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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
 INSTITUTO DE ARTES E COMUNICAÇÃO SOCIAL
        CURSO DE ESTUDOS DE MÍDIA




     RODRIGO GALHANO TOURINHO REIS




“UM PANORAMA GERAL DA CONVERGÊNCIA
            MIDIÁTICA”




                Niterói, RJ
                   2009
RODRIGO GALHANO TOURINHO REIS




  “Um panorama geral da convergência midiática”




                         Dissertação apresentada ao departamento de
                         Estudos de Mídia da Universidade Federal
                         Fluminense, como requisito para obtenção
                         do título de Bacharel em Estudos de Mídia.




Orientador: Prof. Dr. José Maurício Saldanha Alvarez




                    Niterói, RJ
                       2009


                         II
UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE ARTES E COMUNICAÇÃO SOCIAL

DEPARTAMENTO DE ESTUDOS CULTURAIS E MÍDIA

CURSO DE ESTUDOS DE MÍDIA




                  Ata de Defesa de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC)




        Em ______ de _________________ de _________, reuniu-se, no Instituto de Artes e
Comunicação Social, a Banca Examinadora designada para avaliar o Trabalho de Conclusão do
                  Curso de Graduação em Estudos de Mídia do(a) aluno(a)
    ______________________________________________________________________,
                  matrícula UFF _______________________, sob o título
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
   ________________________________________________________. Após a argüição, a
Banca, em sessão secreta, decidiu-se pela ______________________ do Trabalho, com a nota
                   ___________________, emitindo o seguinte parecer:

_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
_____________________________________________________________________________
                        ____________________________.



              Niterói, __________ de ___________________ de __________.



                                  Banca Examinadora:

   1 – Professor Orientador: _________________________________________________

    2 – Professor Examinador: ________________________________________________

   3 – Professor Examinador: ________________________________________________
Agradecimentos

Gostaria de agradecer aos meus pais, Roselyne e Ricardo, que sempre me apoiaram,
desde o maternal até o último dia na faculdade, não importando quais tipos de
dificuldades apareciam nas nossas vidas.

A agradecer também meu irmão, minha avó Marina, que me ajudava a fazer meus
deveres de casa quando era pequeno e também minha avó Vera, que sempre me
incentivou a estudar.

Aos meus tios (todos eles, que são muitos) em especial ao meu tio Ronaldo, que me
buscava no colégio quando era pequeno, e também a minha tia Tamy, que me ajudou
muitas vezes quando o assunto era matemática. A minha namorada, Nathalia, a quem
amo muito e sempre ficava me cobrando de começar logo e podeis de terminar logo a
minha monografia.

Aos professores Afonso de Albuquerque, José Maurício e a Ariane Holzbach por
fazerem parte da minha banca, mas em especial a Ariane, por ter me dado a
oportunidade de participar de um projeto tão legal quando o Clipestesia e por ter me
dado várias dicas importantes ao longo de faculdade.

Aos meus avôs, in memorian, Roberto e Aldenísio, que infelizmente não puderam
testemunhar minha formatura na faculdade, um sonho de ambos, mas que de alguma
forma estão vendo isso.




                                           IV
Resumo
Este trabalho tem como objetivo elaborar um panorama geral sobre a convergência
midiática e seus desdobramentos, tais como o impacto nas empresas e no público, as
formas de apropriação das novas tecnologias. Os desafios e as possibilidades das
narrativas transmidiáticas também são abordadas. Como principal suporte teórico foi
usado o livro Cultura da Convergência, do professor de Estudos de Mídia Comparada
da MIT (Massachussets Institute of Technology), Henry Jenkins.


Palavras-chaves: Convergência Midiática, Narrativa Transmidiática, Convergência
Tecnológica




                                        V
Abstract
The main objective os this research it´s to offer a main view about media convergence
and it´s unfoldings, like the impact in the companies and in the public, the ways of
appropriation of new technologies. The challenges and the possibilities of the
transmedia narratives are also mentioned. As main theoretical it was used the book
“Convergence Culture”, of Compared Media Studies teacher from MIT (Massachussets
Institute of Technology), Henry Jenkins.


Keywords: Media Convergence, Narrative Transmedia, Technological Convergence




                                         VI
Sumário

Introdução.................................................................................... pg. 8

1.Convergência Midiática............................................................. pg. 10

2. Análises .................................................................................... pg. 15

      2.1. Revolução na Indústria da Música ................................. pg. 15

      2.2.1. Além da tela da TV ..................................................... pg. 19

      2.2.2 Pokémon, Convergência e a Cultura do Conhecimento.pg. 25

      2.3. Matrix antes, durante e depois do cinema ...................... pg. 26

 4. Conclusão ................................................................................ pg. 31

Obras Citadas

Obras Consultadas




                                                         VII
Introdução

       A idéia de ter como tema da minha monografia a Convergência Midiática veio
quase que por acaso. Até dezembro de 2008 eu estava pensando em desenvolver o tema
“Migração da TV para a internet”, que de certa forma já tocava um pouco no assunto de
convergência midiática, mas só abracei esse tema mesmo quando encontrei um livro
com um Iphone na capa, em destaque numa livraria. Eu achei que fosse algum livro
técnico, que falasse de Tecnologia da Informação ou coisa parecida, mas mesmo assim
resolvi dar uma folheada nele, e como valeu a pena!

       Para começar o autor era um homem chamado Henry Jenkins (o qual nunca
tinha ouvido falar), professor de Estudos de Mídia Comparada, da renomada MIT –
Massachussets Institute of Technology. Fiquei imaginando se esse curso era um irmão
estrangeiro do meu curso de Estudos de Mídia. Pronto, já estava completamente
interessado no conteúdo daquele livro. Comecei a ler a introdução e tive certeza de que
tinha que levá-lo para casa, e foi o que eu fiz. Depois que acabei de ler a introdução já
tinha certeza que teria que falar sobre convergência midiática no meu trabalho de
conclusão de curso porque fiquei muito interessado pelo assunto que o livro de Henry
Jenkins abordava.

       Jenkins usava exemplos bem próximos a mim, exemplos que pode-se até chamar
de exemplos “pop”. Programas como Survivor, Pokémon, American Idol, e filmes como
Matrix e Star Wars e os livros de Harry Potter caíram como uma luva para entender as
mudanças que estão ocorrendo graças à convergência midiática. No momento esse
fenômeno ainda está muito ligado a área do entretenimento, como se pode ver pelos


                                           8
exemplos citados, mas quem sabe o que o futuro no reserva? Por exemplo, nas últimas
eleições presidenciais norte-americanas, a equipe do então candidato Barack Obama1
criou perfis em sites de relacionamento como o Facebook2 e divulgou suas mensagens
através do site de vídeos Youtube3 e do Twitter4 – todas ferramentas gratuitas que estão
disponíveis na web e que são amplamente usadas por pessoas comuns. E do mesmo
jeito que os candidatos usaram essas ferramentas a seu favor o povo também as usou,
seja para expressar seu apoio ou descontentamento com eles, através de textos em blogs,
protestos em forma de fotos editadas com photoshop5 ou em forma de comunidades no
Facebook ou vídeos amadores hospedados em diversos sites na internet – e esses são só
alguns exemplos do que foi feito.

         É impressionante lembramos que há poucas eleições atrás as equipes de
comunicação de um candidato tinham que se preocupar quase que exclusivamente com
a propaganda política na televisão, e em menor escalar, no rádio. Não que a televisão
tenha perdido seu papel de destaque na comunicação entre candidato e eleitor, mas
agora há meios diferentes de se fazer essa comunicação e elas não são tão passivas
como na TV, onde praticamente apenas um lado tem voz.

        Neste meu trabalho tento oferecer ao leitor um panorama geral sobre a
Convergência Midiática, o que ela é e como ela já está presente em nossas vidas,
mesmo sem muitas vezes nos darmos conta, como ela está mudando e/ou abrindo novas
possibilidades em termos de produção midiática, tanto para as “pessoas comuns” quanto
para as grandes empresas de comunicação. Procuro fazer isso através de exemplos
extraídos do livro de Jenkins e de outros exemplos os quais comecei a pensar enquanto
lia seu livro, “A Cultura da Convergência”(2008). A parte em que eu abordo o seriado
Lost já tinha sido trabalhada na disciplina de Ficção Seriada. Com as reflexões feitas
durante a leitura do já citado livro eu revisei e ampliei o trabalho que eu tinha feito para
esta disciplina.




1
  Ele (Obama) usou o Twitter, o Youtube, publicidade em jogos e coisas que ninguém havia se arriscado
antes, e soube aproveitar esta oportunidade”. TEIXEIRA, Paulo Rodrigo. “Mudar? Sim você pode”.
2
  Site de relacionamentos similar ao Orkut: http://www.facebook.com/
3
  Site para hospedagem gratuita de vídeos: http://www.youtube.com/
4
  Site que permite a troca de mensagens até 140 caracteres: http://twitter.com/
5
  Software para edição de imagens

                                                  9
Capítulo I

                                       Convergência Midiática

Todos os dias somos testemunhas do fenômeno da convergência midiática. Nos ônibus,
com uma rápida olhada, podemos observar várias pessoas com fones de ouvido
conectados aos seus players de Mp3, Mp4, Mp5 e Ipods, ouvindo músicas, vendo fotos,
lendo e-books, trocando arquivos via Bluetooth6 durante a viagem de ida ao trabalho ou
escola e de volta para casa.

        Nas ruas vemos pessoas usando celulares com GPS7, além de os usarem como
câmera filmadora e fotográfica, videogame, televisão (esta última ainda um pouco
difícil de ser ver no Brasil), navegador de internet, envio e recebimento de mensagens
de texto, agenda e, vez ou outra, até como telefone móvel! E isso tudo sem falar do
Iphone, o mais recente queridinho da era digital, o símbolo máximo (ao menos até
agora) da Convergência Midiática.

        Mas o que é a “Convergência Midiática”? Temos basicamente duas formas de
entendermos a convergência midiática. Uma é pelo viés tecnológico, representada pelos
aparelhos eletrônicos que conseguem executar várias funções diferentes, além daquela
função básica para o qual foi feito. O celular é um exemplo perfeito disso.



6
  Bluetooth é uma especificação industrial para áreas de redes pessoais sem fio. O Bluetooth provê uma
maneira de conectar e trocar informações entre dispositivos como telefones celulares, notebooks,
computadores, impressoras, câmeras digitais e consoles de videogames digitais através de uma
freqüência de rádio de curto alcance.
7
  Sistema de Posicionamento Global, popularmente conhecido por GPS (do inglês Global Positioning
System), aparelho usado para localização no globo terrestre. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Gps

                                                  10
O celular é um aparelho ao qual estão convergindo várias mídias: O videogame,
a TV, o rádio, as músicas em formato digital, as mensagens de texto, além de sua
função básica, que é servir como telefone móvel. Se antes, para termos acesso a todas
essas mídias, precisávamos de um aparelho de rádio, de uma TV, de um computador, de
um pager, de um videogame, de um cd player, hoje temos todas essas mídias
convergindo para um único aparelho.

       A segunda forma de pensarmos a convergência midiática é a apresentada por
Henry Jenkins (2008) 8 . Ele compreende que convergência midiática vai além de
aparelhos eletrônicos com múltiplas funções. Jenkins refere-se à convergência como:

                “o fluxo de conteúdos através de múltiplos suportes midiáticos, à cooperação
               entre múltiplos mercados midiáticos e ao comportamento migratório dos
               públicos dos meios de comunicação, que vão a quase qualquer parte em busca
               das experiências de entretenimento que desejam”. (JENKINS, 2008, p. 27.)

       Percebe-se que a idéia de convergência midiática de Jenkins aborda não só o
viés tecnológico, mas também as novas relações de produção midiática, tanto entre as
diferentes indústrias de mídia, que tem que interagir cada vez mais entre elas mesmas,
por causa dos seus produtos em comum, quanto à relação entre a indústria e os
consumidores, que graças às novas tecnologias disponíveis, em especial a internet, estão
cada vez mais influenciando no desenvolvimento dos produtos midiáticos que eles
mesmos consomem.

       A interação entre os mercados midiáticos não é exatamente novidade. Na década
de 90 não eram raros os filmes que ganhavam seus jogos de videogames (e até mesmo o
contrário, videogames de sucesso que ganhavam versões cinematográficas), histórias
em quadrinhos que viraram filmes e videogames, Games que viravam quadrinhos, e por
aí vai. Porém o diálogo entre os diferentes nichos da indústria ainda não era muito forte.

       Por exemplo, os filmes baseados nos videogames de enorme sucesso, Super
Mario Bros e Street Fighter9 foram verdadeiros fracassos de crítica e público, mesmo
contando com uma grande legião de fãs dos games prontos para gastarem seu dinheiro
indo aos cinemas para assistir as versões cinematográficas dos personagens que tanto


8
 JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. São Paulo: Aleph, 2008. p. 27.
9
 Fonte:
http://www.interney.net/blogs/melhoresdomundo/2009/02/27/ign_assitiu_street_fighter_the_legend_
of/#more30697 (acessado em 06 – 05 – 09).

                                              11
gostavam. O motivo básico para o fracasso de tais filmes foi o fato deles não terem
respeitado o universo narrativo dos videogames nos quais foram inspirados.

       Em Street Fighter, os personagens principais do videogame eram dois amigos, o
japonês Ryu (o protagonista) e Ken, seu amigo americano. Por vícios do cinema
Hollywoodiano, o personagem Guile, um militar americano, foi alçado ao posto de
personagem principal do filme, o que por si só já é uma grande decepção para os fãs do
videogame. Somando-se isso ao roteiro sofrível e as péssimas atuações do atores, temos
um filme que tinha um enorme potencial de bilheteria e de se tornar um filme
inesquecível para os fãs, se tornar um fracasso comercial e sinônimo de como não se
fazer uma adaptação cinematográfica.

       O caso de Super Mario Bros foi tão ruim ou até pior do que o de Street Fighter.
Além do game ser um grande sucesso a franquia já tinha se desdobrado em desenhos
animados para a TV e histórias em quadrinhos. Os fãs já tinham grande conhecimento
do produto principal (os videogames) e dos derivados (quadrinhos e desenhos
animados). Até mesmo quem nunca tinha jogado o game, mas assistia os episódios na
TV ou lia as histórias em quadrinhos, tinha um conhecimento razoável no universo de
Super Mario Bros. Na adaptação pro cinema manteve-se apenas os nomes dos
personagens principais e algum resquício da história que os fãs conheciam.

       A caracterização dos personagens foi alterada, os cenários repletos de cores
vivas e cheio de natureza foi trocado por um cenário futurístico com um ambiente feio e
degradado, que não lembrava em nada aquele universo que os fãs conheciam.
Resultado: Outro fracasso comercial, que ficou na mente dos fãs como uma péssima
recordação.




                                          12
(Figura 1: Comparação entre as versões do personagem Koopa, o vilão dos games Super
Mario Bros. O da esquerda é a versão cinematográfica, e o da direita a versão do videogame. A
descaracterização é gritante10.)

        Tivessem os produtores desses videogames conversado ou mesmo trabalhado
em conjuntos com os roteiristas e produtores dos filmes, respeitando as características
principais dos produtos midiáticos em que foram inspirados, eles provavelmente teriam
produzido filmes que agradariam muito mais aos fãs, e consequentemente teriam obtido
muito mais bilheteria. Hoje em dia há mais integração entre as equipes de produção que
trabalham com um mesmo conteúdo em diferentes meios. A franquia Harry Potter é um
exemplo disso. Com o sucesso dos livros a história foi logo adaptada para o cinema, e
depois para os videogames, obtendo êxito em ambas as mídias.

        Tanto os filmes quantos os jogos de videogame respeitaram o universo ficcional
construído nos livros escritos por J.K Rowling, a autora de Harry Potter, e isso
concerteza contribuiu para o sucesso multimidiático da franquia, diferentemente do que
ocorreu em Street Fighter e Super Mario Bros, onde os universos ficcionais de ambos
foram muito modificados.

        Felizmente com o passar do tempo os consumidores/fãs de videogames, música,
cinema, televisão e quaisquer outros produtos culturais e midiáticos ganharam uma
arma poderosa: A internet. Não que ela não existisse já na década de 90, mas seu uso
ainda era muito restrito e estava apenas engatinhando. Com a internet as pessoas
ganharam voz através de sites, blogs, redes de relacionamento (tipo Orkut, Facebook,
entre outros) e fóruns virtuais.

        Os fãs agora podem se reunir em espaços virtuais para discutir sobre seus
objetos de interesse. Por exemplo, nas comunidades no Orkut sobre o seriado Lost a
prática mais recorrente e divertida para os fãs é cada um postar sua teoria sobre o que
viu no último episódio exibido na televisão, juntando as informações com o de
episódios passados11. Os fãs procuram referências na internet para dividir com os outros
fãs, formando a consciência coletiva (DERY Apud SÁ, p.48) 12 sobre Lost dos

10
   Imagens disponíveis em http://www.areavoices.com/hodgepodge/index.cfm?archive=2008-04 e
http://www.gametrailers.com/users/timidshadow/gamepad/?action=viewblog&id=142528 em 26 – 06
– 2009.
11
   http://www.orkut.com.br/Main#CommTopics.aspx?cmm=467672&q=teoria (acessado em
março/2009).
12
   SÁ, Simone Pereira de. O samba em rede: Comunidades virtuais, dinâmicas identitárias e carnaval
carioca. E – Papers Serviços Editoriais, Rio de Janeiro, 2005.

                                                13
freqüentadores    daquela    determinada    comunidade.      Falarei   sobre   Lost    mais
detalhadamente adiante.

       O mesmo acontece com outros produtos, como reality shows, filmes, desenhos
animados, livros e música. Existem comunidades tanto para a adoração quanto para
odiar certos produtos midiáticos. Nelas as pessoas podem fazer mais do que discutir,
elas podem dividir os conteúdos midiáticos oficiais através de downloads e produzir
novos produtos derivados a partir dos originais, como spoofs (uma espécie de paródia)
de videoclipes de músicos e bandas famosas, filmar curtas-metragem que continuam,
complementam ou reinventam histórias de filmes, escrever fan-fiction (“ficção de fã”,
uma história escrita por um fã ou fãs de alguma obra, que usam seu universo narrativo
original mas criam histórias próprias a partir dele) inspirados em livros, filmes, seriados,
histórias em quadrinhos, etc.

       Todo esse movimento dos fãs, que não se contentam em apenas contemplar uma
obra, mas querem obter algo a mais com ela, é considerado por Jenkins como parte
importante da Convergência midiática. São as pessoas se apropriando das tecnologias
para interagir, modificar e reconstruir o conteúdo midiático produzido e distribuído
pelas grandes empresas de comunicação e entretenimento.

       As empresas já perceberam isso, embora ainda estejam aprendendo a lidar com
essa nova realidade. Há alguns bons exemplos de como as empresas estão
reconfigurando seus negócios diante das mudanças tecnológicas e de consumidores
mais ativos (assim como há também maus exemplos de empresas processando pessoas
que distribuem música na internet, sem fins lucrativos, ou mesmo fãs que escrevem ou
filmam fan-fictions). A seguir mostrarei exemplos de mudanças em três campos
diferentes: Na música, na televisão e no cinema.




                                            14
Capítulo 2

                                              Análises

       2.1 Revolução na indústria da música

       Desde o final da década de 90, mas precisamente no ano de 1999, a indústria da
música vem decaindo graças ao compartilhamento de músicas através da internet. Note
que a indústria tradicional da música vem decaindo, com vendas cada vez mais baixas
de CD´s, porém não o consumo de música em si. Provavelmente nós nunca ouvimos
música com tanta variedade a acessibilidade como hoje em dia. Toda essa mudança, e
porque não chamar isso de “revolução”, começou com o primeiro programa de
compartilhamento de arquivos MP313 a se tornar mundialmente popular, o Napster.

       O Napster permitia que pessoas que estivessem conectadas a internet e que
usassem o programa pudessem compartilhar suas músicas de forma gratuita. O sucesso
foi estrondoso e teve seu auge em janeiro de 2001, quando o programa conseguiu
conectar mais de oito milhões de usuários que trocavam aproximadamente vinte
milhões de músicas14.

       O sucesso do Napster não passou despercebido pelas gravadoras que, ainda em
2001, representados pela RIAA (Recording Industry Association of America) moveram
e ganharam vários processos por quebra de direitos autorais (inclusive com o apoio de
bandas famosas, como o Metallica, o que irritou muitos fãs da banda ao redor do

13
   MP3 é um formato que permite armazenar músicas e arquivos de áudio no computador em um
espaço relativamente pequeno, mantendo a qualidade do som. Os arquivos MP3 também podem ser
armazenados e reproduzidos em players de música (ex. Ipod), celulares e em cd´s e dvd´s.
14
   Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Napster (acessado em 27 - 04 – 2009).

                                             15
mundo 15 ). O Napster foi obrigado a “fechar as portas” e o serviço foi desativado.
Algum tempo depois ele foi comprado por uma empresa que fabrica softwares para
gravação de CD´s e DVD´s e passou a vender músicas em formato MP3, sendo um dos
primeiros serviços de venda de músicas em formato “não-físico”. Mesmo com a vitória
das gravadoras contra o Napster o estrago já estava feito e os fãs de música descobriram
um novo jeito de consumir e de se relacionar com ela.

        Desde o ano 2000 as vendas de CD´s de música vem diminuindo e os arquivos
de MP3 ganhando cada vez mais força. O fechamento do Napster inspirou e motivou
ainda mais as pessoas a buscarem meios de se trocar gratuitamente música pela internet.
Novos serviços como Soulseek16, Kazaa17, Emule18, Limewire19, Bitcomet20, além de
blogs e sites especializados em músicas nasceram. Claro que do ano 2000 até hoje
alguns novos serviços surgiram e outros desapareceram, mas de uma forma geral esses
são os mais representativos.

         As gravadoras cedo ou tarde, acabam descobrindo esses serviços e entram na
justiça para fechá-los. Os processos, apesar de sempre favoráveis as gravadoras, levam
muito tempo até serem concluídos, e quando elas conseguem fechar um serviço outros
nascem para ficar em seu lugar. O caso mais recente foi o da prisão dos suecos
responsáveis pelo site Pirate Bay21, o serviço mais popular a nível mundial a oferecer
troca de arquivos entre os usuários, não só de músicas, mais de filmes, videogames,
histórias em quadrinhos, livros, programas de computador, entre outros.

         Apesar dos donos do serviço terem sido julgados, presos e condenados pela
justiça sueca a pagar uma multa de 4,5 milhões de dólares eles já informaram que não
irão pagá-la porque simplesmente eles não tem dinheiro pra isso. O Pirate Bay não
hospeda nenhum arquivo, ele apenas indica links para os arquivos que estão hospedados




15
   Fonte: http://www.rollingstone.com.br/secoes/novas/noticias/2274/ (acessado em 27 – 04 – 2009)
16
   www.slsknet.org/
17
   http://www.kazaa.com/
18
   http://www.emule-project.net/home/perl/general.cgi?l=30
19
   www.limewire.com/
20
   http://www.bitcomet.com/
21
   http://thepiratebay.org/browse (acessado em 27 – 04 – 2009)


                                                16
nos computadores dos usuários do serviço. Os donos já informaram aos usuários que,
mesmo presos, o site continua funcionando normalmente22.

        No Brasil o caso mais recente e de maior comoção foi o fechamento da
comunidade “Discografias”23, criada por usuários do Orkut24. A APCM25 (Associação
Antipirataria de Cinema e Música) ganhou na justiça o direito de fechar a comunidade,
que era usada por mais de um milhão de pessoas para trocas de música. Assim como o
Pirate Bay a Discografias não hospeda nenhum arquivo, apenas aponta e organiza os
links que são hospedados pelos usuários em outros sites na internet.

        Essas ações em nada ajudaram a melhorar as vendas de CD´s. Pelo contrário, os
fãs que utilizam esses meios eletrônicos logo criam novos espaços. No caso da
comunidade Discografias foi muito fácil verificar tal fato: Fazendo uma rápida pesquisa
no Orkut encontrei três comunidades com o mesmo perfil e estrutura da “finada”
comunidade, sendo que uma delas utilizava o irônico título de “Discografias – O
Retorno” 26 , e aparecia, em sua descrição, que os usuários daquela comunidade
compartilhavam músicas sem nenhum fim lucrativo.

                              27
        William Winston            argumentava que, com a convergência tecnológica,
alcançaríamos “maior liberdade humana”, “mais poder ao povo” (1995). De fato isso
aconteceu. Depois do Napster ficou muito mais fácil conseguirmos ouvir músicas que
não tenham passado pelo funil das gravadoras, que investem pesado apenas nos grandes
hits, nas músicas de sucesso, que são tocadas a exaustão nas rádios e na TV, dando a
impressão ao público leigo em música que praticamente não existem outras ofertas de
música além dos grandes sucessos veiculados pela televisão e rádio e que podem ser
facilmente encontrados a venda nas grandes lojas de departamentos. O Napster, e
posteriormente     outros    meios     de   troca    de   músicas     via   internet,    mudaram
significativamente esse cenário:

                “Eu sei, por exemplo, que o Napster despertou de novo meu interesse pela
                exploração de novas músicas, paixão que agora se tornou mais fácil (e legal)
                com a Rhapsody, que provavelmente dobrou meus gastos com música. E minha

22
   Fonte: http://www.vorty.com/fundadores-do-the-pirate-bay-presos (acessado em 27 - 04 – 2009).
23
   Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u535222.shtml (acessado em 27 - 04 –
2009).
24
   http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=6244330 (acessado em 27 – 04 – 2009).
25
   http://www.apcm.org.br/index.php (acessado em 27 -04 – 2009).
26
   http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=56139232 (acessado em 27 -04 -2009).
27
   Winston Apud Briggs & Burke, p. 302.

                                                17
família decerto vê mais DVD´s, graças ao Netflix28.” ANDERSON, 2006, p.
                 173-174)29.
        Segundo Anderson, há um “exército” nas ruas de Nova Iorque com fones
brancos nas orelhas (numa alusão ao player Ipod, um aparelho portátil que serve para
ouvir músicas em formato digital), que sem dúvida está ouvindo mais música do que as
gerações passadas, mas isso não quer dizer que eles estejam comprando mais música:

                “As vendas de CD´s caíram quase 20% desde o lançamento do Ipod. Assim
                sendo, como os consumidores estão ocupando seus espaçosos discos rígidos
                portáteis e seus chips de memória Flash? Copiando CD´s de amigos, baixando-
                os de serviços gratuitos ponto - a - ponto (cujo tráfego continua aumentando,
                apesar das ocasionais campanhas legais restritivas) e trocando-os através de
                LAN´s, entre as paredes dos dormitórios das universidades”. (idem).

        Diante deste quadro, o que podem fazer as gravadoras? Público consumidor de
música não falta, pelo contrário, nunca foi tão grande, mas o público disposto a pagar
pela música provavelmente nunca esteve tão baixo. Pelo andar da carruagem, o caminho
a ser seguido pelas gravadoras é investir em iniciativas como o iTunes Store e
Rhapsody, que vendem músicas via internet em formato Mp3, onde a pessoa não precisa
comprar um álbum inteiro de determinado artista, mas apenas aquelas músicas que ela
escolher.

        No caso do Rhapsody o serviço vai além da venda de Mp3, oferecendo um
serviço que se assemelha a uma “rádio por demanda”, onde o usuário escolhe seu plano
mensal e tem direito a ouvir todo o acervo da Rhapsody, algo em torno de seis milhões
de músicas, criar playlists 30 e ouvir playlists oferecidas pelo programa ou feitas por
outros usuários. A principal diferença é que o usuário não paga por faixa baixada, mas
paga um preço fixo pra ter acesso a todas às músicas disponíveis. É como se uma pessoa
pudesse montar sua própria estação de rádio particular e dividi-lá com outras pessoas.




28
   Netflix é um serviço online que se assemelha a uma videolocadora. Através do site do serviço você
escolhe filmes ou programas da TV que quer “alugar”. Depois de escolhido o serviço manda o arquivo
diretamente para o email do cliente, para ser assistido no computador, ou então diretamente para uma
TV, através da tecnologia stream. Após expirar a locação, a transmissão via stream acaba ou o arquivo
que está no PC não pode mais ser acessado. Atualmente a Netflix conta com mais de 100.000 títulos no
catálogo. Fonte: http://www.netflix.com/Default
29
   ANDERSON, Chris. A Cauda Longa – Do Mercado de Massa para o Mercado de Nicho. São Paulo:
Campus, 2006. p. 173-174.
30
   Playlist, numa tradução livre, seria uma “lista de músicas”.

                                                 18
Não foi a toa que a revista Fortune disse, em 2007, que a Rhapsody, e não a ITunes,
seria o futuro da música31.

        Este caminho aposta no “comportamento migratório dos públicos dos meios de
comunicação, que vão a quase qualquer parte em busca das experiências de
entretenimento que desejam” (JENKINS, 2008). Em outras palavras o futuro da
indústria da música depende da convergência midiática, no sentido do público migrar
para conseguir o que quer. Nesse caso seria a migração do público das lojas de música,
das emissoras de rádio, do formato físico do cd, para a virtualidade da internet, onde ele
tem um papel ativo na escolha do que vai consumir e um leque de escolhas
infinitamente superior a qualquer loja física que possa existir.

        Esse comportamento mais ativo na hora de consumir música começou a ser
encorajado pelo Napster e agora a indústria da música não tem mais como fazer o
público voltar atrás. Se o consumo de música das pessoas já não pode mais ser tão
induzido como era antes da febre de distribuição de música na internet, então há de se
ensinar o homem a pescar, ou seja, dar ao público as ferramentas de busca e o ensinar a
usar, para que possa tirar algum proveito, em termos econômicos, disso.

        Novos modelos de contrato entre artistas e músicos também estão surgindo. Em
vez da gravadora lucrar com a vendas dos CD´s elas passam a ganhar uma porcentagem
dos shows das bandas e músicos. Isso as obriga a fazerem um bom trabalho de
divulgação para seus contratados e a estarem sempre atrás de shows para eles. No Brasil
a banda Detonautas foi uma das primeiras a ter um contrato nesses moldes.32

        2.2.1 Além da tela da TV

        Em matéria de convergência midiática poucos produtos se comparam ao seriado
televisivo Lost. Embora existam seriados e programas de TV que possuam produtos
derivados e comunidades de fãs na internet, poucos souberam aproveitar as
possibilidades transmidiáticas do mesmo jeito que a produção deste seriado norte-
americano.




31
  Traduzido da página http://learn.rhapsody.com/awards (acessada em 06 - 05 – 2009).
32
  Fonte: http://musica.terra.com.br/interna/0,,OI2738909-EI1267,00.html (acessado em 01 – 05 –
2009).

                                                19
Lost foi considerado o segundo programa de TV mais popular do mundo em
200633, e certamente continua sendo um dos mais populares até hoje, em parte pela sua
trama e em parte graças às estratégias de marketing, sendo algumas pioneiras, como a
Lost Experience (a qual abordarei mais adiante), e o incentivo por parte da produção do
programa para que os fãs da série, em todo o mundo, interajam entre eles, ou seja, que
interajam entre iguais, principalmente via internet.

     O seriado foi lançado em 2004 pela rede de TV norte-americana ABC. Ele nos conta
a estória dos sobreviventes de um acidente aéreo, de um voo que saiu da Austrália rumo
aos Estados Unidos, e que por motivos desconhecidos cai numa ilha em que ninguém os
consegue encontrar. Diferentemente das narrativas mais convencionais sobre desastres
de aviões, o espectador não é levado a conhecer os personagens a partir de um momento
anterior ao vôo até o momento do acidente. Ele é apresentado a um cenário caótico onde
os sobreviventes, completamente confusos e desesperados, tentam entender o que
aconteceu em meio aos feridos e aos destroços do avião.

     Alguns dos atrativos que fazem o sucesso de Lost é a grande quantidade de segredos
contidos na trama. Em Lost o improvável acontece e na maioria das vezes sem
explicação imediata. Alguns segredos são revelados alguns episódios depois que
surgem, enquanto outros permanecem até hoje, após o final da quinta temporada, sem
resposta.

        E esses segredos contidos na série são exatamente o grande trunfo dos
produtores para explorarem outras mídias para além dos episódios regulares que passam
na TV. Sob o pretexto de possibilitar aos fãs investigarem os segredos da ilha e de seus
personagens e entidades, foram lançados mobisódios34 (chamados oficialmente de Lost:
Missing Pieces), que são episódios produzidos para serem distribuídos e vistos através
de determinados aparelhos de telefone celular, com duração variando de dois a três
minutos 35 . Os mobisódios eram primeiramente distribuídos para celulares da marca
Verizon e seis dias depois estavam disponíveis no site da rede ABC 36, para que todos os


33
  Segundo uma pesquisa da Informa Telecoms, realizada em 2006, Lost é o segundo programa televisivo
mais popular do mundo, perdendo apenas para o seriado CSI Miami.                            Fonte:
http://news.bbc.co.uk/1/hi/entertainment/5231334.stm (acessado em 18 - 05 – 2009).
34
   Numa tradução livre do termo original, em inglês, “mobisodes”.
35
   Fonte: http://pt.lostpedia.com/wiki/Mobis%C3%B3dios (acessado em 20 – 05 – 2009).
36
   http://abc.go.com/primetime/lost/missingpieces/index?pn=index (acessado em 20 – 05 – 2009).

                                                20
fãs pudessem assistí-los. Em questão de pouco tempo os mobisódios postados no site da
ABC logo se espalhavam pelo Youtube e outros blogs e sites.

       Feito pelo mesmo elenco e produção que faz a série, os mobisódios mostram
novas situações que são incorporados dentro da cronologia de Lost, e como tais, são
considerados como uma extensão oficial da série. Os mobisódios eram lançados
semanalmente, levando até a abertura da 4ª temporada.

      Os mobisódios complementam os episódios regulares que passam na TV. Eles
preenchem pequenas lacunas de um episódio passado ou então adicionam uma
informação extra que pode vir a ser relevante no futuro da série. Os Mobisódios, além
de mostrar situações que os episódios da TV não mostram, dão destaque a outros
sobreviventes da ilha, que não tem destaque algum nos episódios regulares na TV.

       Muito embora Lost seja um sucesso de público os mobisódios não tem a mesma
audiência que os episódios da série. Primeiro porque os downloads pelo celular estão
disponíveis para poucas pessoas, somente para aquelas que possuem um aparelho de
uma determinada marca e mesmo assim, somente as que estão em determinados países,
e isso faz com que não haja um marketing oficial para divulgação dos mobisódios em
lugares onde o download via celular não está disponível, ficando o conhecimento da
existência destes quase que restrita aos fãs mais hardcore de Lost, aqueles fãs que
procuram informações em comunidades virtuais na internet e em blogs e sites de outros
fãs, bem próximo do perfil das pessoas que estão interagindo com as novas produções
midiáticas, que Jenkins fala na abertura do seu livro.

      E no fim das contas os mobisódios servem justamente pra isso, para dar uma
experiência extra para os fãs mais afoitos de Lost, ou até mesmo para criar um “sistema
de classes” entre os fãs do seriado. Há aqueles que apenas assistem os episódios na TV,
há aqueles que assistem os episódios e os mobisódios, e há aqueles que assistem ambos
e que ainda vão à internet procurar informações escondidas nos episódios e discuti-las
com outros fãs, através de fóruns e sites. Os fãs que assistem aos mobisódios se sentem
mais investigadores que aqueles que não assistem, conhecendo personagens secundários
que talvez nunca venham a ter nenhum destaque nos episódios regulares e conhecendo
situações que os outros espectadores da série ignoram. Talvez, devido a essas “classes”




                                            21
de fãs de Lost, tenha surgido a Lostpedia37, uma espécie de “Wikipédia” exclusivamente
sobre Lost, que serve para reunir e catalogar toda e qualquer informação sobre o seriado,
para que os fãs possam procurá-las em um único lugar, de forma organizada.

       Além de incentivar os fãs a investigarem os segredos da trama, os mobisódios foram
uma estratégia de marketing para manter as pessoas se lembrando de Lost, durante o
intervalo entre o fim da terceira temporada e o início da quarta, gerando expectativa
entre os fãs e mantendo alta o interesse do público em geral pelo seriado, numa época
em que o interesse dos telespectadores tender a cair, que é quando a produção do
programa acaba de filmar uma temporada e entra de férias, até retomar as gravações e
começarem a exibir uma nova temporada.

       Para suprir os fãs há ainda outros produtos para além dos episódios televisivos:
Podcasts, comunidades virtuais, sites e livros. Um podcast é parecido com um
programa de rádio, só que pode ser feito com poucos recursos técnicos e sua principal
finalidade é a de ser distribuído gratuitamente via internet através de downloads. Há o
podcast oficial de Lost, feito pelos produtores executivos Damon Lindelof e Carlton
Cuse, que conta com comentários dos episódios feitos pelos mesmos, além de
entrevistas com os atores. Há também os podcasts feitos por fãs que querem discutir
sobre a série e querem apresentar suas teorias sobre a estória de Lost, como o do site
brasileiro Lost in Lost38, que inclusive faz parte do portal de internet da Rede Globo,
que é a emissora que exibe o seriado, pela tv aberta, no Brasil. Esse fato ajuda a
demonstrar a importância que as grandes empresas de comunicação estão dando a esse
tipo de conteúdo transmidiático, um conteúdo extra e/ou complementar ao conteúdo
principal, que nesse caso, são os episódios seriados na televisão.

       As comunidades virtuais são uma experiência a parte em Lost. Mesmo que muitos
dos espectadores do programa efetivamente não participem de nenhuma comunidade
sobre o seriado há um número considerável de fãs que participam delas e discutem
seriamente sobre Lost. Nessas comunidades os fãs partilham suas teorias sobre a ilha e
seus mistérios, discutem sobre os personagens e os rumos da série, procuram pistas
escondidas nos episódios (como o símbolo da empresa fictícia chamada “Dharma
Iniative” na barbatana de um tubarão, numa imagem que dura apenas um segundo mas


37
     http://pt.lostpedia.wikia.com/wiki/Pagina_Principal (acessado em 21 - 05 – 2009).
38
     http://colunas.tv.globo.com/lostinlost/?s=podcast (acessado em 21 – 05 – 2009).

                                                     22
foi notada graças a fãs fervorosos que gravaram ou baixaram o episódio e puderam usar
o recurso de pausa para “estudar” a cena) que possam revelar algum segredo da trama.

     Há também muitos livros sobre Lost. Procurando no site submarino.com.br 39
encontrei doze livros sobre a série. Os livros variam desde guias de episódios, pesquisas
acadêmicas até narrativas paralelas de sobreviventes que não aparecem no seriado. O
que tem a proposta mais interessante é o livro Bad Twin40, escrito por um autor fictício
chamado Gary Troup, (anagrama para purgatório, em inglês purgatory, em uma
referência a ilha) que no universo de Lost é um famoso escritor, que desapareceu no vôo
815, tendo sido Bad Twin seu último trabalho. O manuscrito de seu livro foi encontrado
em um dos episódios da segunda temporada. Contudo, o livro se mostrou uma decepção
para quem buscava segredos sobre o seriado, sendo considerado por fãs e críticos como
uma tentativa de marketing mal-sucedida (AZEREDO, 2007).

     Mas independente de ser uma tentativa de marketing fracassada ou uma narrativa
transmidiática, o interessante é notar como há um público que está disposto a gastar
tempo, dinheiro e dedicação para continuar imerso no universo ficcional do seriado,
mesmo que seja em um meio totalmente diferente do produto primário, o
televisivo.Como Afirma Danny Bilson, vice-presidente de propriedade intelectual da
Eletronic Arts41:

               “(...) as pessoas vão querer se aprofundar naquilo de que gostam, em vez de
               experimentar amostras de várias coisas. Se existe algo que eu adoro, quero que
               seja maior do que apenas duas horas no cinema, ou a experiência de uma hora
               semanal na TV. Quero um aprofundamento do universo.” (Jenkins Apud Bilson,
               2008, pg. 147).

        E é misturando marketing com material extra da série que seus produtores
lançaram um ARG42 – um jogo de realidade alternativa – chamado Lost Experience.
Esse jogo foi um complemento da série disponível apenas na internet. Nele o jogador
deve ajudar a personagem Rachel Blake, que após a morte de sua mãe decide investigar
como esta conseguiu pagar sozinha seus estudos em colégios caríssimos, mesmo tendo
poucos recursos financeiros. A partir daí o jogador, em parceria com a fictícia


39

http://www.submarino.com.br/books_searchresults.asp?Query=ProductPage&ProdTypeId=1&WhichFo
rm=frmSearch&Search=lost&SearchBy=Palavra-chave (pesquisa feita em 24 – 05 – 2009).
40
  Fonte: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=369ASP011
41
   Empresa fabricante de videogames.
42
   Sigla em inglês para Alternative Reality Game.

                                            23
personagem, que é interpretada por uma atriz, descobre coisas estarrecedoras sobre a
Fundação Hanso, fundação esta que é citada em episódios de Lost e faz parte dos
mistérios encontrados no seriado. A grande sacada de Lost Experience foi misturar
realidade e ficção. A medida que Rachel Blake progredia em suas investigações ela
postava textos e vídeos na internet, a fim de “desmascarar” a Hanso 43 no melhor estilo
“teoria da conspiração”. A interação entre jogador/personagem se da toda via internet,
tal como se fossem duas pessoas reais que se ajudam através do ambiente virtual.

     Os fãs de Lost foram convidados por Rachel a verem os vídeos feitos por ela e a
encontrarem barras do chocolate Apollo, que conteriam fotos que deveriam ser
mandadas para ela. Quando todas as barras tivessem sido encontradas ela poderia
revelar um segredo sobre a Fundação Hanso. Os chocolates, assim como outras pistas
de Lost Experience, que os fãs deveriam encontrar para ajudar Rachel Blake variavam
por continente, então, os participantes tinham que coordenar as informações via internet.
A Rede ABC disse que o jogo foi projetado para atingir os fãs e também as pessoas que
até o momento não conheciam ou assistiam Lost.44

     O ápice de Lost Experience se deu quando a personagem Rachel Blake apareceu em
meio à platéia da San Diego Comic-con 45 de San Diego, EUA, 2006. Enquanto os
roteiristas da série, Damon Lindelof e Carlton Cuse, conversavam com a platéia, Rachel
Blake (sendo interpretada pela atriz contratada) se levanta e critica os roteiristas por
permitirem que a Fundação Hanso "prove a eles como é uma grande organização
filantrópica ao comprar o caminho deles para o seriado com dólares em propagandas”.
Perto do final do discurso irado, ela instrui a todos os que querem saber da verdade a
acessarem o site www.hansoexposed.com. Esse ocorrido quebra a “quarta parede”46 do



43
   Os textos e vídeos foram publicadoss nos endereços www.rachelblake.com, www.hansoexposed.com
e http://stophanso.rachelblake.com/index2.html.
44
  Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Lost_Experience
45
   San Diego Comic Com é uma convenção de fãs de produtos da indústria de entretenimento, tais como
seriados de TV, cinema, desenhos animados, mas principalmente de histórias em quadrinhos, que
ocorre anualmente em San Diego, Estados Unidos. E nesse evento que várias empresas mostram suas
principais novidades ou promovem a interação entre produtores, roteiristas, atores e fãs.
46
   O ato de derrubar a quarta parede é usado no cinema, no teatro, na televisão e na arte escrita,
originado da teoria do teatro épico de Bertolt Brecht. Refere-se a uma personagem dirigindo a sua
atenção para a platéia, ou tomando conhecimento de que as personagens e ações não são reais. O
efeito causado é que a platéia lembra-se de que está a ver ficção, e isso pode eliminar a suspensão de
descrença. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Quarta_parede


                                                  24
seriado, misturando ficção com realidade, quando uma personagem de um fictício de
um jogo surge ao vivo diante dos fãs, fazendo a ficção interagir com a realidade .

        2.2.2 – Pokémon, Convergência e a Cultura do Conhecimento

        Apesar de tudo isso, talvez a narrativa transmidiática mais popular até agora não
seja a de Lost, com seus episódios de TV, Mobisódios, ARG´s, Videogames e Livros,
mas sim a de um desenho infantil chamado Pokémon. Como explicam os professores de
pedagogia David Buckingham e Julian Sefton-Green (JENKINS Apud BUCKINGHAM
& SEFTON-GREEN, p. 177), Pokémon não é algo que os fãs apenas assistem ou
consomem, mas sim algo que eles fazem e participam. Mas por que Pokémon é
diferente de qualquer outro desenho animado?

     No universo narrativo de Pokémon existem centenas de criaturas diferentes, com
múltiplas formas evolucionárias, cada uma tendo seu ponto fraco e seu ponto forte e
com jeitos específicos de serem tratadas. A missão do protagonista do desenho
animado, assim como a da pessoa que joga os videogames baseados na série, é pegar o
maior número possível de Pokémons e ganhar todas as batalhas. Aprender as
informações sobre as centenas de criaturas existentes no universo de Pokémon é uma
tarefa um tanto difícil para as crianças fazerem sozinhas;

                 “em vez disso, a criança reúne seu conhecimento sobre Pokémon a partir de
                 diversas mídias (TV, internet, revistas, videogames, cards47), e o resultado é que
                 cada criança sabe alguma coisa que seus amigos não sabem e, portanto, tem a
                 chance de compartilhar sua expertise com outros”. (JENKINS, 2008, p. 177)48

        Resumidamente o que acontece é que as crianças usam as informações que
viram no desenho animado e as usam no videogame e nos jogos de cards. Para fazer
parte da cultura de Pokémon “é preciso buscar ativamente novas informações e novos
produtos e, fundamentalmente, se envolver com outras pessoas ao fazê-lo” (JENKINS,
2008). Para Lévy49 (1998), desenhos como Pokémon ajudam a preparar as crianças para
uma cultura do conhecimento mais sofisticada do que as escolas ensinam. Enquanto elas
ainda se concentram em criar “aprendizes autônomos”, Pokémon faz parte de uma
cultura do conhecimento colaborativo, em que o saber segue uma linha horizontal,



47
   Cartões com ilustrações e informações dos personagens do desenho animado.
48
   O trecho entre parênteses foi adição minha.
49
  LÉVY, Pierre. A Inteligência Coletiva: por uma antropologia do Ciberespaço. São Paulo: Loyola, 1998.

                                                   25
dividindo conhecimento entre iguais, diferentes do sistema escolar, em que o ensino é
verticalizado, fluindo de pessoas que detêm uma determinada autoridade.

        Para Castells 50 , o público desenvolveu um interesse, ainda que limitado, em
hipertextos. Consumidores mais jovens, que já nasceram ou cresceram em meio à
abundância e facilidade de acesso informação que a internet proporciona,

                 “tornaram-se caçadores e coletores de informações, tendo prazer em rastrear os
                 antecedentes de personagens e pontos de enredos, fazendo conexões entre
                 diferentes textos dentro da mesma franquia (...) Numa cultura de caçadores, as
                 crianças brincam com arco e flecha. Na sociedade da informação, elas brincam
                 com informação” (JENKINS, 2008, pgs. 178-179).

         Tal afirmação não é válida somente para Pokémon ou para outras franquias
infantis, mas também para outros produtos midiáticos com públicos bem diferentes,
como Lost ou a franquia Matrix, que abordarei adiante.

        2.3 Matrix antes, durante e depois do cinema

        O ano de 1999 deixou marcas significativas na indústria cinematográfica
hollywoodiana. Neste ano foi lançada uma leva de filmes que tinham uma narrativa não-
linear, reflexo do novo público freqüentador de cinema, que cresceu acostumado a
mídias não-lineares, como a internet e principalmente videogames. Essa parcela do
público estava preparada para um novo tipo de narrativa cinematográfica. Clube da
Luta, Corra Lola Corra, A Bruxa de Blair, O Sexto Sentido e Matrix são alguns bons
exemplos de narrativas não-lineares.

        Matrix foi o projeto que levou, até agora, ao limite a narrativa não-linear. A
narrativa de Matrix foi pensada para diversos meios, foi pensada para ser uma narrativa
transmidiática. Os diretores do filme, os irmãos Wachowski, quiseram aproveitar os
produtos derivados deste, mas não queriam apenas sinergia, como vemos em outras
franquias, como por exemplo, no filme MIB – Os Homens de Preto. Depois do sucesso
deste foi lançado um desenho animado que utilizava o mesmo universo narrativo do
filme. No entanto esse produto derivado não é imprescindível para se entender partes do
enredo do primeiro filme e o mesmo pode se afirmar em relação ao segundo filme da
franquia. Já em Matrix ocorre justamente o oposto. Os diretores apostaram em algo
mais que sinergia, apostaram em convergência midiática, contaram com a cooperação

50
  CASTELLS, Manuel. A Galáxia da internet: Reflexões sobre a Internet, os negócios e a sociedade. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.

                                                  26
entre múltiplos mercados midiáticos e com o comportamento migratório dos públicos
dos meios de comunicação.

          Em Matrix cada produto derivado faz parte efetivamente da narrativa do produto
principal, que é a trilogia de filmes. Uma obra em um meio serve como referência para
outra obra em outro meio. A trama se desenrola em videogames, histórias em
quadrinhos e animes51, isso sem mencionar as discussões em fóruns via internet, onde
os fãs da franquia discutiam sobre o significado de coisas que encontravam nos filmes,
mensagens subliminares plantadas pelos diretores, formando assim um trabalho de
construção de uma consciência coletiva ao redor do filme, algo parecido com o que
acontece com o seriado Lost. No entanto há uma diferença entre a convergência
midiática existente em Lost e em Matrix.




           (Figura 2: Capa da edição brasileira das histórias em quadrinhos de Matrix. Uma das
 histórias é roteirizada pelos próprios diretores do filme, Larry e Andy Wachowski, e as demais
                                  por artistas convidados por eles.)

           Enquanto em Lost há uma espécie de “convergência complementar”, que amplia
a experiência do fã da série televisiva, mas que não é de toda imprescindível para o
entendimento da trama, em Matrix há efetivamente uma narrativa transmidiática; Há
basicamente dois meios de se experimentar essa narrativa: Experimentar o todo ou
frações dela, no entanto ela só faz sentido se experimentada por inteiro. Em outras

51
     Nome dado as animações (ou desenhos animados) produzidos no Japão.

                                                 27
palavras, para entender completamente (ou ao menos tentar) a narrativa de Matrix você
tem de assistir os filmes, ler as histórias em quadrinhos, ver os animes e jogar o
videogame, e tudo isso tem uma determinada ordem cronológica. Os críticos de cinema
mais conservadores criticaram negativamente o filme, como fez Fiona Morrow, do
London Independent:

                   “Podem me chamar de ultrapassada – o que me importa é o filme, e apenas o
                   filme. Não quero ter de „expandir‟ a experiência cinemática me sobrecarregando
                   com artifícios turbinados”52.

           Essa crítica ilustra bem a dificuldade de se produzir narrativas transmidiáticas.
Quanto mais “camadas” são colocadas em uma narrativa mais densa ela fica e
consequentemente o esforço empregado para acompanhar essa narrativa é maior, e
menos pessoas se interessam em se dedicar a ela. O crítico de cinema Richard Corliss
perguntou aos seus leitores se o “Zé Pipoca” – se referindo aquelas pessoas que querem
ir ao cinema, comprar seu lanche e assistir despreocupadamente um filme, sem ter que
se preocupar em refletir a respeito da narrativa ou procurar material extra para entende -
lá melhor, em outras palavras, provavelmente se referia ao público médio do cinema –
“teria de carregar um guia de Matrix na cabeça?”. Henry Jenkins respondeu a essa
pergunta:

                   “A resposta é não, mas o “Zé Pipoca” pode unir seu conhecimento ao de outros
                   fãs e construir um guia coletivo na internet. Em uma série de sites de fãs e listas
                   de discussão, os fãs foram acumulando informações, pesquisando referências
                   (...) transcrevendo diálogos (...) A profundidade e o fôlego do universo de
                   Matrix tornaram impossível a qualquer consumidor „entendê-lo‟, mas o
                   surgimento de culturas do conhecimento tornou possível à comunidade como
                   um todo escavar mais profundamente esse texto insondável”. (JENKINS, 2008,
                   pg. 176).

           Jenkins afirma que é possível “entender” o universo de Matrix graças ao
surgimento do que ele chama de “culturas do conhecimento”. No entanto isso não muda
o fato de que ainda é bem restrita a parcela do público que está disposta a acompanhar
narrativas transmidiáticas, embora esse número tenda a crescer. Para as empresas
produtoras destes conteúdos seria muito interessante do ponto de vista financeiro que
cada vez mais pessoas se interessassem por esse tipo de narrativa, porque assim iriam
consumir um leque maior de produtos relacionados a uma mesma franquia, numa
indústria onde uma mesma empresa pode atuar em vários setores midiáticos.


52
     MORROW, Fiona. “Matrix: The trix of the Trade”, London Independent, 28 de março de 2003.

                                                   28
Cada meio tem seu público específico. Cinema e televisão muito provavelmente
possuem um público mais amplo, enquanto videogames (embora o mercado consumidor
de videogames cresça cada vez, inclusive começando a apostar em consumidores de
faixas etárias mais avançadas, que não são costumeiramente os que consomem esse tipo
de mídia, mas isso é um outro assunto), histórias em quadrinhos e animações (animes,
desenhos animados, animações em 3D, etc) tem um público mais específico. Mídias
diferentes atraem nichos de mercado diferentes e:

              “Uma boa franquia transmidiática trabalha para atrair múltiplas clientelas,
              alterando o tom do conteúdo de acordo com a mídia. Entretanto, se houver
              material suficiente para sustentar as diferentes clientelas (...) é possível contar
              com um mercado de interseção que irá expandir o potencial de toda a franquia”.
              (JENKINS, 2008, p. 135-136).

       O desafio das narrativas transmidiáticas atualmente pode ser resumindo em:

       - Fazer crescer o interesse do público em acompanhar narrativas que se
desenrolam em diversos meios;

       - Convencer o público de que não se trata de um tipo novo de marketing, mas
sim de uma nova experiência narrativa;

       - Adaptar o conteúdo de uma franquia de acordo com a especificidade de cada
meio e aproveitar o que cada um oferece de melhor;

       - Integração das equipes criativas dos diversos meios para que o conteúdo seja
coerente.

       Para ilustrar a minha última afirmação retorno a um exemplo anterior, o da
adptação de videogames para as telas de cinema. Na grande maioria dos casos as
versões cinematográficas de filmes inspirados em games são um fracasso, tanto do
ponto de vista financeiro como de crítica e de público. Super Mario Bros, Street Fighter
– O filme, Street Fighter – A Lenda de Chun-li, Final Fantasy – The Spirits Within,
Double Dragon, são bons exemplos. Esses filmes não utilizaram de forma competente
os elementos apresentados nos videogames que lhes deram origem, ficando
descaracterizados aos olhos dos fãs dos games. Claro que isso não é o único motivo do
fracasso, roteiros ruins e atuações sofríveis por parte dos atores também ajudaram.

       O caso da franquia Final Fantasy é o mais interessante. Ela é uma longa e mais
bem sucedida franquia de videogames de RPG e justamente por isso causou grande

                                             29
alvoroço entre os fãs quando foi anunciado que ganharia uma versão cinematográfica. O
filme Final Fantasy – Spirits Within53 foi lançado em 2001 e foi uma decepção para os
fãs. Independentemente de ter sido um bom filme ou não. O que foi decisivo para os fãs
não gostarem dele foi o fato de que o filme não apresentava nenhum elemento dos jogos
de videogame. Nada sequer chegava perto de lembrar ao público seus queridos jogos, ao
qual se dedicam tanto. Do jogo de videogame carregava apenas o nome.

           Já em 2004 foi lançado o longa-metragem em animação Final Fantasy: Advent
Children54, que apesar do nome não tem nenhuma ligação com o primeiro filme. Nele
os roteiristas procuraram seguir o enredo de umas das versões mais famosas do game, o
game Final Fantasy VII. Aproveitando algumas pontas soltas do enredo do game e
também aproveitando o conhecimento prévio que o público alvo tinha, fizeram do longa
uma continuação do game. Criou-se uma narrativa transmidiática. Se a pessoa não
conhece a história do game simplesmente não entenderá a história do filme, algo
semelhante ao que ocorre em Matrix. Dessa vez o filme fez muito sucesso entre os fãs
dos games, mas por outro lado restringiu muito o seu público, que como foi abordado
anteriormente, é um dos problemas das narrativas transmidiáticas.




53
     http://pt.wikipedia.org/wiki/Final_Fantasy:_The_Spirits_Within (acessado em 09 – 06 – 2009).
54
     http://pt.wikipedia.org/wiki/Final_Fantasy_VII:_Advent_Children (acessado em 09 – 06 – 2009).

                                                    30
Conclusão

       Procurei ao longo do meu trabalho demonstrar como a convergência midiática
está presente no dia-a-dia de muitas pessoas. Procurei também mostrar, balizado pelas
idéias de Jenkins, que a convergência pode ser mais do que um fenômeno tecnológico:
É também um fenômeno cultural, pois está relacionado ao fluxo de imagens, idéias,
histórias, sons e relacionamentos através de vários suportes midiáticos.

       A convergência midiática já mudou muita coisa e ainda vai mudar outras. Por
exemplo, a maneira como consumimos músicas foi radicalmente alterada. Um
computador com acesso a internet e com um programa específico para baixar músicas,
ou mesmo lojas virtuais que vendem músicas em formato digital já substituíram, para
muitas pessoas, o papel das lojas que vendem CD´s de música. As pessoas mudaram
seus hábitos e a indústria está tendo que mudar a sua, por mais que ela esteja relutando,
abrindo processos contra fãs de música e lutando para que tudo volte a ser como era
antes da “era Napster”. Os filtros impostos pelas grandes gravadores ainda existe, mas
foi enfraquecido pela liberdade oferecida pela internet, onde fãs indicam para outros fãs
aquelas músicas que gostam, competindo com o rádio e a TV pela função de influenciar
o gosto musical das pessoas.

       A narrativa transmidiática também acena com possibilidades interessantes.
Exemplos como os de Lost, Matrix e Pokémon mostram que as pessoas estão muito
dispostas a aumentar seu envolvimento com um determinado produto que é do seu
agrado, expandindo não só o consumo das franquias mas também as possibilidades de

                                           31
criar formas diferentes de narrativas, onde cada meio se vale de sua característica
específica para contribuir com o universo ficcional da trama, embora seja muito
complicado executar narrativas desse tipo, pois como vimos, quanto mais “camadas”
são colocadas em uma narrativa mais densa ela fica e consequentemente o esforço
empregado para acompanhar essa narrativa é maior, e menos pessoas se interessam em
se dedicar a ela. Há que se ter um delicado equilíbrio entre explorar novas experiências
narrativas mantendo o interesse do público e fazer com que isso gere lucro.

       As empresas em geral estão tendo que re-aprender a lidar com o público, não só
as da indústria da música. Segundo Jenkins, nos Estados Unidos, aproximadamente
57% dos jovens americanos, a maioria abaixo dos 18 anos de idade, tem seus próprios
blogs e fazem filmes digitais. Essas informações circulam na web e também boca-a-
boca. Os consumidores estão cada vez mais tendo voz ativa. Não me refiro apenas a fãs
discuntindo sobre seus objetos de adoração ou reclamando de serviços ou produtos, mas
também estão discutindo política e criando cultura. A grande mídia ainda é hegemônica,
mas a informação está cada vez mais sendo pulverizada, principalmente graças a
internet e suas diversas ferramentas, como blogs, sites de hospedagem de vídeos e sites
de relacionamento. A forma de consumir e de ser relacionar com a mídia está mudando
hoje e concerteza renderá alguns frutos amanhã.




                                           32
Obras Citadas


ANDERSON, Chris. A Cauda Longa: Do Mercado de Massa para o Mercado de Nicho.
Editora Campus, 2005.
JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. Editora Aleph, São Paulo, 2008.
MORROW, Fiona. “Matrix: The trix of the Trade”, London Independent, 28 de março
de 2003
TEIXEIRA, Paulo Rodrigo. “Mudar? Sim você pode”. TIDIGITAL, n° 02, ano 01, abril
de 2009.




                                       33
Obras Consultadas
AZEREDO, Patrícia Silva de. Que mulher você seria em uma ilha deserta? Aspectos da
representação do feminino no seriado de TV Lost. UFRJ, Rio de Janeiro, 2007.
ABREU, Estela dos Santos e TEIXEIRA, José Carlos Abreu. Apresentação de
trabalhos monográficos de conclusão de curso. Editora da Universidade Federal
Fluminense, Niterói, RJ, 2007.
BRIGGS, Asa e BURKE, Peter. Uma história social da Mídia: De Gutenberg à
Internet. Editora Jorge Zahar, Rio de Janeiro, 2004.
CASTELLS, Manuel. A Galáxia da internet: Reflexões sobre a Internet, os negócios e a
sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003.
LÉVY, Pierre. A Inteligência Coletiva: por uma antropologia do Ciberespaço. São
Paulo: Loyola, 1998.
SÁ, Simone Pereira de. O Samba em Rede: Comunidades Virtuais, dinâmicas
identitárias e carnaval carioca. E – Papers Serviços Editoriais, Rio de Janeiro, 2005.




                                            34

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“UM PANORAMA GERAL DA CONVERGÊNCIA MIDIÁTICA”

  • 1. UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE ARTES E COMUNICAÇÃO SOCIAL CURSO DE ESTUDOS DE MÍDIA RODRIGO GALHANO TOURINHO REIS “UM PANORAMA GERAL DA CONVERGÊNCIA MIDIÁTICA” Niterói, RJ 2009
  • 2. RODRIGO GALHANO TOURINHO REIS “Um panorama geral da convergência midiática” Dissertação apresentada ao departamento de Estudos de Mídia da Universidade Federal Fluminense, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Estudos de Mídia. Orientador: Prof. Dr. José Maurício Saldanha Alvarez Niterói, RJ 2009 II
  • 3. UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE ARTES E COMUNICAÇÃO SOCIAL DEPARTAMENTO DE ESTUDOS CULTURAIS E MÍDIA CURSO DE ESTUDOS DE MÍDIA Ata de Defesa de Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) Em ______ de _________________ de _________, reuniu-se, no Instituto de Artes e Comunicação Social, a Banca Examinadora designada para avaliar o Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Estudos de Mídia do(a) aluno(a) ______________________________________________________________________, matrícula UFF _______________________, sob o título _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ ________________________________________________________. Após a argüição, a Banca, em sessão secreta, decidiu-se pela ______________________ do Trabalho, com a nota ___________________, emitindo o seguinte parecer: _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ ____________________________. Niterói, __________ de ___________________ de __________. Banca Examinadora: 1 – Professor Orientador: _________________________________________________ 2 – Professor Examinador: ________________________________________________ 3 – Professor Examinador: ________________________________________________
  • 4. Agradecimentos Gostaria de agradecer aos meus pais, Roselyne e Ricardo, que sempre me apoiaram, desde o maternal até o último dia na faculdade, não importando quais tipos de dificuldades apareciam nas nossas vidas. A agradecer também meu irmão, minha avó Marina, que me ajudava a fazer meus deveres de casa quando era pequeno e também minha avó Vera, que sempre me incentivou a estudar. Aos meus tios (todos eles, que são muitos) em especial ao meu tio Ronaldo, que me buscava no colégio quando era pequeno, e também a minha tia Tamy, que me ajudou muitas vezes quando o assunto era matemática. A minha namorada, Nathalia, a quem amo muito e sempre ficava me cobrando de começar logo e podeis de terminar logo a minha monografia. Aos professores Afonso de Albuquerque, José Maurício e a Ariane Holzbach por fazerem parte da minha banca, mas em especial a Ariane, por ter me dado a oportunidade de participar de um projeto tão legal quando o Clipestesia e por ter me dado várias dicas importantes ao longo de faculdade. Aos meus avôs, in memorian, Roberto e Aldenísio, que infelizmente não puderam testemunhar minha formatura na faculdade, um sonho de ambos, mas que de alguma forma estão vendo isso. IV
  • 5. Resumo Este trabalho tem como objetivo elaborar um panorama geral sobre a convergência midiática e seus desdobramentos, tais como o impacto nas empresas e no público, as formas de apropriação das novas tecnologias. Os desafios e as possibilidades das narrativas transmidiáticas também são abordadas. Como principal suporte teórico foi usado o livro Cultura da Convergência, do professor de Estudos de Mídia Comparada da MIT (Massachussets Institute of Technology), Henry Jenkins. Palavras-chaves: Convergência Midiática, Narrativa Transmidiática, Convergência Tecnológica V
  • 6. Abstract The main objective os this research it´s to offer a main view about media convergence and it´s unfoldings, like the impact in the companies and in the public, the ways of appropriation of new technologies. The challenges and the possibilities of the transmedia narratives are also mentioned. As main theoretical it was used the book “Convergence Culture”, of Compared Media Studies teacher from MIT (Massachussets Institute of Technology), Henry Jenkins. Keywords: Media Convergence, Narrative Transmedia, Technological Convergence VI
  • 7. Sumário Introdução.................................................................................... pg. 8 1.Convergência Midiática............................................................. pg. 10 2. Análises .................................................................................... pg. 15 2.1. Revolução na Indústria da Música ................................. pg. 15 2.2.1. Além da tela da TV ..................................................... pg. 19 2.2.2 Pokémon, Convergência e a Cultura do Conhecimento.pg. 25 2.3. Matrix antes, durante e depois do cinema ...................... pg. 26 4. Conclusão ................................................................................ pg. 31 Obras Citadas Obras Consultadas VII
  • 8. Introdução A idéia de ter como tema da minha monografia a Convergência Midiática veio quase que por acaso. Até dezembro de 2008 eu estava pensando em desenvolver o tema “Migração da TV para a internet”, que de certa forma já tocava um pouco no assunto de convergência midiática, mas só abracei esse tema mesmo quando encontrei um livro com um Iphone na capa, em destaque numa livraria. Eu achei que fosse algum livro técnico, que falasse de Tecnologia da Informação ou coisa parecida, mas mesmo assim resolvi dar uma folheada nele, e como valeu a pena! Para começar o autor era um homem chamado Henry Jenkins (o qual nunca tinha ouvido falar), professor de Estudos de Mídia Comparada, da renomada MIT – Massachussets Institute of Technology. Fiquei imaginando se esse curso era um irmão estrangeiro do meu curso de Estudos de Mídia. Pronto, já estava completamente interessado no conteúdo daquele livro. Comecei a ler a introdução e tive certeza de que tinha que levá-lo para casa, e foi o que eu fiz. Depois que acabei de ler a introdução já tinha certeza que teria que falar sobre convergência midiática no meu trabalho de conclusão de curso porque fiquei muito interessado pelo assunto que o livro de Henry Jenkins abordava. Jenkins usava exemplos bem próximos a mim, exemplos que pode-se até chamar de exemplos “pop”. Programas como Survivor, Pokémon, American Idol, e filmes como Matrix e Star Wars e os livros de Harry Potter caíram como uma luva para entender as mudanças que estão ocorrendo graças à convergência midiática. No momento esse fenômeno ainda está muito ligado a área do entretenimento, como se pode ver pelos 8
  • 9. exemplos citados, mas quem sabe o que o futuro no reserva? Por exemplo, nas últimas eleições presidenciais norte-americanas, a equipe do então candidato Barack Obama1 criou perfis em sites de relacionamento como o Facebook2 e divulgou suas mensagens através do site de vídeos Youtube3 e do Twitter4 – todas ferramentas gratuitas que estão disponíveis na web e que são amplamente usadas por pessoas comuns. E do mesmo jeito que os candidatos usaram essas ferramentas a seu favor o povo também as usou, seja para expressar seu apoio ou descontentamento com eles, através de textos em blogs, protestos em forma de fotos editadas com photoshop5 ou em forma de comunidades no Facebook ou vídeos amadores hospedados em diversos sites na internet – e esses são só alguns exemplos do que foi feito. É impressionante lembramos que há poucas eleições atrás as equipes de comunicação de um candidato tinham que se preocupar quase que exclusivamente com a propaganda política na televisão, e em menor escalar, no rádio. Não que a televisão tenha perdido seu papel de destaque na comunicação entre candidato e eleitor, mas agora há meios diferentes de se fazer essa comunicação e elas não são tão passivas como na TV, onde praticamente apenas um lado tem voz. Neste meu trabalho tento oferecer ao leitor um panorama geral sobre a Convergência Midiática, o que ela é e como ela já está presente em nossas vidas, mesmo sem muitas vezes nos darmos conta, como ela está mudando e/ou abrindo novas possibilidades em termos de produção midiática, tanto para as “pessoas comuns” quanto para as grandes empresas de comunicação. Procuro fazer isso através de exemplos extraídos do livro de Jenkins e de outros exemplos os quais comecei a pensar enquanto lia seu livro, “A Cultura da Convergência”(2008). A parte em que eu abordo o seriado Lost já tinha sido trabalhada na disciplina de Ficção Seriada. Com as reflexões feitas durante a leitura do já citado livro eu revisei e ampliei o trabalho que eu tinha feito para esta disciplina. 1 Ele (Obama) usou o Twitter, o Youtube, publicidade em jogos e coisas que ninguém havia se arriscado antes, e soube aproveitar esta oportunidade”. TEIXEIRA, Paulo Rodrigo. “Mudar? Sim você pode”. 2 Site de relacionamentos similar ao Orkut: http://www.facebook.com/ 3 Site para hospedagem gratuita de vídeos: http://www.youtube.com/ 4 Site que permite a troca de mensagens até 140 caracteres: http://twitter.com/ 5 Software para edição de imagens 9
  • 10. Capítulo I Convergência Midiática Todos os dias somos testemunhas do fenômeno da convergência midiática. Nos ônibus, com uma rápida olhada, podemos observar várias pessoas com fones de ouvido conectados aos seus players de Mp3, Mp4, Mp5 e Ipods, ouvindo músicas, vendo fotos, lendo e-books, trocando arquivos via Bluetooth6 durante a viagem de ida ao trabalho ou escola e de volta para casa. Nas ruas vemos pessoas usando celulares com GPS7, além de os usarem como câmera filmadora e fotográfica, videogame, televisão (esta última ainda um pouco difícil de ser ver no Brasil), navegador de internet, envio e recebimento de mensagens de texto, agenda e, vez ou outra, até como telefone móvel! E isso tudo sem falar do Iphone, o mais recente queridinho da era digital, o símbolo máximo (ao menos até agora) da Convergência Midiática. Mas o que é a “Convergência Midiática”? Temos basicamente duas formas de entendermos a convergência midiática. Uma é pelo viés tecnológico, representada pelos aparelhos eletrônicos que conseguem executar várias funções diferentes, além daquela função básica para o qual foi feito. O celular é um exemplo perfeito disso. 6 Bluetooth é uma especificação industrial para áreas de redes pessoais sem fio. O Bluetooth provê uma maneira de conectar e trocar informações entre dispositivos como telefones celulares, notebooks, computadores, impressoras, câmeras digitais e consoles de videogames digitais através de uma freqüência de rádio de curto alcance. 7 Sistema de Posicionamento Global, popularmente conhecido por GPS (do inglês Global Positioning System), aparelho usado para localização no globo terrestre. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Gps 10
  • 11. O celular é um aparelho ao qual estão convergindo várias mídias: O videogame, a TV, o rádio, as músicas em formato digital, as mensagens de texto, além de sua função básica, que é servir como telefone móvel. Se antes, para termos acesso a todas essas mídias, precisávamos de um aparelho de rádio, de uma TV, de um computador, de um pager, de um videogame, de um cd player, hoje temos todas essas mídias convergindo para um único aparelho. A segunda forma de pensarmos a convergência midiática é a apresentada por Henry Jenkins (2008) 8 . Ele compreende que convergência midiática vai além de aparelhos eletrônicos com múltiplas funções. Jenkins refere-se à convergência como: “o fluxo de conteúdos através de múltiplos suportes midiáticos, à cooperação entre múltiplos mercados midiáticos e ao comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação, que vão a quase qualquer parte em busca das experiências de entretenimento que desejam”. (JENKINS, 2008, p. 27.) Percebe-se que a idéia de convergência midiática de Jenkins aborda não só o viés tecnológico, mas também as novas relações de produção midiática, tanto entre as diferentes indústrias de mídia, que tem que interagir cada vez mais entre elas mesmas, por causa dos seus produtos em comum, quanto à relação entre a indústria e os consumidores, que graças às novas tecnologias disponíveis, em especial a internet, estão cada vez mais influenciando no desenvolvimento dos produtos midiáticos que eles mesmos consomem. A interação entre os mercados midiáticos não é exatamente novidade. Na década de 90 não eram raros os filmes que ganhavam seus jogos de videogames (e até mesmo o contrário, videogames de sucesso que ganhavam versões cinematográficas), histórias em quadrinhos que viraram filmes e videogames, Games que viravam quadrinhos, e por aí vai. Porém o diálogo entre os diferentes nichos da indústria ainda não era muito forte. Por exemplo, os filmes baseados nos videogames de enorme sucesso, Super Mario Bros e Street Fighter9 foram verdadeiros fracassos de crítica e público, mesmo contando com uma grande legião de fãs dos games prontos para gastarem seu dinheiro indo aos cinemas para assistir as versões cinematográficas dos personagens que tanto 8 JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. São Paulo: Aleph, 2008. p. 27. 9 Fonte: http://www.interney.net/blogs/melhoresdomundo/2009/02/27/ign_assitiu_street_fighter_the_legend_ of/#more30697 (acessado em 06 – 05 – 09). 11
  • 12. gostavam. O motivo básico para o fracasso de tais filmes foi o fato deles não terem respeitado o universo narrativo dos videogames nos quais foram inspirados. Em Street Fighter, os personagens principais do videogame eram dois amigos, o japonês Ryu (o protagonista) e Ken, seu amigo americano. Por vícios do cinema Hollywoodiano, o personagem Guile, um militar americano, foi alçado ao posto de personagem principal do filme, o que por si só já é uma grande decepção para os fãs do videogame. Somando-se isso ao roteiro sofrível e as péssimas atuações do atores, temos um filme que tinha um enorme potencial de bilheteria e de se tornar um filme inesquecível para os fãs, se tornar um fracasso comercial e sinônimo de como não se fazer uma adaptação cinematográfica. O caso de Super Mario Bros foi tão ruim ou até pior do que o de Street Fighter. Além do game ser um grande sucesso a franquia já tinha se desdobrado em desenhos animados para a TV e histórias em quadrinhos. Os fãs já tinham grande conhecimento do produto principal (os videogames) e dos derivados (quadrinhos e desenhos animados). Até mesmo quem nunca tinha jogado o game, mas assistia os episódios na TV ou lia as histórias em quadrinhos, tinha um conhecimento razoável no universo de Super Mario Bros. Na adaptação pro cinema manteve-se apenas os nomes dos personagens principais e algum resquício da história que os fãs conheciam. A caracterização dos personagens foi alterada, os cenários repletos de cores vivas e cheio de natureza foi trocado por um cenário futurístico com um ambiente feio e degradado, que não lembrava em nada aquele universo que os fãs conheciam. Resultado: Outro fracasso comercial, que ficou na mente dos fãs como uma péssima recordação. 12
  • 13. (Figura 1: Comparação entre as versões do personagem Koopa, o vilão dos games Super Mario Bros. O da esquerda é a versão cinematográfica, e o da direita a versão do videogame. A descaracterização é gritante10.) Tivessem os produtores desses videogames conversado ou mesmo trabalhado em conjuntos com os roteiristas e produtores dos filmes, respeitando as características principais dos produtos midiáticos em que foram inspirados, eles provavelmente teriam produzido filmes que agradariam muito mais aos fãs, e consequentemente teriam obtido muito mais bilheteria. Hoje em dia há mais integração entre as equipes de produção que trabalham com um mesmo conteúdo em diferentes meios. A franquia Harry Potter é um exemplo disso. Com o sucesso dos livros a história foi logo adaptada para o cinema, e depois para os videogames, obtendo êxito em ambas as mídias. Tanto os filmes quantos os jogos de videogame respeitaram o universo ficcional construído nos livros escritos por J.K Rowling, a autora de Harry Potter, e isso concerteza contribuiu para o sucesso multimidiático da franquia, diferentemente do que ocorreu em Street Fighter e Super Mario Bros, onde os universos ficcionais de ambos foram muito modificados. Felizmente com o passar do tempo os consumidores/fãs de videogames, música, cinema, televisão e quaisquer outros produtos culturais e midiáticos ganharam uma arma poderosa: A internet. Não que ela não existisse já na década de 90, mas seu uso ainda era muito restrito e estava apenas engatinhando. Com a internet as pessoas ganharam voz através de sites, blogs, redes de relacionamento (tipo Orkut, Facebook, entre outros) e fóruns virtuais. Os fãs agora podem se reunir em espaços virtuais para discutir sobre seus objetos de interesse. Por exemplo, nas comunidades no Orkut sobre o seriado Lost a prática mais recorrente e divertida para os fãs é cada um postar sua teoria sobre o que viu no último episódio exibido na televisão, juntando as informações com o de episódios passados11. Os fãs procuram referências na internet para dividir com os outros fãs, formando a consciência coletiva (DERY Apud SÁ, p.48) 12 sobre Lost dos 10 Imagens disponíveis em http://www.areavoices.com/hodgepodge/index.cfm?archive=2008-04 e http://www.gametrailers.com/users/timidshadow/gamepad/?action=viewblog&id=142528 em 26 – 06 – 2009. 11 http://www.orkut.com.br/Main#CommTopics.aspx?cmm=467672&q=teoria (acessado em março/2009). 12 SÁ, Simone Pereira de. O samba em rede: Comunidades virtuais, dinâmicas identitárias e carnaval carioca. E – Papers Serviços Editoriais, Rio de Janeiro, 2005. 13
  • 14. freqüentadores daquela determinada comunidade. Falarei sobre Lost mais detalhadamente adiante. O mesmo acontece com outros produtos, como reality shows, filmes, desenhos animados, livros e música. Existem comunidades tanto para a adoração quanto para odiar certos produtos midiáticos. Nelas as pessoas podem fazer mais do que discutir, elas podem dividir os conteúdos midiáticos oficiais através de downloads e produzir novos produtos derivados a partir dos originais, como spoofs (uma espécie de paródia) de videoclipes de músicos e bandas famosas, filmar curtas-metragem que continuam, complementam ou reinventam histórias de filmes, escrever fan-fiction (“ficção de fã”, uma história escrita por um fã ou fãs de alguma obra, que usam seu universo narrativo original mas criam histórias próprias a partir dele) inspirados em livros, filmes, seriados, histórias em quadrinhos, etc. Todo esse movimento dos fãs, que não se contentam em apenas contemplar uma obra, mas querem obter algo a mais com ela, é considerado por Jenkins como parte importante da Convergência midiática. São as pessoas se apropriando das tecnologias para interagir, modificar e reconstruir o conteúdo midiático produzido e distribuído pelas grandes empresas de comunicação e entretenimento. As empresas já perceberam isso, embora ainda estejam aprendendo a lidar com essa nova realidade. Há alguns bons exemplos de como as empresas estão reconfigurando seus negócios diante das mudanças tecnológicas e de consumidores mais ativos (assim como há também maus exemplos de empresas processando pessoas que distribuem música na internet, sem fins lucrativos, ou mesmo fãs que escrevem ou filmam fan-fictions). A seguir mostrarei exemplos de mudanças em três campos diferentes: Na música, na televisão e no cinema. 14
  • 15. Capítulo 2 Análises 2.1 Revolução na indústria da música Desde o final da década de 90, mas precisamente no ano de 1999, a indústria da música vem decaindo graças ao compartilhamento de músicas através da internet. Note que a indústria tradicional da música vem decaindo, com vendas cada vez mais baixas de CD´s, porém não o consumo de música em si. Provavelmente nós nunca ouvimos música com tanta variedade a acessibilidade como hoje em dia. Toda essa mudança, e porque não chamar isso de “revolução”, começou com o primeiro programa de compartilhamento de arquivos MP313 a se tornar mundialmente popular, o Napster. O Napster permitia que pessoas que estivessem conectadas a internet e que usassem o programa pudessem compartilhar suas músicas de forma gratuita. O sucesso foi estrondoso e teve seu auge em janeiro de 2001, quando o programa conseguiu conectar mais de oito milhões de usuários que trocavam aproximadamente vinte milhões de músicas14. O sucesso do Napster não passou despercebido pelas gravadoras que, ainda em 2001, representados pela RIAA (Recording Industry Association of America) moveram e ganharam vários processos por quebra de direitos autorais (inclusive com o apoio de bandas famosas, como o Metallica, o que irritou muitos fãs da banda ao redor do 13 MP3 é um formato que permite armazenar músicas e arquivos de áudio no computador em um espaço relativamente pequeno, mantendo a qualidade do som. Os arquivos MP3 também podem ser armazenados e reproduzidos em players de música (ex. Ipod), celulares e em cd´s e dvd´s. 14 Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Napster (acessado em 27 - 04 – 2009). 15
  • 16. mundo 15 ). O Napster foi obrigado a “fechar as portas” e o serviço foi desativado. Algum tempo depois ele foi comprado por uma empresa que fabrica softwares para gravação de CD´s e DVD´s e passou a vender músicas em formato MP3, sendo um dos primeiros serviços de venda de músicas em formato “não-físico”. Mesmo com a vitória das gravadoras contra o Napster o estrago já estava feito e os fãs de música descobriram um novo jeito de consumir e de se relacionar com ela. Desde o ano 2000 as vendas de CD´s de música vem diminuindo e os arquivos de MP3 ganhando cada vez mais força. O fechamento do Napster inspirou e motivou ainda mais as pessoas a buscarem meios de se trocar gratuitamente música pela internet. Novos serviços como Soulseek16, Kazaa17, Emule18, Limewire19, Bitcomet20, além de blogs e sites especializados em músicas nasceram. Claro que do ano 2000 até hoje alguns novos serviços surgiram e outros desapareceram, mas de uma forma geral esses são os mais representativos. As gravadoras cedo ou tarde, acabam descobrindo esses serviços e entram na justiça para fechá-los. Os processos, apesar de sempre favoráveis as gravadoras, levam muito tempo até serem concluídos, e quando elas conseguem fechar um serviço outros nascem para ficar em seu lugar. O caso mais recente foi o da prisão dos suecos responsáveis pelo site Pirate Bay21, o serviço mais popular a nível mundial a oferecer troca de arquivos entre os usuários, não só de músicas, mais de filmes, videogames, histórias em quadrinhos, livros, programas de computador, entre outros. Apesar dos donos do serviço terem sido julgados, presos e condenados pela justiça sueca a pagar uma multa de 4,5 milhões de dólares eles já informaram que não irão pagá-la porque simplesmente eles não tem dinheiro pra isso. O Pirate Bay não hospeda nenhum arquivo, ele apenas indica links para os arquivos que estão hospedados 15 Fonte: http://www.rollingstone.com.br/secoes/novas/noticias/2274/ (acessado em 27 – 04 – 2009) 16 www.slsknet.org/ 17 http://www.kazaa.com/ 18 http://www.emule-project.net/home/perl/general.cgi?l=30 19 www.limewire.com/ 20 http://www.bitcomet.com/ 21 http://thepiratebay.org/browse (acessado em 27 – 04 – 2009) 16
  • 17. nos computadores dos usuários do serviço. Os donos já informaram aos usuários que, mesmo presos, o site continua funcionando normalmente22. No Brasil o caso mais recente e de maior comoção foi o fechamento da comunidade “Discografias”23, criada por usuários do Orkut24. A APCM25 (Associação Antipirataria de Cinema e Música) ganhou na justiça o direito de fechar a comunidade, que era usada por mais de um milhão de pessoas para trocas de música. Assim como o Pirate Bay a Discografias não hospeda nenhum arquivo, apenas aponta e organiza os links que são hospedados pelos usuários em outros sites na internet. Essas ações em nada ajudaram a melhorar as vendas de CD´s. Pelo contrário, os fãs que utilizam esses meios eletrônicos logo criam novos espaços. No caso da comunidade Discografias foi muito fácil verificar tal fato: Fazendo uma rápida pesquisa no Orkut encontrei três comunidades com o mesmo perfil e estrutura da “finada” comunidade, sendo que uma delas utilizava o irônico título de “Discografias – O Retorno” 26 , e aparecia, em sua descrição, que os usuários daquela comunidade compartilhavam músicas sem nenhum fim lucrativo. 27 William Winston argumentava que, com a convergência tecnológica, alcançaríamos “maior liberdade humana”, “mais poder ao povo” (1995). De fato isso aconteceu. Depois do Napster ficou muito mais fácil conseguirmos ouvir músicas que não tenham passado pelo funil das gravadoras, que investem pesado apenas nos grandes hits, nas músicas de sucesso, que são tocadas a exaustão nas rádios e na TV, dando a impressão ao público leigo em música que praticamente não existem outras ofertas de música além dos grandes sucessos veiculados pela televisão e rádio e que podem ser facilmente encontrados a venda nas grandes lojas de departamentos. O Napster, e posteriormente outros meios de troca de músicas via internet, mudaram significativamente esse cenário: “Eu sei, por exemplo, que o Napster despertou de novo meu interesse pela exploração de novas músicas, paixão que agora se tornou mais fácil (e legal) com a Rhapsody, que provavelmente dobrou meus gastos com música. E minha 22 Fonte: http://www.vorty.com/fundadores-do-the-pirate-bay-presos (acessado em 27 - 04 – 2009). 23 Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u535222.shtml (acessado em 27 - 04 – 2009). 24 http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=6244330 (acessado em 27 – 04 – 2009). 25 http://www.apcm.org.br/index.php (acessado em 27 -04 – 2009). 26 http://www.orkut.com.br/Main#Community.aspx?cmm=56139232 (acessado em 27 -04 -2009). 27 Winston Apud Briggs & Burke, p. 302. 17
  • 18. família decerto vê mais DVD´s, graças ao Netflix28.” ANDERSON, 2006, p. 173-174)29. Segundo Anderson, há um “exército” nas ruas de Nova Iorque com fones brancos nas orelhas (numa alusão ao player Ipod, um aparelho portátil que serve para ouvir músicas em formato digital), que sem dúvida está ouvindo mais música do que as gerações passadas, mas isso não quer dizer que eles estejam comprando mais música: “As vendas de CD´s caíram quase 20% desde o lançamento do Ipod. Assim sendo, como os consumidores estão ocupando seus espaçosos discos rígidos portáteis e seus chips de memória Flash? Copiando CD´s de amigos, baixando- os de serviços gratuitos ponto - a - ponto (cujo tráfego continua aumentando, apesar das ocasionais campanhas legais restritivas) e trocando-os através de LAN´s, entre as paredes dos dormitórios das universidades”. (idem). Diante deste quadro, o que podem fazer as gravadoras? Público consumidor de música não falta, pelo contrário, nunca foi tão grande, mas o público disposto a pagar pela música provavelmente nunca esteve tão baixo. Pelo andar da carruagem, o caminho a ser seguido pelas gravadoras é investir em iniciativas como o iTunes Store e Rhapsody, que vendem músicas via internet em formato Mp3, onde a pessoa não precisa comprar um álbum inteiro de determinado artista, mas apenas aquelas músicas que ela escolher. No caso do Rhapsody o serviço vai além da venda de Mp3, oferecendo um serviço que se assemelha a uma “rádio por demanda”, onde o usuário escolhe seu plano mensal e tem direito a ouvir todo o acervo da Rhapsody, algo em torno de seis milhões de músicas, criar playlists 30 e ouvir playlists oferecidas pelo programa ou feitas por outros usuários. A principal diferença é que o usuário não paga por faixa baixada, mas paga um preço fixo pra ter acesso a todas às músicas disponíveis. É como se uma pessoa pudesse montar sua própria estação de rádio particular e dividi-lá com outras pessoas. 28 Netflix é um serviço online que se assemelha a uma videolocadora. Através do site do serviço você escolhe filmes ou programas da TV que quer “alugar”. Depois de escolhido o serviço manda o arquivo diretamente para o email do cliente, para ser assistido no computador, ou então diretamente para uma TV, através da tecnologia stream. Após expirar a locação, a transmissão via stream acaba ou o arquivo que está no PC não pode mais ser acessado. Atualmente a Netflix conta com mais de 100.000 títulos no catálogo. Fonte: http://www.netflix.com/Default 29 ANDERSON, Chris. A Cauda Longa – Do Mercado de Massa para o Mercado de Nicho. São Paulo: Campus, 2006. p. 173-174. 30 Playlist, numa tradução livre, seria uma “lista de músicas”. 18
  • 19. Não foi a toa que a revista Fortune disse, em 2007, que a Rhapsody, e não a ITunes, seria o futuro da música31. Este caminho aposta no “comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação, que vão a quase qualquer parte em busca das experiências de entretenimento que desejam” (JENKINS, 2008). Em outras palavras o futuro da indústria da música depende da convergência midiática, no sentido do público migrar para conseguir o que quer. Nesse caso seria a migração do público das lojas de música, das emissoras de rádio, do formato físico do cd, para a virtualidade da internet, onde ele tem um papel ativo na escolha do que vai consumir e um leque de escolhas infinitamente superior a qualquer loja física que possa existir. Esse comportamento mais ativo na hora de consumir música começou a ser encorajado pelo Napster e agora a indústria da música não tem mais como fazer o público voltar atrás. Se o consumo de música das pessoas já não pode mais ser tão induzido como era antes da febre de distribuição de música na internet, então há de se ensinar o homem a pescar, ou seja, dar ao público as ferramentas de busca e o ensinar a usar, para que possa tirar algum proveito, em termos econômicos, disso. Novos modelos de contrato entre artistas e músicos também estão surgindo. Em vez da gravadora lucrar com a vendas dos CD´s elas passam a ganhar uma porcentagem dos shows das bandas e músicos. Isso as obriga a fazerem um bom trabalho de divulgação para seus contratados e a estarem sempre atrás de shows para eles. No Brasil a banda Detonautas foi uma das primeiras a ter um contrato nesses moldes.32 2.2.1 Além da tela da TV Em matéria de convergência midiática poucos produtos se comparam ao seriado televisivo Lost. Embora existam seriados e programas de TV que possuam produtos derivados e comunidades de fãs na internet, poucos souberam aproveitar as possibilidades transmidiáticas do mesmo jeito que a produção deste seriado norte- americano. 31 Traduzido da página http://learn.rhapsody.com/awards (acessada em 06 - 05 – 2009). 32 Fonte: http://musica.terra.com.br/interna/0,,OI2738909-EI1267,00.html (acessado em 01 – 05 – 2009). 19
  • 20. Lost foi considerado o segundo programa de TV mais popular do mundo em 200633, e certamente continua sendo um dos mais populares até hoje, em parte pela sua trama e em parte graças às estratégias de marketing, sendo algumas pioneiras, como a Lost Experience (a qual abordarei mais adiante), e o incentivo por parte da produção do programa para que os fãs da série, em todo o mundo, interajam entre eles, ou seja, que interajam entre iguais, principalmente via internet. O seriado foi lançado em 2004 pela rede de TV norte-americana ABC. Ele nos conta a estória dos sobreviventes de um acidente aéreo, de um voo que saiu da Austrália rumo aos Estados Unidos, e que por motivos desconhecidos cai numa ilha em que ninguém os consegue encontrar. Diferentemente das narrativas mais convencionais sobre desastres de aviões, o espectador não é levado a conhecer os personagens a partir de um momento anterior ao vôo até o momento do acidente. Ele é apresentado a um cenário caótico onde os sobreviventes, completamente confusos e desesperados, tentam entender o que aconteceu em meio aos feridos e aos destroços do avião. Alguns dos atrativos que fazem o sucesso de Lost é a grande quantidade de segredos contidos na trama. Em Lost o improvável acontece e na maioria das vezes sem explicação imediata. Alguns segredos são revelados alguns episódios depois que surgem, enquanto outros permanecem até hoje, após o final da quinta temporada, sem resposta. E esses segredos contidos na série são exatamente o grande trunfo dos produtores para explorarem outras mídias para além dos episódios regulares que passam na TV. Sob o pretexto de possibilitar aos fãs investigarem os segredos da ilha e de seus personagens e entidades, foram lançados mobisódios34 (chamados oficialmente de Lost: Missing Pieces), que são episódios produzidos para serem distribuídos e vistos através de determinados aparelhos de telefone celular, com duração variando de dois a três minutos 35 . Os mobisódios eram primeiramente distribuídos para celulares da marca Verizon e seis dias depois estavam disponíveis no site da rede ABC 36, para que todos os 33 Segundo uma pesquisa da Informa Telecoms, realizada em 2006, Lost é o segundo programa televisivo mais popular do mundo, perdendo apenas para o seriado CSI Miami. Fonte: http://news.bbc.co.uk/1/hi/entertainment/5231334.stm (acessado em 18 - 05 – 2009). 34 Numa tradução livre do termo original, em inglês, “mobisodes”. 35 Fonte: http://pt.lostpedia.com/wiki/Mobis%C3%B3dios (acessado em 20 – 05 – 2009). 36 http://abc.go.com/primetime/lost/missingpieces/index?pn=index (acessado em 20 – 05 – 2009). 20
  • 21. fãs pudessem assistí-los. Em questão de pouco tempo os mobisódios postados no site da ABC logo se espalhavam pelo Youtube e outros blogs e sites. Feito pelo mesmo elenco e produção que faz a série, os mobisódios mostram novas situações que são incorporados dentro da cronologia de Lost, e como tais, são considerados como uma extensão oficial da série. Os mobisódios eram lançados semanalmente, levando até a abertura da 4ª temporada. Os mobisódios complementam os episódios regulares que passam na TV. Eles preenchem pequenas lacunas de um episódio passado ou então adicionam uma informação extra que pode vir a ser relevante no futuro da série. Os Mobisódios, além de mostrar situações que os episódios da TV não mostram, dão destaque a outros sobreviventes da ilha, que não tem destaque algum nos episódios regulares na TV. Muito embora Lost seja um sucesso de público os mobisódios não tem a mesma audiência que os episódios da série. Primeiro porque os downloads pelo celular estão disponíveis para poucas pessoas, somente para aquelas que possuem um aparelho de uma determinada marca e mesmo assim, somente as que estão em determinados países, e isso faz com que não haja um marketing oficial para divulgação dos mobisódios em lugares onde o download via celular não está disponível, ficando o conhecimento da existência destes quase que restrita aos fãs mais hardcore de Lost, aqueles fãs que procuram informações em comunidades virtuais na internet e em blogs e sites de outros fãs, bem próximo do perfil das pessoas que estão interagindo com as novas produções midiáticas, que Jenkins fala na abertura do seu livro. E no fim das contas os mobisódios servem justamente pra isso, para dar uma experiência extra para os fãs mais afoitos de Lost, ou até mesmo para criar um “sistema de classes” entre os fãs do seriado. Há aqueles que apenas assistem os episódios na TV, há aqueles que assistem os episódios e os mobisódios, e há aqueles que assistem ambos e que ainda vão à internet procurar informações escondidas nos episódios e discuti-las com outros fãs, através de fóruns e sites. Os fãs que assistem aos mobisódios se sentem mais investigadores que aqueles que não assistem, conhecendo personagens secundários que talvez nunca venham a ter nenhum destaque nos episódios regulares e conhecendo situações que os outros espectadores da série ignoram. Talvez, devido a essas “classes” 21
  • 22. de fãs de Lost, tenha surgido a Lostpedia37, uma espécie de “Wikipédia” exclusivamente sobre Lost, que serve para reunir e catalogar toda e qualquer informação sobre o seriado, para que os fãs possam procurá-las em um único lugar, de forma organizada. Além de incentivar os fãs a investigarem os segredos da trama, os mobisódios foram uma estratégia de marketing para manter as pessoas se lembrando de Lost, durante o intervalo entre o fim da terceira temporada e o início da quarta, gerando expectativa entre os fãs e mantendo alta o interesse do público em geral pelo seriado, numa época em que o interesse dos telespectadores tender a cair, que é quando a produção do programa acaba de filmar uma temporada e entra de férias, até retomar as gravações e começarem a exibir uma nova temporada. Para suprir os fãs há ainda outros produtos para além dos episódios televisivos: Podcasts, comunidades virtuais, sites e livros. Um podcast é parecido com um programa de rádio, só que pode ser feito com poucos recursos técnicos e sua principal finalidade é a de ser distribuído gratuitamente via internet através de downloads. Há o podcast oficial de Lost, feito pelos produtores executivos Damon Lindelof e Carlton Cuse, que conta com comentários dos episódios feitos pelos mesmos, além de entrevistas com os atores. Há também os podcasts feitos por fãs que querem discutir sobre a série e querem apresentar suas teorias sobre a estória de Lost, como o do site brasileiro Lost in Lost38, que inclusive faz parte do portal de internet da Rede Globo, que é a emissora que exibe o seriado, pela tv aberta, no Brasil. Esse fato ajuda a demonstrar a importância que as grandes empresas de comunicação estão dando a esse tipo de conteúdo transmidiático, um conteúdo extra e/ou complementar ao conteúdo principal, que nesse caso, são os episódios seriados na televisão. As comunidades virtuais são uma experiência a parte em Lost. Mesmo que muitos dos espectadores do programa efetivamente não participem de nenhuma comunidade sobre o seriado há um número considerável de fãs que participam delas e discutem seriamente sobre Lost. Nessas comunidades os fãs partilham suas teorias sobre a ilha e seus mistérios, discutem sobre os personagens e os rumos da série, procuram pistas escondidas nos episódios (como o símbolo da empresa fictícia chamada “Dharma Iniative” na barbatana de um tubarão, numa imagem que dura apenas um segundo mas 37 http://pt.lostpedia.wikia.com/wiki/Pagina_Principal (acessado em 21 - 05 – 2009). 38 http://colunas.tv.globo.com/lostinlost/?s=podcast (acessado em 21 – 05 – 2009). 22
  • 23. foi notada graças a fãs fervorosos que gravaram ou baixaram o episódio e puderam usar o recurso de pausa para “estudar” a cena) que possam revelar algum segredo da trama. Há também muitos livros sobre Lost. Procurando no site submarino.com.br 39 encontrei doze livros sobre a série. Os livros variam desde guias de episódios, pesquisas acadêmicas até narrativas paralelas de sobreviventes que não aparecem no seriado. O que tem a proposta mais interessante é o livro Bad Twin40, escrito por um autor fictício chamado Gary Troup, (anagrama para purgatório, em inglês purgatory, em uma referência a ilha) que no universo de Lost é um famoso escritor, que desapareceu no vôo 815, tendo sido Bad Twin seu último trabalho. O manuscrito de seu livro foi encontrado em um dos episódios da segunda temporada. Contudo, o livro se mostrou uma decepção para quem buscava segredos sobre o seriado, sendo considerado por fãs e críticos como uma tentativa de marketing mal-sucedida (AZEREDO, 2007). Mas independente de ser uma tentativa de marketing fracassada ou uma narrativa transmidiática, o interessante é notar como há um público que está disposto a gastar tempo, dinheiro e dedicação para continuar imerso no universo ficcional do seriado, mesmo que seja em um meio totalmente diferente do produto primário, o televisivo.Como Afirma Danny Bilson, vice-presidente de propriedade intelectual da Eletronic Arts41: “(...) as pessoas vão querer se aprofundar naquilo de que gostam, em vez de experimentar amostras de várias coisas. Se existe algo que eu adoro, quero que seja maior do que apenas duas horas no cinema, ou a experiência de uma hora semanal na TV. Quero um aprofundamento do universo.” (Jenkins Apud Bilson, 2008, pg. 147). E é misturando marketing com material extra da série que seus produtores lançaram um ARG42 – um jogo de realidade alternativa – chamado Lost Experience. Esse jogo foi um complemento da série disponível apenas na internet. Nele o jogador deve ajudar a personagem Rachel Blake, que após a morte de sua mãe decide investigar como esta conseguiu pagar sozinha seus estudos em colégios caríssimos, mesmo tendo poucos recursos financeiros. A partir daí o jogador, em parceria com a fictícia 39 http://www.submarino.com.br/books_searchresults.asp?Query=ProductPage&ProdTypeId=1&WhichFo rm=frmSearch&Search=lost&SearchBy=Palavra-chave (pesquisa feita em 24 – 05 – 2009). 40 Fonte: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=369ASP011 41 Empresa fabricante de videogames. 42 Sigla em inglês para Alternative Reality Game. 23
  • 24. personagem, que é interpretada por uma atriz, descobre coisas estarrecedoras sobre a Fundação Hanso, fundação esta que é citada em episódios de Lost e faz parte dos mistérios encontrados no seriado. A grande sacada de Lost Experience foi misturar realidade e ficção. A medida que Rachel Blake progredia em suas investigações ela postava textos e vídeos na internet, a fim de “desmascarar” a Hanso 43 no melhor estilo “teoria da conspiração”. A interação entre jogador/personagem se da toda via internet, tal como se fossem duas pessoas reais que se ajudam através do ambiente virtual. Os fãs de Lost foram convidados por Rachel a verem os vídeos feitos por ela e a encontrarem barras do chocolate Apollo, que conteriam fotos que deveriam ser mandadas para ela. Quando todas as barras tivessem sido encontradas ela poderia revelar um segredo sobre a Fundação Hanso. Os chocolates, assim como outras pistas de Lost Experience, que os fãs deveriam encontrar para ajudar Rachel Blake variavam por continente, então, os participantes tinham que coordenar as informações via internet. A Rede ABC disse que o jogo foi projetado para atingir os fãs e também as pessoas que até o momento não conheciam ou assistiam Lost.44 O ápice de Lost Experience se deu quando a personagem Rachel Blake apareceu em meio à platéia da San Diego Comic-con 45 de San Diego, EUA, 2006. Enquanto os roteiristas da série, Damon Lindelof e Carlton Cuse, conversavam com a platéia, Rachel Blake (sendo interpretada pela atriz contratada) se levanta e critica os roteiristas por permitirem que a Fundação Hanso "prove a eles como é uma grande organização filantrópica ao comprar o caminho deles para o seriado com dólares em propagandas”. Perto do final do discurso irado, ela instrui a todos os que querem saber da verdade a acessarem o site www.hansoexposed.com. Esse ocorrido quebra a “quarta parede”46 do 43 Os textos e vídeos foram publicadoss nos endereços www.rachelblake.com, www.hansoexposed.com e http://stophanso.rachelblake.com/index2.html. 44 Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Lost_Experience 45 San Diego Comic Com é uma convenção de fãs de produtos da indústria de entretenimento, tais como seriados de TV, cinema, desenhos animados, mas principalmente de histórias em quadrinhos, que ocorre anualmente em San Diego, Estados Unidos. E nesse evento que várias empresas mostram suas principais novidades ou promovem a interação entre produtores, roteiristas, atores e fãs. 46 O ato de derrubar a quarta parede é usado no cinema, no teatro, na televisão e na arte escrita, originado da teoria do teatro épico de Bertolt Brecht. Refere-se a uma personagem dirigindo a sua atenção para a platéia, ou tomando conhecimento de que as personagens e ações não são reais. O efeito causado é que a platéia lembra-se de que está a ver ficção, e isso pode eliminar a suspensão de descrença. Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Quarta_parede 24
  • 25. seriado, misturando ficção com realidade, quando uma personagem de um fictício de um jogo surge ao vivo diante dos fãs, fazendo a ficção interagir com a realidade . 2.2.2 – Pokémon, Convergência e a Cultura do Conhecimento Apesar de tudo isso, talvez a narrativa transmidiática mais popular até agora não seja a de Lost, com seus episódios de TV, Mobisódios, ARG´s, Videogames e Livros, mas sim a de um desenho infantil chamado Pokémon. Como explicam os professores de pedagogia David Buckingham e Julian Sefton-Green (JENKINS Apud BUCKINGHAM & SEFTON-GREEN, p. 177), Pokémon não é algo que os fãs apenas assistem ou consomem, mas sim algo que eles fazem e participam. Mas por que Pokémon é diferente de qualquer outro desenho animado? No universo narrativo de Pokémon existem centenas de criaturas diferentes, com múltiplas formas evolucionárias, cada uma tendo seu ponto fraco e seu ponto forte e com jeitos específicos de serem tratadas. A missão do protagonista do desenho animado, assim como a da pessoa que joga os videogames baseados na série, é pegar o maior número possível de Pokémons e ganhar todas as batalhas. Aprender as informações sobre as centenas de criaturas existentes no universo de Pokémon é uma tarefa um tanto difícil para as crianças fazerem sozinhas; “em vez disso, a criança reúne seu conhecimento sobre Pokémon a partir de diversas mídias (TV, internet, revistas, videogames, cards47), e o resultado é que cada criança sabe alguma coisa que seus amigos não sabem e, portanto, tem a chance de compartilhar sua expertise com outros”. (JENKINS, 2008, p. 177)48 Resumidamente o que acontece é que as crianças usam as informações que viram no desenho animado e as usam no videogame e nos jogos de cards. Para fazer parte da cultura de Pokémon “é preciso buscar ativamente novas informações e novos produtos e, fundamentalmente, se envolver com outras pessoas ao fazê-lo” (JENKINS, 2008). Para Lévy49 (1998), desenhos como Pokémon ajudam a preparar as crianças para uma cultura do conhecimento mais sofisticada do que as escolas ensinam. Enquanto elas ainda se concentram em criar “aprendizes autônomos”, Pokémon faz parte de uma cultura do conhecimento colaborativo, em que o saber segue uma linha horizontal, 47 Cartões com ilustrações e informações dos personagens do desenho animado. 48 O trecho entre parênteses foi adição minha. 49 LÉVY, Pierre. A Inteligência Coletiva: por uma antropologia do Ciberespaço. São Paulo: Loyola, 1998. 25
  • 26. dividindo conhecimento entre iguais, diferentes do sistema escolar, em que o ensino é verticalizado, fluindo de pessoas que detêm uma determinada autoridade. Para Castells 50 , o público desenvolveu um interesse, ainda que limitado, em hipertextos. Consumidores mais jovens, que já nasceram ou cresceram em meio à abundância e facilidade de acesso informação que a internet proporciona, “tornaram-se caçadores e coletores de informações, tendo prazer em rastrear os antecedentes de personagens e pontos de enredos, fazendo conexões entre diferentes textos dentro da mesma franquia (...) Numa cultura de caçadores, as crianças brincam com arco e flecha. Na sociedade da informação, elas brincam com informação” (JENKINS, 2008, pgs. 178-179). Tal afirmação não é válida somente para Pokémon ou para outras franquias infantis, mas também para outros produtos midiáticos com públicos bem diferentes, como Lost ou a franquia Matrix, que abordarei adiante. 2.3 Matrix antes, durante e depois do cinema O ano de 1999 deixou marcas significativas na indústria cinematográfica hollywoodiana. Neste ano foi lançada uma leva de filmes que tinham uma narrativa não- linear, reflexo do novo público freqüentador de cinema, que cresceu acostumado a mídias não-lineares, como a internet e principalmente videogames. Essa parcela do público estava preparada para um novo tipo de narrativa cinematográfica. Clube da Luta, Corra Lola Corra, A Bruxa de Blair, O Sexto Sentido e Matrix são alguns bons exemplos de narrativas não-lineares. Matrix foi o projeto que levou, até agora, ao limite a narrativa não-linear. A narrativa de Matrix foi pensada para diversos meios, foi pensada para ser uma narrativa transmidiática. Os diretores do filme, os irmãos Wachowski, quiseram aproveitar os produtos derivados deste, mas não queriam apenas sinergia, como vemos em outras franquias, como por exemplo, no filme MIB – Os Homens de Preto. Depois do sucesso deste foi lançado um desenho animado que utilizava o mesmo universo narrativo do filme. No entanto esse produto derivado não é imprescindível para se entender partes do enredo do primeiro filme e o mesmo pode se afirmar em relação ao segundo filme da franquia. Já em Matrix ocorre justamente o oposto. Os diretores apostaram em algo mais que sinergia, apostaram em convergência midiática, contaram com a cooperação 50 CASTELLS, Manuel. A Galáxia da internet: Reflexões sobre a Internet, os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. 26
  • 27. entre múltiplos mercados midiáticos e com o comportamento migratório dos públicos dos meios de comunicação. Em Matrix cada produto derivado faz parte efetivamente da narrativa do produto principal, que é a trilogia de filmes. Uma obra em um meio serve como referência para outra obra em outro meio. A trama se desenrola em videogames, histórias em quadrinhos e animes51, isso sem mencionar as discussões em fóruns via internet, onde os fãs da franquia discutiam sobre o significado de coisas que encontravam nos filmes, mensagens subliminares plantadas pelos diretores, formando assim um trabalho de construção de uma consciência coletiva ao redor do filme, algo parecido com o que acontece com o seriado Lost. No entanto há uma diferença entre a convergência midiática existente em Lost e em Matrix. (Figura 2: Capa da edição brasileira das histórias em quadrinhos de Matrix. Uma das histórias é roteirizada pelos próprios diretores do filme, Larry e Andy Wachowski, e as demais por artistas convidados por eles.) Enquanto em Lost há uma espécie de “convergência complementar”, que amplia a experiência do fã da série televisiva, mas que não é de toda imprescindível para o entendimento da trama, em Matrix há efetivamente uma narrativa transmidiática; Há basicamente dois meios de se experimentar essa narrativa: Experimentar o todo ou frações dela, no entanto ela só faz sentido se experimentada por inteiro. Em outras 51 Nome dado as animações (ou desenhos animados) produzidos no Japão. 27
  • 28. palavras, para entender completamente (ou ao menos tentar) a narrativa de Matrix você tem de assistir os filmes, ler as histórias em quadrinhos, ver os animes e jogar o videogame, e tudo isso tem uma determinada ordem cronológica. Os críticos de cinema mais conservadores criticaram negativamente o filme, como fez Fiona Morrow, do London Independent: “Podem me chamar de ultrapassada – o que me importa é o filme, e apenas o filme. Não quero ter de „expandir‟ a experiência cinemática me sobrecarregando com artifícios turbinados”52. Essa crítica ilustra bem a dificuldade de se produzir narrativas transmidiáticas. Quanto mais “camadas” são colocadas em uma narrativa mais densa ela fica e consequentemente o esforço empregado para acompanhar essa narrativa é maior, e menos pessoas se interessam em se dedicar a ela. O crítico de cinema Richard Corliss perguntou aos seus leitores se o “Zé Pipoca” – se referindo aquelas pessoas que querem ir ao cinema, comprar seu lanche e assistir despreocupadamente um filme, sem ter que se preocupar em refletir a respeito da narrativa ou procurar material extra para entende - lá melhor, em outras palavras, provavelmente se referia ao público médio do cinema – “teria de carregar um guia de Matrix na cabeça?”. Henry Jenkins respondeu a essa pergunta: “A resposta é não, mas o “Zé Pipoca” pode unir seu conhecimento ao de outros fãs e construir um guia coletivo na internet. Em uma série de sites de fãs e listas de discussão, os fãs foram acumulando informações, pesquisando referências (...) transcrevendo diálogos (...) A profundidade e o fôlego do universo de Matrix tornaram impossível a qualquer consumidor „entendê-lo‟, mas o surgimento de culturas do conhecimento tornou possível à comunidade como um todo escavar mais profundamente esse texto insondável”. (JENKINS, 2008, pg. 176). Jenkins afirma que é possível “entender” o universo de Matrix graças ao surgimento do que ele chama de “culturas do conhecimento”. No entanto isso não muda o fato de que ainda é bem restrita a parcela do público que está disposta a acompanhar narrativas transmidiáticas, embora esse número tenda a crescer. Para as empresas produtoras destes conteúdos seria muito interessante do ponto de vista financeiro que cada vez mais pessoas se interessassem por esse tipo de narrativa, porque assim iriam consumir um leque maior de produtos relacionados a uma mesma franquia, numa indústria onde uma mesma empresa pode atuar em vários setores midiáticos. 52 MORROW, Fiona. “Matrix: The trix of the Trade”, London Independent, 28 de março de 2003. 28
  • 29. Cada meio tem seu público específico. Cinema e televisão muito provavelmente possuem um público mais amplo, enquanto videogames (embora o mercado consumidor de videogames cresça cada vez, inclusive começando a apostar em consumidores de faixas etárias mais avançadas, que não são costumeiramente os que consomem esse tipo de mídia, mas isso é um outro assunto), histórias em quadrinhos e animações (animes, desenhos animados, animações em 3D, etc) tem um público mais específico. Mídias diferentes atraem nichos de mercado diferentes e: “Uma boa franquia transmidiática trabalha para atrair múltiplas clientelas, alterando o tom do conteúdo de acordo com a mídia. Entretanto, se houver material suficiente para sustentar as diferentes clientelas (...) é possível contar com um mercado de interseção que irá expandir o potencial de toda a franquia”. (JENKINS, 2008, p. 135-136). O desafio das narrativas transmidiáticas atualmente pode ser resumindo em: - Fazer crescer o interesse do público em acompanhar narrativas que se desenrolam em diversos meios; - Convencer o público de que não se trata de um tipo novo de marketing, mas sim de uma nova experiência narrativa; - Adaptar o conteúdo de uma franquia de acordo com a especificidade de cada meio e aproveitar o que cada um oferece de melhor; - Integração das equipes criativas dos diversos meios para que o conteúdo seja coerente. Para ilustrar a minha última afirmação retorno a um exemplo anterior, o da adptação de videogames para as telas de cinema. Na grande maioria dos casos as versões cinematográficas de filmes inspirados em games são um fracasso, tanto do ponto de vista financeiro como de crítica e de público. Super Mario Bros, Street Fighter – O filme, Street Fighter – A Lenda de Chun-li, Final Fantasy – The Spirits Within, Double Dragon, são bons exemplos. Esses filmes não utilizaram de forma competente os elementos apresentados nos videogames que lhes deram origem, ficando descaracterizados aos olhos dos fãs dos games. Claro que isso não é o único motivo do fracasso, roteiros ruins e atuações sofríveis por parte dos atores também ajudaram. O caso da franquia Final Fantasy é o mais interessante. Ela é uma longa e mais bem sucedida franquia de videogames de RPG e justamente por isso causou grande 29
  • 30. alvoroço entre os fãs quando foi anunciado que ganharia uma versão cinematográfica. O filme Final Fantasy – Spirits Within53 foi lançado em 2001 e foi uma decepção para os fãs. Independentemente de ter sido um bom filme ou não. O que foi decisivo para os fãs não gostarem dele foi o fato de que o filme não apresentava nenhum elemento dos jogos de videogame. Nada sequer chegava perto de lembrar ao público seus queridos jogos, ao qual se dedicam tanto. Do jogo de videogame carregava apenas o nome. Já em 2004 foi lançado o longa-metragem em animação Final Fantasy: Advent Children54, que apesar do nome não tem nenhuma ligação com o primeiro filme. Nele os roteiristas procuraram seguir o enredo de umas das versões mais famosas do game, o game Final Fantasy VII. Aproveitando algumas pontas soltas do enredo do game e também aproveitando o conhecimento prévio que o público alvo tinha, fizeram do longa uma continuação do game. Criou-se uma narrativa transmidiática. Se a pessoa não conhece a história do game simplesmente não entenderá a história do filme, algo semelhante ao que ocorre em Matrix. Dessa vez o filme fez muito sucesso entre os fãs dos games, mas por outro lado restringiu muito o seu público, que como foi abordado anteriormente, é um dos problemas das narrativas transmidiáticas. 53 http://pt.wikipedia.org/wiki/Final_Fantasy:_The_Spirits_Within (acessado em 09 – 06 – 2009). 54 http://pt.wikipedia.org/wiki/Final_Fantasy_VII:_Advent_Children (acessado em 09 – 06 – 2009). 30
  • 31. Conclusão Procurei ao longo do meu trabalho demonstrar como a convergência midiática está presente no dia-a-dia de muitas pessoas. Procurei também mostrar, balizado pelas idéias de Jenkins, que a convergência pode ser mais do que um fenômeno tecnológico: É também um fenômeno cultural, pois está relacionado ao fluxo de imagens, idéias, histórias, sons e relacionamentos através de vários suportes midiáticos. A convergência midiática já mudou muita coisa e ainda vai mudar outras. Por exemplo, a maneira como consumimos músicas foi radicalmente alterada. Um computador com acesso a internet e com um programa específico para baixar músicas, ou mesmo lojas virtuais que vendem músicas em formato digital já substituíram, para muitas pessoas, o papel das lojas que vendem CD´s de música. As pessoas mudaram seus hábitos e a indústria está tendo que mudar a sua, por mais que ela esteja relutando, abrindo processos contra fãs de música e lutando para que tudo volte a ser como era antes da “era Napster”. Os filtros impostos pelas grandes gravadores ainda existe, mas foi enfraquecido pela liberdade oferecida pela internet, onde fãs indicam para outros fãs aquelas músicas que gostam, competindo com o rádio e a TV pela função de influenciar o gosto musical das pessoas. A narrativa transmidiática também acena com possibilidades interessantes. Exemplos como os de Lost, Matrix e Pokémon mostram que as pessoas estão muito dispostas a aumentar seu envolvimento com um determinado produto que é do seu agrado, expandindo não só o consumo das franquias mas também as possibilidades de 31
  • 32. criar formas diferentes de narrativas, onde cada meio se vale de sua característica específica para contribuir com o universo ficcional da trama, embora seja muito complicado executar narrativas desse tipo, pois como vimos, quanto mais “camadas” são colocadas em uma narrativa mais densa ela fica e consequentemente o esforço empregado para acompanhar essa narrativa é maior, e menos pessoas se interessam em se dedicar a ela. Há que se ter um delicado equilíbrio entre explorar novas experiências narrativas mantendo o interesse do público e fazer com que isso gere lucro. As empresas em geral estão tendo que re-aprender a lidar com o público, não só as da indústria da música. Segundo Jenkins, nos Estados Unidos, aproximadamente 57% dos jovens americanos, a maioria abaixo dos 18 anos de idade, tem seus próprios blogs e fazem filmes digitais. Essas informações circulam na web e também boca-a- boca. Os consumidores estão cada vez mais tendo voz ativa. Não me refiro apenas a fãs discuntindo sobre seus objetos de adoração ou reclamando de serviços ou produtos, mas também estão discutindo política e criando cultura. A grande mídia ainda é hegemônica, mas a informação está cada vez mais sendo pulverizada, principalmente graças a internet e suas diversas ferramentas, como blogs, sites de hospedagem de vídeos e sites de relacionamento. A forma de consumir e de ser relacionar com a mídia está mudando hoje e concerteza renderá alguns frutos amanhã. 32
  • 33. Obras Citadas ANDERSON, Chris. A Cauda Longa: Do Mercado de Massa para o Mercado de Nicho. Editora Campus, 2005. JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. Editora Aleph, São Paulo, 2008. MORROW, Fiona. “Matrix: The trix of the Trade”, London Independent, 28 de março de 2003 TEIXEIRA, Paulo Rodrigo. “Mudar? Sim você pode”. TIDIGITAL, n° 02, ano 01, abril de 2009. 33
  • 34. Obras Consultadas AZEREDO, Patrícia Silva de. Que mulher você seria em uma ilha deserta? Aspectos da representação do feminino no seriado de TV Lost. UFRJ, Rio de Janeiro, 2007. ABREU, Estela dos Santos e TEIXEIRA, José Carlos Abreu. Apresentação de trabalhos monográficos de conclusão de curso. Editora da Universidade Federal Fluminense, Niterói, RJ, 2007. BRIGGS, Asa e BURKE, Peter. Uma história social da Mídia: De Gutenberg à Internet. Editora Jorge Zahar, Rio de Janeiro, 2004. CASTELLS, Manuel. A Galáxia da internet: Reflexões sobre a Internet, os negócios e a sociedade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2003. LÉVY, Pierre. A Inteligência Coletiva: por uma antropologia do Ciberespaço. São Paulo: Loyola, 1998. SÁ, Simone Pereira de. O Samba em Rede: Comunidades Virtuais, dinâmicas identitárias e carnaval carioca. E – Papers Serviços Editoriais, Rio de Janeiro, 2005. 34