sobre um garoto viciado em heroína, depois de confessar que a história tinha sido inventada e que o personagem não existia de fato.15 Será possível que Civita realmente acreditasse que todos, absolutamente todos os jornalistas da edi- tora Abril, apenas pelo fato de serem “bem selecionados, bem treinados e bem pagos”, eram e são anjos de candura, inocência e retidão? Logo depois que Blair foi desmascarado, o New York Times criou uma comissão para recomendar medidas destinadas a garantir a qualidade e integridade do trabalho na redação. Uma delas foi a ve- rificação aleatória de artigos que contêm citações de fontes anônimas. A checagem é feita pelo edi- tor de qualidade – cargo também criado após o episódio Jayson Blair – com o objetivo de verificar se algum editor responsável pelo repórter que assina o texto conhece a identidade da fonte utiliza- da.16 Na mesma época, no jornal Folha de São Paulo, a então editora-executiva, Eleonora de Luce- na, também por causa do escândalo no jornal norte-americano, distribuiu um comunicado interno aos jornalistas com o seguinte teor: “O emprego de informações „off the record‟ está banalizado no jornal. É preciso redobrar os cuidados na apuração e os controles na edição de notícias obtidas desse modo. Sempre que solicitados, repórteres devem comunicar a origem dessas informações aos seus superiores hierárquicos. Estes, conhecendo a identidade das fontes que são mantidas no anonimato, devem cuidar da manutenção do sigilo.(...)”17 Que providências Civita, por sua vez, tomou para reduzir o risco de ocorrência de fraudes jornalís- ticas nos veículos da Editora Abril? Que medidas ele tomou para implantar uma Auditoria Edito- rial? Aparentemente nenhuma, porque ele acreditava que “Os jornalistas não levam nenhuma vanta- gem em mentir.” De acordo com Alcântara, Civita “costumava discutir o encaminhamento das ma- térias principais de Veja, mas nunca pedia para ler uma reportagem antes de sua publicação”.18 Exi- gia tão somente dos editores da revista que seu trabalho expressasse a “busca honesta da verdade”.19 Será que ele, pelo menos, verificava periodicamente se a verdade estava de fato sendo buscada, e buscada honestamente? Ou considerava desnecessária essa verificação? A esse respeito, vale relatar um caso em que Veja foi condenada a pagar indenização por danos morais.
  • 8. Segundo notícia de 07.06.13, a revista Veja e as jornalistas Mônica Weinberg e Camila Pereira de- vem indenizar o professor de História Paulo Fioravanti, de Porto Alegre, em R$ 80 mil por danos morais. A determinação é da 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que confirmou sentença de primeiro grau.20 Partes da sentença de origem são reproduzidas a seguir:21 “(...) O exame dos elementos produzidos na causa põe em evidência o abuso pelos réus da liberdade de expressão e de crítica, considerado, para esse efeito, o próprio teor da publicação supostamente veiculadora de lesão ao patrimônio moral do demandante. “A matéria intitulada ironicamente como “Prontos para o Século XIX”, publicada na Revista VEJA, edição nº 2074, de 20 de agosto de 2008, conforme se vê das fls. (...) da publicação de fl. (...), en- quadra o autor como sendo professor que incute ideologias anacrônicas e preconceitos esquerdistas nos alunos, com a justificativa de “incentivar a cidadania” (transcrevendo a expressão na forma em que foi empregada). “Fato incontroverso que houve autorização da escola para que o repórter Marcos Todeschini acom- panhasse 50 minutos de aula ministrada pelo autor, gravada na ocasião (...), e retornasse, um ano depois, para tirar fotografias do autor a fim de acompanhar a reportagem. “O que acontece é que o requerente foi surpreendido com os termos da publicação, após acreditar estar cedendo a aula de história dada para uma turma da 5ª serie para que a revista elaborasse uma matéria positiva sobre o ensino desenvolvido na escola. “Ao contrário, o autor foi qualificado como professor de história do Colégio Anchieta, instituição de ensino que figura entre as melhores do país, conforme sustentou a própria reportagem à fl. (...) da publicação, como exemplo de „tendência prevalecente entre professores brasileiros de esquerdizar a cabeça das crianças.‟ “O que a publicação deixou de registrar é que o requerente ministrava aula sobre a Revolução In- dustrial, século XVIII, estabelecendo relações entre o passado e o presente, a fim de estimular a atenção e o raciocínio dos alunos. Forçou, a reportagem, ao afirmar a ideologia política do autor e estereotipá-lo como esquerdista por conta de seu método de ensino, desconsiderando os seus mais de 15 anos como professor e a tradição da escola, transpondo a fronteira da veracidade e da infor- mação. “Ainda, inverídica a afirmação constante na reportagem de que a disciplina acabou da maneira rela- tada. Extrai-se da gravação juntada à fl. (...), que a aula foi baseada em um questionário respondido pelos alunos, em que o professor, ora autor, comentava as respostas. “A repercussão da matéria foi tamanha, que a direção do Colégio Anchieta divulgou nota de repú- dio à reportagem nos jornais Zero Hora, Correio do Povo, O Sul e Jornal do Comércio (...). O mes- mo foi feito pelo Sindicato dos Professores do Rio Grande do Sul (...), pais (...) e alunos da institui- ção de ensino (...), que se solidarizaram à causa do autor. “Da mesma forma, depreende-se do depoimento das testemunhas Alexandre José Vitalini Paranhos (...), Ana Cláudia Klein Ferreira (...) e Clorinda Elsa da Silva Biegler (...), pertencentes ao corpo do- cente do Colégio Anchieta, que os termos da reportagem são incompatíveis com a retidão profissio- nal e pessoal do autor, bem como os danos causados aos seus direitos personalíssimos.
  • 9. “Assim, tenho que o conteúdo da matéria jornalística, além de ácido, áspero e duro, evidencia a prá- tica ilícita contra a honra subjetiva do ofendido. A reportagem, a partir do momento que qualifica o autor como esquerdista, com viés, de resto, pejorativo, sem a autorização do demandante, extrapola os limites da liberdade de imprensa. “(...) No caso, a informação buscada foi distorcida e manipulada, sendo colocada na reportagem de forma descontextualizada, objetivando unicamente corroborar a ideia lançada da “esquerdiza- ção do ensino” que também seria praticada pelo demandante. (grifo adicionado) A revista está pressupondo que os pais são omissos e não sabem o que os filhos estão aprendendo na escola. Da mesma forma, a publicação é agressiva ao afirmar que os professores levam mais a sério a doutrina- ção esquerdista do que o ensino das matérias em classe, induzindo o leitor a entender que o autor deve ser incluido como este tipo de profissional. “A crítica jornalística, desse modo, configura abuso de direito constitucional, na medida em que os réus, na condição de formadores de opinião, repassaram à sociedade informação manipulada para o bem interesse da publicação. O interesse social, no caso, foi sobrepujado pelo interesse pessoal, financeiro ou político da revista, que envolveu o autor, sem o seu consentimento. (grifo adicionado) “Tenho que a publicação, na medida em que qualifica o autor como esquerdista e questiona o seu método de ensino, é meramente especulativa e inexata. O que mais causa espanto é o fato de os réus terem escondido tanto da escola, como do requerente, o verdadeiro intuito da colheita de in- formações, que colocam em cheque a personalidade e os anos de profissão desempenhado pelo autor junto à comunidade.” (grifo adicionado) Considerando os termos da sentença acima transcritos, na reportagem intitulada “Prontos para o Século XIX”, pela qual Veja foi condenada em primeira e segunda instâncias, será que houve uma “busca honesta da verdade”? Afinal, seria Roberto Civita um homem dissimulado ou simplesmente ingênuo? Minha tendência seria enquadrá-lo na primeira opção, não fossem duas afirmativas perdidas no meio de suas memó- rias. A primeira: “Sempre gostei disso: aperto de mão, a palavra dada, o fio de bigode, olhos nos olhos”.22 A segunda: “Havia uma preponderância da esquerda, dentro da redação, e alguns jornalis- tas da equipe chegaram a ter militância política clandestina, com vida dupla, naqueles chamados anos de chumbo. Sinceramente, eu não percebi. Só me dei conta mais tarde. Vou admitir: eu não me considerava uma pessoa politicamente ingênua, mas eu era”.23 Minha conclusão é que Roberto Civita era um homem ingênuo, tão inacreditavelmente ingênuo que jamais poderia ter ocupado os cargos que ocupou. A imprensa que omite informações e manipula os leitores Introdução A imprensa tem condenado pessoas de modo sumário, considerando-as como criminosas, sem lhes dar o direito de defesa e violando o princípio da presunção de inocência inscrito na Constituição. O modo como a imprensa tem feito isso é pela divulgação de informações que constam dos inquéri- tos policiais, informações que consistem em supostos indícios, de supostos crimes, cometidos por supostos suspeitos. Essas pessoas são consideradas culpadas antes mesmo que tenham sido conde-
  • 10. nadas, julgadas ou sequer denunciadas à Justiça pelo promotor. A imprensa costuma divulgar esse tipo de informação com grande destaque, em forma de manchete. Posteriormente, se confirmada a inocência das pessoas citadas nas investigações, nada será noticiado a respeito, e se for, será – no caso dos jornais – por meio de uma pequena nota de canto de página que dificilmente será notada pelo leitor. Quando essa divulgação é feita pelas revistas semanais e o “suspeito” protesta contra a violação de seus direitos ou contra acusações que considera falsas ou deturpadas, seu protesto ou não é publicado ou é publicado na seção “dos leitores”, onde tem maior probabilidade de passar despercebido porque a seção é pouco lida e porque o protesto se mistura às outras mensagens, pu- blicadas em letra miuda pela revista. É assim que os órgãos de imprensa violam repetidamente um dos direitos constitucionais do cidadão, o direito de resposta proporcional à ofensa.24 Minha tese é que a divulgação de informações sobre pessoas citadas em inquéritos policiais viola o princípio constitucional da presunção de inocência. A razão está na natureza do inquérito policial, que vale examinar. Inquérito policial é uma investigação realizada pela polícia civil com dois obje- tivos: a) confirmar a materialidade do crime, isto é, verificar se houve realmente um crime e quais suas circunstâncias, e b) buscar indícios de autoria, ou seja, identificar o possível autor, para que o promotor público possa denunciá-lo ao juiz. O inquérito policial não faz parte do processo penal nem é conduzido pelo Poder Judiciário. Trata-se de um procedimento administrativo informativo que antecede a ação penal propriamente dita, e que é realizado por um órgão do Poder Executivo. No inquérito policial, não existe acusado, pois, a princípio, não se sabe sequer se houve um crime, e ainda que o delegado de polícia conclua que houve um delito, esse será apenas o parecer da autori- dade policial, pois quem decide se o fato constitui crime não é o delegado de polícia, nem mesmo o promotor, mas apenas o juiz. E mesmo que o juiz decida que houve crime, ele poderá rejeitar a indi- cação feita pela autoridade policial em relação a quem é o possível autor. Assim, antes que o juiz diga que houve um crime e que há indícios de que fulano de tal é o possível autor, legalmente não há nada. Somente se o juiz aceitar a denúncia do promotor é que haverá um processo e um acusado. Em tais condições, para se observar o princípio da presunção de inocência durante o inquérito poli- cial, não se deve tratar ninguém como réu, nem mesmo como suspeito ou investigado, porque o in- quérito não é instaurado para investigar quem quer que seja, isto é, não existe inquérito policial contra uma pessoa, mas sim, para apurar a ocorrência de um possível delito. Se as pessoas citadas em um inquérito devem ser consideradas inocentes até que haja uma decisão definitiva da Justiça, então elas estão na mesma condição de todas as outras, e seu nome não deveria ser divulgado em nenhuma hipótese, salvo para fins de captura em caso de decretação da prisão preventiva. O caso O caso relatado a seguir é exemplo de como um órgão de imprensa – o jornal O Estado de São Pau- lo – e os jornalistas autores das respectivas matérias, a pretexto de zelar pelo interesse público:  Trataram como criminoso uma pessoa citada em inquérito policial;  Omitiram informações do público;  Desobedeceram o princípio do pluralismo jornalístico;  Desobedeceram o princípio do interesse público na divulgação de informações;  Violaram a Constituição e a Lei;  Violaram o Código de Ética e Autorregulamentação da ANJ – Associação Nacional de Jornais;  Violaram o Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros.
  • 11. O caso em questão é a operação Faktor, anteriormente denominada Boi Barrica, nome dado a uma investigação da Polícia Federal. O personagem central, um empresário, tem dois fatores contra si: é filho de um conhecido político e tem contra si vários supostos indícios apurados durante o inquérito policial. Escolhi o caso desse empresário exatamente porque não tenho nada a favor dele. Trata-se de Fernando Sarney, filho de José Sarney, hoje ex-senador, ex-governador do Maranhão, ex-presi- dente do Senado e ex-Presidente da República. O que “O Estado” noticiou 1) Gravação liga Sarney a atos secretos. (22.07.09) Uma sequencia de diálogos gravados pela Polícia Federal com autorização judicial, durante a Operação Boi Barrica, revela a prática de nepotismo explícito pela família Sarney no Senado e amarra o presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), ao ex-diretor-geral Agaciel Maia na prestação de favores concedidos por meio de atos secretos.25 2) Desembargador censura ‘O Estado’ no caso Sarney. (31.07.09) O desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), proibiu o jornal “O Estado de São Paulo” de publicar reportagens que contenham informações da Operação Faktor, mais conhecida como Boi Barrica. O recurso judicial, que pôs o jornal sob censura, foi apresentado pelo empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).26 3) Nunca faria campanha para censurar, diz Fernando Sarney. (03.08.09) Em nota enviada à imprensa nesta segunda-feira, 3, Fernando Sarney disse que nunca fez uma campanha para cen- surar meios de comunicação. (...) Leia na íntegra a nota enviada por Fernando Sarney: “(...) sempre defendi a liberdade de imprensa e a livre manifestação de opinião, e jamais promoveria ou apoiaria qualquer iniciativa que pudesse ser interpretada como censura. É lamentável, por- tanto, que uma decisão judicial que simplesmente exige o respeito a garantias constitucionais inerentes a todo cidadão – intimidade, privacidade, honra e imagem – esteja sendo apresentada como forma de censura à imprensa, que vem divulgando, ilicitamente, informações sob sigilo expressamente imposto pelo Judiciário. Ao recorrer à Justiça contra o que considero uma injus- tiça e uma violência contra mim e a minha família, apenas defendi direitos que me são assegu- rados pela Constituição. Considerar o uso de um direito legítimo como uma maneira de impor censura à imprensa não passa de tentativa de distorcer os fatos. Atenciosamente, Fernando Sarney”27 4) Polícia Federal indicia filho de Sarney por lavagem de dinheiro. (16.07.09) Filho do presi- dente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), o empresário Fernando (...) Sarney foi interrogado nesta quarta-feira, 15, por pelo menos seis horas na Superintendência da Polícia Federal do Ma- ranhão, em São Luís, no âmbito da Operação Boi Barrica. Saiu indiciado por lavagem de dinhei- ro, tráfico de influência e formação de quadrilha.28 5) Desembargador nega liminar do ‘Estadão’ contra censura. (13.08.09) O desembargador Waldir Leôncio Cordeiro Lopes Júnior, da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF), rejeitou nesta quinta-feira, 13, um pedido de liminar feito pelo jornal „O Esta- do de São Paulo‟ para que fosse liberada a publicação de reportagens sobre Fernando Sarney, fi- lho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), no âmbito da Operação Boi Barrica. Lo- pes Júnior, invocando prudência, deixou para deliberar acerca do mandado apenas depois que
  • 12. receber informações do próprio Dácio Vieira e o parecer da Procuradoria de Justiça. “Malgrado o inconformismo do impetrante com a decisão judicial impugnada, está sendo observado o devi- do processo de direito”, assinalou o desembargador. Segundo ele, “o rito do mandado de segu- rança é célere, por isso é mais prudente que se aguarde para deferir ou não a providência reque- rida no momento do julgamento do writ (mandado), quando a questão estará madura”.29 6) Recurso contra censura ao ‘Estado’ chega ao Supremo. (18.11.09) A batalha do Estado para se desvencilhar da mordaça que o cala há 110 dias chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF). Por meio de um recurso denominado reclamação (...), protocolado ontem de manhã na mais alta instância do Judiciário, a defesa do jornal ataca (...) o decreto de censura baixado pelo desem- bargador Dácio Vieira, da 5ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF). Para (...) [o advogado de „O Estado‟], o TJ-DF “desacatou” o histórico julgamento do STF que culminou com a revogação da Lei de Imprensa, do regime autoritário. (...)”.30 7) STF rejeita recurso e censura ao ‘Estado’ continua em vigor. (10.12.09) O Supremo Tribunal Federal (STF), por 6 votos a 3, arquivou nesta quinta-feira, 10, a reclamação em que os advogados do Estado pediam o fim da proibição ao jornal de publicar reportagens sobre a Ope- ração Boi Barrica, que investigou o empresário Fernando Sarney (...). Com isso, fica mantida a censura imposta no fim de julho pelo desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJ-DF). De acordo com a ala do Supremo vencedora no julga- mento desta quinta, a decisão judicial do TJ-DF de censurar o jornal baseou-se na Constituição e na legislação que trata de interceptações telefônicas. Portanto, não haveria referência à Lei de Imprensa e ao julgamento de abril do STF. Por esse entendimento, não caberia reclamação ao Supremo por suposto desrespeito à decisão da corte.31 8) Polícia Federal indicia Fernando Sarney pelo crime de evasão de divisas. (07.05.10) A Polí- cia Federal indiciou nesta sexta-feira, 7, o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), pelo crime de evasão de divisas. Ano passado, ele já havia si- do indiciado por formação de quadrilha, gestão de instituição financeira irregular, falsidade ideológica e lavagem de dinheiro.32 9) STJ anula provas contra filho de Sarney. (17.09.11) O Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou as provas colhidas durante a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, que investigou suspeitas de crimes cometidos por integrantes da família do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP). Os ministros da 6ª Turma do STJ consideraram ilegais interceptações telefônicas feitas durante as investigações. (...) Com a anulação das interceptações ficam comprometidas outras provas obtidas posteriormente, resultantes de quebras de sigilo bancário e fiscal. (...) Com as escutas e informações sobre movimentação financeira, a PF abriu cinco inquéritos e apontou indícios de tráfico de influência no governo federal, formação de quadrilha, desvio e lavagem de dinheiro.33 O que “O Estado” não noticiou e o que ficou oculto 1) Em 1º de novembro de 2006, o COAF – Conselho de Controle de Atividades Financeiras do Mi- nistério da Fazenda – enviou à Polícia Federal um RIF – Relatório de Inteligência Financeira – dando conta de movimentação financeira atípica nas contas-correntes bancárias de algumas pes- soas físicas e jurídicas, entre elas Fernando Sarney. No ofício que acompanhou o Relatório, o COAF destacou que a) movimentações financeiras atípicas não podem, necessariamente, ser
  • 13. consideradas ilícitas (grifo adicionado), b) as informações constantes do RIF são classificadas como confidenciais, nos termos da Lei 8.159/91, ficando o destinatário responsável pela sua pre- servação, c) não se recomenda a inclusão do RIF em inquéritos ou processos. A partir dessa co- municação, no dia 22 de novembro a Polícia Federal instaurou o Inquérito nº 001/2007, a fim de investigar as referidas movimentações. 2) Em setembro de 2007, a TV Mirante, de propriedade de Fernando Sarney, recebeu, de um audi- tor da Receita Federal, um Termo de Intimação Fiscal. Foi estabelecido um prazo de cinco dias para que o empresário fornecesse os Livros Diário e Razão do ano calendário de 2006 com exer- cício em 2007 e os documentos relativos aos fatos contábeis registrados nos livros da emissora de televisão, retransmissora da Rede Globo no Maranhão. 3) Após o pedido da Receita Federal, os advogados do empresário impetraram mandado de segu- rança junto à 1ª Vara da Justiça Federal do Maranhão para ter acesso ao inquérito policial em que Fernando Sarney, na condição de sócio da TV Mirante, faria parte. Na petição, os advoga- dos destacaram que “há fundadas suspeitas de que o sigilo de dados do paciente, seus sócios e advogados esteja sendo violado pela Polícia Federal (...)” (grifo adicionado) Embora o art. 7º, inciso XIV, da Lei 8.906/94, estabeleça que o advogado tem direito de examinar autos de inqué- rito em qualquer repartição policial, o pedido foi negado em primeiro grau e também pelo Tribu- nal Regional Federal da 1ª Região, sob a justificativa de que o processo estava em plena tramita- ção e que o sigilo era necessário para o sucesso das investigações. Contra essas decisões, a defe- sa de Fernando Sarney impetrou habeas-corpus no STJ. Em 19.12.07, o ministro Napoleão Nu- nes concedeu liminar para que os advogados tivessem acesso ao inquérito e, em 10.09.08, o mi- nistro Paulo Gallotti confirmou a concessão do habeas-corpus. 4) Agentes públicos permitiram que o jornal „O Estado de São Paulo‟ tivesse acesso ao conteudo das comunicações telefônicas interceptadas com autorização judicial. Ocorre que, de acordo com o art. 8º da Lei 9.296/96, é obrigatória a preservação do sigilo “das diligências, gravações e transcrições respectivas.” Por outro lado, de acordo com o art. 151, § 1º, inciso II, do Código Pe- nal, a divulgação indevida de comunicações telefônicas é crime punido com detenção de um a seis meses, ou multa. Em outras palavras, agentes públicos em tese cometeram um crime ao per- mitir a divulgação do conteudo de comunicações telefônicas de Fernando Sarney interceptadas com autorização judicial. 5) O „Estado‟ deixou de noticiar que: a) Fernando Sarney, por intermédio de seu advogado, pediu providências ao Ministério Público Federal do Maranhão para apurar o vazamento dos diálogos da Operação Boi Barrica;34 b) O corregedor-geral da Justiça Federal deu 48 horas para que o corregedor do Tribunal Regional Federal da 1ª Região informasse quais as providências tomadas em relação ao vazamento de conversas telefônicas no inquérito relativo à Boi Barrica.35 O jornal não noticiou esses fatos porque, se o fizesse, ficaria claro que o „Estado‟ foi beneficiário e cúm- plice de uma grave irregularidade, para não dizer de um crime. 6) O „Estado‟ violou o princípio da pluralidade jornalística, segundo o qual todo órgão de imprensa tem o dever de assegurar a seu público o acesso a todas as interpretações e opiniões a respeito de um mesmo fato, ainda que opostas.36 O jornal violou esse princípio ao divulgar apenas depoi- mentos de personalidades e entidades que condenavam a “censura” ao „Estado‟ na operação Boi Barrica, no intuito de fazer o público crer, erroneamente, que essa condenação era unânime.37, 38 Em contraste, outros órgãos de comunicação publicaram depoimentos que põem por terra a falsa
  • 14. unanimidade que o „Estado‟ tentou criar. Por exemplo, o site Consultor Jurídico publicou o arti- go intitulado “Censura do jornal O Estado de S. Paulo é discutível”, de autoria de Francisco Ce- sar Pinheiro Rodrigues, desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo.39 O jor- nal Folha de São Paulo, por sua vez, publicou o artigo intitulado “Coletar provas sem driblar a Constituição”, de Antônio Carlos de Almeida Castro, advogado criminalista. Subtítulo do artigo: “Quando a PF [Polícia Federal] e o MP [Ministério Público] praticam abusos, acatados por jui- zes voluntariosos, ocorre muito mais do que uma injustiça contra o cidadão investigado”.40 Ao fazer pouco caso do pluralismo jornalístico, o „Estado‟ violou o preceito nº 5 do Código de Ética e Autorregulamentação da ANJ – Associação Nacional de Jornais.41 7) Os jornalistas do „Estado‟ violaram os seguintes preceitos do Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros: “Art. 6º É dever do jornalista: (...) VIII – respeitar o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem do cidadão; (...) X – defender os princípios constitucionais e legais, base do estado democrático de direito; (...) Art 9º A presunção de inocência é um dos fundamentos da atividade jornalística.” 42 8) A notícia “Gravação liga Sarney a atos secretos” se inicia com a frase “Uma sequencia de diálo- gos gravados pela Polícia Federal com autorização judicial ...”. A frase foi fabricada com o obje- tivo de induzir o público a concluir que era legítima não apenas a interceptação das comunica- ções telefônicas mas também a divulgação do respectivo conteúdo. O „Estado‟ redigiu esta no- tícia com a finalidade de ocultar a ilegalidade – da qual foi beneficiário e cúmplice – da divulga- ção das comunicações telefônicas interceptadas com autorização judicial. 9) A notícia “Polícia Federal indicia filho de Sarney por lavagem de dinheiro” contém a informa- ção de que “Fernando (...) Sarney foi interrogado (...) por pelo menos seis horas na Superinten- dência da Polícia Federal do Maranhão, em São Luís (...)”. Se ele depôs durante seis horas, com certeza apresentou argumentos de defesa e provavelmente documentos que demonstrassem sua inocência. É de se supor que o „Estado‟ tinha acesso ao depoimento. O jornal, porém, não publi- cou uma linha sequer sobre a defesa apresentada por Fernando Sarney. 10)A Lei 9.296/96 assim dispõe: “(...) Art. 2° Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses: I – não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal; (...)” O significado do dispositivo reproduzido acima é que a interceptação de comunicações telefôni- cas não pode ser a primeira diligência em uma investigação criminal. Primeiro, é preciso inves- tigar. Se forem descobertas evidências de que houve crime, bem como indícios de autoria, então a polícia poderá pedir autorização para interceptar comunicações telefônicas que reforcem as evidências colhidas.
  • 15. Esse procedimento, porém, não foi seguido no caso da operação Boi Barrica. A Polícia Federal pediu autorização para interceptar comunicações telefônicas exclusivamente com base no RIF recebido do COAF. Ocorre que movimentações financeiras atípicas não são indício de crime. Não obstante, a Justiça autorizou a escuta, cujo prazo foi prorrogado 18 (dezoito) vezes. É por essa razão que o STJ decretou a nulidade das provas assim obtidas. No caso, o juiz federal do Maranhão que autorizou a escuta desobedeceu a lei. 11)Em 21.09.11, o „Estado‟ publicou a seguinte notícia: “Processo que anulou provas da PF na Boi Barrica correu em tempo recorde”.43 Nessa notícia, o jornal afirma que, enquanto a duração do processo da Boi Barrica no STJ foi de nove meses, o da operação Satiagraha tramitou durante um ano e oito meses e o da operação Castelo de Areia levou cerca de dois anos. O jornal, porém, não informa qual foi o critério utilizado para definir a duração dos processos. Se considerarmos que a duração de um processo no STJ vai da data de seu registro até a data da decisão dos juizes, então o prazo do processo em questão foi realmente de nove meses. Se o término da duração, porém, for definido como a data de publicação do acórdão, então o processo da Boi Barrica tra- mitou durante um ano. Ademais, a notícia em pauta não leva em conta que uma possível razão para a tramitação mais célere de um processo é a repetição, ou seja, quando os juízes decidem repetidamente causas semelhantes, as decisões tendem a tornar-se progressivamente mais rápi- das. No caso, tratava-se do terceiro processo de anulação de provas ilegais. Mais grave, porém, é que o próprio título da notícia, bem como os dados nela contidos, insinuam que os ministros do STJ decidiram o processo rapidamente porque tinham interesses escusos no assunto. 12)Em 07.03.10, o „Estado‟ reproduziu notícia do jornal Folha de São Paulo, segundo a qual “Do- cumentos enviados ao governo brasileiro por autoridades chinesas comprovam (grifo adiciona- do) que o empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB- AP), mantém uma conta corrente no exterior não declarada à Receita Federal.”44 No dia seguin- te, o desmentido: “China não confirma conta de filho de Sarney (...).”45 Na ânsia de atacar Fer- nando Sarney e, por tabela, seu pai, o jornal desobedeceu um dos princípios basilares do jorna- lismo, que é a confirmação da notícia antes de sua publicação. Ao deixar de confirmar previa- mente a informação, o „Estado‟ publicou uma notícia falsa, desonrando a confiança recebida dos leitores. O jornal, porém, sequer deu-se ao trabalho de se desculpar. 13)A Imprensa é uma instituição social que existe para satisfazer uma necessidade social específica, a necessidade de informação. Em tais condições, o direito que tem a Imprensa de informar não é autônomo nem se destina a beneficiar a própria Imprensa, mas constitui um acessório do direito principal, que é o direito de a sociedade ser informada sobre os fatos. O direito de informar só existe em função do direito de ser informado, de obter a informação.46 O principal critério de de- cisão sobre o que deve ser informado é o interesse público. A sociedade deixa, tacitamente, a critério dos órgãos de comunicação a decisão sobre quais são as notícias de interesse público a serem publicadas. Dizer, porém, que a sociedade tem o direito de ser informada significa dizer que os cidadãos têm a prerrogativa de abrir mão desse direito. Isto significa que a sociedade po- de decidir que não deseja receber determinados tipos de informação para melhor resguardar seus próprios interesses. Foi o que aconteceu no caso das comunicações telefônicas. A Constituição Federal, que foi elaborada e aprovada pelos legítimos representantes da sociedade brasileira, es- tabeleceu como regra o sigilo das comunicações, sigilo que só poderá ser quebrado com autori- zação judicial, na forma da lei. E tão sério foi considerado esse sigilo que sua violação foi carac- terizada como crime. Em tais circunstâncias, os órgãos de imprensa não tem o direito de desobe- decer a vontade do povo. No presente caso, nenhum jornalista pode alegar interesse público para
  • 16. divulgar o conteudo de comunicações telefônicas interceptadas porque nesse caso, excepcional- mente, devido a uma expressa determinação constitucional e legal, o interesse público reside justamente no oposto, que é a não veiculação da informação. 14)Embora a lei defina como crime a quebra do sigilo das comunicações telefônicas sem autoriza- ção judicial ou a violação do segredo de justiça, não se costuma processar criminalmente o jor- nalista por essas ocorrências em virtude do entendimento de que a responsabilidade por manter o sigilo cabe exclusivamente ao agente público; o jornalista não é, portanto, co-autor do delito. No campo da moral, porém, será ética a publicação da informação? Se o profissional pensasse, ainda que de forma equivocada, estar cumprindo o dever de informar, poder-se-ia desculpá-lo. Ocorre que os órgãos de imprensa a) sabem que o interesse público está na não veiculação de in- formações que a lei considera sigilosas; b) usam rotineiramente esses vazamentos de informação para produzir “furos” de reportagem que lhes rendem prestígio, leitores e anunciantes. Conclui- se, portanto, que tais vazamentos são publicados não por dever, mas por interesse. Por outro la- do, o auxílio dos meios de comunicação tem sido decisivo para que os agentes públicos come- tam impunemente os crimes de quebra de sigilo de comunicações telefônicas e de violação de segredo de justiça. A publicação dessas informações, portanto, é, no mínimo, imoral. Conclusão Por que me dei ao trabalho de defender Fernando Sarney? Não defendi Fernando Sarney. O que eu defendi foi:  O princípio constitucional da presunção de inocência;  O princípio constitucional do sigilo das comunicações telefônicas;  O respeito à Lei e à Ética jornalística;  O princípio constitucional do pluralismo e o consequente princípio do pluralismo jornalístico;  O princípio jornalístico da confirmação da notícia antes de sua publicação. Eu me dei ao trabalho de dissecar a operação Boi Barrica porque repudio a ocultação de informa- ções pela imprensa e porque me recuso a ser manipulado por qualquer veículo de comunicação. Eu repudio o costume repugnante dos órgãos de imprensa de tentar lucrar satisfazendo o prazer tam- bém repugnante e até doentio que muitas pessoas sentem ao ver notícias de crimes, desgraças, aci- dentes e sangue. Conclusão No Brasil, pode-se dizer que o direito do consumidor está razoavelmente desenvolvido no tocante ao consumo de produtos e serviços em geral. Muitas companhias, principalmente as de maior porte, possuem Códigos de Ética contendo um capítulo de Relações com os Clientes, bem como Comitês de Ética para fiscalizar o cumprimento do Código. Os consumidores, por sua vez, já possuem uma consciência razoável a respeito de seus direitos. Em termos de legislação, temos o Código de Defe- sa do Consumidor, criado em 1990. Do ponto de vista estrutural, temos órgãos como os PROCONs, o IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, a Comissão de Defesa do Consumidor da OAB – Ordem dos Advogados do Brasil e o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça. Na internet, existem sites de defesa do consumidor, tais como o Reclame Aqui.
  • 17. Em contraste, quando se trata do consumo de notícias, constatamos que a Ética da imprensa, o grau de consciência do público sobre seus direitos e o grau de desenvolvimento das instituições encarre- gadas de fiscalizar a mídia se encontram em estado embrionário. As empresas de comunicação não possuem Códigos de Ética Jornalística, muito menos Comitês de Ética Jornalística. Do ponto de vista estrutural, não temos órgãos públicos ou privados de fiscalização do trabalho da imprensa. Na internet, dispomos apenas de dois sites de crítica do trabalho noticioso, sites esses praticamente des- conhecidos: o Observatório da Imprensa e o Instituto Gutenberg. A consequência é que as empresas jornalísticas não apenas são muito menos fiscalizadas do que as outras empresas mas também resis- tem em discutir a Ética da imprensa porque isto significaria questioná-las do ponto de vista moral. Os jornalistas se consideram como os “fiscais” nomeados pela sociedade para vigiar a honestidade dos agentes públicos. Por essa razão, seria embaraçoso para as empresas de comunicação se a socie- dade tomasse consciência de que, no seio da classe jornalística, existem indivíduos e empresas com as mesmas misérias morais de outras empresas e categorias profissionais. O estágio incipiente de consciência do público consumidor de notícias se explica, primeiro, pelo baixo grau de instrução da população brasileira como um todo. Em 2011, o número médio de anos de estudo dos brasileiros era de apenas 7,3 anos.47 Isto significa que, em média, o brasileiro não tem sequer a escolaridade correspondente ao ensino fundamental completo. Em segundo lugar, a cons- ciência do brasileiro como consumidor de notícias é baixa em razão do baixo grau de informação da população. O índice de leitura de jornais, no Brasil, em 2009, era de apenas 53,5 exemplares por mil habitantes, o que nos colocava em 95º lugar em uma relação de 177 países. Em comparação, na Noruega, que era o 3º colocado, o índice era 10 vezes maior, de 538 exemplares por mil habitan- tes.48 Em outras palavras, na Noruega, em cada 100 habitantes cerca de 50 lêem jornais, ao passo que aqui, de cada 100 habitantes apenas 5 têm esse hábito. Outro fator que determina a baixa cons- ciência dos consumidores brasileiros de notícias é a falta de pensamento crítico.49 Por fim, um quarto fator a explicar nosso baixo grau de consciência como consumidores de notícias é a falta de noções básicas do jornalismo como a diferença entre fato e opinião e a diferença entre gêneros jor- nalísticos informativos e opinativos. Apesar dessas dificuldades, a população vêm se tornando mais cética em relação à imprensa. O grau de confiança dos brasileiros nos meios de comunicação, em uma escala de 0 a 100, caiu de 71 em 2009 para 60 em 2012, uma queda de cerca de 15%.50, 51 Alguns órgãos de comunicação se aproveitam do baixo grau de consciência jornalística do público para abusar da liberdade de imprensa. Para demonstrar “compromisso apenas com o público”, os meios de comunicação tratam a vida das pessoas com sumária indiferença, violando seus direitos e passando por cima da Constituição, das leis e dos Códigos de Ética da profissão. Muitos profissio- nais da imprensa, por sua própria iniciativa ou sob orientação ou costume dos órgãos em que traba- lham, abusam do direito de informar, muitas vezes causando danos irreparáveis às suas vítimas. A imprensa costuma divulgar informações sobre quaisquer pessoas citadas em inquéritos policiais, sob o argumento de que tais informações são de interesse público. Ao tratá-las como suspeitas, a imprensa faz com que tais pessoas sejam consideradas culpadas pela opinião pública antes mesmo que tenham sido condenadas, julgadas ou sequer denunciadas pelo promotor. A imprensa exerce um verdadeiro poder social, pois tem capacidade de formar opiniões e idéias, mas também é capaz de violar direitos alheios e de causar danos às pessoas. É por essa razão que a Constituição impõe limites à liberdade de imprensa, pois não se pode admitir que qualquer veículo de comunicação social agrida os direitos da personalidade. Nenhum direito é absoluto e o direito de informar não foge à regra.
  • 18. A ideia de limitação da liberdade de imprensa, porém, não é aceita por alguns órgãos de comunica- ção, que resistem a qualquer cerceamento do processo de busca e divulgação de informações “de in- teresse público”. A esse respeito, veja-se a seguinte passagem – surpreendente e inquietante – ex- traida do Manual da Redação do jornal Folha de São Paulo: “A Folha não reconhece legitimidade em nenhuma restrição, legal ou ilegal, que se faça à liberda- de de imprensa. Mas reconhece como legítima a possibilidade de reparação, determinada em juízo, por calúnia, difamação ou injúria, exceto quando veiculada no exercício do dever de informar.”52 A passagem acima, da forma como está redigida, leva à conclusão de que a „Folha‟ não respeita se- quer a Constituição, e de que o jornal se concede a si próprio o direito de cometer calúnia, difama- ção e injúria, desde que no exercício do “dever de informar”. Em outras palavras, a „Folha‟ se atri- bui uma inviolabilidade igual à dos deputados e senadores, que é fixada pela Constituição. Nesse quadro de verdadeira desobediência civil, as empresas jornalísticas também se recusam a res- peitar o sigilo legal que possuem certas informações, bem como o segredo de justiça. Os órgãos de imprensa sempre se referem àquelas informações como “sigilosas” mas nunca mencionam o fato de que se trata de um sigilo estabelecido em lei. Considerada como o “quarto poder”, a imprensa, no Brasil, tem se recusado a obedecer a Constituição e as leis. Esse é um fato muito grave. A continuar assim, o quarto poder se transformará em um poder situado acima dos outros três. NOTAS 1 A meu ver, a forma monárquica de Estado contémelementos não democráticos. 2 MARQUES, Hugo e Rodrigo Rangel. “Espionagemno porto”. Revista Veja, ed. 2326, (46)25, 19 de junho de 2013, pp. 56-59. 3 BONIN, Robson e Hugo Marques. “E agora, general?”. Revista Veja, ed. 2327, (46)26, 26 de junho de 2013, p. 94. 4 Constituição Federal, art. 144, § 4º. Código de Processo Penal, arts. 4º e 304. 5 CARDOSO, Maurício. “Jornalista é condenada a indenizar juiz”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2010-mar- 03/folha-jornalista-sao-condenados-ofensas-juiz-varig 6 ITO, Marina. “TJ-RJ aumenta indenização em ação contra a Folha”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2010-dez- 20/tj-rio-aumenta-indenizacao-juiz-acao-folha 7 “Jornal e jornalista devem indenizar juiz do caso Varig”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2012-ago-08/folha- eliane-cantanhede-pagar-100-mil-juiz-varig 8 STF. ARE 739806 / RJ – Rio de Janeiro. Recurso extraordinário comagravo. Disp. em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28%28ARE+739806+%29%29+NAO+S%2 EPRES%2E&base=baseMonocraticas 9 BONIN, Robson e Adriano Ceolin. “Distribuição de mentiras”. Revista Veja, ed. 2324, (46)23, 5 de junho de 2013, pp. 64-65. 10 ALCÂNTARA, Eurípedes. “Uma vida dedicada à verdade”. Revista Veja, ed. 2324, (46)23, 5 de junho de 2013, p. 90. 11 ALCÂNTARA, Eurípedes. Idem. p. 92.
  • 19. 12 RIVERA, Lourdes Maria Alvarez. “Os jornais paulistas depois do caso Jayson Blair”. Disp. em: http://www.eca.usp.br/pjbr/arquivos/ensaios5_a.htm 13 NOGUEIRA, Luís Artur. “5 escândalos que abalaram a mídia internacional”. Disp. em: http://exame.abril.com.br/mundo/noticias/5-escandalos-que-envolveram-a-midia-internacional?p=4#4 14 “Entenda o escândalo dos grampos envolvendo o News of the World”. Disp. em: http://noticias.uol.com.br/bbc/2011/07/19/entenda-o-escandalo-dos-grampos-envolvendo-o-news-of-the-world.jhtm 15 RIVERA, Lourdes Maria Alvarez. Idem. 16 Observatório da Imprensa. “Para lembrar (e não repetir) Jayson Blair”. Disp. em: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/para-lembrar-e-nao-repetir-jayson-blair 17 AJZENBERG, Bernardo. “Domesticar o „off‟ ”. Disp. em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ombudsma/om2007200303.htm 18 ALCÂNTARA, Eurípedes. Idem. p. 88. 19 ALCÂNTARA, Eurípedes. Idem. p. 92. 20 “Veja terá de indenizar professor por criar estereótipo”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2013-jun-07/revista- veja-indenizar-professor-liga-lo-estereotipo 21 “Apelação civel”. 10ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Disp. em: http://s.conjur.com.br/dl/tjrs-mantem-condenacao-veja-jornalistas.pdf 22 MARANHÃO, Carlos. “Memórias de umeditor”. Revista Veja, ed. 2324, (46)23, 5 de junho de 2013, p. 101. 23 MARANHÃO, Carlos. Idem. p. 99. 24 Constituição Federal, artigo 5º, inciso V. 25 RANGEL, Rodrigo. “Gravação liga Sarney a atos secretos”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,gravacao-liga-sarney-a-atos-secretos,406401,0.htm 26 RECONDO, Felipe. “Desembargador censura 'O Estado' no caso Sarney”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,desembargador-censura-o-estado-no-caso-sarney,411764,0.htm 27 Jornal O Estado de São Paulo. “Nunca faria campanha para censurar, diz Fernando Sarney”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,nunca-faria-campanha-para-censurar-diz-fernando-sarney,412992,0.htm 28 Jornal O Estado de São Paulo. “Polícia Federal indicia Sarney por lavagemde dinheiro”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,policia-federal-indicia-filho-de-sarney-por-lavagem-de- dinheiro,403568,0.htm 29 Jornal O Estado de São Paulo. “Desembargador nega liminar do 'Estadão' contra censura”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,desembargador-nega-liminar-do-estadao-contra-censura,418374,0.htm 30 MACEDO, Fausto. “Recurso contra censura ao „Estado‟ chega ao Supremo”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,recurso-contra-censura-ao-estado-chega-ao-supremo,468127,0.htm 31 GALLUCCI, Mariangela e Felipe Recondo. “STF rejeita recurso e censura ao „Estado‟ continua emvigor”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,stf-rejeita-recurso-e-censura-ao-estado-continua-em-vigor,480133,0.htm 32 Jornal O Estado de São Paulo. “Polícia Federal indicia Fernando Sarney pelo crime de evasão de divisas”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,policia-federal-indicia-fernando-sarney-pelo-crime-de-evasao-de- divisas,548642,0.htm
  • 20. 33 GALLUCCI, Mariangela. “STJ anula provas contra filho de Sarney”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,stj-anula-provas-contra-filho-de-sarney,773843,0.htm 34 BONIN, Robson. “Fernando Sarney pede providências sobre vazamento de diálogos”. Disp. em: http://g1.globo.com/Noticias/Politica/0,,MUL1244482-5601,00- FERNANDO+SARNEY+PEDE+PROVIDENCIAS+SOBRE+VAZAMENTO+DE+DIALOGOS.html 35 Site Consultor Jurídico. “TRF-1 terá de investigar vazamento de grampo”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2009- jul-27/trf-investigar-vazamento-dialogo-entre-sarney-filho 36 O princípio do pluralismo jornalístico decorre do disposto no Preâmbulo e no art. 1º, inciso V, da Constituição Federal. 37 Jornal O Estado de São Paulo. “Entidades denunciam censura prévia contra 'O Estado'”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,entidades-denunciam-censura-previa-contra-o-estado,411948,0.htm 38 COLON, Leandro. “Senadores repudiam censura feita ao 'O Estado'”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,senadores-repudiam-censura-feita-ao-o-estado,412017,0.htm 39 RODRIGUES, Francisco Cesar Pinheiro. “Censura do jornal O Estado de S. Paulo é discutível”. Disp. em: http://www.conjur.com.br/2011-ago-18/censura-jornal-estado-paulo-nao-existe 40 CASTRO, Antônio Carlos de Almeida. “Coletar provas semdriblar a Constituição”. Disp. em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz0610201107.htm 41 Associação Nacional de Jornais. Código de Ética e Autorregulamentação. Disp. em: http://www.anj.org.br/quem- somos/codigo-de-etica 42 Federação Nacional dos Jornalistas. Código de Ética dos Jornalistas Brasileiros. Disp. em: http://www.fenaj.org.br/federacao/cometica/codigo_de_etica_dos_jornalistas_brasileiros.pdf 43 RECONDO, Felipe. “Processo que anulou provas da PF na Boi Barrica correu emtempo recorde”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,processo-que-anulou-provas-da-pf-na-boi-barrica-correu-em-tempo- recorde--,775302,0.htm 44 Jornal O Estado de São Paulo. “Filho de Sarney não declara conta que temno exterior”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,filho-de-sarney-nao-declara-conta-que-tem-no-exterior,520730,0.htm 45 Jornal O Estado de São Paulo. “China não confirma conta de filho de Sarney, diz Tuma Jr.”. Disp. em: http://www.estadao.com.br/noticias/impresso,china-nao-confirma-conta-de-filho-de-sarney-diz-tuma-jr,521011,0.htm 46 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. São Paulo: Malheiros Editores, 2001. p. 250. 47 IBGE. PNAD 2011 – Tabela 3.3 – Número médio de anos de estudo das pessoas de 10 anos ou mais de idade, por Grandes Regiões, segundo o sexo e os grupos de idade – 2009/2011. Disp. em: ftp://ftp.ibge.gov.br/Trabalho_e_Rendimento/Pesquisa_Nacional_por_Amostra_de_Domicilios_anual/2011/tabelas_p df/sintese_ind_3_3.pdf 48 Associação Nacional de Jornais. Leitura de Jornais no Mundo. Disp. em: http://www.anj.org.br/a-industria- jornalistica/leitura-de-jornais-no-mundo 49 Pensamento crítico é a investigação da veracidade de uma sentença. A finalidade do pensamento crítico é reconhecer os enganos ou erros a que somos submetidos no dia-a-dia, impedindo que sejamos manipulados pelo grande número de informações confusas, contraditórias ou mesmo falsas que recebemos diariamente. A ideia do pensamento crítico é questionar tudo aquilo que se lê ou que se ouve. 50 IBOPE. “Índice de Confiança Social mostra que o brasileiro está menos confiante”. Disp. em: http://www.ibope.com.br/pt- br/noticias/Paginas/%C3%8Dndice%20de%20Confian%C3%A7a%20Social%20mostra%20que%20o%20brasileiro %20est%C3%A1%20menos%20confiante.aspx
  • 21. 51 IBOPE. “Confiança do brasileiro no STF é maior do que na Justiça”. Disp. em: http://www.ibope.com.br/pt- br/noticias/Paginas/Confianca-do-brasileiro-no-STF-e-maior-do-que-na-Justica.aspx 52 Jornal Folha de São Paulo. Manual da Redação – Projeto Folha. Disp. em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/circulo/manual_projeto_l.htm *Flavio Farah é Mestre em Administração de Empresas, Professor Universitário e autor do livro “Ética na gestão de pessoas”. Contato: farah@flaviofarah.com.