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Rev Saúde Pública 2009;43(4):721-25
Magda Duarte dos Anjos SchererI
Denise PiresII
Yves SchwartzIII
I
Núcleo de Estudos de Saúde Pública.
Universidade de Brasília. Brasília, DF, Brasil
II
Pós-Graduação em Enfermagem. Centro de
Ciências da Saúde. Universidade Federal de
Santa Catarina. Florianópolis, SC, Brasil
III
Departamento de Ergologia. Université de
Provence Aix-Marseille I. França
Correspondência | Correspondence:
Magda D. A. Scherer
Núcleo de Estudos de Saúde Pública - NESP
SCLN 406, Bloco A, 2º andar
70847-510 – Brasília, DF, Brasil
E-mail: magscherer@hotmail.com
Recebido: 14/03/2008
Revisado: 12/08/2008
Aprovado: 17/12/2008
Trabalho coletivo: um desafio
para a gestão em saúde
Collective work: a challenge for
health management
RESUMO
Com base na teorização da ergologia e do processo de trabalho, este ensaio
objetiva contribuir para a reflexão acerca do trabalho coletivo em saúde,
destacando sua especificidade e as dificuldades de construção e gestão
de coletivos de trabalho. Aborda o trabalho como atividade humana que
compreende, dialeticamente, a aplicação de um protocolo prescrito e uma
perspectiva singular e histórica. O trabalho em saúde envolve uma relação
entre sujeitos que agem nas dramáticas do uso de si e que fazem a gestão do
seu próprio trabalho; é influenciado pela história das profissões de saúde e
pelas determinações macro-políticas. Conclui-se que essa complexidade do
trabalho em saúde precisa ser considerada no processo de gestão de equipes/
coletivos profissionais de modo a articular ações que possibilitem implementar
um novo projeto de atenção à saúde na perspectiva da integralidade.
DESCRITORES: Trabalho, organização e administração. Satisfação no
Emprego. Equipe de Assistência ao Paciente. Recursos Humanos em
Saúde. Serviços de Saúde, recursos humanos.
ABSTRACT
Based on ergology and work process theorization, the study aims to contribute to
reflections on health collective work, emphasizing its specificity and difficulties
in building and managing groups of workers. It deals with work as a human
activity that dialectically comprises the application of a prescribed protocol
and a unique and historical perspective. Health work involves a relationship
among individuals who act in the drama of using themselves and manage their
own work; it is influenced by the history of health professions and macro-
political determinations. In conclusion, this health work complexity needs to
be considered in the process of management of professional teams/groups of
workers, in a way that actions can interact and enable the implementation of
a new health care project in the perspective of comprehensiveness.
DESCRIPTORS: Work, organization and administration. Job
Satisfaction. Patient Care Team. Health Manpower. Health Services,
manpower.
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722 Trabalho coletivo: desafio para gestão Scherer MDA et al
As formas atuais de organização e de gestão do traba-
lho continuam repousando, predominantemente, sobre
princípios que sacrificam a subjetividade em nome da
rentabilidade e da competitividade. Se por um lado
aumenta a produtividade, por outro desagrega coletivos
e separa o trabalho do conjunto da vida, agravando as
patologias decorrentes do trabalho.3
Refletir sobre as transformações do trabalho tem im-
plicações políticas e éticas uma vez que as relações e
instrumentos utilizados na produção do conhecimento
e dos produtos materiais e não materiais não estão
separados das escolhas e julgamentos de valor.10
Mudanças no trabalho ocorreram ao longo da história
da humanidade sob forte determinação econômica.
Contudo, apesar da fragmentação do processo e da se-
paração entre concepção e execução, agravados com o
taylorismo e o fordismo, os grupos e indivíduos sempre
realizaram algum tipo de negociação e de gestão da re-
lação entre contraintes (constrangimentos de dimensão
subjetiva e objetiva) e valores.12
Assim, considerando-se de um lado, as contraintes
institucionais e pessoais, e de outro a especificidade
do trabalho em saúde, no exercício profissional, as
ações são reconfiguradas permanentemente pelas es-
colhas cotidianas dos sujeitos. Portanto, para alcançar
mudanças no modelo assistencial é preciso considerar
essas dimensões que ultrapassam o modelo tradicional
prescrito de políticas. Há necessidade da construção
de um processo de co-responsabilização entre profis-
sionais, usuários e gestores na definição e realização
da atenção à saúde, em que se incluem a gestão e o
controle social.
Neste cenário colocam-se como questões o significado
de trabalho coletivo e equipe de trabalho e como estes
conceitos se aplicam à gestão de coletivos de trabalho
em saúde.
O presente artigo, construído a partir da teorização da
ergologia e do processo de trabalho, discute trabalho
coletivo em saúde e caracteriza suas especificidades
e dificuldades de construção e gestão de coletivos de
trabalho.
TRABALHO COMO ATIVIDADE HUMANA:
CONTRIBUIÇÃO DA ERGOLOGIA
Considerando-se a heterogeneização e complexificação
do trabalho na sociedade atual, um caminho promissor
é compreendê-lo como atividade humana. Ao analisar
a atividade/ação de trabalho, percebe-se um entre-
cruzamento de normas antecedentes e tentativas de
renormalização na relação com o meio, no qual ocorre
um debate permanente de valores, resultando em es-
INTRODUÇÃO
colhas feitas por indivíduos e grupos. No contexto do
trabalho stricto sensu, ou seja, atividade remunerada
na sociedade de mercado e de direito, as normas ante-
cedentes são tudo que antecipa a atividade de trabalho.
As renormalizações resultam de múltiplas gestões de
variabilidades impossíveis de serem antecipadas, pois
são feitas por seres e grupos sempre singulares e em
situações de trabalho, também, singulares.12
A gestão, na perspectiva da ergologia, é um fenômeno
universal que ultrapassa a dimensão macro-política e
a prescrição de atividades e tarefas. Envolve escolhas,
arbitragens, hierarquização de atos e objetivos, além
de envolver valores que orientam a tomada de decisões
pelos trabalhadores no cotidiano.
Ao discutir a complexidade epistemológica da cate-
goria “trabalho”, Daniellou estabelece uma analogia
com o tear e afirma que “na sua atividade de trabalho,
homens e mulheres tecem”.2
Atrama seria os processos
técnicos, as propriedades da matéria, os instrumentos,
os clientes, as políticas econômicas, as regras formais,
o controle das pessoas, entre outros. A urdidura seria
a própria história dos indivíduos, o corpo que aprende
e envelhece, o pertencimento a grupos sociais que
fornecem valores, saberes, regras, projetos, angústias,
entre outros. A trama seria o lado visível do trabalho e
a urdidura, o menos visível ou invisível.2
Adialética do
entrecruzamento entre o visível e o invisível, o global e
o local, é permeada por debates de normas e valores que
geram situações de trabalho relativamente previsíveis e
ao mesmo tempo novas e inéditas, pois toda atividade
humana integra uma dimensão de transformação.4
Para a realização de um trabalho, existe sempre uma
prescrição que consiste em objetivos definidos, regras
e procedimentos relativos aos resultados esperados e a
maneira de obtê-los.Aprescrição é feita pela sociedade
e pela instituição, mas também pelo próprio traba-
lhador e pelos colegas de trabalho, individualmente
e em grupo. A prescrição não é apenas o oficial, mas
também o oficioso, a maneira como os trabalhadores
se organizam para fazer ou não o que está prescrito.
O trabalho real corresponde à atividade realizada e
também àquilo que é avaliado na incerteza, descartado
com pesar ou sofrimento, por meio do debate de normas
sempre presente.
A atividade de trabalho “é sempre uma dramática do
uso de si.”10
Nessa dialética de uso de si, o trabalhador
faz uso de si mesmo em função do que os outros lhe de-
mandam e do que ele próprio se demanda, e faz uso dos
demais. Esse jogo expressa o coletivo de trabalho.
O uso de si por si e pelos outros manifesta as dimensões
de execução e de subjetividade, o trabalhador parcial-
mente se dá normas, se autolegisla e recria saberes,
valores e novas normas, dificultando a gestão.10
723Rev Saúde Pública 2009;43(4):721-25
Compreender que o essencial de todo trabalho pode
estar na dialética entre trama e urdidura contribui para
reconsiderar os conceitos de inovação, rotina e resis-
tência à mudança.As mudanças devem ser apropriadas
pelos trabalhadores a partir do seu patrimônio de conhe-
cimentos, de saberes práticos e de valores.12
É problemático estabelecer quais as competências apro-
priadas para o trabalho, a exemplo da área da saúde, em
que o objeto é de grande complexidade e as situações
de trabalho são difíceis de padronizar. Isso ocorre, em
grande parte, porque o processo de cuidar envolve um
encontro sempre singular entre sujeitos.
TRABALHO COLETIVO
No debate contemporâneo sobre o trabalho, Schwartz11
considera que nenhuma atividade humana pode ser
totalmente padronizada e controlada. Os coletivos de
trabalho se transformam acompanhando as mudanças
sociais, culturais, econômicas, tecnológicas, entre ou-
tras, re-atualizando permanentemente o debate acerca
do trabalho e da utilização da força coletiva.
O coletivo prescrito se distingue do coletivo real. As
micro-recomposições do coletivo em torno da equipe
permitem orientar o processo de trabalho em função
de referências e lógicas próprias à atividade na qual as
prescrições são reapropriadas. Schwartz11
afirma que a
busca de eficácia dos coletivos de trabalho nas orga-
nizações constitui Entidades Coletivas Relativamente
Pertinentes (ECRP). São entidades porque envolvem
pessoas, mas as fronteiras do coletivo são invisíveis
e variam conforme o conteúdo e o ritmo da atividade
de trabalho; as pessoas podem pertencer a serviços
diferentes e trabalhar juntas por compartilharem
valores. São coletivas porque são vários trabalhado-
res buscando a eficácia e às vezes eficiência no seu
trabalho. São pertinentes para compreender como o
trabalho acontece. São relativas porque as fronteiras
são variáveis, se formam a partir dos atos de trabalho,
em função das pessoas, da necessidade de trabalharem
juntas e da história das organizações.11
O conceito de ECRP contribui para a compreensão dos
processos de cooperação existentes na realização de
uma atividade, que são diferentes a cada momento. É
pela análise do micro da atividade que se pode identifi-
car as trocas e as ações que tecem a rede relacional do
trabalho coletivo. Existem aspectos observáveis e outros
invisíveis nos coletivos de uma atividade de trabalho
formalizada ou não. O conceito de equipe, compreen-
dido na maioria das vezes como algo estável, é limitado
para analisar o trabalho coletivo porque o coletivo se
reconstitui conforme a necessidade do trabalho.5
Apartir de uma representação da atividade, os indivídu-
os cooperam ou se confrontam, avaliam o que é possível
realizar e a composição final será sempre singular. Co-
nhecer o trabalho do outro é condição necessária para
que uma colaboração se desenvolva. A comunicação,
a identificação da presença de diversas lógicas e a
compreensão, pelos profissionais, das contraintes das
outras profissões, podem contribuir para a resolução
das dificuldades de colaboração. A gestão cotidiana de
compromissos, implícitos ou explícitos, pode articular
as diversas lógicas dos distintos atores.
A construção do coletivo depende da presença de um
mínimo de estabilidade e de certa permanência na orga-
nização, pois a confiança e a cooperação se constroem
com o tempo. A cooperação é fruto da busca do traba-
lhador pela qualidade do trabalho como uma condição
para ter prazer na atividade laboral, saúde mental e
construção da sua identidade singular.
Toda organização é permeada por relações de poder e
a ética da responsabilidade e da solidariedade é funda-
mental para orientar ações e construir coletivos.11
TRABALHO COLETIVO EM SAÚDE E SUAS
MÚLTIPLAS DIMENSÕES
Os serviços de saúde atendem a necessidades comple-
xas e variáveis e não podem ser totalmente padroni-
zados. Os profissionais precisam de autonomia para
traduzir normas gerais a casos particulares, decidir
como e qual serviço prestar para atender às necessi-
dades de saúde.4
As organizações de saúde dependem do trabalho de
profissionais da saúde e de outros grupos de trabalha-
dores que não são profissionais de saúde, resultando
numa heterogeneidade que dificulta a construção do
espírito de equipe.9
É um contexto de recursos limitados
e necessidades sempre múltiplas, ilimitadas e variáveis.
O ambiente é propício a conflitos entre atores com
diversos interesses, nem sempre convergentes, o que
demanda um processo de negociação permanente.
Torna-se um grande desafio à gestão dos serviços de
saúde considerar o conjunto de demandas e necessida-
des, numa ética que contemple os interesses da cole-
tividade e as necessidades de usuários e dos diversos
grupos de trabalhadores da saúde.
O trabalho em saúde é marcado pela história das pro-
fissões que obtiveram uma definição de seu domínio de
competências e atos próprios que pesam sobre a divisão
do trabalho e sobre a fronteira entre os grupos.
Acomplexidade das formas de organização do trabalho
coletivo introduzidas pela produção capitalista e suas
mudanças recentes, bem como o paradigma positivista
e a hegemonia da biomedicina têm influenciado o tra-
balho em saúde. A fragmentação de atividades dentro
de campos profissionais e a influência da gerência
científica nos serviços têm resultado em mudanças
724 Trabalho coletivo: desafio para gestão Scherer MDA et al
relacionadas ao controle sobre o processo de trabalho
e a autonomia, característicos das profissões.9
Há consenso na literatura em saúde, em especial no
debate brasileiro sobre o Sistema Único de Saúde
(SUS), de que é necessário revisar a hegemonia do
médico no trabalho em saúde e caminhar no sentido
de práticas interdisciplinares para ampliar a qualidade
da atenção à saúde.
O trabalho médico e dos demais profissionais de saú-
de deve ser concebido como parte de uma totalidade
complexa e multideterminada. A centralidade do tra-
balho médico tem sido apontada como um paradoxo,
pois tem contribuído tanto para a manutenção de um
modelo assistencial descompromissado com o usuário
e centrado no procedimento como para construir novas
formas de agir em saúde.6
No caso brasileiro, mudanças recentes sinalizam
possibilidades de práticas mais colaborativas e com
impacto positivo no resultado assistencial: a criação
do SUS e o investimento na Saúde da Família como
estratégia reestruturante do modelo assistencial; os
estímulos às mudanças na formação, advindos dos
Ministérios da Saúde e da Educação; as experiências
de formação de equipes com atuação interdisciplinar
nas quais se verifica certa diluição do corporativismo
médico e maior valorização das práticas dos diversos
profissionais de saúde.
O trabalho em saúde acontece majoritariamente na
modalidade de trabalho coletivo multiprofissional e em
cooperação, mas geralmente por meio de ações frag-
mentadas, em que cada área técnica se responsabiliza
por uma parte da atividade.9
O trabalho da equipe multiprofissional de saúde é um
trabalho coletivo marcado por uma relação recíproca
entre as múltiplas intervenções técnicas e pela interação
dos diferentes profissionais.8
Contudo, a multiprofis-
sionalidade não tem garantido respostas adequadas à
complexidade das demandas assistenciais.13
Essa equipe
prescrita é um elemento importante, mas sua definição é
insuficiente para compreender as trocas entre as pessoas
para a realização da atividade e para torná-la mais efi-
caz.11
A atividade de trabalho de uma equipe se integra
permanentemente com outros serviços e outras equipes.
Existe uma rede relacional mais ou menos informal que
se constrói no trabalho coletivo.5
No trabalho em saúde, pela sua natureza, as atividades
são singularizadas permanentemente, sobretudo nas
ações de assistência direta ao usuário, dificultando a
aplicação de prescrições, o que favorece a organiza-
ção das ECRP, que se traduzem por todos os gestos,
iniciativas e relações que acontecem sem que haja
formalização no organograma e que vão permitir que
as técnicas e os procedimentos tenham eficácia.11
No desenvolvimento da atividade de trabalho, o profis-
sional procura aqueles com quem possa compartilhar
valores e escolhas, que possa confiar e que irão con-
tribuir para atender uma determinada necessidade de
saúde, buscando a eficácia.
Um processo de trabalho baseado nos princípios da
integralidade, intersetorialidade e interdisciplinaridade
amplia as interfaces a gerir e coloca novos desafios no
plano das competências. Nesse sentido, os conceitos
de Campo (saberes comuns a diversas profissões) e
Núcleo (saberes de responsabilidade específica de
cada profissão), sugeridos por Campos,1
são úteis para
articular a necessidade de polivalência e de especia-
lização, e para lidar com a autonomia e definição de
responsabilidades.
A gerência é um elemento importante que pode pos-
sibilitar que a polivalência, a ajuda-mútua e as trocas
não sejam condenadas à semi-clandestinidade, mas
patrocinadas por organogramas e gerenciamento sensí-
veis às exigências de flexibilidade e de renormalização
contínuas.11
A saúde é atividade de grande complexidade que en-
volve questões relacionadas à vida e à morte e que tem
como objeto de intervenção a saúde e a doença no seu
âmbito social.7
Essa realidade gera a necessidade de
vários conhecimentos e práticas para lidar com sujeitos
que têm história de vida singular, “que têm emoções
e interesses, que participam de grupos e têm inserção
social que lhes dá possibilidades distintas de adoecer
e de ter acesso a tratamento”.9
De certa maneira, sempre há algo de desconhecido no
trabalho em saúde, na prescrição do cuidado. Cada
projeto vai provocar cooperação e conflitos entre os
profissionais, na definição dos problemas prioritários,
bem como dos recursos e meios para resolvê-los. Os
saberes adquiridos ao longo do processo de formação
são necessários para atuar nesse cenário, mas insufi-
cientes. O contexto organizacional e profissional coloca
a seguinte questão: como avançar no sentido de um
projeto que exige flexibilidade, humildade e construção
de campos de conhecimento?
O trabalho em saúde é permeado todo o tempo por
práticas multi, pluri e interdisciplinares, conforme os
problemas que se colocam, as demandas surgidas e a
necessidade de resolução. O tipo da prática depende da
complexidade do problema ou da demanda? Problemas
simples não demandam intervenções interdisciplina-
res? Há urgência de eficácia e de eficiência, e para
tanto o profissional ou a equipe, dependendo da situ-
ação será um ou outro, irá procurar recursos de outras
especialidades ou não. Mas essa eficácia e eficiência
serão julgadas por ele próprio, pelos seus colegas de
trabalho e pelo usuário.
725Rev Saúde Pública 2009;43(4):721-25
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A teorização sobre processo de trabalho e ergologia
conclui que conhecer o trabalho requer conhecer os
sujeitos e o contexto do trabalho. A organização do
trabalho, quando especifica os postos, as competências,
as qualificações e as relações entre as pessoas produz
implicitamente um modelo sobre o que os sujeitos
apreendem e pensam sobre si mesmos. Quando a
organização diz ao trabalhador que deve se ater ao
prescrito, ela interdita formas de conhecimento que
poderiam problematizar a questão do trabalho como
lugar e momento de produção de eficácia.
Aergologianãonegligenciaasdeterminaçõeseconstran-
gimentos macro políticos e econômicos, mas acrescenta
que,noexercíciodasatividadescotidianasostrabalhado-
res fazem a gestão de si mesmos e de sua relação com os
outros participantes de coletivos de trabalho. Levam em
consideração as normas prescritas e tecem, entre a trama
e a urdidura, permanentes renormalizações.
Apesar dos limites internos e externos à realização do
trabalho, é o trabalhador, nas instituições de saúde,
no coletivo e na prática cotidiana que desenvolve e
sustenta um projeto de ação. E no caso da saúde, o
objeto de trabalho é um outro sujeito concreto que
influencia, numa relação dialética, o processo de tra-
balho dos profissionais.
As principais dificuldades de gestão do trabalho coletivo
em saúde dizem respeito: à relação entre sujeitos indivi-
duais e coletivos; à história das profissões de saúde e o
seu exercício no cenário do trabalho coletivo institucio-
nalizado e à complexidade do jogo político e econômico
que delimita o cenário das situações de trabalho.
Os trabalhadores de saúde são sujeitos de processos
de trabalho que os aproximam e os afastam da crença
de que é possível um novo projeto de atenção à saúde
que tenha como referência a integralidade da atenção.
E para um novo projeto, é preciso tornar-se um agente
de mudanças.
1. Campos GWS. Saúde pública e saúde coletiva:
campo e núcleo de saberes e práticas. Cienc Saude
Coletiva. 2000;5(2):219-30. DOI: 10.1590/S1413-
81232000000200002
2. Daniellou F. A ergonomia em busca de seus princípios
- debates epistemológicos. Trad.de MIS Betiol. São
Paulo: Edgard Blücher; 2004.
3. Dejours C. Intelligence pratique et sagesse pratique:
deux dimensions méconnues du travail réel. Educ
Perm. 1993;116(3):47-70.
4. Dussault G. A Gestão dos serviços públicos de
saúde: características e exigências. Rev Adm Publica.
1992;26(2):8-19.
5. Efros D. Travailler en equipe, de quelle équipe et
de quel travail parle-t-on? Soins Rev Ref Infirm.
2004;(49):26-9.
6. Merhy EE. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. São
Paulo: Hucitec; 2002. (Saúde em Debate, 145).
7. Peduzzi M, Palma JJL. A equipe de Saúde. In:
Schraiber LB, Nemes MIB, Mendes-Gonçalves RB,
organizadores. Saúde do adulto, programas e ações na
unidade básica. São Paulo: Hucitec; 2000. p.234-50.
8. Peduzzi M. Equipe multiprofissional de saúde:
conceito e tipologia. Rev Saude Publica.
2001;35(1):103-9. DOI: 10.1590/S0034-
89102001000100016
9. Pires D. Reestruturação produtiva e trabalho em saúde.
2,ed. São Paulo: Annablume; 2008.
10. Schwartz Y. Reconnaissances du travail: pour une
approche ergologique. Paris: PUF; 1998.
11. Schwartz Y. Le paradigme ergologique ou un métier de
philosophe. Toulouse: Octares editions; 2000.
12. Schwartz Y. La conceptualisation du travail, le visible
et l´invisible: L´omme et la société. Rev Int Sci Soc.
2004;2(152):47-77.
13. Silva NEK, Oliveira LA, Figueiredo WS, Landroni
MAS, Waldman CCS, Ayres JRCM. Limites do
trabalho multiprofissional: estudo de caso dos centros
de referência para DST/Aids. Rev Saude Publica.
2002;36(4 Supl):108-16. DOI: 10.1590/S0034-
89102002000500015
REFERÊNCIAS
Artigo baseado em tese de doutorado de Scherer MDA, apresentada à Universidade Federal de Santa Catarina em 2006.

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Gestão Pública e Administração de serviços de saúde

  • 1. Rev Saúde Pública 2009;43(4):721-25 Magda Duarte dos Anjos SchererI Denise PiresII Yves SchwartzIII I Núcleo de Estudos de Saúde Pública. Universidade de Brasília. Brasília, DF, Brasil II Pós-Graduação em Enfermagem. Centro de Ciências da Saúde. Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, SC, Brasil III Departamento de Ergologia. Université de Provence Aix-Marseille I. França Correspondência | Correspondence: Magda D. A. Scherer Núcleo de Estudos de Saúde Pública - NESP SCLN 406, Bloco A, 2º andar 70847-510 – Brasília, DF, Brasil E-mail: magscherer@hotmail.com Recebido: 14/03/2008 Revisado: 12/08/2008 Aprovado: 17/12/2008 Trabalho coletivo: um desafio para a gestão em saúde Collective work: a challenge for health management RESUMO Com base na teorização da ergologia e do processo de trabalho, este ensaio objetiva contribuir para a reflexão acerca do trabalho coletivo em saúde, destacando sua especificidade e as dificuldades de construção e gestão de coletivos de trabalho. Aborda o trabalho como atividade humana que compreende, dialeticamente, a aplicação de um protocolo prescrito e uma perspectiva singular e histórica. O trabalho em saúde envolve uma relação entre sujeitos que agem nas dramáticas do uso de si e que fazem a gestão do seu próprio trabalho; é influenciado pela história das profissões de saúde e pelas determinações macro-políticas. Conclui-se que essa complexidade do trabalho em saúde precisa ser considerada no processo de gestão de equipes/ coletivos profissionais de modo a articular ações que possibilitem implementar um novo projeto de atenção à saúde na perspectiva da integralidade. DESCRITORES: Trabalho, organização e administração. Satisfação no Emprego. Equipe de Assistência ao Paciente. Recursos Humanos em Saúde. Serviços de Saúde, recursos humanos. ABSTRACT Based on ergology and work process theorization, the study aims to contribute to reflections on health collective work, emphasizing its specificity and difficulties in building and managing groups of workers. It deals with work as a human activity that dialectically comprises the application of a prescribed protocol and a unique and historical perspective. Health work involves a relationship among individuals who act in the drama of using themselves and manage their own work; it is influenced by the history of health professions and macro- political determinations. In conclusion, this health work complexity needs to be considered in the process of management of professional teams/groups of workers, in a way that actions can interact and enable the implementation of a new health care project in the perspective of comprehensiveness. DESCRIPTORS: Work, organization and administration. Job Satisfaction. Patient Care Team. Health Manpower. Health Services, manpower. Comentários | Comments
  • 2. 722 Trabalho coletivo: desafio para gestão Scherer MDA et al As formas atuais de organização e de gestão do traba- lho continuam repousando, predominantemente, sobre princípios que sacrificam a subjetividade em nome da rentabilidade e da competitividade. Se por um lado aumenta a produtividade, por outro desagrega coletivos e separa o trabalho do conjunto da vida, agravando as patologias decorrentes do trabalho.3 Refletir sobre as transformações do trabalho tem im- plicações políticas e éticas uma vez que as relações e instrumentos utilizados na produção do conhecimento e dos produtos materiais e não materiais não estão separados das escolhas e julgamentos de valor.10 Mudanças no trabalho ocorreram ao longo da história da humanidade sob forte determinação econômica. Contudo, apesar da fragmentação do processo e da se- paração entre concepção e execução, agravados com o taylorismo e o fordismo, os grupos e indivíduos sempre realizaram algum tipo de negociação e de gestão da re- lação entre contraintes (constrangimentos de dimensão subjetiva e objetiva) e valores.12 Assim, considerando-se de um lado, as contraintes institucionais e pessoais, e de outro a especificidade do trabalho em saúde, no exercício profissional, as ações são reconfiguradas permanentemente pelas es- colhas cotidianas dos sujeitos. Portanto, para alcançar mudanças no modelo assistencial é preciso considerar essas dimensões que ultrapassam o modelo tradicional prescrito de políticas. Há necessidade da construção de um processo de co-responsabilização entre profis- sionais, usuários e gestores na definição e realização da atenção à saúde, em que se incluem a gestão e o controle social. Neste cenário colocam-se como questões o significado de trabalho coletivo e equipe de trabalho e como estes conceitos se aplicam à gestão de coletivos de trabalho em saúde. O presente artigo, construído a partir da teorização da ergologia e do processo de trabalho, discute trabalho coletivo em saúde e caracteriza suas especificidades e dificuldades de construção e gestão de coletivos de trabalho. TRABALHO COMO ATIVIDADE HUMANA: CONTRIBUIÇÃO DA ERGOLOGIA Considerando-se a heterogeneização e complexificação do trabalho na sociedade atual, um caminho promissor é compreendê-lo como atividade humana. Ao analisar a atividade/ação de trabalho, percebe-se um entre- cruzamento de normas antecedentes e tentativas de renormalização na relação com o meio, no qual ocorre um debate permanente de valores, resultando em es- INTRODUÇÃO colhas feitas por indivíduos e grupos. No contexto do trabalho stricto sensu, ou seja, atividade remunerada na sociedade de mercado e de direito, as normas ante- cedentes são tudo que antecipa a atividade de trabalho. As renormalizações resultam de múltiplas gestões de variabilidades impossíveis de serem antecipadas, pois são feitas por seres e grupos sempre singulares e em situações de trabalho, também, singulares.12 A gestão, na perspectiva da ergologia, é um fenômeno universal que ultrapassa a dimensão macro-política e a prescrição de atividades e tarefas. Envolve escolhas, arbitragens, hierarquização de atos e objetivos, além de envolver valores que orientam a tomada de decisões pelos trabalhadores no cotidiano. Ao discutir a complexidade epistemológica da cate- goria “trabalho”, Daniellou estabelece uma analogia com o tear e afirma que “na sua atividade de trabalho, homens e mulheres tecem”.2 Atrama seria os processos técnicos, as propriedades da matéria, os instrumentos, os clientes, as políticas econômicas, as regras formais, o controle das pessoas, entre outros. A urdidura seria a própria história dos indivíduos, o corpo que aprende e envelhece, o pertencimento a grupos sociais que fornecem valores, saberes, regras, projetos, angústias, entre outros. A trama seria o lado visível do trabalho e a urdidura, o menos visível ou invisível.2 Adialética do entrecruzamento entre o visível e o invisível, o global e o local, é permeada por debates de normas e valores que geram situações de trabalho relativamente previsíveis e ao mesmo tempo novas e inéditas, pois toda atividade humana integra uma dimensão de transformação.4 Para a realização de um trabalho, existe sempre uma prescrição que consiste em objetivos definidos, regras e procedimentos relativos aos resultados esperados e a maneira de obtê-los.Aprescrição é feita pela sociedade e pela instituição, mas também pelo próprio traba- lhador e pelos colegas de trabalho, individualmente e em grupo. A prescrição não é apenas o oficial, mas também o oficioso, a maneira como os trabalhadores se organizam para fazer ou não o que está prescrito. O trabalho real corresponde à atividade realizada e também àquilo que é avaliado na incerteza, descartado com pesar ou sofrimento, por meio do debate de normas sempre presente. A atividade de trabalho “é sempre uma dramática do uso de si.”10 Nessa dialética de uso de si, o trabalhador faz uso de si mesmo em função do que os outros lhe de- mandam e do que ele próprio se demanda, e faz uso dos demais. Esse jogo expressa o coletivo de trabalho. O uso de si por si e pelos outros manifesta as dimensões de execução e de subjetividade, o trabalhador parcial- mente se dá normas, se autolegisla e recria saberes, valores e novas normas, dificultando a gestão.10
  • 3. 723Rev Saúde Pública 2009;43(4):721-25 Compreender que o essencial de todo trabalho pode estar na dialética entre trama e urdidura contribui para reconsiderar os conceitos de inovação, rotina e resis- tência à mudança.As mudanças devem ser apropriadas pelos trabalhadores a partir do seu patrimônio de conhe- cimentos, de saberes práticos e de valores.12 É problemático estabelecer quais as competências apro- priadas para o trabalho, a exemplo da área da saúde, em que o objeto é de grande complexidade e as situações de trabalho são difíceis de padronizar. Isso ocorre, em grande parte, porque o processo de cuidar envolve um encontro sempre singular entre sujeitos. TRABALHO COLETIVO No debate contemporâneo sobre o trabalho, Schwartz11 considera que nenhuma atividade humana pode ser totalmente padronizada e controlada. Os coletivos de trabalho se transformam acompanhando as mudanças sociais, culturais, econômicas, tecnológicas, entre ou- tras, re-atualizando permanentemente o debate acerca do trabalho e da utilização da força coletiva. O coletivo prescrito se distingue do coletivo real. As micro-recomposições do coletivo em torno da equipe permitem orientar o processo de trabalho em função de referências e lógicas próprias à atividade na qual as prescrições são reapropriadas. Schwartz11 afirma que a busca de eficácia dos coletivos de trabalho nas orga- nizações constitui Entidades Coletivas Relativamente Pertinentes (ECRP). São entidades porque envolvem pessoas, mas as fronteiras do coletivo são invisíveis e variam conforme o conteúdo e o ritmo da atividade de trabalho; as pessoas podem pertencer a serviços diferentes e trabalhar juntas por compartilharem valores. São coletivas porque são vários trabalhado- res buscando a eficácia e às vezes eficiência no seu trabalho. São pertinentes para compreender como o trabalho acontece. São relativas porque as fronteiras são variáveis, se formam a partir dos atos de trabalho, em função das pessoas, da necessidade de trabalharem juntas e da história das organizações.11 O conceito de ECRP contribui para a compreensão dos processos de cooperação existentes na realização de uma atividade, que são diferentes a cada momento. É pela análise do micro da atividade que se pode identifi- car as trocas e as ações que tecem a rede relacional do trabalho coletivo. Existem aspectos observáveis e outros invisíveis nos coletivos de uma atividade de trabalho formalizada ou não. O conceito de equipe, compreen- dido na maioria das vezes como algo estável, é limitado para analisar o trabalho coletivo porque o coletivo se reconstitui conforme a necessidade do trabalho.5 Apartir de uma representação da atividade, os indivídu- os cooperam ou se confrontam, avaliam o que é possível realizar e a composição final será sempre singular. Co- nhecer o trabalho do outro é condição necessária para que uma colaboração se desenvolva. A comunicação, a identificação da presença de diversas lógicas e a compreensão, pelos profissionais, das contraintes das outras profissões, podem contribuir para a resolução das dificuldades de colaboração. A gestão cotidiana de compromissos, implícitos ou explícitos, pode articular as diversas lógicas dos distintos atores. A construção do coletivo depende da presença de um mínimo de estabilidade e de certa permanência na orga- nização, pois a confiança e a cooperação se constroem com o tempo. A cooperação é fruto da busca do traba- lhador pela qualidade do trabalho como uma condição para ter prazer na atividade laboral, saúde mental e construção da sua identidade singular. Toda organização é permeada por relações de poder e a ética da responsabilidade e da solidariedade é funda- mental para orientar ações e construir coletivos.11 TRABALHO COLETIVO EM SAÚDE E SUAS MÚLTIPLAS DIMENSÕES Os serviços de saúde atendem a necessidades comple- xas e variáveis e não podem ser totalmente padroni- zados. Os profissionais precisam de autonomia para traduzir normas gerais a casos particulares, decidir como e qual serviço prestar para atender às necessi- dades de saúde.4 As organizações de saúde dependem do trabalho de profissionais da saúde e de outros grupos de trabalha- dores que não são profissionais de saúde, resultando numa heterogeneidade que dificulta a construção do espírito de equipe.9 É um contexto de recursos limitados e necessidades sempre múltiplas, ilimitadas e variáveis. O ambiente é propício a conflitos entre atores com diversos interesses, nem sempre convergentes, o que demanda um processo de negociação permanente. Torna-se um grande desafio à gestão dos serviços de saúde considerar o conjunto de demandas e necessida- des, numa ética que contemple os interesses da cole- tividade e as necessidades de usuários e dos diversos grupos de trabalhadores da saúde. O trabalho em saúde é marcado pela história das pro- fissões que obtiveram uma definição de seu domínio de competências e atos próprios que pesam sobre a divisão do trabalho e sobre a fronteira entre os grupos. Acomplexidade das formas de organização do trabalho coletivo introduzidas pela produção capitalista e suas mudanças recentes, bem como o paradigma positivista e a hegemonia da biomedicina têm influenciado o tra- balho em saúde. A fragmentação de atividades dentro de campos profissionais e a influência da gerência científica nos serviços têm resultado em mudanças
  • 4. 724 Trabalho coletivo: desafio para gestão Scherer MDA et al relacionadas ao controle sobre o processo de trabalho e a autonomia, característicos das profissões.9 Há consenso na literatura em saúde, em especial no debate brasileiro sobre o Sistema Único de Saúde (SUS), de que é necessário revisar a hegemonia do médico no trabalho em saúde e caminhar no sentido de práticas interdisciplinares para ampliar a qualidade da atenção à saúde. O trabalho médico e dos demais profissionais de saú- de deve ser concebido como parte de uma totalidade complexa e multideterminada. A centralidade do tra- balho médico tem sido apontada como um paradoxo, pois tem contribuído tanto para a manutenção de um modelo assistencial descompromissado com o usuário e centrado no procedimento como para construir novas formas de agir em saúde.6 No caso brasileiro, mudanças recentes sinalizam possibilidades de práticas mais colaborativas e com impacto positivo no resultado assistencial: a criação do SUS e o investimento na Saúde da Família como estratégia reestruturante do modelo assistencial; os estímulos às mudanças na formação, advindos dos Ministérios da Saúde e da Educação; as experiências de formação de equipes com atuação interdisciplinar nas quais se verifica certa diluição do corporativismo médico e maior valorização das práticas dos diversos profissionais de saúde. O trabalho em saúde acontece majoritariamente na modalidade de trabalho coletivo multiprofissional e em cooperação, mas geralmente por meio de ações frag- mentadas, em que cada área técnica se responsabiliza por uma parte da atividade.9 O trabalho da equipe multiprofissional de saúde é um trabalho coletivo marcado por uma relação recíproca entre as múltiplas intervenções técnicas e pela interação dos diferentes profissionais.8 Contudo, a multiprofis- sionalidade não tem garantido respostas adequadas à complexidade das demandas assistenciais.13 Essa equipe prescrita é um elemento importante, mas sua definição é insuficiente para compreender as trocas entre as pessoas para a realização da atividade e para torná-la mais efi- caz.11 A atividade de trabalho de uma equipe se integra permanentemente com outros serviços e outras equipes. Existe uma rede relacional mais ou menos informal que se constrói no trabalho coletivo.5 No trabalho em saúde, pela sua natureza, as atividades são singularizadas permanentemente, sobretudo nas ações de assistência direta ao usuário, dificultando a aplicação de prescrições, o que favorece a organiza- ção das ECRP, que se traduzem por todos os gestos, iniciativas e relações que acontecem sem que haja formalização no organograma e que vão permitir que as técnicas e os procedimentos tenham eficácia.11 No desenvolvimento da atividade de trabalho, o profis- sional procura aqueles com quem possa compartilhar valores e escolhas, que possa confiar e que irão con- tribuir para atender uma determinada necessidade de saúde, buscando a eficácia. Um processo de trabalho baseado nos princípios da integralidade, intersetorialidade e interdisciplinaridade amplia as interfaces a gerir e coloca novos desafios no plano das competências. Nesse sentido, os conceitos de Campo (saberes comuns a diversas profissões) e Núcleo (saberes de responsabilidade específica de cada profissão), sugeridos por Campos,1 são úteis para articular a necessidade de polivalência e de especia- lização, e para lidar com a autonomia e definição de responsabilidades. A gerência é um elemento importante que pode pos- sibilitar que a polivalência, a ajuda-mútua e as trocas não sejam condenadas à semi-clandestinidade, mas patrocinadas por organogramas e gerenciamento sensí- veis às exigências de flexibilidade e de renormalização contínuas.11 A saúde é atividade de grande complexidade que en- volve questões relacionadas à vida e à morte e que tem como objeto de intervenção a saúde e a doença no seu âmbito social.7 Essa realidade gera a necessidade de vários conhecimentos e práticas para lidar com sujeitos que têm história de vida singular, “que têm emoções e interesses, que participam de grupos e têm inserção social que lhes dá possibilidades distintas de adoecer e de ter acesso a tratamento”.9 De certa maneira, sempre há algo de desconhecido no trabalho em saúde, na prescrição do cuidado. Cada projeto vai provocar cooperação e conflitos entre os profissionais, na definição dos problemas prioritários, bem como dos recursos e meios para resolvê-los. Os saberes adquiridos ao longo do processo de formação são necessários para atuar nesse cenário, mas insufi- cientes. O contexto organizacional e profissional coloca a seguinte questão: como avançar no sentido de um projeto que exige flexibilidade, humildade e construção de campos de conhecimento? O trabalho em saúde é permeado todo o tempo por práticas multi, pluri e interdisciplinares, conforme os problemas que se colocam, as demandas surgidas e a necessidade de resolução. O tipo da prática depende da complexidade do problema ou da demanda? Problemas simples não demandam intervenções interdisciplina- res? Há urgência de eficácia e de eficiência, e para tanto o profissional ou a equipe, dependendo da situ- ação será um ou outro, irá procurar recursos de outras especialidades ou não. Mas essa eficácia e eficiência serão julgadas por ele próprio, pelos seus colegas de trabalho e pelo usuário.
  • 5. 725Rev Saúde Pública 2009;43(4):721-25 CONSIDERAÇÕES FINAIS A teorização sobre processo de trabalho e ergologia conclui que conhecer o trabalho requer conhecer os sujeitos e o contexto do trabalho. A organização do trabalho, quando especifica os postos, as competências, as qualificações e as relações entre as pessoas produz implicitamente um modelo sobre o que os sujeitos apreendem e pensam sobre si mesmos. Quando a organização diz ao trabalhador que deve se ater ao prescrito, ela interdita formas de conhecimento que poderiam problematizar a questão do trabalho como lugar e momento de produção de eficácia. Aergologianãonegligenciaasdeterminaçõeseconstran- gimentos macro políticos e econômicos, mas acrescenta que,noexercíciodasatividadescotidianasostrabalhado- res fazem a gestão de si mesmos e de sua relação com os outros participantes de coletivos de trabalho. Levam em consideração as normas prescritas e tecem, entre a trama e a urdidura, permanentes renormalizações. Apesar dos limites internos e externos à realização do trabalho, é o trabalhador, nas instituições de saúde, no coletivo e na prática cotidiana que desenvolve e sustenta um projeto de ação. E no caso da saúde, o objeto de trabalho é um outro sujeito concreto que influencia, numa relação dialética, o processo de tra- balho dos profissionais. As principais dificuldades de gestão do trabalho coletivo em saúde dizem respeito: à relação entre sujeitos indivi- duais e coletivos; à história das profissões de saúde e o seu exercício no cenário do trabalho coletivo institucio- nalizado e à complexidade do jogo político e econômico que delimita o cenário das situações de trabalho. Os trabalhadores de saúde são sujeitos de processos de trabalho que os aproximam e os afastam da crença de que é possível um novo projeto de atenção à saúde que tenha como referência a integralidade da atenção. E para um novo projeto, é preciso tornar-se um agente de mudanças. 1. Campos GWS. Saúde pública e saúde coletiva: campo e núcleo de saberes e práticas. Cienc Saude Coletiva. 2000;5(2):219-30. DOI: 10.1590/S1413- 81232000000200002 2. Daniellou F. A ergonomia em busca de seus princípios - debates epistemológicos. Trad.de MIS Betiol. São Paulo: Edgard Blücher; 2004. 3. Dejours C. Intelligence pratique et sagesse pratique: deux dimensions méconnues du travail réel. Educ Perm. 1993;116(3):47-70. 4. Dussault G. A Gestão dos serviços públicos de saúde: características e exigências. Rev Adm Publica. 1992;26(2):8-19. 5. Efros D. Travailler en equipe, de quelle équipe et de quel travail parle-t-on? Soins Rev Ref Infirm. 2004;(49):26-9. 6. Merhy EE. Saúde: a cartografia do trabalho vivo. São Paulo: Hucitec; 2002. (Saúde em Debate, 145). 7. Peduzzi M, Palma JJL. A equipe de Saúde. In: Schraiber LB, Nemes MIB, Mendes-Gonçalves RB, organizadores. Saúde do adulto, programas e ações na unidade básica. São Paulo: Hucitec; 2000. p.234-50. 8. Peduzzi M. Equipe multiprofissional de saúde: conceito e tipologia. Rev Saude Publica. 2001;35(1):103-9. DOI: 10.1590/S0034- 89102001000100016 9. Pires D. Reestruturação produtiva e trabalho em saúde. 2,ed. São Paulo: Annablume; 2008. 10. Schwartz Y. Reconnaissances du travail: pour une approche ergologique. Paris: PUF; 1998. 11. Schwartz Y. Le paradigme ergologique ou un métier de philosophe. Toulouse: Octares editions; 2000. 12. Schwartz Y. La conceptualisation du travail, le visible et l´invisible: L´omme et la société. Rev Int Sci Soc. 2004;2(152):47-77. 13. Silva NEK, Oliveira LA, Figueiredo WS, Landroni MAS, Waldman CCS, Ayres JRCM. Limites do trabalho multiprofissional: estudo de caso dos centros de referência para DST/Aids. Rev Saude Publica. 2002;36(4 Supl):108-16. DOI: 10.1590/S0034- 89102002000500015 REFERÊNCIAS Artigo baseado em tese de doutorado de Scherer MDA, apresentada à Universidade Federal de Santa Catarina em 2006.