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Química Orgânica
  Florence M. Cordeiro de Farias  
  
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Química Orgânica 
Química Orgânica
Histórico até a definição final
A utilização de compostos orgânicos é descrita desde a antiguidade. Pesquisas arqueológicas recentes
comprovaram a presença de vinhos em jarros encontrados em tumbas de faraós (3150 a.C.). Os papiros
egípcios de Ebers (cerca de 1500 a.C.), de Edwin Smith (cerca de 1600 a.C.) e de Brugsch (cerca de 1300
a.C.) descrevem inúmeras fórmulas medicinais cujos constituintes eram principalmente ervas. Os
próprios papiros eram feitos da celulose obtida a partir dos talos da planta papiro do Egito, planta
aquática da mesma família da tiririca, abundante nas margens do Rio Nilo. A Bíblia, no episódio de Noé
(Gênesis), fala no vinho. Os romanos e egípcios utilizavam os corantes índigo e alizarina. O índigo era
obtido a partir de plantas do gênero Indigofera (anil do campo, timbozinho) e atualmente é obtido por
síntese e utilizado principalmente para a coloração de “jeans”. A alizarina era retirada de raízes da rubia .
A alizarina foi o primeiro corante a ser sintetizado (obtido em laboratório) e hoje em dia é utilizado
principalmente como reagente químico.
Apesar dessa grande utilização, até o século XVIII era pouco o conhecimento que se tinha sobre as
propriedades e composição dos compostos orgânicos. A Química já era bastante estudada, mas a parte
que envolvia a composição e estrutura (átomos que existiam nas moléculas e as formas com que se
arrumavam nelas) dos compostos orgânicos era pouco conhecida. A importância da Química Orgânica
estava muito mais em sua fonte de obtenção (na época, animal ou vegetal) e em sua aplicabilidade em
medicina, do que na sua parte estrutural.
Havia pouca produção de materiais orgânicos e, na maioria das vezes, eram feitos domesticamente ou
em pequena escala. Poucas coisas como, por exemplo, a fabricação de sabão, o refino do açúcar,
processos de tingimento e destilação (separação de duas ou mais substâncias por aquecimento) eram
feitas em escalas maiores.
Poucos compostos orgânicos eram conhecidos em sua forma pura. Valerius Cordus (médico e botânico
alemão,1515-1544) descreveu, em 1540, a obtenção do éter por tratamento do álcool com ácido
sulfúrico – método ainda usado –, dentre outros. Em 1780, Scheele (químico farmacêutico sueco, 1742-
1786) desenvolveu um método químico para obter ácidos orgânicos a partir de plantas ou animais e
assim descobriu vários ácidos orgânicos, tais como, por exemplo, os ácidos benzoicos (isolados da
resina balsâmica obtida do benjoim: Styrax benjoin), utilizado hoje em dia para a preservação de
alimentos, e o ácido tartárico (Figura 1), isolado de extratos de uvas fermentadas.
 
 
 
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Química Orgânica 
COOH
Ácido Benzóico
HOOC
COOH
OH
OH
Ácido tartárico
 
Figura 1: Estruturas do ácido benzoico e ácido tartárico.
 
O que podemos notar é que os compostos orgânicos eram obtidos, até então, de plantas ou animais. As
técnicas existentes na época não permitiam sua caracterização (isto é, como eram constituídos).
Lavoisier (químico francês, 1743-1794) já havia relatado que, diferente dos compostos químicos do
“reino mineral”, os compostos orgânicos eram constituídos principalmente de carbono e hidrogênio e,
frequentemente, também de nitrogênio e fósforo. Passou a ocorrer uma tendência a achar que a
Química Orgânica, embora fosse uma parte integrante da Química, era diferente. Na medida em que era
relacionada aos organismos vivos e aos compostos orgânicos, acreditava-se, eram produzidos apenas
por esses organismos. A Química Orgânica, como uma divisão da Química, foi proposta em 1777 por
Bergman (físico e matemático sueco, 1735-1784) e foi definida como a “Química dos organismos vivos”.
Em 1797, pela primeira vez, é tratada diferencialmente quando Gren (químico alemão,1760-1798)
publica um livro no qual os compostos orgânicos são tratados em um capítulo à parte. Nesse capítulo,
essas substâncias são definidas, na linguagem da época, “como princípios presentes em organismos
animais e vegetais e que não poderiam ser sintetizados artificialmente”.
Essa ideia permaneceu por várias décadas. Vários químicos achavam que a origem desses compostos
(seres vivos) os diferenciava dos compostos minerais. Esses últimos eram obtidos frequentemente em
estados mais puros e obedeciam à Lei das Proporções Constantes (também denominada Lei de Proust,
ela diz que, independente do modo pelo qual uma substância é obtida, a proporção, em massa, dos
elementos que participam de sua composição é sempre a mesma). Como, na época, as técnicas
existentes dificultavam a obtenção de compostos orgânicos puros, a presença de impurezas diversas
levava a resultados diferentes de análise elementar (proporção de cada átomo presente na molécula)
para um mesmo composto, então achou-se que não obedeciam à Lei das Proporções Constantes.
A origem do termo “Química Orgânica” vem da proposta de Berzelius (1779-1848), médico e químico
sueco, em 1807, para referir-se a todos os compostos descobertos a partir de organismos vivos.
Acreditava-se – teoria denominada de Vitalismo – que os compostos orgânicos eram obtidos pela
intermediação de uma força vital que existia apenas em plantas e animais. Esses compostos poderiam
ser extraídos e transformados uns nos outros, mas não poderiam ser obtidos a partir de outros
elementos do reino mineral (que não possuíam a força vital).
 
 
 
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Química Orgânica 
A ideia do vitalismo começou a declinar quando Wöhler (1800-1882), médico e químico sueco, em 1828,
sintetizou a ureia (substância anteriormente isolada da urina de animais) a partir do cianato de amônia,
reação que ficou conhecida como Síntese de Wöhler (Figura 2). Na realidade, Wöhler desejava obter
cianato de amônia e, para isso, tratou cianato de chumbo com hidróxido de amônia. Para sua surpresa,
obteve um material sólido, que não mostrou as propriedades típicas dos cianatos. Ao analisar o que
havia ocorrido, descobriu que havia obtido ureia, idêntica àquela anteriormente isolada de urina. Na
realidade, a reação do cianato de chumbo com hidróxido de amônia forma cianato de amônia que, por
aquecimento, gera ureia:
 
   
Figura 2: Síntese de Wöhler
Wöhler, então, escreveu para Berzelius dizendo: “Devo contar-lhe que eu posso fazer ureia sem o uso de
rins animais ou humanos”. Realmente, a experiência de Wöhler foi de grande importância, mas ainda
houve o questionamento do fato de que, na realidade, esses compostos deveriam ter a força vital, pois
o hidróxido de amônia e o ácido ciânico (fonte do cianato de chumbo) eram obtidos de fontes animais
(origem orgânica). O reconhecimento de que a teoria da força vital não tem grande aplicabilidade na
Química Orgânica foi ocorrendo gradualmente, na medida em que novos compostos orgânicos foram
sendo reconhecidos e sintetizados.
À medida que o vitalismo perde forças, aquela definição anterior proposta por Bergman (química dos
organismos vivos) deixa de ser adequada e, então, Kekulé (1829-1896), químico alemão,(químico
alemão, 1829-1896) propõe a definição da Química Orgânica como o ramo da Química que estuda os
compostos de carbono. Essa afirmação está correta, contudo, nem todo composto que contém
carbono é orgânico. Por exemplo, o dióxido de carbono, o carbonato de sódio, o ácido carbônico,
dentre outros, não são orgânicos. Mas, todo composto orgânico contém carbono.
Por conveniência, o termo orgânica se mantém até hoje, buscando classificar um grande número de
compostos que possuem uma série de propriedades em comum. Diferente dos outros elementos, o
 
 
 
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Química Orgânica 
átomo de carbono tem a capacidade de se ligar infinitamente entre si em um número ilimitado de
combinações, gerando, com essas ligações, milhares de compostos diferentes. Deve-se enfatizar,
contudo, que as divisões da Química nunca foram, nem se espera que venham a ser, mutuamente
exclusivas, pois o campo da Química é um só, e há uma tendência natural para a unificação e remoção
de barreiras artificiais. A divisão em Química Orgânica, inorgânica, analítica, físico-química e bioquímica
se faz buscando uma finalidade didática e em função do enfoque que se deseja dar a um determinado
problema.
Importância
A Química Orgânica está presente em qualquer atividade de nossas vidas. Nesse momento, por
exemplo, ao ler esse texto, tudo está sendo mediado por compostos orgânicos. Para conseguir
enxergar, seus olhos estão utilizando um composto orgânico (o cis-retinal) para converter a luz em um
impulso nervoso. Quando você mexe no “mouse”, no teclado, enfim, faz qualquer movimento (até
dormir) o seu organismo está fazendo uma reação química para transformar a glicose em energia. Para
que você possa raciocinar e entender esse texto ou perceber o mundo, os impulsos nervosos são
transmitidos entre os neurônios através da intermediação de moléculas orgânicas (neurotransmissores,
como, por exemplo, a serotonina).
A vida moderna está repleta de compostos orgânicos. A grande maioria dos medicamentos, vários
pesticidas, as fibras têxteis, os polímeros, os corantes...são moléculas orgânicas.
Como mostrado no breve resumo que se fez sobre a história da Química Orgânica, desde a pré-história
até meados do século XIX, os compostos orgânicos eram obtidos de organismos vivos. Atualmente,
apesar de muitas substâncias orgânicas naturais serem muito complexas e de difícil obtenção
laboratorial e, assim, ainda serem obtidas a partir de plantas ou animais, a maioria dos compostos
orgânicos são obtidos em laboratório. Os compostos são retirados dos organismos vivos (atualmente, o
ambiente marinho também tem se mostrado uma grande fonte de produtos orgânicos), estudados e
depois, se tiverem alguma aplicação, sintetizados. Assim, por exemplo, a gente já comentou que o
índigo, corante azul utilizado em “jeans”, antigamente era obtido de plantas. Porém, sua aplicação
industrial é tão grande que a obtenção da fonte natural não atenderia à demanda mundial. É aí que a
Química Orgânica moderna exerce o seu papel: atualmente, o índigo é obtido através de uma síntese
(chama-se síntese o processo de transformação de moléculas através de reações químicas para se obter
a molécula que se deseja). Dessa mesma forma, tem se sintetizado uma variedade enorme de
compostos orgânicos, cujo isolamento de fontes naturais tornaria o processo inviável economicamente.
Assim, vários compostos obtidos por síntese são exatamente iguais àqueles existentes nos
organismos vivos. Outras vezes, o químico faz algumas modificações nas moléculas naturais, obtendo
 
 
 
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Química Orgânica 
compostos semelhantes (denominados derivados), mas que apresentam maior aplicabilidade do que o
produto natural. Por exemplo, o ácido salicílico é isolado do salgueiro (família de plantas do gênero
Salix) e apresenta atividade anti-inflamatória. No entanto, possui também um efeito corrosivo nas
paredes do estômago. Assim, o derivado ácido acetil salicílico (AAS) foi sintetizado e é utilizado como
medicamento anti-inflamatório que possui menos efeito colateral que o primeiro. Repare como eles são
parecidos (Figura 3):
OH
COOH
O
COOH
O
ÁCIDO SALICILICO ÁCIDO ACETIL SALICILICO
 
Figura 3: Estruturas do ácido salicílico e do AAS
 
Com o crescimento da Química Orgânica e o acúmulo de informações obtidas hoje em dia, várias
moléculas de grande utilidade são obtidas por síntese química, muitas vezes sem ter nenhuma
correlação com produtos naturais.
 
Fonte de compostos orgânicos
Mas, se a maioria dos compostos orgânicos atualmente são obtidos por síntese, quais são as matérias-
primas para a sua obtenção?
Os compostos orgânicos utilizados como matéria-prima atualmente são obtidos de produtos naturais
(por exemplo, no Brasil, o álcool é obtido da fermentação - reação química realizada por micro-
organismos – do açúcar da cana e é utilizado para a síntese de éter) e, principalmente, de materiais
fósseis.
Até o século XX, a principal fonte de compostos orgânicos era o carvão mineral (denominado hulha). A
destilação da hulha fornece três frações constituídas respectivamente de: 1) Um material gasoso
constituído principalmente de hidrogênio e dióxido de carbono, que era muito utilizado para
iluminação e aquecimento; 2) Material líquido, denominado de alcatrão da hulha, e que é a fonte de
compostos orgânicos, e 3) Material sólido, denominado coque, utilizado em siderurgia para a obtenção
 
 
 
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do ferro gusa (liga de ferro e carbono – designa-se liga uma mistura homogênea de metais) matéria-
prima utilizada para a produção do lingote de ferro.
No século XX, o petróleo passa a constituir a principal fonte de compostos orgânicos.
Além de carbono e hidrogênio, vários outros elementos também estão presentes nos compostos
orgânicos. A tabela periódica a seguir mostra os principais elementos constituintes de compostos
orgânicos, estando em vermelho os elementos presentes em maiores quantidades.
 
1                          14  15  16     
H
   
  C  N  O   
   
 
Si P  S  Cl   
                               
Br
 
                              I   
                                 
Tabela 1: Tabela Periódica
Assim, o gás metano (principal constituinte do gás natural) possui apenas carbono e hidrogênio. A
sacarose (açúcar comum) possui carbono, hidrogênio e oxigênio. A anfetamina, um estimulante do
sistema nervoso central, possui, além de carbono e hidrogênio, nitrogênio. O colágeno, a elastina e as
glicoproteínas são as fibras responsáveis pela sustentação da derme e contém silício em sua estrutura.
O NAD (nicotinamida-adenina-dinucleotídeo) é um agente oxidante biológico que contém fósforo em
sua estrutura. O cheiro desagradável exalado pelo gambá é devido a dois compostos orgânicos que
contém carbono, hidrogênio e enxofre em sua estrutura. O policloreto de vinila (PVC) utilizado para a
fabricação de canos é constituído de átomos de carbono, hidrogênio e cloro. O halomon é um
composto que contém, além de carbono e hidrogênio, bromo e cloro em sua estrutura. Foi isolado de
uma alga marinha e possui atividade antitumoral (possibilidade de uso na terapia contra o câncer). A
tiroxina é o hormônio produzido pela tiroide e contém, além de carbono, hidrogênio, oxigênio,
 
 
 
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nitrogênio e iodo em sua estrutura. Daqui a pouco, quando a gente entender como as moléculas são
representadas, vocês vão ver a estrutura desses compostos.
Ligações Químicas Covalentes
Antes de começarmos a analisar o átomo de carbono e os compostos orgânicos, devemos recordar
sucintamente o processo pelo qual ocorrem as ligações químicas covalentes, isto é, aquelas que se
fazem por compartilhamento de elétrons.
Os elétrons em um átomo estão distribuídos nos orbitais atômicos (orbital é uma dedução matemática
que define a região do espaço onde existe maior probabilidade de se encontrar elétrons). Os orbitais
possuem tamanho e níveis energéticos diferentes (quanto mais afastado do núcleo, maior e mais
energético é o orbital) e, em função disso, são subdivididos nos subníveis s, p, d e f. Para o estudo da
Química Orgânica, vamos nos limitar aos subníveis s e p.
Os orbitais s possuem a forma esférica, isto é, a probabilidade de encontrar elétrons é maior na região
do espaço definida por uma esfera:
 
 
Figura 4: a) ORBITAL 1s b) ORBITAL 1s (preto) e 2s (cinza)
 
Os orbitais p tem a forma de um haltere e, como são três, orientam-se no espaço ao longo dos eixos
cartesianos x, y e z (Figura 5):
 
 
 
 
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Figura 5: a) ORBITAL 2p b) ARRUMAÇÃO ESPACIAL DOS ORBITAIS 2px, 2py e 2pz
 
Os orbitais 3p e 4p possuem a mesma forma de haltere, só que se encontram mais afastados do núcleo
(e, então, são maiores e mais energéticos). A região do espaço entre os dois lobos do haltere é
denominada nodo e, nessa região, não há probabilidade de se encontrar elétrons. Os orbitais dos
subníveis s não possuem nodo. Para simplificar o desenho dos orbitais, normalmente eles são
apresentados da seguinte forma (Figura 6):
 
 
   
 
 
 
 
 
Figura 6: a) Representação dos orbitais s e p; b) Orbitais p orientados nos eixos cartesianos
 
Quando ocorre uma ligação química covalente, os orbitais atômicos do último nível (orbitais ocupados
pelos elétrons de valência) vão se aproximando, encontram-se, e formam um novo orbital (orbital
molecular) onde vão se posicionar os dois elétrons, que, agora passam a ser compartilhados pelos dois
núcleos dos átomos que se aproximaram, ou seja, os orbitais moleculares são ocupados pelos dois
elétrons que formam a ligação.
 
 
 
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Por exemplo, vamos ver como ocorre a formação da ligação entre dois átomos de hidrogênio para
formar a molécula do gás hidrogênio. Para obedecer a regra do octeto, cada átomo de hidrogênio deve
ficar com dois elétrons.
A distribuição eletrônica do átomo de hidrogênio (1
H) é 1s1
e, consequentemente, vai ocorrer uma
interação entre dois orbitais s:
 
1s
σ
ORBITAL MOLECULAR
1s
 
 
Figura 7
Observe que a interação entre estes dois orbitais ocorre segundo um mesmo eixo, ou seja, ocorre
uma interação linear dos dois orbitais. O orbital resultante desse tipo de interação é denominado
orbital sigma (σ) e a ligação resultante é denominada ligação sigma (σ). A representação estrutural
de uma ligação química é feita por um traço (-) e, assim, a molécula do hidrogênio é representada com a
seguinte fórmula estrutural: H-H.
Mas, se os orbitais são ocupados por elétrons e esses possuem carga negativa, como os orbitais se
aproximam, se cargas iguais tendem a se repelir?
Nota ao professor:
Para uma melhor compreensão do aluno do Ensino Médio, as representações
que se seguem não obedecem plenamente à TEORIA DA COMBINAÇÃO
LINEAR DOS ORBITAIS ATÔMICOS (CLOA) e, portanto, conceitos relativos à
formação de orbitais moleculares somente levam em conta os orbitais
ligantes, descartando-se a formação de antiligantes que não se aplicam às
necessidades dos alunos nessa fase de aprendizagem.
 
 
 
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O que ocorre é uma atração eletrostática (atração entre cargas opostas) entre o núcleo (carga positiva
devido aos prótons) e os orbitais (cargas negativas porque os elétrons estão aí). Assim, o núcleo de um
átomo atrai a nuvem eletrônica do outro até o momento em que a aproximação dos dois orbitais gera
uma repulsão eletrostática, e aí acaba o processo de formação da ligação. Nessa situação, há um
equilíbrio entre as forças de atração e repulsão, resultando numa distância internuclear de maior
estabilidade Essa distância internuclear é o que denominamos de comprimento (ou distância) da
ligação, cuja unidade mais utilizada é o Angstron (Ao
; 1 Ao
= 10 –10
m). O comprimento da ligação H-H é
de 0,74 Ao
.
Em um segundo exemplo, vamos ver como ocorre a formação da ligação da molécula do cloro, onde a
interação acontece entre dois elétrons que ocupam os orbitais 3p (17
Cl: 1s2
2s2
2p6
3s2
3p5
) :
σ
ORBITAIS ATÔMICOS 3p
ORBITAL MOLECULAR
3p
3p
 
 
Figura 8
 
Observe que, assim como para a formação da molécula de hidrogênio, a interação dos orbitais é linear,
segundo um mesmo eixo. Logo, a ligação que se forma também é uma ligação σ. O comprimento dessa
ligação é de 1,42 Ao
.
Na formação da molécula de ácido clorídrico (HCl) ocorre a interação entre um orbital 1s do hidrogênio
com um 3p do cloro:
 
 
 
 
 
 
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1s σORBITAL MOLECULAR3p  
 
Figura 9
 
Como para os outros exemplos, a interação dos orbitais ocorre linearmente, formando uma ligação σ. O
comprimento da ligação H-Cl é de 1,27 Ao
.
Nos exemplos vistos acima, todas as ligações ocorreram segundo um mesmo eixo, ou seja, foram
realizadas interpenetrações lineares de orbitais gerando ligações σ. Entretanto, nem sempre isso é
possível, pois quando mais de uma ligação é realizada entre dois átomos, uma delas ocorre segundo um
mesmo eixo, porém as demais, em função do próprio arranjo espacial dos orbitais, não podem ocorrer
dessa forma, visto que os demais orbitais envolvidos não estão alinhados segundo esse mesmo eixo,
mas sim em eixos normalmente paralelos. Sendo assim, a interpenetração não ocorre de forma linear e
as ligações são estabelecidas segundo eixos paralelos, distinguindo-se da sigma (σ) e são
denominadas de ligações pi (π):
Como exemplo, vamos ver a formação da molécula de nitrogênio (7N: 1s2
2s2
2p3
). Pela configuração
eletrônica do átomo, há três orbitais p, cada um com um elétron: 2px
1
2py
1
2pz
1
. Os orbitais 2px
1
(essa
escolha 2px foi arbitrária. A ligação poderia ser feita entre os 2py ou 2pz) se superpõem ao longo do eixo
x (eixo internuclear) e formam uma ligação σ:
 
 
 
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σORBITAIS ATÔMICOS2p ORBITAL MOLECULAR  
 
Figura 10
E as outras duas ligações?
As outras duas ligações são feitas por entrosamento orbitalar paralelo, perpendicular ao eixo da ligação
σ, formando duas ligações π:
 
ORBITAIS ATÔMICOS2py
ORBITAIS ATÔMICOS2pz
 
Figura 11: a) Representação dos orbitais na molécula de N2; b) Representação da molécula de N2.
 
Observem que, nesse entrosamento paralelo dos orbitais p, cria-se dois orbitais moleculares π que
originam, na molécula, regiões ricas em elétrons (orbitais π) que se posicionam acima e abaixo do plano
da ligação σ (Figura 11).
Portanto, uma das ligações covalentes entre dois átomos é chamada de sigma (σ) e as demais, entre
esses mesmos átomos, é chamada de pi (π). Assim, numa dupla ligação, é encontrada uma ligação
sigma (σ) e uma pi (π); numa tripla ligação, é encontrada uma ligação sigma (σ) e duas pi (π). Quando
não há presença de duplas ou triplas ligações nas moléculas todas são classificadas como sigma.
 
 
 
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Ligações Covalentes Polares e Apolares
Os elétrons nas ligações covalentes não são necessariamente compartilhados igualmente entre os dois
átomos que formam a ligação. Se um átomo for mais eletronegativo (eletronegatividade é a tendência
que possuem determinados átomos de atrair elétrons) que o outro, o átomo mais eletronegativo vai
puxar os elétrons para mais perto dele. Quando isso ocorre, dizemos que a distribuição eletrônica é
polarizada e a ligação é dita covalente polar. Por exemplo, na molécula de H-F, como o flúor é mais
eletronegativo que o hidrogênio, os elétrons da ligação vão estar mais próximos do flúor. Assim, a
ligação H-F é uma ligação covalente polar, na qual o flúor possui uma carga parcial negativa (a carga é
denominada parcial para distingui-la da carga formal, que é a carga real presente nos cátions e ânions).
As formas mais utilizadas para representar essa polarização são os símbolos δ+
δ‐
para representar
cargas parciais ou uma seta orientada no sentido do átomo menos eletronegativo para o mais
eletronegativo:
 
H F
δ
+
δ
-
H Fou  
 
Figura 12
Na tabela periódica, a eletronegatividade cresce da esquerda para a direita e de baixo para cima. Linus
Pauling (químico americano, 1901-1994) estudou muito as ligações químicas. A tabela da escala de
eletronegatividade de Linus Pauling é muito utilizada cotidianamente:
 
  E    E 
F  4,0  I  2,5 
O  3,5  C  2,5 
N  3,0  S  2,5 
Cl  3,0  H  2,1 
Br  2,8     
Tabela 2: Tabela de eletronegatividade de Linus Pauling
 
 
 
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O Átomo de Carbono
Hibridização
Hibridização sp3
O carbono encontra-se situado na família 14 da classificação periódica e possui número atômico igual a
6. Portanto, possui seis prótons em seu núcleo e seis elétrons em sua eletrosfera. Na natureza, são
encontrados três isótopos (isótopos são elementos químicos de um mesmo átomo, cuja diferença entre
eles está no número de nêutrons) do carbono de números de massa 12, 13 e 14, cada um deles com
número de nêutrons igual a 6, 7 e 8, respectivamente. O isótopo 12
C está presente em 99% dos átomos
de carbono existentes na Terra, enquanto o 13
C é encontrado no 1% restante. O 14
C é um radioisótopo
(um radioisótopo é um isótopo instável que emite energia ao se transformar no isótopo mais estável),
que ocorre na Terra na proporção de 1 para 1 trilhão (0,0000000001%) e é muito utilizado em processos
de datação de fósseis. A distribuição eletrônica por subníveis, em ordem crescente de energia para esse
elemento é 1s2
2s2
2p2.
 
energia
1s
2s
2px 2py 2pz
ORBITAIS ATÔMICOS DO CARBONO
(Distribuição Eletrônica)  
Figura 13
Se analisarmos a distribuição eletrônica do carbono (acima), e formos fazer o tratamento que estamos
habituados para as ligações químicas (regra do octeto), haveria duas possibilidades:
1) O carbono faria duas ligações usando os orbitais mono-ocupados e aí seria divalente e não
obedeceria a regra do octeto (ficaria com seis elétrons no último nível).
2) O carbono faria três ligações, sendo que em uma delas ambos os elétrons seriam cedidos por outro
átomo.
 
 
 
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Entretanto, Kekulé, em 1857, já havia mostrado experimentalmente que nos compostos orgânicos o
carbono é sempre tetravalente (isto é, faz quatro ligações) e essas quatro ligações são covalentes.
Assim, a molécula do metano (CH4) é formada por quatro ligações σ C-H idênticas, como mostrado na
fórmula estrutural plana (fórmula estrutural plana é uma representação molecular em que não nos
preocupamos em mostrar os ângulos que os orbitais moleculares fazem entre si):
C
H
H
H
H
 
Figura 14
Como explicar, então, essa tetravalência do carbono?
O modelo que usamos para isso é o que se denomina hibridização de orbitais. Nesse processo, ocorre
uma combinação dos quatro orbitais atômicos do último nível (2s + 2px + 2py + 2pz) formando quatro
novos orbitais atômicos idênticos. Como essa combinação ocorreu entre um orbital s e três orbitais p,
esses novos orbitais são designados sp3
:
 
+ + +
2s 2px 2py 2pz
sp3
sp3 sp
3
sp3
 
Figura 15
Analogicamente, esse processo pode ser comparado ao significado do termo hibridização em Biologia.
Por exemplo, uma mula é um híbrido resultante do acasalamento de duas espécies diferentes: jumento
 
 
 
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e égua. Ela não é um jumento, nem uma égua. É uma mula, espécie diferente, resultante da hibridização
de outras duas espécies.
Os orbitais atômicos híbridos sp3
não são orbitais s nem p, mas novos orbitais advindos da hibridização
daqueles.
A distribuição eletrônica nesses novos orbitais segue a regra de Hund (físico alemão, 1896-1997): ao ser
preenchido um subnível, cada orbital desse subnível recebe apenas um elétron. O orbital só receberá
um segundo elétron quando todos os orbitais daquele subnível já possuírem um elétron. Assim, após a
hibridização, cada orbital sp3
do carbono possuirá um elétron:
energia
1s
2s
2px 2py 2pz
ORBITAIS ATÔMICOS DO CARBONO
HIBRIDIZAÇÃO
energia
1s
2sp3
ORBITAIS ATÔMICOS HÍBRIDOS
DO CARBONO
2sp3 2sp3
2sp3
 
Figura 16
Com essa nova distribuição eletrônica fica fácil entender que na molécula do metano formam-se quatro
ligações σ resultantes da interação orbitalar de cada um dos orbitais híbridos do carbono com um
orbital s do hidrogênio.
 
C
H
H
H
H
Quatro ligações σ C-H
resultantes da interação
do orbital sp3
do C com o
s do hidrogênio.  
 
Figura 17
 
 
 
.  17 . 
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Química Orgânica 
Mas, de que forma (arranjo espacial) esses orbitais se posicionam em torno do núcleo do átomo de
carbono?
Os elétrons têm carga negativa e, por conta da repulsão eletrostática, os quatro orbitais vão querer estar
o mais afastados possível. A figura geométrica com quatro vértices onde estes estão o mais afastados
possível um do outro é o tetraedro e, assim, os quatro orbitais sp3
estão arrumados ao redor do
átomo de carbono em um arranjo tetraédrico:
 
 
Figura 18
 
A interação dos átomos de hidrogênio ocorrerá com o átomo de carbono nesse arranjo e daí resultará
que a molécula do metano possuirá, também, este arranjo:
 
 
Figura 19
Assim, a molécula do metano arranja-se espacialmente como um tetraedro e os ângulos formados por
suas ligações são de 109,5o
, característico de um tetraedro regular. Isso é bem visualizado no modelo
vareta e bola mostrado abaixo:
 
 
 
 
.  18 . 
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Química Orgânica 
 
109,5o
 
Figura 20
Para facilitar o desenho dessa representação estrutural do metano, usamos uma fórmula estrutural
conhecida como modelo cunha e traço, em que os dois vértices do tetraedro situados no plano do
papel são desenhados como uma linha comum. O vértice que se projeta para frente desse plano é
desenhado por uma cunha em negrito e o que se projeta para trás é representado por uma cunha
pontilhada:
 
H
C
H H
H
" para atrás" do plano do papel
"para a frente" do plano do papel  
 
Figura 21
 
Finalmente, deve-se ressaltar que esse modelo de hibridização orbitalar e arranjo tetraédrico em torno
do carbono é aplicável para qualquer composto orgânico no qual o carbono realiza quatro ligações σ.
Isso pode ser visto nos modelos vareta e bola e em cunha e traço para as moléculas do etano e
propano (Figura 22):
 
 
 
.  19 . 
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Química Orgânica 
H
C C
H
H
H
H
H
H
C
C
C
H
H H
H H
H
H
ETANO
PROPANO
 
Figura 22: Modelo vareta e bola e cunha e traço para as moléculas do etano e propano.
Hibridização sp2
:
Assim como já vimos para a molécula de nitrogênio, existem compostos orgânicos que possuem em
sua estrutura ligações π . Esse é o caso, por exemplo, dos gases etileno e acetileno:
 
H
C C
H
H
H
C C HH
σ
σ
σ
σ
σ
σ σ σ
π
π π
ETILENO ACETILENO 
Figura 23
 
Mas, a ligação π ocorre pelo entrosamento paralelo de orbitais p. No modelo de hibridização proposto
para moléculas do metano, e válido para todos os compostos que possuem carbono que só faz ligação
σ – ou seja, o modelo de formação de orbitais atômicos sp3
– não resta nenhum orbital p com apenas
um elétron, condição necessária para fazer uma ligação π.
Como ocorre a formação dessa ligação? Vamos iniciar explicando a molécula do etileno (com uma
ligação π):
Agora, ocorre uma hibridização entre o orbital 2s e apenas dois dos três orbitais p, gerando três orbitais
atômicos híbridos sp2
(repare que é a combinação de um orbital s com dois p, daí a designação sp2
) e
restando um p já ocupado anteriormente:
 
 
 
.  20 . 
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+ +
2s 2px 2py 2pz
sp2
sp2 sp2 2pz
 
 
Figura 24
 
Na figura acima, o processo foi mostrado sem o envolvimento do orbital 2pz. Essa escolha foi aleatória e
pode ocorrer com qualquer um dos três orbitais p.
Após a distribuição eletrônica nos orbitais híbridos fica fácil entender como ocorre a ligação C=C no
etileno:
 
energia
1s
2s
2px 2py 2pz
ORBITAIS ATÔMICOS DO CARBONO
HIBRIDIZAÇÃO
energia
1s
2sp2
ORBITAIS ATÔMICOS HÍBRIDOS
DO CARBONO
2sp2 2sp2
2p
 
 
Figura 25
 
Dos três orbitais sp2
, dois vão se ligar ao orbital s do hidrogênio e o terceiro vai se ligar ao outro átomo
de carbono, gerando as ligações σ. O orbital p vai se ligar ao outro orbital p, formando a ligação σ C‐C. 
 
 
 
.  21 . 
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Química Orgânica 
 
 
Figura 26
 
Observe que o entrosamento paralelo dos orbitais p gera uma nuvem eletrônica acima e abaixo do
plano definido pela ligação σ C-C.
Da mesma forma que vimos para o arranjo espacial dos orbitais sp3
, os orbitais sp2
, devido à repulsão
das cargas entre seus elétrons, posicionam-se no centro de um triângulo equilátero (ângulo de 120o
entre eles) e o orbital p fica perpendicular ao plano desse triângulo. A esse tipo de arranjo designamos
trigonal planar e a ligação C=C terá sempre esse arranjo (Figura 27):
 
 
 
Figura 27: a) Representação do C sp2: três orbitais sp2 arrumados em um triângulo equilátero e um orbital p
perpendicular a esse triângulo; b) Ângulo de 120º entre os orbitais sp2 e de 90º entre um orbital sp2 e o orbital p;
c) Arranjo orbitalar na molécula do etileno: H2C=CH2
Por que a ligação C=C é planar? Já comentamos que a ligação p ocorre por um entrosamento paralelo
de orbitais p. Para que fiquem paralelos, eles têm de estar no mesmo plano. Esse paralelismo tem uma
consequência importante para todas as moléculas que têm ligação π. Repare que na formação de
ligações σ o entrosamento orbitalar é linear, resultando em uma ligação que dizemos possuir simetria
cilíndrica, como podemos ver para a ligação C-C do etano: ACHO QUE NÃO DAR PARA EXCLUIR O
SÍMBOLO SIGMA POIS SÓ NESSA LIGAÇÃO O ENTRPOSAMENTO DA LIGAÇÃO È LINEAR.
 
 
 
.  22 . 
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Química Orgânica 
 
C C
H
H
H
H
H
H  
 
Figura 28
 
As ligações que possuem simetria cilíndrica possuem rotação livre e é isso o que ocorre, na realidade.
As moléculas não são entidades estáticas, estão sempre em constante movimento e as ligações
simples giram o tempo todo.
Mas, o que ocorreria se a ligação C=C girasse? Os orbitais p perderiam seu paralelismo, ou seja, não
aconteceria entrosamento orbitalar. Em outras palavras, a ligação química se quebraria (Figura 29). Por
conta disso, as ligações π não possuem rotação livre.
 
 
Figura 29: Quebra da ligação π em um suposto movimento de rotação
 
Hibridização sp:
Vamos ver agora o que ocorre com a molécula do acetileno que possui uma ligação tripla CΞC:
 
 
Como já vimos, uma ligação tripla significa uma ligação e duas . Para isso ocorrer, dois orbitais p
devem ficar fora do processo de hibridização, ou seja, a combinação orbitalar (hibridização) deve
ocorrer entre um orbital s e um orbital p. Por conta disso, os dois orbitais híbridos resultantes são
designados sp.
C C HH
 
 
 
.  23 . 
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+
2s 2px 2py 2pz
sp sp 2pz2py
 
 
Figura 30
 
A distribuição eletrônica do átomo de carbono após a hibridização sp mostra que existem dois orbitais
híbridos sp que farão duas ligações σ (no caso do acetileno, uma será com o carbono e a outra com o
hidrogênio) e dois orbitais p, que por entrosamento paralelo dois a dois formarão as duas ligações π. 
Lembre-se que os dois orbitais p são perpendiculares entre si e, consequentemente, após a formação
das duas ligações π essas também serão perpendiculares entre si. Assim, a molécula do acetileno
possui duas nuvens eletrônicas abaixo e acima do plano da ligação σ e outras duas nuvens eletrônicas
localizadas na frente e atrás desse plano:
 
 
Figura 31
 
Por analogia ao arranjo tetraédrico do carbono com orbitais híbridos sp3
e trigonal planar do carbono
com orbitais híbridos sp2
, os orbitais híbridos sp se arranjam de forma linear, um do lado oposto ao
outro, pois é nessa arrumação que as duas nuvens eletrônicas estarão o mais afastadas possível.
Já comentamos sobre a característica peculiar do átomo de carbono de realizar ligações C-C
infinitamente, gerando compostos diferentes ou, como costumam dizer os químicos, com uma
variedade enorme de cadeias carbônicas. É importante ficar claro que em uma mesma cadeia
carbônica podemos ter ligações simples (orbital sp3
), duplas (orbital sp2
) e triplas (orbital sp). Não
 
 
 
.  24 . 
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Química Orgânica 
precisamos fazer toda a análise orbitalar para prever como essas cadeias estão arrumadas no espaço.
Basta observar os tipos de ligações que os átomos de carbono estão fazendo: se o carbono só possuir
ligações simples, essas são todas σ e o carbono é tetraédrico (sp3
); se o carbono possuir ligação dupla,
uma é σ e a outra π e o carbono é trigonal planar (sp2
); se o carbono possuir ligação tripla, uma é σ e as
outras duas são π e o carbono é linear (sp).
Por exemplo, na molécula ao lado, os carbonos que
eu chamei de 1 e 2 são sp2
e trigonal planares. Os
carbonos 3 e 6 são sp3
e tetraédricos, enquanto os
carbonos 4 e 5 são sp e lineares.
Figura 32
 
Não é apenas no átomo de carbono que ocorre a
hibridização de orbitais. O modelo de hibridização pode ser
aplicado para explicar a ligação em qualquer átomo. Por
causa disso, outros átomos ligados ao carbono também
podem estar hibridizados. Na molécula da supercola, por
exemplo, o carbono e o nitrogênio da ligação CΞN são sp, o
oxigênio e o carbono da ligação C=O são sp2
e o carbono e
oxigênio da ligação C-O são sp3
.
O comprimento das ligações também é diferente, em função do tipo de ligação. Observe que uma
esfera (orbital s) está mais próxima do núcleo atômico que um haltere (orbital p). Por conta disso,
quanto maior for o caráter s do orbital híbrido, mais curta vai ser a ligação (vai estar mais perto do
núcleo). Assim, as ligações triplas onde a ligação σ (é ela quem define o comprimento da ligação por
conta do entrosamento linear) é formada pelo carbono sp (50% de s + 50% de p) são mais curtas que as
ligações duplas (sp2
: 33,3% s + 66,7% p), que, por sua vez, são mais curtas que as ligações simples (sp3
:
25% de s + 75% de p). Observe abaixo o comprimento (em vermelho) e os ângulos (em azul) das
ligações para o etano, etileno e acetileno: O QUE FOI EXCLUÍDO?
 
 
 
 
 
H
C
H C
H
C
C
C H
C
H H
H
H
1
2
3
4
5
6
 
H
C
H C
C
N
O
O C H
H H
Super-cola  
Figura 33
 
 
 
.  25 . 
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Figura 34
 
Resumindo, em termos de comprimento de ligação: C-C > C=C > C C
 
 
Representação dos Compostos (“Desenhando As Moléculas”)
Quando estudamos Química Orgânica, o que buscamos é entender a maneira pela qual os átomos se
encontram nas moléculas (arranjo molecular), ou seja, como eles estão ligados entre si, as
propriedades químicas que são consequência dessa arrumação e a maneira pela qual as estruturas
moleculares se modificam quando ocorre uma reação química.
Para alcançar esses objetivos, o primeiro passo deve ser o entendimento das representações que
utilizamos para tentar descrever as moléculas. Em outras palavras, precisamos entender e aprender o
que queremos dizer quando representamos as moléculas por fórmulas. Devemos nos lembrar sempre
que a representação de uma coisa não é a coisa. Assim, por exemplo, a foto do namorado ou da
namorada não é o namorado ou a namorada: é a representação dele ou dela.
Os químicos utilizam diversas maneiras para representar as moléculas. Não existe uma mais correta que
a outra. O tipo de representação que usamos vai depender do problema que estamos analisando.
A fórmula molecular, por exemplo, apenas informa quais são e a quantidade dos átomos presentes em
uma molécula. Ela não informa nada sobre a estrutura (como os átomos estão ligados na molécula)
molecular. Por causa disso, é muito comum que duas moléculas diferentes possuam a mesma fórmula
molecular. Por exemplo, o álcool etílico (aquele que nós conhecemos simplesmente por álcool) e o éter
metílico são dois compostos completamente diferentes. Mas, repare que os dois possuem a mesma
fórmula molecular (C2H6O). Compostos diferentes que possuem a mesma fórmula molecular são
denominados isômeros.
 
 
 
.  26 . 
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Química Orgânica 
 
 
 
Figura 35
Como a fórmula molecular não informa nada sobre a estrutura molecular, não conseguimos, a partir
dela, entender o comportamento da molécula. Mas ela é muito útil quando, por exemplo, estamos
realizando cálculos estequiométricos (cálculo das quantidades de substâncias envolvidas em uma
reação química).
No entanto, na maioria das vezes em que estamos lidando com a Química, precisamos tentar entender
como as moléculas se comportam e, para isso, é fundamental que se represente como os átomos estão
unidos entre si dentro da molécula, isto é, precisamos representar a conectividade dos átomos. As
fórmulas que mostram essa conectividade são denominadas fórmulas estruturais. Compostos que
possuem fórmulas estruturais diferentes são diferentes.
Existem várias maneiras de se representar a fórmula estrutural de uma molécula. As mais usadas estão
mostradas a seguir para o álcool etílico:
 
 
 
Figura 36
 
 
 
 
.  27 . 
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As fórmulas estruturais condensadas e as fórmulas de traços mostram a conectividade dos átomos,
mas não mostram a geometria molecular (as moléculas são entidades tridimensionais e têm uma
arrumação no espaço). Observe, ao analisarmos a fórmula em traços, que a cadeia carbônica é
apresentada linearmente e não nos preocupamos com os ângulos das ligações. As fórmulas
condensadas e de traços nos dão basicamente as mesmas informações sobre a molécula.
A fórmula estrutural plana nos fornece mais informações sobre a geometria da cadeia carbônica. Na
realidade, tendo em vista os ângulos de 109,5º do carbono sp3
, as cadeias carbônicas se arrumam como
um zigue-zague (“sobe e desce”) e esse tipo de fórmula estrutural representa isso. Na fórmula
estrutural espacial, além da representação em zigue-zague das cadeias carbônicas, são também
mostradas as cunhas que representam os átomos que estão se posicionado nos outros dois vértices do
tetraedro. Nesse tipo de representação estrutural buscamos mostrar toda a geometria molecular.
A fórmula estrutural em traços (também chamada fórmula em bastão) é centrada na representação
das ligações e não dos átomos (repare que na representação do álcool etílico usando essa fórmula só
desenhamos o oxigênio e o hidrogênio ligados a ele).
As fórmulas em traços são desenhadas da seguinte maneira:
1a
etapa: Desenhe a cadeia de carbono como traços e em zigue-zague. Não represente o símbolo do
carbono (C) nem do hidrogênio (H) quando ele estiver ligado ao carbono. Entretanto, você não pode
esquecer nunca que o carbono é tetravalente. Assim, cada vértice da cadeia em zigue-zague representa
o átomo de carbono e se mais nada estiver escrito nela, significa que ali existem dois hidrogênios,
sendo um localizado para frente do plano criado pela cadeia e outro para trás desse plano, de acordo
com a geometria do tetraedro.
2a
etapa: Todos os átomos que não são carbonos devem ter os seus símbolos mostrados, bem como o
hidrogênio que não está ligado ao carbono.
Vamos entender isso com a fórmula em traços do álcool etílico:
 
 
 
.  28 . 
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O H
As extremidades da cadeia
representam
um átomo de carbono
Cada vértice do zigue-zague
representa um átomo de carbono
Este átomo de carbono
tem três hidrogenios ligados
a ele, pois só estamos mostrando
uma ligação (traço) e 4-1=3
Este átomo de carbono
tem dois hidrogenios ligados
a ele, pois estao sendo mostradas
duas ligaões : C-C e C-O e 4-2=2
Este hidrogênio deve ser desenhado porque
ele não está ligado ao carbono.
 
Figura 37
 
Por uma questão de simplificação, é muito comum a gente não desenhar o traço que representa a
ligação do hidrogênio com o heteroátomo (chamamos de heteroátomo a todo átomo da cadeia
carbônica que não é carbono ou hidrogênio):
 
As ligações duplas devem ser representadas por dois traços e as triplas por três traços:
 
OH
O
H
H H
O
O H
H
H  
 
H C C
H
H
H
H
H
 
Figura 38
 
Preste atenção que, no caso da ligação dupla, a cadeia foi desenhada em zigue-zague e, na ligação
tripla, fomos fiéis ao ângulo de 180o
(repare que desenhamos essa parte da molécula linearmente). Isso
porque é muito difícil distinguir desenhando um ângulo de 109,5o
de um de 120o
. O Importante é você
sempre lembrar que nessa parte da cadeia os carbonos possuem um arranjo trigonal planar.
OH Observe que não desenhamos o traço
que representa a ligação O-H  
 
 
 
.  29 . 
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Química Orgânica 
É muito comum a gente misturar a forma de representação em traços com a condensada na parte da
molécula que temos os heteroátomos:
H
H H
O
OH
H
H
COOH ou CO2H
 
Figura 39
Outra coisa que você vai ver muito são representações deste tipo:
NH2
, e aí fica a pergunta: ué, o carbono não é tetraédrico? Esse nitrogênio não está para
frente ou para trás do plano da cadeia carbônica? A resposta é: está sim. O que estamos dizendo nessa
representação é:
1) Não sabemos se o arranjo espacial desse nitrogênio (mais tarde vamos entender que ele estar para a
frente ou para trás do plano pode gerar compostos diferentes); ou
2) Para o estudo que estamos fazendo não faz diferença saber para que lado está o átomo de
nitrogênio.
As cadeias carbônicas não são sempre abertas. Elas também podem ser cíclicas e os ciclos também são
representados em traços:
 
C
C
C C
C
H H
H
H
H
H
H
H
H
H
C
C
C
C
C
C
H
H
H
H
H
H
 
Figura 40
As representações em traços possuem a vantagem de facilitar os desenhos das moléculas. Em virtude
da propriedade do carbono de realizar ligações C-C infinitamente, existem moléculas enormes e se
fossemos desenhar todos os átomos, além da perda de tempo, o resultado ia ser extremamente
confuso. Por exemplo, a molécula da palitoxina (Figura 41), uma toxina marinha extremamente
 
 
 
.  30 . 
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Química Orgânica 
venenosa isolada de corais da espécie Palythoa (ainda bem que até hoje não encontramos esse coral
nos nossos mares!), tem fórmula molecular C129H221O54N3:
 
 
Figura 41: a) Corais marinhos da espécie Palythoa caribaeorum; fórmula estrutural em traços da palitoxina.
 
Imagine o trabalho que daria desenhar a fórmula estrutural espacial dessa molécula. Tente e veja... você
vai desistir rapidinho!
Agora que já sabemos interpretar a representação das moléculas orgânicas, podemos visualizar (e
entender o que as representações querem dizer) as fórmulas estruturais das substâncias citadas no
início desse texto (Figura 42), quando aprendemos sobre os átomos que aparecem com mais frequência
nos compostos orgânicos (lembra, foi quando vimos os elementos da tabela periódica que mais
aparecem nos compostos orgânicos).
 
 
 
 
 
.  31 . 
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Cl Cl Cl Cl
Policloreto de vinila (PVC)
Polímero utilizado para a
fabricação de canos
O
N
H
O
NH2
OH
HH
OH
H
O
P O P
O
H
HH
OH
H
O
OH
N
N
N
N
O
O
O
O
NH2
Nicotinamida-adenina-dinucleotídeo
(NAD)
Cl
Cl Br
Br
Cl
Halomon
Medicamento utilizado
em quimioterapia (tratamento de cancer)
OI
HO
I
I
I
CO2H
NH2
Tiroxina
Hormônio produzido pela
tiróide
O O
OH
OH
HO
HO
O
HO
OH
OH
OH
Sacarose (açucar comum)
NH2
Anfetamina
(estimulante do SNC)
SH SH
2-buteno-tiol 3-metil-2-buteno-tiol
(substâncias exaladas pelo gambá)
 
 
Figura 42: Exemplos de representações de algumas moléculas orgânicas importantes.
 
Toda ciência, talvez para que as pessoas que trabalham com ela possam se identificar como um grupo,
possui uma linguagem própria. Com a Química não é diferente. Daqui a pouco nós vamos aprender a
nomear os compostos orgânicos. Mas, antes disso, devemos saber como se classificam as cadeias
orgânicas:
- Em função da presença ou não de ciclo (também chamamos de anel), a cadeia é classificada em cíclica
ou acíclica (ou aberta):
 
 
 
 
.  32 . 
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Química Orgânica 
 
 
 
Figura 43
- Em função da presença de ligações π entre os átomos de carbono, as cadeias são classificadas em
saturadas ou insaturadas. As cadeias insaturadas são as que possuem ligação π entre átomos de
carbono.
 
 
 
Figura 44
 
 
 
.  33 . 
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Química Orgânica 
Esta definição causa certa polêmica entre os químicos. A molécula de cadeia aberta constituída apenas
por átomos de carbono e hidrogênio tem sempre a fórmula molecular CnH2n+2, isto é, o número de
hidrogênios é sempre o dobro do de carbonos:
 
 
 
Figura 45
As moléculas desse tipo são ditas saturadas. A partir daí, insaturadas seriam aquelas que não obedecem
a essa regra. Observe nas moléculas:
 
Figura 46
 
A presença de uma ligação π diminui em 2 (C4H10 x
C4H8) o número de hidrogênios e diz-se que a
molécula tem uma insaturação. A presença de duas
ligações π (duas ligações duplas ou uma tripla)
diminui em 4 o número de hidrogênios e a molécula
tem duas insaturações. Mas, observe uma cadeia
cíclica:
 
        Figura 47
 
 
 
.  34 . 
Sala de Leitura 
Química Orgânica 
Também diminui em dois o número de hidrogênios, ou seja, a molécula tem uma insaturação e essa
cadeia cíclica seria dita insaturada, embora não tenha nenhuma ligação π.
Afinal, insaturação é quando tem ligação π entre átomos de carbono ou é diminuição do número de
hidrogênios em relação à molécula saturada? Para evitar essa confusão, tem sido uma tendência
designar cadeia insaturada apenas aquelas que possuem ligações π entre carbonos e, para o enfoque
de diminuição de hidrogênios, dizemos “cadeias com deficiência de hidrogênio”, caso em que se
incluem as cadeias cíclicas.
- Quanto à presença ou não de heteroátomos (lembrem-se: heteroátomos são átomos diferentes de
carbono e hidrogênio) na cadeia, estas são chamadas de cadeias homogêneas ou heterogêneas:
 
 
Figura 48
 
Normalmente, os ciclos contendo heteroátomos chamamos de heterociclos. Os outros seriam os
homociclos, que em geral a gente se refere apenas como ciclos (não usamos o prefixo “homo”).
 
 
 
.  35 . 
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Química Orgânica 
- As cadeias carbônicas podem ainda ser classificadas em ramificadas ou não ramificadas. Analise a
molécula abaixo:
 
Figura 49
Observe que o segundo carbono possui ligado a ele – além, é claro, do resto da cadeia – uma cadeia
menor, constituída de dois átomos de carbono. Essa cadeia menor nós chamamos de ramificação (em
analogia aos ramos de uma árvore que saem do tronco principal), e as cadeias que as contêm são
designadas ramificadas. A cadeia maior é chamada de cadeia principal.
Não é obrigatório que se desenhe a cadeia principal na horizontal. Essa é apenas a forma mais comum.
O importante é você saber que a cadeia principal é sempre a que contém maior número de átomos
de carbono. Abaixo, por exemplo, estão mostradas três representações da mesma molécula cuja cadeia
principal (destacada em vermelho) tem 6 átomos de carbono:
 
 
Figura 50
É importante que se tenha claro que só chamamos de ramificação cadeias carbônicas. Heteroátomos
ligados à cadeia carbônica não são considerados ramificações:
Cadeia ciclica insaturada
ramificada ( o ciclo é a
cadeia principal)
OH
Cadeia ciclica insaturada
não ramificada
N
Cadeia aciclica saturada
não ramificada
 
Figura 51
1 2
3
4
5  
 
 
 
.  36 . 
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Química Orgânica 
Em função do número de ramificações, o carbono sp3
é classificado em metílico, primário, secundário,
terciário ou quaternário. Carbono metílico não está ligado a nenhum carbono. Carbono primário está
ligado a um carbono, o secundário a dois, e assim sucessivamente:
OP
P
P P
Q
TS P
M
O
O
O
P
S
S
S
S
Q
M
M = METÍLICO
P = PRIMÁRIO
S= SECUNDÁRIO
T = TERCIÁRIO
Q = QUATERNÁRIO
 
Figura 52
Forças Intermoleculares
Até agora nós conversamos sobre as ligações que constituem as moléculas orgânicas. Mas, vamos
lembrar que nunca a gente se depara com uma única molécula. Quando eu pego um vidro de uma
substância qualquer, orgânica ou inorgânica, lá dentro, mesmo que o vidro seja bem pequenino, tenho
milhares de moléculas. Por exemplo, um mol de água pesa 18g. Como a densidade da água é igual a 1,
então 18g correspondem a 18 mL, ou seja, em 18 mL de água eu tenho 6,02 x 1023
(o no
de Avogrado)
moléculas de água! E aí vem a pergunta: será que essas moléculas interagem entre si ou uma não está
nem aí para a outra?
As moléculas interagem entre si através do que chamamos de forças ou ligações intermoleculares.
Para que a gente possa entender o que são essas forças, precisamos estudar o que vem a ser
polaridade de uma molécula.
Nós já vimos que uma ligação covalente polar é aquela em que o compartilhamento de elétrons não é
igual para os dois átomos porque o mais eletronegativo puxa os elétrons para mais perto dele. Com
isso, é criado um dipolo interno (uma parte fica com caráter positivo e outra com caráter negativo) na
ligação e, consequentemente, na molécula:
 
 
 
.  37 . 
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O
H
O
H
δ+
δ
−
δ+
C-O
O-H
LIGAÇÕES POLARES ÁLCOOL ETÍLICO : MOLÉCULA POLAR
 
Figura 53
 
Observe que nós não consideramos a ligação C-H como um dipolo interno. A diferença de
eletronegatividade dos dois é tão pequena que praticamente não se cria esse dipolo. Na linguagem
química, a gente diz que a ligação C-H é apolar.
Entretanto, nem toda molécula que tem ligação polar é uma molécula polar. Nesse caso, nós temos que
avaliar dois aspectos: o arranjo espacial e o tamanho da molécula.
Arranjo espacial: vamos ver o que acontece com a molécula de CO2:
O sentido de um dos dipolos é oposto ao do outro. Assim, os dipolos se anulam e a molécula, apesar de
ter ligações polares, é apolar. Lembre-se que no CO2 o carbono faz duas ligações π (uma com cada
oxigênio) e, então, é hibridizado sp, logo, linear.
Na molécula CCl4 (tetracloreto de carbono) acontece uma coisa parecida. O arranjo da molécula é
tetraédrico e, lembrando-se da forma com que somamos vetores, os dois vetores resultantes estão em
sentido oposto, e assim se anulam. Então, embora ela tenha quatro ligações polares, é uma molécula
apolar:
 
Cl
Cl
Cl
Cl
Os vetores resultantes das duas somas
vetoriais se anulam
 
Figura 55
 
Outro fator que devemos analisar é o tamanho da molécula. Às vezes, uma molécula tem ligações
polares, mas a cadeia carbônica é tão grande que a molécula acaba se comportando como uma
O C O
  Figura 54 
 
 
 
.  38 . 
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molécula apolar. As gorduras (triglicerídeos), por exemplo, têm propriedades apolares, apesar de
possuírem várias ligações C-O e C=O (polares):
 
O
O
O
O
O
O
Triglicerídeo  
Figura 56
Bem, agora que a gente já sabe reconhecer se uma molécula é polar ou apolar, podemos entender as
forças intermoleculares. Essas forças ocorrem devido à interação entre as cargas reais ou parciais
(aquelas advindas da polaridade) de uma molécula interagindo com as cargas reais ou parciais de outra
molécula. Essa interação ocorre pela atração de uma carga positiva com uma negativa e ela é maior
quanto maior for a magnitude da carga e menor for a distância entre elas. Essas forças intermoleculares
são de cinco tipos: interação íon-íon, interação íon-dipolo, interação dipolo-dipolo, interação
dipolo-dipolo induzido, interação dipolo-induzido-dipolo-induzido.
A interação íon-íon é aquela que nós conhecemos como ligação iônica. Ela ocorre, por exemplo, entre
os íons cloreto e sódio no NaCl (sal de cozinha) e no lauril éter sulfato de sódio, um agente de limpeza
muito usado em xampus. São interações muito fortes:
 
 
 
 
 
 
 
 
  Figura 57
O
S
O
O-
Na+
Lauril eter sulfato de sodio
interação ío-íon
 
Na+
Na+
Na+
Na+
Na+
Cl-
Cl-
Cl-
Cl-
 
 
 
.  39 . 
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As interações íon-dipolo induzido são as que ocorrem entre uma espécie com carga real (cátion ou
ânion) e a carga parcial de outra molécula, como mostrado na interação do cátion de sódio com a carga
parcial negativa do átomo de oxigênio da água. Essas interações são moderadamente fortes.
 
Na+ O
H
H
δ−
δ+
δ
+
 
Figura 58
 
As interações dipolo-dipolo, como o próprio nome diz, são as que ocorrem entre o polo criado pela
carga parcial positiva de uma molécula com a carga parcial negativa de outra. É uma interação fraca. É a
que ocorre entre duas moléculas polares, mas sem carga. Veja na acetona:
 
δ−
δ+
δ+
O
Oδ−
 
Figura 59
Um tipo especial de atração dipo-dipolo é chamada de Ligação Hidrogênio. Nessa interação, o
hidrogênio é ligado a um átomo muito eletronegativo: F, O ou N é o polo positivo que é atraído pelo
polo negativo F, O ou N, de outra molécula (para ajudar a memorizar, lembrem-se de uma buzina: fon-
fon!):
O
H
H
O
H
H
Figura 60
 
 
 
.  40 . 
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Por exemplo, a dupla hélice do DNA é estabilizada pelas ligações hidrogênio entre as bases
nitrogenadas presas às duas cadeias:
 
Figura 61: a) Ligação hidrogênio entre as bases nitrogenadas (guanina e citosina) do DNA.
 
Como o hidrogênio é um átomo pequeno, as cargas parciais conseguem se aproximar muito,
resultando em uma atração mais forte que a dipolo-dipolo clássica.
A interação dipolo-dipolo induzido ocorre quando uma molécula polar se aproxima de uma outra,
apolar. Ao se aproximar, o dipolo da molécula polar faz com que ocorra uma distorção da nuvem
eletrônica da molécula apolar, induzindo um dipolo instantâneo:
 
O
H
H
δ−
δ
+
δ
+
I I
δ−
δ−
δ
+
δ
+
 
Figura 62
É uma interação mais fraca que a dipolo-dipolo.
A interação dipolo-induzido-dipolo-induzido (também chamada Força de London) ocorre entre
moléculas apolares e é a mais fraca delas. Como os elétrons estão em movimento constante, em um
determinado momento, uma molécula apolar – por exemplo, o etano (CH3CH3) – pode ter uma
distribuição não igualitária dos elétrons na ligação, ou seja, pode ser criado um dipolo momentâneo.
Esse dipolo pode, então, criar outro dipolo em uma molécula vizinha e esses dipolos se atraem:
 
 
 
.  41 . 
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δ− δ
+
δ−
δ−
δ+
δ+
H3C CH3
δ− δ+
δ−
δ−
δ+
δ+
H3C CH3
 
Figura 63
 
Essas duas últimas interações, que envolvem a formação de dipolo induzido, são chamadas juntas de
Forças de van der Waals. Essas forças são mais fracas, mas em moléculas grandes, isto é, com grande
superfície de contato entre elas, as Forças de van der Waals tem efeitos importantes. Por exemplo, são
Forças de van der Waals que seguram a lagartixa na parede (Figura 64): os dedos das lagartixas
terminam em milhões de filamentos pequenos, cada um com comprimento de cerca de 100
milionésimos do metro. Essas pequenas estruturas, por sua vez, estão subdivididas em mil partes ainda
menores, invisíveis a olho nu. Quando os répteis pressionam suas patas contra uma superfície, os
filamentos se espalham e cobrem uma área relativamente grande. Como os filamentos aumentam a
superfície de contato, um número maior de Forças de van der Waals atua entre a pata do animal e a
parede, garantindo uma adesão segura.
 
Figura 64: Filamentos existentes na pata da lagartixa
 
 
 
 
 
 
 
.  42 . 
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Propriedades Físicas: Ponto De Fusão, Ponto De Ebulição E Solubilidade.
Ponto de fusão
Ponto de fusão (P.F.) é a passagem de uma substância do estado sólido para o líquido. Quando estão
no estado sólido, as substâncias estão arrumadas ordenadamente em um cristal, ou seja, estão bem
pertinho umas das outras. Em outras palavras, as atrações entre elas estão maximizadas. Para que
elas fundam (passem para o estado líquido), as atrações intermoleculares devem ser enfraquecidas (o
que ocorre com o aquecimento), para que elas se mexam mais livremente, embora continuem sendo
atraídas entre si. Assim, quanto mais fortes forem as interações intermoleculares, mais difícil vai ser
separar as substâncias umas das outras, e então temos que aquecer mais, ou seja, maior vai ser o ponto
de fusão. Por causa disso, os sais (compostos com ligações iônicas) tipicamente fundem em
temperaturas muito maiores que compostos polares (com interações dipolo-dipolo), que, por sua vez,
fundem em temperaturas maiores que compostos apolares (com interações do tipo van der Waals). Isso
pode ser visto na tabela abaixo:
 
NaCl  P.F. = 801o
C Ligaçoes iônicas 
H2O  P.F.= 0o
C Ligação hidrogênio 
H
O
 
P.F. = ‐99o
C Dipolo‐Dipolo 
 
P.F. = ‐130o
C Forças de van Der Waals. 
 
Tabela 3
 
Ponto de Ebulição
Já o Ponto de Ebulição (P.E.) é a temperatura em que um composto passa do estado líquido (no qual as
moléculas estão mais afastadas) para o gasoso (no qual as moléculas estão mais afastadas ainda. No
estado gasoso praticamente não existem interações intermoleculares), isto é, é a temperatura em
que o composto ferve. Novamente, o que vai definir o grau de aproximação entre as moléculas são as
interações intermoleculares. Quanto mais fortes forem essas interações, mais alto vai ser o ponto de
ebulição. Observe os dois compostos mostrados na figura abaixo:
 
 
 
 
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P.E. = 39o
C P.E. = 117o
C
O
OH
 
Figura 65
Repare que os dois têm o mesmo no
de átomos de carbono, oxigênio e hidrogênio (lembrem-se: têm a
mesma fórmula molecular – C4H10O e, então, são isômeros), mas o primeiro tem um ponto de ebulição
muito menor que o segundo. Por quê? Porque no primeiro caso, as interações intermoleculares são
principalmente do tipo dipolo-dipolo, mais fracas que no segundo exemplo, no qual as moléculas
interagem entre si principalmente por ligações hidrogênio. Ora, se as moléculas estão unidas por uma
ligação mais forte, eu vou ter que dar mais calor para romper essas interações. Em outras palavras, o seu
ponto de ebulição é maior.
Solubilidade
Solubilidade é outra propriedade física que depende das interações intermoleculares. Mas, a coisa aqui
é um pouco diferente do que a gente viu para os pontos de fusão e ebulição, pois agora vamos misturar
moléculas de tipos diferentes, as moléculas do soluto e do solvente. Por exemplo, quando a gente
prepara “água com açúcar” o que fazemos é misturar as moléculas do açúcar (o soluto) com a água (o
solvente). A esse processo nós damos o nome de dissolução.
O que ocorre no processo de dissolução é que as interações intermoleculares existentes entre as
moléculas do soluto-soluto são substituídas por interações entre as moléculas do soluto - solvente.
Vamos então imaginar as situações que podem ocorrer:
1. Se o meu soluto é polar, ele deve fazer entre si interações, por exemplo, dipolo-
dipolo. Será que um solvente apolar, que faça tipicamente ligações tipo van der
Waals vai conseguir separar as interações dipolo-dipolo, mais fortes? Não.
2. Mas, se o meu soluto polar for misturado com um solvente polar que faça os
mesmos tipos de interações intermoleculares, aí provavelmente as interações
dipolo-dipolo das moléculas do soluto podem ser separadas e eu teria a dissolução.
3. Se o meu soluto é apolar e eu coloco um solvente polar, será que aí eu consigo
dissolver um no outro? Não, pois agora é o meu soluto que não vai conseguir vencer
as interações intermoleculares da molécula do solvente (não esqueça que as
moléculas do solvente também interagem entre si!).
 
 
 
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4. Já no caso em que tanto o soluto quanto o solvente são apolares ocorre a
dissolução, pois as interações devem ser do mesmo tipo.
A partir dessas observações, pode-se, com cuidado, aplicar uma regra que diz: “semelhante dissolve
semelhante” ou, em outras palavras, “polar dissolve polar e apolar dissolve apolar”. Mas, por que a
gente deve ter cuidado ao aplicar essa regra?
Olhe, por exemplo, a molécula abaixo, chamada ácido linoleico:
 
O
OH
Ácido Linoleico  
Figura 66
O óleo de soja é constituído principalmente de ácido linoleico e mais outras moléculas bem parecidas,
com uma cadeia carbônica grande e um grupo polar no final da cadeia. Aí, a gente poderia pensar: bom,
como tem aquele grupo polar e que faz ligação hidrogênio (repare que tem um hidrogênio ligado ao
átomo de oxigênio), então vai se dissolver em água que também é polar e também faz ligação
hidrogênio. Mas a gente sabe muito bem que se eu misturar água com óleo eles não vão se dissolver!
Ora, o que acontece é que a cadeia carbônica é muito grande e praticamente sem nenhuma polaridade.
Só um pedacinho da molécula tem polaridade, o que não é suficiente para separar as moléculas de
água umas das outras. Temos que nos lembrar sempre (como a gente já falou quando estudamos
polaridade das moléculas) que o tamanho das moléculas tem de ser analisado sempre que formos
avaliar a questão de polaridade e apolaridade.
Bom, até agora nós já estudamos as ligações químicas, o átomo de carbono, as ligações
intermoleculares e, no decorrer disso, vimos vários exemplos de moléculas orgânicas. Já citamos várias
vezes, também, que existe uma infinidade de moléculas orgânicas. Aí, a gente pode se perguntar: como
é que eu vou fazer para estudar e entender as propriedades químicas de todos estes compostos? Não
dá!!!
Felizmente, não é necessário aprender as propriedades químicas de cada composto orgânico
isoladamente. Os químicos orgânicos já perceberam que uma determinada arrumação de átomos leva a
propriedades químicas muito parecidas, independente de como a cadeia carbônica se arruma. Por
exemplo, os dois compostos mostrados na figura abaixo são diferentes, mas tem propriedades muito
parecidas.
 
 
 
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Química Orgânica 
 
OH OH 
 
Figura 67
Por exemplo, a polaridade da ligação O-H e sua capacidade de realizar ligação hidrogênio faz com que
eles tenham pontos de ebulição parecidos e maiores do que, por exemplo, de compostos similares, mas
que só tenham carbono e hidrogênio na sua estrutura.
À medida que formos estudando mais Química Orgânica, vamos perceber que as interações entre
cargas positivas e negativas são um dos fatores mais importantes para que ocorram as reações
químicas. Assim, normalmente as reações ocorrem nos locais polares das moléculas. No exemplo que
estamos discutindo, as reações ocorrem nas ligações O-H e C-O. As ligações C-C e C-H não são muito
reativas. Na realidade, em termos de reações químicas, não faz muita diferença o número ou a forma
com que estão arrumadas as ligações C-C e C-H.
De fato, os compostos mostrados na figura abaixo tem comportamento químico muito semelhante.
 
OH
OH
OH
OH
 
Figura 68
Com isso, em termos de propriedades químicas, as moléculas devem ser vistas como compostas por
duas partes:
Com isso, em termos de propriedades químicas, as moléculas devem ser vistas como compostas por
duas partes:
1) A cadeia carbônica, que como já vimos, tem grande influência nas propriedades físicas (P.E.,P.F.,
solubilidade), mas não interfere muito nas propriedades químicas (como vão reagir, isto é, na
reatividade);
 
 
 
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2) O grupo funcional, que é a parte da molécula responsável pela sua reatividade química. Nos
exemplos que a gente está discutindo todos os compostos têm o grupo funcional O-H, mas diferentes
cadeias carbônicas (que a gente vai representar por R). Assim, todos os compostos do nosso exemplo
são alcoóis (compostos orgânicos cujo grupo funcional é o OH) e são representados como ROH. Todos
os alcoóis têm reatividade química semelhante.
Esse conceito é muito importante e geralmente organizamos o estudo da Química Orgânica por grupo
funcional. Assim, a partir de agora vamos estudar com mais detalhes os principais grupos funcionais. A
tabela abaixo mostra os grupos funcionais que vão ser apresentados a partir de agora:
FÓRMULA GENÉRICA EXEMPLO NOME
RH ALCANOS (na realidade, alcanos
não possuem grupo funcional).
RCH=CHR (estes R podem ser
hidrogênio)
ALCENOS (o grupo funcional é a
ligação dupla C=C).
RR (estes R podem ser
hidrogênio)
ALCINOS (o grupo funcional é a
ligação tripla CΞC).
ArH ARENOS (um ciclo de seis átomos
de carbono com três ligações
duplas tem reatividade química
diferente dos alcenos e assim são
outro grupo funcional,
representados por Ar. Arenos,
também chamados de anéis
aromáticos, podem ter grupos
alquil ou outros grupos funcionais
ligados ao anel aromático).
RX (X é a letra que usamos em
Química Orgânica para
representar os halogênios)
Cl HALETOS DE ALQUILA
(O grupo funcional é a ligação C-
Halogênio).
ROH OH ALCOÓIS (o grupo funcional é o O-
H).
ArOH OH FENÓIS (quando o O-H está ligado
a um anel aromático, a reatividade
muda muito em comparação com
os alcoóis e então é outro grupo
 
 
 
.  47 . 
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funcional).
ROR O ÉTERES (o grupo funcional é C-O-
C).
RNH2 NH2 AMINAS (o grupo funcional é o
NH2. Estes dois hidrogênios
podem ser substituídos por outros
grupos alquil).
R
O
H O
H ALDEÍDOS (o grupo funcional é o
C=O, com pelo menos um
hidrogênio ligado ao carbono).
R
O
R
O CETONAS (o grupo funcional é o
C=O, com dois grupos alquil – ou
anel aromático - ligados ao
carbono).
R
O
OH H
O
OH
ÁCIDOS CARBOXÍLICOS (o grupo
funcional é o COOH).
R
O
Cl
O
Cl
CLORETOS DE ÁCIDO (o grupo
funcional é o COCl).
R
O
O
O
R
O
O
O ANIDRIDOS DE ÁCIDOS (o grupo
funcional é COOCO).
R
O
OR
O
O
ÉSTERES (o grupo funcional é
COOR).
R
O
NH2
O
NH2
AMIDAS (o grupo funcional é o
CONH2. Os hidrogênios ligados ao
nitrogênio podem ser substituídos
por alquil ou anel aromático).
RCΞN C
N
NITRILAS (o grupo funcional é o
CN).
 
Tabela 4
 
 
 
 
 
 
.  48 . 
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Funções Orgânicas
1. Hidrocarbonetos
Hidrocarbonetos, como o próprio nome já diz, são compostos que possuem apenas carbono e
hidrogênio em sua estrutura. O esquema abaixo mostra a classificação dos hidrocarbonetos:
 
HIDROCARBONETOS
ALIFÁTICOS
ALCANOS (ou parafinas)
CnH2n+2
ALCENOS (ou alquenos ou olefinas)
CnH2n
ALCINOS (ou alquinos)
CnH2n-2
ALICÍCLICOS
CICLOALCANOS
CICLOALCENOS
CICLOALCINOS
R-H
AROMÁTICOS
Ar-H
 
Figura 69
A gente conhece por aromáticos um grupo especial de hidrocarbonetos, que tem propriedades muito
diferentes devido às suas características estruturais. Daqui a pouco nós veremos um pouco mais quais
são essas características. Por enquanto, aqui estão duas regras que devemos aplicar para saber se um
composto é aromático:
- Os compostos aromáticos sempre são cíclicos e têm ligações duplas alternadas com ligações simples
em toda a volta do anel E:
- Todo composto aromático tem um número tal de elétrons π (cada ligação dupla tem dois elétrons π),
que se a gente aplicar a fórmula 4n+2 = no
de elétrons π, a resolução dessa equação deve dar, para os
compostos aromáticos, um valor de n inteiro (essa regra a gente conhece por Regra de Huckel).
 
 
 
.  49 . 
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Analise, por exemplo, a Figura 70. Os dois primeiros compostos são aromáticos, enquanto o terceiro,
apesar de ser cíclico e possuir ligações duplas alternadas, não é aromático, pois n na regra 4n+2 = no
de
elétrons π não é um no
inteiro. Já o quarto exemplo não é aromático, porque as ligações duplas não
estão em toda a volta do anel.
 
3 ligações duplas = 6 elétrons π
4n + 2 = 6
4n = 4
n = 1 (no.
inteiro)
5 igações duplas = 10 elétrons π
4n + 2 = 10
4n = 8
n = 2 (no.
inteiro)
4igações duplas = 8elétrons π
4n + 2 = 8
4n = 6
n = 6/4 (no.
não inteiro)
AROMÁTICO AROMÁTICO
ALIFÁTICO
3 ligações duplas = 6 elétrons π
4n + 2 = 6
4n = 4
n = 1 (no.
inteiro)
ALIFÁTICO  
Figura 70: Exemplos de aplicação da regra de Hückel.
 
Alcanos
Os alcanos são os hidrocarbonetos saturados de fórmula geral CnH2n+2.
Os alcanos ocorrem na natureza em depósitos de gás natural e no petróleo. O gás natural é constituído
principalmente de metano (CH4) e o petróleo é uma mistura complexa de vários hidrocarbonetos. Como
esses hidrocarbonetos presentes no petróleo têm aplicações muito diferentes, a gente precisa separar
o petróleo em misturas mais simples (dizemos que separamos o petróleo em várias frações, cada uma
delas com utilizações diferentes). Essa separação é feita por destilação e, no caso do petróleo, essa
destilação recebe o nome específico de refinação (refinaria de petróleo é o local onde se faz essa
destilação). Todas as frações obtidas no refinamento do petróleo contêm alcanos.
 
 
 
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Os alcanos são compostos apolares e estão entre os menos reativos diante dos reagentes mais comuns
de um laboratório de Química (lembrem-se que nós já comentamos que a reatividade normalmente 
está associada à existência de ligações polares nas moléculas). O próprio nome parafina, outra
designação usada para os alcanos, vem de uma expressão latina que significa “pouca afinidade”.
Mas a gente tem que tomar cuidado quando dizemos “pouco reativos”. Estamos nos referindo
basicamente a reações químicas nas quais misturamos duas ou mais substâncias com o intuito de obter
outras substâncias diferentes. Para isso, realmente, os alcanos não são muito utilizados.
Por outro lado, os alcanos sofrem reações de combustão – queima na presença de oxigênio ––
(Esquema 1), e essa é uma das reações mais praticadas por todos nós. Realizamos reações de
combustão quando acendemos um fogão a gás, ligamos um motor a gasolina, acendemos um isqueiro
Mas, reparem: o “produto” que a gente quer nessas reações é o calor (ou melhor dizendo, a energia) e
não o dióxido de carbono (CO2) e água.
 
CnH2n+2 + O2 CO2 + H2O + CALOR  
Esquema 1: Reação de combustão
 
Outra reação que a indústria petroquímica (indústria que utiliza as frações do petróleo como matéria-
prima) realiza muito com os alcanos é a chamada pirólise (quebra pela ação do calor) ou
craqueamento. Como a gente já viu, o petróleo dá origem a muitos produtos diferentes, mas a
quantidade em que esses produtos se encontram no petróleo em geral não atendem às necessidades
do mundo atual. Assim, as indústrias pegam as frações do refino que têm hidrocarbonetos mais
pesados (frações que destilam com P.E. maior que o da gasolina) e quebram esses hidrocarbonetos em
moléculas menores (mais leves), isto é, fazem o craqueamento para obter mais gasolina e outros
hidrocarbonetos menores e assim atender à demanda do sistema de consumo atual.
Bem, agora, antes da gente começar a ver as outras funções orgânicas, precisamos aprender a dar
nomes aos compostos orgânicos. Por quê?
Vamos imaginar como nós nos comunicaríamos se as coisas não tivessem nomes. Seria impossível
transmitir nossas ideias ou dúvidas ou esclarecimentos! E lógico, os nomes têm que ser palavras. Mas a
gente podia pensar: já que as fórmulas estruturais constituem uma perfeita identificação para cada
substância, por que os químicos não dispensam os nomes formados por palavras e utilizam as fórmulas
 
 
 
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Química Orgânica 
estruturais na comunicação em suas várias formas? Mas isso é impossível! Teríamos, no mínimo, que
decorar todas as estruturas. Além disso, tente, por exemplo, descrever a palitoxina (Figura 41), aquela
substância enorme isolada de corais e que fomos apresentados quando aprendíamos a desenhar
fórmulas estruturais em bastão, sem usar o seu nome. Conseguiu? Claro que não.
Por conta disso, os químicos perceberam que deveria ser desenvolvido um sistema organizado, um
conjunto de regras, para dar nomes às substâncias. A IUPAC (International Union of Pure and Applied
Chemistry) assumiu a responsabilidade de recomendar um sistema para nomear as substâncias. Na
realidade, a gente não diz que um composto possui nome: o termo correto é nomenclatura. Dar nome
a um composto orgânico consiste em nomenclaturar ou nomenclar esse composto.
Obs.: A União Internacional de Química Pura e Aplicada (IUPAC) tem por objetivo intermediar
mundialmente aspectos das ciências químicas e contribuir para a aplicação da Química ao serviço da
humanidade. Por ser uma organização internacional, não governamental, a IUPAC atua como referência
em questões globais que envolvem as ciências químicas.
 
Em princípio, a nomenclatura utilizada para os compostos orgânicos tem como parâmetros três
aspectos de relevância:
1) Todo composto orgânico possui átomos de carbono.
2) Suas cadeias podem ou não apresentar ligações π entre átomos de carbono e podem ser cíclicas ou
não.
3) Os compostos orgânicos são classificados segundo o grupo funcional presente na molécula.
A partir dessas características pode-se estabelecer a base para a nomenclatura de qualquer substância
orgânica. Observe o esquema a seguir:
Composição da nomenclatura orgânica:
 
 
O prefixo encontra-se associado ao número de átomos de carbono existentes na cadeia principal do
composto.
O intermediário indica se a substância possui somente ligações simples entre os átomos de carbono ou
se há também a presença de duplas ou triplas ligações entre esses.
PREFIXO + INTERMEDIÁRIO + SUFIXO
 
 
 
.  52 . 
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O sufixo indica a que função pertence a substância.
Os prefixos que indicam o no
de carbonos estão mostrados na tabela a seguir:
 
Número de átomos de carbono Prefixo
1  met 
2  et 
3  prop 
4  but 
5  pent 
6  hex 
7  hept 
8  oct 
9  non 
10  dec 
11  undec 
12  dodec 
Tabela 5: Prefixos utilizados para a designação do no
de átomos de uma cadeia carbônica.
 
O prefixo correspondente aos compostos até quatro carbonos (Met, Et, Prop e But) infelizmente tem
de ser decorados, pois são nomes mantidos por tradição, sem nenhum aspecto lógico. Os outros
prefixos são de origem grega ou latina, tem correlação com o número e são os mesmos usados para as
figuras geométricas.
Quando se tratar de um composto cíclico, antes desses prefixos que indicam o no
de átomos de carbono
colocamos a palavra ciclo.
O intermediário nos diz se o composto possui ligação dupla ou tripla, conforme mostrado na tabela
abaixo:
 
 
 
.  53 . 
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Ligações entre os átomos de carbono Intermediário
C C
 
an 
C C
 
en 
C C
 
in 
 
Tabela 6: Designações usadas para a indicação do no
de insaturações em uma cadeia carbônica.
 
Cada função orgânica é nomenclaturada por um sufixo específico. À medida que formos conhecendo
essas funções seremos apresentados ao sufixo usado para designá-las.
Para os alcanos, usa-se o sufixo “ano”, conforme exemplificado na figura a seguir:
 
CH4 Metano
Etano
Propano
Butano
Met signif ica que tem um carbono
Ano signif ica que só tem ligação e é um alcano.
Ciclo-propano
Ciclo-butano
 
Figura 71
Quando nós aprendemos sobre cadeias carbônicas vimos que elas podem ser ramificadas. Vamos ver
agora como fazemos para dar a nomenclatura dos compostos que possuem ramificação.
As ramificações são designadas genericamente de grupo alquil, alquenil, alquinil ou aril, em função do
tipo de hidrocarboneto que lhes deram origem. Grupos alquil são partes da estrutura molecular que
correspondem a um alcano menos um hidrogênio. Assim, ao metano (CH4) corresponde o grupo metila
 
 
 
.  54 . 
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(CH3), ao etano (C2H6) corresponde o grupo etil (C2H5) e assim sucessivamente. A tabela abaixo mostra
alguns exemplos de nomenclatura dos grupos alquil, onde o traço mostra o átomo que se liga à cadeia
carbônica principal:
 
ALCANO  NOMENCLATURA GRUPO ALQUIL  NOMENCLATURA 
CH4  Metano  ‐CH3   METIL 
 
Etano  CH3CH2 ‐  ETIL 
 
Propano  CH3CH2CH2‐ 
 
n‐PROPIL 
iso‐PROPIL 
(ou sec‐PROPIL) 
 
Butano  CH3CH2CH2CH2‐ 
 
n‐BUTIL 
sec‐BUTIL 
 
Iso‐Butano 
 
CH3CCH3
CH3
 
iso‐BUTIL 
 
terc‐BUTIL 
 
Tabela 7: Nomenclatura utilizada para a designação de grupos alquil.
 
 
 
 
 
 
 
Observem que no caso do propano, e para todos os alcanos com mais de três carbonos, o
alcano pode “perder hidrogênio” de carbonos distintos, gerando grupos alquil diferentes
que, lógico, pois são coisas diferentes, devem ser nomenclaturados de forma diversa. A
recomendação IUPAC para esses casos é mais complexa e acabamos usando nomes triviais,
como, por exemplo, iso-propil. Denominamos nomenclatura trivial ou vulgar aquela
consagrada pelo uso, mas que, na maioria das vezes, não é consagrada pela IUPAC.
Assim, quando a gente coloca a letra n na frente da nomenclatura do radical alquila, estamos
dizendo que a ligação à cadeia carbônica se faz no carbono primário. Se for ao carbono
secundário usa-se sec e no terciário usa-se terc.
O termo iso significa “grupamento igual”. Observe que no isopropil o carbono que se liga à
cadeia carbônica possui duas metilas (dois grupamentos iguais) ligadas a ele.
 
 
 
.  55 . 
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Química Orgânica 
Para nomenclaturar um alcano ramificado, o primeiro passo é definir quem é a cadeia principal. Já
vimos que é a maior cadeia contínua (linear) que for possível encontrar na estrutura. É bom sempre
lembrar que “linear” é uma forma de dizer. A cadeia dos alcanos são arrumadas em zigue-zague com os
ângulos entre as ligações de cerca de 109,5o
.
Depois de localizarmos a cadeia principal, precisamos dizer em quais carbonos estão os substituintes.
Para isso, a cadeia carbônica é numerada começando pela extremidade que resultará em menores
números para as posições em que há substituições. A figura abaixo (Figura 72) mostra como aplicamos
essa regra:
1
2
3 4
123
4
1
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
2
3
4 5
6 7
8
9
10
1
12
2
3
4
5
3
45
6
7
8
6
7
8
CORRETO ERRADO
SUBSTITUINTE EM C-2 SUBSTITUINTE EM C-3
SUBSTITUINTES EM
C-4 E C-6
SUBSTITUINTES EM
C-5E C-7
DOIS SUBSTITUINTES EM
C-3 E UM EM C-6
DOIS SUBSTITUINTES EM
C-6 E UM EM C-3
 
Figura 72: Método para a determinação da cadeia principal de um alcano.
 
Depois de localizados os substituintes, a nomenclatura é feita da seguinte forma: grupo alquil,
precedido da numeração do carbono em que ele se encontra, seguido do nome do alcano. Assim, a
nomenclatura do primeiro exemplo mostrado seria:
 
 
 
 
 
.  56 . 
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Química Orgânica 
 
   
 
 
Figura 73
Algumas pessoas usam os números para indicar a posição do substituinte apenas quando ele é
realmente necessário. Observem o exemplo acima: só há uma possibilidade de colocação do grupo
metil e, assim, não está errado dizer apenas metilbutano.
Já no exemplo:
A numeração é imprescindível, pois se dissermos apenas
metil-pentano não teremos como saber se o composto é o 2
ou o 3-metil-pentano:
 
 
 
 
Quando existem dois ou mais substituintes diferentes, esses devem ser colocados em ordem alfabética
e não de numeração. Assim, no segundo exemplo, teríamos:
 
E não 4-metil-6-etildecano (afinal, o “e” vem antes do “m”).
 
 
 
 
1
23
4
2-metilbutano 
Usa‐se hífen para separar o número 
e o nome todo é escrito como uma 
única palavra.  
123
4
5
2-metilpentano 
1
2
34
5
3-metilpentano 
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
6-etil-4-metildecano
Figura 74
Figura 75
Figura 76
 
 
 
.  57 . 
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Química Orgânica 
Se os substituintes forem iguais, usamos os prefixos multiplicativos: di, tri, tetra... mas esses não são
considerados na colocação em ordem alfabética. Veja isso na nomenclatura das moléculas mostradas
abaixo:
   
 
 
 
A segunda classe de grupos funcionais que vamos estudar é a dos alcenos. No entanto, essas
substâncias possuem algumas características estruturais que só vamos compreender após estudarmos
outro fenômeno muito importante, que é o de isomeria.
Isomeria
Isômeros são compostos diferentes que possuem a mesma fórmula molecular. Como exemplo, com a
fórmula molecular C2H6O podemos desenhar duas moléculas:
 
 
 
Figura 79
Evidentemente, já estamos cansados de saber que são compostos distintos. O primeiro é o álcool
etílico, o álcool encontrado na cerveja, que é um líquido. O segundo, o éter metílico, é um gás que tem
sido testado como gás refrigerante em substituição aos freons (freons são compostos orgânicos
halogenados que eram utilizados como gases refrigerantes em “sprays”, geladeiras e cujo uso
indiscriminado levou à formação do buraco de ozônio). Esses dois compostos são isômeros.
Os isômeros podem ser de dois tipos: isômeros de constituição e estereoisômeros.
1
2
3
4
6
7
8
3,3,6-trimetiloctano 1
2
3
456
78
9
6-etil-4,4-dimetilnonano
 
OH
O
 
Figura 77
Figura 78
 
 
 
.  58 . 
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Isômeros de constituição são isômeros cuja sequência de átomos ligados (quem se liga com quem)
são diferentes. Alguns livros mais antigos costumam chamar esse tipo de isomeria de “isomeria plana”.
Esse termo deve ser evitado, pois como já estamos carecas de saber, os alcanos, por exemplo, não tem
nada de planaridade! A Figura 80 mostra exemplos de isômeros de constituição.
C5H12
Observe que o primeiro composto não
possui ramificação, enquanto o segundo tem uma
metila no C-2.
C6H12
Note que o primeiro composto é um alceno
e o segundo é um ciclo-alcano
O
O
C4H10O
Veja que no primeiro composto o oxigênio
está ligado a dois grupos etil e no segundo está ligado
a um metil e um propil.
 
Figura 80: Exemplos de isômeros de constituição
 
Antigamente, a isomeria constitucional era classificada em vários subtipos. No entanto, como isso é
motivo de várias confusões devido a interpretações diferentes, a tendência tem sido a de abandonar
essa subdivisão. No entanto, como tem gente que ainda usa, devemos entender o que é, caso apareça
em algum texto. Vamos ver como se faz essa classificação:
 
Isomeria de função
Ocorre entre compostos de mesma fórmula molecular que pertençam a funções químicas distintas,
como exemplificadas abaixo:
 
 
 
 
Figura 81
OO
H
ALDEÍDO CETONA
 
 
 
.  59 . 
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Isomeria de cadeia ou de núcleo
Ocorre entre compostos de mesma fórmula molecular e mesma função química que possuam cadeias
carbônicas distintas:
 
CADEIA NORMAL CADEIA RAMIFICADA  
Figura 82
Isomeria de posição
Ocorre entre compostos de mesma fórmula molecular, mesma função química e mesma cadeia
carbônica, porém, que possuam diferenças entre si na posição de grupamentos funcionais, ramificações
ou insaturações.
Figura 83
Isomeria de compensação ou metameria
Ocorre entre compostos de mesma fórmula molecular e mesma função química, em que o heteroátomo
encontra-se em diferentes posições.
O
O
OXIGÊNIO LIGADO
A METIL E PROPIL
OXIGÊNIO LIGADO
A DOIS ETIL
Figura 84
OH
OH
GRUPO FUNCIONAL
NO C-1
GRUPO FUNCIONAL
NO C-2  
RAMIFICAÇÃO
EM C-2
RAMIFICAÇÃO
EM C-3  
 
 
 
.  60 . 
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Estereoisômeros, por outro lado, são isômeros que possuem a mesma conectividade (a sequência dos
átomos ligados na molécula são exatamente as mesmas), mas cujas estruturas variam na forma com
que se arrumam no espaço.
Os estereoisômeros podem ser de dois tipos: enantiômeros e diastereoisômeros.
Qualquer coisa tem uma imagem no espelho (exceto os vampiros, é claro!). E qualquer coisa só é igual a
outra se essas imagens forem sobreponíveis. As mãos são exemplos clássicos de imagens especulares (a
mão esquerda é a imagem no espelho da mão direita e vice-versa) que não são sobreponíveis, e a nossa
mão direita não é igual à esquerda (Figura 85). As coisas que não são sobreponíveis à sua imagem
especular são denominadas quirais (quiral, em grego “cheir”, quer dizer mão).
Isso também é verdade para as moléculas. Sempre que uma molécula for diferente de sua imagem
especular, isto é, se as duas não forem sobreponíveis, temos um tipo de estereoisomeria que
denominamos de enantiomeria (e dizemos que as duas moléculas são enantiômeros).
Observe as moléculas abaixo (imagens especulares entre si) e veja que elas não são sobreponíveis:
 
Figura 85
Quaisquer outros tipos de compostos que sejam isômeros espaciais (estereoisômeros), mas que não são
imagem especular um do outro são ditos diastereoisômeros. Olhe, por exemplo, as duas moléculas
abaixo:
 
Br Br
Figura 86
 
 
 
.  61 . 
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Convençam-se de que elas são enantiômeros. Uma é a imagem especular da outra e são compostos
diferentes. Agora, olhem esta:
Br
Figura 87
Não é imagem especular de nenhuma das outras duas. Mas, a sequência de átomos das três são
idênticas. Logo, essa última é um diastereoisômero (isômero espacial que não é a imagem especular) de
cada uma das outras duas.
Um tipo especial de diastereoisômeros são os chamados isômeros geométricos.
Como a gente já viu, as ligações π ocorrem por sobreposição paralela de orbitais p. Por causa disso, elas
não giram livremente, pois a ligação dupla se quebraria. Analise a molécula do n-butano:
Como a ligação σ se faz pela interação linear segundo
um eixo, as ligações têm rotação livre e o n-butano está
o tempo todo se interconvertendo nas duas formas
espaciais mostradas no desenho (representado pelas
duas setas em sentido contrário). Isto é, as duas formas
são representações da mesma molécula. 
Já no caso do 2-buteno: , como essa rotação é impossível, não ocorre uma
interconversão de um no outro. São duas moléculas diferentes. São dois diastereoisômeros.
Diastereoisômeros que existem por causa da impossibilidade de rotação de suas ligações são
denominados isômeros geométricos.
Observe agora os ciclos abaixo:
Rotação livre Rotação livre
n-Butano  
Figura 88
 
 
 
.  62 . 
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Química Orgânica 
 
 
Figura 89
 
Esses sistemas cíclicos, embora não tenham ligação π, também não tem rotação livre por conta da
própria geometria do anel. Preste atenção que seria impossível eu colocar um grupo alquil que está
para frente do plano do tetraedro (lembra-se do que significa a linha grossa?) para trás desse plano sem 
quebrar o ciclo. Então, os dois ciclobutanos e os dois cicloexanos mostrados acima também são
exemplos de isômeros geométricos.
Bem, agora, depois dessa pausa para entender o que são isômeros, vamos retornar ao estudo das
funções orgânicas.
Alcenos (Ou Alquenos) Ou Olefinas
Alcenos são hidrocarbonetos que possuem uma ou mais ligações duplas em sua estrutura, ou seja, o
grupo funcional (parte da molécula que é responsável por suas propriedades químicas) de um alceno é
a C=C. O eteno, alceno mais simples que existe: H2C=CH2, por exemplo, reage com cloro ou bromo
formando compostos oleosos. Por causa disso, logo que se descobriu a propriedade desse composto,
ele recebeu o nome de gás oléfiant que significa “gás fazedor de óleo”. A extensão desse nome para
todos os compostos dessa classe é que explica o termo olefinas, sinônimo de alcenos.
Os alcenos mais simples (com apenas uma ligação dupla) são mais raros na natureza que os alcanos. O
eteno (também conhecido por etilideno) é produzido no processo de amadurecimento de frutas.
Quando a gente quer que a banana amadureça mais rapidamente, a embrulhamos em jornal para que o
eteno que vá sendo liberado, aos poucos se dissipe mais lentamente. Por questões de facilidade de
transporte e de armazenamento, as frutas são colhidas verdes e colocadas para amadurecer pela ação
do gás eteno.
 
 
 
.  63 . 
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Química Orgânica 
Apesar dos alcenos serem mais difíceis de ser encontrados na natureza, são matéria-prima fundamental
para uma porção de indústrias. A obtenção deles é feita pelo craqueamento das frações
mais pesadas obtidas no refinamento do petróleo (se você não se lembra o que é isso, dê uma olhada
mais acima nesse texto, quando falamos dos alcanos).
Essa importância dos alcenos é porque as ligações C=C reagem entre si formando polímeros. Polímeros
são moléculas enormes (macromoléculas) obtidas por ligações de várias moléculas menores
(monômeros), que podem ou não ser iguais (quando os monômeros não são iguais são chamados de
copolímeros). No mundo de hoje, os polímeros com certeza são o material mais importante para a
confecção de várias coisas. A Figura 90 mostra alguns exemplos.
 
 
MONÔMERO POLÍMERO APLICAÇÃO (exemplo)
Propeno
(Nome comum=Propileno)
Polipropileno
Seringa de Injeção
Brinquedos
Auto-peças
(parachoque,pedais,..)
Eteno
(Nome comum=Etileno) Polietileno
Sacola plástica de
supermercado
Garrafa térmica
Frasco de detergente
Cl
2-cloro-eteno
(Nome coum = cloreto de vinila)
Cl Cl Cl Cl Cl
Policloreto de vinila (PVC)
Encanamentos
Filmes plásticos para
embalagem de alimentos
Garrafões de água
 
Figura 90: Exemplos de polímeros e suas aplicações
 
As regras de nomenclatura que a gente aprendeu para os alcanos serve de base para o caso dos
alcenos, mas temos que prestar atenção em vários aspectos em que há diferenças:
‐ A cadeia principal de um alceno é a maior que contém a ligação dupla.
 
 
 
.  64 . 
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Química Orgânica 
Por exemplo,  no                                      , a cadeia principal é a que está destacada com vermelho,
com seis carbonos, e não a outra que possui oito carbonos.
 
 
‐ A cadeia principal é sempre numerada a partir da extremidade mais próxima à ligação dupla.
- A parte do nome que se refere à cadeia principal é formada de maneira parecida com a utilizada para
os alcanos, com duas diferenças:
- Ao invés de “ano” usamos o sufixo “eno”.
- Precisamos especificar a posição da ligação dupla, o que é feito por um número que deve ser colocado
imediatamente antes da terminação “eno”. A Figura 92 mostra alguns exemplos da nomenclatura de
alcenos:
 
1
2
3 4
5
6
ETENO PROPENO BUT-1-ENO BUT-2-ENO
2-METIL-PROPENO
21 3
2
4
1
3
2
41 3
2,3-DIMETIL-BUT-1-ENO
24
1
3
3-METIL-CICLOEXENO 
Figura 92: Exemplos de aplicação das regras de nomenclatura em alcenos
 
 
 
1
2 3
4
5
6
NOTA: A colocação do no
que indica a posição da ligação dupla imediatamente antes do sufixo
“eno” é a recomendação da IUPAC. Porém, muitas vezes você irá encontrá-la no início ou no fim
da cadeia principal. Por exemplo, tem gente que escreve 2-buteno ou ainda buteno-2. Isso não é
problema. O importante na nomenclatura é que ela nunca permita que você fique em dúvida
sobre qual é a estrutura do composto.
Figura 91
 
 
 
.  65 . 
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Química Orgânica 
Quando a ligação dupla é um substituinte (grupo alquenil), usa-se o sufixo “enil”, como se pode ver na
Figura 93:
METENIL-CICLOEXENO ETENIL-BENZENO 
Figura 93: Exemplos de nomenclatura de grupos alquenil.
 
 
Os grupos alquenil mostrados abaixo são muito mais conhecidos por sua nomenclatura normal do que
pela estabelecida pelas regras da IUPAC (Figura 94):
 
 
Figura 94: Nomenclatura comum (trivial) de grupos alquenil
 
Isomeria Cis X Trans
Nós já vimos que a impossibilidade de rotação da ligação π faz com que os alcenos do tipo:
e
 sejam moléculas diferentes. Mas, como dar a nomenclatura delas para
que a gente possa saber quem é quem?
Quando dois substituintes iguais estão do mesmo lado, dizemos que a molécula é cis. Quando estão de
lados opostos, dizemos que a molécula é trans. Assim, teríamos:
 
C H 2
M E T ILE N O ou M E T ILID E N O M e tilen o -C iclop e n tan o
C H C H 2
V IN IL
V in il-b en ze n o
E sta m o lécu la é m a is co n he cid a
a in da co m o e stire no
C H C H 2
A L IL
H 2C
A lil-ciclo -he p ta no
 
 
 
 
.  66 . 
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Química Orgânica 
trans-But-2-eno cis-But-2-eno
trans-Hex-3-eno cis-Hex-3-eno  
Figura 95
 
Pode não parecer tão óbvio, mas é claro que só existe isomeria cis x trans quando temos dois tipos de
substituintes no carbono da ligação dupla e que cada um deles seja diferente entre si. Repare nos
exemplos abaixo:
 
1-propeno
Não existe isomeria cisx trans porque o C-1 está ligado a
dois hidrogênios - substituintes iguais.
Não existe isomeria cisx trans porque o C-1 está ligado a
duas metilas - substituintes iguais.
2-metil-but-2-eno  
Figura 96
Mas, a nomenclatura cis x trans é muito fácil quando os substituintes são iguais. E, essa molécula é cis ou
trans?
 
 
 
Figura 97
 
 
Sl quimica organica
Sl quimica organica
Sl quimica organica
Sl quimica organica
Sl quimica organica
Sl quimica organica
Sl quimica organica
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  • 1. Química Orgânica   Florence M. Cordeiro de Farias                                                                  Este documento tem nível de compartilhamento de acordo com a licença 3.0 do Creative Commons. http://creativecommons.org.br http://creativecommons.org/licenses/by-sa/3.0/br/legalcode  
  • 2.       .  1 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Química Orgânica Histórico até a definição final A utilização de compostos orgânicos é descrita desde a antiguidade. Pesquisas arqueológicas recentes comprovaram a presença de vinhos em jarros encontrados em tumbas de faraós (3150 a.C.). Os papiros egípcios de Ebers (cerca de 1500 a.C.), de Edwin Smith (cerca de 1600 a.C.) e de Brugsch (cerca de 1300 a.C.) descrevem inúmeras fórmulas medicinais cujos constituintes eram principalmente ervas. Os próprios papiros eram feitos da celulose obtida a partir dos talos da planta papiro do Egito, planta aquática da mesma família da tiririca, abundante nas margens do Rio Nilo. A Bíblia, no episódio de Noé (Gênesis), fala no vinho. Os romanos e egípcios utilizavam os corantes índigo e alizarina. O índigo era obtido a partir de plantas do gênero Indigofera (anil do campo, timbozinho) e atualmente é obtido por síntese e utilizado principalmente para a coloração de “jeans”. A alizarina era retirada de raízes da rubia . A alizarina foi o primeiro corante a ser sintetizado (obtido em laboratório) e hoje em dia é utilizado principalmente como reagente químico. Apesar dessa grande utilização, até o século XVIII era pouco o conhecimento que se tinha sobre as propriedades e composição dos compostos orgânicos. A Química já era bastante estudada, mas a parte que envolvia a composição e estrutura (átomos que existiam nas moléculas e as formas com que se arrumavam nelas) dos compostos orgânicos era pouco conhecida. A importância da Química Orgânica estava muito mais em sua fonte de obtenção (na época, animal ou vegetal) e em sua aplicabilidade em medicina, do que na sua parte estrutural. Havia pouca produção de materiais orgânicos e, na maioria das vezes, eram feitos domesticamente ou em pequena escala. Poucas coisas como, por exemplo, a fabricação de sabão, o refino do açúcar, processos de tingimento e destilação (separação de duas ou mais substâncias por aquecimento) eram feitas em escalas maiores. Poucos compostos orgânicos eram conhecidos em sua forma pura. Valerius Cordus (médico e botânico alemão,1515-1544) descreveu, em 1540, a obtenção do éter por tratamento do álcool com ácido sulfúrico – método ainda usado –, dentre outros. Em 1780, Scheele (químico farmacêutico sueco, 1742- 1786) desenvolveu um método químico para obter ácidos orgânicos a partir de plantas ou animais e assim descobriu vários ácidos orgânicos, tais como, por exemplo, os ácidos benzoicos (isolados da resina balsâmica obtida do benjoim: Styrax benjoin), utilizado hoje em dia para a preservação de alimentos, e o ácido tartárico (Figura 1), isolado de extratos de uvas fermentadas.
  • 3.       .  2 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  COOH Ácido Benzóico HOOC COOH OH OH Ácido tartárico   Figura 1: Estruturas do ácido benzoico e ácido tartárico.   O que podemos notar é que os compostos orgânicos eram obtidos, até então, de plantas ou animais. As técnicas existentes na época não permitiam sua caracterização (isto é, como eram constituídos). Lavoisier (químico francês, 1743-1794) já havia relatado que, diferente dos compostos químicos do “reino mineral”, os compostos orgânicos eram constituídos principalmente de carbono e hidrogênio e, frequentemente, também de nitrogênio e fósforo. Passou a ocorrer uma tendência a achar que a Química Orgânica, embora fosse uma parte integrante da Química, era diferente. Na medida em que era relacionada aos organismos vivos e aos compostos orgânicos, acreditava-se, eram produzidos apenas por esses organismos. A Química Orgânica, como uma divisão da Química, foi proposta em 1777 por Bergman (físico e matemático sueco, 1735-1784) e foi definida como a “Química dos organismos vivos”. Em 1797, pela primeira vez, é tratada diferencialmente quando Gren (químico alemão,1760-1798) publica um livro no qual os compostos orgânicos são tratados em um capítulo à parte. Nesse capítulo, essas substâncias são definidas, na linguagem da época, “como princípios presentes em organismos animais e vegetais e que não poderiam ser sintetizados artificialmente”. Essa ideia permaneceu por várias décadas. Vários químicos achavam que a origem desses compostos (seres vivos) os diferenciava dos compostos minerais. Esses últimos eram obtidos frequentemente em estados mais puros e obedeciam à Lei das Proporções Constantes (também denominada Lei de Proust, ela diz que, independente do modo pelo qual uma substância é obtida, a proporção, em massa, dos elementos que participam de sua composição é sempre a mesma). Como, na época, as técnicas existentes dificultavam a obtenção de compostos orgânicos puros, a presença de impurezas diversas levava a resultados diferentes de análise elementar (proporção de cada átomo presente na molécula) para um mesmo composto, então achou-se que não obedeciam à Lei das Proporções Constantes. A origem do termo “Química Orgânica” vem da proposta de Berzelius (1779-1848), médico e químico sueco, em 1807, para referir-se a todos os compostos descobertos a partir de organismos vivos. Acreditava-se – teoria denominada de Vitalismo – que os compostos orgânicos eram obtidos pela intermediação de uma força vital que existia apenas em plantas e animais. Esses compostos poderiam ser extraídos e transformados uns nos outros, mas não poderiam ser obtidos a partir de outros elementos do reino mineral (que não possuíam a força vital).
  • 4.       .  3 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  A ideia do vitalismo começou a declinar quando Wöhler (1800-1882), médico e químico sueco, em 1828, sintetizou a ureia (substância anteriormente isolada da urina de animais) a partir do cianato de amônia, reação que ficou conhecida como Síntese de Wöhler (Figura 2). Na realidade, Wöhler desejava obter cianato de amônia e, para isso, tratou cianato de chumbo com hidróxido de amônia. Para sua surpresa, obteve um material sólido, que não mostrou as propriedades típicas dos cianatos. Ao analisar o que havia ocorrido, descobriu que havia obtido ureia, idêntica àquela anteriormente isolada de urina. Na realidade, a reação do cianato de chumbo com hidróxido de amônia forma cianato de amônia que, por aquecimento, gera ureia:       Figura 2: Síntese de Wöhler Wöhler, então, escreveu para Berzelius dizendo: “Devo contar-lhe que eu posso fazer ureia sem o uso de rins animais ou humanos”. Realmente, a experiência de Wöhler foi de grande importância, mas ainda houve o questionamento do fato de que, na realidade, esses compostos deveriam ter a força vital, pois o hidróxido de amônia e o ácido ciânico (fonte do cianato de chumbo) eram obtidos de fontes animais (origem orgânica). O reconhecimento de que a teoria da força vital não tem grande aplicabilidade na Química Orgânica foi ocorrendo gradualmente, na medida em que novos compostos orgânicos foram sendo reconhecidos e sintetizados. À medida que o vitalismo perde forças, aquela definição anterior proposta por Bergman (química dos organismos vivos) deixa de ser adequada e, então, Kekulé (1829-1896), químico alemão,(químico alemão, 1829-1896) propõe a definição da Química Orgânica como o ramo da Química que estuda os compostos de carbono. Essa afirmação está correta, contudo, nem todo composto que contém carbono é orgânico. Por exemplo, o dióxido de carbono, o carbonato de sódio, o ácido carbônico, dentre outros, não são orgânicos. Mas, todo composto orgânico contém carbono. Por conveniência, o termo orgânica se mantém até hoje, buscando classificar um grande número de compostos que possuem uma série de propriedades em comum. Diferente dos outros elementos, o
  • 5.       .  4 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  átomo de carbono tem a capacidade de se ligar infinitamente entre si em um número ilimitado de combinações, gerando, com essas ligações, milhares de compostos diferentes. Deve-se enfatizar, contudo, que as divisões da Química nunca foram, nem se espera que venham a ser, mutuamente exclusivas, pois o campo da Química é um só, e há uma tendência natural para a unificação e remoção de barreiras artificiais. A divisão em Química Orgânica, inorgânica, analítica, físico-química e bioquímica se faz buscando uma finalidade didática e em função do enfoque que se deseja dar a um determinado problema. Importância A Química Orgânica está presente em qualquer atividade de nossas vidas. Nesse momento, por exemplo, ao ler esse texto, tudo está sendo mediado por compostos orgânicos. Para conseguir enxergar, seus olhos estão utilizando um composto orgânico (o cis-retinal) para converter a luz em um impulso nervoso. Quando você mexe no “mouse”, no teclado, enfim, faz qualquer movimento (até dormir) o seu organismo está fazendo uma reação química para transformar a glicose em energia. Para que você possa raciocinar e entender esse texto ou perceber o mundo, os impulsos nervosos são transmitidos entre os neurônios através da intermediação de moléculas orgânicas (neurotransmissores, como, por exemplo, a serotonina). A vida moderna está repleta de compostos orgânicos. A grande maioria dos medicamentos, vários pesticidas, as fibras têxteis, os polímeros, os corantes...são moléculas orgânicas. Como mostrado no breve resumo que se fez sobre a história da Química Orgânica, desde a pré-história até meados do século XIX, os compostos orgânicos eram obtidos de organismos vivos. Atualmente, apesar de muitas substâncias orgânicas naturais serem muito complexas e de difícil obtenção laboratorial e, assim, ainda serem obtidas a partir de plantas ou animais, a maioria dos compostos orgânicos são obtidos em laboratório. Os compostos são retirados dos organismos vivos (atualmente, o ambiente marinho também tem se mostrado uma grande fonte de produtos orgânicos), estudados e depois, se tiverem alguma aplicação, sintetizados. Assim, por exemplo, a gente já comentou que o índigo, corante azul utilizado em “jeans”, antigamente era obtido de plantas. Porém, sua aplicação industrial é tão grande que a obtenção da fonte natural não atenderia à demanda mundial. É aí que a Química Orgânica moderna exerce o seu papel: atualmente, o índigo é obtido através de uma síntese (chama-se síntese o processo de transformação de moléculas através de reações químicas para se obter a molécula que se deseja). Dessa mesma forma, tem se sintetizado uma variedade enorme de compostos orgânicos, cujo isolamento de fontes naturais tornaria o processo inviável economicamente. Assim, vários compostos obtidos por síntese são exatamente iguais àqueles existentes nos organismos vivos. Outras vezes, o químico faz algumas modificações nas moléculas naturais, obtendo
  • 6.       .  5 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  compostos semelhantes (denominados derivados), mas que apresentam maior aplicabilidade do que o produto natural. Por exemplo, o ácido salicílico é isolado do salgueiro (família de plantas do gênero Salix) e apresenta atividade anti-inflamatória. No entanto, possui também um efeito corrosivo nas paredes do estômago. Assim, o derivado ácido acetil salicílico (AAS) foi sintetizado e é utilizado como medicamento anti-inflamatório que possui menos efeito colateral que o primeiro. Repare como eles são parecidos (Figura 3): OH COOH O COOH O ÁCIDO SALICILICO ÁCIDO ACETIL SALICILICO   Figura 3: Estruturas do ácido salicílico e do AAS   Com o crescimento da Química Orgânica e o acúmulo de informações obtidas hoje em dia, várias moléculas de grande utilidade são obtidas por síntese química, muitas vezes sem ter nenhuma correlação com produtos naturais.   Fonte de compostos orgânicos Mas, se a maioria dos compostos orgânicos atualmente são obtidos por síntese, quais são as matérias- primas para a sua obtenção? Os compostos orgânicos utilizados como matéria-prima atualmente são obtidos de produtos naturais (por exemplo, no Brasil, o álcool é obtido da fermentação - reação química realizada por micro- organismos – do açúcar da cana e é utilizado para a síntese de éter) e, principalmente, de materiais fósseis. Até o século XX, a principal fonte de compostos orgânicos era o carvão mineral (denominado hulha). A destilação da hulha fornece três frações constituídas respectivamente de: 1) Um material gasoso constituído principalmente de hidrogênio e dióxido de carbono, que era muito utilizado para iluminação e aquecimento; 2) Material líquido, denominado de alcatrão da hulha, e que é a fonte de compostos orgânicos, e 3) Material sólido, denominado coque, utilizado em siderurgia para a obtenção
  • 7.       .  6 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  do ferro gusa (liga de ferro e carbono – designa-se liga uma mistura homogênea de metais) matéria- prima utilizada para a produção do lingote de ferro. No século XX, o petróleo passa a constituir a principal fonte de compostos orgânicos. Além de carbono e hidrogênio, vários outros elementos também estão presentes nos compostos orgânicos. A tabela periódica a seguir mostra os principais elementos constituintes de compostos orgânicos, estando em vermelho os elementos presentes em maiores quantidades.   1                          14  15  16      H       C  N  O          Si P  S  Cl                                    Br                                 I                                      Tabela 1: Tabela Periódica Assim, o gás metano (principal constituinte do gás natural) possui apenas carbono e hidrogênio. A sacarose (açúcar comum) possui carbono, hidrogênio e oxigênio. A anfetamina, um estimulante do sistema nervoso central, possui, além de carbono e hidrogênio, nitrogênio. O colágeno, a elastina e as glicoproteínas são as fibras responsáveis pela sustentação da derme e contém silício em sua estrutura. O NAD (nicotinamida-adenina-dinucleotídeo) é um agente oxidante biológico que contém fósforo em sua estrutura. O cheiro desagradável exalado pelo gambá é devido a dois compostos orgânicos que contém carbono, hidrogênio e enxofre em sua estrutura. O policloreto de vinila (PVC) utilizado para a fabricação de canos é constituído de átomos de carbono, hidrogênio e cloro. O halomon é um composto que contém, além de carbono e hidrogênio, bromo e cloro em sua estrutura. Foi isolado de uma alga marinha e possui atividade antitumoral (possibilidade de uso na terapia contra o câncer). A tiroxina é o hormônio produzido pela tiroide e contém, além de carbono, hidrogênio, oxigênio,
  • 8.       .  7 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  nitrogênio e iodo em sua estrutura. Daqui a pouco, quando a gente entender como as moléculas são representadas, vocês vão ver a estrutura desses compostos. Ligações Químicas Covalentes Antes de começarmos a analisar o átomo de carbono e os compostos orgânicos, devemos recordar sucintamente o processo pelo qual ocorrem as ligações químicas covalentes, isto é, aquelas que se fazem por compartilhamento de elétrons. Os elétrons em um átomo estão distribuídos nos orbitais atômicos (orbital é uma dedução matemática que define a região do espaço onde existe maior probabilidade de se encontrar elétrons). Os orbitais possuem tamanho e níveis energéticos diferentes (quanto mais afastado do núcleo, maior e mais energético é o orbital) e, em função disso, são subdivididos nos subníveis s, p, d e f. Para o estudo da Química Orgânica, vamos nos limitar aos subníveis s e p. Os orbitais s possuem a forma esférica, isto é, a probabilidade de encontrar elétrons é maior na região do espaço definida por uma esfera:     Figura 4: a) ORBITAL 1s b) ORBITAL 1s (preto) e 2s (cinza)   Os orbitais p tem a forma de um haltere e, como são três, orientam-se no espaço ao longo dos eixos cartesianos x, y e z (Figura 5):  
  • 9.       .  8 .  Sala de Leitura  Química Orgânica    Figura 5: a) ORBITAL 2p b) ARRUMAÇÃO ESPACIAL DOS ORBITAIS 2px, 2py e 2pz   Os orbitais 3p e 4p possuem a mesma forma de haltere, só que se encontram mais afastados do núcleo (e, então, são maiores e mais energéticos). A região do espaço entre os dois lobos do haltere é denominada nodo e, nessa região, não há probabilidade de se encontrar elétrons. Os orbitais dos subníveis s não possuem nodo. Para simplificar o desenho dos orbitais, normalmente eles são apresentados da seguinte forma (Figura 6):                   Figura 6: a) Representação dos orbitais s e p; b) Orbitais p orientados nos eixos cartesianos   Quando ocorre uma ligação química covalente, os orbitais atômicos do último nível (orbitais ocupados pelos elétrons de valência) vão se aproximando, encontram-se, e formam um novo orbital (orbital molecular) onde vão se posicionar os dois elétrons, que, agora passam a ser compartilhados pelos dois núcleos dos átomos que se aproximaram, ou seja, os orbitais moleculares são ocupados pelos dois elétrons que formam a ligação.
  • 10.       .  9 .  Sala de Leitura  Química Orgânica      Por exemplo, vamos ver como ocorre a formação da ligação entre dois átomos de hidrogênio para formar a molécula do gás hidrogênio. Para obedecer a regra do octeto, cada átomo de hidrogênio deve ficar com dois elétrons. A distribuição eletrônica do átomo de hidrogênio (1 H) é 1s1 e, consequentemente, vai ocorrer uma interação entre dois orbitais s:   1s σ ORBITAL MOLECULAR 1s     Figura 7 Observe que a interação entre estes dois orbitais ocorre segundo um mesmo eixo, ou seja, ocorre uma interação linear dos dois orbitais. O orbital resultante desse tipo de interação é denominado orbital sigma (σ) e a ligação resultante é denominada ligação sigma (σ). A representação estrutural de uma ligação química é feita por um traço (-) e, assim, a molécula do hidrogênio é representada com a seguinte fórmula estrutural: H-H. Mas, se os orbitais são ocupados por elétrons e esses possuem carga negativa, como os orbitais se aproximam, se cargas iguais tendem a se repelir? Nota ao professor: Para uma melhor compreensão do aluno do Ensino Médio, as representações que se seguem não obedecem plenamente à TEORIA DA COMBINAÇÃO LINEAR DOS ORBITAIS ATÔMICOS (CLOA) e, portanto, conceitos relativos à formação de orbitais moleculares somente levam em conta os orbitais ligantes, descartando-se a formação de antiligantes que não se aplicam às necessidades dos alunos nessa fase de aprendizagem.
  • 11.       .  10 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  O que ocorre é uma atração eletrostática (atração entre cargas opostas) entre o núcleo (carga positiva devido aos prótons) e os orbitais (cargas negativas porque os elétrons estão aí). Assim, o núcleo de um átomo atrai a nuvem eletrônica do outro até o momento em que a aproximação dos dois orbitais gera uma repulsão eletrostática, e aí acaba o processo de formação da ligação. Nessa situação, há um equilíbrio entre as forças de atração e repulsão, resultando numa distância internuclear de maior estabilidade Essa distância internuclear é o que denominamos de comprimento (ou distância) da ligação, cuja unidade mais utilizada é o Angstron (Ao ; 1 Ao = 10 –10 m). O comprimento da ligação H-H é de 0,74 Ao . Em um segundo exemplo, vamos ver como ocorre a formação da ligação da molécula do cloro, onde a interação acontece entre dois elétrons que ocupam os orbitais 3p (17 Cl: 1s2 2s2 2p6 3s2 3p5 ) : σ ORBITAIS ATÔMICOS 3p ORBITAL MOLECULAR 3p 3p     Figura 8   Observe que, assim como para a formação da molécula de hidrogênio, a interação dos orbitais é linear, segundo um mesmo eixo. Logo, a ligação que se forma também é uma ligação σ. O comprimento dessa ligação é de 1,42 Ao . Na formação da molécula de ácido clorídrico (HCl) ocorre a interação entre um orbital 1s do hidrogênio com um 3p do cloro:      
  • 12.       .  11 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  1s σORBITAL MOLECULAR3p     Figura 9   Como para os outros exemplos, a interação dos orbitais ocorre linearmente, formando uma ligação σ. O comprimento da ligação H-Cl é de 1,27 Ao . Nos exemplos vistos acima, todas as ligações ocorreram segundo um mesmo eixo, ou seja, foram realizadas interpenetrações lineares de orbitais gerando ligações σ. Entretanto, nem sempre isso é possível, pois quando mais de uma ligação é realizada entre dois átomos, uma delas ocorre segundo um mesmo eixo, porém as demais, em função do próprio arranjo espacial dos orbitais, não podem ocorrer dessa forma, visto que os demais orbitais envolvidos não estão alinhados segundo esse mesmo eixo, mas sim em eixos normalmente paralelos. Sendo assim, a interpenetração não ocorre de forma linear e as ligações são estabelecidas segundo eixos paralelos, distinguindo-se da sigma (σ) e são denominadas de ligações pi (π): Como exemplo, vamos ver a formação da molécula de nitrogênio (7N: 1s2 2s2 2p3 ). Pela configuração eletrônica do átomo, há três orbitais p, cada um com um elétron: 2px 1 2py 1 2pz 1 . Os orbitais 2px 1 (essa escolha 2px foi arbitrária. A ligação poderia ser feita entre os 2py ou 2pz) se superpõem ao longo do eixo x (eixo internuclear) e formam uma ligação σ:
  • 13.       .  12 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  σORBITAIS ATÔMICOS2p ORBITAL MOLECULAR     Figura 10 E as outras duas ligações? As outras duas ligações são feitas por entrosamento orbitalar paralelo, perpendicular ao eixo da ligação σ, formando duas ligações π:   ORBITAIS ATÔMICOS2py ORBITAIS ATÔMICOS2pz   Figura 11: a) Representação dos orbitais na molécula de N2; b) Representação da molécula de N2.   Observem que, nesse entrosamento paralelo dos orbitais p, cria-se dois orbitais moleculares π que originam, na molécula, regiões ricas em elétrons (orbitais π) que se posicionam acima e abaixo do plano da ligação σ (Figura 11). Portanto, uma das ligações covalentes entre dois átomos é chamada de sigma (σ) e as demais, entre esses mesmos átomos, é chamada de pi (π). Assim, numa dupla ligação, é encontrada uma ligação sigma (σ) e uma pi (π); numa tripla ligação, é encontrada uma ligação sigma (σ) e duas pi (π). Quando não há presença de duplas ou triplas ligações nas moléculas todas são classificadas como sigma.
  • 14.       .  13 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Ligações Covalentes Polares e Apolares Os elétrons nas ligações covalentes não são necessariamente compartilhados igualmente entre os dois átomos que formam a ligação. Se um átomo for mais eletronegativo (eletronegatividade é a tendência que possuem determinados átomos de atrair elétrons) que o outro, o átomo mais eletronegativo vai puxar os elétrons para mais perto dele. Quando isso ocorre, dizemos que a distribuição eletrônica é polarizada e a ligação é dita covalente polar. Por exemplo, na molécula de H-F, como o flúor é mais eletronegativo que o hidrogênio, os elétrons da ligação vão estar mais próximos do flúor. Assim, a ligação H-F é uma ligação covalente polar, na qual o flúor possui uma carga parcial negativa (a carga é denominada parcial para distingui-la da carga formal, que é a carga real presente nos cátions e ânions). As formas mais utilizadas para representar essa polarização são os símbolos δ+ δ‐ para representar cargas parciais ou uma seta orientada no sentido do átomo menos eletronegativo para o mais eletronegativo:   H F δ + δ - H Fou     Figura 12 Na tabela periódica, a eletronegatividade cresce da esquerda para a direita e de baixo para cima. Linus Pauling (químico americano, 1901-1994) estudou muito as ligações químicas. A tabela da escala de eletronegatividade de Linus Pauling é muito utilizada cotidianamente:     E    E  F  4,0  I  2,5  O  3,5  C  2,5  N  3,0  S  2,5  Cl  3,0  H  2,1  Br  2,8      Tabela 2: Tabela de eletronegatividade de Linus Pauling
  • 15.       .  14 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  O Átomo de Carbono Hibridização Hibridização sp3 O carbono encontra-se situado na família 14 da classificação periódica e possui número atômico igual a 6. Portanto, possui seis prótons em seu núcleo e seis elétrons em sua eletrosfera. Na natureza, são encontrados três isótopos (isótopos são elementos químicos de um mesmo átomo, cuja diferença entre eles está no número de nêutrons) do carbono de números de massa 12, 13 e 14, cada um deles com número de nêutrons igual a 6, 7 e 8, respectivamente. O isótopo 12 C está presente em 99% dos átomos de carbono existentes na Terra, enquanto o 13 C é encontrado no 1% restante. O 14 C é um radioisótopo (um radioisótopo é um isótopo instável que emite energia ao se transformar no isótopo mais estável), que ocorre na Terra na proporção de 1 para 1 trilhão (0,0000000001%) e é muito utilizado em processos de datação de fósseis. A distribuição eletrônica por subníveis, em ordem crescente de energia para esse elemento é 1s2 2s2 2p2.   energia 1s 2s 2px 2py 2pz ORBITAIS ATÔMICOS DO CARBONO (Distribuição Eletrônica)   Figura 13 Se analisarmos a distribuição eletrônica do carbono (acima), e formos fazer o tratamento que estamos habituados para as ligações químicas (regra do octeto), haveria duas possibilidades: 1) O carbono faria duas ligações usando os orbitais mono-ocupados e aí seria divalente e não obedeceria a regra do octeto (ficaria com seis elétrons no último nível). 2) O carbono faria três ligações, sendo que em uma delas ambos os elétrons seriam cedidos por outro átomo.
  • 16.       .  15 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Entretanto, Kekulé, em 1857, já havia mostrado experimentalmente que nos compostos orgânicos o carbono é sempre tetravalente (isto é, faz quatro ligações) e essas quatro ligações são covalentes. Assim, a molécula do metano (CH4) é formada por quatro ligações σ C-H idênticas, como mostrado na fórmula estrutural plana (fórmula estrutural plana é uma representação molecular em que não nos preocupamos em mostrar os ângulos que os orbitais moleculares fazem entre si): C H H H H   Figura 14 Como explicar, então, essa tetravalência do carbono? O modelo que usamos para isso é o que se denomina hibridização de orbitais. Nesse processo, ocorre uma combinação dos quatro orbitais atômicos do último nível (2s + 2px + 2py + 2pz) formando quatro novos orbitais atômicos idênticos. Como essa combinação ocorreu entre um orbital s e três orbitais p, esses novos orbitais são designados sp3 :   + + + 2s 2px 2py 2pz sp3 sp3 sp 3 sp3   Figura 15 Analogicamente, esse processo pode ser comparado ao significado do termo hibridização em Biologia. Por exemplo, uma mula é um híbrido resultante do acasalamento de duas espécies diferentes: jumento
  • 17.       .  16 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  e égua. Ela não é um jumento, nem uma égua. É uma mula, espécie diferente, resultante da hibridização de outras duas espécies. Os orbitais atômicos híbridos sp3 não são orbitais s nem p, mas novos orbitais advindos da hibridização daqueles. A distribuição eletrônica nesses novos orbitais segue a regra de Hund (físico alemão, 1896-1997): ao ser preenchido um subnível, cada orbital desse subnível recebe apenas um elétron. O orbital só receberá um segundo elétron quando todos os orbitais daquele subnível já possuírem um elétron. Assim, após a hibridização, cada orbital sp3 do carbono possuirá um elétron: energia 1s 2s 2px 2py 2pz ORBITAIS ATÔMICOS DO CARBONO HIBRIDIZAÇÃO energia 1s 2sp3 ORBITAIS ATÔMICOS HÍBRIDOS DO CARBONO 2sp3 2sp3 2sp3   Figura 16 Com essa nova distribuição eletrônica fica fácil entender que na molécula do metano formam-se quatro ligações σ resultantes da interação orbitalar de cada um dos orbitais híbridos do carbono com um orbital s do hidrogênio.   C H H H H Quatro ligações σ C-H resultantes da interação do orbital sp3 do C com o s do hidrogênio.     Figura 17
  • 18.       .  17 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Mas, de que forma (arranjo espacial) esses orbitais se posicionam em torno do núcleo do átomo de carbono? Os elétrons têm carga negativa e, por conta da repulsão eletrostática, os quatro orbitais vão querer estar o mais afastados possível. A figura geométrica com quatro vértices onde estes estão o mais afastados possível um do outro é o tetraedro e, assim, os quatro orbitais sp3 estão arrumados ao redor do átomo de carbono em um arranjo tetraédrico:     Figura 18   A interação dos átomos de hidrogênio ocorrerá com o átomo de carbono nesse arranjo e daí resultará que a molécula do metano possuirá, também, este arranjo:     Figura 19 Assim, a molécula do metano arranja-se espacialmente como um tetraedro e os ângulos formados por suas ligações são de 109,5o , característico de um tetraedro regular. Isso é bem visualizado no modelo vareta e bola mostrado abaixo:  
  • 19.       .  18 .  Sala de Leitura  Química Orgânica    109,5o   Figura 20 Para facilitar o desenho dessa representação estrutural do metano, usamos uma fórmula estrutural conhecida como modelo cunha e traço, em que os dois vértices do tetraedro situados no plano do papel são desenhados como uma linha comum. O vértice que se projeta para frente desse plano é desenhado por uma cunha em negrito e o que se projeta para trás é representado por uma cunha pontilhada:   H C H H H " para atrás" do plano do papel "para a frente" do plano do papel     Figura 21   Finalmente, deve-se ressaltar que esse modelo de hibridização orbitalar e arranjo tetraédrico em torno do carbono é aplicável para qualquer composto orgânico no qual o carbono realiza quatro ligações σ. Isso pode ser visto nos modelos vareta e bola e em cunha e traço para as moléculas do etano e propano (Figura 22):
  • 20.       .  19 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  H C C H H H H H H C C C H H H H H H H ETANO PROPANO   Figura 22: Modelo vareta e bola e cunha e traço para as moléculas do etano e propano. Hibridização sp2 : Assim como já vimos para a molécula de nitrogênio, existem compostos orgânicos que possuem em sua estrutura ligações π . Esse é o caso, por exemplo, dos gases etileno e acetileno:   H C C H H H C C HH σ σ σ σ σ σ σ σ π π π ETILENO ACETILENO  Figura 23   Mas, a ligação π ocorre pelo entrosamento paralelo de orbitais p. No modelo de hibridização proposto para moléculas do metano, e válido para todos os compostos que possuem carbono que só faz ligação σ – ou seja, o modelo de formação de orbitais atômicos sp3 – não resta nenhum orbital p com apenas um elétron, condição necessária para fazer uma ligação π. Como ocorre a formação dessa ligação? Vamos iniciar explicando a molécula do etileno (com uma ligação π): Agora, ocorre uma hibridização entre o orbital 2s e apenas dois dos três orbitais p, gerando três orbitais atômicos híbridos sp2 (repare que é a combinação de um orbital s com dois p, daí a designação sp2 ) e restando um p já ocupado anteriormente:
  • 21.       .  20 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  + + 2s 2px 2py 2pz sp2 sp2 sp2 2pz     Figura 24   Na figura acima, o processo foi mostrado sem o envolvimento do orbital 2pz. Essa escolha foi aleatória e pode ocorrer com qualquer um dos três orbitais p. Após a distribuição eletrônica nos orbitais híbridos fica fácil entender como ocorre a ligação C=C no etileno:   energia 1s 2s 2px 2py 2pz ORBITAIS ATÔMICOS DO CARBONO HIBRIDIZAÇÃO energia 1s 2sp2 ORBITAIS ATÔMICOS HÍBRIDOS DO CARBONO 2sp2 2sp2 2p     Figura 25   Dos três orbitais sp2 , dois vão se ligar ao orbital s do hidrogênio e o terceiro vai se ligar ao outro átomo de carbono, gerando as ligações σ. O orbital p vai se ligar ao outro orbital p, formando a ligação σ C‐C. 
  • 22.       .  21 .  Sala de Leitura  Química Orgânica      Figura 26   Observe que o entrosamento paralelo dos orbitais p gera uma nuvem eletrônica acima e abaixo do plano definido pela ligação σ C-C. Da mesma forma que vimos para o arranjo espacial dos orbitais sp3 , os orbitais sp2 , devido à repulsão das cargas entre seus elétrons, posicionam-se no centro de um triângulo equilátero (ângulo de 120o entre eles) e o orbital p fica perpendicular ao plano desse triângulo. A esse tipo de arranjo designamos trigonal planar e a ligação C=C terá sempre esse arranjo (Figura 27):       Figura 27: a) Representação do C sp2: três orbitais sp2 arrumados em um triângulo equilátero e um orbital p perpendicular a esse triângulo; b) Ângulo de 120º entre os orbitais sp2 e de 90º entre um orbital sp2 e o orbital p; c) Arranjo orbitalar na molécula do etileno: H2C=CH2 Por que a ligação C=C é planar? Já comentamos que a ligação p ocorre por um entrosamento paralelo de orbitais p. Para que fiquem paralelos, eles têm de estar no mesmo plano. Esse paralelismo tem uma consequência importante para todas as moléculas que têm ligação π. Repare que na formação de ligações σ o entrosamento orbitalar é linear, resultando em uma ligação que dizemos possuir simetria cilíndrica, como podemos ver para a ligação C-C do etano: ACHO QUE NÃO DAR PARA EXCLUIR O SÍMBOLO SIGMA POIS SÓ NESSA LIGAÇÃO O ENTRPOSAMENTO DA LIGAÇÃO È LINEAR.
  • 23.       .  22 .  Sala de Leitura  Química Orgânica    C C H H H H H H     Figura 28   As ligações que possuem simetria cilíndrica possuem rotação livre e é isso o que ocorre, na realidade. As moléculas não são entidades estáticas, estão sempre em constante movimento e as ligações simples giram o tempo todo. Mas, o que ocorreria se a ligação C=C girasse? Os orbitais p perderiam seu paralelismo, ou seja, não aconteceria entrosamento orbitalar. Em outras palavras, a ligação química se quebraria (Figura 29). Por conta disso, as ligações π não possuem rotação livre.     Figura 29: Quebra da ligação π em um suposto movimento de rotação   Hibridização sp: Vamos ver agora o que ocorre com a molécula do acetileno que possui uma ligação tripla CΞC:     Como já vimos, uma ligação tripla significa uma ligação e duas . Para isso ocorrer, dois orbitais p devem ficar fora do processo de hibridização, ou seja, a combinação orbitalar (hibridização) deve ocorrer entre um orbital s e um orbital p. Por conta disso, os dois orbitais híbridos resultantes são designados sp. C C HH
  • 24.       .  23 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  + 2s 2px 2py 2pz sp sp 2pz2py     Figura 30   A distribuição eletrônica do átomo de carbono após a hibridização sp mostra que existem dois orbitais híbridos sp que farão duas ligações σ (no caso do acetileno, uma será com o carbono e a outra com o hidrogênio) e dois orbitais p, que por entrosamento paralelo dois a dois formarão as duas ligações π.  Lembre-se que os dois orbitais p são perpendiculares entre si e, consequentemente, após a formação das duas ligações π essas também serão perpendiculares entre si. Assim, a molécula do acetileno possui duas nuvens eletrônicas abaixo e acima do plano da ligação σ e outras duas nuvens eletrônicas localizadas na frente e atrás desse plano:     Figura 31   Por analogia ao arranjo tetraédrico do carbono com orbitais híbridos sp3 e trigonal planar do carbono com orbitais híbridos sp2 , os orbitais híbridos sp se arranjam de forma linear, um do lado oposto ao outro, pois é nessa arrumação que as duas nuvens eletrônicas estarão o mais afastadas possível. Já comentamos sobre a característica peculiar do átomo de carbono de realizar ligações C-C infinitamente, gerando compostos diferentes ou, como costumam dizer os químicos, com uma variedade enorme de cadeias carbônicas. É importante ficar claro que em uma mesma cadeia carbônica podemos ter ligações simples (orbital sp3 ), duplas (orbital sp2 ) e triplas (orbital sp). Não
  • 25.       .  24 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  precisamos fazer toda a análise orbitalar para prever como essas cadeias estão arrumadas no espaço. Basta observar os tipos de ligações que os átomos de carbono estão fazendo: se o carbono só possuir ligações simples, essas são todas σ e o carbono é tetraédrico (sp3 ); se o carbono possuir ligação dupla, uma é σ e a outra π e o carbono é trigonal planar (sp2 ); se o carbono possuir ligação tripla, uma é σ e as outras duas são π e o carbono é linear (sp). Por exemplo, na molécula ao lado, os carbonos que eu chamei de 1 e 2 são sp2 e trigonal planares. Os carbonos 3 e 6 são sp3 e tetraédricos, enquanto os carbonos 4 e 5 são sp e lineares. Figura 32   Não é apenas no átomo de carbono que ocorre a hibridização de orbitais. O modelo de hibridização pode ser aplicado para explicar a ligação em qualquer átomo. Por causa disso, outros átomos ligados ao carbono também podem estar hibridizados. Na molécula da supercola, por exemplo, o carbono e o nitrogênio da ligação CΞN são sp, o oxigênio e o carbono da ligação C=O são sp2 e o carbono e oxigênio da ligação C-O são sp3 . O comprimento das ligações também é diferente, em função do tipo de ligação. Observe que uma esfera (orbital s) está mais próxima do núcleo atômico que um haltere (orbital p). Por conta disso, quanto maior for o caráter s do orbital híbrido, mais curta vai ser a ligação (vai estar mais perto do núcleo). Assim, as ligações triplas onde a ligação σ (é ela quem define o comprimento da ligação por conta do entrosamento linear) é formada pelo carbono sp (50% de s + 50% de p) são mais curtas que as ligações duplas (sp2 : 33,3% s + 66,7% p), que, por sua vez, são mais curtas que as ligações simples (sp3 : 25% de s + 75% de p). Observe abaixo o comprimento (em vermelho) e os ângulos (em azul) das ligações para o etano, etileno e acetileno: O QUE FOI EXCLUÍDO?           H C H C H C C C H C H H H H 1 2 3 4 5 6   H C H C C N O O C H H H Super-cola   Figura 33
  • 26.       .  25 .  Sala de Leitura  Química Orgânica        Figura 34   Resumindo, em termos de comprimento de ligação: C-C > C=C > C C     Representação dos Compostos (“Desenhando As Moléculas”) Quando estudamos Química Orgânica, o que buscamos é entender a maneira pela qual os átomos se encontram nas moléculas (arranjo molecular), ou seja, como eles estão ligados entre si, as propriedades químicas que são consequência dessa arrumação e a maneira pela qual as estruturas moleculares se modificam quando ocorre uma reação química. Para alcançar esses objetivos, o primeiro passo deve ser o entendimento das representações que utilizamos para tentar descrever as moléculas. Em outras palavras, precisamos entender e aprender o que queremos dizer quando representamos as moléculas por fórmulas. Devemos nos lembrar sempre que a representação de uma coisa não é a coisa. Assim, por exemplo, a foto do namorado ou da namorada não é o namorado ou a namorada: é a representação dele ou dela. Os químicos utilizam diversas maneiras para representar as moléculas. Não existe uma mais correta que a outra. O tipo de representação que usamos vai depender do problema que estamos analisando. A fórmula molecular, por exemplo, apenas informa quais são e a quantidade dos átomos presentes em uma molécula. Ela não informa nada sobre a estrutura (como os átomos estão ligados na molécula) molecular. Por causa disso, é muito comum que duas moléculas diferentes possuam a mesma fórmula molecular. Por exemplo, o álcool etílico (aquele que nós conhecemos simplesmente por álcool) e o éter metílico são dois compostos completamente diferentes. Mas, repare que os dois possuem a mesma fórmula molecular (C2H6O). Compostos diferentes que possuem a mesma fórmula molecular são denominados isômeros.
  • 27.       .  26 .  Sala de Leitura  Química Orgânica        Figura 35 Como a fórmula molecular não informa nada sobre a estrutura molecular, não conseguimos, a partir dela, entender o comportamento da molécula. Mas ela é muito útil quando, por exemplo, estamos realizando cálculos estequiométricos (cálculo das quantidades de substâncias envolvidas em uma reação química). No entanto, na maioria das vezes em que estamos lidando com a Química, precisamos tentar entender como as moléculas se comportam e, para isso, é fundamental que se represente como os átomos estão unidos entre si dentro da molécula, isto é, precisamos representar a conectividade dos átomos. As fórmulas que mostram essa conectividade são denominadas fórmulas estruturais. Compostos que possuem fórmulas estruturais diferentes são diferentes. Existem várias maneiras de se representar a fórmula estrutural de uma molécula. As mais usadas estão mostradas a seguir para o álcool etílico:       Figura 36  
  • 28.       .  27 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  As fórmulas estruturais condensadas e as fórmulas de traços mostram a conectividade dos átomos, mas não mostram a geometria molecular (as moléculas são entidades tridimensionais e têm uma arrumação no espaço). Observe, ao analisarmos a fórmula em traços, que a cadeia carbônica é apresentada linearmente e não nos preocupamos com os ângulos das ligações. As fórmulas condensadas e de traços nos dão basicamente as mesmas informações sobre a molécula. A fórmula estrutural plana nos fornece mais informações sobre a geometria da cadeia carbônica. Na realidade, tendo em vista os ângulos de 109,5º do carbono sp3 , as cadeias carbônicas se arrumam como um zigue-zague (“sobe e desce”) e esse tipo de fórmula estrutural representa isso. Na fórmula estrutural espacial, além da representação em zigue-zague das cadeias carbônicas, são também mostradas as cunhas que representam os átomos que estão se posicionado nos outros dois vértices do tetraedro. Nesse tipo de representação estrutural buscamos mostrar toda a geometria molecular. A fórmula estrutural em traços (também chamada fórmula em bastão) é centrada na representação das ligações e não dos átomos (repare que na representação do álcool etílico usando essa fórmula só desenhamos o oxigênio e o hidrogênio ligados a ele). As fórmulas em traços são desenhadas da seguinte maneira: 1a etapa: Desenhe a cadeia de carbono como traços e em zigue-zague. Não represente o símbolo do carbono (C) nem do hidrogênio (H) quando ele estiver ligado ao carbono. Entretanto, você não pode esquecer nunca que o carbono é tetravalente. Assim, cada vértice da cadeia em zigue-zague representa o átomo de carbono e se mais nada estiver escrito nela, significa que ali existem dois hidrogênios, sendo um localizado para frente do plano criado pela cadeia e outro para trás desse plano, de acordo com a geometria do tetraedro. 2a etapa: Todos os átomos que não são carbonos devem ter os seus símbolos mostrados, bem como o hidrogênio que não está ligado ao carbono. Vamos entender isso com a fórmula em traços do álcool etílico:
  • 29.       .  28 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  O H As extremidades da cadeia representam um átomo de carbono Cada vértice do zigue-zague representa um átomo de carbono Este átomo de carbono tem três hidrogenios ligados a ele, pois só estamos mostrando uma ligação (traço) e 4-1=3 Este átomo de carbono tem dois hidrogenios ligados a ele, pois estao sendo mostradas duas ligaões : C-C e C-O e 4-2=2 Este hidrogênio deve ser desenhado porque ele não está ligado ao carbono.   Figura 37   Por uma questão de simplificação, é muito comum a gente não desenhar o traço que representa a ligação do hidrogênio com o heteroátomo (chamamos de heteroátomo a todo átomo da cadeia carbônica que não é carbono ou hidrogênio):   As ligações duplas devem ser representadas por dois traços e as triplas por três traços:   OH O H H H O O H H H     H C C H H H H H   Figura 38   Preste atenção que, no caso da ligação dupla, a cadeia foi desenhada em zigue-zague e, na ligação tripla, fomos fiéis ao ângulo de 180o (repare que desenhamos essa parte da molécula linearmente). Isso porque é muito difícil distinguir desenhando um ângulo de 109,5o de um de 120o . O Importante é você sempre lembrar que nessa parte da cadeia os carbonos possuem um arranjo trigonal planar. OH Observe que não desenhamos o traço que representa a ligação O-H  
  • 30.       .  29 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  É muito comum a gente misturar a forma de representação em traços com a condensada na parte da molécula que temos os heteroátomos: H H H O OH H H COOH ou CO2H   Figura 39 Outra coisa que você vai ver muito são representações deste tipo: NH2 , e aí fica a pergunta: ué, o carbono não é tetraédrico? Esse nitrogênio não está para frente ou para trás do plano da cadeia carbônica? A resposta é: está sim. O que estamos dizendo nessa representação é: 1) Não sabemos se o arranjo espacial desse nitrogênio (mais tarde vamos entender que ele estar para a frente ou para trás do plano pode gerar compostos diferentes); ou 2) Para o estudo que estamos fazendo não faz diferença saber para que lado está o átomo de nitrogênio. As cadeias carbônicas não são sempre abertas. Elas também podem ser cíclicas e os ciclos também são representados em traços:   C C C C C H H H H H H H H H H C C C C C C H H H H H H   Figura 40 As representações em traços possuem a vantagem de facilitar os desenhos das moléculas. Em virtude da propriedade do carbono de realizar ligações C-C infinitamente, existem moléculas enormes e se fossemos desenhar todos os átomos, além da perda de tempo, o resultado ia ser extremamente confuso. Por exemplo, a molécula da palitoxina (Figura 41), uma toxina marinha extremamente
  • 31.       .  30 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  venenosa isolada de corais da espécie Palythoa (ainda bem que até hoje não encontramos esse coral nos nossos mares!), tem fórmula molecular C129H221O54N3:     Figura 41: a) Corais marinhos da espécie Palythoa caribaeorum; fórmula estrutural em traços da palitoxina.   Imagine o trabalho que daria desenhar a fórmula estrutural espacial dessa molécula. Tente e veja... você vai desistir rapidinho! Agora que já sabemos interpretar a representação das moléculas orgânicas, podemos visualizar (e entender o que as representações querem dizer) as fórmulas estruturais das substâncias citadas no início desse texto (Figura 42), quando aprendemos sobre os átomos que aparecem com mais frequência nos compostos orgânicos (lembra, foi quando vimos os elementos da tabela periódica que mais aparecem nos compostos orgânicos).    
  • 32.       .  31 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Cl Cl Cl Cl Policloreto de vinila (PVC) Polímero utilizado para a fabricação de canos O N H O NH2 OH HH OH H O P O P O H HH OH H O OH N N N N O O O O NH2 Nicotinamida-adenina-dinucleotídeo (NAD) Cl Cl Br Br Cl Halomon Medicamento utilizado em quimioterapia (tratamento de cancer) OI HO I I I CO2H NH2 Tiroxina Hormônio produzido pela tiróide O O OH OH HO HO O HO OH OH OH Sacarose (açucar comum) NH2 Anfetamina (estimulante do SNC) SH SH 2-buteno-tiol 3-metil-2-buteno-tiol (substâncias exaladas pelo gambá)     Figura 42: Exemplos de representações de algumas moléculas orgânicas importantes.   Toda ciência, talvez para que as pessoas que trabalham com ela possam se identificar como um grupo, possui uma linguagem própria. Com a Química não é diferente. Daqui a pouco nós vamos aprender a nomear os compostos orgânicos. Mas, antes disso, devemos saber como se classificam as cadeias orgânicas: - Em função da presença ou não de ciclo (também chamamos de anel), a cadeia é classificada em cíclica ou acíclica (ou aberta):  
  • 33.       .  32 .  Sala de Leitura  Química Orgânica        Figura 43 - Em função da presença de ligações π entre os átomos de carbono, as cadeias são classificadas em saturadas ou insaturadas. As cadeias insaturadas são as que possuem ligação π entre átomos de carbono.       Figura 44
  • 34.       .  33 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Esta definição causa certa polêmica entre os químicos. A molécula de cadeia aberta constituída apenas por átomos de carbono e hidrogênio tem sempre a fórmula molecular CnH2n+2, isto é, o número de hidrogênios é sempre o dobro do de carbonos:       Figura 45 As moléculas desse tipo são ditas saturadas. A partir daí, insaturadas seriam aquelas que não obedecem a essa regra. Observe nas moléculas:   Figura 46   A presença de uma ligação π diminui em 2 (C4H10 x C4H8) o número de hidrogênios e diz-se que a molécula tem uma insaturação. A presença de duas ligações π (duas ligações duplas ou uma tripla) diminui em 4 o número de hidrogênios e a molécula tem duas insaturações. Mas, observe uma cadeia cíclica:           Figura 47
  • 35.       .  34 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Também diminui em dois o número de hidrogênios, ou seja, a molécula tem uma insaturação e essa cadeia cíclica seria dita insaturada, embora não tenha nenhuma ligação π. Afinal, insaturação é quando tem ligação π entre átomos de carbono ou é diminuição do número de hidrogênios em relação à molécula saturada? Para evitar essa confusão, tem sido uma tendência designar cadeia insaturada apenas aquelas que possuem ligações π entre carbonos e, para o enfoque de diminuição de hidrogênios, dizemos “cadeias com deficiência de hidrogênio”, caso em que se incluem as cadeias cíclicas. - Quanto à presença ou não de heteroátomos (lembrem-se: heteroátomos são átomos diferentes de carbono e hidrogênio) na cadeia, estas são chamadas de cadeias homogêneas ou heterogêneas:     Figura 48   Normalmente, os ciclos contendo heteroátomos chamamos de heterociclos. Os outros seriam os homociclos, que em geral a gente se refere apenas como ciclos (não usamos o prefixo “homo”).
  • 36.       .  35 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  - As cadeias carbônicas podem ainda ser classificadas em ramificadas ou não ramificadas. Analise a molécula abaixo:   Figura 49 Observe que o segundo carbono possui ligado a ele – além, é claro, do resto da cadeia – uma cadeia menor, constituída de dois átomos de carbono. Essa cadeia menor nós chamamos de ramificação (em analogia aos ramos de uma árvore que saem do tronco principal), e as cadeias que as contêm são designadas ramificadas. A cadeia maior é chamada de cadeia principal. Não é obrigatório que se desenhe a cadeia principal na horizontal. Essa é apenas a forma mais comum. O importante é você saber que a cadeia principal é sempre a que contém maior número de átomos de carbono. Abaixo, por exemplo, estão mostradas três representações da mesma molécula cuja cadeia principal (destacada em vermelho) tem 6 átomos de carbono:     Figura 50 É importante que se tenha claro que só chamamos de ramificação cadeias carbônicas. Heteroátomos ligados à cadeia carbônica não são considerados ramificações: Cadeia ciclica insaturada ramificada ( o ciclo é a cadeia principal) OH Cadeia ciclica insaturada não ramificada N Cadeia aciclica saturada não ramificada   Figura 51 1 2 3 4 5  
  • 37.       .  36 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Em função do número de ramificações, o carbono sp3 é classificado em metílico, primário, secundário, terciário ou quaternário. Carbono metílico não está ligado a nenhum carbono. Carbono primário está ligado a um carbono, o secundário a dois, e assim sucessivamente: OP P P P Q TS P M O O O P S S S S Q M M = METÍLICO P = PRIMÁRIO S= SECUNDÁRIO T = TERCIÁRIO Q = QUATERNÁRIO   Figura 52 Forças Intermoleculares Até agora nós conversamos sobre as ligações que constituem as moléculas orgânicas. Mas, vamos lembrar que nunca a gente se depara com uma única molécula. Quando eu pego um vidro de uma substância qualquer, orgânica ou inorgânica, lá dentro, mesmo que o vidro seja bem pequenino, tenho milhares de moléculas. Por exemplo, um mol de água pesa 18g. Como a densidade da água é igual a 1, então 18g correspondem a 18 mL, ou seja, em 18 mL de água eu tenho 6,02 x 1023 (o no de Avogrado) moléculas de água! E aí vem a pergunta: será que essas moléculas interagem entre si ou uma não está nem aí para a outra? As moléculas interagem entre si através do que chamamos de forças ou ligações intermoleculares. Para que a gente possa entender o que são essas forças, precisamos estudar o que vem a ser polaridade de uma molécula. Nós já vimos que uma ligação covalente polar é aquela em que o compartilhamento de elétrons não é igual para os dois átomos porque o mais eletronegativo puxa os elétrons para mais perto dele. Com isso, é criado um dipolo interno (uma parte fica com caráter positivo e outra com caráter negativo) na ligação e, consequentemente, na molécula:
  • 38.       .  37 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  O H O H δ+ δ − δ+ C-O O-H LIGAÇÕES POLARES ÁLCOOL ETÍLICO : MOLÉCULA POLAR   Figura 53   Observe que nós não consideramos a ligação C-H como um dipolo interno. A diferença de eletronegatividade dos dois é tão pequena que praticamente não se cria esse dipolo. Na linguagem química, a gente diz que a ligação C-H é apolar. Entretanto, nem toda molécula que tem ligação polar é uma molécula polar. Nesse caso, nós temos que avaliar dois aspectos: o arranjo espacial e o tamanho da molécula. Arranjo espacial: vamos ver o que acontece com a molécula de CO2: O sentido de um dos dipolos é oposto ao do outro. Assim, os dipolos se anulam e a molécula, apesar de ter ligações polares, é apolar. Lembre-se que no CO2 o carbono faz duas ligações π (uma com cada oxigênio) e, então, é hibridizado sp, logo, linear. Na molécula CCl4 (tetracloreto de carbono) acontece uma coisa parecida. O arranjo da molécula é tetraédrico e, lembrando-se da forma com que somamos vetores, os dois vetores resultantes estão em sentido oposto, e assim se anulam. Então, embora ela tenha quatro ligações polares, é uma molécula apolar:   Cl Cl Cl Cl Os vetores resultantes das duas somas vetoriais se anulam   Figura 55   Outro fator que devemos analisar é o tamanho da molécula. Às vezes, uma molécula tem ligações polares, mas a cadeia carbônica é tão grande que a molécula acaba se comportando como uma O C O   Figura 54 
  • 39.       .  38 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  molécula apolar. As gorduras (triglicerídeos), por exemplo, têm propriedades apolares, apesar de possuírem várias ligações C-O e C=O (polares):   O O O O O O Triglicerídeo   Figura 56 Bem, agora que a gente já sabe reconhecer se uma molécula é polar ou apolar, podemos entender as forças intermoleculares. Essas forças ocorrem devido à interação entre as cargas reais ou parciais (aquelas advindas da polaridade) de uma molécula interagindo com as cargas reais ou parciais de outra molécula. Essa interação ocorre pela atração de uma carga positiva com uma negativa e ela é maior quanto maior for a magnitude da carga e menor for a distância entre elas. Essas forças intermoleculares são de cinco tipos: interação íon-íon, interação íon-dipolo, interação dipolo-dipolo, interação dipolo-dipolo induzido, interação dipolo-induzido-dipolo-induzido. A interação íon-íon é aquela que nós conhecemos como ligação iônica. Ela ocorre, por exemplo, entre os íons cloreto e sódio no NaCl (sal de cozinha) e no lauril éter sulfato de sódio, um agente de limpeza muito usado em xampus. São interações muito fortes:                   Figura 57 O S O O- Na+ Lauril eter sulfato de sodio interação ío-íon   Na+ Na+ Na+ Na+ Na+ Cl- Cl- Cl- Cl-
  • 40.       .  39 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  As interações íon-dipolo induzido são as que ocorrem entre uma espécie com carga real (cátion ou ânion) e a carga parcial de outra molécula, como mostrado na interação do cátion de sódio com a carga parcial negativa do átomo de oxigênio da água. Essas interações são moderadamente fortes.   Na+ O H H δ− δ+ δ +   Figura 58   As interações dipolo-dipolo, como o próprio nome diz, são as que ocorrem entre o polo criado pela carga parcial positiva de uma molécula com a carga parcial negativa de outra. É uma interação fraca. É a que ocorre entre duas moléculas polares, mas sem carga. Veja na acetona:   δ− δ+ δ+ O Oδ−   Figura 59 Um tipo especial de atração dipo-dipolo é chamada de Ligação Hidrogênio. Nessa interação, o hidrogênio é ligado a um átomo muito eletronegativo: F, O ou N é o polo positivo que é atraído pelo polo negativo F, O ou N, de outra molécula (para ajudar a memorizar, lembrem-se de uma buzina: fon- fon!): O H H O H H Figura 60
  • 41.       .  40 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Por exemplo, a dupla hélice do DNA é estabilizada pelas ligações hidrogênio entre as bases nitrogenadas presas às duas cadeias:   Figura 61: a) Ligação hidrogênio entre as bases nitrogenadas (guanina e citosina) do DNA.   Como o hidrogênio é um átomo pequeno, as cargas parciais conseguem se aproximar muito, resultando em uma atração mais forte que a dipolo-dipolo clássica. A interação dipolo-dipolo induzido ocorre quando uma molécula polar se aproxima de uma outra, apolar. Ao se aproximar, o dipolo da molécula polar faz com que ocorra uma distorção da nuvem eletrônica da molécula apolar, induzindo um dipolo instantâneo:   O H H δ− δ + δ + I I δ− δ− δ + δ +   Figura 62 É uma interação mais fraca que a dipolo-dipolo. A interação dipolo-induzido-dipolo-induzido (também chamada Força de London) ocorre entre moléculas apolares e é a mais fraca delas. Como os elétrons estão em movimento constante, em um determinado momento, uma molécula apolar – por exemplo, o etano (CH3CH3) – pode ter uma distribuição não igualitária dos elétrons na ligação, ou seja, pode ser criado um dipolo momentâneo. Esse dipolo pode, então, criar outro dipolo em uma molécula vizinha e esses dipolos se atraem:
  • 42.       .  41 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  δ− δ + δ− δ− δ+ δ+ H3C CH3 δ− δ+ δ− δ− δ+ δ+ H3C CH3   Figura 63   Essas duas últimas interações, que envolvem a formação de dipolo induzido, são chamadas juntas de Forças de van der Waals. Essas forças são mais fracas, mas em moléculas grandes, isto é, com grande superfície de contato entre elas, as Forças de van der Waals tem efeitos importantes. Por exemplo, são Forças de van der Waals que seguram a lagartixa na parede (Figura 64): os dedos das lagartixas terminam em milhões de filamentos pequenos, cada um com comprimento de cerca de 100 milionésimos do metro. Essas pequenas estruturas, por sua vez, estão subdivididas em mil partes ainda menores, invisíveis a olho nu. Quando os répteis pressionam suas patas contra uma superfície, os filamentos se espalham e cobrem uma área relativamente grande. Como os filamentos aumentam a superfície de contato, um número maior de Forças de van der Waals atua entre a pata do animal e a parede, garantindo uma adesão segura.   Figura 64: Filamentos existentes na pata da lagartixa        
  • 43.       .  42 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Propriedades Físicas: Ponto De Fusão, Ponto De Ebulição E Solubilidade. Ponto de fusão Ponto de fusão (P.F.) é a passagem de uma substância do estado sólido para o líquido. Quando estão no estado sólido, as substâncias estão arrumadas ordenadamente em um cristal, ou seja, estão bem pertinho umas das outras. Em outras palavras, as atrações entre elas estão maximizadas. Para que elas fundam (passem para o estado líquido), as atrações intermoleculares devem ser enfraquecidas (o que ocorre com o aquecimento), para que elas se mexam mais livremente, embora continuem sendo atraídas entre si. Assim, quanto mais fortes forem as interações intermoleculares, mais difícil vai ser separar as substâncias umas das outras, e então temos que aquecer mais, ou seja, maior vai ser o ponto de fusão. Por causa disso, os sais (compostos com ligações iônicas) tipicamente fundem em temperaturas muito maiores que compostos polares (com interações dipolo-dipolo), que, por sua vez, fundem em temperaturas maiores que compostos apolares (com interações do tipo van der Waals). Isso pode ser visto na tabela abaixo:   NaCl  P.F. = 801o C Ligaçoes iônicas  H2O  P.F.= 0o C Ligação hidrogênio  H O   P.F. = ‐99o C Dipolo‐Dipolo    P.F. = ‐130o C Forças de van Der Waals.    Tabela 3   Ponto de Ebulição Já o Ponto de Ebulição (P.E.) é a temperatura em que um composto passa do estado líquido (no qual as moléculas estão mais afastadas) para o gasoso (no qual as moléculas estão mais afastadas ainda. No estado gasoso praticamente não existem interações intermoleculares), isto é, é a temperatura em que o composto ferve. Novamente, o que vai definir o grau de aproximação entre as moléculas são as interações intermoleculares. Quanto mais fortes forem essas interações, mais alto vai ser o ponto de ebulição. Observe os dois compostos mostrados na figura abaixo:  
  • 44.       .  43 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  P.E. = 39o C P.E. = 117o C O OH   Figura 65 Repare que os dois têm o mesmo no de átomos de carbono, oxigênio e hidrogênio (lembrem-se: têm a mesma fórmula molecular – C4H10O e, então, são isômeros), mas o primeiro tem um ponto de ebulição muito menor que o segundo. Por quê? Porque no primeiro caso, as interações intermoleculares são principalmente do tipo dipolo-dipolo, mais fracas que no segundo exemplo, no qual as moléculas interagem entre si principalmente por ligações hidrogênio. Ora, se as moléculas estão unidas por uma ligação mais forte, eu vou ter que dar mais calor para romper essas interações. Em outras palavras, o seu ponto de ebulição é maior. Solubilidade Solubilidade é outra propriedade física que depende das interações intermoleculares. Mas, a coisa aqui é um pouco diferente do que a gente viu para os pontos de fusão e ebulição, pois agora vamos misturar moléculas de tipos diferentes, as moléculas do soluto e do solvente. Por exemplo, quando a gente prepara “água com açúcar” o que fazemos é misturar as moléculas do açúcar (o soluto) com a água (o solvente). A esse processo nós damos o nome de dissolução. O que ocorre no processo de dissolução é que as interações intermoleculares existentes entre as moléculas do soluto-soluto são substituídas por interações entre as moléculas do soluto - solvente. Vamos então imaginar as situações que podem ocorrer: 1. Se o meu soluto é polar, ele deve fazer entre si interações, por exemplo, dipolo- dipolo. Será que um solvente apolar, que faça tipicamente ligações tipo van der Waals vai conseguir separar as interações dipolo-dipolo, mais fortes? Não. 2. Mas, se o meu soluto polar for misturado com um solvente polar que faça os mesmos tipos de interações intermoleculares, aí provavelmente as interações dipolo-dipolo das moléculas do soluto podem ser separadas e eu teria a dissolução. 3. Se o meu soluto é apolar e eu coloco um solvente polar, será que aí eu consigo dissolver um no outro? Não, pois agora é o meu soluto que não vai conseguir vencer as interações intermoleculares da molécula do solvente (não esqueça que as moléculas do solvente também interagem entre si!).
  • 45.       .  44 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  4. Já no caso em que tanto o soluto quanto o solvente são apolares ocorre a dissolução, pois as interações devem ser do mesmo tipo. A partir dessas observações, pode-se, com cuidado, aplicar uma regra que diz: “semelhante dissolve semelhante” ou, em outras palavras, “polar dissolve polar e apolar dissolve apolar”. Mas, por que a gente deve ter cuidado ao aplicar essa regra? Olhe, por exemplo, a molécula abaixo, chamada ácido linoleico:   O OH Ácido Linoleico   Figura 66 O óleo de soja é constituído principalmente de ácido linoleico e mais outras moléculas bem parecidas, com uma cadeia carbônica grande e um grupo polar no final da cadeia. Aí, a gente poderia pensar: bom, como tem aquele grupo polar e que faz ligação hidrogênio (repare que tem um hidrogênio ligado ao átomo de oxigênio), então vai se dissolver em água que também é polar e também faz ligação hidrogênio. Mas a gente sabe muito bem que se eu misturar água com óleo eles não vão se dissolver! Ora, o que acontece é que a cadeia carbônica é muito grande e praticamente sem nenhuma polaridade. Só um pedacinho da molécula tem polaridade, o que não é suficiente para separar as moléculas de água umas das outras. Temos que nos lembrar sempre (como a gente já falou quando estudamos polaridade das moléculas) que o tamanho das moléculas tem de ser analisado sempre que formos avaliar a questão de polaridade e apolaridade. Bom, até agora nós já estudamos as ligações químicas, o átomo de carbono, as ligações intermoleculares e, no decorrer disso, vimos vários exemplos de moléculas orgânicas. Já citamos várias vezes, também, que existe uma infinidade de moléculas orgânicas. Aí, a gente pode se perguntar: como é que eu vou fazer para estudar e entender as propriedades químicas de todos estes compostos? Não dá!!! Felizmente, não é necessário aprender as propriedades químicas de cada composto orgânico isoladamente. Os químicos orgânicos já perceberam que uma determinada arrumação de átomos leva a propriedades químicas muito parecidas, independente de como a cadeia carbônica se arruma. Por exemplo, os dois compostos mostrados na figura abaixo são diferentes, mas tem propriedades muito parecidas.
  • 46.       .  45 .  Sala de Leitura  Química Orgânica    OH OH    Figura 67 Por exemplo, a polaridade da ligação O-H e sua capacidade de realizar ligação hidrogênio faz com que eles tenham pontos de ebulição parecidos e maiores do que, por exemplo, de compostos similares, mas que só tenham carbono e hidrogênio na sua estrutura. À medida que formos estudando mais Química Orgânica, vamos perceber que as interações entre cargas positivas e negativas são um dos fatores mais importantes para que ocorram as reações químicas. Assim, normalmente as reações ocorrem nos locais polares das moléculas. No exemplo que estamos discutindo, as reações ocorrem nas ligações O-H e C-O. As ligações C-C e C-H não são muito reativas. Na realidade, em termos de reações químicas, não faz muita diferença o número ou a forma com que estão arrumadas as ligações C-C e C-H. De fato, os compostos mostrados na figura abaixo tem comportamento químico muito semelhante.   OH OH OH OH   Figura 68 Com isso, em termos de propriedades químicas, as moléculas devem ser vistas como compostas por duas partes: Com isso, em termos de propriedades químicas, as moléculas devem ser vistas como compostas por duas partes: 1) A cadeia carbônica, que como já vimos, tem grande influência nas propriedades físicas (P.E.,P.F., solubilidade), mas não interfere muito nas propriedades químicas (como vão reagir, isto é, na reatividade);
  • 47.       .  46 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  2) O grupo funcional, que é a parte da molécula responsável pela sua reatividade química. Nos exemplos que a gente está discutindo todos os compostos têm o grupo funcional O-H, mas diferentes cadeias carbônicas (que a gente vai representar por R). Assim, todos os compostos do nosso exemplo são alcoóis (compostos orgânicos cujo grupo funcional é o OH) e são representados como ROH. Todos os alcoóis têm reatividade química semelhante. Esse conceito é muito importante e geralmente organizamos o estudo da Química Orgânica por grupo funcional. Assim, a partir de agora vamos estudar com mais detalhes os principais grupos funcionais. A tabela abaixo mostra os grupos funcionais que vão ser apresentados a partir de agora: FÓRMULA GENÉRICA EXEMPLO NOME RH ALCANOS (na realidade, alcanos não possuem grupo funcional). RCH=CHR (estes R podem ser hidrogênio) ALCENOS (o grupo funcional é a ligação dupla C=C). RR (estes R podem ser hidrogênio) ALCINOS (o grupo funcional é a ligação tripla CΞC). ArH ARENOS (um ciclo de seis átomos de carbono com três ligações duplas tem reatividade química diferente dos alcenos e assim são outro grupo funcional, representados por Ar. Arenos, também chamados de anéis aromáticos, podem ter grupos alquil ou outros grupos funcionais ligados ao anel aromático). RX (X é a letra que usamos em Química Orgânica para representar os halogênios) Cl HALETOS DE ALQUILA (O grupo funcional é a ligação C- Halogênio). ROH OH ALCOÓIS (o grupo funcional é o O- H). ArOH OH FENÓIS (quando o O-H está ligado a um anel aromático, a reatividade muda muito em comparação com os alcoóis e então é outro grupo
  • 48.       .  47 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  funcional). ROR O ÉTERES (o grupo funcional é C-O- C). RNH2 NH2 AMINAS (o grupo funcional é o NH2. Estes dois hidrogênios podem ser substituídos por outros grupos alquil). R O H O H ALDEÍDOS (o grupo funcional é o C=O, com pelo menos um hidrogênio ligado ao carbono). R O R O CETONAS (o grupo funcional é o C=O, com dois grupos alquil – ou anel aromático - ligados ao carbono). R O OH H O OH ÁCIDOS CARBOXÍLICOS (o grupo funcional é o COOH). R O Cl O Cl CLORETOS DE ÁCIDO (o grupo funcional é o COCl). R O O O R O O O ANIDRIDOS DE ÁCIDOS (o grupo funcional é COOCO). R O OR O O ÉSTERES (o grupo funcional é COOR). R O NH2 O NH2 AMIDAS (o grupo funcional é o CONH2. Os hidrogênios ligados ao nitrogênio podem ser substituídos por alquil ou anel aromático). RCΞN C N NITRILAS (o grupo funcional é o CN).   Tabela 4      
  • 49.       .  48 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Funções Orgânicas 1. Hidrocarbonetos Hidrocarbonetos, como o próprio nome já diz, são compostos que possuem apenas carbono e hidrogênio em sua estrutura. O esquema abaixo mostra a classificação dos hidrocarbonetos:   HIDROCARBONETOS ALIFÁTICOS ALCANOS (ou parafinas) CnH2n+2 ALCENOS (ou alquenos ou olefinas) CnH2n ALCINOS (ou alquinos) CnH2n-2 ALICÍCLICOS CICLOALCANOS CICLOALCENOS CICLOALCINOS R-H AROMÁTICOS Ar-H   Figura 69 A gente conhece por aromáticos um grupo especial de hidrocarbonetos, que tem propriedades muito diferentes devido às suas características estruturais. Daqui a pouco nós veremos um pouco mais quais são essas características. Por enquanto, aqui estão duas regras que devemos aplicar para saber se um composto é aromático: - Os compostos aromáticos sempre são cíclicos e têm ligações duplas alternadas com ligações simples em toda a volta do anel E: - Todo composto aromático tem um número tal de elétrons π (cada ligação dupla tem dois elétrons π), que se a gente aplicar a fórmula 4n+2 = no de elétrons π, a resolução dessa equação deve dar, para os compostos aromáticos, um valor de n inteiro (essa regra a gente conhece por Regra de Huckel).
  • 50.       .  49 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Analise, por exemplo, a Figura 70. Os dois primeiros compostos são aromáticos, enquanto o terceiro, apesar de ser cíclico e possuir ligações duplas alternadas, não é aromático, pois n na regra 4n+2 = no de elétrons π não é um no inteiro. Já o quarto exemplo não é aromático, porque as ligações duplas não estão em toda a volta do anel.   3 ligações duplas = 6 elétrons π 4n + 2 = 6 4n = 4 n = 1 (no. inteiro) 5 igações duplas = 10 elétrons π 4n + 2 = 10 4n = 8 n = 2 (no. inteiro) 4igações duplas = 8elétrons π 4n + 2 = 8 4n = 6 n = 6/4 (no. não inteiro) AROMÁTICO AROMÁTICO ALIFÁTICO 3 ligações duplas = 6 elétrons π 4n + 2 = 6 4n = 4 n = 1 (no. inteiro) ALIFÁTICO   Figura 70: Exemplos de aplicação da regra de Hückel.   Alcanos Os alcanos são os hidrocarbonetos saturados de fórmula geral CnH2n+2. Os alcanos ocorrem na natureza em depósitos de gás natural e no petróleo. O gás natural é constituído principalmente de metano (CH4) e o petróleo é uma mistura complexa de vários hidrocarbonetos. Como esses hidrocarbonetos presentes no petróleo têm aplicações muito diferentes, a gente precisa separar o petróleo em misturas mais simples (dizemos que separamos o petróleo em várias frações, cada uma delas com utilizações diferentes). Essa separação é feita por destilação e, no caso do petróleo, essa destilação recebe o nome específico de refinação (refinaria de petróleo é o local onde se faz essa destilação). Todas as frações obtidas no refinamento do petróleo contêm alcanos.
  • 51.       .  50 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Os alcanos são compostos apolares e estão entre os menos reativos diante dos reagentes mais comuns de um laboratório de Química (lembrem-se que nós já comentamos que a reatividade normalmente  está associada à existência de ligações polares nas moléculas). O próprio nome parafina, outra designação usada para os alcanos, vem de uma expressão latina que significa “pouca afinidade”. Mas a gente tem que tomar cuidado quando dizemos “pouco reativos”. Estamos nos referindo basicamente a reações químicas nas quais misturamos duas ou mais substâncias com o intuito de obter outras substâncias diferentes. Para isso, realmente, os alcanos não são muito utilizados. Por outro lado, os alcanos sofrem reações de combustão – queima na presença de oxigênio –– (Esquema 1), e essa é uma das reações mais praticadas por todos nós. Realizamos reações de combustão quando acendemos um fogão a gás, ligamos um motor a gasolina, acendemos um isqueiro Mas, reparem: o “produto” que a gente quer nessas reações é o calor (ou melhor dizendo, a energia) e não o dióxido de carbono (CO2) e água.   CnH2n+2 + O2 CO2 + H2O + CALOR   Esquema 1: Reação de combustão   Outra reação que a indústria petroquímica (indústria que utiliza as frações do petróleo como matéria- prima) realiza muito com os alcanos é a chamada pirólise (quebra pela ação do calor) ou craqueamento. Como a gente já viu, o petróleo dá origem a muitos produtos diferentes, mas a quantidade em que esses produtos se encontram no petróleo em geral não atendem às necessidades do mundo atual. Assim, as indústrias pegam as frações do refino que têm hidrocarbonetos mais pesados (frações que destilam com P.E. maior que o da gasolina) e quebram esses hidrocarbonetos em moléculas menores (mais leves), isto é, fazem o craqueamento para obter mais gasolina e outros hidrocarbonetos menores e assim atender à demanda do sistema de consumo atual. Bem, agora, antes da gente começar a ver as outras funções orgânicas, precisamos aprender a dar nomes aos compostos orgânicos. Por quê? Vamos imaginar como nós nos comunicaríamos se as coisas não tivessem nomes. Seria impossível transmitir nossas ideias ou dúvidas ou esclarecimentos! E lógico, os nomes têm que ser palavras. Mas a gente podia pensar: já que as fórmulas estruturais constituem uma perfeita identificação para cada substância, por que os químicos não dispensam os nomes formados por palavras e utilizam as fórmulas
  • 52.       .  51 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  estruturais na comunicação em suas várias formas? Mas isso é impossível! Teríamos, no mínimo, que decorar todas as estruturas. Além disso, tente, por exemplo, descrever a palitoxina (Figura 41), aquela substância enorme isolada de corais e que fomos apresentados quando aprendíamos a desenhar fórmulas estruturais em bastão, sem usar o seu nome. Conseguiu? Claro que não. Por conta disso, os químicos perceberam que deveria ser desenvolvido um sistema organizado, um conjunto de regras, para dar nomes às substâncias. A IUPAC (International Union of Pure and Applied Chemistry) assumiu a responsabilidade de recomendar um sistema para nomear as substâncias. Na realidade, a gente não diz que um composto possui nome: o termo correto é nomenclatura. Dar nome a um composto orgânico consiste em nomenclaturar ou nomenclar esse composto. Obs.: A União Internacional de Química Pura e Aplicada (IUPAC) tem por objetivo intermediar mundialmente aspectos das ciências químicas e contribuir para a aplicação da Química ao serviço da humanidade. Por ser uma organização internacional, não governamental, a IUPAC atua como referência em questões globais que envolvem as ciências químicas.   Em princípio, a nomenclatura utilizada para os compostos orgânicos tem como parâmetros três aspectos de relevância: 1) Todo composto orgânico possui átomos de carbono. 2) Suas cadeias podem ou não apresentar ligações π entre átomos de carbono e podem ser cíclicas ou não. 3) Os compostos orgânicos são classificados segundo o grupo funcional presente na molécula. A partir dessas características pode-se estabelecer a base para a nomenclatura de qualquer substância orgânica. Observe o esquema a seguir: Composição da nomenclatura orgânica:     O prefixo encontra-se associado ao número de átomos de carbono existentes na cadeia principal do composto. O intermediário indica se a substância possui somente ligações simples entre os átomos de carbono ou se há também a presença de duplas ou triplas ligações entre esses. PREFIXO + INTERMEDIÁRIO + SUFIXO
  • 53.       .  52 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  O sufixo indica a que função pertence a substância. Os prefixos que indicam o no de carbonos estão mostrados na tabela a seguir:   Número de átomos de carbono Prefixo 1  met  2  et  3  prop  4  but  5  pent  6  hex  7  hept  8  oct  9  non  10  dec  11  undec  12  dodec  Tabela 5: Prefixos utilizados para a designação do no de átomos de uma cadeia carbônica.   O prefixo correspondente aos compostos até quatro carbonos (Met, Et, Prop e But) infelizmente tem de ser decorados, pois são nomes mantidos por tradição, sem nenhum aspecto lógico. Os outros prefixos são de origem grega ou latina, tem correlação com o número e são os mesmos usados para as figuras geométricas. Quando se tratar de um composto cíclico, antes desses prefixos que indicam o no de átomos de carbono colocamos a palavra ciclo. O intermediário nos diz se o composto possui ligação dupla ou tripla, conforme mostrado na tabela abaixo:
  • 54.       .  53 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Ligações entre os átomos de carbono Intermediário C C   an  C C   en  C C   in    Tabela 6: Designações usadas para a indicação do no de insaturações em uma cadeia carbônica.   Cada função orgânica é nomenclaturada por um sufixo específico. À medida que formos conhecendo essas funções seremos apresentados ao sufixo usado para designá-las. Para os alcanos, usa-se o sufixo “ano”, conforme exemplificado na figura a seguir:   CH4 Metano Etano Propano Butano Met signif ica que tem um carbono Ano signif ica que só tem ligação e é um alcano. Ciclo-propano Ciclo-butano   Figura 71 Quando nós aprendemos sobre cadeias carbônicas vimos que elas podem ser ramificadas. Vamos ver agora como fazemos para dar a nomenclatura dos compostos que possuem ramificação. As ramificações são designadas genericamente de grupo alquil, alquenil, alquinil ou aril, em função do tipo de hidrocarboneto que lhes deram origem. Grupos alquil são partes da estrutura molecular que correspondem a um alcano menos um hidrogênio. Assim, ao metano (CH4) corresponde o grupo metila
  • 55.       .  54 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  (CH3), ao etano (C2H6) corresponde o grupo etil (C2H5) e assim sucessivamente. A tabela abaixo mostra alguns exemplos de nomenclatura dos grupos alquil, onde o traço mostra o átomo que se liga à cadeia carbônica principal:   ALCANO  NOMENCLATURA GRUPO ALQUIL  NOMENCLATURA  CH4  Metano  ‐CH3   METIL    Etano  CH3CH2 ‐  ETIL    Propano  CH3CH2CH2‐    n‐PROPIL  iso‐PROPIL  (ou sec‐PROPIL)    Butano  CH3CH2CH2CH2‐    n‐BUTIL  sec‐BUTIL    Iso‐Butano    CH3CCH3 CH3   iso‐BUTIL    terc‐BUTIL    Tabela 7: Nomenclatura utilizada para a designação de grupos alquil.               Observem que no caso do propano, e para todos os alcanos com mais de três carbonos, o alcano pode “perder hidrogênio” de carbonos distintos, gerando grupos alquil diferentes que, lógico, pois são coisas diferentes, devem ser nomenclaturados de forma diversa. A recomendação IUPAC para esses casos é mais complexa e acabamos usando nomes triviais, como, por exemplo, iso-propil. Denominamos nomenclatura trivial ou vulgar aquela consagrada pelo uso, mas que, na maioria das vezes, não é consagrada pela IUPAC. Assim, quando a gente coloca a letra n na frente da nomenclatura do radical alquila, estamos dizendo que a ligação à cadeia carbônica se faz no carbono primário. Se for ao carbono secundário usa-se sec e no terciário usa-se terc. O termo iso significa “grupamento igual”. Observe que no isopropil o carbono que se liga à cadeia carbônica possui duas metilas (dois grupamentos iguais) ligadas a ele.
  • 56.       .  55 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Para nomenclaturar um alcano ramificado, o primeiro passo é definir quem é a cadeia principal. Já vimos que é a maior cadeia contínua (linear) que for possível encontrar na estrutura. É bom sempre lembrar que “linear” é uma forma de dizer. A cadeia dos alcanos são arrumadas em zigue-zague com os ângulos entre as ligações de cerca de 109,5o . Depois de localizarmos a cadeia principal, precisamos dizer em quais carbonos estão os substituintes. Para isso, a cadeia carbônica é numerada começando pela extremidade que resultará em menores números para as posições em que há substituições. A figura abaixo (Figura 72) mostra como aplicamos essa regra: 1 2 3 4 123 4 1 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 2 3 4 5 6 7 8 9 10 1 12 2 3 4 5 3 45 6 7 8 6 7 8 CORRETO ERRADO SUBSTITUINTE EM C-2 SUBSTITUINTE EM C-3 SUBSTITUINTES EM C-4 E C-6 SUBSTITUINTES EM C-5E C-7 DOIS SUBSTITUINTES EM C-3 E UM EM C-6 DOIS SUBSTITUINTES EM C-6 E UM EM C-3   Figura 72: Método para a determinação da cadeia principal de um alcano.   Depois de localizados os substituintes, a nomenclatura é feita da seguinte forma: grupo alquil, precedido da numeração do carbono em que ele se encontra, seguido do nome do alcano. Assim, a nomenclatura do primeiro exemplo mostrado seria:    
  • 57.       .  56 .  Sala de Leitura  Química Orgânica            Figura 73 Algumas pessoas usam os números para indicar a posição do substituinte apenas quando ele é realmente necessário. Observem o exemplo acima: só há uma possibilidade de colocação do grupo metil e, assim, não está errado dizer apenas metilbutano. Já no exemplo: A numeração é imprescindível, pois se dissermos apenas metil-pentano não teremos como saber se o composto é o 2 ou o 3-metil-pentano:         Quando existem dois ou mais substituintes diferentes, esses devem ser colocados em ordem alfabética e não de numeração. Assim, no segundo exemplo, teríamos:   E não 4-metil-6-etildecano (afinal, o “e” vem antes do “m”).         1 23 4 2-metilbutano  Usa‐se hífen para separar o número  e o nome todo é escrito como uma  única palavra.   123 4 5 2-metilpentano  1 2 34 5 3-metilpentano  1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 6-etil-4-metildecano Figura 74 Figura 75 Figura 76
  • 58.       .  57 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Se os substituintes forem iguais, usamos os prefixos multiplicativos: di, tri, tetra... mas esses não são considerados na colocação em ordem alfabética. Veja isso na nomenclatura das moléculas mostradas abaixo:           A segunda classe de grupos funcionais que vamos estudar é a dos alcenos. No entanto, essas substâncias possuem algumas características estruturais que só vamos compreender após estudarmos outro fenômeno muito importante, que é o de isomeria. Isomeria Isômeros são compostos diferentes que possuem a mesma fórmula molecular. Como exemplo, com a fórmula molecular C2H6O podemos desenhar duas moléculas:       Figura 79 Evidentemente, já estamos cansados de saber que são compostos distintos. O primeiro é o álcool etílico, o álcool encontrado na cerveja, que é um líquido. O segundo, o éter metílico, é um gás que tem sido testado como gás refrigerante em substituição aos freons (freons são compostos orgânicos halogenados que eram utilizados como gases refrigerantes em “sprays”, geladeiras e cujo uso indiscriminado levou à formação do buraco de ozônio). Esses dois compostos são isômeros. Os isômeros podem ser de dois tipos: isômeros de constituição e estereoisômeros. 1 2 3 4 6 7 8 3,3,6-trimetiloctano 1 2 3 456 78 9 6-etil-4,4-dimetilnonano   OH O   Figura 77 Figura 78
  • 59.       .  58 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Isômeros de constituição são isômeros cuja sequência de átomos ligados (quem se liga com quem) são diferentes. Alguns livros mais antigos costumam chamar esse tipo de isomeria de “isomeria plana”. Esse termo deve ser evitado, pois como já estamos carecas de saber, os alcanos, por exemplo, não tem nada de planaridade! A Figura 80 mostra exemplos de isômeros de constituição. C5H12 Observe que o primeiro composto não possui ramificação, enquanto o segundo tem uma metila no C-2. C6H12 Note que o primeiro composto é um alceno e o segundo é um ciclo-alcano O O C4H10O Veja que no primeiro composto o oxigênio está ligado a dois grupos etil e no segundo está ligado a um metil e um propil.   Figura 80: Exemplos de isômeros de constituição   Antigamente, a isomeria constitucional era classificada em vários subtipos. No entanto, como isso é motivo de várias confusões devido a interpretações diferentes, a tendência tem sido a de abandonar essa subdivisão. No entanto, como tem gente que ainda usa, devemos entender o que é, caso apareça em algum texto. Vamos ver como se faz essa classificação:   Isomeria de função Ocorre entre compostos de mesma fórmula molecular que pertençam a funções químicas distintas, como exemplificadas abaixo:         Figura 81 OO H ALDEÍDO CETONA
  • 60.       .  59 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Isomeria de cadeia ou de núcleo Ocorre entre compostos de mesma fórmula molecular e mesma função química que possuam cadeias carbônicas distintas:   CADEIA NORMAL CADEIA RAMIFICADA   Figura 82 Isomeria de posição Ocorre entre compostos de mesma fórmula molecular, mesma função química e mesma cadeia carbônica, porém, que possuam diferenças entre si na posição de grupamentos funcionais, ramificações ou insaturações. Figura 83 Isomeria de compensação ou metameria Ocorre entre compostos de mesma fórmula molecular e mesma função química, em que o heteroátomo encontra-se em diferentes posições. O O OXIGÊNIO LIGADO A METIL E PROPIL OXIGÊNIO LIGADO A DOIS ETIL Figura 84 OH OH GRUPO FUNCIONAL NO C-1 GRUPO FUNCIONAL NO C-2   RAMIFICAÇÃO EM C-2 RAMIFICAÇÃO EM C-3  
  • 61.       .  60 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Estereoisômeros, por outro lado, são isômeros que possuem a mesma conectividade (a sequência dos átomos ligados na molécula são exatamente as mesmas), mas cujas estruturas variam na forma com que se arrumam no espaço. Os estereoisômeros podem ser de dois tipos: enantiômeros e diastereoisômeros. Qualquer coisa tem uma imagem no espelho (exceto os vampiros, é claro!). E qualquer coisa só é igual a outra se essas imagens forem sobreponíveis. As mãos são exemplos clássicos de imagens especulares (a mão esquerda é a imagem no espelho da mão direita e vice-versa) que não são sobreponíveis, e a nossa mão direita não é igual à esquerda (Figura 85). As coisas que não são sobreponíveis à sua imagem especular são denominadas quirais (quiral, em grego “cheir”, quer dizer mão). Isso também é verdade para as moléculas. Sempre que uma molécula for diferente de sua imagem especular, isto é, se as duas não forem sobreponíveis, temos um tipo de estereoisomeria que denominamos de enantiomeria (e dizemos que as duas moléculas são enantiômeros). Observe as moléculas abaixo (imagens especulares entre si) e veja que elas não são sobreponíveis:   Figura 85 Quaisquer outros tipos de compostos que sejam isômeros espaciais (estereoisômeros), mas que não são imagem especular um do outro são ditos diastereoisômeros. Olhe, por exemplo, as duas moléculas abaixo:   Br Br Figura 86
  • 62.       .  61 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Convençam-se de que elas são enantiômeros. Uma é a imagem especular da outra e são compostos diferentes. Agora, olhem esta: Br Figura 87 Não é imagem especular de nenhuma das outras duas. Mas, a sequência de átomos das três são idênticas. Logo, essa última é um diastereoisômero (isômero espacial que não é a imagem especular) de cada uma das outras duas. Um tipo especial de diastereoisômeros são os chamados isômeros geométricos. Como a gente já viu, as ligações π ocorrem por sobreposição paralela de orbitais p. Por causa disso, elas não giram livremente, pois a ligação dupla se quebraria. Analise a molécula do n-butano: Como a ligação σ se faz pela interação linear segundo um eixo, as ligações têm rotação livre e o n-butano está o tempo todo se interconvertendo nas duas formas espaciais mostradas no desenho (representado pelas duas setas em sentido contrário). Isto é, as duas formas são representações da mesma molécula.  Já no caso do 2-buteno: , como essa rotação é impossível, não ocorre uma interconversão de um no outro. São duas moléculas diferentes. São dois diastereoisômeros. Diastereoisômeros que existem por causa da impossibilidade de rotação de suas ligações são denominados isômeros geométricos. Observe agora os ciclos abaixo: Rotação livre Rotação livre n-Butano   Figura 88
  • 63.       .  62 .  Sala de Leitura  Química Orgânica      Figura 89   Esses sistemas cíclicos, embora não tenham ligação π, também não tem rotação livre por conta da própria geometria do anel. Preste atenção que seria impossível eu colocar um grupo alquil que está para frente do plano do tetraedro (lembra-se do que significa a linha grossa?) para trás desse plano sem  quebrar o ciclo. Então, os dois ciclobutanos e os dois cicloexanos mostrados acima também são exemplos de isômeros geométricos. Bem, agora, depois dessa pausa para entender o que são isômeros, vamos retornar ao estudo das funções orgânicas. Alcenos (Ou Alquenos) Ou Olefinas Alcenos são hidrocarbonetos que possuem uma ou mais ligações duplas em sua estrutura, ou seja, o grupo funcional (parte da molécula que é responsável por suas propriedades químicas) de um alceno é a C=C. O eteno, alceno mais simples que existe: H2C=CH2, por exemplo, reage com cloro ou bromo formando compostos oleosos. Por causa disso, logo que se descobriu a propriedade desse composto, ele recebeu o nome de gás oléfiant que significa “gás fazedor de óleo”. A extensão desse nome para todos os compostos dessa classe é que explica o termo olefinas, sinônimo de alcenos. Os alcenos mais simples (com apenas uma ligação dupla) são mais raros na natureza que os alcanos. O eteno (também conhecido por etilideno) é produzido no processo de amadurecimento de frutas. Quando a gente quer que a banana amadureça mais rapidamente, a embrulhamos em jornal para que o eteno que vá sendo liberado, aos poucos se dissipe mais lentamente. Por questões de facilidade de transporte e de armazenamento, as frutas são colhidas verdes e colocadas para amadurecer pela ação do gás eteno.
  • 64.       .  63 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Apesar dos alcenos serem mais difíceis de ser encontrados na natureza, são matéria-prima fundamental para uma porção de indústrias. A obtenção deles é feita pelo craqueamento das frações mais pesadas obtidas no refinamento do petróleo (se você não se lembra o que é isso, dê uma olhada mais acima nesse texto, quando falamos dos alcanos). Essa importância dos alcenos é porque as ligações C=C reagem entre si formando polímeros. Polímeros são moléculas enormes (macromoléculas) obtidas por ligações de várias moléculas menores (monômeros), que podem ou não ser iguais (quando os monômeros não são iguais são chamados de copolímeros). No mundo de hoje, os polímeros com certeza são o material mais importante para a confecção de várias coisas. A Figura 90 mostra alguns exemplos.     MONÔMERO POLÍMERO APLICAÇÃO (exemplo) Propeno (Nome comum=Propileno) Polipropileno Seringa de Injeção Brinquedos Auto-peças (parachoque,pedais,..) Eteno (Nome comum=Etileno) Polietileno Sacola plástica de supermercado Garrafa térmica Frasco de detergente Cl 2-cloro-eteno (Nome coum = cloreto de vinila) Cl Cl Cl Cl Cl Policloreto de vinila (PVC) Encanamentos Filmes plásticos para embalagem de alimentos Garrafões de água   Figura 90: Exemplos de polímeros e suas aplicações   As regras de nomenclatura que a gente aprendeu para os alcanos serve de base para o caso dos alcenos, mas temos que prestar atenção em vários aspectos em que há diferenças: ‐ A cadeia principal de um alceno é a maior que contém a ligação dupla.
  • 65.       .  64 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Por exemplo,  no                                      , a cadeia principal é a que está destacada com vermelho, com seis carbonos, e não a outra que possui oito carbonos.     ‐ A cadeia principal é sempre numerada a partir da extremidade mais próxima à ligação dupla. - A parte do nome que se refere à cadeia principal é formada de maneira parecida com a utilizada para os alcanos, com duas diferenças: - Ao invés de “ano” usamos o sufixo “eno”. - Precisamos especificar a posição da ligação dupla, o que é feito por um número que deve ser colocado imediatamente antes da terminação “eno”. A Figura 92 mostra alguns exemplos da nomenclatura de alcenos:   1 2 3 4 5 6 ETENO PROPENO BUT-1-ENO BUT-2-ENO 2-METIL-PROPENO 21 3 2 4 1 3 2 41 3 2,3-DIMETIL-BUT-1-ENO 24 1 3 3-METIL-CICLOEXENO  Figura 92: Exemplos de aplicação das regras de nomenclatura em alcenos       1 2 3 4 5 6 NOTA: A colocação do no que indica a posição da ligação dupla imediatamente antes do sufixo “eno” é a recomendação da IUPAC. Porém, muitas vezes você irá encontrá-la no início ou no fim da cadeia principal. Por exemplo, tem gente que escreve 2-buteno ou ainda buteno-2. Isso não é problema. O importante na nomenclatura é que ela nunca permita que você fique em dúvida sobre qual é a estrutura do composto. Figura 91
  • 66.       .  65 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  Quando a ligação dupla é um substituinte (grupo alquenil), usa-se o sufixo “enil”, como se pode ver na Figura 93: METENIL-CICLOEXENO ETENIL-BENZENO  Figura 93: Exemplos de nomenclatura de grupos alquenil.     Os grupos alquenil mostrados abaixo são muito mais conhecidos por sua nomenclatura normal do que pela estabelecida pelas regras da IUPAC (Figura 94):     Figura 94: Nomenclatura comum (trivial) de grupos alquenil   Isomeria Cis X Trans Nós já vimos que a impossibilidade de rotação da ligação π faz com que os alcenos do tipo: e  sejam moléculas diferentes. Mas, como dar a nomenclatura delas para que a gente possa saber quem é quem? Quando dois substituintes iguais estão do mesmo lado, dizemos que a molécula é cis. Quando estão de lados opostos, dizemos que a molécula é trans. Assim, teríamos:   C H 2 M E T ILE N O ou M E T ILID E N O M e tilen o -C iclop e n tan o C H C H 2 V IN IL V in il-b en ze n o E sta m o lécu la é m a is co n he cid a a in da co m o e stire no C H C H 2 A L IL H 2C A lil-ciclo -he p ta no  
  • 67.       .  66 .  Sala de Leitura  Química Orgânica  trans-But-2-eno cis-But-2-eno trans-Hex-3-eno cis-Hex-3-eno   Figura 95   Pode não parecer tão óbvio, mas é claro que só existe isomeria cis x trans quando temos dois tipos de substituintes no carbono da ligação dupla e que cada um deles seja diferente entre si. Repare nos exemplos abaixo:   1-propeno Não existe isomeria cisx trans porque o C-1 está ligado a dois hidrogênios - substituintes iguais. Não existe isomeria cisx trans porque o C-1 está ligado a duas metilas - substituintes iguais. 2-metil-but-2-eno   Figura 96 Mas, a nomenclatura cis x trans é muito fácil quando os substituintes são iguais. E, essa molécula é cis ou trans?       Figura 97