Dados do Processo e Decisão sobre Greve de Professores
1. Dados do
Processo
Número 0002640-69.2016.8.17.0000 (427864-6)
DescriçãoPROCEDIMENTO ORDINÁRIO
Relator FREDERICO RICARDO DE ALMEIDA NEVES
Data 07/03/2016 17:31
Fase DEVOLUÇÃO DE CONCLUSÃO
Texto
DECISÃO INTERLOCUTÓRIA O Município do Recife ajuizou
"ação declaratória de ilegalidade de greve c/c obrigação de fazer e
não fazer com pedido de antecipação de tutela inaudita altera pars",
em face do Sindicato Municipal dos Profissionais de Ensino da Rede
Oficial do Recife - SIMPERE. Alega, em síntese, que os professores
da rede municipal de ensino, em assembleia realizada no dia 03 de
março último, deflagraram greve, a partir da zero hora do dia 08 de
março de 2016, paralisando suas atividades (v. doc. fl.34). Advoga,
fundamentalmente, a ilegalidade e a abusividade da greve, à vista da
essencialidade do serviço público de educação. Sustenta também a
ocorrência de desobediência à Lei 7.783/1989, em especial à regra
inscrita no seu art. 3º, sob o argumento de que o movimento
paredista foi deflagrando antes do esgotamento das negociações.
Garante que vem pagando acima do piso salarial do professor,
previsto em lei federal, e que tem investido maciçamente na melhoria
da carreira, apesar de ter recebido alerta do Tribunal de Contas do
Estado de Pernambuco quanto ao limite de despesas com pessoal, em
virtude de haver alcançado, nesse tipo de despesa, 49,74% da Receita
Corrente Líquida, fato último esse decorrente da grave crise
financeira que assola o País, com reflexos diretos nos repasses
constitucionais ao Município do Recife (Anexo 5). Destaca que, nos
últimos três anos concedeu reajustes de 7,97%, 8,32% e 13,01%,
respectivamente, a todo o Grupo Operacional Magistério (GOM), o
que significa um aumento acumulado de 32,17%, enquanto o índice
Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) teve 19,28% de
acumulado, o que caracteriza aumento real concedido a toda
categoria no período, o que levou a uma remuneração média mensal
dos professores municipais para R$3.976,68. Pede o deferimento da
tutela antecipada, para o fim de que seja determinada a suspensão da
greve, objetivando que os servidores municipais da Rede de Ensino
do Município do Recife sejam compelidos a voltar a exercer o seu
múnus público, sob pena de multa de um milhão de reais por dia, em
caso de eventual descumprimento. É o que importa relatar. Decido.
Cuida-se de pleito de caráter urgente, de natureza cível, cuja demora
na apreciação é suscetível de causar risco de graves prejuízos de
caráter social geral (art. 4º, V, da Resolução TJPE nº 267/2009). Por
isso, em caráter excepcional, passo a conhecer do pedido de tutela
antecipada. Consigno, de preâmbulo, que, em sede de julgamento de
Mandado de Injunção, o Supremo Tribunal Federal firmou
entendimento no sentido de definir situações provisórias de
competência constitucional para apreciação dos dissídios de greve de
servidores públicos, até a definitiva disciplina legislativa,
estabelecendo que as greves de âmbito municipal sejam dirimidas
2. pelo Tribunal de Justiça com jurisdição sobre o Município em
questão. Nesse sentido, transcrevo, no que importa, a ementa do
Mandado de Injunção 708-DF: MANDADO DE INJUNÇÃO.
GARANTIA FUNDAMENTAL (CF, ART. 5º, INCISO LXXI).
DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS (CF,
ART. 37, INCISO VII). EVOLUÇÃO DO TEMA NA
JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
(STF). DEFINIÇÃO DOS PARÂMETROS DE COMPETÊNCIA
CONSTITUCIONAL PARA APRECIAÇÃO NO ÂMBITO DA
JUSTIÇA FEDERAL E DA JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A
EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PERTINENTE, NOS
TERMOS DO ART. 37, VII, DA CF. EM OBSERVÂNCIA AOS
DITAMES DA SEGURANÇA JURÍDICA E À EVOLUÇÃO
JURISPRUDENCIAL NA INTERPRETAÇÃO DA OMISSÃO
LEGISLATIVA SOBRE O DIREITO DE GREVE DOS
SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS, FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60
(SESSENTA) DIAS PARA QUE O CONGRESSO NACIONAL
LEGISLE SOBRE A MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO
DEFERIDO PARA DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS
Nos 7.701/1988 E 7.783/1989. [...].6. DEFINIÇÃO DOS
PARÂMETROS DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PARA
APRECIAÇÃO DO TEMA NO ÂMBITO DA JUSTIÇA FEDERAL
E DA JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO
ESPECÍFICA PERTINENTE, NOS TERMOS DO ART. 37, VII,
DA CF. FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60 (SESSENTA) DIAS PARA
QUE O CONGRESSO NACIONAL LEGISLE SOBRE A
MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO DEFERIDO PARA
DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS Nos 7.701/1988 E
7.783/1989. [...] 6.3. Até a devida disciplina legislativa, devem-se
definir as situações provisórias de competência constitucional para a
apreciação desses dissídios no contexto nacional, regional, estadual e
municipal. Assim, nas condições acima especificadas, se a
paralisação for de âmbito nacional, ou abranger mais de uma região
da justiça federal, ou ainda, compreender mais de uma unidade da
federação, a competência para o dissídio de greve será do Superior
Tribunal de Justiça (por aplicação analógica do art. 2o, I, "a", da Lei
no 7.701/1988). Ainda no âmbito federal, se a controvérsia estiver
adstrita a uma única região da justiça federal, a competência será dos
Tribunais Regionais Federais (aplicação analógica do art. 6o da Lei
no 7.701/1988). Para o caso da jurisdição no contexto estadual ou
municipal, se a controvérsia estiver adstrita a uma unidade da
federação, a competência será do respectivo Tribunal de Justiça
(também por aplicação analógica do art. 6o da Lei no 7.701/1988).
As greves de âmbito local ou municipal serão dirimidas pelo
Tribunal de Justiça ou Tribunal Regional Federal com jurisdição
sobre o local da paralisação, conforme se trate de greve de servidores
municipais, estaduais ou federais. [...] MI 708/DF - DISTRITO
FEDERAL. MANDADO DE INJUNÇÃO. Relator(a): Min.
GILMAR MENDES. Julgamento: 25/10/2007. Órgão Julgador:
Tribunal Pleno. À vista do precedente transcrito, tenho por certa a
3. competência originária deste Tribunal para apreciação do dissídio de
greve de servidores públicos de âmbito estadual ou municipal.
Superada a questão preliminar, examino o pleito antecipatório. A Lei
7.783/89, aplicável aos servidores públicos por força da decisão do
STF no MI 708-DF, estabelece no seu art. 3º que: "Art. 3º Frustrada
a negociação ou verificada a impossibilidade de recursos via arbitral,
é facultada a cessação coletiva do trabalho". À vista do texto legal,
não há negar, portanto, que a frustração da negociação é requisito de
legalidade da paralisação das atividades. Nesse sentido, aliás, é farta
a jurisprudência inclusive no que pertine especificamente a hipóteses
de greve de professores da rede pública: ACÓRDÃO N.º
5.0218/2012 AÇÃO DECLARATÓRIA DE ILEGALIDADE DE
GREVE. COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL. NECESSIDADE DE
PRÉVIA NEGOCIAÇÃO E DE AVISO EM TEMPO HABIL
ANTES DA DEFLAGRAÇÃO DO MOVIMENTO PAREDISTA.
REQUISITOS NÃO ATENDIDOS. AÇÃO CONHECIDA E
JULGADA TOTALMENTE PROCEDENTE (TJAL 0005012-
47.2012.8.02.000. Tribunal Pleno. Relator: Des. Tutmés Airan de
Albuquerque Melo. J. 18.12.2012). "ACÓRDAO - AÇAO
DECLARATÓRIA DE ILEGALIDADE DE GREVE -
PROFESSORES DO MUNICÍPIO DE CARIACICA - VIOLAÇAO
AOS REQUISITOS FIXADOS NA LEI DE GREVE -
ILEGALIDADE DA GREVE - PRETENSAO AUTORAL
PROCEDENTE - CONDENAÇAO DO SINDICATO REQUERIDO
EM CUSTAS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS - I- A
deflagração do movimento grevista antecipou o encerramento das
tratativas negociais havidas entre a Administração e os professores
municipais, ocasionando a deturpação da ordem prevista em lei. Vale
dizer, a inversão das fases legalmente prevista, quais sejam,
primeiramente a frustração da negociação e depois a deflagração da
greve, demonstra a ilegalidade do movimento, já que, as negociações
acerca da questão salarial não restaram encerradas. (...) VI - Ação
declaratória de ilegalidade de greve procedente. (TJES, Classe: Ação
Declaratória, 100110011671, Relator : MAURÍLIO ALMEIDA DE
ABREU, Órgão julgador: TRIBUNAL PLENO, Data de Julgamento:
15/09/2011, Data da Publicação no Diário: 27/09/2011)". "Ementa:
AÇAO DECLARATÓRIA DE ILEGALIDADE DE GREVE -
MAGISTÉRIO - MUNICÍPIO DE ITABAIANINHA -
PRELIMINAR DE PERDA DO OBJETO. REJEIÇAO. MÉRITO -
NAO ATENDIMENTO AOS REQUISITOS ENCARTADOS NA
LEI DA GREVE. I - não há cogitar de perda do objeto da presente
ação. Preliminar rejeitada. II - Suspensão das atividades funcionais
dos professores do Município de Itabaianinha, sem que fossem
obedecidas as regras estabelecidas na Lei 7.783/89, paralisação
anunciada antes de cessadas as negociações com o citado Ente
Municipal e em flagrante desrespeito ao princípio da continuidade do
serviço público. Ilegalidade do movimento paredista reconhecida.
Pedido procedente. Decisão unânime" (TJSE AD 2010113700 SE.
Tribunal Pleno. Relator: Desa. Geni Silveira Schuster. J. 15.6.2011).
Na hipótese sob exame, o Município do Recife desincumbiu-se do
4. ônus de provar não só a deflagração do movimento (anexo 1), como
também o fato de que as negociações com a categoria encontravam-
se em curso (anexo 2). Sob outro ângulo, importa destacar que a
educação, direito constitucionalmente assegurado a todos, visando ao
pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da
cidadania e sua qualificação para o trabalho (art. 205 da CF),
constitui serviço público de natureza essencial, de cuja paralisação
poderão decorrer danos de natureza grave e de difícil reparação,
significando prejuízos à ministração do conteúdo programático e
suspensão do processo de aprendizagem, consistindo, ainda, em fator
de desestímulo aos alunos, que acabaram de retornar ao convívio
escolar após as férias. Nesse sentido, confiram-se inclusive recentes
precedentes da Corte Especial deste Tribunal: "EMENTA.
AGRAVO REGIMENTAL CONTRA DECISÃO
INTERLOCUTÓRIA PROFERIDA EM AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
GREVE DE PROFESSORES DA REDE PÚBLICA MUNICIPAL.
PRESENÇA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES À
CONCESSÃO DA LIMINAR. SUSPENSÃO DA GREVE.
EDUCAÇÃO. SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. RETORNO
DOS DOCENTES ÀS ATIVIDADES LABORAIS. DECISÃO
RECORRIDA RESPALDADA NA JURISPRUDÊNCIA PÁTRIA
DOMINANTE. REGIMENTAL AO QUAL SE NEGA
PROVIMENTO. 1. A deflagração de greve pelos professores da rede
pública municipal causa danos e prejuízos irreparáveis à
coletividade, inclusive com a possibilidade de os estudantes
perderem o ano letivo. Some-se a tudo isso o fato de a educação ser
considerada um serviço público essencial, na medida em que ela
proporciona aos seres humanos o desenvolvimento moral e
intelectual. 2. Regimental ao qual se nega provimento" (Agravo
Regimental nº329209-1. Corte Especial do Tribunal de Justiça do
Estado de Pernambuco. Relator: Des. Jovaldo Nunes Gomes. J.
12.5.2014). EMENTA: AÇÃO DECLARATÓRIA. GREVE DE
PROFESSORES. ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE. PLEITO DA
MUNICIPALIDADE PARA SUSPENSÃO DO MOVIMENTO.
SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL. ACESSO À EDUCAÇÃO.
DIREITO PREVISTO NA CF. TUTELA ANTECIPADA.
PRESENÇA DOS REQUISITOS. DEFERIMENTO. 1. Os
movimentos paredistas realizados por servidores públicos, em
princípio, demandam os mesmos objetivos que aqueles da iniciativa
privada, como melhores salários, condições de trabalho, etc. No
entanto, os movimentos deflagrados por professores da rede pública,
pelos quais requerem direitos análogos ao da iniciativa privada,
entretanto, não devem provocar suspensão das aulas aos estudantes,
em sua maioria humildes crianças, evidentemente dependentes das
aulas diárias e de alimentação. A perda da carga horária será
irreversível. 2. O direito à educação, e ao ensino público, é direito
essencial ao desenvolvimento humano e intelectual das crianças e
dos jovens, assim assegurado pela Carta Constitucional de 1988, não
podendo perecer diante de movimentos grevistas de professores, ao
contrário, prevalecendo ante a paralisação. 3. O pedido de
5. antecipação de tutela deve se amoldar aos pressupostos detalhados
pelo Código de Processo Civil no art. 273, quais sejam, prova
inequívoca, verossimilhança das alegações, a verificação de dano
irreparável ou de difícil reparação, além da possibilidade da medida
poder vir a ser revertida. Presentes esses requisitos legais, mostra-se
correto o deferimento da medida pretendida. Multa cominatória
arbitrada em R$ 1.000,00 (um mil reais) por dia, limitada a R$
50.000,00 (cinquenta mil reais). Antecipação de Tutela deferida.
Decisão unânime. (Ação Declaratória nº 336063-6. Relator
Substituto: Des. Antônio Fernando Araújo Martins. Corte Especial
do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco. J. 16.06.2014) Em
decorrência direta do movimento grevista, crianças e adolescentes de
baixa renda, destinatários primários dos serviços públicos prestados
pelos professores da rede municipal de ensino, encontram-se em
situação de vulnerabilidade. A despeito da possibilidade de
reposição, a paralisação das atividades em face da greve reflete-se,
indiscutivelmente, na qualidade da aprendizagem anual, com
incalculáveis prejuízos à sociedade. Assim, conquanto se reconheça
que os servidores públicos são, seguramente, titulares do direito de
greve, importa assentar que o exercício de tal direito não pode
alcançar os serviços públicos essenciais, dentre os quais se enquadra
o de educação pública. À vista de todas essas considerações, tenho
por configurados a verossimilhança das alegações da parte autora e o
periculum in mora. Isso posto, em sede de juízo provisório
decorrente de cognição sumária, defiro a antecipação da tutela e, em
consequência, determino ao Sindicato Municipal dos Profissionais de
Ensino da Rede Oficial do Recife - SIMPERE que se abstenha de
promover a paralisação do movimento grevista, previsto para ter
início a zero hora do dia 08 de março de 2016, a fim de que os
servidores da rede de ensino do Município do Recife (professores)
promovam o imediato retorno as suas regulares atividades, dando-se
prosseguimento às negociações com a categoria. Para a hipótese de
descumprimento, fixo multa diária no valor de R$ 30.000,00 (trinta
mil reais), limitada a R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais). Intime-
se a parte Ré para, querendo, no prazo legal, contestar a presente
ação, sob pena de revelia, bem como para que tome conhecimento
desta decisão, dando-lhe imediato cumprimento. Após, remetam-se
os autos à Douta Procuradoria Geral de Justiça para, querendo, emitir
seu parecer. Cópia da presente decisão também servirá como ofício
para os devidos fins, a qual deverá ser encaminhada ao
Excelentíssimo Senhor Prefeito do Municipio do Recife bem como
ao Excelentíssimo Senhor Procurador Geral do Município do Recife
para conhecimento. Em seguida, voltem-me conclusos. Intimações
necessárias. Cumpra-se. Recife-PE, 07 de março de 2016.
Desembargador Marco Maggi Relator Substituto
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3424.3021.