1. Rede Multicêntrica
5.4 Cuidado, acolhimento e
vínculo de usuários e família
Deise Nunes
deisecardosonunes@yahoo.com.br
Fone: 8429.9191
2. Humanização do cuidado
Por humanização compreendemos a
valorização dos diferentes sujeitos implicados
no processo de produção de saúde. Os
valores que norteiam essa política são a
autonomia e o protagonismo dos sujeitos, a
corresponsabilidade entre eles, os vínculos
solidários e a participação coletiva nas
práticas de saúde.
(Cartilha PNH-Clinica ampliada e compartilhada, 2009)
3. Acolhimento
Capacidade de acatar as demandas e
necessidades do usuário.
Início da construção de um vínculo com o
serviço, o profissional e outros usuários.
... Pressupõe
4. Escuta
Acolher toda queixa ou relato do usuário
mesmo quando aparentemente não
interessar diretamente para o diagnóstico e
tratamento.
Ajudá-lo a reconstruir e respeitar os motivos
que ocasionaram o seu adoecimento
Ajudá-lo a estabelecer correlações entre o que
sente e a sua vida
5. Vínculo e afetos
É da natureza do sujeito depositar afetos
diversos uns sobre os outros.
É responsabilização sanitária e ampliação da
capacidade de contrair responsabilidade.
Elemento imprescindível no cuidado, pois
permite a produção de confiança e
cumplicidade.
6. Algumas questões para trabalhar no
acolhimento:
Motivo de busca de tratamento
Em que momento de vida fez esta procura
História do uso de drogas: início, com quem usava, onde, quais drogas,
quantidade, frequência, abstinência...
Relações familiares, conjugais, sociais e destas com o uso de drogas.
Tratamentos já realizados
Complicações clínicas uso de medicação
Rede de apoio: saúde, assistência, comunidade, amigos...
Ocupação, rotina, lazer
Quanto tempo dispõe para o tratamento: possibilidades e motivação
O que espera do tratamento objetivos
Apresentação do serviço,
Retorno ao usuário
7. Perguntas importantes para o
profissional se fazer...
O que é possível em cada situação?
O que é necessário?
O que está sendo demandado?
O que pode ser ofertado?
8. Discursos autorizados...
Heróicos: discurso daquele que superou o problema e é
exemplo
Desesperados: discurso daquele que não superou e
precisa desesperadamente de ajuda.
Será que nossa escuta possui abertura para outros
discursos?
* A RD busca os discursos dissonantes. Acolhimento não
só da pessoa, mas do discurso da pessoa.
Dênis Petuco
9. Projeto Terapêutico Singular
(PTS)
Conjunto de propostas de condutas terapêuticas
articuladas, para um sujeito individual ou
coletivo.
Começa a ser moldado desde a entrada do usuário
no serviço
Resultado da discussão coletiva de uma equipe
Construído COM o usuário
10. PTS- 4 movimentos (PNH)
1) Definir hipóteses diagnósticas (avaliação orgânica, psicológica e
social) -> riscos, vulnerabilidades e potencialidades,
(Diagnóstico nunca é sem efeitos...)
2) Definição de metas: propostas de curto, médio e longo prazo,
3) Divisão de responsabilidades: é importante definir as tarefas de cada
um com clareza, favorecendo a continuidade e articulação entre
formulação, ações e reavaliações,
4) Reavaliação: momento em que se discutirá a evolução e se farão as devidas
correções de rumo.
* São movimentos, não etapas!
11. Construção COM o usuário...
Resulta em liberdade, co-responsabilidade, e
vínculo com profissionais e serviços
Descentralização (Eduardo Passos)
Lógica: Prescrição => Problematização
A possibilidade de incluir o usuário de drogas
como sujeito político vem sendo um dos
aspectos mais desafiadores da política de
Redução de Danos . (Souza, 2007, pág. 109)
12. Conceito de drogas: inclui uma dimensão fármaco-
química, mas também legislações, preconceitos,
estigmas, sentidos, significados...
Droga é mais do que uma substância química.
Assim, o conceito de DQ dá conta do nosso objeto de
trabalho?
Sofrimento tem uma dimensão política! Portanto, a
clínica precisa também ser política.
Dênis Petuco
13. Nem tudo são flores...
Formação, especialização do cuidado e separação de
procedimentos e diagnósticos
Equipe/profissional de referência: responsabilidade
compartilhamento (grupalidade solidária)
Estrutura/Logística: verbas, espaço físico, recursos
Inserção das equipes nas redes e abertura destas aos UD
Participação dos usuários nas discussões do serviço
Dificuldade de vislumbrar os resultados do trabalho
14. Algumas estratégias possíveis...
Formação: supervisão institucional, reunião de equipe
e para estudo, abertura de estágios
Envolvimento dos usuários nas decisões do serviço
Discussão com os usuários sobre o seu próprio
tratamento: entraves, avanços, caminhos possíveis
Participação nos espaços de controle social
Parceria com as redes de cuidado, tanto da saúde
quanto outros atores
15. R., 29 anos, 1 mês no CAPSad
§ Orientado pelo Ambulatório a procurar o CAPSad
§ Sintomas: tonturas (apagões), dores de cabeça, perda de
memória, fraqueza, tosse, impulsividade, choro fácil, culpa,
tristeza, perda de peso (15kg em 2 meses), dor nas gengivas
§ 8ª. série incompleta, com facilidade de aprender sozinho coisas
novas (bateria, construção, trabalhos manuais, desenho, skate)
§ Esposa e 2 filhos (8 e 4 anos), os dois com muita tosse também,
pois ele fuma pitico em casa.
§ Cheiro em casa é insuportável ( cheiro de morte )
§ Histórico do uso:
- aos 12 anos: início do uso de cigarro, maconha e cocaína (uso
sazonal)
- aos 25 anos: uso de pitico. Desde então não tem conseguido usar
maconha sozinha.
- usou álcool 1x na vida e passou mal.
16. § Pais alcoolistas: mãe faleceu há 1 ano, não sabe ao certo o
motivo. Passou os últimos 10 anos acamada, família
precisava lhe dar bebida. Intensificou o uso desde a morte
da mãe.
§ O pai tem lhe dado dinheiro para usar pitico, pois acha que
o filho fica muito triste e introspectivo quando não usa.
§ Nas últimas semanas, estava usando até 100 cigarros de
pitico por dia. Coincide com o abandono do trabalho.
§ Orientamos buscar a sua empresa. Atestado de 15 dias,
para depois fazer perícia no INSS para afastamento
temporário do trabalho.
§ Após o acolhimento, não usou droga nos próximos 4 dias e
depois passou a usar de forma mais controlada.
§ Segue com dores de cabeça intensas, falta de apetite,
desânimo
§ Preconceito da família
§ Esposa não sabe que ele usa pitico, acha que é só maconha:
questão da confiança mútua.
17. § Refere não ter tido convivência diária com os pais, estavam
sempre no quarto usando álcool. Apanhava da mãe para estudar
ou quando tirava nota baixa.
§ Irmão nunca se casou, usuário de pitico também. Ficou mais
envolvido com o cuidado da mãe.
§ 2 semanas: atendimento individualdiário
§ Após, iniciou a participar das oficinas: acha que quem teve a
ideia das oficinas foi esperto , porque quando está fazendo a
atividade, não pensa em outras coisas.
§ Nos dias em que não veio ao CAPS, usou mais, diz que precisa
acordar de manhã sabendo que virá ao caps.
§ Na última semana, comprou algumas roupas novas, cortou o
cabelo, procurou dentista. Está em busca dos dinheiros
trabalhistas, a empresa lhe deu apoio e quer que ele retorne
depois ao trabalho.
§ Quer saber o que se passa com ele, entender-se.
§ Faz perguntas sobre o assunto.
§ Oferece-se para ajudar na mudança da casa, diz que sabe fazer
muitas coisas.
18. X., 54 anos, 1 e ½ ano no CAPSad
§ Encaminhado pelo hospital após internação
§ Histórico de uso:
§ - aos 17 anos: início maconha e álcool
§ - aos 22 anos: início cocaína
§ Experimentou crack só uma vez e não sentiu-se bem.
§ Intensificou o uso quando ingressou num trabalho à noite.
Chegavam a usar 200g de cocaína e álcool por noite.
§ Separado, 4 filhos, 5 netos, completamente afastado da família,
que lhe cobrava o uso e lhe chamava de bêbado.
§ Uma filha foi acompanhar um grupo e passou a entender melhor
a situação do pai. Ajuda-lhe a buscar tratamento no CAPSad.
§ Motivo de tratamento: em função dos netos, quer acompanhar o
crescimento deles. Queria se reaproximar da família.
§ Sempre justificou o uso pelo trabalho.
19. § Irmãos e pai usavam álcool. Sempre muito afastado do pai, não
conviveu com ele, pai era muito fechado.
§ Hoje entende o comportamento do pai e culpa-se por não ter se
aproximado dele. Quando pensou em procurar o pai, ele faleceu
dias depois.
§ Preocupação com o que a terapeuta iria pensar, se recaísse. Mas
na época em que retorna ao uso, segue no caps.
§ Refere que no seu trabalho é como regra usar drogas. Trabalhar
é saúde, mas não neste trabalho .
§ Vem numa oficina sob efeito de álcool e cocaína, um dos
adolescentes que tem um bom vínculo com ele, lhe chama de pai
e pede que ele pare de usar. Chora ao falar que os filhos nunca lhe
trataram assim.
§ 8 meses após o início do tratamento, voltou a procurar a família.
Nota as diferenças no seu comportamento, percebe-se mais
educado.
§ Passa o primeiro natal em família, após 20 anos, diz que nem
sentiu vontade.
20. § Em momentos difíceis da sua vida, fala na
vontade de usar novamente.
§ Quando ajuda outros participantes, sente-se
bem, importante. Mais afetivo.
§ A filha conta que ele sempre foi muito bravo,
razão pela qual eram afastados, não em função
do uso de drogas.
§ Culpa-se por tratar as pessoas mal por impulso,
hoje tem controlado isto. Nos espaços coletivos,
brinca e aceita as brincadeiras do grupo.
§ Na última feira, convida a ex-mulher pra
prestigiar, aproxima-se dela em função de uma
situação traumática com o filho. A partir disto,
vai morar com ele.
21. Bibliografia
§ Souza, Tadeu. Redução de danos no Brasil: A clínica e a política em
movimento. Dissertação. Programa de Pós Graduação em Psicologia,
Departamento de Psicologia, UFF, 2007.
§ Vídeo: Cortina de Fumaça
§ Labate, Beatriz et al. Drogas e cultura: novas perspectivas. Salvador:
EDUFBA, 2008
§ Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Política
Nacional de Humanização da Atenção e Gestão do SUS. Clínica ampliada
e compartilhada. Brasília : Ministério da Saúde, 2009
§ Brasil, Ministério da Saúde. A política do Ministério da Saúde para
Atenção Integral a Usuários de Álcool e Outras Drogas. Brasília, 2003.