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CAPSUma nova abordagem a saúde
mental para Florianópolis
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO
TRABALHO DE CONCLUSAO DE CURSO
CAPS
ACADEMICA: STEFANY PAULA TROJAN
ORIENTADORA: VANESSA GOULART DORNELES
FLORIANÓPOLIS, AGOSTO DE 2016
Uma nova abordagem a saúde
mental para Florianópolis
CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 5
A trajetória durante todo este trabalho o curso de Arquitetura e
Urbanismo e o que me trouxe a este ponto fora rodeada por pessoas
que me deram apoio, e atenção, e muitas vezes um ombro pra chorar.
Destre estas uma pessoa que merece um agradecimento especial é
minha mãe, esteve ao meu lado me apoiando, e acreditando em mim,
até mesmo quando eu mesma duvidava. Me escutou, deu apoio, além
da educaçao até aqui.
Asos meus professores, que fizeram parte desta trajetória,
inspirando, ajudando, fazendo pensar e refletir. Obrigada a minha
orientadora, que dava força e motivação para continuar a trabalhar.
Um agradecimento especial a professora Marta Dischinger, por
se interessar e orientar mesmo sem obrigação, na vontade de fazer
crescer. Um obrigada ao professor Eduardo Wesphal, que já admirava
desde que fora emu professor de projeto e que atentou-se ao trabalho,
que não contentou-se em participar da pré-banca, se informou e se
interessou pelo tema, ajudou e orientou, acreditando e apoiando
minhas decisões de projeto, de maneira que me fizesse evoluir sem
perder a essencia do que acreditava.
Muitos amigos também estiveram do meu lado me apoiando durante
todo o percurso da faculdade. Minhas amigas Jaguelines, Bruna Brito,
Karla Shutz, Ana Paula Kincheski, Gabriela Drehmer, Luiza Losso,
Carla Fracchiola, Laís Garcia, que sempre acreditaram e apoiaram
durante todo o percurso e em especial a Luciana Bonetti, que me deu
uma ajuda especial neste trabalho, mostrando o quanto a referencia de
textos e pronomes são importantes e fazem a diferença. As meninas
Angela e Ana Nascimento, que dividiram tantos momentos de
trabalho, principalmente deste, dividindo os momentos de angustia e
apoiando uma a outra. Ao meu amigo André Santos Souza um super
agradecimentopor me ajudar neste trabalho e me mostrar que alguns
programas de diagramação não são um bicho papão.
Não teria como deixar de fora um enorme obrigada ao meu amigo
Tadashi Fujiwara, que além de apoiar, ajudar, ficar do meu lado,
não me fazer desistir, escutar as angustias e ainda ter paciencia pra
motivar quando o cansaço batia, ao meu parceiro de tantos diferentes
momentos, desde trabalhos, conversas, desabafos, festas, um super
obrigada.
A estes e tantos outros que fizeram parte de algums forma deste
processo, muito obrigada.
Agradecimentos
6 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 7
1.Apresentação
2. Temática
3. Arquitetura e Psicologia do indivíduo
4. Vivencias
5. Referências
6. O Lugar
7. O projeto
8. Conclusao
9. Referencias
10. Anexos
Sumário
Apresentação
1
10 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 11
O louco afasta-se da razão, mas pondo em jogo imagens,
crenças, raciocínios encontrados, tais quais, no homem da
razão. Portanto, o louco não pode ser louco por si mesmo,
mas apenas aos olhos de um terceiro que, somente este,
pode distinguir o exercício da razão da própria razão.
Michael Foucault
1.11.1
Introdução
“
”
As características do projeto seguiram linhas
descritas por estudiosos como Michel Foucault
e Nina Raquel Soalheiro, e principalmente pelos
requisitos mínimos exigidos na legislação vigente.
Também foram de fundamental importância as
visitas aos CAPS, através das quais pôde-se levar
em consideração os relatos dos profissionais e dos
próprios pacientes.
O projeto buscou dar conta da complexa
demanda deste tipo de instituição, prevendo um
espaço para uma recepção aconchegante, que
transmita confiança ao primeiro contato, e espaços
mais individualizados e;ou utilitários para a
atividade de triagem, consultórios, refeitórios para
pacientes e visitantes, espaços de terapias, balcão
para distribuição de medicamentos, oito leitos
para internações e espaço mais reservados para os
profissionais.
	 Desta forma, pretende-se abordar não só o
tratamento, como também a prevenção e quebra de
estigmas e preconceitos que existem em torno do
tratamento a pacientes com transtornos mentais.
Para tal, temos como premissa que a arquitetura
pode intermediar ou auxiliar no tratamento,
possibilitando um ambiente que promova não
só o tratamento, como é preconizado hoje, como
também inserção destas pessoas à vida social da
cidade/comunidade, como forma de tratamento.
Além ainda da intenção de proporcionar à cidade
um ambiente restaurador, que atue como integrador
social e convide as pessoas a conviverem e viverem a
cidade.
O presente trabalho foi elaborado em atendimento
a requisito de conclusão do curso de Arquitetura
e Urbanismo da Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC) e visa o desenvolvimento do projeto
arquitetônico do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS
III) - atendimento ininterrupto - às pessoas portadoras
de distúrbios mentais, no Município de Florianópolis.
Entre os fatore que impulsionaram este projeto
estão: a deficiência do atendimento psicossocial na
Grande Florianópolis; a inadequação dos espaços
hoje disponíveis diante da própria legislação
existente e das necessidades que devem ser dedicadas
a estes pacientes, conforme fartos estudos sobre o
temaç e ainda a emergência de novas propostas no
Brasil e no mundo.
12 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 13
Nossa sociedade hoje é assolada com uma crescente problemática
ao abuso de drogas, remédios psicoativos, pessoas transtornadas.
Números estampam capas de jornais e revistas. Reportagens abordando
o tema passam em diversos meios. Todavia, isto é apenas um sintoma
do que vivemos em nossa sociedade.
Ignoramos nossos problemas, por falta de tempo, por preconceito,
por vergonha. Muitos acreditam ser uma fraqueza demonstrar
sentimentos, ou ter algum problema psicológico. Focamos apenas
no trabalho, nos resultados, não damos importância ao ser, à nossa
vivência e individualidade. Apenas julgamos.
Isto faz com que nossa sociedade fique cada dia mais doente.
As doenças tomam uma proporção grande por falta de atenção e
nossas cidades deixam de ser protagonistas do viver e passam a ser
coadjuvantes do produzir.
Escondemos em nós e em nossas cidades os problemas. Os queremos
longe. Criando grandes paredes de preconceitos, de crenças que são
ainda parte estruturante da nossa cultura.
Vive-se, hoje, um momento de luta, de ressignificação ao tratamento
mental no Brasil e no mundo. A intenção de quebrar estes conceitos
criados pela sociedade de que o louco, o não produtivo, deve ser isolado,
separado, preso. Pretende-se uma reinserção, uma ressignificação,
e assim como no discurso da luta, isto se reflete na arquitetura e
urbanismo, em como moldamos nossas cidades e sociedade.
Entende-se que melhorar a qualidade do ambiente de tratamento
psicossocial é agregar à instituição mais um instrumento de combate
a estes estigmas e de experimentação e reinvenção ao que se faz ao
tratamento hoje, colocando a arquitetura a serviço da transformação
social e da qualidade de vida.
Sendoassim,pretende-secomestetrabalhocriarumespaçodetratamento
onde o usuário sinta-se estimulado e capaz de vivenciar a cidade em meio
à sociedade, vencendo seus medos, angústias e anseios e, principalmente,
pretende-se trazer a realidade destes ao convívio da cidade, para que se
tenha uma sociedade mais compreensiva, pois o problema maior não é
o “louco” não saber conviver em sociedade e sim a sociedade não saber
conviver com o “louco”.
1.3
Justificativa
1.2
A empatia pelo tema antecede o ingresso
na faculdade de arquitetura. Sempre me
interessei pela psicologia e pela influência
da arquitetura no psicológico do sujeito,
na vivência do mesmo, na cidade e nos
costumes sociais.
	 Além da ligação anterior com
a temática, no decorrer da graduação,
amigos passaram por transtornos
mentais e necessitaram de tratamento
em instituições do gênero. Em visita
à tais instituições, tive a impressão de
serem espaços segregados, impessoais
e de controle extremo, parecendo-me
inadequadas para recepcionar os pacientes
nos momentos de maior fragilidade.
	 Próximo ao início do projeto, o
relato de um amigo que ficara internado
em uma instituição de reabilitação pelo
uso de drogas, trouxe ainda a reflexão
sobre como a rotina, o espaço físico e o
convívio influenciavam diretamente na
sua recuperação.
A partir de então, sensibilizei-me ainda
mais à questão no contexto da nossa cidade
e aos silenciamentos em relação ao tema
em diversos níveis.
	 Sendo assim, optei neste trabalho
por buscar entender um pouco mais da
problemática e como a arquitetura e
urbanismo pode ou não influenciar na
mesma. Como a arquitetura poderia ser
uma aliada para melhora de vida tanto dos
que sofrem de alguma questão relacionada
a saúde mental, como para a sociedade
como um todo, desmistificando o tema e
quebrando preconceitos.
Motivação
14 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 15
1.51.4
MetodologiaObjetivos
4 - ANÁLISE
Após o levantamento foi feita uma análise
da área, contextualizando sua relação com
o entorno e a cidade, suas características,
seus condicionantes e suas potencialidades.
5 - DIRETRIZES
Propor um projeto de maneira a
considerar os mapas de intenções, sensações,
sentimentos, trajetos, eixos, assim como
mater as diretrizes entre a tectônica
arquitetônica e as conclusões das análises
de vegetação, topografia e gabaritos.
6 - PROPOSTA
Elaborar um projeto arquitetônico que
vise contemplar todas as potencialidades
do local, assim como atender ao máximo
as necessidades dos usuários, levantadas
nos estudos e análises descritos acima.
1 – LEITURAS E PESQUISAS
Leituras relacionadas ao tema, a história, as
lutas, as formas de tratamento, as diferentes
instituições responsáveis, assim como normas
e informativos relacionados ao mesmo.
2 - VIVÊNCIA
Visitas a locais de tratamento, conversas
com quem já passou ou passa por algum tipo
de tratamento relacionado à saúde mental, e
entrevistas com profissionais da área.
3 - RECONHECIMENTO
A partir da escolha do local de inserção
de projeto, foi realizado o levantamento
de dados do mesmo, visitas ao local e seu
entorno, consulta e execução de mapas de
reconhecimento e vivência de ambiências
do local pretendido para o projeto.
•	 Ampliar o atendimento das instituições
para a cidade como um todo, como
ponto de interação, convívio e
atendimento à saúde da cidade, como
espaço restaurador, de fomentação de
cultura e lazer, atendendo as demandas
locais e valorizando os espaços perante
a mesma;
•	 Afastar a rigidez, a padronização e
institucionalizações de espaços de
saúde, dando suporte espacial ao
tratamento personalizado.
1.4.1 OBJETIVOS GERAIS
Apresenta-se como objetivo geral deste
trabalho a proposição, através do espaço
projetado, de tratamento e inclusão social
de pessoas que sofrem de transtornos
mentais, desconstruindo preconceitos e
iniciando uma nova dinâmica social para a
valorização da pessoa, suprindo a demanda
municipal de atendimento a este público.
1.4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Como objetivos específicos, visa-se
promover a requalificação do espaço de
atendimento psicossocial em Florianópolis,
com enfoque na pessoa, de maneira a:
•	 Estender o espaço de tratamento na
cidade hoje, avaliando sua efetividade
para que, a partir disto, possa-se
propor ou melhorar, através do espaço
construído, o tratamento psicossocial
na cidade;
•	 Fomentar a discussão acerca da
qualidade dos espaços de tratamento
psicossociais como espaços de
experiência, vivência e tratamento,
propondo ambientes capazes de atrair
e informar aqueles que precisam de
atenção psicossocial na cidade;
Temática
2
18 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 19
É evidente que o internamento, em
suas formas primitivas funcionou
como um mecanismo social, e que
esse mecanismo atuou sobre uma área
bem ampla, dado que se estendeu dos
regulamentos mercantis elementares ao
grande sonho burguês de uma cidade
onde imperaria a síntese autoritária na
natureza da virtude. Daí a supor que
o sentido do internato se esgota numa
obscura finalidade social que permite
ao grupo eliminar os elementos que lhes
são heterogêneos ou nocivos, há apenas
um passo. O internato seria assim uma
eliminação espontânea dos a-sociais”.
(FOUCAULT, 2010a, p. 78)
No contexto dos movimentos iluminista
e do racionalista, do século XVII, observa-
se o reconhecimento da dade do “louco”
enquanto um sujeito marcado pela perda
da racionalidade humana. Busca-se então
devover racionalidade ao “louco” e para isso
ele passa a ser separado do grande grupo de
excluidos, e torna objeto da psiquiatria.
Em meados de 1880, Sigmund Freud
começa sua jornada no estudo da psicanálise
e tratamento psíquico, dando início a uma
vasta gama de teorias que até hoje perduram
no assunto, apesar de muitos rebaterem e
criarem estas teorias, como Yung e tantos
outros, que sugerem diferentes modos de ver
a loucura, suas causas e tratamentos.
Outro grande nome, pensador da temática,
todavia na área da filosofia, fora Michel
Foucault, que dedicou-se ao estudo da
população e suas interações. Na pesquisa de
assuntos referentes ao sujeito e poder, tratou
a loucura como mais um contexto social do
que meramente uma doença.
Desde a alta Idade Média, o louco é aquele
cujo discurso não pode circular como o
dos outros: pode ocorrer que sua palavra
seja considerada nula e não seja colhida
[…] Jamais, antes do fim do século XVIII,
um médico teve a ideia de saber o que era
dito (como era dito e porque era dito) nessa
palavra [do louco] que, contudo, fazia
diferença” (FOUCAULT, 2010b, p. 10-11)
	 Muito se falou da voz do louco e
de sua segregação da sociedade. Contudo,
apesar dos estudos e textos destes e outros
pensadores do assunto, a imagem negativa e
marginalizada do “louco” perdura até hoje e
em todo o mundo.
Ainda há quem tenha vergonha de
mostrar seus parentes com algum tipo de
transtorno mental. Também encontramos
pessoas que deixam de procurar tratamento
antecipadamente por vergonha, por ser um
problema visto como algo a ser colocado à
parte da sociedade, isolado de seu convívio.
2.1.1 HISTÓRICO DA LOUCURA NO MUNDO E O
PRECONCEITO NELA ENRRAIZADO
A forma de lidar com a loucura ao longo
dos tempos teve inconstantes evoluções (e
involuções), de acordo com as crenças sociais
de cada período. Porém, mais importante
que a história pura e seca ou a busca por
uma verdade, é a forma como a entendemos
e como lidamos com ela hoje em dia.
Nem sempre em nossa sociedade a figura
do louco teve uma conotação negativa.
NaGrécia Antiga aloucuraeravistacomo
um privilégio. Filósofos como Sócrates de
Platão ressaltavam a existência de um forma
de loucura tida como divina, “era através do
delírio que alguns privilegiados podiam ter
acesso a verdades divinas”.
Todavia, esta leitura foi se modificando.
Ainda na Antiguidade Clássica, os loucos
passaram a ser enviados à embarcações ou
para mercantes que os aceitassem, visando
evitar sua circulação na sociedade.
Do Antigo Regime até os dias atuais
No séc XVII, a Europa vivia o declínio dos
impérios ibéricos, um grande número de
conflitos internos e externos, além de baixas
colheitas devido a mudanças climáticas e a
peste negra. Neste contexto, segundo Maria
Ifigênia Sidrim (2010), populariza-se a
prática da clausura.
No Brasil, e no mundo, primeiramente, ocorreu um processo de isolamento e
encarceramento do louco ao longo da história. Em um segundo momento, a partir
de um novo contexto político-econômico-ideológico, o encarceramento passou a ser
visto como um problema, e assim iniciou-se o movimento antimanicomial brasileiro,
seguindo os rumos da história da psiquiatria mundial.
Grande enclausuramento e isolamento
disseminado na Europa funcionou
como estratégia para retirar do
convívio social todos os que, por causas
diversas, encontravam-se a margem da
sociedade. Esses grupos eram formados
pormendigos,leprosos,aleijados,loucos
e todos aqueles que fossem necessários
ocultar por significarem ameaça a
ordem social. (DESVIAT, 1999 apud
SIDRIM 2012, p21). O hospício original
não tinha como prática a aplicação de
qualquer espécie de tratamento. Seu
grande objetivo era proporcionar um
espaço destinado a reclusão de pessoas
marginais (AMARANTE et al., 1995,
p24 apud SIDRIM, 2012, p. 22)
Nessa época os loucos eram locados nos
antigos leprosários que, com o controle
da doença, foram substituídos pelos
doentes venéreos e por fim utilizados como
manicômios, locais distantes e isolados do
convívio social (FOUCAULT, 2010).
2.12.1
Histórico
20 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 21
2.1.2 NO BRASIL
No Brasil, o tratamento mental não foi por um
caminho muito diferente do que se passou na
Europa e Estados Unidos a partir da idade média.
Os loucos eram presos nos manicômios, submetidos
a tratamentos desumanos e muitos dos internos
eram internados sem realmente ter um problema
grave, e acabavam por se institucionalizar ou piorar
seus quadros devido aos tratamentos submetidos
nessas instituições1
.
Austregésilo Carraro Bueno foi um grande
incentivador da luta antimanicomial no Brasil,
reivindicando os direitos daqueles que passam por
tratamento e a atenção às suas famílias, atuando em
prol daqueles que precisam de amparo e que lutam
pela desinstitucionalização e dignidade de vida e
tratamento adequado.
A Reforma Psiquiátrica, no Brasil, baseou-se
no modelo Italiano, do início da década de 70,
questionando a forma asilar e propondo novas
alternativas de cuidado. “[...] a psiquiatria brasileira
surgiu numa época onde a higiene publica era um dos
fatores mais importantes para o crescimento, segurança
e embelezamento das cidades” (REIS, 2013, p.26).
A seguir, elencamos2
em ordem cronológica fatos
marcantes da nossa historia da saúde e cuidados
mentais que levaram a criação dos CAPS.
1
No filme “Bicho de sete cabeças”, baseado na bibliografia de Austregésilo Carrano Bueno (Canto do Malditos), vemos o
exemplo de uma história próxima à realidade de muitos dos internos que passaram por essas instituições. Austregésilo foi um
grande incentivador da luta anti-manicomial no Brasil.
2
Tendo como base o trabalhos de Reis (2013) e consulta ao artigo “A Reforma Psiquiátrica no Brasil” disponível no site da
Fiocruz, acessado em 30 de julho de 2016.
Contexto na Europa e nos EUA
Segundo Sidrim (2012), as críticas ao modelo
manicomial e manifestaram rapidamente nos
Estados Unidos quando no contexto da Guerra
do Vietnã, quando houve um brusco crescimento
do uso de drogas pelos jovens, o aparecimento de
gangues, o movimento “beatnick”, enfim, uma serie
de indícios de profundas conturbações no nível de
adaptações da sociedade e da cultura, da política e
da economia. Para a autora, o período pós Segunda
Guerra Mundial foi decisivo para a construção de
alternativas assistenciais que marcaram a psiquiatria
contemporânea. Começa-se a questionar a influência
daassistênciaeaspéssimascondiçõesaqueosinternos
eram submetidos na estrutura asilar existente. Dentre
as varias manifestações que ocorreram na Europa e
nos Estados Unidos, salienta-se:
1.Comunidade Terapêutica (Inglaterra) e
psicoterapia institucional (França) que visavam
a reforma psiquiátrica, restrita ao âmbito asilar;
2.Psiquiatria de setor (França) e psiquiatria
comunitária e preventiva (EUA) que buscavam
a superação da ideia de o espaço asilar ser o
único local de tratamento a investir alternativas
comunitárias e regionalizadas, embora
reservassem ainda ao hospital papel necessário
de tratamento; e
3.Antipsiquiatria (Inglaterra) e movimento
de desinstitucionalização (Itália) propuseram
ruptura absoluta com os modelos anteriores. Tais
movimentos colocaram em cheque conceito de
doençamental,formasdeintervençãoetratamento
existentes, e propunham completa extinção dos
hospitais psiquiátricos. (SIDRIM, 2012, p.23)
O movimento antimanicomial no nosso país é
marcado pela reivindicação desinstitucionalização. A
criaçãodenovosdispositivosquepropiciemaassistência
e a reinserção dos pacientes na sociedade é a base do
movimento que defende a criação centros de saúde
mental para todas as regiões da cidade. Prevendo-se
o atendimento a pacientes sem família, cooperativas
de trabalho para inserção dos pacientes no mercado
de trabalho e serviços diagnóstico e tratamento, com a
possibilidade de hospitalidade noturna.
2.12.1
22 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 23
A psiquiatria intensificou
o uso das técnicas como o
eletroconvulsoterapia, o choque
insulínico, as lobotomias. Em
1950, surgiram os primeiros
neurolépticos.
Foi promulgada a Constituição do
Centro Brasileiro de Estatuto da
Saúde e do Movimento de Renovação
Médica, que já foi um grande passo
para início das mudanças no
tratamento mental, muito disto
fundamentado nos exemplos e
constituição italianos.
É criado o primeiro Centro de
Atenção Psicossocial (CAPS) em
São Paulo, o CAPS Itapeva.’
É aprovada Lei 10.216 que dispõe
sobre a proteção e os direitos das
pessoas portadoras de transtornos
mentais e redireciona o modelo
assistencial em saúde mental,
priorizando a reinserção social
e substituição dos manicômios
por modelos de atendimento
mais humanizados.
O modelo privatista (iniciado em
1960) e hospitalocêntrico tornou-se
inviável para manter a estabilidade
financeira que, ao inicio da
década de 1980, o Estado vê-
se obrigado a adotar novas
politicas no setor da saúde.
Consolidando o Movimento Nacional
da Luta Antimanicomial (MNLA)13,
é realizado o 1º Encontro Nacional da
Luta Antimanicomial, em Salvador,
Bahia. Neste encontro, foi elaborada
a carta sobre os direitos dos
usuários e familiares aos serviços
de saúde mental. De acordo com
Soalheiro (2003), é necessário
para a mudança um conjunto de
estratégiasqueexigeminiciativas
políticas, jurídicas, culturais que
criam, possibilitam e marcam a
presença da loucura na cidade;
A Portaria nº 3.088, de 23 de
dezembro de 2011, republicada
em 21 de maio de 2013, instituiu
a Rede de Atenção Psicossocial
(RAPS) com a criação, ampliação
e articulação de pontos de atenção
à saúde para as pessoas em
sofrimento psíquico decorrente
de transtorno mental, uso
de álcool e outras drogas,
como espaço de cuidado de
porta aberta, primando pela
liberdade e cidadania.
Foram formadas associações de
usuários e familiares, como a
“Loucos pela Vida” de São Paulo
e a Sociedade de Serviços Gerais
para a Integração Social pelo
Trabalho - Manifesto de Bauru
que lutou e ainda luta pelos
direitos destes internos.
2.12.1
1830 - 1950
1976
1987
2001
Déc 1070
1993
2011
Meados da
década de 80
A Comissão da sociedade de
medicina do Rio de Janeiro
diagnosticou a situação dos
``loucos da cidade``, os quais
passam a ser considerados
doentes mentais e merecedores
de um espaço social próprio
parasuareclusãoetratamento;
Ocorreu a ampliação da estrutura
asilar no Brasil através de colônias
para alienados que utilizavam
o trabalho como terapia de
tratamento;
Foi inaugurado o primeiro hospício
brasileiro, o hospício Pedro II. Até
1881, a Igreja assumiu a direção;
Foi fundada a Liga Brasileira de
Higiene Mental no Rio de Janeiro.
Tratava-se de uma visão sobre
a loucura que a considerava
doença hereditária;
1830
Até 1920
1852 - 1890
1923
LINHA CRONOLÓGICA
24 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 25
2.2
2.2.1 ESTRUTURA NACIONAL
A partir da grande luta nacional por um
tratamento melhor à saúde mental, incluindo os
efeitos do álcool e outras drogas, foi montada
uma estrutura que abrange diversos serviços e
equipamentos, intitulados como RAPS - Rede de
Atenção Psicossocial.
‘’A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) tem como
finalidade a criação, ampliação e articulação
de pontos de atenção à saúde para pessoas com
sofrimento ou transtorno mental e com necessidades
decorrentes do uso de álcool e outras drogas, no
âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Dentre as
principais diretrizes da RAPS, é importante destacar:
•	 Respeito aos direitos humanos, garantindo a
autonomia e a liberdade das pessoas;
•	 Promoção da equidade, reconhecendo os
determinantes sociais da saúde;
•	 Combate a estigmas e preconceitos;
•	 Garantia do acesso e da qualidade dos serviços,
ofertando cuidado integral e assistência
multiprofissional, sob a lógica interdisciplinar;
•	 Atenção humanizada e centrada nas necessidades
das pessoas;
2.2.1.1 ORGANIZAÇÃO DA REDE DE
ATENÇÃO PSICOSSOCIAL E SUAS
DEFINIÇÕES
As intervenções em saúde mental não
devem ficar restritas à cura de doenças, mas
possibilitar a troca e compartilhamento de
conhecimentos para a produção da saúde,
e melhorias nas condições e modos de vida
das pessoas na comunidade.
A RAPS atualmente é composta pelos
Centros de Convivência e Cultura;
Centros de Atenção Psicossocial (CAPS);
Unidade de Acolhimento (UA); Serviços
Residenciais Terapêuticos (SRT); e os
leitos de atenção integral (em hospitais
gerais e nos CAPS III). Contam ainda
com programas junto a atenção básica
(NASF - Núcleo de Apoio a Saúde da
Família), programas de consultório na rua
e estratégias de reabilitação psicossocial.
Faz parte ainda da política nacional, o
programa de Volta para Casa, que oferece
bolsas para pacientes egressores de longas
internações em hospitais psiquiátricos. A
seguir, com base no Manual de Estrutura
Física dos Centros de Atenção Psicossocial
e Unidades de Acolhimento (BRASIL,
2013) e nas diretrizes elencadas no Saúde
Mental, Álcool e Outras Drogas (SANTA
CATARINA,2015),apresentamosumesboço
de como se configuram os equipamentos
institucionais de atendimento psicossocial.
CAPS - Centro de Atenção Psicossocial
Os CAPS, nas suas diferentes
modalidades, são pontos de atenção
estratégicos da RAPS, fornecendo serviços
de saúde de caráter aberto e comunitário
constituídosporequipesmultiprofissionais,
que atuam sob a ótica interdisciplinar e
realizam prioritariamente atendimento às
pessoas com transtornos mentais graves
e persistentes e/ou com sofrimento ou
transtorno mental em geral, incluindo
aquelas com necessidades decorrentes
do uso de crack, álcool e outras drogas,
•	 Desenvolvimento de atividades no território, que
favoreça a inclusão social com vistas à promoção
de autonomia e ao exercício da cidadania;
•	 Desenvolvimento de estratégias de Redução de
Danos;
•	 Ênfase em serviços de base territorial e
comunitária, com participação e controle social
dos usuários e de seus familiares;
•	 Desenvolvimento da lógica do cuidado para
pessoas com sofrimento ou transtorno mental,
incluindo aquelas com necessidades decorrentes
do uso de crack, álcool e outras drogas, tendo
como eixo central a construção do projeto
terapêutico singular”
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013, p. 5)
Apesar de toda a ideologia estruturante nacional, a
RAPS acontece a nível municipal, com atendimento
conjunto com os equipamentos do município de
acordo com suas demandas específicas.
em sua área territorial, seja em situações
de crise ou nos processos de reabilitação
psicossocial (BRASIL, 2011).
Constituem-se como um lugar de
referência e de cuidado na comunidade,
promotor de saúde e que tem a missão de
garantir o exercício da cidadania e a inclusão
social de usuários e de seus familiares.
“Tem por finalidade promover atenção
integral aos portadores de transtornos
mentais severos e persistentes,
desenvolvendo práticas clínicas que
lhes permitam viver em comunidade,
ter acesso ao trabalho, lazer e direitos
civis.” (BRASIL, 2004)
Por ser unidades responsáveis para
promover a assistência e reinserção
dos usuários, o CAPS deve oferecer
diferentes tipos de atividades terapêuticas
como: atividades comunitárias, oficinas
terapêuticas, atividades artísticas,
orientação e acompanhamento do uso
da medicação, atendimento domiciliar
e aos familiares, psicoterapia individual
ou em grupo (BRASIL, 2005), além de
oferecer tratamento multidisciplinar
com psiquiatras, enfermeiros, psicólogos,
assistentes sociais, nutricionistas, clínicos
gerais e terapeutas ocupacionais.
Os CAPS têm papel estratégico na
articulação da RAPS, tanto no que se
refere à atenção direta visando à promoção
da vida comunitária e da autonomia dos
usuários, quanto na ordenação do cuidado,
trabalhando em conjunto com as AB/ESF
e Agentes Comunitários de Saúde (ACS),
articulando e ativando os recursos existentes
em outras redes, assim como nos territórios.
Atualmente existem 2.382 CAPS em
todo o Brasil.
Tratamento mental hoje
2.2
26 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 27
2.2
UA - Unidades de Acolhimento
Local reservado para internações
necessárias em momentos de surto, após
uma triagem pelo primeiro atendimento
nos CAPS ou outras instituições adequadas,
além dos hospitais psiquiátricos, instituída
pela Portaria GM/MS n. 121, de 25 de
janeiro de 2012.
SRT - Serviço Residencial Terapêutico
Os SRTs constituem-se em modalidade
assistencial substitutiva da internação
psiquiátrica prolongada (Portaria
nº.3.090/2011) e constituem-se em
residências terapêuticas alternativas de
moradia para um grande contingente de
pessoas que muitas vezes, por não contarem
com adequado suporte familiar ou da
comunidade, estão internadas há anos
em hospitais psiquiátricos. Já temos 620
residências terapêuticas em todo o país.
MODALIDADES DOS CAPS
Os CAPS estão organizados nas seguintes
modalidades:
CAPS I:
Atende pessoas de todas as faixas
etárias que apresentam prioritariamente
intenso sofrimento psíquico decorrente de
transtornos mentais graves e persistentes,
incluindo aqueles relacionados ao uso de
substâncias psicoativas, e outras situações
clínicas que impossibilitem estabelecer
laços sociais e realizar projetos de vida.
Indicado para Municípios ou regiões
de saúde com população acima de 15
mil habitantes.
CAPS II:
Atendimento semelhante ao CAPS I,
todavia apenas a adultos.
Indicado para Municípios ou regiões
de saúde com população acima de 70 mil
habitantes.
CAPS III:
Atendimento semelhante ao CAPS II,
entretanto proporciona ainda, serviços de
atenção contínua, com funcionamento vinte
e quatro horas, incluindo feriados e finais
de semana, ofertando retaguarda clínica e
acolhimento noturno a outros serviços de
saúde mental, inclusive CAPS AD.
Indicado para Municípios ou regiões
de saúde com população acima de 150
mil habitantes.
Programas de Volta para Casa e Estratégias de
Reabilitação Psicossocial
O primeiro “De volta para casa” é um programa
de inserção social para pessoas acometidas de
transtornos mentais, egressas de longas internações,
através de pagamento do auxílio-reabilitação
psicossocial.
O segundo é uma gama de ações de trabalho
comunitário reintegrador ao contexto social, capaz
de dar nova significação individual e social para
as pessoas acometidas pelo transtorno mental e
também para suas famílias.
Os atuais projetos voltados para o modelo
de reabilitação psicossocial têm focado quatro
aspectos: moradia, trabalho, família e criatividade
(lúdico/artística).
Quadro informativo dos serviços ligados a saúde
mental e seus pontos de atenção de acesso:
CAPS AD:
Atende pessoas de todas as faixas
etárias que apresentam intenso sofrimento
psíquico decorrente do uso de crack, álcool
e outras drogas. Proporciona serviços de
atenção contínua, com funcionamento
vinte e quatro horas, incluindo feriados
e finais de semana, ofertando retaguarda
clínica e acolhimento noturno.
Indicado para Municípios ou regiões
de saúde com população acima de 150
mil habitantes.
CAPS ADIII:
Atende adultos, crianças e adolescentes,
considerando as normativas do Estatuto
da Criança e do Adolescente, com
necessidades de cuidados clínicos
contínuos. Serviço com no máximo doze
leitos para observação e monitoramento,
de funcionamento 24 horas, incluindo
feriados e finais de semana.
Indicado para municípios ou regiões com
população acima de 150.000 habitantes.
CAPSi:
Atende crianças e adolescentes que
apresentam prioritariamente intenso
sofrimento psíquico decorrente de
transtornos mentais graves e persistentes,
incluindo aqueles relacionados ao uso de
substâncias psicoativas, e outras situações
clínicas que impossibilitem estabelecer
laços sociais e realizar projetos de vida.
Indicado para municípios ou regiões
com população acima de 70 mil habitantes.
2.2
28 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 29
2.2
2.2.1.2 TIPOS DE TRANSTORNOS ATENDIDOS
Otemadasdoençasmentais,aindaquenãototalmentedesmistificado,
gera muito interesse na sociedade. O jornalismo pautou a questão em
diversas oportunidades. Neste trabalho, reproduzimos os trechos
mais pertinentes de uma reportagem do portal de notícias G1.
2.2
As doenças psiquiátricas mais comuns na população são a depressão
e os transtornos de ansiedade. Segundo o médico do departamento de
psiquiatria da Unifesp Adriano Resende Lima, aproximadamente 10% das
mulheres e 6% dos homens vão ter um episódio depressivo ao longo da vida.
“Hoje a depressão é o segundo maior problema de saúde pública no
mundo, de acordo com dados da OMS [Organização Mundial da
Saúde]. É importante a população saber que transtornos depressivos e
ansiosos são comuns e causam grande impacto”, explica o psiquiatra.
Os transtornos ansiosos são: pânico, com incidência de 3,5% na
população; e o transtorno de ansiedade generalizada, com 3,4%. A
esquizofrenia é uma doença considerada rara, que afeta 1% da população.
Há duas linhas complementares de tratamento para os transtornos
mentais comuns: o farmacológico, com remédios, e o psicoterapêutico,
com diferentes tipos de terapia. Para a depressão e ansiedade
geralmente são ministrados antidepressivos, que variam de acordo
com a natureza do caso.
(G1, acesso em 30/07/2016 - Reportagem “ Conheça as doenças
mentais mais comuns e saiba onde procurar ajuda”)
30 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 31
2.2.1.82.2.1.8
2.2.1.3 DEMANDA DE ATENÇÃO
PSICOSSOCIAL NO BRASIL
Deacordocomareportagem, ostranstornos
mentais acometem, em algum momento da
vida, ao menos 20% da população mundial.
Apesar de mudanças, especialistas na área
consideram a rede de atendimento público
ainda insuficiente. “Faltam investimentos
e faltam Caps. Também faltam unidades
básicas de saúde com capacidade para atender
os transtornos mentais. É preciso uma política
nacional que realmente olhe para o problema
de forma abrangente e forneça recursos” (G1,
acesso: 30/07/2016), diz o psiquiatra Marcel
Higa Kaio, diretor técnico do Caps Itapeva, à
reportagem mencionada anteriormente.
Em 2011, segundo a Associação Brasileira
de Psiquiatria, transtornos mentais são
a segunda causa dos atendimentos de
urgência. Uma pesquisa da Universidade
Federal de São Paulo (Unifesp) de 2006
realizada no Serviço de Atendimento
Móvel de Urgência (Samu) de Marília, no
interior de São Paulo, mostrou que 16%
dos pacientes atendidos apresentaram
transtornos mentais e do comportamento.
(G1, acesso: 30/07/2016)
Em levantamentos em 2011, no Brasil,
23 milhões de pessoas (12% da população)
necessita de algum atendimento em saúde
mental. Pelo menos 5 milhões de brasileiros
(3% da população) sofrem com transtornos
mentais graves e persistentes.
2.2.1.4 UMA OUTRA VISÃO A
PROBLEMÁTICA DO ABUSO DE
ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS
Em 2015, o escritor e jornalista britânico
Johann Hari publicou um livro em que
relaciona o problema da sociedade com
este problema social do uso de drogas, o
“Chasing the Scream: The First and Last
Days of the War on Drugs”. Este mesmo,
publicou um texto comentando sobre sua
jornada e pincelando a problemática geral.
Nele, faz algumas relações entre o vício nas
drogas e esta doença social por assim dizer.
O texto de Hari relata um experimento
feito com ratos que mostra didaticamente
como funciona e o porque do crescente
aumento no vício em drogas em nossa
sociedade. A conclusão da experiência
foi que o problema não são as drogas
em si, mas sim a fala de convívio social,
interações interpessoais, o que faz com que
o individuo não crie laços e se refugie nas
drogas.
Hari traz também o exemplo dos
soldados na guerra do Vietnã, onde cerca
de 20% dos soldados ficaram viciados em
heroína. Mas ao voltarem a sua boa via,
95% largaram o vício. Além de diversos
outros exemplos e constatações de que a
droga não é a causa e sim a solução.
Por isso a dificuldade de largar o vício,
pois não se trata simplesmente do vício
em si, mas a falta de conexão, seja consigo
mesmo, com outro, ou até mesmo com a
sociedade. É neste contexto que reside a
importância do trabalho dos RAPS e CAPS.
É parte de um instrumento de conexão das
pessoas em diversos parâmetros, sendo, de
acordo com Hari, o modo mais eficiente de
evitar o aumento no número de casos de
abusos de álcool e outras drogas.
Hoje no Brasil um dos maiores problemas
com relação ao tratamento da saúde mental,
que vem crescendo a cada dia, são os
transtornos ocasionados pelo uso excessivo
de drogas, que acabam por trazer diversos
outros problemas socais e, apesar de diversas
iniciativas e ações do governo, o problema
não pare de aumentar a cada dia em nossa
sociedade.
Estaconstataçãofoiconfirmadanãosomente
através de conversa com uma funcionária da
secretaria da saúde, mas também percebemos
tal situação através da importância a que se da
ao tema nas mídias e em novos tratamentos
ou pontos de atendimento.
Um levantamento em Limeira, no
interior de São Paulo, apontou que
51% dos atendimentos no CAPS são
usuários de entorpecentes, e no ano
passado, os atendimentos no CAPS já
haviam registrado aumento de 31% em
relação a 2014 (G1, acesso: 30/07/2016)
De acordo com a Associação Brasileira
de Psiquiatria, apesar de a política de saúde
mental priorizar as doenças mais graves,
como esquizofrenia e transtorno bipolar,
as mais comuns então ligadas a depressão,
ansiedade e a transtornos de ajustamento.
32 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 33
2.2.2 ESTRUTURA MUNICIPAL
2.2.2.1 DEMANDA DA CIDADE
De acordo com o censo de 2010, a Grande Florianópolis tinha uma
população de 1.027.271 (Plano Operativo Estadual de Saúde Mental -
2012 - 2015 - Região 18 - Grande Florianópolis, da Secretaria do Estado
de Saúde do Estado de Santa Catarina). Com base nas projeções dos
resultados de pesquisa de Teixeira (1998), a região apresentou estimativa
de ocorrência de pacientes com algum tipo de transtorno conforme
quadro abaixo (condizente com as estatísticas internacionais):
2.2 2.2
A Portaria GM/MS no. 148, de 25 de janeiro de 2012, preconiza um leito para cada
23.000 habitantes, o que representaria, para a região, 44 leitos em hospitais gerais.
A região, contudo, é a capital da unidade federativa e é o maior polo de atração
de todo o Estado. Casos psiquiátricos complexos e refratários chegam a até aqui
para investigações e pareceres, avaliações, perícias e até mesmo para tratamento,
como centro de referência. Portanto apresenta um crescimento populacional
superior a média nacional.
Possivelmente vários pacientes compreendidos nestes percentuais podem
apresentar sintomas avulsos na forma de queixas esporadicamente, demandando
atenção primária momentânea, sem contudo considerar a hipótese de transtorno
mental, e para tanto aproveitam consultas agendadas para outras finalidades, ou
marcarão consultas específicas.
Uma fração delas solicitará algum tipo de atenção psicossocial maior e repetida,
por parte da rede básica, onde serão diagnosticadas e atendidas. Esta fração pode
ser estimada, na região, em torno de 82.600 possíveis utentes do sistema, para
o ano de 2012. Destes, cerca de 8.100 provavelmente serão encaminhados para
avaliação acurada ou para cuidados de especialistas em saúde mental (psicólogos,
psiquiatras ou terapeutas ocupacionais). Certamente um número bem menor
será portador de problemas crônicos graves, que requeiram seguimento longo,
continuado ou vitalício, caso funcionem os mecanismos de contra-referência.
A distribuição dos casos, segundo categorias nosológicas, estão dispostas na
próxima tabela.
34 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 35
2.2.2.2 ESTRUTURA DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL EM
FLORIANÓPOLIS
Temos hoje na cidade de Florianópolis quatro unidades CAPS em
funcionamento. Sendo dois CAPS AD em funcionamento e um AM
finalização. Um CAPS II e um CAPS I.
De acordo com o último senso realizado
no ano de 2010, Florianópolis tem uma
população com cerca de 420 mil habitantes,
com estimativa para chegar a 460 mil no ano
de 2014. Para cidades com população acima
de 150 mil habitantes, de acordo com o
Manual de Ambientes da Secretaria da Saúde,
é indicado o CAPS III, com atendimento
mais completo. Todavia o município ainda
não possui este equipamento.
Atualmente, são complementares aos CAPS
os ambulatórios especializados de psiquiatria,
que suprem parte da carência de consultas.
A região conta ainda com um ambulatório
capaz de prestar atenção a problemas de saúde
mental, vinculado aos Cursos de Medicina e
Enfermagem da Universidade do Sul de Santa
Catarina (UNISUL), em Palhoça, e com
o Hospital Regional Homero de Miranda
Gomes, público estadual, em São José, que
atende precariamente a região.
Locais de apoio a tratamento psiquiátrico
na grande Florianópolis:
•	 Instituto São José Ltda - ala de
psiquiatria
•	 Instituto de Psiquiatria de Santa
Catarina - Colônia Santana
•	 Hospital Colônia Santana - Colônia
Santana
•	 Hospital Caridade - unidade de
psiquiatria
•	 Hospital Universitário Polydoro Ernani
de São Thiago - laboratório psiquiátrico
2.2 2.2
O Hospital Universitário (HU) da
Universidade Federal de Santa Catarina
(UFSC), mediante convênio firmado desde
2003 com a Residência Médica da Secretaria
de Estado da Saúde mantém um ambulatório
de psiquiatria de boa qualidade.
Foi proposto a implantação de 53 leitos
de atendimento mental mais voltados
ao uso de álcool e outras drogas, sendo
30 leitos para São José, 16 leitos infanto-
juvenis e 07 para adultos na cidade de
Florianópolis, todos locados em Hospitais
comuns, de acordo com o Plano Operativo
Estadual de Saúde Mental 2012 - 2015.
Os 07 leitos para adultos na cidade
de Florianópolis, locados no Hospital
Universitário, funcionarão como retaguarda
à emergência, visando manter um tempo de
permanência máxima de 72 horas.
‘’A estimativa de uma prevalência
anual de necessidade de internação
psiquiátrica, ao redor de 0,2%,
implicaria numa população de 1.620
utentes na região. Num conjunto de 53
leitos, poder-se-ia fazer 135 internações
por mês, incluindo as emergenciais
e as observacionais breves, de curta
duração. Isto implicaria uma média
de 2,5 internações por leito, por mês.
A média geral de permanência no
hospital, se mantida em 12 dias,
cobriria plenamente as necessidades.’’
(PLANO OPERATIVO ESTADUAL
DE SAÚDE MENTAL, 2012)
Aqui fica a crítica ao sistema proposto
à implantação dos leitos, podendo ser
suficientes para a demanda de emergências
de álcool e outras drogas, todavia em
atendimentohospitalar,institucionalizado,
sem o preparo e abrangência que se propõe
em unidades de CAPS.
A proposta de implantação de
leitos podem atender as demandas de
emergências de vítimas de abuso de álcool
e drogas, porém não há preparo para suprir
a necessidade do atendimento que deve ser
oferecido num CAPS.
Atualmente, apenas o município de
Florianópolis possui unidades de pronto
atendimento de 24 horas (UPA), com duas
unidades habilitadas e recebem custeio
regular do Ministério da Saúde - elas
dispõem de atendimento psicossocial 24h
para atendimento emergencial, todavia não
são especializadas em atendimento mental.
Uma sala de atendimento e de
observação psiquiátrica de alto nível está
sendo planejada, num trabalho conjunto
com a Secretaria Municipal de Saúde de
Florianópolis e a Universidade Federal de
Santa Catarina, na Emergência do Hospital
Universitário da UFSC. Ela impor-se-á
na prestação de serviços regionais e na
formação de estudantes, inclusive como um
dos cenários para a residência médica em
psiquiatria e a residência interdisciplinar
em saúde mental, ambas da Secretaria de
Estado da Saúde - ainda não instaurada.
CAPS ad Continente Estreito CAPS ad Ilha - PantanalCAPS ad - Jardim Atlântico
CAPS I - Agronômica CAPSi Centro
36 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 37
A implantação de unidades de atendimento
proposta para a região da Grande Florianópolis está
assim distribuída:
No município de São José há três serviços
residenciais terapêuticos mantidos pelo Estado
e nenhum, mas a região não dispões de nenhum
residencial terapêutico mantido por municípios.
Atualmente em Florianópolis os CAPS tratam
os pacientes em geral, tanto os dependentes
químicos como os portadores de transtornos
mentais, como se portadores de doenças
hormonais tratáveis com remédios, sem análise
ou psicanálise (conversas e terapias).
2.2.2.3 A ESCOLHA. UMA UTOPIA
PARA A CIDADE?
OBrasilvemapresentandoumcrescimento
abrupto no consumo de ansiolíticos,
antidepressivos e outros, nadando contra
a maré, tentando remediar os efeitos sem
contudo repensar as causas, que muitas vezes
acaba agravando mais o quadro daqueles que
poderiam ter os sintomas abrandados com
simples práticas cotidianas.
Da mesma forma, nas instituições, o
tema da institucionalização é abordado de
maneira a expor a realidade dos tratamentos
que agravam o problema pela “mortificação
do eu”, tema também abordado por Foucault
como “disciplinarização”, através do
controle disciplinar da atividade humana
bastante forte, onde o paciente é restrito de
liberdade e tem seu espaço pessoal limitado.
Nas instituições não tratamos diferente.
No trabalho de pós-graduação em
arquitetura, da aluna Aline Eyng Sava
(2008), o tema da institucionalização é
abordado de maneira a expor a realidade de
nossos tratamentos. Em nossas instituições
de tratamento, segundo a autora, agravamos
o problema pela “mortificação do eu”,
tema também abordado por Foucault
como “disciplinarização”. Há um controle
disciplinar da atividade humana bastante
forte, onde o paciente é restrito de liberdade
e tem seu espaço pessoal limitado.
Como exposto no trabalho de Goffman
(1996), as obrigações dentro destas
instituições ou até mesmo sociais acabam
por refletir em uma perda da sensação de
escolha pessoal. Outro fator bastante forte
nos tratamentos é a ausência dos bens,
que tem uma relação bastante forte com a
identidade pessoal.
Nestas instituições os indivíduos são
estimulados a interagir com pessoas nas
quais muitas vezes não possuem afinidade,
desrespeitando as características particulares
de cada interno. Em tais “instituições totais”,
a “mortificação do eu” pode resultar em
“desculturamento” que significa perda dos
hábitos e costumes derivados do contexto
socioeconômicoanteriorainstitucionalização,
tornando o indivíduo incapaz de enfrentar os
aspectosdavidadiária.Savi(2008),caracteriza
estas instituições totais como ”estufas para
mudar pessoas”, para se moldarem aos
parâmetros sociais.
E esta é a realidade que constatamos
em visita ao CAPS Ponta do Coral. Sendo
assim, a partir dos estudos realizados,
concluimos que o ideal para a cidade seria a
implementação de um CAPS III, com uma
real atenção ao indivíduo, ao tratamento
multidisciplinar, humano, fugindo dos
padrões institucionais de leitos hospitalares
e tratamentos frios que temos hoje.
Agregado a esta instituição, propõe-se a
instalação de um Centro de Convivência
e Cultura, com trabalhos em conjunto
ao CAPS, promovendo a interação com a
sociedade, estimulando a reinserção social
dos usuários a mesma, como também e
principalmente a informação desta como
forma de dissociação do preconceito perante
a ‘’loucura’’, trazendo o tema ao meio social
e para a vivência da cidade.
2.2 2.2
Arquitetura e Psicologia
do indivíduo 3
40 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 41
3.1 CONCEITO DE AMBIENTES
RESTAURADORES E SUA
RELEVÂNCIA
Apartirdadécadade1980,aspesquisassobre
ambientes restauradores ganharam maior
visibilidade, sugerindo este termo a partir de
teorias propostas por Rachel e Stephen Kaplan
e Roger Ulrich (GRESSLER; GUNTER, 2013).
Uma gama de pesquisas e estudos sobre
ambientes capazes de provocar ou amenizar
o estresse nos indivíduos começaram a
ser divulgadas e alguns preceitos foram se
moldando. Passou-se a estudar o “apego ou
desapego ao lugar, identidade e significado
do lugar, ambientes calmos ou estressantes”
(GRESSLER; GUNTER, 2013).
Na teoria da recuperação psicofisiologia
ao estresse proposta por Ulrich, enfatiza-se a
percepção visual e estética de certos ambientes
à resposta afetiva associada. Ulrich defende
que a exigência ligada ao excesso de tomada
de decisão pode levar ao estresse, resultando
em emoções negativas, mudanças negativas
do sistema fisiológico e aumento da atenção
de vigilância (automática).
Ambientes físicos, visualmente prazerosos,
podem auxiliar na redução do estresse.
Além disto, considerou-se alguns aspectos
da natureza também capazes de promover
a recuperação psicofisiológica ao estresse,
como a água e a vegetação, principalmente
gramados e árvores. Os resultados desta
pesquisa sugerem que “apenas um vislumbre
da natureza pode possibilitar a recuperação do
estresse” (GRESSLER; GUNTER, 2013).
Já Stephen e Rachel Kaplan, apesar de
estudarem a mesma temática propõem uma
teoria um pouco diferente da restauração da
atenção. Para os autores a qualidade da inter-
relação de um sujeito com o ambiente está
relacionada às ações inerentes ao individuo e
aos parâmetros de informação oferecidos pelo
ambiente.Sugeriramcomofatorespromotores
de restauração, as etapas: fascinação,
afastamento, extensão e compatibilidade.
A fascinação está ligada a atenção
involuntária, podendo ser de intensidade
moderada, voltada a estímulos esteticamente
agradáveis, permitindo a capacidade de
reflexação. Ou a fascinação aguçada,
relacionada a atenção às atividades como
assistir a um evento esportivo, por exemplo.
Afastamento envolve a possibilidade
geográfica e/ou psicológica de se estar
afastado do contexto usual, contexto que
permita a promoção de mudança de nossos
pensamentos cotidianos.
Extensão seria o conceito de ambiente físico
que permite uma exploração e interpretação,
mantendo interação com o mesmo, sem
provocar tédio durante um período de tempo.
Um ambiente rico, seria aquele que dá margem
à futura exploração. A compatibilidade refere-se
ao suporte que o ambiente dá ao seu propósito
e às possíveis ações no ambiente. Apesar de
diversos aspectos, um ambiente restaurado
é percebido como um todo, em que todos os
elementos estão relacionados de forma coerente.
A questão da agressividade é tema corrente
dentro dos CAPS, seja pela dificuldade dos
usuários em expor suas questões, ou seja pelo
estresse do dia-a-dia. No artigo “Ambientes
restauradores: Definições, histórico, abordage
e pesquisas” (GRESSLER; GUNTER, 2013),
relaciona-se a agressividade com o estresse,
podendo agravar as situações. Defende-se,
no trabalho, que aquelas pessoas com maior
contato com ambientes naturais apresentam
menor grau de agressividade e estresse.
Conceito de ambientes
restauradores e sua relevância
3.1
Destacou-se ainda a importância da exposição
a luz do sol, com benefícios fisiológicos e
psicológicos positivos comprovados.
Acredita-se que o significado de
experiências restauradoras provém da inter-
relação dos componentes físicos e sociais,
e pode ser caracterizado por diferentes
dimensões afetivas.
Com relação às diferentes preferências
pessoais e à aparência do lugar, Galindo
e Hidalgo (2005) demonstraram que
os atributos estéticos não afetam a
categorização de um local como atrativo
ou pouco atrativo. É o fator restaurador
do local que afeta a sua categorização
como um local atrativo ou pouco atrativo
(Purcell, Peron, & Berto, 2001, apud
GRESSLER; GUNTER, 2013).
3.2 COMO A ARQUITETURA
INFLUENCIA NO TRATAMENTO E
PERCEPÇÃO DO SER.
De acordo com artigo “Supporting the
psychosocial needs of cancer patients through
desing”, (KRUMP; NORDLING, 2012),
em tradução livre “Apoio as necessidades
psicossociais dos pacientes com câncer através
dedesing”),queconsideraaindaasnecessidades
de pacientes de câncer, o ambiente é um fator
decisivo ao tratamento para pessoas com
algum tipo de sofrimento mental.
“Olhar para o suporte das necessidades do
paciente significa olhar para suas necessidades
de vulnerabilidade. Dignidade, privacidade e
empoderamento.” (KRUMP; NORDLING,
2012, p.3 - tradução livre). O design do espaço
construído pode proporcionar ao paciente
sensações de que este está no controle
da situação, muitas vezes oposto a sua
realidade. Podem ser utilizadas estratégias
na conformação da edificação, para que
o individuo tenha a sensação de poder de
escolha, controle, privacidade, reduzindo seu
sentimento de vulnerabilidade.
Um exemplo de tais estratégias seria o
uso de portas deslizantes que permitam
fechamento ou abertura dos ambientes,
tendo-se escolha no nível de privacidade,
controle de iluminação. Opções de escolha
de diferentes ambiências dão ao individuo
a sensação de controle, empoderamento e
dignidade perante a arquitetura habitada.
Os espaços devem ainda, além de
possibilitar os recantos individuais, estimular
e encorajar a conversa e a convivência,
uma vez que estudos mostraram a eficácia
destes espaços na redução do sentimento
de ansiedade, isolamento, dor e melhora na
qualidade de vida.
Ressalta-se ainda a importância da
exposição a luz solar, como já mencionado,
que aumenta a serotonina do indivíduo,
reduzindo o estresse, ansiedade. A
importância dos jardins é afirmada no estudo
(KRUMP; NORDLING, 2012), enquanto
pequenos recantos em contato com a natureza
como ambientes restauradores e promotores
de socialização, com contato a natureza.
Discorre-se ainda sobre a importância dos
espaços terem uma leitura fácil aos pacientes,
de modo a não proporcionar estresse aos
mesmos, tendo uma entrada bem demarcada,
caminhoscobertosefacilidadedecompreensão
dos trajetos realizados dentro da edificação,
com identidade visual de sinais claros para se
indetifucar os caminhos com facilidade.
Outro aspecto levantado em estudo de
caso, no artigo de Krump e Nordling (2012),
fala da presença de obras de arte coloridas
e inspiradoras ao longo das passagens,
com histórias de sobreviventes, fornecendo
esperança e inspiração àqueles que estão
em tratamento. De forma que ex-pacientes
tenham expostas suas obras nos CAPs.
3.1
Vivencias
4
44 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 45
4.1.1 CAPS PONTA DO CORAL
O acesso ao CAPS Ponta do Coral
(CAPS II) situado no Bairro Agronômica
em Florianópolis, não foi dos mais fáceis.
Conforme me foi informado, atualmente
o atendimento é prestado através de
agendamento pela secretaria da saúde, e
só posteriormente é permitido o acesso ao
local pelos usuários.
O reconhecimento fora feito através de
visitajuntoàturmadepsicologiadadisciplina
de Esquizologia da UFSC, acompanhado
pelo o professor responsável Marcos Eduardo
Rocha Lima. Na oportunidade, a dinâmica
de grupo fora uma oficina de teatro, uma
das atividades utilizadas na promoção do
tratamento dos pacientes.
4.1.1.1 ANÁLISE DO LOCAL
No acesso ao local, a primeira impressão
é negativa pois não há preocupação de
integração do ambiente com a cidade.
Embora o CAPS esteja localizado em uma
região nobre, com muitas opções de acesso
de transporte público, a edificação localiza-
se aos fundos do acesso de outras edificações
públicas, de maneira que mesmo de divisando
com a avenida Beira Mar Norte e um centro
esportivo, encontra-se escondida pelo mato
e muros no seu entorno, resultando em
pouca percepção do estrutura dentre os que
transitam nas proximidades. Esta situação
teve uma pequena alteração com a construção
do corredor de ônibus da Avenida Beira Mar,
porém não há acesso através desta.
Em contrapartida, a própria vegetação ao
redor da edificação e os recantos que elas
formam tornam-se pontos de encontro para
os usuários para interação e integração, nos
momentos que antecedem as atividades
profissionais promovidas nos tratamentos.
‘
Estudos de caso
4.14.1
46 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 47
4.14.1
O ambiente do CAPS Ponta do Coral é bastante impessoal, como pode ser
percebido pelas fotos. Foi constatado a presença de produções artísticas dos
usuários, no ambiente, na tentativa de se apropriarem do lugar, mas ainda de
forma bem inexpressiva se em comparação com outros espaços como o Hospital
da Loucura, do Rio de Janeiro, ou o projeto “Madlove: A Design Asylum”.
48 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 49
Na sala onde são realizadas as atividades
interativas, o espaço é insuficiente para acolher
todos os interessados. Com a impossibilidade
da entrada de todos os usuários e estudantes, os
mesmos permanecem do lado de fora da porta,
amontoados, ficando apenas como expectadores.
Estas limitações de espaço resultam na
supressão de parte das dinâmicas, além de
limitar os movimentos e expressões do grupo.
Foi neste ambiente que se consegue perceber
mais claramente a integração entre pacientes e
psicólogos,onde,nãosóospacientesmastambém
os profissionais da saúde se libertavam de certas
amarras sociais e soltavam ares, gritos e palavras
livremente. Expressavam-se.
Além da insuficiência do espaço, o local não
dispõe de armário para guarda de materiais,
o que acarreta em um amontoado de coisas,
parecendo mais um grande depósito,
improvisado como sala de aula.
As grades nas janelas marcavam o
enclausuramento, que em conjunto com as
paredes todas claras e piso branco, davam um
ardeumainstituiçãocontroladaepadronizada,
sem espaço a individualidade ou expressão.
Apesar de todas as deficiências, havia uma
expectativa latente pela alegria de se ter aquele
espaço para a livre expressão, falar, viver nesse
ambiente mais livre, onde a liberdade de ações
daquele momento transcendessem a falta do
espaço físico e permitissem o livre movimento.
Logo na entrada, há uma recepção,
parecida com uma recepção de um posto de
saúde, com cadeiras de plástico enfileiradas,
acompanhadas de uma mesa a frente,
ocupada por um recepcionista, e um guarda
próximo. A pintura é de cores claras e sóbrias,
com predominância do branco. Por ser uma
casa antiga, sua disposição lembra mais um
pequeno labirinto. Para chegar à pequena
sala de teatro, passamos por algumas salas
sequenciais, exceto uma que lembrava
mais um grande corredor, com disposição
de pequenas saletas para atendimento
individual, uma pequena sala de convivência
onde são expostos artesanatos, obra de um
dos pacientes que usava sua arte na tentativa
de ensinar os outros pacientes, e também
com a intenção de vender para seu sustento
- de acordo com informações prestadas no
local -, um pequeno refeitório com espaço
aproximado para umas dez pessoas, por fim
mais um corredor que desemboca na sala de
teatro, tudo predominantemente branco.
A organização espacial é um pouco confusa,
comcorredorservindocomosalaparaalgumas
atividades e exposição de trabalhos, e os
trajetos lembram mais labirintos, dificultando
a localização dos ambientes para quem visita o
local pela primeira vez, além da edificação não
estar adaptada às pessoas com dificuldades de
locomoção, mesmo sendo uma instituição que
atende um alto índice de pacientes portadores
de necessidades especiais.
4.14.1
50 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 51
4.1 4.1
Dentre as necessidades da hospitalidade,
foi-me informado da necessidade de
armários para os usuários, para que
estes possam ter seu espaço individual
garantido. Foi salientado a importância
de quartos coletivos, exceto em casos
bastante atípicos, para evitar que os
pacientes fiquem sozinhos, visando evitar
ocorrências de suicídios nos casos de
pacientes com esta tendência. No banheiro
há a necessidade de espaço maior no vazo
e um grande box adaptados, pois alguns
pacientes necessitam de auxilio para usar
o sanitário e tomar banho. 	
Uma usuária que acompanhava a visita
comentou a necessidade de cortina, pois toda
vez que alguém tomava banho molhava todo
o banheiro, já que o local não dispunha de um
box adequado, para dar espaço aos usuários
que necessitam de acompanhamento.
Por todos ambientes foi observado a presença
de artes, cartazes informativos e placas, feitos
pelos próprios usuários e funcionários, dando
vida ao local. Apesar disto os consultórios ainda
são bastante impessoais e um pouco frios, com
pinturas monocromáticas e claras. A disposição
dascadeirasedasmesasparaatendimentomédico
ou psicológico ainda são bem tradicionais.
Há o cuidado de que os profissionais
não tenham salas marcadas, dispondo
o espaço organizado por placas de livre
ou ocupado, para tentar fugir do modelo
institucionalizado e não instaurar a relação
de posse e poder pelos profissionais,
criando assim uma circulação entre
profissionais e usuários livre e fluida. Há
ainda uma sala onde acontecem as sessões
de terapia em grupo. No dia da visita havia
cerca de quinze pessoas em uma sala de
cerca de 5x7m, de forma a não comportar
de maneira ideal a quantidade de pessoas e
atividades nela realizadas.
Outra forma de inserção é o estímulo a
participação nas atividades de serviços do
CAPS, como auxílio para disposição de
louças e pequenos serviços, porém nunca
tratados como uma obrigação.
Os murais de atendimento são
setorizados por cores, onde cada um pode
ver sua região e o profissional responsável
pela mesma, com nomes de flores. Estes
estavam dispostos na sala do ócio, sala
destinada a não se fazer nada, munida com
televisão e sofás, dando-se importância
especial a este ambiente principalmente
porque após o horário do almoço são
distribuídos colchonetes pelo chão, onde
os usuários possam dormir, visto que os
pacientes sentem muito sono, inclusive
devido aos medicamentos, semelhante
ao que ocorre no CAPS Ponta do Coral.
Porém, esta sala também é insuficiente
para o número de usuários.
Junto a sala do ócio encontra-se a
enfermariaeasalademedicamentos.Ressalta-
se a conveniência da proximidade entre elas
pela facilidade ao acesso aos medicamentos
pelos pacientes. Nesta sala, encontra-se
instruções de uso e as doses certas, apesar da
necessidade de um espaço de concentração
para a contagem destes medicamentos, o
controle dos mesmos e a divisão previa as
doses certas para cada usuário.
Há também uma sala de artes muito
pequena para a demanda, limitando-se ao
uso de poucos usuários por vez, além da falta
de espaço para guardar o material de artes.
Não há uma lavanderia na unidade, desta
forma foi necessário reservar um espaço para
de expurgo, onde as roupas são armazenadas
para coleta e lavagem em outro local, tendo
no lugar apenas um tanque para atender a
demanda do dia-a-dia.
4.1.2 CAPS JOINVILLE (CAPS III)
A visita ao CAPS Joinville foi das mais
esclarecedoras para o trabalho. Dispendi
uma manhã inteira junto da coordenadora
da unidade, conhecendo e questionando
sobre o espaço.
A casa encontra-se em uma rua calma,
muito próxima ao centro da cidade, muito
bem localizada e foi adaptada a instalação do
CAPS. Mantém características de uma típica
casa residencial, com a identificação através
de placa na frente e possui grande circulação
e permanência de pessoas no pátio.
A recepção no local foi muito diferente
da encontrada em Florianópolis. O CAPS
em Joinville se mostra aberto a quem
quiser entrar, com o acolhimento na
fachada frontal, facilitando para quem
busca atendimento quando se necessário.
Há um guarda em frente que visa mais
o atendimento e a segurança do lugar que
impedir a saída dos pacientes. Apesar de
haver controle no portão, os usuários têm
certa liberdade de entrada e saída e, para a
maioria, a permanência ali é uma opção. De
maneira que o CAPS torna-se um ambiente
democrático, onde o usuário é ativo em
seu tratamento, tendo plena liberdade de
escolha perante suas atividades.
A casa é rodeada por jardins, de forma
que esta paisagem torna-se presente no dia
a dia dos usuários, os quais podem realizar
atividades tanto nas varandas, quanto nas
áreas externas sempre que possível, apesar
do terreno ter muitas partes lodosas, o
que impede mais atividades na grama,
conforme informado.
Como o CAPS Florianópolis, o espaço
físico da unidade é insuficiente. As áreas
de circulação são apertadas e as pessoas
se esbarram nas passagens, além da
insuficiência de áreas de estar de qualidade
para a quantidade de pessoas que ali são
atendidas diariamente.
As refeições são servidas na varanda aberta,
espaço destinado ao refeitório. Conforme
informado, o CAPS Joinville atende hoje
cerca de 240 pessoas ao longo da semana. São
servidos cerca 50 cafés da manha, 45 almoços,
45 cafés da tarde, 20 jantares e 29 ceias. Há
usuários que permanecem no CAPS apenas
no período da manhã, outros apenas no
período da tarde e alguns o dia todo, além das
hospitalidades noturnas, que são os pacientes
que permanecem no CAPS por 24 horas,
ficando internados em média uma semana.
52 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 53
4.1 4.1
O ambi	 ente como um todo foi
adaptado com pequenas rampas para vencer
os degraus de acessos aos ambientes, visto
que muitos dos usuários tem dificuldades de
locomoção em consequência tanto das suas
doenças, quanto do estado de confusão que
são acometidos pelo uso dos medicamentos.
O espaço destinado aos funcionários fica
no segundo andar, subindo uma escada
estreita ao lado da sala de ócio. Percebi
que um ponto positivo de sua localização
é a possibilidade de se obter um controle
visual das atividades que ocorrem no
pavimento inferior, podendo-se observar
as dinâmicas que ali ocorrem.
Há uma sala munida com uma grande
mesa de reuniões onde ocorre a maior parte
da convivência, das atividades e reuniões,
além das refeições. Nas paredes deste
ambiente existem murais informativos
dos casos tratados no local, para que todos
possam ficar informados de mudanças nos
tratamentos de usuários que necessitam de
uma atenção maior.
A copa também é bem pequena para os
38 funcionários públicos que trabalham em
diferentes turnos, sendo a maioria diurno,
além dos funcionários terceirizados,
responsáveis pela segurança e limpeza.
O espaço necessita de uma sala separada
paraaadministração,poissãorecebidasmuitas
ligações ao longo do dia, além de um espaço
destinado a coordenação geral do mesmo.
Foi possível perceber um grande esforço e
força de vontade por parte dos funcionários
na atenção ao melhor atendimento e
tratamento aos usuários. Sempre muito
atenciosos, apesar das dificuldades do
dia-a-dia. Tocou-me profundamente a
humanidade que presenciei, pela atenção
dispensada ao próximo, pelos cuidados, pela
vontade de mudar apesar do espaço físico
não ser o ideal. Há um esforço constante
de se dar o melhor atendimento possível,
compensando com a atenção, enfeites,
alegria e nos pequenos detalhes, vivendo
cada dia com intensidade e atenção.
Além da atenção que me foi dispensada,
foi-me permitido gravar uma entrevista
de esclarecimento sobre alguns pontos de
atenção do CAPS, em parte acima descritas
além da descrição do local. Entrevista
completa em anexo.
54 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 55
4.2.2 PRESENÇA DA FAMÍLIA
AcoordenadoradoCAPSJoinvillesalientou
que ainda existe uma grande resistência por
parte de muitos familiares na participação do
tratamento dos usuários. Contudo, em visitas
a ambos os CAPS percebi uma falta de espaço
físico voltado a estes. No primeiro caso, CAPS
PontadoCoral,háapenasarecepção/espaçode
espera, que não é nem um pouco convidativa.
No segundo, há apenas um banco onde no dia
da visita estava uma mãe de usuário fazendo
um bordado enquanto aguardava seu filho em
consulta, muito desconfortável e com pouco
espaço e exposta as intempéries do tempo.
Há ainda o depoimento da mãe de um
usuário de uma unidade de acolhimento que
relatou-me que os encontros de apoio com
outros pais de internos ocorriam no espaço
físico de uma escola, com atenção de um
psiquiatra e um psicólogo, em reuniões de
ajuda mútua e conversas de esclarecimentos.
Issomefezperceberqueafaltadeparticipação
dos familiares se dá um pouco pela falta de
espaços destinados a estes, perdendo-se um
grande aliado no tratamento aos usuários.
Não há espaço melhor que o CAPS para
acolher esta demanda, pois este familiares
são de extrema importância no tratamento
dos pacientes, assim como se faz necessário
esclarecer a importância do problema, bem
como o acompanhamento e o apoio aos
mesmo que sofrem junto com seus familiares.
4.2.1 RELATO DE PROFISSIONAIS
Ao longo do processo muitos profissionais
agregaram à pesquisa, esclarecendo dúvidas e
trazendo informações.
Dentre eles destaco o professor Jeferson
Rodrigues, da Enfermagem da UFSC, que
sempre se mostrou aberto a conversar e tirar
dúvidas sobre o assunto e foi quem conseguiu o
contato para a visita ao CAPS Joinville.
OutrocontatoimportantefoiapsicólogaJulia
Malaguti, que trabalha em um CAPS no Rio
de Janeiro, e relatou exemplos de tratamentos
dedicados no Rio de Janeiro, no Hospital Nise
da Silveira, exemplificado nas referências a
seguir, e além da própria coordenadora do
CAPS Joinville, alguns outros profissionais,
como psicólogos, professores e outros
profissionais em conversas na universidade.
Nogeral,muitosefaloudopreconceitoacerca
deste tema, não só dentre a sociedade, mas
inclusive entre os próprios profissionais, tendo
diversas linhas de pensamento, de tratamento,
envolto a muita polêmica, do preconceito da
sociedade, da vergonha dos próprios usuários e
familiares por falta de conhecimento, tanto de
sua vivência como de sua capacidade.
Nas conversas, muito se falou sobre a
importância do usuário se sentir parte de algo,
de o CAPS ser um espaço destinado a estes
já que há poucos espaços assim na sociedade,
da necessidade de se criar um vínculo de
pertencimento, como também da importância
dolúdico,daexpressão,daarteedaimportância
da liberdade de expressão e fala dos usuários.
Depoimentos estes que apenas corroboraram
com todas as informações obtidas através das
leituras realizadas, assim como as diretrizes e
princípiosdoquedeveserotratamentomental.
Pessoais
4.24.2
Referências
5
58 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 59
5.1
Referências de atendimento
5.1.1 TRATAMENTO NA ITÁLIA
A Itália foi uma das pioneiras em um
tratamento diferenciado aos doentes
mentais, impulsionada principalmente
por Franco Basaglia, psiquiatra italiano
com forte presença na história da luta
antimanicomial no país.
A partir da Lei nº 180, de 1978, foi
possível a criação de cooperativas com a
participação de até 30% de seus associados
com históricos psiquiátricos, com boa
aceitação social, não só por estar inserido
nos ideais da reforma psiquiátrica, como
também pela cultura cooperativista ser
difundida na Itália desde o inicio do século.
As cooperativas se mostraram diferentes e
distantes do que eram os espaços de exclusão
dos manicômios, por se constituírem como
espaço de inserção destas pessoas outrora
excluídas, mas que ali são acolhidas e se
tornam cooperados de forma apropriada,
e muitas vezes assistida, com apoio aos
mesmos. Assim o usuário vai se construindo
como pertencente a sociedade com espaço
dentro da divisão social do trabalho.
Esta trajetória incentivou a produção do
filme “Se puo fare” (2008), “Se pode fazer”,
em tradução livre. O filme retrata como
foi a trajetória e inserção deste tipo de
iniciativa na Itália, sendo um filme bastante
esclarecedor sobre o modo de como se
faz o trabalho junto a estas pessoas, com
informação, compreensão e aos poucos estes
podem surpreender e demostrar habilidades
além das esperadas, surpreendendo por sua
vontade e criatividade.
As cooperativas sociais são constituídas com o objetivo,
não mais ‘terapêutico’, isto é, rompendo com a tradição
da terapia ocupacional, mas de construção efetiva de
autonomias e possibilidades sociais e subjetivas. Por um
lado,otrabalhonascooperativassurgecomoconstruçãoreal
de oferta de trabalho para pessoas em desvantagem social
para as quais o mercado não facilita oportunidades. Por
outro, surge como espaço de construção de possibilidades
subjetivas e objetivas, de validação e reprodução social dos
sujeitos envolvidos em seus projetos
AMARANTE (1997, p. 176)
“
”
60 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 61
5.1 5.1
“o teatro é uma excelente maneira de trabalhar porque
quanto mais desenvolve o ator o controle sobre si próprio,
o controle sobre seu discurso, controle sobre seu gesto, que
é capaz de colocar seu conteúdo pra fora, os conteúdos
de seus personagens, os conteúdos das pessoas que estão
trabalhando com você, que você ajuda elas a se expressar,
menos medicamento você vai precisar.”
“quando pergunta, a arte cura? claro que cura. se arte
não curar o que vai curar? se a arte não for capaz
de colocar o ser humano em debate, de colocar o ser
humano em movimento, revelar novas coisa, revelar
novas imagens, novas possibilidades, trabalhar a
memoria, a historia, os conteúdos da pessoa, isso que
a arte faz, isso que o teatro faz, isso que a musica faz,
que a dança faz, pra isso que elas existem.”
Vitor Pordeus, médico psiquiatra
5.1.2 HOSPITAL PSIQUIÁTRICO NISE
DA SILVEIRA - HOTEL DA LOUCURA
Na cidade do Rio de Janeiro, Zona Norte,
dispomos de um belo exemplo de instituição de
tratamentomental.OInstitutoNisedaSilveira,
um dos maiores símbolos pela luta contra a
internação forçada, conta hoje com 5.000 m²,
com atividades voltadas principalmente à
arte, como pintura, escultura, teatro e dança.
Dentro das instalações foi criado ainda o
Museu de Imagens do Inconsciente, inaugura
do em 1952, locado dentro do próprio instituto.
Junto ao Instituto, ocupando o terceiro
andar, local que antes abrigava uma enfermaria
que fora abandonada, está situado o Hotel
da Loucura, que funciona desde 2012. “Lá,
artistas, pesquisadores e médicos podem se
hospedar para conviver com pacientes ainda
internados por problemas psiquiátricos. O
objetivo? Promover não apenas uma reflexão
cultural e científica sobre o tema da loucura,
mas também acabar com o estigma da doença
mental.” (REVISTA GALILEU, acesso em:
30/07/2016) De acordo com a reportagem, a
instituição tem por base convívio entre pessoas
e não o tratamento de doentes.
No documentário Hotel da Locura - Gênese
(2013), sobre o Instituto, o médico psiquiatra
Vitor Pordeus ainda complementa que o
objetivodotrabalhoalirealizadoédedevolução
da dignidade do ser humano, como defendia a
Dra. Nise, com diálogos, construção conjunta e
afeto catalizador. A seguir, elencamos algumas
falas do psiquiatra no documentário que os
ajudam a pensar na temática.
“A cura é a ausência de preconceito,
o que cura é afeto incondicional.”
Nise da Silveira
“O hotel da loucura é a busca pela construção de
um lugar que seja capaz de acolher, permitir que as
pessoas se manifestem, que dialoguem, que encontrem
um lugar que poca dialogar sem medo, que possam se
enlouquecer sem medo, possam se colocar sem medo”
62 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 63
5.1 5.1
5.1.3 ESTUDO DE AMBIÊNCIA DE CONSULTÓRIO
Como seria uma enfermaria projetada pelos
pacientes? Esta pergunta foi o que incentivou a
pesquisa “Madlove: A Designer Asylum” desing
asilar do artista britânico e ativista James Leadbitter.
Através de workshops junto a pacientes, psiquiatras,
arquitetos e designers, sobre o que seria um espaço
atraente para o tratamento mental, distanciando-se
das configurações institucionais.
Entre março e maio de 2015, uma versão do projeto
fora exposta na Fundação de Arte e Tecnologia
Criativa em Liverpool, Inglaterra, criado com o apoio
do Wellcome Trust em colaboração com o British
Psychological Society. O espaço foi desenvolvido com
a ajuda de designer de arquitetura James Christian e
BenjaminKoslowski,umdesignerePh.D.pesquisador
da Royal College of Art de Londres. Leadbitter
chamou-lhe “Um espaço lúdico e emocionante para
redesenhar loucura, uma tentativa utópica em que
um hospital de saúde mental poderia ser assim”
(SLATE’S DESIGN BLOG, acesso em 30/07/2016).
A instalação bastante colorida é resultado de
uma serie de feedbacks dos workshops, projetado
para oferecer um espaço com diferentes níveis de
privacidade e intimidade, que varia de isolamento
total a convivência e união, com diversos “cantos”
projetados para cada momento ou intenção.
Um exemplo é a torre de resfriamento com um
toque humorístico da cela acolchoada, que permite a
privacidade da pessoas para gritar e se isolar em seu
momento de expressão.
Há também um móvel que abriga uma pequena
biblioteca com intenção de manter a saúde mental
integrada,comumarmáriodebaixodaescadaqueéusado
como armazenamento ou como refúgio temporário.
Uma mesa de boas-vindas inclui garrafas contendo
aromas agradáveis, para fazer o lugar cheirar bem e
estimular diferentes sensações.
64 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 65
5.2 5.2
Referências Arquitetônicas
Os espaços internos do edifício foram
zoneados de acordo com suas atividades, em
zonasdehospitalidade,tratamentoeserviços,
para facilitar o trabalho ali realizado, e ainda
assim, foi mantida a fluidez nas circulações,
como espaços de livre acessos.
Há ainda a presença de espaços menores
pelo edifício para que se possa ter diminuída
a sensação de vigilância por parte dos
funcionários,aindaqueaspartesenvidraçadas
permitam um contato visual por parte dos
funcionários de forma mais discreta.
Com base no trabalho de Andressa Franco Moura (2014) e em projetos
do site Archy Daily, reuni as seguintes referências para este projeto.
5.2.1 HOSPITAL PSIQUIÁTRICO KRONSTAD
Arquitetos: Origo Arkitektgruppe
Localização: Bergen, Noruega
Paisagismo: Smedsvig Landskapsarkitekter
Área: 12.500 m²
Ano do projeto: 2013
Como pontos estruturantes do projeto
temos a participação do contato com
o público, assim como sua abertura,
transparência e inclusão de áreas verdes
por todo o edifício.
O projeto do hospital dá forte ênfase
em sua abertura e transparência em
relação ao público, ao passo que forma
um abrigo de proteção para os pacientes
(Archy Daily, acesso em 30/07/2016)
A permeabilidade visual e transparência
do edifício, que priorizam pontos de vista
atraentes da cidade, dando sensação de
liberdade e inserção espacial, faz-se,
também, com a intenção de que isto se
reflita em uma maior abertura “quanto aos
problemas de saúde mental na sociedade
atual. Além de convidar os pacientes e
funcionários ao interior, a cidade inteira
é bem-vinda a dar uma olhada.’’ (Archy
Daily, acesso em 30/07/2016)
Para maior interação, também, ao
norte do edifício fora criada uma praça
pública, conectando o edifício à cidade
e aos indivíduos que ali transitam,
transbordando estas áreas verdes para
dentro do edifício e criando ainda praças
internas destinadas aos usuários, marcando
seu espaço de pertencimento.
Estas áreas verdes internas no edifício
conectam visualmente o edifício entre
suas diferentes áreas, facilitando também
a visibilidade do do externo a partir de
qualquer ponto do edifício.
Localizado em meio ao tráfico intenso da
cidade, envolto a vida social, possui um ponto
de trem, conectado aos modais da cidade,
para facilitar o acesso daqueles usuários e
estimular sua independência do ir e vir.
66 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 67
5.2 5.2
Ele é organizado em torno de três grandes átrios que garantem luz natural, ar e
valiosos espaços de lazer ao ar livre. Os átrios proporcionam o contato visual entre os
diferentes departamentos, auxiliam no deslocamento por serem pontos geográficos de
referência, e proporcionam perspectivas de dentro do edifício para a natureza. Cada um
dos departamentos do hospital está conectado a um jardim de cobertura específico: cada
jardim tem suas próprias características e difere por sua localização e função. As zonas
verdes incentivam a interação social e oferecem espaços para a contemplação em um
ambiente composto por materiais e plantas naturais
(Archy Daily, acesso em 30/07/2016)
68 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 69
5.2 5.2
O diretor do projeto, comentou sobre o
conceito do projeto (Brisbane Times, acesso
em 30/07/2016), que foi desenvolvido por
meio de pesquisa, mostrando que jardins e
arredores naturais podem ajudar pacientes
agitados ou ansiosos. Foi constatado que
estes tipos de ambiente têm influência sobre o
usuário, estes acalmam e aliviam a depressão.
5.2.2UNIDADEDESAÚDEMENTALDAUNIVERSIDADE
DE GOLD COAST (GCUH)
Arquitetos: PDT, STH and HASSELL (Joint venture)
Localização: Southport, Queensland
Ano do projeto: 2012
A unidade de saúde mental da
Universidade Hospital de Gold Coast,
localiza-se junto a um complexo de cuidados
a saúde, anexo a um hospital convencional,
com diversos estruturas de apoio a ambos
como o próprio centro de estudos, que
abriga livrarias e estruturas relacionadas,
clínicas, unidades de permanência e até um
espaço destinado a workshops.
A unidade trabalhou bastante planos
abertos, possibilitando grandes espaços
externos de áreas verdes e livres. Além dos
espaços externos, internamente também
possui espaços coloridos, enfatizando a
vida e independência dos pacientes, sempre
com forte presença de vegetação e jardins.
As cores presentes nas fachadas ajudam
na identificação de cada setor da edificação,
facilitando a compreensão espacial ao usuário.
“A essência é que as pessoas andem através - eles não
se sentem como se estivessem sendo controlados ou se
estivessem presos no espaço”
(Brisbane Times, acesso em 30/07/2016)
“A unidade pode ser garantida, os quartos podem
ser garantidos, mas há também um grande senso
de abertura e independência de cada usuário, que
surgiu do que a pesquisa mostrou ser essencial para
a recuperação e tratamento bem sucedido.”
(Brisbane Times, acesso em 30/07/2016)
70 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 71
5.2 5.2
5.2.3 CENTRO DE ACOLHIMENTO / CYS.ASDO
Arquitetos: CYS.ASDO
Localização: Hsinchu, Taiwan 300
Autor: Chung-Yei Sheng
Equipe de Projeto: Jill Yang, Orange Kang, Peggy Chiang
Área: 3000.0 m²
Ano do projeto: 2014
Localizado no Distrito de Chupei, este
projeto tem como estrutura sua relação do
espaço interno/externo, de maneira a se
apresentar como um ambiente acolhedor,
trazendo para dentro do edifício a presença
dos jardins.
Estas camadas de paredes, e as aberturas
irregulares, entregam uma boa qualidade de
luz solar à edificação, produzindo um jogo
de luzes e sombras que variam de acordo
com a passagem do dia e das estações.
Além de brincar com a iluminação
artificial, descontraindo os ambientes muito
limpos e de fácil compreensão, há ainda a
preocupação com a visibilidade aos jardins
a partir de cada ambiente do edifício.
Neste projeto, foi possível conformar um
circuito de circulações onde o usuário passa
por diferentes conformações de jardins, o
que cria uma dinâmica ao espaço, apesar de
ainda manter a intenção de tranquilidade e
acolhimento dos ambientes.
Esta série de paredes em camadas não definem apenas as fronteiras
hierárquicas,mastambémrecebeosprogramasparasatisfazerasnecessidades
espaciais. Além de proporcionar abertura e a transparência necessária para
dar ao espectador uma experiência interior e exterior simultânea.
(Archy Daily acesso em 30/07/2016)
O Lugar
6
74 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 75
As pesquisas realizadas até aqui nos permitem esboçar
algumas necessidades e intenções ao que se pretende para
a instalação de um CAPS, juntamente com o Centro de
Convivência e Cultura para a cidade de Florianópolis, tendo
como pressupostos:
•	 Fácil acesso, com diferentes modais em meio à cidade;
•	 Conexão com os outras instituições de saúde para
trabalhos conjuntos e continuados;
•	 Visibilidade perante a cidade;
•	 Conexão com a comunidade, diversificada para que
não se crie mais estigmas, mas que ainda assim esteja
próximo e acessível àqueles com maior demanda;
•	 Conexão com áreas verdes e de lazer;
•	 Constituição de um espaço que possibilite a realização
de várias atividades;
A escolha pelo espaço onde já está implantado o CAPS II foi pela
necessidade de manter a conexão e acessos já existente a partir de
toda a cidade, além de manter o atendimento em uma área com boa
densidade e visibilidade social, fora optado pela locação na região
insular ilha. Por sua centralidade a partir de diversos pontos da cidade,
além de concentrar um intenso fluxo de linhas de ônibus, facilitando
o acesso de usuários, já que estes, em sua maioria não podem dirigir
devido ao uso de medicamentos e limitações motoras.
Analisando a região, que é a insular central da cidade, com base
no Plano Diretor de Florianópolis (LEI 482/2014), nota-se algumas
grandes áreas de concentração de equipamentos institucionais, tanto
da área da saúde, como da área da educação, da segurança, cultura
e justiça. Como retrata o mapa acima, além da Casa do Governador,
que se localiza praticamente anexa ao CAPS Ponta do Coral, temos,
na saída leste, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); no
acesso norte, outro campus da UFSC, o da Universidade do Estado de
Santa Catarina (UDESC) e o Cemitério Municipal da Cidade, entre
outros equipamentos.
6.26.1
Diretrizes para o
reconhecimento do lugar Reconhecimento do lugar
76 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 77
6.26.2
Outro aspecto a se destacar,
segundo exposto nos mapas a
seguir, elaborados a partir de dados
do IBGE, é a grande densidade
populacional na região e suas
proximidades. Encontramos
ainda disníveis na concentração
de renda destes habitantes, o que
promove o contato entre diferentes
culturas, realidades e necessidades
diversas, cenário que corrobora
para a desmistificação perante a
problemática do atendimento a
pacientes com transtornos mentais.
Por estas características,
acreditamos que a localização do
CAPS será estratégica para que ele
proporcione maiores benefícios
ao seu entorno, assim como o
entorno reverteria benefícios ao
equipamento institucional por toda
sua potencialidade de conexões,
possibilitando o tratamento e
requalificação da área, assim como
seus acessos e bordas.
78 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 79
6.4.1 USO E OCUPAÇAO DO SOLO
A região é marcada, como já mencionado, por duas áreas residenciais
já bastante consolidadas. Na região mais próxima a linha da Beira Mar
Norte, as edificações são maiores e com menor adensamento, em área
supervalorizada, enquanto que, aquelas direcionadas ao morro, as
edificações são menores com maior adensamento, nas quais percebe-
se o processo de favelização.
Observa-se ainda uma grande quantidade de edificações destinadas
ao uso institucional, com uma pequena concentração de comércio
no entorno imediato. Além destas, ainda há presença de comércio
irregular na área, devido ao grande fluxo de pessoas que ali trefega,
principalmente em acessos aos hospitais, tema que será comentado no
próximo tópico.
Por ser uma área institucional e abrigar equipamentos esportivos
e educacionais no entorno imediato, a densificação torna-se bastante
rarefeita e um gabarito mais reduzido
Análises do entorno
6.4
6.3.1 METODOLOGIA
A partir da escolha do terreno, as estratégias utilizadas para
materialização das teorias estudadas e apresentadas até agora,
respeitando a localidade foram:
•	 Análises de mapas locais;
•	 Visitas exploratórias;
•	 Reconhecimento físico e fotográfico;
•	 Pesquisa de estudo de impacto de vizinhança;
•	 Elaboração de um programa para o projeto a ser instalado no local.
Metodologia de Aproximação
80 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 81
6.2.1.86.2.1.8
6.4.3 EQUIPAMENTOS
Como já mencionado, a área de
estudo possui um grande complexo de
equipamentos institucionais no entorno,
listados em mapa abaixo com sua
localização. Todavia, apesar da grande
disponibilidade de equipamentos de
serviço, o bairro Agronômica é bastante
carente de espaços comunitários, conforme
levantado no trabalho de Flávia Ramos
(2015), Arte e Corpo no Espaço Educativo,
que propunha uma intervenção de alguns
desses espaços. Nas escolas, por exemplo,
há reivindicações, pela comunidade, de
quadras de esportes, geralmente no período
noturno, e, pela prefeitura, de salas de aulas
para reuniões administrativas ou para
pequenas organizações de comunidades.
Em visitas ao local percebeu-se ainda
uma desconexão da área com o eixo
hospitalarç carência e ou inadequação de
calçadas, insuficiência de estacionamento
para atender a demanda local e sem espaços
demarcados, onde o carro é prioridade e
são estacionados sem nenhuma ordem.
Desta forma, os pedestres necessitam se
locomover no meio das ruas para passagem.
Situação ainda mais agravada por se tratar
de uma área com intensa circulação de
crianças devido proximidade de escolas e
equipamentos de assistência a crianças.
6.4.2 COMUNIDADES
O complexo do Morro da Cruz reúne
quatro comunidades, cuja ocupação
iniciou-se ainda no início do século XX
e já se incorpora à paisagem da ilha,
sendo elas: Morro do Horácio, o Morro
Santa Vitória, o Morro do 25 e o Morro
Nova Trento. Estas estão zoneadas em
sua maioria no Plano Diretor, exceto o
Morro do 25, Como Zonas de Interesse
Social (ZEIS) e a comunidade Vila Santa
Rosa, localizada mais próxima a linha do
mar como constatado no mapa abaixo.
Apesar da tendência dos programas
habitacionais em relocar estas comunidades
para áreas periféricas da cidade, estas
resistem na região. Contudo, permanecem
segregadas da cidade, com poucos espaços
de convivência e oportunidades restritas,
tanto em matéria de educação como em
oportunidades de trabalho e acesso à
cultura.
A implementação do complexo de
atendimento à saúde mental com CAPS
e Centro de Convivência e Cultura,
juntamente a um parque estruturado,
poderia proporcionar uma melhor
qualidade de vida e novas oportunidades
para muitos destas comunidades, além de
aproximar potenciais usuários aos serviço
e assistência proporcionadas no CAPS.
O projeto ainda visa a oportunidade
de fomentar a interação social, para que
ali se construa um espaço conjunto de
crescimento e aprendizado.
Muito próximo a área de estudo, do
outro lado da Avenida Beira Mar Norte,
encontra-se a região da Ponta do Coral,
com excelente localização e topografia
perante a cidade. Porém, trata-se de uma
área com histórico de grandes conflitos,
despertando interesse da população para
sua transformação em parque público,
em resistência a crescente especulação
imobiliária sobre a mesma. Devido a
esta indefinição, quanto a sua natureza
pública ou privada, o projeto não prevê a
conectividade com a àrea, ainda que seja
reconhecida a importância de fazê-lo.
A densidade de áreas verdes na região
também é baixa. Uma delas, hoje,
demarcada no Plano Diretor como Área
Verde de Lazer (AVL) faz divisa com o
terreno do CAPS Ponta do Coral e deveria
abrigar um parque urbano servindo à
população. Mas o acesso à mesma encontra-
se cercado e fechado, além da densa
vegetação também ser um impeditivo para
seu acesso e permanência.
Apesar de estar localizada junto a Beira
Mar Norte, a área fica bastante segregada
da comunidade, não representando apoio
a esta e com poucas áreas de permanência
efetiva, mais voltada como área de
passagem e às atividades esportivas.
82 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 83
6.2.1.86.2.1.8
84 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 85
6.2.1.86.2.1.8
6.4.3 ESTUDO IMPACTO DE
VIZINHANÇA
Junto à área de inserção do projeto,
encontra-se hoje instalada uma subestação
da Centrais Elétricas de Santa Catarina
S.A., conforme locado em mapa no item
acima. Para sua instalação fora necessário
a avaliação através do Estudo de Imapcto
de Vizinhança (EIV): Substação 138
kV Florianópolis - Agrômica (CELESC,
2008), de onde se pode extrair algumas
informações, das quais as mais relevantes
são:
Vegetação - fora levantado que a maioria
dos indivíduos arboresos e do sub-bosque
são exóticos, sendo alguns inclusive
contaminantes, somando cerca de 90%
do volume da vegetação local, sendo o
Cinamomo o mais representativo.
As árvores nativas encontradas no local
foram o Tanheiro, a Embaúba, a Pintanga,
Goiaba, Aroeira e a Grandiúva, esparças
e com sub-bosque descaracterizado e
dominado pela espécie exótica invasora
Maria-sem-Vergonha.
Assim, a derrubada de grande parte
da vegetação para requalificação do local
não traria grande impacto, e seria uma
oportunidade de relocação de espécies
nativas, trazendo, inclusive, benefícios a
área.
Drenagem Natural e Rede de Águas
Pluviais - a rede de drenagem natural onde
se insere a área de estudo é composta pela
micro bacia hidrográfica Florianópolis,
abrangendo a região do centro da cidade
e bairros vizinhos, como a Agronômica.
Esta é umas das menores da Ilha de Santa
Catarina, sendo abastecida por pequenos
corredores preminentes das encostas do
maciço Morro da Cruz.
A área apresenta problemas na sua
drenagem natural, pois materiais
excedentes da construção da avenida
(aterro) represam as águas vindas dos
locais mais altos, formando assim uma
área alagadiça. Porém na implantação da
subestação da CELESC o problema não foi
resolvido. Entretanto, deve-se atentar para
a linha d’água bem marcada no terreno,
respeitando-a para que não se tenha
problemas, e solucionando o escoamento
corretamente.
Patrimônio Cultural - Apesar de a Ponta
do Coral fazer parte de momentos da
história da cidade, a área em questão não
possui reconhecimento. Não há registro de
tombamento da casa onde hoje funciona o
CAPS Ponta do Coral em nenhum órgão
responsável pelo mesmo, de acordo com
pesquisa realizada. Foi encontrado apenas
um registro no livro Memória Urbana, de
Eliane Veras da Veiga. Na obra se afirma
que a casa era o antigo abrigo dos Maristas
responsáveis pelos cuidados dos menores
do Abrigo de Menores: Educandário 25
de novembro. O abrigo já sofreu diversas
modificações, restando hoje apenas poucas
ruínas já bastante descaracterizadas, que
não representam relevante importância
histórico cultural para a cidade.
Análise de entorno
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  • 1. CAPSUma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis
  • 2. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA DEPARTAMENTO DE ARQUITETURA E URBANISMO TRABALHO DE CONCLUSAO DE CURSO CAPS ACADEMICA: STEFANY PAULA TROJAN ORIENTADORA: VANESSA GOULART DORNELES FLORIANÓPOLIS, AGOSTO DE 2016 Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis
  • 3. CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 5 A trajetória durante todo este trabalho o curso de Arquitetura e Urbanismo e o que me trouxe a este ponto fora rodeada por pessoas que me deram apoio, e atenção, e muitas vezes um ombro pra chorar. Destre estas uma pessoa que merece um agradecimento especial é minha mãe, esteve ao meu lado me apoiando, e acreditando em mim, até mesmo quando eu mesma duvidava. Me escutou, deu apoio, além da educaçao até aqui. Asos meus professores, que fizeram parte desta trajetória, inspirando, ajudando, fazendo pensar e refletir. Obrigada a minha orientadora, que dava força e motivação para continuar a trabalhar. Um agradecimento especial a professora Marta Dischinger, por se interessar e orientar mesmo sem obrigação, na vontade de fazer crescer. Um obrigada ao professor Eduardo Wesphal, que já admirava desde que fora emu professor de projeto e que atentou-se ao trabalho, que não contentou-se em participar da pré-banca, se informou e se interessou pelo tema, ajudou e orientou, acreditando e apoiando minhas decisões de projeto, de maneira que me fizesse evoluir sem perder a essencia do que acreditava. Muitos amigos também estiveram do meu lado me apoiando durante todo o percurso da faculdade. Minhas amigas Jaguelines, Bruna Brito, Karla Shutz, Ana Paula Kincheski, Gabriela Drehmer, Luiza Losso, Carla Fracchiola, Laís Garcia, que sempre acreditaram e apoiaram durante todo o percurso e em especial a Luciana Bonetti, que me deu uma ajuda especial neste trabalho, mostrando o quanto a referencia de textos e pronomes são importantes e fazem a diferença. As meninas Angela e Ana Nascimento, que dividiram tantos momentos de trabalho, principalmente deste, dividindo os momentos de angustia e apoiando uma a outra. Ao meu amigo André Santos Souza um super agradecimentopor me ajudar neste trabalho e me mostrar que alguns programas de diagramação não são um bicho papão. Não teria como deixar de fora um enorme obrigada ao meu amigo Tadashi Fujiwara, que além de apoiar, ajudar, ficar do meu lado, não me fazer desistir, escutar as angustias e ainda ter paciencia pra motivar quando o cansaço batia, ao meu parceiro de tantos diferentes momentos, desde trabalhos, conversas, desabafos, festas, um super obrigada. A estes e tantos outros que fizeram parte de algums forma deste processo, muito obrigada. Agradecimentos
  • 4. 6 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 7 1.Apresentação 2. Temática 3. Arquitetura e Psicologia do indivíduo 4. Vivencias 5. Referências 6. O Lugar 7. O projeto 8. Conclusao 9. Referencias 10. Anexos Sumário
  • 6. 10 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 11 O louco afasta-se da razão, mas pondo em jogo imagens, crenças, raciocínios encontrados, tais quais, no homem da razão. Portanto, o louco não pode ser louco por si mesmo, mas apenas aos olhos de um terceiro que, somente este, pode distinguir o exercício da razão da própria razão. Michael Foucault 1.11.1 Introdução “ ” As características do projeto seguiram linhas descritas por estudiosos como Michel Foucault e Nina Raquel Soalheiro, e principalmente pelos requisitos mínimos exigidos na legislação vigente. Também foram de fundamental importância as visitas aos CAPS, através das quais pôde-se levar em consideração os relatos dos profissionais e dos próprios pacientes. O projeto buscou dar conta da complexa demanda deste tipo de instituição, prevendo um espaço para uma recepção aconchegante, que transmita confiança ao primeiro contato, e espaços mais individualizados e;ou utilitários para a atividade de triagem, consultórios, refeitórios para pacientes e visitantes, espaços de terapias, balcão para distribuição de medicamentos, oito leitos para internações e espaço mais reservados para os profissionais. Desta forma, pretende-se abordar não só o tratamento, como também a prevenção e quebra de estigmas e preconceitos que existem em torno do tratamento a pacientes com transtornos mentais. Para tal, temos como premissa que a arquitetura pode intermediar ou auxiliar no tratamento, possibilitando um ambiente que promova não só o tratamento, como é preconizado hoje, como também inserção destas pessoas à vida social da cidade/comunidade, como forma de tratamento. Além ainda da intenção de proporcionar à cidade um ambiente restaurador, que atue como integrador social e convide as pessoas a conviverem e viverem a cidade. O presente trabalho foi elaborado em atendimento a requisito de conclusão do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e visa o desenvolvimento do projeto arquitetônico do Centro de Atenção Psicossocial (CAPS III) - atendimento ininterrupto - às pessoas portadoras de distúrbios mentais, no Município de Florianópolis. Entre os fatore que impulsionaram este projeto estão: a deficiência do atendimento psicossocial na Grande Florianópolis; a inadequação dos espaços hoje disponíveis diante da própria legislação existente e das necessidades que devem ser dedicadas a estes pacientes, conforme fartos estudos sobre o temaç e ainda a emergência de novas propostas no Brasil e no mundo.
  • 7. 12 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 13 Nossa sociedade hoje é assolada com uma crescente problemática ao abuso de drogas, remédios psicoativos, pessoas transtornadas. Números estampam capas de jornais e revistas. Reportagens abordando o tema passam em diversos meios. Todavia, isto é apenas um sintoma do que vivemos em nossa sociedade. Ignoramos nossos problemas, por falta de tempo, por preconceito, por vergonha. Muitos acreditam ser uma fraqueza demonstrar sentimentos, ou ter algum problema psicológico. Focamos apenas no trabalho, nos resultados, não damos importância ao ser, à nossa vivência e individualidade. Apenas julgamos. Isto faz com que nossa sociedade fique cada dia mais doente. As doenças tomam uma proporção grande por falta de atenção e nossas cidades deixam de ser protagonistas do viver e passam a ser coadjuvantes do produzir. Escondemos em nós e em nossas cidades os problemas. Os queremos longe. Criando grandes paredes de preconceitos, de crenças que são ainda parte estruturante da nossa cultura. Vive-se, hoje, um momento de luta, de ressignificação ao tratamento mental no Brasil e no mundo. A intenção de quebrar estes conceitos criados pela sociedade de que o louco, o não produtivo, deve ser isolado, separado, preso. Pretende-se uma reinserção, uma ressignificação, e assim como no discurso da luta, isto se reflete na arquitetura e urbanismo, em como moldamos nossas cidades e sociedade. Entende-se que melhorar a qualidade do ambiente de tratamento psicossocial é agregar à instituição mais um instrumento de combate a estes estigmas e de experimentação e reinvenção ao que se faz ao tratamento hoje, colocando a arquitetura a serviço da transformação social e da qualidade de vida. Sendoassim,pretende-secomestetrabalhocriarumespaçodetratamento onde o usuário sinta-se estimulado e capaz de vivenciar a cidade em meio à sociedade, vencendo seus medos, angústias e anseios e, principalmente, pretende-se trazer a realidade destes ao convívio da cidade, para que se tenha uma sociedade mais compreensiva, pois o problema maior não é o “louco” não saber conviver em sociedade e sim a sociedade não saber conviver com o “louco”. 1.3 Justificativa 1.2 A empatia pelo tema antecede o ingresso na faculdade de arquitetura. Sempre me interessei pela psicologia e pela influência da arquitetura no psicológico do sujeito, na vivência do mesmo, na cidade e nos costumes sociais. Além da ligação anterior com a temática, no decorrer da graduação, amigos passaram por transtornos mentais e necessitaram de tratamento em instituições do gênero. Em visita à tais instituições, tive a impressão de serem espaços segregados, impessoais e de controle extremo, parecendo-me inadequadas para recepcionar os pacientes nos momentos de maior fragilidade. Próximo ao início do projeto, o relato de um amigo que ficara internado em uma instituição de reabilitação pelo uso de drogas, trouxe ainda a reflexão sobre como a rotina, o espaço físico e o convívio influenciavam diretamente na sua recuperação. A partir de então, sensibilizei-me ainda mais à questão no contexto da nossa cidade e aos silenciamentos em relação ao tema em diversos níveis. Sendo assim, optei neste trabalho por buscar entender um pouco mais da problemática e como a arquitetura e urbanismo pode ou não influenciar na mesma. Como a arquitetura poderia ser uma aliada para melhora de vida tanto dos que sofrem de alguma questão relacionada a saúde mental, como para a sociedade como um todo, desmistificando o tema e quebrando preconceitos. Motivação
  • 8. 14 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 15 1.51.4 MetodologiaObjetivos 4 - ANÁLISE Após o levantamento foi feita uma análise da área, contextualizando sua relação com o entorno e a cidade, suas características, seus condicionantes e suas potencialidades. 5 - DIRETRIZES Propor um projeto de maneira a considerar os mapas de intenções, sensações, sentimentos, trajetos, eixos, assim como mater as diretrizes entre a tectônica arquitetônica e as conclusões das análises de vegetação, topografia e gabaritos. 6 - PROPOSTA Elaborar um projeto arquitetônico que vise contemplar todas as potencialidades do local, assim como atender ao máximo as necessidades dos usuários, levantadas nos estudos e análises descritos acima. 1 – LEITURAS E PESQUISAS Leituras relacionadas ao tema, a história, as lutas, as formas de tratamento, as diferentes instituições responsáveis, assim como normas e informativos relacionados ao mesmo. 2 - VIVÊNCIA Visitas a locais de tratamento, conversas com quem já passou ou passa por algum tipo de tratamento relacionado à saúde mental, e entrevistas com profissionais da área. 3 - RECONHECIMENTO A partir da escolha do local de inserção de projeto, foi realizado o levantamento de dados do mesmo, visitas ao local e seu entorno, consulta e execução de mapas de reconhecimento e vivência de ambiências do local pretendido para o projeto. • Ampliar o atendimento das instituições para a cidade como um todo, como ponto de interação, convívio e atendimento à saúde da cidade, como espaço restaurador, de fomentação de cultura e lazer, atendendo as demandas locais e valorizando os espaços perante a mesma; • Afastar a rigidez, a padronização e institucionalizações de espaços de saúde, dando suporte espacial ao tratamento personalizado. 1.4.1 OBJETIVOS GERAIS Apresenta-se como objetivo geral deste trabalho a proposição, através do espaço projetado, de tratamento e inclusão social de pessoas que sofrem de transtornos mentais, desconstruindo preconceitos e iniciando uma nova dinâmica social para a valorização da pessoa, suprindo a demanda municipal de atendimento a este público. 1.4.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Como objetivos específicos, visa-se promover a requalificação do espaço de atendimento psicossocial em Florianópolis, com enfoque na pessoa, de maneira a: • Estender o espaço de tratamento na cidade hoje, avaliando sua efetividade para que, a partir disto, possa-se propor ou melhorar, através do espaço construído, o tratamento psicossocial na cidade; • Fomentar a discussão acerca da qualidade dos espaços de tratamento psicossociais como espaços de experiência, vivência e tratamento, propondo ambientes capazes de atrair e informar aqueles que precisam de atenção psicossocial na cidade;
  • 10. 18 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 19 É evidente que o internamento, em suas formas primitivas funcionou como um mecanismo social, e que esse mecanismo atuou sobre uma área bem ampla, dado que se estendeu dos regulamentos mercantis elementares ao grande sonho burguês de uma cidade onde imperaria a síntese autoritária na natureza da virtude. Daí a supor que o sentido do internato se esgota numa obscura finalidade social que permite ao grupo eliminar os elementos que lhes são heterogêneos ou nocivos, há apenas um passo. O internato seria assim uma eliminação espontânea dos a-sociais”. (FOUCAULT, 2010a, p. 78) No contexto dos movimentos iluminista e do racionalista, do século XVII, observa- se o reconhecimento da dade do “louco” enquanto um sujeito marcado pela perda da racionalidade humana. Busca-se então devover racionalidade ao “louco” e para isso ele passa a ser separado do grande grupo de excluidos, e torna objeto da psiquiatria. Em meados de 1880, Sigmund Freud começa sua jornada no estudo da psicanálise e tratamento psíquico, dando início a uma vasta gama de teorias que até hoje perduram no assunto, apesar de muitos rebaterem e criarem estas teorias, como Yung e tantos outros, que sugerem diferentes modos de ver a loucura, suas causas e tratamentos. Outro grande nome, pensador da temática, todavia na área da filosofia, fora Michel Foucault, que dedicou-se ao estudo da população e suas interações. Na pesquisa de assuntos referentes ao sujeito e poder, tratou a loucura como mais um contexto social do que meramente uma doença. Desde a alta Idade Média, o louco é aquele cujo discurso não pode circular como o dos outros: pode ocorrer que sua palavra seja considerada nula e não seja colhida […] Jamais, antes do fim do século XVIII, um médico teve a ideia de saber o que era dito (como era dito e porque era dito) nessa palavra [do louco] que, contudo, fazia diferença” (FOUCAULT, 2010b, p. 10-11) Muito se falou da voz do louco e de sua segregação da sociedade. Contudo, apesar dos estudos e textos destes e outros pensadores do assunto, a imagem negativa e marginalizada do “louco” perdura até hoje e em todo o mundo. Ainda há quem tenha vergonha de mostrar seus parentes com algum tipo de transtorno mental. Também encontramos pessoas que deixam de procurar tratamento antecipadamente por vergonha, por ser um problema visto como algo a ser colocado à parte da sociedade, isolado de seu convívio. 2.1.1 HISTÓRICO DA LOUCURA NO MUNDO E O PRECONCEITO NELA ENRRAIZADO A forma de lidar com a loucura ao longo dos tempos teve inconstantes evoluções (e involuções), de acordo com as crenças sociais de cada período. Porém, mais importante que a história pura e seca ou a busca por uma verdade, é a forma como a entendemos e como lidamos com ela hoje em dia. Nem sempre em nossa sociedade a figura do louco teve uma conotação negativa. NaGrécia Antiga aloucuraeravistacomo um privilégio. Filósofos como Sócrates de Platão ressaltavam a existência de um forma de loucura tida como divina, “era através do delírio que alguns privilegiados podiam ter acesso a verdades divinas”. Todavia, esta leitura foi se modificando. Ainda na Antiguidade Clássica, os loucos passaram a ser enviados à embarcações ou para mercantes que os aceitassem, visando evitar sua circulação na sociedade. Do Antigo Regime até os dias atuais No séc XVII, a Europa vivia o declínio dos impérios ibéricos, um grande número de conflitos internos e externos, além de baixas colheitas devido a mudanças climáticas e a peste negra. Neste contexto, segundo Maria Ifigênia Sidrim (2010), populariza-se a prática da clausura. No Brasil, e no mundo, primeiramente, ocorreu um processo de isolamento e encarceramento do louco ao longo da história. Em um segundo momento, a partir de um novo contexto político-econômico-ideológico, o encarceramento passou a ser visto como um problema, e assim iniciou-se o movimento antimanicomial brasileiro, seguindo os rumos da história da psiquiatria mundial. Grande enclausuramento e isolamento disseminado na Europa funcionou como estratégia para retirar do convívio social todos os que, por causas diversas, encontravam-se a margem da sociedade. Esses grupos eram formados pormendigos,leprosos,aleijados,loucos e todos aqueles que fossem necessários ocultar por significarem ameaça a ordem social. (DESVIAT, 1999 apud SIDRIM 2012, p21). O hospício original não tinha como prática a aplicação de qualquer espécie de tratamento. Seu grande objetivo era proporcionar um espaço destinado a reclusão de pessoas marginais (AMARANTE et al., 1995, p24 apud SIDRIM, 2012, p. 22) Nessa época os loucos eram locados nos antigos leprosários que, com o controle da doença, foram substituídos pelos doentes venéreos e por fim utilizados como manicômios, locais distantes e isolados do convívio social (FOUCAULT, 2010). 2.12.1 Histórico
  • 11. 20 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 21 2.1.2 NO BRASIL No Brasil, o tratamento mental não foi por um caminho muito diferente do que se passou na Europa e Estados Unidos a partir da idade média. Os loucos eram presos nos manicômios, submetidos a tratamentos desumanos e muitos dos internos eram internados sem realmente ter um problema grave, e acabavam por se institucionalizar ou piorar seus quadros devido aos tratamentos submetidos nessas instituições1 . Austregésilo Carraro Bueno foi um grande incentivador da luta antimanicomial no Brasil, reivindicando os direitos daqueles que passam por tratamento e a atenção às suas famílias, atuando em prol daqueles que precisam de amparo e que lutam pela desinstitucionalização e dignidade de vida e tratamento adequado. A Reforma Psiquiátrica, no Brasil, baseou-se no modelo Italiano, do início da década de 70, questionando a forma asilar e propondo novas alternativas de cuidado. “[...] a psiquiatria brasileira surgiu numa época onde a higiene publica era um dos fatores mais importantes para o crescimento, segurança e embelezamento das cidades” (REIS, 2013, p.26). A seguir, elencamos2 em ordem cronológica fatos marcantes da nossa historia da saúde e cuidados mentais que levaram a criação dos CAPS. 1 No filme “Bicho de sete cabeças”, baseado na bibliografia de Austregésilo Carrano Bueno (Canto do Malditos), vemos o exemplo de uma história próxima à realidade de muitos dos internos que passaram por essas instituições. Austregésilo foi um grande incentivador da luta anti-manicomial no Brasil. 2 Tendo como base o trabalhos de Reis (2013) e consulta ao artigo “A Reforma Psiquiátrica no Brasil” disponível no site da Fiocruz, acessado em 30 de julho de 2016. Contexto na Europa e nos EUA Segundo Sidrim (2012), as críticas ao modelo manicomial e manifestaram rapidamente nos Estados Unidos quando no contexto da Guerra do Vietnã, quando houve um brusco crescimento do uso de drogas pelos jovens, o aparecimento de gangues, o movimento “beatnick”, enfim, uma serie de indícios de profundas conturbações no nível de adaptações da sociedade e da cultura, da política e da economia. Para a autora, o período pós Segunda Guerra Mundial foi decisivo para a construção de alternativas assistenciais que marcaram a psiquiatria contemporânea. Começa-se a questionar a influência daassistênciaeaspéssimascondiçõesaqueosinternos eram submetidos na estrutura asilar existente. Dentre as varias manifestações que ocorreram na Europa e nos Estados Unidos, salienta-se: 1.Comunidade Terapêutica (Inglaterra) e psicoterapia institucional (França) que visavam a reforma psiquiátrica, restrita ao âmbito asilar; 2.Psiquiatria de setor (França) e psiquiatria comunitária e preventiva (EUA) que buscavam a superação da ideia de o espaço asilar ser o único local de tratamento a investir alternativas comunitárias e regionalizadas, embora reservassem ainda ao hospital papel necessário de tratamento; e 3.Antipsiquiatria (Inglaterra) e movimento de desinstitucionalização (Itália) propuseram ruptura absoluta com os modelos anteriores. Tais movimentos colocaram em cheque conceito de doençamental,formasdeintervençãoetratamento existentes, e propunham completa extinção dos hospitais psiquiátricos. (SIDRIM, 2012, p.23) O movimento antimanicomial no nosso país é marcado pela reivindicação desinstitucionalização. A criaçãodenovosdispositivosquepropiciemaassistência e a reinserção dos pacientes na sociedade é a base do movimento que defende a criação centros de saúde mental para todas as regiões da cidade. Prevendo-se o atendimento a pacientes sem família, cooperativas de trabalho para inserção dos pacientes no mercado de trabalho e serviços diagnóstico e tratamento, com a possibilidade de hospitalidade noturna. 2.12.1
  • 12. 22 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 23 A psiquiatria intensificou o uso das técnicas como o eletroconvulsoterapia, o choque insulínico, as lobotomias. Em 1950, surgiram os primeiros neurolépticos. Foi promulgada a Constituição do Centro Brasileiro de Estatuto da Saúde e do Movimento de Renovação Médica, que já foi um grande passo para início das mudanças no tratamento mental, muito disto fundamentado nos exemplos e constituição italianos. É criado o primeiro Centro de Atenção Psicossocial (CAPS) em São Paulo, o CAPS Itapeva.’ É aprovada Lei 10.216 que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental, priorizando a reinserção social e substituição dos manicômios por modelos de atendimento mais humanizados. O modelo privatista (iniciado em 1960) e hospitalocêntrico tornou-se inviável para manter a estabilidade financeira que, ao inicio da década de 1980, o Estado vê- se obrigado a adotar novas politicas no setor da saúde. Consolidando o Movimento Nacional da Luta Antimanicomial (MNLA)13, é realizado o 1º Encontro Nacional da Luta Antimanicomial, em Salvador, Bahia. Neste encontro, foi elaborada a carta sobre os direitos dos usuários e familiares aos serviços de saúde mental. De acordo com Soalheiro (2003), é necessário para a mudança um conjunto de estratégiasqueexigeminiciativas políticas, jurídicas, culturais que criam, possibilitam e marcam a presença da loucura na cidade; A Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011, republicada em 21 de maio de 2013, instituiu a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) com a criação, ampliação e articulação de pontos de atenção à saúde para as pessoas em sofrimento psíquico decorrente de transtorno mental, uso de álcool e outras drogas, como espaço de cuidado de porta aberta, primando pela liberdade e cidadania. Foram formadas associações de usuários e familiares, como a “Loucos pela Vida” de São Paulo e a Sociedade de Serviços Gerais para a Integração Social pelo Trabalho - Manifesto de Bauru que lutou e ainda luta pelos direitos destes internos. 2.12.1 1830 - 1950 1976 1987 2001 Déc 1070 1993 2011 Meados da década de 80 A Comissão da sociedade de medicina do Rio de Janeiro diagnosticou a situação dos ``loucos da cidade``, os quais passam a ser considerados doentes mentais e merecedores de um espaço social próprio parasuareclusãoetratamento; Ocorreu a ampliação da estrutura asilar no Brasil através de colônias para alienados que utilizavam o trabalho como terapia de tratamento; Foi inaugurado o primeiro hospício brasileiro, o hospício Pedro II. Até 1881, a Igreja assumiu a direção; Foi fundada a Liga Brasileira de Higiene Mental no Rio de Janeiro. Tratava-se de uma visão sobre a loucura que a considerava doença hereditária; 1830 Até 1920 1852 - 1890 1923 LINHA CRONOLÓGICA
  • 13. 24 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 25 2.2 2.2.1 ESTRUTURA NACIONAL A partir da grande luta nacional por um tratamento melhor à saúde mental, incluindo os efeitos do álcool e outras drogas, foi montada uma estrutura que abrange diversos serviços e equipamentos, intitulados como RAPS - Rede de Atenção Psicossocial. ‘’A Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) tem como finalidade a criação, ampliação e articulação de pontos de atenção à saúde para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Dentre as principais diretrizes da RAPS, é importante destacar: • Respeito aos direitos humanos, garantindo a autonomia e a liberdade das pessoas; • Promoção da equidade, reconhecendo os determinantes sociais da saúde; • Combate a estigmas e preconceitos; • Garantia do acesso e da qualidade dos serviços, ofertando cuidado integral e assistência multiprofissional, sob a lógica interdisciplinar; • Atenção humanizada e centrada nas necessidades das pessoas; 2.2.1.1 ORGANIZAÇÃO DA REDE DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL E SUAS DEFINIÇÕES As intervenções em saúde mental não devem ficar restritas à cura de doenças, mas possibilitar a troca e compartilhamento de conhecimentos para a produção da saúde, e melhorias nas condições e modos de vida das pessoas na comunidade. A RAPS atualmente é composta pelos Centros de Convivência e Cultura; Centros de Atenção Psicossocial (CAPS); Unidade de Acolhimento (UA); Serviços Residenciais Terapêuticos (SRT); e os leitos de atenção integral (em hospitais gerais e nos CAPS III). Contam ainda com programas junto a atenção básica (NASF - Núcleo de Apoio a Saúde da Família), programas de consultório na rua e estratégias de reabilitação psicossocial. Faz parte ainda da política nacional, o programa de Volta para Casa, que oferece bolsas para pacientes egressores de longas internações em hospitais psiquiátricos. A seguir, com base no Manual de Estrutura Física dos Centros de Atenção Psicossocial e Unidades de Acolhimento (BRASIL, 2013) e nas diretrizes elencadas no Saúde Mental, Álcool e Outras Drogas (SANTA CATARINA,2015),apresentamosumesboço de como se configuram os equipamentos institucionais de atendimento psicossocial. CAPS - Centro de Atenção Psicossocial Os CAPS, nas suas diferentes modalidades, são pontos de atenção estratégicos da RAPS, fornecendo serviços de saúde de caráter aberto e comunitário constituídosporequipesmultiprofissionais, que atuam sob a ótica interdisciplinar e realizam prioritariamente atendimento às pessoas com transtornos mentais graves e persistentes e/ou com sofrimento ou transtorno mental em geral, incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, • Desenvolvimento de atividades no território, que favoreça a inclusão social com vistas à promoção de autonomia e ao exercício da cidadania; • Desenvolvimento de estratégias de Redução de Danos; • Ênfase em serviços de base territorial e comunitária, com participação e controle social dos usuários e de seus familiares; • Desenvolvimento da lógica do cuidado para pessoas com sofrimento ou transtorno mental, incluindo aquelas com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, tendo como eixo central a construção do projeto terapêutico singular” (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2013, p. 5) Apesar de toda a ideologia estruturante nacional, a RAPS acontece a nível municipal, com atendimento conjunto com os equipamentos do município de acordo com suas demandas específicas. em sua área territorial, seja em situações de crise ou nos processos de reabilitação psicossocial (BRASIL, 2011). Constituem-se como um lugar de referência e de cuidado na comunidade, promotor de saúde e que tem a missão de garantir o exercício da cidadania e a inclusão social de usuários e de seus familiares. “Tem por finalidade promover atenção integral aos portadores de transtornos mentais severos e persistentes, desenvolvendo práticas clínicas que lhes permitam viver em comunidade, ter acesso ao trabalho, lazer e direitos civis.” (BRASIL, 2004) Por ser unidades responsáveis para promover a assistência e reinserção dos usuários, o CAPS deve oferecer diferentes tipos de atividades terapêuticas como: atividades comunitárias, oficinas terapêuticas, atividades artísticas, orientação e acompanhamento do uso da medicação, atendimento domiciliar e aos familiares, psicoterapia individual ou em grupo (BRASIL, 2005), além de oferecer tratamento multidisciplinar com psiquiatras, enfermeiros, psicólogos, assistentes sociais, nutricionistas, clínicos gerais e terapeutas ocupacionais. Os CAPS têm papel estratégico na articulação da RAPS, tanto no que se refere à atenção direta visando à promoção da vida comunitária e da autonomia dos usuários, quanto na ordenação do cuidado, trabalhando em conjunto com as AB/ESF e Agentes Comunitários de Saúde (ACS), articulando e ativando os recursos existentes em outras redes, assim como nos territórios. Atualmente existem 2.382 CAPS em todo o Brasil. Tratamento mental hoje 2.2
  • 14. 26 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 27 2.2 UA - Unidades de Acolhimento Local reservado para internações necessárias em momentos de surto, após uma triagem pelo primeiro atendimento nos CAPS ou outras instituições adequadas, além dos hospitais psiquiátricos, instituída pela Portaria GM/MS n. 121, de 25 de janeiro de 2012. SRT - Serviço Residencial Terapêutico Os SRTs constituem-se em modalidade assistencial substitutiva da internação psiquiátrica prolongada (Portaria nº.3.090/2011) e constituem-se em residências terapêuticas alternativas de moradia para um grande contingente de pessoas que muitas vezes, por não contarem com adequado suporte familiar ou da comunidade, estão internadas há anos em hospitais psiquiátricos. Já temos 620 residências terapêuticas em todo o país. MODALIDADES DOS CAPS Os CAPS estão organizados nas seguintes modalidades: CAPS I: Atende pessoas de todas as faixas etárias que apresentam prioritariamente intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aqueles relacionados ao uso de substâncias psicoativas, e outras situações clínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida. Indicado para Municípios ou regiões de saúde com população acima de 15 mil habitantes. CAPS II: Atendimento semelhante ao CAPS I, todavia apenas a adultos. Indicado para Municípios ou regiões de saúde com população acima de 70 mil habitantes. CAPS III: Atendimento semelhante ao CAPS II, entretanto proporciona ainda, serviços de atenção contínua, com funcionamento vinte e quatro horas, incluindo feriados e finais de semana, ofertando retaguarda clínica e acolhimento noturno a outros serviços de saúde mental, inclusive CAPS AD. Indicado para Municípios ou regiões de saúde com população acima de 150 mil habitantes. Programas de Volta para Casa e Estratégias de Reabilitação Psicossocial O primeiro “De volta para casa” é um programa de inserção social para pessoas acometidas de transtornos mentais, egressas de longas internações, através de pagamento do auxílio-reabilitação psicossocial. O segundo é uma gama de ações de trabalho comunitário reintegrador ao contexto social, capaz de dar nova significação individual e social para as pessoas acometidas pelo transtorno mental e também para suas famílias. Os atuais projetos voltados para o modelo de reabilitação psicossocial têm focado quatro aspectos: moradia, trabalho, família e criatividade (lúdico/artística). Quadro informativo dos serviços ligados a saúde mental e seus pontos de atenção de acesso: CAPS AD: Atende pessoas de todas as faixas etárias que apresentam intenso sofrimento psíquico decorrente do uso de crack, álcool e outras drogas. Proporciona serviços de atenção contínua, com funcionamento vinte e quatro horas, incluindo feriados e finais de semana, ofertando retaguarda clínica e acolhimento noturno. Indicado para Municípios ou regiões de saúde com população acima de 150 mil habitantes. CAPS ADIII: Atende adultos, crianças e adolescentes, considerando as normativas do Estatuto da Criança e do Adolescente, com necessidades de cuidados clínicos contínuos. Serviço com no máximo doze leitos para observação e monitoramento, de funcionamento 24 horas, incluindo feriados e finais de semana. Indicado para municípios ou regiões com população acima de 150.000 habitantes. CAPSi: Atende crianças e adolescentes que apresentam prioritariamente intenso sofrimento psíquico decorrente de transtornos mentais graves e persistentes, incluindo aqueles relacionados ao uso de substâncias psicoativas, e outras situações clínicas que impossibilitem estabelecer laços sociais e realizar projetos de vida. Indicado para municípios ou regiões com população acima de 70 mil habitantes. 2.2
  • 15. 28 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 29 2.2 2.2.1.2 TIPOS DE TRANSTORNOS ATENDIDOS Otemadasdoençasmentais,aindaquenãototalmentedesmistificado, gera muito interesse na sociedade. O jornalismo pautou a questão em diversas oportunidades. Neste trabalho, reproduzimos os trechos mais pertinentes de uma reportagem do portal de notícias G1. 2.2 As doenças psiquiátricas mais comuns na população são a depressão e os transtornos de ansiedade. Segundo o médico do departamento de psiquiatria da Unifesp Adriano Resende Lima, aproximadamente 10% das mulheres e 6% dos homens vão ter um episódio depressivo ao longo da vida. “Hoje a depressão é o segundo maior problema de saúde pública no mundo, de acordo com dados da OMS [Organização Mundial da Saúde]. É importante a população saber que transtornos depressivos e ansiosos são comuns e causam grande impacto”, explica o psiquiatra. Os transtornos ansiosos são: pânico, com incidência de 3,5% na população; e o transtorno de ansiedade generalizada, com 3,4%. A esquizofrenia é uma doença considerada rara, que afeta 1% da população. Há duas linhas complementares de tratamento para os transtornos mentais comuns: o farmacológico, com remédios, e o psicoterapêutico, com diferentes tipos de terapia. Para a depressão e ansiedade geralmente são ministrados antidepressivos, que variam de acordo com a natureza do caso. (G1, acesso em 30/07/2016 - Reportagem “ Conheça as doenças mentais mais comuns e saiba onde procurar ajuda”)
  • 16. 30 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 31 2.2.1.82.2.1.8 2.2.1.3 DEMANDA DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL NO BRASIL Deacordocomareportagem, ostranstornos mentais acometem, em algum momento da vida, ao menos 20% da população mundial. Apesar de mudanças, especialistas na área consideram a rede de atendimento público ainda insuficiente. “Faltam investimentos e faltam Caps. Também faltam unidades básicas de saúde com capacidade para atender os transtornos mentais. É preciso uma política nacional que realmente olhe para o problema de forma abrangente e forneça recursos” (G1, acesso: 30/07/2016), diz o psiquiatra Marcel Higa Kaio, diretor técnico do Caps Itapeva, à reportagem mencionada anteriormente. Em 2011, segundo a Associação Brasileira de Psiquiatria, transtornos mentais são a segunda causa dos atendimentos de urgência. Uma pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) de 2006 realizada no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) de Marília, no interior de São Paulo, mostrou que 16% dos pacientes atendidos apresentaram transtornos mentais e do comportamento. (G1, acesso: 30/07/2016) Em levantamentos em 2011, no Brasil, 23 milhões de pessoas (12% da população) necessita de algum atendimento em saúde mental. Pelo menos 5 milhões de brasileiros (3% da população) sofrem com transtornos mentais graves e persistentes. 2.2.1.4 UMA OUTRA VISÃO A PROBLEMÁTICA DO ABUSO DE ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS Em 2015, o escritor e jornalista britânico Johann Hari publicou um livro em que relaciona o problema da sociedade com este problema social do uso de drogas, o “Chasing the Scream: The First and Last Days of the War on Drugs”. Este mesmo, publicou um texto comentando sobre sua jornada e pincelando a problemática geral. Nele, faz algumas relações entre o vício nas drogas e esta doença social por assim dizer. O texto de Hari relata um experimento feito com ratos que mostra didaticamente como funciona e o porque do crescente aumento no vício em drogas em nossa sociedade. A conclusão da experiência foi que o problema não são as drogas em si, mas sim a fala de convívio social, interações interpessoais, o que faz com que o individuo não crie laços e se refugie nas drogas. Hari traz também o exemplo dos soldados na guerra do Vietnã, onde cerca de 20% dos soldados ficaram viciados em heroína. Mas ao voltarem a sua boa via, 95% largaram o vício. Além de diversos outros exemplos e constatações de que a droga não é a causa e sim a solução. Por isso a dificuldade de largar o vício, pois não se trata simplesmente do vício em si, mas a falta de conexão, seja consigo mesmo, com outro, ou até mesmo com a sociedade. É neste contexto que reside a importância do trabalho dos RAPS e CAPS. É parte de um instrumento de conexão das pessoas em diversos parâmetros, sendo, de acordo com Hari, o modo mais eficiente de evitar o aumento no número de casos de abusos de álcool e outras drogas. Hoje no Brasil um dos maiores problemas com relação ao tratamento da saúde mental, que vem crescendo a cada dia, são os transtornos ocasionados pelo uso excessivo de drogas, que acabam por trazer diversos outros problemas socais e, apesar de diversas iniciativas e ações do governo, o problema não pare de aumentar a cada dia em nossa sociedade. Estaconstataçãofoiconfirmadanãosomente através de conversa com uma funcionária da secretaria da saúde, mas também percebemos tal situação através da importância a que se da ao tema nas mídias e em novos tratamentos ou pontos de atendimento. Um levantamento em Limeira, no interior de São Paulo, apontou que 51% dos atendimentos no CAPS são usuários de entorpecentes, e no ano passado, os atendimentos no CAPS já haviam registrado aumento de 31% em relação a 2014 (G1, acesso: 30/07/2016) De acordo com a Associação Brasileira de Psiquiatria, apesar de a política de saúde mental priorizar as doenças mais graves, como esquizofrenia e transtorno bipolar, as mais comuns então ligadas a depressão, ansiedade e a transtornos de ajustamento.
  • 17. 32 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 33 2.2.2 ESTRUTURA MUNICIPAL 2.2.2.1 DEMANDA DA CIDADE De acordo com o censo de 2010, a Grande Florianópolis tinha uma população de 1.027.271 (Plano Operativo Estadual de Saúde Mental - 2012 - 2015 - Região 18 - Grande Florianópolis, da Secretaria do Estado de Saúde do Estado de Santa Catarina). Com base nas projeções dos resultados de pesquisa de Teixeira (1998), a região apresentou estimativa de ocorrência de pacientes com algum tipo de transtorno conforme quadro abaixo (condizente com as estatísticas internacionais): 2.2 2.2 A Portaria GM/MS no. 148, de 25 de janeiro de 2012, preconiza um leito para cada 23.000 habitantes, o que representaria, para a região, 44 leitos em hospitais gerais. A região, contudo, é a capital da unidade federativa e é o maior polo de atração de todo o Estado. Casos psiquiátricos complexos e refratários chegam a até aqui para investigações e pareceres, avaliações, perícias e até mesmo para tratamento, como centro de referência. Portanto apresenta um crescimento populacional superior a média nacional. Possivelmente vários pacientes compreendidos nestes percentuais podem apresentar sintomas avulsos na forma de queixas esporadicamente, demandando atenção primária momentânea, sem contudo considerar a hipótese de transtorno mental, e para tanto aproveitam consultas agendadas para outras finalidades, ou marcarão consultas específicas. Uma fração delas solicitará algum tipo de atenção psicossocial maior e repetida, por parte da rede básica, onde serão diagnosticadas e atendidas. Esta fração pode ser estimada, na região, em torno de 82.600 possíveis utentes do sistema, para o ano de 2012. Destes, cerca de 8.100 provavelmente serão encaminhados para avaliação acurada ou para cuidados de especialistas em saúde mental (psicólogos, psiquiatras ou terapeutas ocupacionais). Certamente um número bem menor será portador de problemas crônicos graves, que requeiram seguimento longo, continuado ou vitalício, caso funcionem os mecanismos de contra-referência. A distribuição dos casos, segundo categorias nosológicas, estão dispostas na próxima tabela.
  • 18. 34 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 35 2.2.2.2 ESTRUTURA DE ATENÇÃO PSICOSSOCIAL EM FLORIANÓPOLIS Temos hoje na cidade de Florianópolis quatro unidades CAPS em funcionamento. Sendo dois CAPS AD em funcionamento e um AM finalização. Um CAPS II e um CAPS I. De acordo com o último senso realizado no ano de 2010, Florianópolis tem uma população com cerca de 420 mil habitantes, com estimativa para chegar a 460 mil no ano de 2014. Para cidades com população acima de 150 mil habitantes, de acordo com o Manual de Ambientes da Secretaria da Saúde, é indicado o CAPS III, com atendimento mais completo. Todavia o município ainda não possui este equipamento. Atualmente, são complementares aos CAPS os ambulatórios especializados de psiquiatria, que suprem parte da carência de consultas. A região conta ainda com um ambulatório capaz de prestar atenção a problemas de saúde mental, vinculado aos Cursos de Medicina e Enfermagem da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), em Palhoça, e com o Hospital Regional Homero de Miranda Gomes, público estadual, em São José, que atende precariamente a região. Locais de apoio a tratamento psiquiátrico na grande Florianópolis: • Instituto São José Ltda - ala de psiquiatria • Instituto de Psiquiatria de Santa Catarina - Colônia Santana • Hospital Colônia Santana - Colônia Santana • Hospital Caridade - unidade de psiquiatria • Hospital Universitário Polydoro Ernani de São Thiago - laboratório psiquiátrico 2.2 2.2 O Hospital Universitário (HU) da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), mediante convênio firmado desde 2003 com a Residência Médica da Secretaria de Estado da Saúde mantém um ambulatório de psiquiatria de boa qualidade. Foi proposto a implantação de 53 leitos de atendimento mental mais voltados ao uso de álcool e outras drogas, sendo 30 leitos para São José, 16 leitos infanto- juvenis e 07 para adultos na cidade de Florianópolis, todos locados em Hospitais comuns, de acordo com o Plano Operativo Estadual de Saúde Mental 2012 - 2015. Os 07 leitos para adultos na cidade de Florianópolis, locados no Hospital Universitário, funcionarão como retaguarda à emergência, visando manter um tempo de permanência máxima de 72 horas. ‘’A estimativa de uma prevalência anual de necessidade de internação psiquiátrica, ao redor de 0,2%, implicaria numa população de 1.620 utentes na região. Num conjunto de 53 leitos, poder-se-ia fazer 135 internações por mês, incluindo as emergenciais e as observacionais breves, de curta duração. Isto implicaria uma média de 2,5 internações por leito, por mês. A média geral de permanência no hospital, se mantida em 12 dias, cobriria plenamente as necessidades.’’ (PLANO OPERATIVO ESTADUAL DE SAÚDE MENTAL, 2012) Aqui fica a crítica ao sistema proposto à implantação dos leitos, podendo ser suficientes para a demanda de emergências de álcool e outras drogas, todavia em atendimentohospitalar,institucionalizado, sem o preparo e abrangência que se propõe em unidades de CAPS. A proposta de implantação de leitos podem atender as demandas de emergências de vítimas de abuso de álcool e drogas, porém não há preparo para suprir a necessidade do atendimento que deve ser oferecido num CAPS. Atualmente, apenas o município de Florianópolis possui unidades de pronto atendimento de 24 horas (UPA), com duas unidades habilitadas e recebem custeio regular do Ministério da Saúde - elas dispõem de atendimento psicossocial 24h para atendimento emergencial, todavia não são especializadas em atendimento mental. Uma sala de atendimento e de observação psiquiátrica de alto nível está sendo planejada, num trabalho conjunto com a Secretaria Municipal de Saúde de Florianópolis e a Universidade Federal de Santa Catarina, na Emergência do Hospital Universitário da UFSC. Ela impor-se-á na prestação de serviços regionais e na formação de estudantes, inclusive como um dos cenários para a residência médica em psiquiatria e a residência interdisciplinar em saúde mental, ambas da Secretaria de Estado da Saúde - ainda não instaurada. CAPS ad Continente Estreito CAPS ad Ilha - PantanalCAPS ad - Jardim Atlântico CAPS I - Agronômica CAPSi Centro
  • 19. 36 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 37 A implantação de unidades de atendimento proposta para a região da Grande Florianópolis está assim distribuída: No município de São José há três serviços residenciais terapêuticos mantidos pelo Estado e nenhum, mas a região não dispões de nenhum residencial terapêutico mantido por municípios. Atualmente em Florianópolis os CAPS tratam os pacientes em geral, tanto os dependentes químicos como os portadores de transtornos mentais, como se portadores de doenças hormonais tratáveis com remédios, sem análise ou psicanálise (conversas e terapias). 2.2.2.3 A ESCOLHA. UMA UTOPIA PARA A CIDADE? OBrasilvemapresentandoumcrescimento abrupto no consumo de ansiolíticos, antidepressivos e outros, nadando contra a maré, tentando remediar os efeitos sem contudo repensar as causas, que muitas vezes acaba agravando mais o quadro daqueles que poderiam ter os sintomas abrandados com simples práticas cotidianas. Da mesma forma, nas instituições, o tema da institucionalização é abordado de maneira a expor a realidade dos tratamentos que agravam o problema pela “mortificação do eu”, tema também abordado por Foucault como “disciplinarização”, através do controle disciplinar da atividade humana bastante forte, onde o paciente é restrito de liberdade e tem seu espaço pessoal limitado. Nas instituições não tratamos diferente. No trabalho de pós-graduação em arquitetura, da aluna Aline Eyng Sava (2008), o tema da institucionalização é abordado de maneira a expor a realidade de nossos tratamentos. Em nossas instituições de tratamento, segundo a autora, agravamos o problema pela “mortificação do eu”, tema também abordado por Foucault como “disciplinarização”. Há um controle disciplinar da atividade humana bastante forte, onde o paciente é restrito de liberdade e tem seu espaço pessoal limitado. Como exposto no trabalho de Goffman (1996), as obrigações dentro destas instituições ou até mesmo sociais acabam por refletir em uma perda da sensação de escolha pessoal. Outro fator bastante forte nos tratamentos é a ausência dos bens, que tem uma relação bastante forte com a identidade pessoal. Nestas instituições os indivíduos são estimulados a interagir com pessoas nas quais muitas vezes não possuem afinidade, desrespeitando as características particulares de cada interno. Em tais “instituições totais”, a “mortificação do eu” pode resultar em “desculturamento” que significa perda dos hábitos e costumes derivados do contexto socioeconômicoanteriorainstitucionalização, tornando o indivíduo incapaz de enfrentar os aspectosdavidadiária.Savi(2008),caracteriza estas instituições totais como ”estufas para mudar pessoas”, para se moldarem aos parâmetros sociais. E esta é a realidade que constatamos em visita ao CAPS Ponta do Coral. Sendo assim, a partir dos estudos realizados, concluimos que o ideal para a cidade seria a implementação de um CAPS III, com uma real atenção ao indivíduo, ao tratamento multidisciplinar, humano, fugindo dos padrões institucionais de leitos hospitalares e tratamentos frios que temos hoje. Agregado a esta instituição, propõe-se a instalação de um Centro de Convivência e Cultura, com trabalhos em conjunto ao CAPS, promovendo a interação com a sociedade, estimulando a reinserção social dos usuários a mesma, como também e principalmente a informação desta como forma de dissociação do preconceito perante a ‘’loucura’’, trazendo o tema ao meio social e para a vivência da cidade. 2.2 2.2
  • 21. 40 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 41 3.1 CONCEITO DE AMBIENTES RESTAURADORES E SUA RELEVÂNCIA Apartirdadécadade1980,aspesquisassobre ambientes restauradores ganharam maior visibilidade, sugerindo este termo a partir de teorias propostas por Rachel e Stephen Kaplan e Roger Ulrich (GRESSLER; GUNTER, 2013). Uma gama de pesquisas e estudos sobre ambientes capazes de provocar ou amenizar o estresse nos indivíduos começaram a ser divulgadas e alguns preceitos foram se moldando. Passou-se a estudar o “apego ou desapego ao lugar, identidade e significado do lugar, ambientes calmos ou estressantes” (GRESSLER; GUNTER, 2013). Na teoria da recuperação psicofisiologia ao estresse proposta por Ulrich, enfatiza-se a percepção visual e estética de certos ambientes à resposta afetiva associada. Ulrich defende que a exigência ligada ao excesso de tomada de decisão pode levar ao estresse, resultando em emoções negativas, mudanças negativas do sistema fisiológico e aumento da atenção de vigilância (automática). Ambientes físicos, visualmente prazerosos, podem auxiliar na redução do estresse. Além disto, considerou-se alguns aspectos da natureza também capazes de promover a recuperação psicofisiológica ao estresse, como a água e a vegetação, principalmente gramados e árvores. Os resultados desta pesquisa sugerem que “apenas um vislumbre da natureza pode possibilitar a recuperação do estresse” (GRESSLER; GUNTER, 2013). Já Stephen e Rachel Kaplan, apesar de estudarem a mesma temática propõem uma teoria um pouco diferente da restauração da atenção. Para os autores a qualidade da inter- relação de um sujeito com o ambiente está relacionada às ações inerentes ao individuo e aos parâmetros de informação oferecidos pelo ambiente.Sugeriramcomofatorespromotores de restauração, as etapas: fascinação, afastamento, extensão e compatibilidade. A fascinação está ligada a atenção involuntária, podendo ser de intensidade moderada, voltada a estímulos esteticamente agradáveis, permitindo a capacidade de reflexação. Ou a fascinação aguçada, relacionada a atenção às atividades como assistir a um evento esportivo, por exemplo. Afastamento envolve a possibilidade geográfica e/ou psicológica de se estar afastado do contexto usual, contexto que permita a promoção de mudança de nossos pensamentos cotidianos. Extensão seria o conceito de ambiente físico que permite uma exploração e interpretação, mantendo interação com o mesmo, sem provocar tédio durante um período de tempo. Um ambiente rico, seria aquele que dá margem à futura exploração. A compatibilidade refere-se ao suporte que o ambiente dá ao seu propósito e às possíveis ações no ambiente. Apesar de diversos aspectos, um ambiente restaurado é percebido como um todo, em que todos os elementos estão relacionados de forma coerente. A questão da agressividade é tema corrente dentro dos CAPS, seja pela dificuldade dos usuários em expor suas questões, ou seja pelo estresse do dia-a-dia. No artigo “Ambientes restauradores: Definições, histórico, abordage e pesquisas” (GRESSLER; GUNTER, 2013), relaciona-se a agressividade com o estresse, podendo agravar as situações. Defende-se, no trabalho, que aquelas pessoas com maior contato com ambientes naturais apresentam menor grau de agressividade e estresse. Conceito de ambientes restauradores e sua relevância 3.1 Destacou-se ainda a importância da exposição a luz do sol, com benefícios fisiológicos e psicológicos positivos comprovados. Acredita-se que o significado de experiências restauradoras provém da inter- relação dos componentes físicos e sociais, e pode ser caracterizado por diferentes dimensões afetivas. Com relação às diferentes preferências pessoais e à aparência do lugar, Galindo e Hidalgo (2005) demonstraram que os atributos estéticos não afetam a categorização de um local como atrativo ou pouco atrativo. É o fator restaurador do local que afeta a sua categorização como um local atrativo ou pouco atrativo (Purcell, Peron, & Berto, 2001, apud GRESSLER; GUNTER, 2013). 3.2 COMO A ARQUITETURA INFLUENCIA NO TRATAMENTO E PERCEPÇÃO DO SER. De acordo com artigo “Supporting the psychosocial needs of cancer patients through desing”, (KRUMP; NORDLING, 2012), em tradução livre “Apoio as necessidades psicossociais dos pacientes com câncer através dedesing”),queconsideraaindaasnecessidades de pacientes de câncer, o ambiente é um fator decisivo ao tratamento para pessoas com algum tipo de sofrimento mental. “Olhar para o suporte das necessidades do paciente significa olhar para suas necessidades de vulnerabilidade. Dignidade, privacidade e empoderamento.” (KRUMP; NORDLING, 2012, p.3 - tradução livre). O design do espaço construído pode proporcionar ao paciente sensações de que este está no controle da situação, muitas vezes oposto a sua realidade. Podem ser utilizadas estratégias na conformação da edificação, para que o individuo tenha a sensação de poder de escolha, controle, privacidade, reduzindo seu sentimento de vulnerabilidade. Um exemplo de tais estratégias seria o uso de portas deslizantes que permitam fechamento ou abertura dos ambientes, tendo-se escolha no nível de privacidade, controle de iluminação. Opções de escolha de diferentes ambiências dão ao individuo a sensação de controle, empoderamento e dignidade perante a arquitetura habitada. Os espaços devem ainda, além de possibilitar os recantos individuais, estimular e encorajar a conversa e a convivência, uma vez que estudos mostraram a eficácia destes espaços na redução do sentimento de ansiedade, isolamento, dor e melhora na qualidade de vida. Ressalta-se ainda a importância da exposição a luz solar, como já mencionado, que aumenta a serotonina do indivíduo, reduzindo o estresse, ansiedade. A importância dos jardins é afirmada no estudo (KRUMP; NORDLING, 2012), enquanto pequenos recantos em contato com a natureza como ambientes restauradores e promotores de socialização, com contato a natureza. Discorre-se ainda sobre a importância dos espaços terem uma leitura fácil aos pacientes, de modo a não proporcionar estresse aos mesmos, tendo uma entrada bem demarcada, caminhoscobertosefacilidadedecompreensão dos trajetos realizados dentro da edificação, com identidade visual de sinais claros para se indetifucar os caminhos com facilidade. Outro aspecto levantado em estudo de caso, no artigo de Krump e Nordling (2012), fala da presença de obras de arte coloridas e inspiradoras ao longo das passagens, com histórias de sobreviventes, fornecendo esperança e inspiração àqueles que estão em tratamento. De forma que ex-pacientes tenham expostas suas obras nos CAPs. 3.1
  • 23. 44 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 45 4.1.1 CAPS PONTA DO CORAL O acesso ao CAPS Ponta do Coral (CAPS II) situado no Bairro Agronômica em Florianópolis, não foi dos mais fáceis. Conforme me foi informado, atualmente o atendimento é prestado através de agendamento pela secretaria da saúde, e só posteriormente é permitido o acesso ao local pelos usuários. O reconhecimento fora feito através de visitajuntoàturmadepsicologiadadisciplina de Esquizologia da UFSC, acompanhado pelo o professor responsável Marcos Eduardo Rocha Lima. Na oportunidade, a dinâmica de grupo fora uma oficina de teatro, uma das atividades utilizadas na promoção do tratamento dos pacientes. 4.1.1.1 ANÁLISE DO LOCAL No acesso ao local, a primeira impressão é negativa pois não há preocupação de integração do ambiente com a cidade. Embora o CAPS esteja localizado em uma região nobre, com muitas opções de acesso de transporte público, a edificação localiza- se aos fundos do acesso de outras edificações públicas, de maneira que mesmo de divisando com a avenida Beira Mar Norte e um centro esportivo, encontra-se escondida pelo mato e muros no seu entorno, resultando em pouca percepção do estrutura dentre os que transitam nas proximidades. Esta situação teve uma pequena alteração com a construção do corredor de ônibus da Avenida Beira Mar, porém não há acesso através desta. Em contrapartida, a própria vegetação ao redor da edificação e os recantos que elas formam tornam-se pontos de encontro para os usuários para interação e integração, nos momentos que antecedem as atividades profissionais promovidas nos tratamentos. ‘ Estudos de caso 4.14.1
  • 24. 46 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 47 4.14.1 O ambiente do CAPS Ponta do Coral é bastante impessoal, como pode ser percebido pelas fotos. Foi constatado a presença de produções artísticas dos usuários, no ambiente, na tentativa de se apropriarem do lugar, mas ainda de forma bem inexpressiva se em comparação com outros espaços como o Hospital da Loucura, do Rio de Janeiro, ou o projeto “Madlove: A Design Asylum”.
  • 25. 48 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 49 Na sala onde são realizadas as atividades interativas, o espaço é insuficiente para acolher todos os interessados. Com a impossibilidade da entrada de todos os usuários e estudantes, os mesmos permanecem do lado de fora da porta, amontoados, ficando apenas como expectadores. Estas limitações de espaço resultam na supressão de parte das dinâmicas, além de limitar os movimentos e expressões do grupo. Foi neste ambiente que se consegue perceber mais claramente a integração entre pacientes e psicólogos,onde,nãosóospacientesmastambém os profissionais da saúde se libertavam de certas amarras sociais e soltavam ares, gritos e palavras livremente. Expressavam-se. Além da insuficiência do espaço, o local não dispõe de armário para guarda de materiais, o que acarreta em um amontoado de coisas, parecendo mais um grande depósito, improvisado como sala de aula. As grades nas janelas marcavam o enclausuramento, que em conjunto com as paredes todas claras e piso branco, davam um ardeumainstituiçãocontroladaepadronizada, sem espaço a individualidade ou expressão. Apesar de todas as deficiências, havia uma expectativa latente pela alegria de se ter aquele espaço para a livre expressão, falar, viver nesse ambiente mais livre, onde a liberdade de ações daquele momento transcendessem a falta do espaço físico e permitissem o livre movimento. Logo na entrada, há uma recepção, parecida com uma recepção de um posto de saúde, com cadeiras de plástico enfileiradas, acompanhadas de uma mesa a frente, ocupada por um recepcionista, e um guarda próximo. A pintura é de cores claras e sóbrias, com predominância do branco. Por ser uma casa antiga, sua disposição lembra mais um pequeno labirinto. Para chegar à pequena sala de teatro, passamos por algumas salas sequenciais, exceto uma que lembrava mais um grande corredor, com disposição de pequenas saletas para atendimento individual, uma pequena sala de convivência onde são expostos artesanatos, obra de um dos pacientes que usava sua arte na tentativa de ensinar os outros pacientes, e também com a intenção de vender para seu sustento - de acordo com informações prestadas no local -, um pequeno refeitório com espaço aproximado para umas dez pessoas, por fim mais um corredor que desemboca na sala de teatro, tudo predominantemente branco. A organização espacial é um pouco confusa, comcorredorservindocomosalaparaalgumas atividades e exposição de trabalhos, e os trajetos lembram mais labirintos, dificultando a localização dos ambientes para quem visita o local pela primeira vez, além da edificação não estar adaptada às pessoas com dificuldades de locomoção, mesmo sendo uma instituição que atende um alto índice de pacientes portadores de necessidades especiais. 4.14.1
  • 26. 50 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 51 4.1 4.1 Dentre as necessidades da hospitalidade, foi-me informado da necessidade de armários para os usuários, para que estes possam ter seu espaço individual garantido. Foi salientado a importância de quartos coletivos, exceto em casos bastante atípicos, para evitar que os pacientes fiquem sozinhos, visando evitar ocorrências de suicídios nos casos de pacientes com esta tendência. No banheiro há a necessidade de espaço maior no vazo e um grande box adaptados, pois alguns pacientes necessitam de auxilio para usar o sanitário e tomar banho. Uma usuária que acompanhava a visita comentou a necessidade de cortina, pois toda vez que alguém tomava banho molhava todo o banheiro, já que o local não dispunha de um box adequado, para dar espaço aos usuários que necessitam de acompanhamento. Por todos ambientes foi observado a presença de artes, cartazes informativos e placas, feitos pelos próprios usuários e funcionários, dando vida ao local. Apesar disto os consultórios ainda são bastante impessoais e um pouco frios, com pinturas monocromáticas e claras. A disposição dascadeirasedasmesasparaatendimentomédico ou psicológico ainda são bem tradicionais. Há o cuidado de que os profissionais não tenham salas marcadas, dispondo o espaço organizado por placas de livre ou ocupado, para tentar fugir do modelo institucionalizado e não instaurar a relação de posse e poder pelos profissionais, criando assim uma circulação entre profissionais e usuários livre e fluida. Há ainda uma sala onde acontecem as sessões de terapia em grupo. No dia da visita havia cerca de quinze pessoas em uma sala de cerca de 5x7m, de forma a não comportar de maneira ideal a quantidade de pessoas e atividades nela realizadas. Outra forma de inserção é o estímulo a participação nas atividades de serviços do CAPS, como auxílio para disposição de louças e pequenos serviços, porém nunca tratados como uma obrigação. Os murais de atendimento são setorizados por cores, onde cada um pode ver sua região e o profissional responsável pela mesma, com nomes de flores. Estes estavam dispostos na sala do ócio, sala destinada a não se fazer nada, munida com televisão e sofás, dando-se importância especial a este ambiente principalmente porque após o horário do almoço são distribuídos colchonetes pelo chão, onde os usuários possam dormir, visto que os pacientes sentem muito sono, inclusive devido aos medicamentos, semelhante ao que ocorre no CAPS Ponta do Coral. Porém, esta sala também é insuficiente para o número de usuários. Junto a sala do ócio encontra-se a enfermariaeasalademedicamentos.Ressalta- se a conveniência da proximidade entre elas pela facilidade ao acesso aos medicamentos pelos pacientes. Nesta sala, encontra-se instruções de uso e as doses certas, apesar da necessidade de um espaço de concentração para a contagem destes medicamentos, o controle dos mesmos e a divisão previa as doses certas para cada usuário. Há também uma sala de artes muito pequena para a demanda, limitando-se ao uso de poucos usuários por vez, além da falta de espaço para guardar o material de artes. Não há uma lavanderia na unidade, desta forma foi necessário reservar um espaço para de expurgo, onde as roupas são armazenadas para coleta e lavagem em outro local, tendo no lugar apenas um tanque para atender a demanda do dia-a-dia. 4.1.2 CAPS JOINVILLE (CAPS III) A visita ao CAPS Joinville foi das mais esclarecedoras para o trabalho. Dispendi uma manhã inteira junto da coordenadora da unidade, conhecendo e questionando sobre o espaço. A casa encontra-se em uma rua calma, muito próxima ao centro da cidade, muito bem localizada e foi adaptada a instalação do CAPS. Mantém características de uma típica casa residencial, com a identificação através de placa na frente e possui grande circulação e permanência de pessoas no pátio. A recepção no local foi muito diferente da encontrada em Florianópolis. O CAPS em Joinville se mostra aberto a quem quiser entrar, com o acolhimento na fachada frontal, facilitando para quem busca atendimento quando se necessário. Há um guarda em frente que visa mais o atendimento e a segurança do lugar que impedir a saída dos pacientes. Apesar de haver controle no portão, os usuários têm certa liberdade de entrada e saída e, para a maioria, a permanência ali é uma opção. De maneira que o CAPS torna-se um ambiente democrático, onde o usuário é ativo em seu tratamento, tendo plena liberdade de escolha perante suas atividades. A casa é rodeada por jardins, de forma que esta paisagem torna-se presente no dia a dia dos usuários, os quais podem realizar atividades tanto nas varandas, quanto nas áreas externas sempre que possível, apesar do terreno ter muitas partes lodosas, o que impede mais atividades na grama, conforme informado. Como o CAPS Florianópolis, o espaço físico da unidade é insuficiente. As áreas de circulação são apertadas e as pessoas se esbarram nas passagens, além da insuficiência de áreas de estar de qualidade para a quantidade de pessoas que ali são atendidas diariamente. As refeições são servidas na varanda aberta, espaço destinado ao refeitório. Conforme informado, o CAPS Joinville atende hoje cerca de 240 pessoas ao longo da semana. São servidos cerca 50 cafés da manha, 45 almoços, 45 cafés da tarde, 20 jantares e 29 ceias. Há usuários que permanecem no CAPS apenas no período da manhã, outros apenas no período da tarde e alguns o dia todo, além das hospitalidades noturnas, que são os pacientes que permanecem no CAPS por 24 horas, ficando internados em média uma semana.
  • 27. 52 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 53 4.1 4.1 O ambi ente como um todo foi adaptado com pequenas rampas para vencer os degraus de acessos aos ambientes, visto que muitos dos usuários tem dificuldades de locomoção em consequência tanto das suas doenças, quanto do estado de confusão que são acometidos pelo uso dos medicamentos. O espaço destinado aos funcionários fica no segundo andar, subindo uma escada estreita ao lado da sala de ócio. Percebi que um ponto positivo de sua localização é a possibilidade de se obter um controle visual das atividades que ocorrem no pavimento inferior, podendo-se observar as dinâmicas que ali ocorrem. Há uma sala munida com uma grande mesa de reuniões onde ocorre a maior parte da convivência, das atividades e reuniões, além das refeições. Nas paredes deste ambiente existem murais informativos dos casos tratados no local, para que todos possam ficar informados de mudanças nos tratamentos de usuários que necessitam de uma atenção maior. A copa também é bem pequena para os 38 funcionários públicos que trabalham em diferentes turnos, sendo a maioria diurno, além dos funcionários terceirizados, responsáveis pela segurança e limpeza. O espaço necessita de uma sala separada paraaadministração,poissãorecebidasmuitas ligações ao longo do dia, além de um espaço destinado a coordenação geral do mesmo. Foi possível perceber um grande esforço e força de vontade por parte dos funcionários na atenção ao melhor atendimento e tratamento aos usuários. Sempre muito atenciosos, apesar das dificuldades do dia-a-dia. Tocou-me profundamente a humanidade que presenciei, pela atenção dispensada ao próximo, pelos cuidados, pela vontade de mudar apesar do espaço físico não ser o ideal. Há um esforço constante de se dar o melhor atendimento possível, compensando com a atenção, enfeites, alegria e nos pequenos detalhes, vivendo cada dia com intensidade e atenção. Além da atenção que me foi dispensada, foi-me permitido gravar uma entrevista de esclarecimento sobre alguns pontos de atenção do CAPS, em parte acima descritas além da descrição do local. Entrevista completa em anexo.
  • 28. 54 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 55 4.2.2 PRESENÇA DA FAMÍLIA AcoordenadoradoCAPSJoinvillesalientou que ainda existe uma grande resistência por parte de muitos familiares na participação do tratamento dos usuários. Contudo, em visitas a ambos os CAPS percebi uma falta de espaço físico voltado a estes. No primeiro caso, CAPS PontadoCoral,háapenasarecepção/espaçode espera, que não é nem um pouco convidativa. No segundo, há apenas um banco onde no dia da visita estava uma mãe de usuário fazendo um bordado enquanto aguardava seu filho em consulta, muito desconfortável e com pouco espaço e exposta as intempéries do tempo. Há ainda o depoimento da mãe de um usuário de uma unidade de acolhimento que relatou-me que os encontros de apoio com outros pais de internos ocorriam no espaço físico de uma escola, com atenção de um psiquiatra e um psicólogo, em reuniões de ajuda mútua e conversas de esclarecimentos. Issomefezperceberqueafaltadeparticipação dos familiares se dá um pouco pela falta de espaços destinados a estes, perdendo-se um grande aliado no tratamento aos usuários. Não há espaço melhor que o CAPS para acolher esta demanda, pois este familiares são de extrema importância no tratamento dos pacientes, assim como se faz necessário esclarecer a importância do problema, bem como o acompanhamento e o apoio aos mesmo que sofrem junto com seus familiares. 4.2.1 RELATO DE PROFISSIONAIS Ao longo do processo muitos profissionais agregaram à pesquisa, esclarecendo dúvidas e trazendo informações. Dentre eles destaco o professor Jeferson Rodrigues, da Enfermagem da UFSC, que sempre se mostrou aberto a conversar e tirar dúvidas sobre o assunto e foi quem conseguiu o contato para a visita ao CAPS Joinville. OutrocontatoimportantefoiapsicólogaJulia Malaguti, que trabalha em um CAPS no Rio de Janeiro, e relatou exemplos de tratamentos dedicados no Rio de Janeiro, no Hospital Nise da Silveira, exemplificado nas referências a seguir, e além da própria coordenadora do CAPS Joinville, alguns outros profissionais, como psicólogos, professores e outros profissionais em conversas na universidade. Nogeral,muitosefaloudopreconceitoacerca deste tema, não só dentre a sociedade, mas inclusive entre os próprios profissionais, tendo diversas linhas de pensamento, de tratamento, envolto a muita polêmica, do preconceito da sociedade, da vergonha dos próprios usuários e familiares por falta de conhecimento, tanto de sua vivência como de sua capacidade. Nas conversas, muito se falou sobre a importância do usuário se sentir parte de algo, de o CAPS ser um espaço destinado a estes já que há poucos espaços assim na sociedade, da necessidade de se criar um vínculo de pertencimento, como também da importância dolúdico,daexpressão,daarteedaimportância da liberdade de expressão e fala dos usuários. Depoimentos estes que apenas corroboraram com todas as informações obtidas através das leituras realizadas, assim como as diretrizes e princípiosdoquedeveserotratamentomental. Pessoais 4.24.2
  • 30. 58 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 59 5.1 Referências de atendimento 5.1.1 TRATAMENTO NA ITÁLIA A Itália foi uma das pioneiras em um tratamento diferenciado aos doentes mentais, impulsionada principalmente por Franco Basaglia, psiquiatra italiano com forte presença na história da luta antimanicomial no país. A partir da Lei nº 180, de 1978, foi possível a criação de cooperativas com a participação de até 30% de seus associados com históricos psiquiátricos, com boa aceitação social, não só por estar inserido nos ideais da reforma psiquiátrica, como também pela cultura cooperativista ser difundida na Itália desde o inicio do século. As cooperativas se mostraram diferentes e distantes do que eram os espaços de exclusão dos manicômios, por se constituírem como espaço de inserção destas pessoas outrora excluídas, mas que ali são acolhidas e se tornam cooperados de forma apropriada, e muitas vezes assistida, com apoio aos mesmos. Assim o usuário vai se construindo como pertencente a sociedade com espaço dentro da divisão social do trabalho. Esta trajetória incentivou a produção do filme “Se puo fare” (2008), “Se pode fazer”, em tradução livre. O filme retrata como foi a trajetória e inserção deste tipo de iniciativa na Itália, sendo um filme bastante esclarecedor sobre o modo de como se faz o trabalho junto a estas pessoas, com informação, compreensão e aos poucos estes podem surpreender e demostrar habilidades além das esperadas, surpreendendo por sua vontade e criatividade. As cooperativas sociais são constituídas com o objetivo, não mais ‘terapêutico’, isto é, rompendo com a tradição da terapia ocupacional, mas de construção efetiva de autonomias e possibilidades sociais e subjetivas. Por um lado,otrabalhonascooperativassurgecomoconstruçãoreal de oferta de trabalho para pessoas em desvantagem social para as quais o mercado não facilita oportunidades. Por outro, surge como espaço de construção de possibilidades subjetivas e objetivas, de validação e reprodução social dos sujeitos envolvidos em seus projetos AMARANTE (1997, p. 176) “ ”
  • 31. 60 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 61 5.1 5.1 “o teatro é uma excelente maneira de trabalhar porque quanto mais desenvolve o ator o controle sobre si próprio, o controle sobre seu discurso, controle sobre seu gesto, que é capaz de colocar seu conteúdo pra fora, os conteúdos de seus personagens, os conteúdos das pessoas que estão trabalhando com você, que você ajuda elas a se expressar, menos medicamento você vai precisar.” “quando pergunta, a arte cura? claro que cura. se arte não curar o que vai curar? se a arte não for capaz de colocar o ser humano em debate, de colocar o ser humano em movimento, revelar novas coisa, revelar novas imagens, novas possibilidades, trabalhar a memoria, a historia, os conteúdos da pessoa, isso que a arte faz, isso que o teatro faz, isso que a musica faz, que a dança faz, pra isso que elas existem.” Vitor Pordeus, médico psiquiatra 5.1.2 HOSPITAL PSIQUIÁTRICO NISE DA SILVEIRA - HOTEL DA LOUCURA Na cidade do Rio de Janeiro, Zona Norte, dispomos de um belo exemplo de instituição de tratamentomental.OInstitutoNisedaSilveira, um dos maiores símbolos pela luta contra a internação forçada, conta hoje com 5.000 m², com atividades voltadas principalmente à arte, como pintura, escultura, teatro e dança. Dentro das instalações foi criado ainda o Museu de Imagens do Inconsciente, inaugura do em 1952, locado dentro do próprio instituto. Junto ao Instituto, ocupando o terceiro andar, local que antes abrigava uma enfermaria que fora abandonada, está situado o Hotel da Loucura, que funciona desde 2012. “Lá, artistas, pesquisadores e médicos podem se hospedar para conviver com pacientes ainda internados por problemas psiquiátricos. O objetivo? Promover não apenas uma reflexão cultural e científica sobre o tema da loucura, mas também acabar com o estigma da doença mental.” (REVISTA GALILEU, acesso em: 30/07/2016) De acordo com a reportagem, a instituição tem por base convívio entre pessoas e não o tratamento de doentes. No documentário Hotel da Locura - Gênese (2013), sobre o Instituto, o médico psiquiatra Vitor Pordeus ainda complementa que o objetivodotrabalhoalirealizadoédedevolução da dignidade do ser humano, como defendia a Dra. Nise, com diálogos, construção conjunta e afeto catalizador. A seguir, elencamos algumas falas do psiquiatra no documentário que os ajudam a pensar na temática. “A cura é a ausência de preconceito, o que cura é afeto incondicional.” Nise da Silveira “O hotel da loucura é a busca pela construção de um lugar que seja capaz de acolher, permitir que as pessoas se manifestem, que dialoguem, que encontrem um lugar que poca dialogar sem medo, que possam se enlouquecer sem medo, possam se colocar sem medo”
  • 32. 62 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 63 5.1 5.1 5.1.3 ESTUDO DE AMBIÊNCIA DE CONSULTÓRIO Como seria uma enfermaria projetada pelos pacientes? Esta pergunta foi o que incentivou a pesquisa “Madlove: A Designer Asylum” desing asilar do artista britânico e ativista James Leadbitter. Através de workshops junto a pacientes, psiquiatras, arquitetos e designers, sobre o que seria um espaço atraente para o tratamento mental, distanciando-se das configurações institucionais. Entre março e maio de 2015, uma versão do projeto fora exposta na Fundação de Arte e Tecnologia Criativa em Liverpool, Inglaterra, criado com o apoio do Wellcome Trust em colaboração com o British Psychological Society. O espaço foi desenvolvido com a ajuda de designer de arquitetura James Christian e BenjaminKoslowski,umdesignerePh.D.pesquisador da Royal College of Art de Londres. Leadbitter chamou-lhe “Um espaço lúdico e emocionante para redesenhar loucura, uma tentativa utópica em que um hospital de saúde mental poderia ser assim” (SLATE’S DESIGN BLOG, acesso em 30/07/2016). A instalação bastante colorida é resultado de uma serie de feedbacks dos workshops, projetado para oferecer um espaço com diferentes níveis de privacidade e intimidade, que varia de isolamento total a convivência e união, com diversos “cantos” projetados para cada momento ou intenção. Um exemplo é a torre de resfriamento com um toque humorístico da cela acolchoada, que permite a privacidade da pessoas para gritar e se isolar em seu momento de expressão. Há também um móvel que abriga uma pequena biblioteca com intenção de manter a saúde mental integrada,comumarmáriodebaixodaescadaqueéusado como armazenamento ou como refúgio temporário. Uma mesa de boas-vindas inclui garrafas contendo aromas agradáveis, para fazer o lugar cheirar bem e estimular diferentes sensações.
  • 33. 64 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 65 5.2 5.2 Referências Arquitetônicas Os espaços internos do edifício foram zoneados de acordo com suas atividades, em zonasdehospitalidade,tratamentoeserviços, para facilitar o trabalho ali realizado, e ainda assim, foi mantida a fluidez nas circulações, como espaços de livre acessos. Há ainda a presença de espaços menores pelo edifício para que se possa ter diminuída a sensação de vigilância por parte dos funcionários,aindaqueaspartesenvidraçadas permitam um contato visual por parte dos funcionários de forma mais discreta. Com base no trabalho de Andressa Franco Moura (2014) e em projetos do site Archy Daily, reuni as seguintes referências para este projeto. 5.2.1 HOSPITAL PSIQUIÁTRICO KRONSTAD Arquitetos: Origo Arkitektgruppe Localização: Bergen, Noruega Paisagismo: Smedsvig Landskapsarkitekter Área: 12.500 m² Ano do projeto: 2013 Como pontos estruturantes do projeto temos a participação do contato com o público, assim como sua abertura, transparência e inclusão de áreas verdes por todo o edifício. O projeto do hospital dá forte ênfase em sua abertura e transparência em relação ao público, ao passo que forma um abrigo de proteção para os pacientes (Archy Daily, acesso em 30/07/2016) A permeabilidade visual e transparência do edifício, que priorizam pontos de vista atraentes da cidade, dando sensação de liberdade e inserção espacial, faz-se, também, com a intenção de que isto se reflita em uma maior abertura “quanto aos problemas de saúde mental na sociedade atual. Além de convidar os pacientes e funcionários ao interior, a cidade inteira é bem-vinda a dar uma olhada.’’ (Archy Daily, acesso em 30/07/2016) Para maior interação, também, ao norte do edifício fora criada uma praça pública, conectando o edifício à cidade e aos indivíduos que ali transitam, transbordando estas áreas verdes para dentro do edifício e criando ainda praças internas destinadas aos usuários, marcando seu espaço de pertencimento. Estas áreas verdes internas no edifício conectam visualmente o edifício entre suas diferentes áreas, facilitando também a visibilidade do do externo a partir de qualquer ponto do edifício. Localizado em meio ao tráfico intenso da cidade, envolto a vida social, possui um ponto de trem, conectado aos modais da cidade, para facilitar o acesso daqueles usuários e estimular sua independência do ir e vir.
  • 34. 66 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 67 5.2 5.2 Ele é organizado em torno de três grandes átrios que garantem luz natural, ar e valiosos espaços de lazer ao ar livre. Os átrios proporcionam o contato visual entre os diferentes departamentos, auxiliam no deslocamento por serem pontos geográficos de referência, e proporcionam perspectivas de dentro do edifício para a natureza. Cada um dos departamentos do hospital está conectado a um jardim de cobertura específico: cada jardim tem suas próprias características e difere por sua localização e função. As zonas verdes incentivam a interação social e oferecem espaços para a contemplação em um ambiente composto por materiais e plantas naturais (Archy Daily, acesso em 30/07/2016)
  • 35. 68 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 69 5.2 5.2 O diretor do projeto, comentou sobre o conceito do projeto (Brisbane Times, acesso em 30/07/2016), que foi desenvolvido por meio de pesquisa, mostrando que jardins e arredores naturais podem ajudar pacientes agitados ou ansiosos. Foi constatado que estes tipos de ambiente têm influência sobre o usuário, estes acalmam e aliviam a depressão. 5.2.2UNIDADEDESAÚDEMENTALDAUNIVERSIDADE DE GOLD COAST (GCUH) Arquitetos: PDT, STH and HASSELL (Joint venture) Localização: Southport, Queensland Ano do projeto: 2012 A unidade de saúde mental da Universidade Hospital de Gold Coast, localiza-se junto a um complexo de cuidados a saúde, anexo a um hospital convencional, com diversos estruturas de apoio a ambos como o próprio centro de estudos, que abriga livrarias e estruturas relacionadas, clínicas, unidades de permanência e até um espaço destinado a workshops. A unidade trabalhou bastante planos abertos, possibilitando grandes espaços externos de áreas verdes e livres. Além dos espaços externos, internamente também possui espaços coloridos, enfatizando a vida e independência dos pacientes, sempre com forte presença de vegetação e jardins. As cores presentes nas fachadas ajudam na identificação de cada setor da edificação, facilitando a compreensão espacial ao usuário. “A essência é que as pessoas andem através - eles não se sentem como se estivessem sendo controlados ou se estivessem presos no espaço” (Brisbane Times, acesso em 30/07/2016) “A unidade pode ser garantida, os quartos podem ser garantidos, mas há também um grande senso de abertura e independência de cada usuário, que surgiu do que a pesquisa mostrou ser essencial para a recuperação e tratamento bem sucedido.” (Brisbane Times, acesso em 30/07/2016)
  • 36. 70 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 71 5.2 5.2 5.2.3 CENTRO DE ACOLHIMENTO / CYS.ASDO Arquitetos: CYS.ASDO Localização: Hsinchu, Taiwan 300 Autor: Chung-Yei Sheng Equipe de Projeto: Jill Yang, Orange Kang, Peggy Chiang Área: 3000.0 m² Ano do projeto: 2014 Localizado no Distrito de Chupei, este projeto tem como estrutura sua relação do espaço interno/externo, de maneira a se apresentar como um ambiente acolhedor, trazendo para dentro do edifício a presença dos jardins. Estas camadas de paredes, e as aberturas irregulares, entregam uma boa qualidade de luz solar à edificação, produzindo um jogo de luzes e sombras que variam de acordo com a passagem do dia e das estações. Além de brincar com a iluminação artificial, descontraindo os ambientes muito limpos e de fácil compreensão, há ainda a preocupação com a visibilidade aos jardins a partir de cada ambiente do edifício. Neste projeto, foi possível conformar um circuito de circulações onde o usuário passa por diferentes conformações de jardins, o que cria uma dinâmica ao espaço, apesar de ainda manter a intenção de tranquilidade e acolhimento dos ambientes. Esta série de paredes em camadas não definem apenas as fronteiras hierárquicas,mastambémrecebeosprogramasparasatisfazerasnecessidades espaciais. Além de proporcionar abertura e a transparência necessária para dar ao espectador uma experiência interior e exterior simultânea. (Archy Daily acesso em 30/07/2016)
  • 38. 74 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 75 As pesquisas realizadas até aqui nos permitem esboçar algumas necessidades e intenções ao que se pretende para a instalação de um CAPS, juntamente com o Centro de Convivência e Cultura para a cidade de Florianópolis, tendo como pressupostos: • Fácil acesso, com diferentes modais em meio à cidade; • Conexão com os outras instituições de saúde para trabalhos conjuntos e continuados; • Visibilidade perante a cidade; • Conexão com a comunidade, diversificada para que não se crie mais estigmas, mas que ainda assim esteja próximo e acessível àqueles com maior demanda; • Conexão com áreas verdes e de lazer; • Constituição de um espaço que possibilite a realização de várias atividades; A escolha pelo espaço onde já está implantado o CAPS II foi pela necessidade de manter a conexão e acessos já existente a partir de toda a cidade, além de manter o atendimento em uma área com boa densidade e visibilidade social, fora optado pela locação na região insular ilha. Por sua centralidade a partir de diversos pontos da cidade, além de concentrar um intenso fluxo de linhas de ônibus, facilitando o acesso de usuários, já que estes, em sua maioria não podem dirigir devido ao uso de medicamentos e limitações motoras. Analisando a região, que é a insular central da cidade, com base no Plano Diretor de Florianópolis (LEI 482/2014), nota-se algumas grandes áreas de concentração de equipamentos institucionais, tanto da área da saúde, como da área da educação, da segurança, cultura e justiça. Como retrata o mapa acima, além da Casa do Governador, que se localiza praticamente anexa ao CAPS Ponta do Coral, temos, na saída leste, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC); no acesso norte, outro campus da UFSC, o da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) e o Cemitério Municipal da Cidade, entre outros equipamentos. 6.26.1 Diretrizes para o reconhecimento do lugar Reconhecimento do lugar
  • 39. 76 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 77 6.26.2 Outro aspecto a se destacar, segundo exposto nos mapas a seguir, elaborados a partir de dados do IBGE, é a grande densidade populacional na região e suas proximidades. Encontramos ainda disníveis na concentração de renda destes habitantes, o que promove o contato entre diferentes culturas, realidades e necessidades diversas, cenário que corrobora para a desmistificação perante a problemática do atendimento a pacientes com transtornos mentais. Por estas características, acreditamos que a localização do CAPS será estratégica para que ele proporcione maiores benefícios ao seu entorno, assim como o entorno reverteria benefícios ao equipamento institucional por toda sua potencialidade de conexões, possibilitando o tratamento e requalificação da área, assim como seus acessos e bordas.
  • 40. 78 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 79 6.4.1 USO E OCUPAÇAO DO SOLO A região é marcada, como já mencionado, por duas áreas residenciais já bastante consolidadas. Na região mais próxima a linha da Beira Mar Norte, as edificações são maiores e com menor adensamento, em área supervalorizada, enquanto que, aquelas direcionadas ao morro, as edificações são menores com maior adensamento, nas quais percebe- se o processo de favelização. Observa-se ainda uma grande quantidade de edificações destinadas ao uso institucional, com uma pequena concentração de comércio no entorno imediato. Além destas, ainda há presença de comércio irregular na área, devido ao grande fluxo de pessoas que ali trefega, principalmente em acessos aos hospitais, tema que será comentado no próximo tópico. Por ser uma área institucional e abrigar equipamentos esportivos e educacionais no entorno imediato, a densificação torna-se bastante rarefeita e um gabarito mais reduzido Análises do entorno 6.4 6.3.1 METODOLOGIA A partir da escolha do terreno, as estratégias utilizadas para materialização das teorias estudadas e apresentadas até agora, respeitando a localidade foram: • Análises de mapas locais; • Visitas exploratórias; • Reconhecimento físico e fotográfico; • Pesquisa de estudo de impacto de vizinhança; • Elaboração de um programa para o projeto a ser instalado no local. Metodologia de Aproximação
  • 41. 80 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 81 6.2.1.86.2.1.8 6.4.3 EQUIPAMENTOS Como já mencionado, a área de estudo possui um grande complexo de equipamentos institucionais no entorno, listados em mapa abaixo com sua localização. Todavia, apesar da grande disponibilidade de equipamentos de serviço, o bairro Agronômica é bastante carente de espaços comunitários, conforme levantado no trabalho de Flávia Ramos (2015), Arte e Corpo no Espaço Educativo, que propunha uma intervenção de alguns desses espaços. Nas escolas, por exemplo, há reivindicações, pela comunidade, de quadras de esportes, geralmente no período noturno, e, pela prefeitura, de salas de aulas para reuniões administrativas ou para pequenas organizações de comunidades. Em visitas ao local percebeu-se ainda uma desconexão da área com o eixo hospitalarç carência e ou inadequação de calçadas, insuficiência de estacionamento para atender a demanda local e sem espaços demarcados, onde o carro é prioridade e são estacionados sem nenhuma ordem. Desta forma, os pedestres necessitam se locomover no meio das ruas para passagem. Situação ainda mais agravada por se tratar de uma área com intensa circulação de crianças devido proximidade de escolas e equipamentos de assistência a crianças. 6.4.2 COMUNIDADES O complexo do Morro da Cruz reúne quatro comunidades, cuja ocupação iniciou-se ainda no início do século XX e já se incorpora à paisagem da ilha, sendo elas: Morro do Horácio, o Morro Santa Vitória, o Morro do 25 e o Morro Nova Trento. Estas estão zoneadas em sua maioria no Plano Diretor, exceto o Morro do 25, Como Zonas de Interesse Social (ZEIS) e a comunidade Vila Santa Rosa, localizada mais próxima a linha do mar como constatado no mapa abaixo. Apesar da tendência dos programas habitacionais em relocar estas comunidades para áreas periféricas da cidade, estas resistem na região. Contudo, permanecem segregadas da cidade, com poucos espaços de convivência e oportunidades restritas, tanto em matéria de educação como em oportunidades de trabalho e acesso à cultura. A implementação do complexo de atendimento à saúde mental com CAPS e Centro de Convivência e Cultura, juntamente a um parque estruturado, poderia proporcionar uma melhor qualidade de vida e novas oportunidades para muitos destas comunidades, além de aproximar potenciais usuários aos serviço e assistência proporcionadas no CAPS. O projeto ainda visa a oportunidade de fomentar a interação social, para que ali se construa um espaço conjunto de crescimento e aprendizado. Muito próximo a área de estudo, do outro lado da Avenida Beira Mar Norte, encontra-se a região da Ponta do Coral, com excelente localização e topografia perante a cidade. Porém, trata-se de uma área com histórico de grandes conflitos, despertando interesse da população para sua transformação em parque público, em resistência a crescente especulação imobiliária sobre a mesma. Devido a esta indefinição, quanto a sua natureza pública ou privada, o projeto não prevê a conectividade com a àrea, ainda que seja reconhecida a importância de fazê-lo. A densidade de áreas verdes na região também é baixa. Uma delas, hoje, demarcada no Plano Diretor como Área Verde de Lazer (AVL) faz divisa com o terreno do CAPS Ponta do Coral e deveria abrigar um parque urbano servindo à população. Mas o acesso à mesma encontra- se cercado e fechado, além da densa vegetação também ser um impeditivo para seu acesso e permanência. Apesar de estar localizada junto a Beira Mar Norte, a área fica bastante segregada da comunidade, não representando apoio a esta e com poucas áreas de permanência efetiva, mais voltada como área de passagem e às atividades esportivas.
  • 42. 82 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 83 6.2.1.86.2.1.8
  • 43. 84 | Stefany Trojan - Universidade Federal de Santa Catarina CAPS - Uma nova abordagem a saúde mental para Florianópolis | 85 6.2.1.86.2.1.8 6.4.3 ESTUDO IMPACTO DE VIZINHANÇA Junto à área de inserção do projeto, encontra-se hoje instalada uma subestação da Centrais Elétricas de Santa Catarina S.A., conforme locado em mapa no item acima. Para sua instalação fora necessário a avaliação através do Estudo de Imapcto de Vizinhança (EIV): Substação 138 kV Florianópolis - Agrômica (CELESC, 2008), de onde se pode extrair algumas informações, das quais as mais relevantes são: Vegetação - fora levantado que a maioria dos indivíduos arboresos e do sub-bosque são exóticos, sendo alguns inclusive contaminantes, somando cerca de 90% do volume da vegetação local, sendo o Cinamomo o mais representativo. As árvores nativas encontradas no local foram o Tanheiro, a Embaúba, a Pintanga, Goiaba, Aroeira e a Grandiúva, esparças e com sub-bosque descaracterizado e dominado pela espécie exótica invasora Maria-sem-Vergonha. Assim, a derrubada de grande parte da vegetação para requalificação do local não traria grande impacto, e seria uma oportunidade de relocação de espécies nativas, trazendo, inclusive, benefícios a área. Drenagem Natural e Rede de Águas Pluviais - a rede de drenagem natural onde se insere a área de estudo é composta pela micro bacia hidrográfica Florianópolis, abrangendo a região do centro da cidade e bairros vizinhos, como a Agronômica. Esta é umas das menores da Ilha de Santa Catarina, sendo abastecida por pequenos corredores preminentes das encostas do maciço Morro da Cruz. A área apresenta problemas na sua drenagem natural, pois materiais excedentes da construção da avenida (aterro) represam as águas vindas dos locais mais altos, formando assim uma área alagadiça. Porém na implantação da subestação da CELESC o problema não foi resolvido. Entretanto, deve-se atentar para a linha d’água bem marcada no terreno, respeitando-a para que não se tenha problemas, e solucionando o escoamento corretamente. Patrimônio Cultural - Apesar de a Ponta do Coral fazer parte de momentos da história da cidade, a área em questão não possui reconhecimento. Não há registro de tombamento da casa onde hoje funciona o CAPS Ponta do Coral em nenhum órgão responsável pelo mesmo, de acordo com pesquisa realizada. Foi encontrado apenas um registro no livro Memória Urbana, de Eliane Veras da Veiga. Na obra se afirma que a casa era o antigo abrigo dos Maristas responsáveis pelos cuidados dos menores do Abrigo de Menores: Educandário 25 de novembro. O abrigo já sofreu diversas modificações, restando hoje apenas poucas ruínas já bastante descaracterizadas, que não representam relevante importância histórico cultural para a cidade. Análise de entorno