1. O Ministério Público move ação civil pública contra vereadores e secretários do município de Ipojuca por improbidade administrativa na distribuição de cestas básicas.
2. Os réus alegam inocência e que a distribuição visava atender a população carente.
3. Após audiência de instrução, o juiz analisa o mérito da ação e afirma que o patrimônio público deve ser usado para o interesse público, e desvios configuram improbidade administrativa.
PROGRAMA DE AÇÃO 2024 - MARIANA DA SILVA MORAES.pdf
Distribuição irregular de cestas básicas em programa social
1. Vara da Fazenda Pública e Marítima
da Comarca do Ipojuca
NPU: 1976-94.2007.8.17.0730
Autor: MINISTÉRIO PÚBLICO DO
ESTADO DE PERNAMBUCO
Réu: AMARO ALVES DA SILVA E
OUTROSS
SENTENÇA
Vistos etc.
1. RELATÓRIO
1.1 Pretensão
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE
PERNAMBUCO propõe a presente ação civil pública por ato de improbidade
administrativa contra os Réus
1. AMARO ALVES DA SILVA
2. CARLOS ANTÔNIO GUEDES MONTEIRO
3. ELIAS JOSÉ DA SILVA, conhecido por ELIAS
PINTOR
1
2. 4. FERNANDO ANTÔNIO DE OLIVEIRA, conhecido
por FERNANDO DE FAUSTO
5. GILSON JOSÉ RIBEIRO, conhecido por GILSON
FICA FRIO
6. JOÃO CARNEIRO DA CUNHA,
7. JOSÉ ALVES BEZERRA JÚNIOR, conhecido por
JÚNIOR ALVES
8. JOSÉ HELENO ALVES,
9. ODIMERES JOSÉ DA SILVA, conhecido por NEM
BATATINHA
10.PAULO AGOSTINHO LINS
11.PEDRO SERAFIM DE SOUZA FILHO e
12.VALTER JOSÉ PIMENTEL, conhecido por
VALTINHO DA SUCATA.
todos qualificados nos autos, objetivando a procedência do pedido no sentido
de condenar:
1. AMARO ALVES DA SILVA, CARLOS ANTÔNIO
GUEDES MONTEIRO, ELIAS JOSÉ DA SILVA,
FERNANDO ANTÔNIO DE OLIVEIRA, GILSON
JOSÉ RIBEIRO, JOÃO CARNEIRO DA CUNHA,
JOSÉ ALVES BEZERRA JÚNIOR, JOSÉ HELENO
ALVES, ODIMERES JOSÉ DA SILVA, PAULO
AGOSTINHO LINS e VALTER JOSÉ PIMENTEL,
nas penas previstas no art. 12, inciso II, da Lei
Federal 8.429/92, de forma gradual, inclusive no
ressarcimento ao erário público do MUNICÍPIO DO
2
3. IPOJUCA da quantia de R$ 136.900,00 (cento e
trinta e seis mil e novecentos reais);
2. PEDRO SERAFIM DE SOUZA FILHO, nas penas
previstas no art. 12, inciso III, da Lei Federal
8.429/92, de forma gradual.
Aduz que através do Inquérito Civil n. 01/2007, da 2a.
Promotoria de Justiça Cível do Ipojuca, foi constatada irregularidades no
programa de distribuição de cestas básicas da Prefeitura do Ipojuca. Sustenta
que em julho de 2007, inúmeras denúncias chegaram à 1a. e 2a. Promotorias de
Justiça do Ipojuca informando que estariam sendo distribuidas cestas básicas
pela Secretaria de Ação Social do Município apenas para pessoas que
possuíssem um cartão numerado e distribuído pelos Vereadores. Aponta que,
em cumprimento à ordem judicial, foram apreendidos inúmeros documentos
comprovando o envolvimento de todos os integrantes do Poder Legislativo
Municipal na distribuição de cestas básicas, com desvio de finalidade pública
do programa. Além disso, a distribuição de cestas pelos vereadores teve a
contribuição do Secretário de Ação Social JOÃO CARNEIRO. Por fim, diz
que houve dano ao eráro público municipal que pagou 3.700 cestas básicas a
empresa COMERCIAL DIALI LTDA., delegando entre os dias 16 e 20 de
julho de 2007, através de cartões numéricos, a entrega das cestas apenas a
pessoas indicadas pelos Vereadores do Ipojuca. O Prefeito do Município do
Ipojuca, sabendo da prática ilícita, incorreu em conduta desarmoniosa,
sengundo afirma o Ministério Público, com a moralidade administrativa.
A petição inicial veio acompanhada do Inquérito Civil n.
01/2007, da 2a. Promotoria de Justiça Cível do Ipojuca.
3
4. 1.2 Manifestação Preliminar / Justificação
Através da Decisão de fls. 854/857 (5o. volume) foi
determinada a indisponibilidade dos bens dos Requeridos e a intimação para
oferta de manifestação preliminar.
O MUNICÍPIO DO IPOJUCA apresentou manifestação
escrita em que trata do programa de suplementação alimentar que foi iniciado
em abril de 2005, sofrendo paralisação em 2007. Diante da dificuldade
enfrentada pela população do Ipojuca, informa o Município do Ipojuca que o
Sr. João Carneiro da Cunha, por conta própria, solicitou de uma empresa
contratada para o fornecimento de cestas básicas a entrega de fichas de
atendimento, pretendendo agilizar a atualização do cadastro e vindo a
distribuir as fichas primeiramente com os Vereadores. Informa que era a
pretensão do Secretário de Ação Social, em um segundo momento, distribuir
tais fichas através do Ministério Público, Poder Judiciário e associações locais.
Diz que quando da busca e apreensão, estariam sendo atendidas as pessoas
indicads por Vereadores que possuíssem os cartões de atendimento. Ao tomar
conhecimento do ocorrido, o Sr. Prefeito determinou a continuidade do
programa sem a distribuição de fichas numeradas e sem o atendimento
exclusivo a pessoas indicadas por quem quer que fosse. Afirma que não houve
uso político do programa, sendo a distribuição mera rotina administrativa.
PEDRO SERAFIM DE SOUZA FILHO apresentou
manifestação preliminar aduzindo que a Lei n. 8.429/92 não se aplica aos
agentes políticos e afirma que não praticou qualquer ato que importe em
improbidade admnistrativa, pois, segundo a Lei Municipal 1.409/2005 e
Decreto 32/2005, a execução e fiscalização do programa de suplementação
alimentar ficou a cargo da Secretaria de Ação Social. Sustenta que não pode
4
5. ser aplicada a responsabilidade objetiva no caso presente, como demonstra em
diversos julgados dos Tribunais de Contas. Diz que jamais houve uso
eleitoreiro do programa de suplementação alimentar.
JOÃO CARNEIRO DA CUNHA, em sede de
manifestação preliminar (fls. 1.287/1.303, do 7o. volume), reproduz os
argumentos apresentados pelo Sr. Prefeito, além de criticar o deferimento da
indisbonibilidade dos bens antes da manifestação preliminar e por não haver
probabilidade de dano.
AMARO ALVES DA SILVA, CARLOS ANTÔNIO
GUEDES MONTEIRO, ELIAS JOSÉ DA SILVA, FERNANDO ANTÔNIO
DE OLIVEIRA, GILSON JOSÉ RIBEIRO, JOSÉ ALVES BEZERRA
JÚNIOR, JOSÉ HELENO ALVES, ODIMERES JOSÉ DA SILVA, PAULO
AGOSTINHO LINS e VALTER JOSÉ PIMENTEL, em sede de manifestação
preliminar (fls. 1.472/1.476, o 8o. volume), também alegaram ser nula a
decisão que decretou a indisponibilidade dos seus bens, aduziram ser o
Ministério Público parte ilegítima e que a Lei Federal 8.429/92 é inaplicável
aos agentes políticos. Apontam que não há justa causa para a promoção da
ação civil pública em tela.
Juntaram documentos diversos.
Por meio da Decisão de fls. 1.610/1.623 (9o. volume), a
petição incial foi recebida, visto que entendido ser aplicável a Lei Federal
8.429/92, não havendo mácula a respeito de sua constitucionalidade, bem
como ser o Ministério Público parte legítima a figurar no polo ativo.
Veio Ofício do TJPE participando Decisão proferida no
AI 161813-1 que suspendeu o decreto de indisponibilidade dos bens dos Réus.
5
6. 1.3 Respostas
PEDRO SERAFIM DE SOUZA FILHO ofertou
Contestação (fls. 1.643/1.644, do 9o. volume), em que reafirma o alegado na
manifestação escrita e junta matéria jornalística onde o Representante do
Ministério Público diz que o Sr. Prefeito não teria qualquer responsabilidade
sobre o fato alegado na inicial.
JOÃO CARNEIRO DA CUNHA ofertou Contestação,
também reafirmando o alegado na manifestação preliminar, além do que disse
haver pobreza extrema no Município do Ipojuca, sendo estas pessoas as reais
destinatárias dos programas sociais.
O TJPE, através do Ofício n. 488/2007-GDRPB, informa
que tornou sem efeito o decreto de indisponibilidade dos bens dos Réus.
Novo Ofício do TJPE (n. 133/2008-GDRPB), em que
informa a manutenção da Decisão que recebeu a petição incial.
AMARO ALVES DA SILVA, CARLOS ANTÔNIO
GUEDES MONTEIRO, ELIAS JOSÉ DA SILVA, FERNANDO ANTÔNIO
DE OLIVEIRA, GILSON JOSÉ RIBEIRO, JOSÉ ALVES BEZERRA
JÚNIOR, JOSÉ HELENO ALVES, ODIMERES JOSÉ DA SILVA, PAULO
AGOSTINHO LINS e VALTER JOSÉ PIMENTEL ofertaram Contestação
(fls. 1.778/1.800, do 9o. volume), refirmando o que foi dito na manifestação
preliminar. Apontam que a petição inicial é vazia, pois destituída de qualquer
fundamento.
Veio o Ofício n. 172/2008 – GDRPB, informando que o
Sr. Prefeito do Município do Ipojuca foi excluído do polo passivo.
6
7. Dispensada a Réplica, foi determinada a exclusão no
registro do Sr. Prefeito do polo passivo. Também foi facultado às partes a
especificação de provas.
1.4 Instrução
As partes demandadas arrolaram testemunhas (fls.
1.817/1.823, do 10o. volume), sendo designada audiência de instrução e
julgamento.
Foi adiada a audiência designada para o dia 03 de junho
de 2008, coforme noticia a assentada de fls. 1.857.
Decisão de fls. 1.869, do dia 10 de junho de 2008, verso,
suspendendo o processo até o julgamento da exceção de suspeição ofertada.
Ofício do TJPE n. 50/10 – 8a. CC/DC, do dia 24 de março
de 2010, informando a rejeição da exceção de suspeição (fls. 1.886).
Designada audiência de instrução, foi o ato realizado nos
dias 10 de novembro de 2010 (fls. 1.990/2.001) e 04 de abril de 2011 (fls.
2.013/2.015), com a coleta da prova oral, sendo designado o dia 18 de abril de
2011 para a audiência de entrega dos memoriais escritos.
1.5 Razões-finais
Em razões finais, o MINISTÉRIO PÚBLICO reiterou
tudo que foi exposto até o presente momento, pugnando pela condenação dos
Réus.
JOÃO CARNEIRO DA CUNHA ofertou razões finais
reiterando sua defesa no sentido de que inexistiu prática de ato de improbidade
administrativa. Informa que o Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco
7
8. acolheu Habeas Corcups Preventido trancando Ação Penal por ausência de
justa causa, isso quanto aos fatos ora narrados nos autos.
Por fim, os Réus AMARO ALVES DA SILVA,
CARLOS ANTÔNIO GUEDES MONTEIRO, ELIAS JOSÉ DA SILVA,
FERNANDO ANTÔNIO DE OLIVEIRA, GILSON JOSÉ RIBEIRO, JOSÉ
ALVES BEZERRA JÚNIOR, JOSÉ HELENO ALVES, ODIMERES JOSÉ
DA SILVA, PAULO AGOSTINHO LINS e VALTER JOSÉ PIMENTEL
ofertaram razões finais aduzindo inexistir prova de prática de ato de
improbidade administrativa. Dizem que as testemunhas foram unânimes em
negar a existência de Vânia Campos, sendo forjada a assinatura nos recibos,
com o ituito de prejudicar os Réus. Pugnam pela improcedência do pedido.
É o Relato. Decido.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 Preliminares
As questões preliminares já foram objeto de Decisão por
este Juízo, estando a instância esgotada neste particular.
2.2 Mérito
Em proêmio, esclareço que não está sob julgamento a
conduta narrada na inicial e atribuída ao Exmo. Sr. Prefeito do Município do
Ipojuca, PEDRO SERAFIM DE SOUZA FILHO, visto que foi excluido do
polo passivo conforme Ofício n. 172/2008 – GDRPB.
8
9. É princípio basico no Direito Administrativo em um
Regime Democrático de Direito que o patrimônio público deve ser empregado
segundo o interesse público pelos gestores públicos.
O gestor público preocupado com as boas práticas
administrativas públicas desenvolve uma série de atos administrativos (meios)
em busca de um resultado (fim) que interesse à coletividade. A grandeza dos
fins é o seu foco de atenção, porém não se deve olvidar, obviamnte, o percurso
ético que se deve ter na execução dos meios.
Quano há inobservância do interesse público no uso das
verbas e recursos públicos, encontra-se o desvio de finalidade e um ato
atentatório à boa administração pública, com prejuízos nefastos à toda
coletividade, que demanda atenção na área de saúde, educação e segurança.
Condutas imorais praticadas pelos gestores públicos, com
ou sem a participação de terceiros, deve ser combatida segundo mecanismos
existentes no Estado Democrático de Direito, visto ser essencial para sua
própria subsistência. Em um regime onde se impera o interesse particular dos
gestores públicos em detrimento do interesse coletivo, a razão de existir do
próprio Estado Democrátivo é posta em xeque. O resultado é funesto, pois a
população sofre com o enfraquecimento do próprio Estado, enfrentando
deficiências no sistema de saúde, educação e segurança, além de forte
restrição à liberdade.
São demagogos todos aqueles que se queixam e
voziferam sobre deficiências dos sistemas de saúde, educação e segurança mas
não se acanham em “meter a mão” nos recursos públicos na primeira janela de
oportunidade.
9
10. Para ser homem1 público é preciso ter espírito público.
Não basta ostentar um cargo público. Muitas pessoas praticam ações em prol
do bem comum sem carregar qualquer encargo público.
No caso dos autos, as provas trazem a convicção de que
os Réus não honraram a confiança que lhes foi depositada pelo povo
ipojucano (no caso dos Vereadores) e a confiança depositada pelo Chefe do
Poder Executivo (no caso do Secretário de Ação Social). Em uma ação
organizada, envolvendo diversas pessoas, tiraram preciosos recursos dos
cofres do Município do Ipojuca para atender seus próprios interesses (manter
uma população faminta sob seu cabresto).
Diversos populares procuraram o Ministério Público para
formalizar reclamação a respeito da forma como as cestas básicas estavam
sendo distribuídas em meados de julho de 2007 (fls. 07/15). Sete populares
informaram no Ministério Público que a distribuição de cestas básicas pela
Secretaria de Ação Social estava condicionada à entrega de vales pelos
Vereadores da Câmara Municipal do Ipojuca. Apenas pessoas escolhidas pelos
Vereadores receberiam as cestas. Descreveram que os cartões eram vermelhos
e que os comentários correntes na população era de que apenas quem votou
nos Vereadores receberiam os vales para aquisição de cesta básica.
Em vista disso, deferindo o requerimento formulado pelo
Parquet, o Juízo Criminal da Comarca do Ipojuca expediu Mandado de Busca
e Apreensão visando todos os documentos referentes ao “Programa de
Distribuição de Cestas Básicas do Município do Ipojuca”, no exercício 2007, a
ser realizado nas dependências da Secretaria de Ação Social do Município.
Por seu turno, três servidoras públicas municipais
ouvidas no Ministério Público (fls. 59/67) informaram que eram responsáveis
1
Empregado como ser humano, independentemente do gênero.
10
11. pelo preenchimento de fichas de cadastro no Programa de Distribuição de
Cestas Básicas, recebendo dos populares um cartão vermelho numerado. Os
números correspondiam a um dos Vereadores, sendo anotadas as correlações
na lista de pessoas que iriam receber as cestas básicas.
O Réu João Carneiro da Cunha confirmou perante o
Ministério Público que no mês de julho de 2007 as cestas básicas eram
distribuídas segundo indicação dos Vereadores e que haveria restrições para
quem não fosse eleitor no Município de Ipojuca. Neste último caso, haveria
necessidade de uma investigação da assistência social (fls. 68/73).
Como resultado da Busca e Apreensão, foram enviados
pelo Exmo. Sr. Delegado ao Ministério Público diversos documentos (por
amostragem), onde se destacam as Fichas de Atendimento.
Nestas Fichas de Atendimento constam observações que
vinculam a distribuição das cestas aos cartões numerados entregues pelos
Vereadores BATATINHA (fls. 75), AMRARO ALVES (fls. 98), CARLOS
MONTEIRO (fls. 86), ELIAS PINTOR (fls. 92), FERNANDO DE FAUSTO
(fls. 77), GILSON FICA FRIO (fls. 79;82), JUNIOR ALVES (fls. 94), JOSÉ
HELENO (fls. 88) e PAULO LINS (fls. 84).
Também é de se destacar que dentre os documentos
apreendidos existia uma lista (fls. 96) contendo o nome de cada Vereador com
a respectiva seqüência numérica dos cartões, onde foram destinados 500
individualmente, totalizando 5.000 cartões vermelhos (fls. 97 e 133 envelope).
Os documentos que até aqui ilustram os autos são
públicos, apreendidos em órgão público por ordem regular da autoridade
competente.
Denúncia formalizada no sítio eletrônico do Ministério
Público pelo Sr. Agripino Limeira de Souza Neto (fls. 104) corroboram com o
11
12. que té aqui foi apurado, pois participa que a distribuição dos cartões para
recebimento de cestas básicas pelos Vereadores era feita nos locais onde os
políticos eram votados, mediante a entrega dos vales por seus cabos eleitorais.
No Contrato –PMI Nº 38/2007 firmado entre o Município
do Ipojuca e a empresa Comercail DIALI LTDA., foi ajustado o fornecimento
de 156.000 cestas básicas (fls. 188/199) em um período de 12 meses, no preço
de R$ 5.772.000,00 (cinco milhões setecentos e setenta e dois mil reais).
Assim, cada cesta custou o preço de R$ 37,00 (trinta e sete reais). A empresa
informou que entre os dias 16 e 20 de julho de 2007 foram distribuídas
aproximadamente 3.700 cestas básicas e confeccionados 15.000 cartões em
PVC para serem distribuídos no Programa Cesta do Povo (fls. 185/186).
A Sra. CINTIA KELLY confirmou que os 15.000 cartões
foram doados por sua empresa à Secretaria de Ação Social no mês de junho de
2007 (fls. 217). Chama a atenção pela atipicidade o fato da Sra. CINTIA
KELLY ser sócia majoritária da empresa fornecedora das cestas básicas, tendo
integralizado R$ 152.600,00 (cento e cinquenta e dois mil e seiscentos reais)
em cotas da sociedade e trabalhado até então como doméstica (fls. 218 e 221).
O Sr. Fábio Luiz Gouveia Sá Barreto, ao que indicam os depoimentos,
transferiu suas cotas à Sra. Cintia Kelly por questões que envolve o divórcio
daquele, exercendo atualmente a função de conselheiro e representante
comercial da empresa (fls. 233/234).
Outros populares, em depoimentos prestados no
Ministério Público (fls. 230 e 793), reforçam a afirmação de que a entrega dos
cartões numerados pelos Vereadores estava condicionada à inscrição eleitoral
em Ipojuca. Não receberia o cartão dos Vereadores aquele que, mesmo carente
e residente no Município, votasse em outra Zona Eleitoral.
12
13. Chama a atenção o documento de fls. 787 que atesta a
entrega dos Cartões Numerados aos Vereadores. Esta distribuição for
novamente confirmada pelo Réu JOÃO CARNEIRO DA CUNHA perante a
Autoridade Policial (fls. 765). Esta mesma listagem se encontrava em diversos
envelopes apreendidos na Secretaria de Ação Social (fls. 848/851).
O Município de Ipojuca, em manifestação apresentada
aos autos, informou que o Réu JOÃO CARNEIRO DA CUNHA, de sua livre
iniciativa, obteve de uma empresa os cartões numerados e os entregou aos
Vereadores para que as cestas fossem distribuídas.
Contudo, também alegam os Réus que havia uma
programação para que as cestas básicas fossem distribuidas pelo próprio
Ministério Público, Poder Judiciário e entidades assistenciais. Apresentaram
diversos Ofícios do Ministério Público encaminhando populares que
procuravam aquele órgão em busca de ajuda à Secretaria de Ação Social. As
situações, porém, não se confundem.
É perfeitamente legítimo quando um órgão público
encaminha o caso de alguém para ser atendido por outro órgão público
competente, sem que isso implique uma obrigação, comando ou ingerência.
Outra situação completamente diferente é quando agentes públicos
determinam, em comunhão de propósito, que outro órgão público de diferente
hierarquia e atribuições tome ações sobre seu comando.
Constitui um artifício canhestro de defesa a alegação de
que em outras ocasiões futuras a distribuição de cestas básicas seria feita pelo
Poder Judiciário e Ministério Público. A experiência mostra que fato como
este narrado pela defesa jamais aconteceu.
No meu sentir, as diversas provas apresentadas demonstram
que houve uma ação deliberada e organizada para a distribuição de cestas básicas
13
14. à população carente pelos Vereadores, sob a regência do Secretário JOÃO
CARNEIRO DA CUNHA.
Em depoimento prestado judicialmente, o Sr. Secretário
JOÃO CARNEIRO DA CUNHA entrou em forte contradição. Inicialmente
queria fazer crer que a entrega dos cartões numerados aos Vereadores era
apenas para fins de encaminhamento dos necessitados à Secretaria de Ação
Social, que avaliaria se seria o caso de entrega ou não das cestas. Logo em
seguida, disse que a confecção dos cartões numerados em PVC visava evitar a
sua falsificação. Ora, a experiência nos mostra que a proteção contra a
falsificação de documento só se faz necessária quando este documento tem
valor ou crédito considerável. Se fosse verdadeira a afirmação de que o cartão
numerado em PVC corresponoderia a um encaminhamento, não haveria a
necessidade sequer da confecção deste cartão de elevado custo, pois bastaria
dizer ao popular que procurasse a Secretaria de Ação Social para ter seu caso
avaliado. Todavia, o valor atribuído ao cartão numerado pelo Secretário JOÃO
CARNEIRO DA CUNHA foi bem maior, pois se sua preocupação era evitar
uma falsificação ele só poderia ver o cartão como um título ao portador, pelo
qual o seu detentor teria o direito inquestionável de obter uma cesta básica.
Os Vereadores, ora Réus, foram mais ousados em sua
defesa, pois se arriscaram na negativa geral dizendo desconhecer a
distribuição de cartões numerados. À exceção dos Vereadores e de seus
Assessores ouvidos como testemunhas em Juízo, todos afirmaram,
confirmando as diversas provas materiais, que a entrega aos Parlamentares dos
cartões numerados com validade de uma cesta básica foi fato corrente e
aplicado nos dias 16 a 20 de julho de 2007. Isso agravado ao fato de que a
entrega dos cartões aos populares era condicionada à inscrição eleitoral no
Município do Ipojuca.
14
15. Os programas assistenciais à população carente são
necessários. A distribuição de 156.000 cestas básicas à população carente é
louvável. Não se justifica, pela necessidade e carência de pessoal para a
distribuição de cestas básicas, a ausência de critérios claros e objetivos,
observada a finalidade do ato administrativo. Entretanto, é ilícita a ação de
separar 5.000 cestas básicas custeadas pelo Município do Ipojuca para serem
entregues pelos Vereadores/Réus segundo suas conveniências políticas,
olvidando por completo a real necessidade da população carente.
2.3 Aplicação do art. 12 da Lei n. 8.429/92
Há provas fartas de que as ações dos Réus causaram
prejuízo ao erário, pois agiram dolosamente em detrimento do patrimônio
público quando da realização de doações de cestas básicas segundo critérios e
interesses pessoais. Desta forma, entendo que os Réus incorreram em na
conduta descrita no art. 10 da Lei 8.429/92, fazendo incidir as conseqüências
do art. 12, inciso II, da LIA. A aplicação das sanções civis previstas no art. 12
deve ser feita de forma razoável e proporcional ao ato amoral e prejuízo
causado, sendo necessária a apresentação, pelo julgador, das suas razões para
cada qual (art. 12, parágrafo único da LIA).
Diante do grande número cartões numerados para a
distribuição de cestas básicas para 5.000 famílias carentes, houve a intensão
dolosa de atingir grande parcela da população formada por aproximadamente
80.000 habitantes. Não houve interesse na proteção do bem comum e na
satisfação da real necessidade da população carente, sendo a própria carência
financeira utilizada como moeda de troca política e manutenção da degradável
situação enfrentada pelo povo. Ações como estas praticadas pelos Réus só
15
16. fazem agravar o baixíssimo IDH – Índice de Desenvolvimento Humano do
Município do Ipojuca, que contraditoriamente é considerado o terceiro mais
abastardo de todo o Estado de Pernambuco.
Canta-se aos quatro cantos que a prosperidade chegou em
Pernambuco, especialmente em Ipojuca, novo polo de desenvolvimento
industrial do Estado. Esta prosperidade só será sentida pela população carente
se esta tiver acesso imediato aos recursos adequados (educação e saúde) para o
ingresso no mercado de trabalho e, consequentemente, acesso a um patamar
socio-econômico digno, sem depender de ações clientelistas revestidas de uma
aparência assistencial.
Se os esforços e organização empregados pelos Réus e
verificados nos autos tivessem por fim a instrução e saúde das pessoas (com
interesse apenas no bem comum), certamente a população teria a devida
atenção em prol da almejada dignidade. Enquanto as condições adequadas de
educação e saúde forem negadas à população carente, o único futuro em vista
é a de cidadãos de segunda classe subservitenes aos favores alheios.
Em vista disso, a manutenção da função publica pelos
Réus milita pela malversação da moralidade da administração pública e
patrimônio público.
Deve o dano ao patrimônio público ser ressarcido pelos
Réus, solidatiamente. Este dano corresponde à entrega de 3.700 cestas básicas
ocorridas entre os dias 16 a 20 de julho de 2007, que corresponde ao valor de
R$ 136.900,00 (cento e trinta e seis mil e novecentos reais).
A suspensão dos direitos políticos dos Réus deve incidir
pelo mínimo legal, cinco anos, pois condizente com a conduta empreendida
contra a Administração Pública municipal acima descrita.
16
17. De igual modo, deve ser fixado o pagamento de multa
civil pelos Réus, solidariamente, de no valor correspondete a 2 vezes o dano,
importando na quantia de R$273.800,00 (duzentos e setenta e três mil e
oitocentos reais).
Por fim, em vista da gravidade do ato, deve-se aplicar aos
Réus a proibição de contratarem com o poder público ou receberem benefícios
e incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, pelo prazo de cinco
anos.
3. DISPOSITIVO
Isto posto, julgo PROCEDENTE o pedido formulado na
inicial para, em vista do Ato de Improbidade Administrativa praticado pelos
Réus, AMARO ALVES DA SILVA, CARLOS ANTÔNIO GUEDES
MONTEIRO, ELIAS JOSÉ DA SILVA, conhecido por ELIAS PINTOR,
FERNANDO ANTÔNIO DE OLIVEIRA, conhecido por FERNANDO DE
FAUSTO, GILSON JOSÉ RIBEIRO, conhecido por GILSON FICA FRIO,
JOÃO CARNEIRO DA CUNHA, JOSÉ ALVES BEZERRA JÚNIOR,
conhecido por JÚNIOR ALVES, JOSÉ HELENO ALVES, ODIMERES
JOSÉ DA SILVA, conhecido por NEM BATATINHA, PAULO
AGOSTINHO LINS e VALTER JOSÉ PIMENTEL, conhecido por
VALTINHO DA SUCATA, consistente na ação dolosa de doar cestas básicas
do Município do Ipojuca segundo interesses pessoais, de forma ilícita,
APLICAR-LHES, na medida de suas condutas, as sanções previstas no art. 12,
inciso II, da LIA: a) perda da função pública; b) condenação no ressarcimento,
solidariamente, ao erário público municipal da quantia de R$ 136.900,00
(cento e trinta e seis mil e novecentos reais), valores de julho de 2007; c)
17
18. suspensão dos seus direitos políticos pelo prazo de cinco anos; d) condenação
no pagamento de de multa civil, solidariamente, no valor de R$273.800,00
(duzentos e setenta e três mil e oitocentos reais); e) proibição de contratarem
com o poder público ou receberem benefícios e incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, pelo prazo de cinco anos. Em razão da
sucumbência, deverão os Réus arcar com as despesas processuais.
Dispensados os honorários advocatírios por ser o Ministério Público o autor
da ação.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Ipojuca, segunda-feira, 02 de maio de 2011, 9:57 hora(s).
HAROLDO CARNEIRO LEÃO SOBRINHO
Juiz de Direito
18