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LICENCIAMENTO AMBIENTAL MUNICIPAL: PERSPECTIVAS
DA LEI COMPLEMENTAR N. 140/11
LIZ BEATRIZ SASS
Doutoranda em Direito pela UFSC. Bolsista do CNPQ. Professora de Direito Ambiental no Curso de
Direito da UNIVALI e Professora licenciada da UNISINOS.
MELISSA ELY MELO
Doutoranda em Direito pela UFSC. Bolsista do CNPQ. Professora de Políticas Públicas no Curso de
Graduação em Administração Pública (ESAG/UDESC).
1. Introdução
A Lei Complementar n. 140/11 foi publicada com o intuito de sanar uma lacuna
existente no ordenamento jurídico ambiental brasileiro, qual seja, a regulamentação do
exercício da competência comum entre os entes federativos, prevista no artigo 23 da
Constituição Federal de 1988. Assim, a referida Lei Complementar foi recebida com grande
expectativa, haja vista o déficit existente quanto à proteção ambiental em razão das
inseguranças jurídicas geradas pelo controverso aparato legislativo até então vigente sobre a
temática.
Nesse contexto, a Lei Complementar traz importante normatização quanto ao
exercício das competências ambientais, destacando-se, neste artigo, a competência para
licenciamento ambiental pelos Municípios. Ao mesmo tempo em que se considera este um
movimento importante para a descentralização do poder político no âmbito do federalismo
brasileiro, teme-se que o reconhecimento da autonomia municipal nesta material possa
acarretar prejuízos para a proteção do meio ambiente.
No intuito de discutir esta temática, o presente trabalho científico tem por objetivo
analisar o licenciamento ambiental municipal a partir da Lei Complementar n. 140/11,
confrontando a relevância da autonomia dos Municípios com a fragilidade dos órgãos
públicos municipais diante da pressão exercida pelo setor econômico na contemporaneidade.
Assim sendo, dividiu-se a abordagem em três tópicos. O primeiro debate a
descentralização política no contexto do federalismo brasileiro, buscando as raízes históricas
das disfunções na distribuição do poder político. O segundo tópico apresenta um breve
panorama quanto à transformação da competência dos Municípios para o licenciamento
ambiental. Por fim, o último tópico dedica-se à análise dos dispositivos da Lei Complementar
n. 140/11 relacionados à temática e suas possíveis interpretações e incongruências em relação
à proteção ambiental.
2. Descentralização política e autonomia municipal: do coronelismo ao “federalismo
competitivo”
A compreensão do papel reconhecido aos Municípios na Lei Complementar n.
140/2011 exige inicialmente que se compreenda a sua posição no federalismo brasileiro.
Nesse aspecto, importa ressaltar que a federação brasileira apresenta-se diferente do modelo
de federalismo norte-americano, apesar de este ter servido como fonte de inspiração. De
acordo com Roberta Camineiro Baggio1
, enquanto nos Estados Unidos os Estados-membros
se uniram em prol da formação de uma União, aqui o território já se constituía como uma
nação. Portanto, no Brasil, o poder centralizado é que foi repartido entre as diferentes
províncias brasileiras.
As distinções entre a experiência americana e a brasileira irão marcar de forma mais
acentuada o caráter desagregador do federalismo no Brasil, em outras palavras, o aspecto
centrífugo em detrimento do centrípeto. No caso brasileiro, a escolha pelo federalismo não foi
protagonizada por atores em posições simétricas, nem mesmo de relativa simetria. Em sentido
oposto, a distribuição do poder era completamente desigual entre os distintos Estados, uma
vez que as elites locais é que acabavam por exercer o domínio político ao determinar quem
seriam os governadores.2
Assim, a descentralização se apresenta de forma bastante peculiar
no caso do federalismo brasileiro. As diversas disputas pelo poder político presentes desde a
fundação da federação fazem com que este movimento seja pautado por oscilações de maior
ou menor centralização.
A descentralização do poder é entendida como uma das principais características do
sistema federalista. É por meio dela que se torna possível a manutenção da harmonia entre as
forças internas, admitindo que o Estado Nação se forme e tornando democraticamente
estáveis as relações políticas no território nacional. Sendo assim, a descentralização política
trata-se de pressuposto de qualquer sistema federativa, já que é a sua graduação que permitirá
a autonomia dos entes federados, impondo relações intergovernamentais não hierárquicas
considerando o nível vertical3
.4
De acordo com Andreas J. Krell, entretanto, as relações
verticais entre os distintos níveis estatais jamais foi definida de maneira clara no Brasil,
restando nebulosas as exigências para cada ente federativo no que diz respeito à cooperação
com os demais, no sentido de solucionar os problemas que colocam em risco a qualidade de
vida da população.5
Ao longo da história federativa do Brasil a mencionada assimetria conduziu a um
processo de formação de distintas coalizões de certos Estados em oposição a outros. Esta
realidade impediu a cooperação entre estes atores, estabelecendo um “jogo não cooperativo”.
Somando-se a isto, a experiência brasileira tem mais uma característica relevante: as relações
firmadas entre os Estados e a União não foram pautadas pelas práticas democráticas, tal como
determinam os princípios federativos. Entre as décadas de 1930 e 1980 houve um
fortalecimento do Governo Federal tanto no plano político, quanto no plano econômico e
administrativo, o que se realizou por meio do autoritarismo. Em contraposição, os governos
estaduais contaram, mesmo nos períodos democráticos, com uma conduta irresponsável em
termos econômicos, baseada no parasitismo em relação ao Governo Federal.6
1
BAGGIO, Roberta Camineiro. Federalismo no contexto da nova ordem global: perspectivas de
(re)formulação da federação brasileira. Curitiba: Juruá, 2006. p. 78.
2
ABRUCIO, Fernando Luiz; COSTA, Valeriano Mendes Ferreira. Reforma do Estado e o contexto federativo
brasileiro. São Paulo: Konrad-Adenauer-Stiftung,,1998. p. 33.
3
As relações intergovernamentais verticais são aquelas que se estabelecem entre distintos níveis de governo –
federal, estadual, municipal. Já as relações intergovernamentais horizontais são aquelas que se estabelecem entre
os mesmos níveis governamentais.
4
BAGGIO, Roberta Camineiro. Federalismo no contexto da nova ordem global: perspectivas de
(re)formulação da federação brasileira. Curitiba: Juruá, 2006. p. 116.
5
KRELL, Andreas J. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental: o controle dos conceitos
jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2004. p. 93.
6
ABRUCIO, Fernando Luiz; COSTA, Valeriano Mendes Ferreira. Reforma do Estado e o contexto federativo
brasileiro. São Paulo: Konrad-Adenauer-Stiftung, 1998. p. 33-34.
Krell7
afirma que, em lugar da cooperação federativa, institui-se uma espécie de
federalismo em que as esferas pactuam espontaneamente com o objetivo de superar as
dificuldades inerentes a este sistema da separação administrativa. Assim, não há uma parceria
equilibrada entre os entes, mas uma relação de subordinação, a qual resta atrelada à
instabilidade e aos “jogos políticos”. No mesmo sentido, Sidney Guerra8
afirma que, em
termos práticos, o modelo brasileiro é de um federalismo “competitivo”, no qual ao invés de
cooperação se estabelece uma competição entre os entes federativos, produzindo efeitos
nefastos de todas as ordens na sociedade. É justamente esta competição que vai trazer imensas
dúvidas e inquietações acerca do licenciamento ambiental. Tema a ser aprofundado no último
tópico deste artigo.
Muito embora a organização federativa possa propiciar um sistema democrático, uma
vez que torna necessária a pluralidade de centros de poder político, no caso brasileiro, diante
da histórica aliança das oligarquias locais, esta pluralidade acabou representando grande risco
para o sistema, considerando a criação de um cenário de “democracia fictícia”, embora tenha
como base os princípios e a mecânica do federalismo. Apesar do cumprimento dos
pressupostos democráticos, como, por exemplo, por meio de sufrágio universal, voto secreto,
eleições diretas, dentro dos Estados-membros a dominação política, econômica e social foi
sendo exercida por oligarquias dominantes da política local.9
Esta dominação pelo poder local não diz respeito a fenômeno recente dentro do
contexto brasileiro. A história do federalismo no Brasil é pautada pela prática denominada de
“coronelismo” e suas artimanhas, ainda reinante em muitas regiões do país. Neste sentido, a
Proclamação da República e a instauração do sistema federativo acabaram contribuindo para
o fortalecimento do coronelismo, pois o sufrágio universal fez com que a população passasse
a ser uma massa de eleitores, concentrada em especial no meio rural e tutelada pelos
detentores de terra.10
De acordo com Victor Nunes Leal11
o coronelismo não se trata de fenômeno simples,
uma vez que envolve uma série de características da política municipal. De forma bastante
sucinta, pode-se dizer que se apresenta como resultante da superposição de formas
desenvolvidas do regime representativo a uma estrutura econômica e social não apropriada.
Não se trata de mera sobrevivência do poder privado, cujo desenvolvimento representou
fenômeno comum da história colonial brasileira. É, sobretudo, uma forma particular de
manifestação do poder privado, isto é, uma adaptação em nome da qual as consequências do
antigo e marcante poder privado tem conseguido subsistir com um regime político de vasta
base representativa. Nos termos do autor é:
7
KRELL, Andreas J. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental: o controle dos conceitos
jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2004. p. 96.
8
GUERRA, Sidney. O licenciamento ambiental de acordo com a LC 140/2011. Revista de Direito Ambiental,
São Paulo, Ano 17. n. 66, p. 151-179, Abril/Junho 2012. p. 158.
9
BAGGIO, Roberta Camineiro. Federalismo no contexto da nova ordem global: perspectivas de
(re)formulação da federação brasileira. Curitiba: Juruá, 2006. p. 117.
10
BAGGIO, Roberta Camineiro. Federalismo no contexto da nova ordem global: perspectivas de
(re)formulação da federação brasileira. Curitiba: Juruá, 2006. p. 87.
11
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. 3ed. São
Paulo: Editora Alfa-Omega, 1976. p. 19-20.
“[...] sobretudo um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público,
progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais,
notadamente dos senhores de terras. Não é possível, pois, compreender o fenômeno
sem referência à nossa estrutura agrária, que fornece a base de sustentação das
manifestações de poder privado ainda tão visíveis no interior do Brasil”.12
Na contemporaneidade brasileira, em especial posteriormente à Constituição de 1988,
consagrou-se um modelo que aperfeiçoa a autonomia municipal, trazendo a possibilidade de
que a população esteja mais envolvida nos temas relacionados à ordem pública. Ou seja,
oportunizou-se que o poder público esteja mais próximo e sensível às demandas da
comunidade. Para além desta constatação pode-se dizer que quanto mais poder o Município
tiver, maiores as chances de se estabelecer um Estado democrático.13
No entanto, ainda considerando a descentralização de poder para os Municípios, outro
fator a ser ponderado é o território político em termos de grande diversidade regional,
incluindo aí as distinções nas condições financeiras, políticas e administrativas das “entidades
subnacionais” e em suas capacidades de resposta às demandas sociais. Assim, seria
impensável uma descentralização uniforme, sem se levar em conta estas distinções. Este
processo foi agravado de forma mais drástica pela “chuva” de novos Municípios após a
Constituição Federal de 1988.
Uma vez que a Constituição incentivou o processo de emancipação de inúmeros
distritos e a criação também significativa de Municípios, acabou gerando grande dificuldade
para o federalismo brasileiro. Considerando que se tem como umas das consequências o
enfraquecimento financeiro tanto dos distritos emancipados quanto dos “municípios-mãe”.
Entende-se que se tratou de estratégia de governadores almejando expandir ainda mais suas
“máquinas eleitorais” satisfazendo os aliados locais, sob o manto da “total autonomia
municipal”.14
Tal estratégia, como já referido, repousa suas raízes no já mencionado
fenômeno do coronelismo e seus desdobramentos.
Já passados diversos anos da promulgação da Constituição Federal de 1988, boa parte
dos municípios brasileiros (mesmo nas regiões mais desenvolvidas) permanece sem uma
efetiva estrutura financeira, institucional, política ou mesmo técnica administrativa no sentido
de assumir um protagonismo na eficácia da participação e democratização das políticas
públicas. Em muitos destes municípios, em especial nas regiões menos desenvolvidas,
predomina a economia de base agrícola (com pouca diversidade de culturas), em crise ou
estagnado e comumente necessitando de auxílio dos governos estaduais e federais.15
Não há como ignorar as profundas diferenças que marcam a realidade dos Municípios
brasileiros. A falta de percepção desta disparidade fez com que igualdade trazida pela
Constituição Federal entre os entes da Federação se tornasse um “mito da igualdade”. Assim,
é muito diferente a realidade de Municípios como o de São Paulo, por exemplo, que conta
12
LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. 3. ed.
São Paulo: Editora Alfa-Omega, 1976. p. 20.
13
Sobre o tema cf. MAGALHÃES, José Luiz Quadros. Pacto federativo. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000;
MAGALHÃES, José Luiz Quadros. O poder local no Brasil: a alternativa da democracia participativa. Revista
Katálysis, Florianópolis, v. 7, n. 1, p. 85-98, jan./jun, 2004.
14
BAGGIO, Roberta Camineiro. Federalismo no contexto da nova ordem global: perspectivas de
(re)formulação da federação brasileira. Curitiba: Juruá, 2006. p. 119.
15
SOUZA, Celina; CARVALHO, Inaiá MM de. Reforma do Estado, descentralização e desigualdades. Revista
Lua Nova [online]. 1999, n. 48, p. 187-212. p. 203. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/ln/n48/a11n48.pdf> Acesso em 08 de maio de 2013.
com ampla infraestrutura, em comparação com grande parte dos mal estruturados municípios
brasileiros.
Em um país de enorme dimensão territorial e marcado por densas diferenças intra e
inter-regionais e sociais, os efeitos da descentralização assumem uma tendência a grandes
variações. Por esta razão, a valorização das instâncias locais não pode ter um caráter absoluto
e a descentralização não pode ocorrer sem se considerar uma gama imbricada de fatores, tais
como, os econômicos, políticos, demográficos e sociais que irão assumir diferentes
perspectivas de transformação do setor público em cada contexto. Muitas vezes estas
distinções podem prejudicar os próprios objetivos da descentralização, diminuindo as
possibilidades de auxílio federal e estadual às instâncias locais, não se permitindo minimizar
os efeitos dessas desigualdades.16
Em se tratando especificamente de estruturação dos órgãos ambientais, a disparidade é
bastante perceptível. E mesmo municípios que contam com recursos financeiros mais vastos,
como é o caso das capitais dos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, já tiveram
seus órgão ambientais envolvidos em casos policiais onde se constatou “esquemas de venda
de licenças ambientais”17
, restando clara a sua fragilidade diante das pressões exercidas pelo
setor econômico.
Há, portanto, um paradoxo no que concerne à questão da evidente necessidade de
descentralização do poder para os demais entes federados, em especial ao poder municipal.
Por um lado, a descentralização do poder ao nível local representa o fortalecimento do mesmo
e a possibilidade de aproximação das esferas de decisão para o nível mais próximo à
população, ou seja, para a melhor compreensão dos anseios sociais, tendo em vista a maior
capacidade de percepção do que seria o “interesse local”. Por outro lado, a fragmentação do
controle federal em termos de fiscalização e exercício do poder de polícia pode representar
forte afronta à efetivação das normas de proteção ambiental, tendo em vista a conhecida falta
de infraestrutura dos órgãos ambientais municipais e a vulnerabilidade do poder público local
diante da pressão exercida pelos lobbies existentes no país, tais como o do setor imobiliário
ou do agronegócio.
Diante de tais considerações, a compreensão das polêmicas quanto às questões
trazidas a partir da publicação da Lei Complementar n. 140/2011 em termos de
descentralização política exige que se compreenda o processo de transformação vivenciado
pela legislação relativa à matéria, o que será apresentado no tópico seguinte.
3. Transformações da competência municipal para licenciamento ambiental
O tema da competência municipal para licenciamento ambiental mostra-se bastante
controverso ao longo das últimas décadas. Em parte, isto ocorre em razão do aparato
legislativo institucionalizado sobre o tema, o qual criou critérios diferenciados e confusos
sobre a matéria. Além disso, no intuito de estabelecer uma gestão ambiental compartilhada
entre os diversos entes federativos, este mesmo aparato legislativo acabou por criar
sobreposições, omissões e divergências no que diz respeito ao exercício da competência para
o licenciamento ambiental.
16
SOUZA, Celina; CARVALHO, Inaiá MM de. Reforma do Estado, descentralização e desigualdades . Revista
Lua Nova [online]. 1999, n. 48, p. 187-212. p. 208-209. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/ln/n48/a11n48.pdf> Acesso em 08 de maio de 2013.
17
Deflagradas pelas Operações da Polícia Federal com a designação de Moeda Verde em Florianópolis e
Concutare em Porto Alegre, esta última bastante recente (abril-maio de 2013) e ainda em andamento.
Cabe destacar que, a partir da Constituição Federal de 1988, os Municípios
adquiriram um papel de destaque no estado federativo brasileiro. De acordo com Paulo
Bonavides18
a autonomia municipal no contexto da Carta Constitucional de 1988 constituiu o
mais considerável avanço de proteção e abrangência já recebido por esse instituto.
Anteriormente a 1988, os Municípios não possuíam autonomia plena. Os interesses políticos
faziam com que houvesse um controle total por parte do poder central sobre os Municípios.19
Assim, a Constituição Federal modificou este panorama, transferindo o poder político para
mais perto do cidadão e transformando o Município em ente federativo dotado de autonomia.
Segundo José Afonso da Silva20
, a autonomia federativa baseia-se em dois elementos básicos:
existência de órgãos governamentais próprios e posse de competências exclusivas.
A federalização instituída no plano constitucional teve por objetivo compatibilizar a
autonomia local e a dependência do governo central, estabelecendo uma organização político-
administrativa que compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios.
Como esses entes federativos manifestam-se sobre a mesma população e sobre o mesmo
território, a matéria condizente com a repartição de competências entre as diferentes esferas
governamentais constitui um dos núcleos fundamentais do Estado Federal brasileiro,
estabelecendo os limites de atuação de cada um desses entes como centros de poderes
autônomos.21
O equilíbrio federativo é traçado, na Constituição Federal, por meio de um sistema
de repartição de competências fundado na técnica de enumeração de poderes da União, com
poderes remanescentes para os Estados e poderes definidos indicativamente para os
Municípios. Em regra, a repartição de competências entre as entidades federativas baseia-se
no princípio da preponderância do interesse, de acordo com o qual à União competem as
matérias e questões de interesse geral ou nacional, aos Estados tocam as matérias e assuntos
de predominante interesse regional e aos Municípios concernem os assuntos de interesse
local. Além desses campos específicos, o texto constitucional estabelece atuações comuns dos
entes federativos, prerrogativas concorrentes entre União, Estados e Distrito Federal e
atribuições suplementares para os Municípios.22
Na Constituição Federal de 1988, a divisão de competências entre os entes
federativos foi diferenciada entre competência legislativa e competência material. Os artigos
22, 24 e 30, I, do texto constitucional, tratam da competência para legislar, ao passo que os
artigos 21 e 23 apresentam as competências materiais. Nesse contexto, em matéria ambiental
estabeleceu-se uma espécie de federalismo cooperativo, com a previsão de uma série de
competências compartilhadas entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios a fim de
garantir a tutela do meio ambiente. No que tange ao licenciamento ambiental, importa
observar a competência material comum estabelecida pela Constituição Federal no artigo 23,
visto que a matéria insere-se na seara do exercício do poder de polícia. Assim, o artigo 23 da
Constituição Federal atribuiu competência comum a todos os entes federados, ou seja, União,
Estados membros, Distrito Federal e Municípios.
18
BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 311.
19
ALBERGARIA, Bruno Direito Ambiental e a responsabilidade civil das empresas. Belo Horizonte: Fórum,
2005. p. 67.
20
SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 71.
21
FERREIRA, Heline Sivini. Competências Ambientais. IN: CANOTILHO, José Joaquim Gomes. LEITE, José
Rubens Morato. (org.) Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 204.
22
FERREIRA, Heline Sivini. Competências Ambientais. IN: CANOTILHO, José Joaquim Gomes. LEITE, José
Rubens Morato. (org.) Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 204.
Em relação à matéria ambiental, o referido artigo dispõe que se trata de competência
comum: proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural,
os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos (III); impedir a
destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico
ou cultural (IV); proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas
(VI); preservar as florestas a fauna e a flora (VII). O parágrafo único deste mesmo artigo,
conforme redação dada pela Emenda Constitucional n. 53/06, prevê que cabe à lei
complementar fixar normas para a cooperação entre os entes federativos, tendo em vista o
equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional. Neste sentido, a Lei
Complementar n. 140/11 veio a completar lacuna importante em matéria de competências
ambientais.
Contudo, deve-se destacar que anteriormente à Lei Complementar n. 140/11, a
matéria já era discutida considerando os termos da Lei n. 6.938/81 e da Resolução 237/97 do
CONAMA, sendo pautada por inúmeros conflitos. Na estrutura criada pela Política Nacional
do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) a competência para licenciar foi atribuída à União, aos
Estados e ao Distrito Federal. De acordo com o artigo 10 da Lei n. 6.938/81, o órgão
competente para o licenciamento ambiental é o órgão estadual do SISNAMA, sendo a
competência do IBAMA para o licenciamento de caráter supletivo na maioria dos casos. Foi,
porém, determinada competência originária do IBAMA para o caso de atividades e obras com
significativo impacto ambiental, de âmbito nacional ou regional.
Constata-se, assim, que o critério para a repartição de competência administrativa
licenciatória estabelecido pela Lei n. 6.938/81 caracteriza-se por uma concentração de
atribuições aos órgãos estaduais de meio ambiente, que por vezes não conseguem cumprir a
enorme demanda de licenciamentos, bem como pela não-inclusão dos Municípios na condição
de responsáveis pelo licenciamento ambiental.23
Em parte esta situação justifica-se pela
situação política do Estado brasileiro a época da Lei n. 6.938/81, a qual não reconhecia plena
autonomia aos municípios. Esta situação modifica-se com a Constituição Federal de 1988,
como já referido acima. Porém, a forma de cooperação entre os entes federativos carecia de
regulamentação por meio de Lei Complementar. Diante das inúmeras controvérsias, em
especial quanto ao licenciamento ambiental, em 1997 o Conselho Nacional do Meio
Ambiente editou a Resolução n. 237/97.
A Resolução n. 237/97 do CONAMA, por sua vez, estabelecia regime diverso da Lei
n. 6.938/81, prevendo uma repartição de competências para o licenciamento baseado
predominantemente na extensão territorial dos impactos ambientais. Segundo a Resolução,
compete ao IBAMA o licenciamento de atividades ou empreendimentos com significativo
impacto ambiental de âmbito nacional ou regional (art. 4º). Ao órgão estadual estabeleceu a
competência para o licenciamento de atividades cujos impactos ambientais possam ultrapassar
os limites de um Município. E, por fim, ao órgão ambiental municipal previu competência
para o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades de impacto ambiental local.
Logo, nos termos na Resolução, o critério para identificação do órgão ambiental competente
para o licenciamento ambiental seria o da abrangência do impacto.
Entretanto, este não era o único critério utilizado pela Resolução 237/97, visto que,
por vezes, a mesma ainda atribuía o exercício da competência para licenciamento ambiental a
partir do critério da dominialidade do bem, por exemplo, no que tange às unidades de
23
FARIAS, Talden. Licenciamento ambiental: aspectos teóricos e práticos. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p.
130.
conservação do domínio da União. Também estipulava o critério geográfico ao dispor que é
competência do IBAMA o licenciamento de empreendimentos e atividades localizados no
mar territorial ou na plataforma continental. E, ainda, estabelecia o critério da segurança
nacional ao prever a competência da União para o licenciamento de atividades que envolvam
energia nuclear ou empreendimentos militares. A Resolução 237/97 foi bastante criticada por
se entender que, nestes pontos, o texto distancia-se do critério constitucional da
preponderância do interesse vinculado à influência direta do impacto ambiental, colidindo
com a autonomia dos estes federativos.24
Por outro lado, a referida Resolução teria inovado ao
estabelecer o licenciamento ambiental municipal e ao prever que o licenciamento deveria ser
feito em um único nível de competência.
Desse modo, verifica-se que o licenciamento ambiental municipal restou expresso
nos termos da Resolução n. 237/97, no artigo 6º, o qual estipulava que compete ao órgão
ambiental municipal o licenciamento ambiental de empreendimento e atividades de impacto
ambiental local. Considera-se impacto ambiental local qualquer alteração direta (ou seja,
decorrente de uma única relação de causa e efeito) das propriedades físicas, químicas e
biológicas do meio ambiente, que afetem a saúde, a segurança e o bem-estar da população, as
atividades sociais e econômicas, a biota, as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente
e/ou a qualidade dos recursos ambientais, dentro dos limites do Município.25
Não obstante, embora a Resolução 237/97 tenha buscado estabelecer critérios para
dividir os encargos do licenciamento, evitando sobreposições ou omissões decorrentes da
ausência da previsão de competências, em especial para os municípios, havia um grande
número de críticas doutrinárias quanto à sua constitucionalidade, o que gerava incertezas e
possíveis conflitos judiciais em razão da competência do órgão ambiental licenciador.26
Quanto ao tema Patrícia Silveira da Rosa informa que o fato da atribuição de competência ter
sido instituída por uma resolução, somado à ausência da Lei Complementar, prevista no
parágrafo único do artigo 23 da Constituição Federal, trouxe insegurança à Administração
Pública, decorrente de interpretações formais, aliada à recusa da perda de poder pelos órgãos
estaduais, justificáveis, em inúmeros casos, por notórias deficiências materiais e humanas dos
órgãos municipais.
“A extensão do problema da falta de solução para o impasse surgido dessas
incertezas acarreta graves conseqüências, em níveis que suplantam o estritamente
ambiental, contagiando o econômico. Incertezas quanto à competência executiva em
matéria ambiental impedem a fluidez e a racionalidade na gestão do meio ambiente,
dificultando a cooperação e a divisão de poderes verdadeiramente federativa, além
de contribuir para a informalidade”.27
Com o objetivo de sanar a insegurança jurídica em relação à matéria, em 2001, o
Ministério do Meio Ambiente instituiu uma Comissão Tripartite Nacional a fim de que esta
buscasse definir as competências ambientais. No ano de 2003, esta Comissão Tripartite
Nacional iniciou seus trabalhos e sua primeira meta foi construir um projeto de lei envolvendo
os três entes. Este trabalho foi finalizado em 2005 e recepcionado pelo Congresso Nacional
24
FINK, Daniel Roberto. ALONSO JUNIOR, Hamilton. DAWALIBI, Marcelo. Aspectos jurídicos do
licenciamento ambiental. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002. p. 50.
25
BARROS, Wellington Pacheco. Curso de Direito Ambiental. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 196.
26
MARCHESAN, Ana Maria Moreira. STEIGLEDER, Annelise Monteiro. CAPPELI, Sílvia. Direito
Ambiental. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2010. p. 108.
27
ROSA, Patrícia Silveira da. Licenciamento Ambiental à luz da Teoria dos Sistemas Autopoiéticos. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 120.
por meio do Deputado Federal Sarney Filho, que era o signatário do projeto original sobre o
tema.28
Este projeto tinha como objetivos: estabelecer a cooperação entre União, Estados e
Municípios; atuação descentralizada, democrática e eficiente; garantir o equilíbrio do
desenvolvimento socioeconômico com a proteção do meio ambiente e a harmonização de
políticas e ações administrativas para se evitar a sobreposição de atuação entre os entes
federativos; e a garantia de uniformidade da política ambiental nacional, respeitadas as
peculiaridades regionais e locais.29
O projeto inicial, porém, foi totalmente desfigurado pela
bancada ruralista e pelo empresariado por meio de diversas emendas e, ao final, relatado no
Senado pela senadora Kátia Abreu.30
Em 2005, o Ministério do Meio Ambiente começou a disseminar no país a
implantação das Comissões Tripartites Estaduais, sendo que, até o ano de 2011, as referidas
comissões haviam sido implantadas em aproximadamente vinte e dois Estados da Federação.
Na maioria das Comissões Tripartites Estaduais destacaram-se as discussões sobre as
competências de cada ente federativo. No intuito de capacitar os entes federados,
especialmente Estados e Municípios, desde o final de 2005 até 2010, o Ministério do Meio
Ambiente instituiu e apoiou o Plano Nacional de Capacitação de Gestores do SISNAMA –
PNC. Este Plano visava preparar, principalmente os gestores municipais para que estivessem
tecnicamente capacitados a assumirem o licenciamento ambiental das atividades de impacto
local. Infelizmente, o programa deixou de ser uma prioridade e caiu no esquecimento, mas o
mesmo capacitou em 17 Estados brasileiros aproximadamente 6.000 gestores.31
Por fim, em 2009, a Lei Complementar n. 140/11 foi aprovada na Câmara Federal e,
em 2011, no Senado Federal. Em 09 de dezembro de 2011 a Presidente da República
sancionou seu texto. Como relatado anteriormente, o advento da referida Lei Complementar
trouxe alguma esperança no sentido de que os impasses em torno da competência ambiental
para licenciar pudessem ser definitivamente resolvidos. Em relação à competência municipal
para o licenciamento ambiental, a Lei Complementar efetivamente reconhece o licenciamento
ambiental por parte dos Municípios ao prever, no artigo 9º, inciso XIV, a competência para
promover o licenciamento ambiental de atividades ou empreendimentos que: a) causem ou
possam causar impacto ambiental de âmbito local, conforme tipologia definida pelos
respectivos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente, considerados os critérios de porte,
potencial poluidor e natureza da atividade; ou b) localizados em unidades de conservação
instituídas pelo Município, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs).
4. Lei Complementar n. 140/11: o “federalismo competitivo” e as perspectivas do
licenciamento ambiental municipal
Retomando a ideia de descentralização no federalismo brasileiro, verifica-se que a
Lei Complementar n. 140/11, ao estipular as competências de cada ente federativo no que
tange à proteção ambiental, destacou a participação dos Municípios, com ênfase ao
28
CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS. Nota Técnica nº. 005/2012. Brasília, 20 de março de
2012. Disponível em: <http://www.cnm.org.br> Acesso em 04 de maio de 2013.
29
SOUZA, José Fernando Vidal de. ZUBEN, Erika Von. O Licenciamento Ambiental e a Lei Complementar nº.
140/2011. IN: Cadernos de Direito, Piracicaba, v. 12(23): 11-44, jul.-dez. 2012. Disponível em:
<https://www.metodista.br/revistas/revistas-unimep/index.php/.../1022> Acesso em 04 de maio de 2013.
30
SOUZA, José Fernando Vidal de. ZUBEN, Erika Von. O Licenciamento Ambiental e a Lei Complementar nº.
140/2011. IN: Cadernos de Direito, Piracicaba, v. 12(23): 11-44, jul.-dez. 2012. Disponível em:
<https://www.metodista.br/revistas/revistas-unimep/index.php/.../1022> Acesso em 04 de maio de 2013.
31
CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS. Nota Técnica nº. 005/2012. Brasília, 20 de março de
2012. Disponível em:<http:// www.cnm.org.br> Acesso em 04 de maio de 2013.
licenciamento de empreendimentos de impacto local, os quais passam a ser de competência
do Município. De fato, a Lei em comento cria a possibilidade de que os Estados (e também o
Distrito Federal), além dos Municípios, possuam irrestrita autonomia acerca da decisão sobre
a gestão ambiental.
Constata-se que a Lei Complementar nº 140/11 acabou por descentralizar o processo
regulamentar das competências da União, Estados e Municípios no que se refere à proteção
ambiental. Tal conjuntura foi desenhada com o objetivo de permitir uma maior agilidade na
análise dos procedimentos de licenciamento ambiental, visto que no contexto da Resolução
237/97 do CONAMA os Estados ficaram como o principal ente responsável pelo
licenciamento ambiental. Assim, o compartilhamento dessa competência com os Municípios
permitiria uma maior rapidez na análise dos processos, bem como solucionaria os conflitos de
competência que eram suscitados até então em virtude da sobreposição de atribuições
colocada pela referida Resolução. Destaca-se, ainda, que o licenciamento ambiental por parte
dos Municípios na referida Resolução mostrava-se vaga e não detalhava o procedimento a ser
cumprido pelos órgãos ambientais municipais. Isso gerava insegurança jurídica no exercício
dessas funções.
No entanto, se de um lado compreende-se a necessidade de maior clareza na
delimitação das competências para licenciamento ambiental, no intuito de evitar incertezas
tanto para Administração Pública, quanto para o empreendedor, por outro lado entende-se que
esta mudança pode afetar a proteção do meio ambiente de forma significativa. Nesse sentido,
recorda-se o paradoxo apresentado no primeiro tópico deste artigo em relação à
descentralização do poder. No caso do licenciamento ambiental, a descentralização desta
competência, embora fortaleça os entes municipais e torne as decisões mais próximas da
realidade local, também fragmenta o do controle federal o que, aliada à falta de estrutura dos
órgãos municipais, pode deixar as decisões ambientais à mercê dos interesses econômicos e
políticos.
A afirmação de que esta pulverização de competências pode significar um
fortalecimento do federalismo deve considerar, porém, que no contexto brasileiro isso
igualmente implica na possibilidade de tornar o sistema mais permissivo em relação a
empreendimentos de impactos ambientais consideráveis, em razão da ausência de pessoal
técnico capacitado para o acompanhamento dos procedimentos de licenciamento e concessão
de licenças. Além disso, esta vulnerabilidade dos órgãos locais pode facilitar a criação de
“balcões de negócios” e convites à corrupção.32
Traçando um paralelo com a análise feita acerca da recorrente preponderância dos
interesses privados no âmbito do poder local, haja vista o histórico fenômeno do coronelismo,
pode-se depreender que uma das intenções da Lei Complementar n. 140/11 é a de diluir e
transferir responsabilidades para os entes federativos menos capacitados tecnicamente,
eventualmente facilitando a aprovação de empreendimentos a nível local. A título
exemplificativo e, como já referido anteriormente, há fortes disparidades entre os 5.570
Municípios brasileiro. Dentre estes, enquanto São Paulo conta com cerca de 11 milhões de
habitantes, outros possuem menos de mil habitantes. No que tange à extensão territorial,
alguns tem área maior do que determinados países europeus, como é o caso do Município de
Altamira, no Estado do Pará (cuja extensão é quase duas vezes maior do que a de Portugal),
32
SOUZA, José Fernando Vidal de. ZUBEN, Erika Von. O Licenciamento Ambiental e a Lei Complementar n.
140/2011. IN: Cadernos de Direito, Piracicaba, v. 12(23): 11-44, jul.-dez. 2012. Disponível em:
<https://www.metodista.br/revistas/revistas-unimep/index.php/.../1022> Acesso em 04 de maio de 2013.
de outro lado existem Municípios com menos de 4 km.
Desse modo, o estabelecimento de
uma regra geral sem levar em consideração essa disparidade tende a manter a histórica
ineficácia da proteção ambiental no Brasil.
Por outro lado, a Lei Complementar n. 140/11 em seu art. 4º instituiu instrumentos
de cooperação em matéria ambiental, tais como consórcios públicos, convênios e acordos de
cooperação técnica. Esta matéria era importante para o reconhecimento de praxes comuns no
âmbito de diversos Estados que já haviam regulamentado o licenciamento ambiental
municipal via convênio entre o órgão estadual e os Municípios, desde que preenchidas
determinadas exigências estabelecidas em Resoluções dos Conselhos Estaduais de Meio
Ambiente.
No que diz respeito aos convênios, estes já de longa data vinham representando o
principal instrumento colaborativo entre União, Estados e Municípios, muito embora os
inúmeros problemas a eles relacionados ainda não tivessem sido enfrentados de forma clara
pela doutrina. Os convênios eram negociados caso a caso entre as prefeituras e o Estado ou
União e, não raras vezes, previam apoio técnico e financeiro para aqueles municípios que não
dispõem do suporte suficiente para a execução das atribuições.33
Em que pese o reconhecimento desses instrumentos pela Lei Complementar n.
140/11, não há previsão expressa quanto à necessidade de submissão dos Municípios aos
Estados ou à União para o exercício da competência para licenciamento ambiental quanto a
empreendimentos de impacto local, não se exigindo qualquer delegação, habilitação e/ou
qualificação para o exercício do direito de licenciar, tão somente estar tecnicamente
capacitado.
Nesse sentido, a leitura combinada do artigo 15, com o artigo 5º, parágrafo único, da
Lei Complementar n. 140/11 permite afirmar que, para o exercício do direito de licenciar as
atividades e empreendimentos de impacto local, os Municípios deverão apresentar órgão
ambiental capacitado. Segundo os termos da lei, órgão ambiental capacitado é aquele que
possui técnicos próprios ou em consórcio, devidamente habilitados e em número compatível
com a demanda das ações administrativas a serem efetuadas. Nota-se, dessa maneira, que
embora a lei tenha previsto alguma exigência, o dispositivo é vago e impreciso, podendo gerar
número considerável de discussões sobre as características deste órgão ambiental municipal.
Não se mostra demasiado considerar que, na estruturação da Administração Pública
brasileira é comum a utilização de critérios subjetivos para a determinação de como será feita
a distribuição de cargos e a escolha das pessoas. Krell34
afirma que a dimensão da máquina
burocrática municipal é definida mais preponderantemente por fatores externos, tais como o
clientelismo e o nepotismo, em detrimento das necessidades internas de uma administração
eficaz.
Além de tais aspectos, importa salientar que a Lei Complementar n. 140/11
determinou, ainda, no artigo 17, que a competência para a fiscalização ambiental dos
33
KRELL, Andreas J. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental: o controle dos conceitos
jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2004. p. 94-95.
34
KRELL, Andreas J. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental: o controle dos conceitos
jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2004. p. 92.
empreendimentos está atrelada ao órgão licenciador, embora permaneça a possibilidade de
atuação supletiva de outros entes federados no exercício do poder de polícia. Não obstante, a
Lei determina que no caso de autuação por mais de um órgão ambiental o auto de infração
lavrado pelo órgão ambiental licenciador prevalecerá. Desse modo, se o licenciamento é
realizado pelo Município, a princípio este também será competente para a fiscalização, o que
torna a proteção ambiental em âmbito local ainda mais sujeita às pressões econômicas e
políticas atuantes sobre o poder público municipal.
Observa-se que as Administrações Municipais não têm colaborado de forma muito
efetiva junto aos órgãos ambientais dos demais entes, tendo em vista que uma cooperação
administrativa das três esferas visaria maior proteção ambiental. Contudo, o que se verifica é
um federalismo ambiental competitivo entre os diversos entes federativos, no qual prevalecem
os interesses do jogo político, já anteriormente referido.
De fato, os Municípios apresentam papel relevante como agentes primários e
principais na proteção ambiental, porém, como se buscou debater, na forma estabelecida pela
Lei Complementar n. 140/11, a ausência de critérios a serem preenchidos pelos Municípios
para o exercício da atividade licenciatória poderá fragilizar a proteção ambiental. De outra
parte, a descentralização quanto o licenciamento ambiental promovida pela Lei
Complementar n. 140/11exigirá investimentos, métodos, recursos humanos, ferramentas de
gestão e de tecnologia da informação que possam acarretar o fortalecimento estrutural da
gestão ambiental nos Municípios.35
Anteriormente às competências específicas para o
licenciamento ambiental municipal, acredita-se que os entes municipais deveriam estar
preocupados em coordenar ações e desenvolver sistemas de cooperação mais eficazes, bem
como atuar junto à população local no intuito de evitar a degradação ambiental por meio de
políticas públicas e educação ambiental.
5. Conclusões Articuladas
5.1 A Constituição Federal de 1988 buscou estabelecer um federalismo cooperativo. No
entanto, o que de fato se constata é a existência um federalismo competitivo, que repousa suas
raízes históricas no fenômeno do coronelismo, comprometendo uma das características mais
relevantes desse sistema, qual seja, a descentralização política.
5.2 A Lei Complementar n. 140/11 tenta sanar as lacunas e controvérsias acerca da
competência para o licenciamento ambiental municipal. Contudo, ao mesmo tempo em que
fortalece a autonomia dos Municípios, coloca em risco a proteção ambiental em face da
fragilidade estrutural dos órgãos ambientais municipais brasileiros.
5.3 A Lei Complementar n. 140/11, apesar de criar instrumentos de cooperação (art. 4º) entre
os entes federativos em matéria ambiental, não os exige para que os Municípios exerçam
competência para licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades de impacto
local, ficando as exigências restritas à previsão do artigo 5º, parágrafo único.
5.4 A leitura combinada do artigo 15 com o artigo 5º, parágrafo único, da Lei Complementar
n. 140/11 permite afirmar que, para o exercício do direito de licenciar as atividades e
35
GUERRA, Sidney. O licenciamento ambiental de acordo com a LC 140/2011, Revista de Direito Ambiental,
Ano 17. n. 66, p. 151-179, São Paulo, Abril/Junho 2012. p. 177.
empreendimentos de impacto local, os Municípios deverão apresentar órgão ambiental
capacitado, porém, o dispositivo é vago e impreciso.
5.5 O artigo 17 da Lei Complementar nº 140/11 ao estabelecer que o ente licenciador deverá
ser o responsável pela fiscalização, torna a proteção ambiental em âmbito local ainda mais
sujeita às pressões econômicas e políticas atuantes sobre o poder público municipal.

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Licenciamento ambiental municipal e Lei Complementar 140/11

  • 1. LICENCIAMENTO AMBIENTAL MUNICIPAL: PERSPECTIVAS DA LEI COMPLEMENTAR N. 140/11 LIZ BEATRIZ SASS Doutoranda em Direito pela UFSC. Bolsista do CNPQ. Professora de Direito Ambiental no Curso de Direito da UNIVALI e Professora licenciada da UNISINOS. MELISSA ELY MELO Doutoranda em Direito pela UFSC. Bolsista do CNPQ. Professora de Políticas Públicas no Curso de Graduação em Administração Pública (ESAG/UDESC). 1. Introdução A Lei Complementar n. 140/11 foi publicada com o intuito de sanar uma lacuna existente no ordenamento jurídico ambiental brasileiro, qual seja, a regulamentação do exercício da competência comum entre os entes federativos, prevista no artigo 23 da Constituição Federal de 1988. Assim, a referida Lei Complementar foi recebida com grande expectativa, haja vista o déficit existente quanto à proteção ambiental em razão das inseguranças jurídicas geradas pelo controverso aparato legislativo até então vigente sobre a temática. Nesse contexto, a Lei Complementar traz importante normatização quanto ao exercício das competências ambientais, destacando-se, neste artigo, a competência para licenciamento ambiental pelos Municípios. Ao mesmo tempo em que se considera este um movimento importante para a descentralização do poder político no âmbito do federalismo brasileiro, teme-se que o reconhecimento da autonomia municipal nesta material possa acarretar prejuízos para a proteção do meio ambiente. No intuito de discutir esta temática, o presente trabalho científico tem por objetivo analisar o licenciamento ambiental municipal a partir da Lei Complementar n. 140/11, confrontando a relevância da autonomia dos Municípios com a fragilidade dos órgãos públicos municipais diante da pressão exercida pelo setor econômico na contemporaneidade. Assim sendo, dividiu-se a abordagem em três tópicos. O primeiro debate a descentralização política no contexto do federalismo brasileiro, buscando as raízes históricas das disfunções na distribuição do poder político. O segundo tópico apresenta um breve panorama quanto à transformação da competência dos Municípios para o licenciamento ambiental. Por fim, o último tópico dedica-se à análise dos dispositivos da Lei Complementar n. 140/11 relacionados à temática e suas possíveis interpretações e incongruências em relação à proteção ambiental. 2. Descentralização política e autonomia municipal: do coronelismo ao “federalismo competitivo” A compreensão do papel reconhecido aos Municípios na Lei Complementar n. 140/2011 exige inicialmente que se compreenda a sua posição no federalismo brasileiro. Nesse aspecto, importa ressaltar que a federação brasileira apresenta-se diferente do modelo de federalismo norte-americano, apesar de este ter servido como fonte de inspiração. De
  • 2. acordo com Roberta Camineiro Baggio1 , enquanto nos Estados Unidos os Estados-membros se uniram em prol da formação de uma União, aqui o território já se constituía como uma nação. Portanto, no Brasil, o poder centralizado é que foi repartido entre as diferentes províncias brasileiras. As distinções entre a experiência americana e a brasileira irão marcar de forma mais acentuada o caráter desagregador do federalismo no Brasil, em outras palavras, o aspecto centrífugo em detrimento do centrípeto. No caso brasileiro, a escolha pelo federalismo não foi protagonizada por atores em posições simétricas, nem mesmo de relativa simetria. Em sentido oposto, a distribuição do poder era completamente desigual entre os distintos Estados, uma vez que as elites locais é que acabavam por exercer o domínio político ao determinar quem seriam os governadores.2 Assim, a descentralização se apresenta de forma bastante peculiar no caso do federalismo brasileiro. As diversas disputas pelo poder político presentes desde a fundação da federação fazem com que este movimento seja pautado por oscilações de maior ou menor centralização. A descentralização do poder é entendida como uma das principais características do sistema federalista. É por meio dela que se torna possível a manutenção da harmonia entre as forças internas, admitindo que o Estado Nação se forme e tornando democraticamente estáveis as relações políticas no território nacional. Sendo assim, a descentralização política trata-se de pressuposto de qualquer sistema federativa, já que é a sua graduação que permitirá a autonomia dos entes federados, impondo relações intergovernamentais não hierárquicas considerando o nível vertical3 .4 De acordo com Andreas J. Krell, entretanto, as relações verticais entre os distintos níveis estatais jamais foi definida de maneira clara no Brasil, restando nebulosas as exigências para cada ente federativo no que diz respeito à cooperação com os demais, no sentido de solucionar os problemas que colocam em risco a qualidade de vida da população.5 Ao longo da história federativa do Brasil a mencionada assimetria conduziu a um processo de formação de distintas coalizões de certos Estados em oposição a outros. Esta realidade impediu a cooperação entre estes atores, estabelecendo um “jogo não cooperativo”. Somando-se a isto, a experiência brasileira tem mais uma característica relevante: as relações firmadas entre os Estados e a União não foram pautadas pelas práticas democráticas, tal como determinam os princípios federativos. Entre as décadas de 1930 e 1980 houve um fortalecimento do Governo Federal tanto no plano político, quanto no plano econômico e administrativo, o que se realizou por meio do autoritarismo. Em contraposição, os governos estaduais contaram, mesmo nos períodos democráticos, com uma conduta irresponsável em termos econômicos, baseada no parasitismo em relação ao Governo Federal.6 1 BAGGIO, Roberta Camineiro. Federalismo no contexto da nova ordem global: perspectivas de (re)formulação da federação brasileira. Curitiba: Juruá, 2006. p. 78. 2 ABRUCIO, Fernando Luiz; COSTA, Valeriano Mendes Ferreira. Reforma do Estado e o contexto federativo brasileiro. São Paulo: Konrad-Adenauer-Stiftung,,1998. p. 33. 3 As relações intergovernamentais verticais são aquelas que se estabelecem entre distintos níveis de governo – federal, estadual, municipal. Já as relações intergovernamentais horizontais são aquelas que se estabelecem entre os mesmos níveis governamentais. 4 BAGGIO, Roberta Camineiro. Federalismo no contexto da nova ordem global: perspectivas de (re)formulação da federação brasileira. Curitiba: Juruá, 2006. p. 116. 5 KRELL, Andreas J. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental: o controle dos conceitos jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 93. 6 ABRUCIO, Fernando Luiz; COSTA, Valeriano Mendes Ferreira. Reforma do Estado e o contexto federativo brasileiro. São Paulo: Konrad-Adenauer-Stiftung, 1998. p. 33-34.
  • 3. Krell7 afirma que, em lugar da cooperação federativa, institui-se uma espécie de federalismo em que as esferas pactuam espontaneamente com o objetivo de superar as dificuldades inerentes a este sistema da separação administrativa. Assim, não há uma parceria equilibrada entre os entes, mas uma relação de subordinação, a qual resta atrelada à instabilidade e aos “jogos políticos”. No mesmo sentido, Sidney Guerra8 afirma que, em termos práticos, o modelo brasileiro é de um federalismo “competitivo”, no qual ao invés de cooperação se estabelece uma competição entre os entes federativos, produzindo efeitos nefastos de todas as ordens na sociedade. É justamente esta competição que vai trazer imensas dúvidas e inquietações acerca do licenciamento ambiental. Tema a ser aprofundado no último tópico deste artigo. Muito embora a organização federativa possa propiciar um sistema democrático, uma vez que torna necessária a pluralidade de centros de poder político, no caso brasileiro, diante da histórica aliança das oligarquias locais, esta pluralidade acabou representando grande risco para o sistema, considerando a criação de um cenário de “democracia fictícia”, embora tenha como base os princípios e a mecânica do federalismo. Apesar do cumprimento dos pressupostos democráticos, como, por exemplo, por meio de sufrágio universal, voto secreto, eleições diretas, dentro dos Estados-membros a dominação política, econômica e social foi sendo exercida por oligarquias dominantes da política local.9 Esta dominação pelo poder local não diz respeito a fenômeno recente dentro do contexto brasileiro. A história do federalismo no Brasil é pautada pela prática denominada de “coronelismo” e suas artimanhas, ainda reinante em muitas regiões do país. Neste sentido, a Proclamação da República e a instauração do sistema federativo acabaram contribuindo para o fortalecimento do coronelismo, pois o sufrágio universal fez com que a população passasse a ser uma massa de eleitores, concentrada em especial no meio rural e tutelada pelos detentores de terra.10 De acordo com Victor Nunes Leal11 o coronelismo não se trata de fenômeno simples, uma vez que envolve uma série de características da política municipal. De forma bastante sucinta, pode-se dizer que se apresenta como resultante da superposição de formas desenvolvidas do regime representativo a uma estrutura econômica e social não apropriada. Não se trata de mera sobrevivência do poder privado, cujo desenvolvimento representou fenômeno comum da história colonial brasileira. É, sobretudo, uma forma particular de manifestação do poder privado, isto é, uma adaptação em nome da qual as consequências do antigo e marcante poder privado tem conseguido subsistir com um regime político de vasta base representativa. Nos termos do autor é: 7 KRELL, Andreas J. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental: o controle dos conceitos jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 96. 8 GUERRA, Sidney. O licenciamento ambiental de acordo com a LC 140/2011. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, Ano 17. n. 66, p. 151-179, Abril/Junho 2012. p. 158. 9 BAGGIO, Roberta Camineiro. Federalismo no contexto da nova ordem global: perspectivas de (re)formulação da federação brasileira. Curitiba: Juruá, 2006. p. 117. 10 BAGGIO, Roberta Camineiro. Federalismo no contexto da nova ordem global: perspectivas de (re)formulação da federação brasileira. Curitiba: Juruá, 2006. p. 87. 11 LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. 3ed. São Paulo: Editora Alfa-Omega, 1976. p. 19-20.
  • 4. “[...] sobretudo um compromisso, uma troca de proveitos entre o poder público, progressivamente fortalecido, e a decadente influência social dos chefes locais, notadamente dos senhores de terras. Não é possível, pois, compreender o fenômeno sem referência à nossa estrutura agrária, que fornece a base de sustentação das manifestações de poder privado ainda tão visíveis no interior do Brasil”.12 Na contemporaneidade brasileira, em especial posteriormente à Constituição de 1988, consagrou-se um modelo que aperfeiçoa a autonomia municipal, trazendo a possibilidade de que a população esteja mais envolvida nos temas relacionados à ordem pública. Ou seja, oportunizou-se que o poder público esteja mais próximo e sensível às demandas da comunidade. Para além desta constatação pode-se dizer que quanto mais poder o Município tiver, maiores as chances de se estabelecer um Estado democrático.13 No entanto, ainda considerando a descentralização de poder para os Municípios, outro fator a ser ponderado é o território político em termos de grande diversidade regional, incluindo aí as distinções nas condições financeiras, políticas e administrativas das “entidades subnacionais” e em suas capacidades de resposta às demandas sociais. Assim, seria impensável uma descentralização uniforme, sem se levar em conta estas distinções. Este processo foi agravado de forma mais drástica pela “chuva” de novos Municípios após a Constituição Federal de 1988. Uma vez que a Constituição incentivou o processo de emancipação de inúmeros distritos e a criação também significativa de Municípios, acabou gerando grande dificuldade para o federalismo brasileiro. Considerando que se tem como umas das consequências o enfraquecimento financeiro tanto dos distritos emancipados quanto dos “municípios-mãe”. Entende-se que se tratou de estratégia de governadores almejando expandir ainda mais suas “máquinas eleitorais” satisfazendo os aliados locais, sob o manto da “total autonomia municipal”.14 Tal estratégia, como já referido, repousa suas raízes no já mencionado fenômeno do coronelismo e seus desdobramentos. Já passados diversos anos da promulgação da Constituição Federal de 1988, boa parte dos municípios brasileiros (mesmo nas regiões mais desenvolvidas) permanece sem uma efetiva estrutura financeira, institucional, política ou mesmo técnica administrativa no sentido de assumir um protagonismo na eficácia da participação e democratização das políticas públicas. Em muitos destes municípios, em especial nas regiões menos desenvolvidas, predomina a economia de base agrícola (com pouca diversidade de culturas), em crise ou estagnado e comumente necessitando de auxílio dos governos estaduais e federais.15 Não há como ignorar as profundas diferenças que marcam a realidade dos Municípios brasileiros. A falta de percepção desta disparidade fez com que igualdade trazida pela Constituição Federal entre os entes da Federação se tornasse um “mito da igualdade”. Assim, é muito diferente a realidade de Municípios como o de São Paulo, por exemplo, que conta 12 LEAL, Victor Nunes. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. 3. ed. São Paulo: Editora Alfa-Omega, 1976. p. 20. 13 Sobre o tema cf. MAGALHÃES, José Luiz Quadros. Pacto federativo. Belo Horizonte: Mandamentos, 2000; MAGALHÃES, José Luiz Quadros. O poder local no Brasil: a alternativa da democracia participativa. Revista Katálysis, Florianópolis, v. 7, n. 1, p. 85-98, jan./jun, 2004. 14 BAGGIO, Roberta Camineiro. Federalismo no contexto da nova ordem global: perspectivas de (re)formulação da federação brasileira. Curitiba: Juruá, 2006. p. 119. 15 SOUZA, Celina; CARVALHO, Inaiá MM de. Reforma do Estado, descentralização e desigualdades. Revista Lua Nova [online]. 1999, n. 48, p. 187-212. p. 203. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ln/n48/a11n48.pdf> Acesso em 08 de maio de 2013.
  • 5. com ampla infraestrutura, em comparação com grande parte dos mal estruturados municípios brasileiros. Em um país de enorme dimensão territorial e marcado por densas diferenças intra e inter-regionais e sociais, os efeitos da descentralização assumem uma tendência a grandes variações. Por esta razão, a valorização das instâncias locais não pode ter um caráter absoluto e a descentralização não pode ocorrer sem se considerar uma gama imbricada de fatores, tais como, os econômicos, políticos, demográficos e sociais que irão assumir diferentes perspectivas de transformação do setor público em cada contexto. Muitas vezes estas distinções podem prejudicar os próprios objetivos da descentralização, diminuindo as possibilidades de auxílio federal e estadual às instâncias locais, não se permitindo minimizar os efeitos dessas desigualdades.16 Em se tratando especificamente de estruturação dos órgãos ambientais, a disparidade é bastante perceptível. E mesmo municípios que contam com recursos financeiros mais vastos, como é o caso das capitais dos Estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, já tiveram seus órgão ambientais envolvidos em casos policiais onde se constatou “esquemas de venda de licenças ambientais”17 , restando clara a sua fragilidade diante das pressões exercidas pelo setor econômico. Há, portanto, um paradoxo no que concerne à questão da evidente necessidade de descentralização do poder para os demais entes federados, em especial ao poder municipal. Por um lado, a descentralização do poder ao nível local representa o fortalecimento do mesmo e a possibilidade de aproximação das esferas de decisão para o nível mais próximo à população, ou seja, para a melhor compreensão dos anseios sociais, tendo em vista a maior capacidade de percepção do que seria o “interesse local”. Por outro lado, a fragmentação do controle federal em termos de fiscalização e exercício do poder de polícia pode representar forte afronta à efetivação das normas de proteção ambiental, tendo em vista a conhecida falta de infraestrutura dos órgãos ambientais municipais e a vulnerabilidade do poder público local diante da pressão exercida pelos lobbies existentes no país, tais como o do setor imobiliário ou do agronegócio. Diante de tais considerações, a compreensão das polêmicas quanto às questões trazidas a partir da publicação da Lei Complementar n. 140/2011 em termos de descentralização política exige que se compreenda o processo de transformação vivenciado pela legislação relativa à matéria, o que será apresentado no tópico seguinte. 3. Transformações da competência municipal para licenciamento ambiental O tema da competência municipal para licenciamento ambiental mostra-se bastante controverso ao longo das últimas décadas. Em parte, isto ocorre em razão do aparato legislativo institucionalizado sobre o tema, o qual criou critérios diferenciados e confusos sobre a matéria. Além disso, no intuito de estabelecer uma gestão ambiental compartilhada entre os diversos entes federativos, este mesmo aparato legislativo acabou por criar sobreposições, omissões e divergências no que diz respeito ao exercício da competência para o licenciamento ambiental. 16 SOUZA, Celina; CARVALHO, Inaiá MM de. Reforma do Estado, descentralização e desigualdades . Revista Lua Nova [online]. 1999, n. 48, p. 187-212. p. 208-209. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ln/n48/a11n48.pdf> Acesso em 08 de maio de 2013. 17 Deflagradas pelas Operações da Polícia Federal com a designação de Moeda Verde em Florianópolis e Concutare em Porto Alegre, esta última bastante recente (abril-maio de 2013) e ainda em andamento.
  • 6. Cabe destacar que, a partir da Constituição Federal de 1988, os Municípios adquiriram um papel de destaque no estado federativo brasileiro. De acordo com Paulo Bonavides18 a autonomia municipal no contexto da Carta Constitucional de 1988 constituiu o mais considerável avanço de proteção e abrangência já recebido por esse instituto. Anteriormente a 1988, os Municípios não possuíam autonomia plena. Os interesses políticos faziam com que houvesse um controle total por parte do poder central sobre os Municípios.19 Assim, a Constituição Federal modificou este panorama, transferindo o poder político para mais perto do cidadão e transformando o Município em ente federativo dotado de autonomia. Segundo José Afonso da Silva20 , a autonomia federativa baseia-se em dois elementos básicos: existência de órgãos governamentais próprios e posse de competências exclusivas. A federalização instituída no plano constitucional teve por objetivo compatibilizar a autonomia local e a dependência do governo central, estabelecendo uma organização político- administrativa que compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. Como esses entes federativos manifestam-se sobre a mesma população e sobre o mesmo território, a matéria condizente com a repartição de competências entre as diferentes esferas governamentais constitui um dos núcleos fundamentais do Estado Federal brasileiro, estabelecendo os limites de atuação de cada um desses entes como centros de poderes autônomos.21 O equilíbrio federativo é traçado, na Constituição Federal, por meio de um sistema de repartição de competências fundado na técnica de enumeração de poderes da União, com poderes remanescentes para os Estados e poderes definidos indicativamente para os Municípios. Em regra, a repartição de competências entre as entidades federativas baseia-se no princípio da preponderância do interesse, de acordo com o qual à União competem as matérias e questões de interesse geral ou nacional, aos Estados tocam as matérias e assuntos de predominante interesse regional e aos Municípios concernem os assuntos de interesse local. Além desses campos específicos, o texto constitucional estabelece atuações comuns dos entes federativos, prerrogativas concorrentes entre União, Estados e Distrito Federal e atribuições suplementares para os Municípios.22 Na Constituição Federal de 1988, a divisão de competências entre os entes federativos foi diferenciada entre competência legislativa e competência material. Os artigos 22, 24 e 30, I, do texto constitucional, tratam da competência para legislar, ao passo que os artigos 21 e 23 apresentam as competências materiais. Nesse contexto, em matéria ambiental estabeleceu-se uma espécie de federalismo cooperativo, com a previsão de uma série de competências compartilhadas entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios a fim de garantir a tutela do meio ambiente. No que tange ao licenciamento ambiental, importa observar a competência material comum estabelecida pela Constituição Federal no artigo 23, visto que a matéria insere-se na seara do exercício do poder de polícia. Assim, o artigo 23 da Constituição Federal atribuiu competência comum a todos os entes federados, ou seja, União, Estados membros, Distrito Federal e Municípios. 18 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 1996. p. 311. 19 ALBERGARIA, Bruno Direito Ambiental e a responsabilidade civil das empresas. Belo Horizonte: Fórum, 2005. p. 67. 20 SILVA, José Afonso. Direito Ambiental Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2009. p. 71. 21 FERREIRA, Heline Sivini. Competências Ambientais. IN: CANOTILHO, José Joaquim Gomes. LEITE, José Rubens Morato. (org.) Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 204. 22 FERREIRA, Heline Sivini. Competências Ambientais. IN: CANOTILHO, José Joaquim Gomes. LEITE, José Rubens Morato. (org.) Direito Constitucional Ambiental Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 204.
  • 7. Em relação à matéria ambiental, o referido artigo dispõe que se trata de competência comum: proteger os documentos, as obras e outros bens de valor histórico, artístico e cultural, os monumentos, as paisagens naturais notáveis e os sítios arqueológicos (III); impedir a destruição e a descaracterização de obras de arte e de outros bens de valor histórico, artístico ou cultural (IV); proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas (VI); preservar as florestas a fauna e a flora (VII). O parágrafo único deste mesmo artigo, conforme redação dada pela Emenda Constitucional n. 53/06, prevê que cabe à lei complementar fixar normas para a cooperação entre os entes federativos, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional. Neste sentido, a Lei Complementar n. 140/11 veio a completar lacuna importante em matéria de competências ambientais. Contudo, deve-se destacar que anteriormente à Lei Complementar n. 140/11, a matéria já era discutida considerando os termos da Lei n. 6.938/81 e da Resolução 237/97 do CONAMA, sendo pautada por inúmeros conflitos. Na estrutura criada pela Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81) a competência para licenciar foi atribuída à União, aos Estados e ao Distrito Federal. De acordo com o artigo 10 da Lei n. 6.938/81, o órgão competente para o licenciamento ambiental é o órgão estadual do SISNAMA, sendo a competência do IBAMA para o licenciamento de caráter supletivo na maioria dos casos. Foi, porém, determinada competência originária do IBAMA para o caso de atividades e obras com significativo impacto ambiental, de âmbito nacional ou regional. Constata-se, assim, que o critério para a repartição de competência administrativa licenciatória estabelecido pela Lei n. 6.938/81 caracteriza-se por uma concentração de atribuições aos órgãos estaduais de meio ambiente, que por vezes não conseguem cumprir a enorme demanda de licenciamentos, bem como pela não-inclusão dos Municípios na condição de responsáveis pelo licenciamento ambiental.23 Em parte esta situação justifica-se pela situação política do Estado brasileiro a época da Lei n. 6.938/81, a qual não reconhecia plena autonomia aos municípios. Esta situação modifica-se com a Constituição Federal de 1988, como já referido acima. Porém, a forma de cooperação entre os entes federativos carecia de regulamentação por meio de Lei Complementar. Diante das inúmeras controvérsias, em especial quanto ao licenciamento ambiental, em 1997 o Conselho Nacional do Meio Ambiente editou a Resolução n. 237/97. A Resolução n. 237/97 do CONAMA, por sua vez, estabelecia regime diverso da Lei n. 6.938/81, prevendo uma repartição de competências para o licenciamento baseado predominantemente na extensão territorial dos impactos ambientais. Segundo a Resolução, compete ao IBAMA o licenciamento de atividades ou empreendimentos com significativo impacto ambiental de âmbito nacional ou regional (art. 4º). Ao órgão estadual estabeleceu a competência para o licenciamento de atividades cujos impactos ambientais possam ultrapassar os limites de um Município. E, por fim, ao órgão ambiental municipal previu competência para o licenciamento ambiental de empreendimentos e atividades de impacto ambiental local. Logo, nos termos na Resolução, o critério para identificação do órgão ambiental competente para o licenciamento ambiental seria o da abrangência do impacto. Entretanto, este não era o único critério utilizado pela Resolução 237/97, visto que, por vezes, a mesma ainda atribuía o exercício da competência para licenciamento ambiental a partir do critério da dominialidade do bem, por exemplo, no que tange às unidades de 23 FARIAS, Talden. Licenciamento ambiental: aspectos teóricos e práticos. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 130.
  • 8. conservação do domínio da União. Também estipulava o critério geográfico ao dispor que é competência do IBAMA o licenciamento de empreendimentos e atividades localizados no mar territorial ou na plataforma continental. E, ainda, estabelecia o critério da segurança nacional ao prever a competência da União para o licenciamento de atividades que envolvam energia nuclear ou empreendimentos militares. A Resolução 237/97 foi bastante criticada por se entender que, nestes pontos, o texto distancia-se do critério constitucional da preponderância do interesse vinculado à influência direta do impacto ambiental, colidindo com a autonomia dos estes federativos.24 Por outro lado, a referida Resolução teria inovado ao estabelecer o licenciamento ambiental municipal e ao prever que o licenciamento deveria ser feito em um único nível de competência. Desse modo, verifica-se que o licenciamento ambiental municipal restou expresso nos termos da Resolução n. 237/97, no artigo 6º, o qual estipulava que compete ao órgão ambiental municipal o licenciamento ambiental de empreendimento e atividades de impacto ambiental local. Considera-se impacto ambiental local qualquer alteração direta (ou seja, decorrente de uma única relação de causa e efeito) das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, que afetem a saúde, a segurança e o bem-estar da população, as atividades sociais e econômicas, a biota, as condições estéticas e sanitárias do meio ambiente e/ou a qualidade dos recursos ambientais, dentro dos limites do Município.25 Não obstante, embora a Resolução 237/97 tenha buscado estabelecer critérios para dividir os encargos do licenciamento, evitando sobreposições ou omissões decorrentes da ausência da previsão de competências, em especial para os municípios, havia um grande número de críticas doutrinárias quanto à sua constitucionalidade, o que gerava incertezas e possíveis conflitos judiciais em razão da competência do órgão ambiental licenciador.26 Quanto ao tema Patrícia Silveira da Rosa informa que o fato da atribuição de competência ter sido instituída por uma resolução, somado à ausência da Lei Complementar, prevista no parágrafo único do artigo 23 da Constituição Federal, trouxe insegurança à Administração Pública, decorrente de interpretações formais, aliada à recusa da perda de poder pelos órgãos estaduais, justificáveis, em inúmeros casos, por notórias deficiências materiais e humanas dos órgãos municipais. “A extensão do problema da falta de solução para o impasse surgido dessas incertezas acarreta graves conseqüências, em níveis que suplantam o estritamente ambiental, contagiando o econômico. Incertezas quanto à competência executiva em matéria ambiental impedem a fluidez e a racionalidade na gestão do meio ambiente, dificultando a cooperação e a divisão de poderes verdadeiramente federativa, além de contribuir para a informalidade”.27 Com o objetivo de sanar a insegurança jurídica em relação à matéria, em 2001, o Ministério do Meio Ambiente instituiu uma Comissão Tripartite Nacional a fim de que esta buscasse definir as competências ambientais. No ano de 2003, esta Comissão Tripartite Nacional iniciou seus trabalhos e sua primeira meta foi construir um projeto de lei envolvendo os três entes. Este trabalho foi finalizado em 2005 e recepcionado pelo Congresso Nacional 24 FINK, Daniel Roberto. ALONSO JUNIOR, Hamilton. DAWALIBI, Marcelo. Aspectos jurídicos do licenciamento ambiental. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2002. p. 50. 25 BARROS, Wellington Pacheco. Curso de Direito Ambiental. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 196. 26 MARCHESAN, Ana Maria Moreira. STEIGLEDER, Annelise Monteiro. CAPPELI, Sílvia. Direito Ambiental. Porto Alegre: Verbo Jurídico, 2010. p. 108. 27 ROSA, Patrícia Silveira da. Licenciamento Ambiental à luz da Teoria dos Sistemas Autopoiéticos. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. p. 120.
  • 9. por meio do Deputado Federal Sarney Filho, que era o signatário do projeto original sobre o tema.28 Este projeto tinha como objetivos: estabelecer a cooperação entre União, Estados e Municípios; atuação descentralizada, democrática e eficiente; garantir o equilíbrio do desenvolvimento socioeconômico com a proteção do meio ambiente e a harmonização de políticas e ações administrativas para se evitar a sobreposição de atuação entre os entes federativos; e a garantia de uniformidade da política ambiental nacional, respeitadas as peculiaridades regionais e locais.29 O projeto inicial, porém, foi totalmente desfigurado pela bancada ruralista e pelo empresariado por meio de diversas emendas e, ao final, relatado no Senado pela senadora Kátia Abreu.30 Em 2005, o Ministério do Meio Ambiente começou a disseminar no país a implantação das Comissões Tripartites Estaduais, sendo que, até o ano de 2011, as referidas comissões haviam sido implantadas em aproximadamente vinte e dois Estados da Federação. Na maioria das Comissões Tripartites Estaduais destacaram-se as discussões sobre as competências de cada ente federativo. No intuito de capacitar os entes federados, especialmente Estados e Municípios, desde o final de 2005 até 2010, o Ministério do Meio Ambiente instituiu e apoiou o Plano Nacional de Capacitação de Gestores do SISNAMA – PNC. Este Plano visava preparar, principalmente os gestores municipais para que estivessem tecnicamente capacitados a assumirem o licenciamento ambiental das atividades de impacto local. Infelizmente, o programa deixou de ser uma prioridade e caiu no esquecimento, mas o mesmo capacitou em 17 Estados brasileiros aproximadamente 6.000 gestores.31 Por fim, em 2009, a Lei Complementar n. 140/11 foi aprovada na Câmara Federal e, em 2011, no Senado Federal. Em 09 de dezembro de 2011 a Presidente da República sancionou seu texto. Como relatado anteriormente, o advento da referida Lei Complementar trouxe alguma esperança no sentido de que os impasses em torno da competência ambiental para licenciar pudessem ser definitivamente resolvidos. Em relação à competência municipal para o licenciamento ambiental, a Lei Complementar efetivamente reconhece o licenciamento ambiental por parte dos Municípios ao prever, no artigo 9º, inciso XIV, a competência para promover o licenciamento ambiental de atividades ou empreendimentos que: a) causem ou possam causar impacto ambiental de âmbito local, conforme tipologia definida pelos respectivos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente, considerados os critérios de porte, potencial poluidor e natureza da atividade; ou b) localizados em unidades de conservação instituídas pelo Município, exceto em Áreas de Proteção Ambiental (APAs). 4. Lei Complementar n. 140/11: o “federalismo competitivo” e as perspectivas do licenciamento ambiental municipal Retomando a ideia de descentralização no federalismo brasileiro, verifica-se que a Lei Complementar n. 140/11, ao estipular as competências de cada ente federativo no que tange à proteção ambiental, destacou a participação dos Municípios, com ênfase ao 28 CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS. Nota Técnica nº. 005/2012. Brasília, 20 de março de 2012. Disponível em: <http://www.cnm.org.br> Acesso em 04 de maio de 2013. 29 SOUZA, José Fernando Vidal de. ZUBEN, Erika Von. O Licenciamento Ambiental e a Lei Complementar nº. 140/2011. IN: Cadernos de Direito, Piracicaba, v. 12(23): 11-44, jul.-dez. 2012. Disponível em: <https://www.metodista.br/revistas/revistas-unimep/index.php/.../1022> Acesso em 04 de maio de 2013. 30 SOUZA, José Fernando Vidal de. ZUBEN, Erika Von. O Licenciamento Ambiental e a Lei Complementar nº. 140/2011. IN: Cadernos de Direito, Piracicaba, v. 12(23): 11-44, jul.-dez. 2012. Disponível em: <https://www.metodista.br/revistas/revistas-unimep/index.php/.../1022> Acesso em 04 de maio de 2013. 31 CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS. Nota Técnica nº. 005/2012. Brasília, 20 de março de 2012. Disponível em:<http:// www.cnm.org.br> Acesso em 04 de maio de 2013.
  • 10. licenciamento de empreendimentos de impacto local, os quais passam a ser de competência do Município. De fato, a Lei em comento cria a possibilidade de que os Estados (e também o Distrito Federal), além dos Municípios, possuam irrestrita autonomia acerca da decisão sobre a gestão ambiental. Constata-se que a Lei Complementar nº 140/11 acabou por descentralizar o processo regulamentar das competências da União, Estados e Municípios no que se refere à proteção ambiental. Tal conjuntura foi desenhada com o objetivo de permitir uma maior agilidade na análise dos procedimentos de licenciamento ambiental, visto que no contexto da Resolução 237/97 do CONAMA os Estados ficaram como o principal ente responsável pelo licenciamento ambiental. Assim, o compartilhamento dessa competência com os Municípios permitiria uma maior rapidez na análise dos processos, bem como solucionaria os conflitos de competência que eram suscitados até então em virtude da sobreposição de atribuições colocada pela referida Resolução. Destaca-se, ainda, que o licenciamento ambiental por parte dos Municípios na referida Resolução mostrava-se vaga e não detalhava o procedimento a ser cumprido pelos órgãos ambientais municipais. Isso gerava insegurança jurídica no exercício dessas funções. No entanto, se de um lado compreende-se a necessidade de maior clareza na delimitação das competências para licenciamento ambiental, no intuito de evitar incertezas tanto para Administração Pública, quanto para o empreendedor, por outro lado entende-se que esta mudança pode afetar a proteção do meio ambiente de forma significativa. Nesse sentido, recorda-se o paradoxo apresentado no primeiro tópico deste artigo em relação à descentralização do poder. No caso do licenciamento ambiental, a descentralização desta competência, embora fortaleça os entes municipais e torne as decisões mais próximas da realidade local, também fragmenta o do controle federal o que, aliada à falta de estrutura dos órgãos municipais, pode deixar as decisões ambientais à mercê dos interesses econômicos e políticos. A afirmação de que esta pulverização de competências pode significar um fortalecimento do federalismo deve considerar, porém, que no contexto brasileiro isso igualmente implica na possibilidade de tornar o sistema mais permissivo em relação a empreendimentos de impactos ambientais consideráveis, em razão da ausência de pessoal técnico capacitado para o acompanhamento dos procedimentos de licenciamento e concessão de licenças. Além disso, esta vulnerabilidade dos órgãos locais pode facilitar a criação de “balcões de negócios” e convites à corrupção.32 Traçando um paralelo com a análise feita acerca da recorrente preponderância dos interesses privados no âmbito do poder local, haja vista o histórico fenômeno do coronelismo, pode-se depreender que uma das intenções da Lei Complementar n. 140/11 é a de diluir e transferir responsabilidades para os entes federativos menos capacitados tecnicamente, eventualmente facilitando a aprovação de empreendimentos a nível local. A título exemplificativo e, como já referido anteriormente, há fortes disparidades entre os 5.570 Municípios brasileiro. Dentre estes, enquanto São Paulo conta com cerca de 11 milhões de habitantes, outros possuem menos de mil habitantes. No que tange à extensão territorial, alguns tem área maior do que determinados países europeus, como é o caso do Município de Altamira, no Estado do Pará (cuja extensão é quase duas vezes maior do que a de Portugal), 32 SOUZA, José Fernando Vidal de. ZUBEN, Erika Von. O Licenciamento Ambiental e a Lei Complementar n. 140/2011. IN: Cadernos de Direito, Piracicaba, v. 12(23): 11-44, jul.-dez. 2012. Disponível em: <https://www.metodista.br/revistas/revistas-unimep/index.php/.../1022> Acesso em 04 de maio de 2013.
  • 11. de outro lado existem Municípios com menos de 4 km. Desse modo, o estabelecimento de uma regra geral sem levar em consideração essa disparidade tende a manter a histórica ineficácia da proteção ambiental no Brasil. Por outro lado, a Lei Complementar n. 140/11 em seu art. 4º instituiu instrumentos de cooperação em matéria ambiental, tais como consórcios públicos, convênios e acordos de cooperação técnica. Esta matéria era importante para o reconhecimento de praxes comuns no âmbito de diversos Estados que já haviam regulamentado o licenciamento ambiental municipal via convênio entre o órgão estadual e os Municípios, desde que preenchidas determinadas exigências estabelecidas em Resoluções dos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente. No que diz respeito aos convênios, estes já de longa data vinham representando o principal instrumento colaborativo entre União, Estados e Municípios, muito embora os inúmeros problemas a eles relacionados ainda não tivessem sido enfrentados de forma clara pela doutrina. Os convênios eram negociados caso a caso entre as prefeituras e o Estado ou União e, não raras vezes, previam apoio técnico e financeiro para aqueles municípios que não dispõem do suporte suficiente para a execução das atribuições.33 Em que pese o reconhecimento desses instrumentos pela Lei Complementar n. 140/11, não há previsão expressa quanto à necessidade de submissão dos Municípios aos Estados ou à União para o exercício da competência para licenciamento ambiental quanto a empreendimentos de impacto local, não se exigindo qualquer delegação, habilitação e/ou qualificação para o exercício do direito de licenciar, tão somente estar tecnicamente capacitado. Nesse sentido, a leitura combinada do artigo 15, com o artigo 5º, parágrafo único, da Lei Complementar n. 140/11 permite afirmar que, para o exercício do direito de licenciar as atividades e empreendimentos de impacto local, os Municípios deverão apresentar órgão ambiental capacitado. Segundo os termos da lei, órgão ambiental capacitado é aquele que possui técnicos próprios ou em consórcio, devidamente habilitados e em número compatível com a demanda das ações administrativas a serem efetuadas. Nota-se, dessa maneira, que embora a lei tenha previsto alguma exigência, o dispositivo é vago e impreciso, podendo gerar número considerável de discussões sobre as características deste órgão ambiental municipal. Não se mostra demasiado considerar que, na estruturação da Administração Pública brasileira é comum a utilização de critérios subjetivos para a determinação de como será feita a distribuição de cargos e a escolha das pessoas. Krell34 afirma que a dimensão da máquina burocrática municipal é definida mais preponderantemente por fatores externos, tais como o clientelismo e o nepotismo, em detrimento das necessidades internas de uma administração eficaz. Além de tais aspectos, importa salientar que a Lei Complementar n. 140/11 determinou, ainda, no artigo 17, que a competência para a fiscalização ambiental dos 33 KRELL, Andreas J. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental: o controle dos conceitos jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 94-95. 34 KRELL, Andreas J. Discricionariedade Administrativa e Proteção Ambiental: o controle dos conceitos jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 92.
  • 12. empreendimentos está atrelada ao órgão licenciador, embora permaneça a possibilidade de atuação supletiva de outros entes federados no exercício do poder de polícia. Não obstante, a Lei determina que no caso de autuação por mais de um órgão ambiental o auto de infração lavrado pelo órgão ambiental licenciador prevalecerá. Desse modo, se o licenciamento é realizado pelo Município, a princípio este também será competente para a fiscalização, o que torna a proteção ambiental em âmbito local ainda mais sujeita às pressões econômicas e políticas atuantes sobre o poder público municipal. Observa-se que as Administrações Municipais não têm colaborado de forma muito efetiva junto aos órgãos ambientais dos demais entes, tendo em vista que uma cooperação administrativa das três esferas visaria maior proteção ambiental. Contudo, o que se verifica é um federalismo ambiental competitivo entre os diversos entes federativos, no qual prevalecem os interesses do jogo político, já anteriormente referido. De fato, os Municípios apresentam papel relevante como agentes primários e principais na proteção ambiental, porém, como se buscou debater, na forma estabelecida pela Lei Complementar n. 140/11, a ausência de critérios a serem preenchidos pelos Municípios para o exercício da atividade licenciatória poderá fragilizar a proteção ambiental. De outra parte, a descentralização quanto o licenciamento ambiental promovida pela Lei Complementar n. 140/11exigirá investimentos, métodos, recursos humanos, ferramentas de gestão e de tecnologia da informação que possam acarretar o fortalecimento estrutural da gestão ambiental nos Municípios.35 Anteriormente às competências específicas para o licenciamento ambiental municipal, acredita-se que os entes municipais deveriam estar preocupados em coordenar ações e desenvolver sistemas de cooperação mais eficazes, bem como atuar junto à população local no intuito de evitar a degradação ambiental por meio de políticas públicas e educação ambiental. 5. Conclusões Articuladas 5.1 A Constituição Federal de 1988 buscou estabelecer um federalismo cooperativo. No entanto, o que de fato se constata é a existência um federalismo competitivo, que repousa suas raízes históricas no fenômeno do coronelismo, comprometendo uma das características mais relevantes desse sistema, qual seja, a descentralização política. 5.2 A Lei Complementar n. 140/11 tenta sanar as lacunas e controvérsias acerca da competência para o licenciamento ambiental municipal. Contudo, ao mesmo tempo em que fortalece a autonomia dos Municípios, coloca em risco a proteção ambiental em face da fragilidade estrutural dos órgãos ambientais municipais brasileiros. 5.3 A Lei Complementar n. 140/11, apesar de criar instrumentos de cooperação (art. 4º) entre os entes federativos em matéria ambiental, não os exige para que os Municípios exerçam competência para licenciamento ambiental de empreendimentos ou atividades de impacto local, ficando as exigências restritas à previsão do artigo 5º, parágrafo único. 5.4 A leitura combinada do artigo 15 com o artigo 5º, parágrafo único, da Lei Complementar n. 140/11 permite afirmar que, para o exercício do direito de licenciar as atividades e 35 GUERRA, Sidney. O licenciamento ambiental de acordo com a LC 140/2011, Revista de Direito Ambiental, Ano 17. n. 66, p. 151-179, São Paulo, Abril/Junho 2012. p. 177.
  • 13. empreendimentos de impacto local, os Municípios deverão apresentar órgão ambiental capacitado, porém, o dispositivo é vago e impreciso. 5.5 O artigo 17 da Lei Complementar nº 140/11 ao estabelecer que o ente licenciador deverá ser o responsável pela fiscalização, torna a proteção ambiental em âmbito local ainda mais sujeita às pressões econômicas e políticas atuantes sobre o poder público municipal.