Este documento resume as razões do Coletivo Alternativa Verde (CAVE) para se opor à desregulamentação da Área de Preservação Ambiental de Santos/Continente. A região contém sítios históricos, arqueológicos e ecológicos importantes, como o Vale do Rio Quilombo que abriga uma grande colônia da ave ameaçada de extinção guará-vermelho. A proposta transformaria extensas áreas em Zonas Portuárias e Retroportuárias, ameaçando esses patrimôn
Relatorio de impacto sobre a APA na area continetal de Santos
1. CAVE – Coletivo Alternativa Verde
AVALIAÇÃO PRELIMINAR de IMPACTO AMBIENTAL na APA
-SANTOS/CONTINENTE nas FUTURAS ÁREAS de OCUPAÇÃO ZPR.
Ref.: Projeto de Lei Complementar da PMS que disciplina o ordenamento do
uso e da ocupação do solo na área continental do município.
O CAVE, Coletivo Alternativa Verde, apresenta neste relatório uma breve
exposição dos motivos pelos quais defende a não desregulamentação da atual
Lei Complementar n º. 54/92, que aprovou a área definida como sendo APA -
Área de Preservação Ambiental em Santos/Continente, como é a proposta do
projeto do executivo em tramitação.
Entendemos ser de suma importância a manutenção da APA já existente,
principalmente no que toca a proposta de transformação de extensas regiões
demarcadas dentro dela em ZPR, Zona Portuária e Retroportuária. Uma das
ZPR se situará na foz e vale do Rio Quilombo e a outra na área compreendida
desde o Sítio das Neves até a ilha Diana. Nessas regiões encontram-se áreas
de distintos interesses de preservação que relatamos a seguir.
Na região do Vale do Rio Quilombo, encontram-se importantes sítios
históricos e arqueológicos, (ruínas e restos de engenhos do século XVI e XVII
e antigos quilombos que denominam a região) alguns deles já tombados pelo
CONDEPHAT, Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico,
Artístico e Turístico do Estado de São Paulo, pelas resoluções 40/85. Ainda
nessa região do Rio Quilombo, encontra-se rica diversidade da fauna silvestre,
em especial o maior ninhal da região da ave guará-vermelho, que encontra-se
em risco de extinção. Além dessa ave, vivem por lá a águia asa-de-telha, o
socó dorminhoco, e as garças azuis entre os pássaros mais raros (ver anexo
fotográfico).
Na outra área, na região do Sítio das Neves, encontra-se extenso sítio histórico
e arqueológico, conhecido como Engenho da Madre de Deus e Igreja de Nossa
Senhora das Neves, patrimônio histórico da humanidade, compreendendo as
ruínas do engenho e da casa de Luiz Góes, cuja construção data de fins do
século XVI. Além disto, encontram-se os restos arqueológicos da antiga vila
de Nossa Senhora das Neves, localizada em frente ao Largo Santa Rita, bem
2. como é uma área onde há vasta quantidade de sambaquis. A ocorrência destes
sítios arqueológicos levou o Instituto de Pré-História da USP a catalogar sua
incidência na área. Portanto, toda esta região adjacente ao Parque Estadual da
Serra do Mar, sofre processo de tombamento realizado pelo CONDEPHAT,
através da resolução n º. 60/88.
Na outra ponta dessa ZPR proposta, encontra-se a comunidade caiçara
remanescente da ilha Diana com aproximadamente 80 habitantes, sem acesso
por terra, medida tomada após a comunidade local ter sido consultada no
início da década e decidido pela preservação da área nativa. Toda a área
intermediária compreendida pela ZPR é repleta de biodiversidade da fauna e
flora nativa, compreendida nos ecossistemas associados de mangue e restinga,
entrecortados por rios e córregos naturais dentro do domínio da Mata
Atlântica. É nessa região por onde passa o Ribeirão das Neves além dos rios
Jurubatuba (que abastece de água o município de Guarujá), Sandi e Diana.
(ver anexo fotográfico)
O Brasil segue sendo signatário da Convenção sobre Diversidade Biológica,
assinada durante a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento da ECO-92, referendado pelo decreto legislativo n º. 02 de
03/02/94, em que a riqueza biológica da mata atlântica é tratada a partir de seu
valor intrínseco, caracterizado pela biodiversidade ecológica, genética, social
e cultural.
Fica evidente a necessidade de manutenção da APA em questão, para que as
futuras gerações tenham a oportunidade de tomar contato com as riquezas
potenciais de nossa região, inclusive o seu uso dentro de um projeto de
desenvolvimento turístico ecologicamente sustentável.
Antes do poder público pensar na ampliação da área portuária do município de
Santos em direção ao continente, faz-se necessária uma auto critica por parte
desse mesmo do poder (Estadual e Municipal), que não teve a competência de
gerir o maior porto da América Latina deixando-o em estado de quase
abandono e péssimo aproveitamento. Não precisamos soterrar novas áreas de
mangues, reservas reprodutoras da fauna marinha, uma vez que a capacidade
atual do porto de Santos encontra-se sub-utilizada. Ainda é possível ampliar
em larga escala o volume de carga que transita atualmente por ele, desde que
sejam racionalizados os seus espaços físicos já existentes, com uma real
otimização do manejo de seus recursos.
3. Gostaríamos de alertar que a desregulamentação dessa APA fere a legislação
existente que incide sobre a regulação dos usos da área em questão, a saber
entre outras:
• Decreto-Lei n º. 25/37, que disciplina o tombamento, em seu artigo n º. 17, proíbe a
destruição, demolição ou mutilação de coisas tombadas.
• Constituição Federal, artigo 23, inciso III e IV, da competência comum da União, dos
estados, do distrito federal e dos municípios:
Inciso III – proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico. Artístico e
cultural, os monumentos as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos :
Inciso IV- Impedir a evasão, destruição e a descaracterização de obras de arte e outros bens
de valor histórico, artístico e cultural;
• Resolução CONAMA n º. 11, 03/12/87, dispõe sobre o Patrimônio
Ecológico/Cultural.
• Constituição do Estado, Artigo 260 - Inciso II, III e IV e Artigo 261 (Caput).
• Constituição Federal, Artigo 170 – Inciso VI, Artigo 225 – Inciso I, II, III e IV
Parágrafo IV.
• Código Florestal, Lei n º. 4771 de 15/09/75, Artigo 2 – Inciso III Alínea D, E, F e H,
Artigo 3 Alínea E e F (Redação dada pela Lei n º. 7803 de 18/07/89).
• Lei n º. 6938 de 31/08/81, da Política Nacional de Meio Ambiente, Artigo 2 Inciso I e
IV, Artigo 4 Inciso VI.
• Lei n º. 9509 de 20/03/97, da Política Estadual do Meio Ambiente, Artigo 1, Artigo 2
Incisos XI e XII, Artigo 3 Inciso VI e VII.
• Constituição do Estado de São Paulo, Artigo 196 (Caput), Artigo 197 – Inciso I, II, III,
IV e V.
• Lei de Crimes Ambientais, Lei 9605 de 02/98, Artigos 2 e 3 Parágrafo Único.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SEMA/CETESB. Mapeamento dos Ecossistemas Costeiros do Estado de São Paulo, 1999.
AVELINE, L.C. Fauna dos manguezais brasileiros. “Rev. Bras. Geografia 42(4), 1980.
DIEGUES, A.C. Comunidades litorâneas e os manguezais no Brasil. “Simp. ecossistemas
da costa sul e sudeste brasileira, 2.” Águas de Lindóia, 1990. Pub. ACIESP 71 (3).
RODRIGUES, F.º e ROQUETTI-HUMAYTA, M.H. Estudo dos manguezais da Baixada
Santista. Relatório final. CETESB, 1988.
4. ANEXOS
1. FOTOGRÁFICO (realizado por Elson Maceió, em agosto e setembro/1999)
Legenda das fotografias anexas:
1) foz do Rio Quilombo, já de encontro ao estuário de Santos
2) águia asa-de-telha em sobrevôo na margem do Rio Quilombo
3) guarás-vermelhos em repouso às margens do Rio Quilombo
4) vista frontal da casa de Luiz Góes, séc. XVI. (parede com 6,5 m de altura)
5) detalhe da lateral da casa de Luiz Góes. (parede c/ 1 m de espessura)
6) vista do cais da antiga Vila de N. S. das Neves, no Largo de Sta. Rita.
7) área de mangue e restinga vista a partir das ruínas do Sítio das Neves
8) visão geral da área de mangue e restinga no vale do rio Jurubatuba.
9) detalhe da vegetação de mangue às margens dos rios Jurubatuba e Diana.
10) vista do rio Diana e vegetação de restinga nas margens. (ao fundo ilha Diana)
11) vista da chegada de barco à vila caiçara da ilha Diana.
12) detalhe de atividade cultural no centro comunitário da ilha Diana.
2. MAPAS:
mapa 1) nova proposta de ocupação APA – Santos/Continente. PMS.
mapa 2) mapeamento dos ecossistemas costeiros da Baixada Santista. CAVE.
Fontes: INPE, SOS Mata Atlântica, IGC, SEMA/CETESB.
Detalhe do trecho a ser desregulamentado para ocupação como ZPR. Nele
encontram-se localizadas as fotografias que acompanham o ensaio.
Leg.: verde (domínio da mata atlântica)
marrom (manguezal)
amarelo (restinga)
vermelho (ocupação urbana)
vermelho escuro (área deteriorada ambientalmente)
Relatório elaborado pelo CAVE- COLETIVO ALTERNATIVA VERDE
Santos, 27/09/1999