SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 22
Baixar para ler offline
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB
       DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS XIV
             LICENCIATURA EM HISTÓRIA



               Ariene Pinto Góes Matos




  “QUE A JUSTIÇA DE ÁGUA FRIA TE CONDENE”.
O JULGAMENTO DE UM SANTO NO SERTÃO BAIANO




                  Conceição do Coité
                  Fevereiro de 2010
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS XIV
      LICENCIATURA EM HISTÓRIA




          Ariene Pinto Góes Matos




    “QUE A JUSTIÇA DE ÁGUA FRIA TE CONDENE”.
  O JULGAMENTO DE UM SANTO NO SERTÃO BAIANO




                          Trabalho de conclusão de curso
                          apresentado ao curso de Licenciatura em
                          História para obtenção do título de
                          licenciada, sob a orientação da Professora
                          Suzana Severs.




                 Conceição do Coité
                  Fevereiro de 2010
Resumo


Este artigo conta a história do julgamento e condenação da imagem de Santo Antônio das
Queimadas a qual foi responsabilizada por um assassinato na região de Queimadas em razão
de ter recebido toda a herança de uma devota, proprietária desta imagem e, dentre ela estar um
escravo, autor do crime. A legislação de final do século XVIII e início do XIX, quando este
episódio parece se desenvolver, atribui responsabilidade de crimes cometidos por escravos a
seus donos. Sendo assim, a imagem do santo foi obrigada a pagar por um crime e condenado à
perda dos seus bens para custear as despesas do processo. Por ausência de comprovação do
julgamento, esta história faz parte do imaginário coletivo de Queimadas sendo responsável,
algumas vezes, pelos infortúnios que ocorrem no município. E é este aspecto que apuramos
neste trabalho.


Palavras-chave: Religiosidade popular; Santo Antônio; Imaginário, Sertão baiano




           Introdução


           Este é um trabalho de cunho descritivo que se preocupou em levantar informações
para contar a história do julgamento civil de Santo Antônio em Queimadas, Bahia, ocorrido
em data incerta, entre o final do século XVIII ou o início do século XIX.
           Queimadas, cidade do sertão baiano, foi palco de um episódio curioso. O juiz da
comarca de Água Fria teria submetido à imagem de Santo Antônio das Queimadas a um
julgamento civil, para responder por um crime cometido por um dos seus escravos, baseado
na lei imperial que responsabilizava o senhor de escravos por quaisquer delitos e danos
causados por eles. Santo Antônio era dono de terras, gados e escravos que lhes tinham sido
doado por Dona Maria Isabel Guedes de Brito. Depois do julgamento a imagem desapareceu
sem deixar vestígios, o mesmo aconteceu com o processo criminal.
           Como foi impossível encontrar o processo do julgamento, história que contamos
no corpo deste artigo, optamos por levantar a história do julgamento no imaginário da
população, nos dias de hoje. Posto que encontramos em algumas falas a idéia de regresso e
decadência da cidade ligado a este fato.
Para ajudar em nossa reflexão utilizamos como referencial teórico Jean-Jacques
Wunenburger sobre imaginário e os escritos sobre religiosidade de Luiz Mott.
Metodologicamente, para dar conta da pesquisa tão fragmentada, lançamos mão das
entrevistas nos moldes da história oral proposta por José Carlos Sebe Bom Meihy, ainda que
não classifiquemos este artigo como um trabalho de história oral propriamente dito,
utilizamos as entrevistas apenas como um recurso complementar dos textos mais estruturados.
Optamos por não identificar as pessoas entrevistadas para preservar a sua identidade.


1-      Santo Antônio no Brasil
                                                                   Por arte de umas leis ou do Demônio
                                                                   levaram a imagem para os tribunais,
                                                                   condenaram no júri a Santo Antônio
                                                                   que ali mesmo perdeu os cabedais.

                                                                   Perdeu tudo o que tinha de uma vez:
                                                                   terras, escravos, roças e boiadas
                                                                   deixaram pobre o insigne português.

                                                                   O caso fez escândalo no céu,
                                                                   porque foi Santo Antônio das Queimadas
                                                                   o único santo que também foi réu...

                                                                                           Nonato Marques


             Um dos traços marcantes da espiritualidade dos católicos sempre foi à devoção
aos santos, tendo uma relação de adulação e rituais. Os santos têm um papel essencial na vida
religiosa, tanto para resolver problemas mundanos quanto espirituais. Os católicos se valem
de promessas e novenas aos santos a fim de realizar seus pedidos como um mercado de troca.
            A concepção de Santo é explicitada por Luiz Mott quando diz que:


                           Santo é que se adula... diz um ditado antigo repetido na Bahia de todos os
                           Santos. De fato, na religiosidade popular do Brasil de antanho, a intimidade
                           dos devotos vis-à-vis certos santos e oragos percorria um continuum de
                           amor e ódio, que incluía louvores, adulação, rituais propiciatórios,
                           intimidação e até agressão física explicita. 1

            Dentro do rol dos santos o lusitano Santo Antônio é o campeão da devoção
popular. Dedicou toda a sua vida aos ensinamentos de Deus, conhecedor e praticante dos




1
 MOTT, Luiz. Cotidiano e vivência religiosa: entre a capela e o calundu. In: SOUZA. Laura de Melo;
NOVAIS. Fernando (orgs). História da Vida Privada no Brasil. p.184.
ensinamentos da Bíblia Sagrada recebeu o título de Doutor da Igreja 2. Um grande pregador
dos evangelhos e apoiado por uma popularidade que sempre crescia de época em época, Santo
Antonio foi canonizado em apenas um ano após a sua morte (1232).
             Santo Antônio é conhecido como Santo Antônio de Lisboa e também como Santo
Antonio de Pádua, em razão de ser o patrono de Portugal, por ter nascido na capital, Lisboa
(1195), e de Pádua (Itália), porque foi lá que passou dez anos evangelizando até sua morte, 13
de junho de 1231, data que se tornou celebrativa de sua memória e devoção. Desde então a
cada 13 de junho, fiéis o celebram com trezenas e procissões lembrando seus feitos em vida e
também os milagres realizados por ele depois de sua morte.
             Santo Antônio foi uns dos santos trazidos para o Brasil pelos portugueses, os quais
eram devotos fervorosos do santo franciscano, tinham um culto com sentido patriótico. Eles
determinaram Santo Antônio como o padroeiro da Bahia, sendo que ele já era patrono de
Portugal.
             Existem no Brasil diversas cidades que têm igrejas ou capelas consagradas a este
santo. E muitas igrejas que não são consagradas, possuem sua imagem em um dos altares
laterais. Além disso, muitos devotos têm em sua própria casa a imagem de Santo Antônio,
expressando a influência portuguesa aos brasileiros na veneração ao santo franciscano.
             Na religiosidade popular brasileira Santo Antônio foi e continua sendo um dos
santos mais requisitado pelos fiéis. Ele é bastante procurado para resolver problemas
conjugais - o “santo casamenteiro”. Mas nem sempre foi assim, na época colonial ele era
procurado para solucionar diversos problemas dos seus devotos, desde a cura de uma doença a
achar coisas perdidas e principalmente ele era solicitado como um colaborador dos senhores
na captura de negros fujões.
              Várias torturas eram aplicadas a Santo Antônio pelos fiéis - colocar pedra sobre
sua imagem, retirar o menino Jesus de seus braços, colocá-lo de cabeça pra baixo, arrancar-
lhe o esplendor - com o objetivo de realizar seus pedidos, desde a intercessões em
aproximações amorosas e enlaces conjugais, como hoje ainda acontece e também para
recuperar os escravos fugitivos e encontrar coisas perdidas.
              Em um registro do século XIX, de Thomas Ewbank, viajante inglês há o relato de
uma senhora que confessa que sua mãe realizava torturas a Santo Antônio a fim de localizar

2
  Na Igreja Católica, Doutor e Doutora da Igreja , são homens e mulheres cujos pensamentos, pregações, escritos
e forma de vida enalteceram o cristianismo.Todos eles foram considerados modelos de santidade e que
contribuiram de alguma forma original (e ortodoxa) para a doutrina e espiritualidade cristã, tendo sido o título
reconhecido quer por um Papa, quer por um concílio ecuménico (embora nenhum concílio tenha jamais exercido
essa prerrogativa); trata-se de uma honra rara (a Igreja conta apenas 33 doctores ecclesiæ entre os seus múltiplos
santos), atribuída apenas a título póstumo e após a canonização.
seu escravo fugido. Dando várias receitas de como castigá-lo para alcançar suas solicitações,
as quais foram ensinadas por sua própria mãe. Ela afirmava que, ao torturar a imagem,
acelerava o atendimento do pedido e que o santo, por ter desejado em vida o sacramento do
martírio, não se importaria3.
            Padre Antônio Vieira, que foi um grande admirador de Santo Antônio, a quem
dedicou inúmeros sermões e proclamava-o Santo Universal, afirmava que a prática desses
maus tratos ao santo podia ser interpretada como uma dívida, um condicionamento do santo
ao cumprimento do pedido. 4
             Na mentalidade dos fiéis estas práticas eram normais, apenas uma forma de
alcançar os seus pedidos com mais rapidez e eficácia. Apesar de toda tortura, existe o respeito
e a veneração.




            1.1 A patente de Santo Antônio


             Durante o período colonial no Brasil a imagem de Santo Antônio recebeu diversos
títulos da graduação militar, sendo promovido a patente de capitão em várias cidades, recebeu
o título de tenente-coronel do próprio D. João VI quando ainda era príncipe regente, em 1814,
os soldos referentes ao título militar era recebido pelos responsáveis das igrejas da cidade as
quais o santo era homenageado.


                          No período do Brasil Colônia, pela carta-régia de 07 de abril de 1707, o governo
                          português facultou praça de Capitão, com o respectivo soldo, à Imagem do Santo
                          Antônio do Convento de São Francisco da Bahia. Em 21 de março de 1711,
                          confirma no posto de capitão à Imagem do Santo Antônio do Rio de Janeiro; a de
                          Goiás, em 19 de novembro de 1750 com o soldo de 480 mil reis anuais; em 22 de
                          fevereiro de 1784, é dado o posto de capitão à Imagem do Santo Antônio de Ouro
                          Preto. Por decreto de 13 de setembro de 1810, D. João VI eleva o glorioso Santo,
                          venerado aqui em nossa Cidade do Salvador, ao posto de Major de Infantaria,
                          percebendo o soldo desta patente; promovido a Tenente-coronel com o respectivo
                                   5
                          soldo...




3
  MOTT, Luiz. Cotidiano e vivência religiosa: entre a capela e o calundu. In: SOUZA. Laura de Melo; NOVAIS.
Fernando (orgs). História da Vida Privada no Brasil. p.187.
4
  Idem, p.187
5
  Jornal A Tarde de 13 de Junho de 1970. Santo Antônio – Coronel
Um artigo publicado na Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia 6
transcreve a carta de patente de Tenente-coronel feita por D, João em 1814.

                            Faço saber aos que esta minha carta patente virem que sendo da minha particular
                            devoção o glorioso Santo Antônio, a quem o povo desta corte incessantemente e
                            com a maior fé dedica os seus votos; e tendo o céu abençoado os esforços dos meus
                            exércitos com a paz que se dignou conceder a monarquia portuguesa, crendo eu
                            piamente que a eficaz intercessão do mesmo santo tem concorrido para tão felizes
                            resultados: Hei por bem elevai-o ao posto de Tenente-Coronel de infantaria e com
                            ele haverá o respectivo soldo...


             Estes títulos foram dados à imagem de Santo Antônio como forma de pagamento
pela proteção dada durante batalhas e invasões de povos inimigos. O governador da capitania
de Pernambuco concede o título de Praça a Santo Antônio antes de sair para Guerra dos
Palmares.

                            O governador desta capitania, João do Souto Maior, por portaria datada de 13 de
                            Setembro de 1685, mandou abrir assento de Praça a Santo Antônio, afim de seguir a
                            sua viagem para a guerra dos palmares e proteger as armas reais na conquista desse
                            quilombo; e ao mesmo tempo expediu as necessárias ordens, para que se pagasse ao
                            sindico do convento de Olinda o soldo e importância do fardamento que lhe
                                        7
                            competiam.


             Com toda esta veneração, encontramos Santo Antônio em Queimadas, terra do
sertão baiano, como herdeiro de uma fazenda, gados e escravos. Herança esta que lhe rendeu
um processo na justiça como veremos adiante.


             2- Santo Antônio no banco dos réus

                    2.1 As Terras de Guedes de Brito


             No início do século XVI, Portugal instituiu doações de terras com o objetivo de
povoar as regiões em que viviam populações indígenas e as terras que eram sempre
ameaçadas por invasores estrangeiros.


                            No início do século XVI, quando Portugal, no reinado de D. João III, estabeleceu
                            concessões de terras com o fim de povoamento em vastas regiões, nas quais viviam
                            populações indígenas e cujas terras eram ameaçadas constantemente por invasores
                            estrangeiros, no caso, os holandeses. Através desse processo de ocupação territorial
                            os capitães donatários recebiam gratuitamente 50 léguas de costa, tornando-se reais
                            proprietários de apenas 20% das terras. Os outros 80% deveriam ser distribuídas

6
  Revista Trimestral do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. Ano VI, Vol. VI, n. 21. Setembro de 1899.
Variedade Histórica: A patente de Santo Antônio. P. 469-472
7
  Idem; p 470
sem qualquer ônus, a título de sesmaria, cujos sesmeiros se obrigavam a cultivá-las
                                                             8
                           num prazo máximo de cinco anos.



             Através desse processo de ocupação territorial, as terras mais afastadas do litoral
eram doadas a títulos de sesmaria. Tais concessões deram origem à formação de grandes
latifúndios como é o caso dos Guedes de Brito.
             O vasto império dos Guedes de Brito foi iniciado por Antônio de Brito Correa e
sua esposa Maria Guedes, e teve continuidade pelo herdeiro da família, Antônio Guedes de
Brito9. A vasta extensão territorial do patrimônio dos Guedes de Brito percorria a distância
entre Morro do Chapéu, Ba. até Ouro Preto, Mg, isso significava 1.333 km de terras.
             Antônio Guedes de Brito anexou essas terras a outras que herdara dos pais e tios
no norte da Capitania da Bahia formando o segundo maior latifúndio da América portuguesa,
superado apenas pelos D‟ávila, da Casa da Torre, cujos domínios estendiam-se por áreas
atualmente sob jurisdição de várias unidades da federação, desde a Bahia até ao Maranhão.


                            A leitura realizada no documento também mostra a grandiosidade das posses
                            territoriais que os Guedes de Brito amealharam durante o período colonial seja por
                            via familiar (herança), seja por ocupação forçada. A incorporação de outras
                            sesmarias ao patrimônio Guedes de Brito deu-se também mediante serviços
                            prestados à Coroa por esta família ajudando na defesa da Colônia e através do
                            acolhimento que dava às tropas portuguesas em suas terras, Em conseqüência
                            desses relevantes serviços, foi concedido a Antonio de Brito Correa e depois legado
                                                                                                   10
                            ao seu filho - Antonio Guedes de Brito - o título de Mestre-de–Campo.


             Em 1676 a Coroa portuguesa designou o desembargador Sebastião Cardoso
Sampaio para fiscalizar a situação das sesmarias que até aquela data haviam sido concedidas.
Todos os sesmeiros fizeram declaração das suas terras com provas dos respectivos títulos.
Dentre estes declarantes estava Antônio Guedes de Brito, cuja declaração de bens foi
publicada na integra na Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia 11




8
   NEVES, Erivaldo Fagundes. Da Sesmaria ao Minifúndio (um estudo de história regional e local). Apud
VASCONCELOS, Suani de Almeida. Carta de Sesmaria- Seculo XIX: Edição Semidiplomática e Estudo
Histórico. www.filologia.org.br/.../Carta_de_Sesmaria_–_Século_XIX
9
   O qual se transformou em um dos homens mais importantes da Bahia seiscentista, conquistando também vários
títulos como: Mestre de campo, Fidalgo de Sua Majestade, Provedor da Santa Casa de Misericórdia (1663) e
Capitão de infantaria, por carta patente de 26 de fevereiro de 1667.
10
    VASCONCELOS, Suani de Almeida. Carta de Sesmaria- Seculo XIX: Edição Semidiplomática e Estudo
Histórico. www.filologia.org.br/.../Carta_de_Sesmaria_–_Século_XIX_
11
   Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, 1916. Ano XXIII, Vol. XI n.42. As Terras de Guedes de
Brito, p. 69-74
„As fazendas de Curráes de gados nos districtos dório Real, possuo por título de
                            herança de meu pai Antonio Brito Correa [...] as Fazendas de Itapicurú desta parte
                            da Bahia por escritura de compra [...] as Fazendas dos Tocós por hum título de
                            sesmaria dado a minha Mãy Maria Guedes [...] Possuo metade da Matta de S. João,
                            por arrematação [...] Tenho huma Fazenda de Cana em Maré...‟


             O documento mostra a grandiosidade das posses territoriais que os Guedes de
Brito possuíam durante o período colonial sejam por sesmarias, por herança, compradas, ou
por ocupação forçada. Muitas vezes ele declara o pedido de ampliação de determinados
territórios às autoridades responsáveis.


                            Acima destas Fazendas do Itapicurú merim pedimos meu pai e eu ao Conde de
                            Castelo melhor Governador que foi deste Estado em 26 de Outubro de 1652,
                            principiando no Caguague, ou Caguaguena até a Serra do Tuyuyuba com oito
                            léguas de largo. E em 2 de Março de 1665, pedi na mesma Caguague, junto ao
                            Itapicurú por ele acima até as suas nascenças com seis léguas de largo por haverem
                            muitos matos e serras com que não fazia toda a distância habitável, logo as povoei
                                                         12
                            de meus próprios currais ...


             Dentro desta minuciosa declaração Antônio Guedes de Brito mencionou as
fazendas dos Tocós, que segundo Nonato Marques13 foi nesta parte do território dos Guedes
de Brito que o município de Queimadas foi fundado.


                            Possuo as Fazendas dos Tocos por um título de sesmaria dado a minha mãe Maria
                            Guedes, ao Padre Manoel Guedes Lobo, a Sebastiana de Brito, a Ana Guedes em
                            14 de Dezembro de 1612 pelo Governador D. Diogo de Menezes. E dito Padre meu
                            tio me fez a doação do que lhe tocava... E o Capitão Francisco Barbosa Paiva,
                            marido de minha tia, Sebastiana de Brito fizeram venda ao meu pai do que lhes
                            pertencia ... as quais terras povoei, descobrindo-as, fazendo estradas e pazes com os
                                                                      14
                            índios Cariocas, Sapoias e Carapaus ...


             A margem direita do rio Itapicuru-Açu, existiam duas fazendas chamadas “As
Queimadas”, ambas pertencentes à Dona Isabel Maria Guedes de Brito herdeira de imensos
territórios deixados por seu pai Antônio Guedes de Brito. As fazendas eram chamadas de
Queimadas, por causa das constantes queimas que faziam na caatinga para conseguir espaço
para plantação.
             Durante todo processo de elevação da fazenda seja em arraial, depois em freguesia
(1842), e anos depois em vila (1884) o nome do santo esteve presente na denominação desta

12
   Idem, p. 70 e 71
13
   Nonato Marques foi um memorialista queimadense que escreveu um livro relatando toda a história de
Queimadas, desde o desbravamento das terras pelos Guedes de Brito até 1980.
14
   Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, 1916. Ano XXIII, Vol. XI n.42. As Terras de Guedes de
Brito, p.71
localidade. Apenas em 1915, com a lei estadual nº 1.081, que a cidade passou de Santo
Antônio das Queimadas para ser simplificado apenas a Queimadas.
              E foi aí que começou a história do julgamento de Santo Antônio das Queimadas, a
qual abordaremos a seguir.




              2.2 Aparecimento da imagem de Santo Antônio em Queimadas


              Foi neste espaço do sertão nordestino que ocorreu a curiosa aparição de uma
imagem de Santo Antônio. Segundo a história transmitida por gerações, a imagem deste Santo
apareceu, inexplicavelmente, debaixo de uma árvore no alto de uma colina, local em que mais
tarde, a igreja de Santo Antônio das Queimadas foi construída, lá permanecendo até hoje. A
imagem foi encontrada por um vaqueiro debaixo de uma árvore, e infelizmente perdeu-se no
tempo. Depois do julgamento, a imagem teria sumido e ninguém sabe seu paradeiro.




Autoria: Rosa Ramos, 1980. Acervo de D. Minita.   Igreja de Santo Antônio. Queimadas-Ba. Foto: Ariene Góes
Queimadas-Ba                                      Matos. 2009

              As entrevistas realizadas com moradores da cidade mostram certa contradição em
relação ao tipo de árvore onde a imagem teria sido encontrada. Temos várias versões:
licurizeiro, pindobeira, arirí, quixabeira, figueira. Não há um consenso em relação a isso, já
que a árvore foi arrancada para a construção da capela e afirmam que onde se encontra o altar
principal foi o local que encontraram a imagem de Santo Antônio.
              Ao se deparar com a imagem, o vaqueiro a levou para a casa da dona das fazendas,
Dona Isabel Maria Guedes de Brito, e ela o colocou no seu oratório. Curiosamente, no dia
seguinte a imagem havia desaparecido. Mais tarde, foi encontrada no mesmo local que tinha
aparecido pela primeira vez. Esse deslocamento ocorreu diversas vezes: ao sumir da casa da
fazenda a imagem era sempre achada no local em que o vaqueiro a encontrou pela primeira
vez. O fato foi dado como milagre.

                           [...] Queimadas começou a surgir ao redor dessas queimas da fazenda então daí o
                           nome de Queimadas, e também tem uma ligação com a imagem de Santo Antônio, o
                           povo conta que apareceu essa imagem dejunto [sic] de uma pindoba e então os
                           escravos que encontraram levaram até a casa da fazenda. A senhora da fazenda
                           muito piedosa chamou todo mundo para avisar e deixou a imagem dentro da casa
                           da fazenda, daqui a uns dias a imagem desapareceu e foi achada de novo no lugar
                                                                                           15
                           onde tinha sido encontrada no início e assim outras vezes [...]


             Os sucessivos aparecimentos e desaparecimentos da imagem de Santo Antônio
chegaram ao conhecimento de alguns missionários capuchinhos que lá estavam de passagem.
Eles aconselharam Dona Isabel Guedes de Brito a construir uma capela em consagração ao
santo no mesmo local onde a imagem apareceu transformando, daquele dia em diante, Santo
Antônio em padroeiro da localidade, que passou a se chamar Santo Antônio das Queimadas.
             A história do aparecimento da imagem de Santo Antônio em Queimadas logo foi
conhecida por toda redondeza. Logo após a construção da capela, começou as romarias e
peregrinações dos sertanejos, os quais vinham conhecer a imagem que tinha aparecido
misteriosamente. Vinham prestar veneração, fazer e pagar promessas ao Santo tão milagroso.
             Depois da construção da capela, Dona Isabel franqueou terras a quem quisesse
morar naquela localidade. Assim o povoado começou a se formar a margem direita do rio
Itapicuru. Muitos destes novos moradores eram peregrinos que vieram para venerar a imagem
de Santo Antônio e resolveram residir no local.
             Neste espaço nordestino que por si só é um local místico, onde o povo tem muita
fé, Santo Antônio recebeu de Dona Isabel Maria Guedes de Brito, a dona das fazendas, uma
herança. Segundo Nonato Marques, memorialista queimadense, após a morte de Dona Isabel
seus bens foram legados àquela imagem de Santo Antônio: terras, escravos, gados. Estes bens
eram administrados pela freguesia de Sant‟Ana do Tucano, que jurisdicionava Santo Antônio
das Queimadas16.


             2.3 - A prisão de Santo Antônio




15
   Entrevista realizada com Sr. Marcelo* no dia 23 de julho de 2009* (Os nomes dos entrevistados são aqui
substituídos por nomes fictícios a fim de preservar suas identidades.)
16
   MARQUES, Nonato. Santo Antônio das Queimadas. Salvador, 1984. p.94
Segundo a memória coletiva dos queimadenses, entre o final do século XVIII e
início do século XIX (não temos como comprovar com exatidão data por falta de
documentação), Queimadas teria passado por um dos episódios mais pitorescos da história da
religiosidade brasileira: o julgamento civil da imagem de Santo Antônio.
             Depois de uma noite de louvação a Santo Antônio, um homem foi assassinado e o
corpo foi colocado no adro da igreja. No sertão daquela época se fosse encontrado um morto
na frente da porta da casa de qualquer pessoa, o dono da casa seria responsável pelo crime.


                            Nós sabemos que a lei daquela época quando tinha um crime, uma morte violenta
                            de alguma pessoa onde se encontrasse o cadáver da pessoa o dono da casa
                            respondia processo. Dizem os antigos que houve uma festa e uma briga entre os
                            escravos e então houve um crime e deixaram o corpo na frente da igreja Santo
                            Antônio e por isso foi como a lei mandava, foi aberto um processo contra Santo
                                    17
                            Antônio.

                            Tinha aquela lei que onde aparecia a arma do crime, quem era condenado era o
                            dono da casa onde a arma tinha aparecido, aí eles mataram um escravo e
                                                                                                          18
                            deixaram a arma, a faca lá na igreja, aí quem foi condenado foi Santo Antônio.


             Sendo assim o crime foi atribuído a um escravo que pertencia a Santo Antônio,
pois o mesmo teria desaparecido neste dia sem explicações e nunca mais foi encontrado.
Diante do acontecido à imagem do santo foi responsabilizada pelo crime cometido por seu
escravo.
             Isso se deu por causa de uma lei do período que penalizava o senhor pelos delitos
cometidos pelos seus escravos, caso este não o entregasse na mão da justiça.


                             [...] um escravo de Santo Antônio que cometeu o crime e fugiu, e tinha uma lei
                            naquele período que era muito respeitada, nessa região, que afirmava que se um
                            escravo cometesse um crime qualquer, quem pagaria por aquele crime era o dono
                                            19
                            do escravo [...]


             Segundo alguns entrevistados era uma lei colonial, mas Câmara Cascudo comenta
sobre o episódio do julgamento de Santo Antônio citando que era uma lei do código criminal
do império, artigo 28, que segundo ele dizia que “o senhor do escravo era responsável pela




17
   Entrevista realizada com Sr. Marcelo* no dia 23 de julho de 2009
18
   Entrevista realizada com Sr. José * no dia 13 de novembro de 2009
19
   Entrevista realizada com Marcelo* no dia 19 de outubro de 2009
20
pena pecuniária devida pelo servo até os limites do seu próprio valor”.                       Mas o código
criminal do império, artigo 28,21 diz o seguinte:

                                        Art. 28. Serão obrigados a satisfação, posto que não delinqüentes:
                                        1º senhor pelo escravo até o valor deste.
                                        2º que gratuitamente tiver participado dos produtos do crime até a
                                        concorrente quantia.


            Em razão da interpretação desta lei, a imagem de Santo Antônio teria sido
obrigada a pagar pelo crime do seu escravo. Aprisionaram a imagem do santo nas terras dos
Guedes de Brito amarando-a no lombo de um jegue ou de um burro e levaram para a comarca
de Água Fria a mando do juiz, pois a localidade de Santo Antônio das Queimadas pertencia à
comarca de Água Fria.


                           O Santo passou 30 dias preso na cadeia local no quarto da forca, e o místico pavor
                           dos moradores fez com que enquanto durasse a prisão do Santo, a cadeia se
                           transformasse na igreja da cidade. Centenas de pessoas iam para ali rezar e pedir
                           perdão ao Santo. Mas os juizes, famosos pela sua austeridade, submeteram Santo
                           Antônio a um longo julgamento. (...) sabe apenas que a imagem participou de duas
                           audiências, sentou-se no banco dos réus, teve defensor e que duas testemunhas da
                                                                 22
                           apresentação da prisão foram ouvidas.


            A justiça de Água Fria que tinha um poder temido em toda região, julgou e
condenou a imagem do santo à perda dos seus bens, os quais herdara, como já foi
mencionado, de sua devota, Isabel Maria Guedes de Brito.
            Os bens de Santo Antônio foram confiscados e levados hasta pública para pagar à
custa do processo. Segundo Nonato Marques, um coronel chamado Francisco de Paula Araújo
Brito, fazendeiro da Inhambupe comprou as terras, mas não foi tomar posse.


                           Naturalmente Santo Antônio não podia ter feito esse crime não é, mas foi a
                           julgamento justamente para ser esclarecido que Santo Antônio não foi o criminoso,
                           e sim que tinha que encontrar criminosos em outras bandas né! [...] mas tinha que
                           pagar as custas do processo, então o único que tinha bens era Santo Antônio, então
                           correu pra achar os bens de Santo Antônio que era gado , era escravos, que era as
                           terras, e correu pra achar esses bens , sobretudo das terras , por que as donas do
                                                                                                     23
                           terreno tinha deixado 6 léguas em volta de propriedade de Santo Antônio.




20
   CASCUDO, Luiz da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 4ª Ed. São Paulo. Melhoramentos, 1979. p. 62
– 63 Verbete: Antônio
21
    Código Criminal do Império do Brasil. Parte Primeira. Dos Crimes e das Penas. Art. 28. Disponível em:
<www.ciespi.org.br/base_legis/legislacao/COD11a.html>
22
   Jornal da Bahia, Edição Especial, 10-05-1976. Prisão de Santo foi maldição para Queimadas e Água Fria.
23
   Entrevista realizada com Sr. Marcelo* no dia 23 de julho de 2009
Anos depois da compra destas terras, os herdeiros de Francisco de Paula é que
foram reivindicar estas terras, porém boa parte delas já estavam sendo habitada por muitas
pessoas. Estes herdeiros começaram a cobrar imposto destas pessoas, os chamados foros das
terras.
                               Esse leilão vamos dizer assim ficou deserto , ninguém queria arrematar essas
                               terras, até quando apareceu um português que tinha um pouco de condição né, em
                               Salvador, então disseram: olha tem umas terras ai assim, assim, no leilão...vai lá
                               no fórum, e ai ele foi e adquiriu essas terras, né. Mas nunca veio tomar posse,
                               então as terras ficaram indivisas. Cada qual construiu a sua casinha onde queria e
                               pronto. Até esse senhor português morreu teve dois filhos, não é, então um dos dois
                               filhos achou que podia explorar isso, chegar em Queimadas e dizer essas terra é
                               minha , eu sou o herdeiro, então cada qual me paga a sua taxa da terra onde
                                            24
                               construíram.


               Não temos a data em que estes herdeiros chegaram a Queimadas, apenas a data de
1943 em que alguns moradores se uniram e compraram as terras a estes herdeiros.
             Segundo alguns entrevistados, os moradores que compraram estes terras tinham um
poder aquisitivo melhor que os outros, se uniram e fizeram uma sociedade para comprarem a
metade das terras de Queimadas, dividindo a quantia para cada um, mas há uma contradição
na quantidade destes moradores, tendo uma variação de 25, 35, quarenta e 42 pessoas. Existe
uma certidão de compra de terras expedida pela comarca de Bonfim, em 1943, que especifica
os 36 moradores que tinham comprado as terras de Queimadas nas mãos do Senhor Eduardo
Pondé de Mendonça e sua esposa Olinda Brito Pondé25.
                Outro senhor chamado Jaconias comprou a outra metade das terras de Queimadas.
Não temos conhecimento das mãos de quem o senhor Jaconias teria comprado a outra parte,
pois não tivemos acesso a nenhuma documentação sobre o assunto. Apenas a fala de um dos
entrevistados que diz que havia seis herdeiros das terras de Queimadas, e que este senhor teria
comprado a parte das terras de cinco herdeiros e os outros que se associaram compraram a
parte de apenas um herdeiro.
               Estes novos donos das terras de Queimadas passaram a doar e a vender os lotes
destas terras. Nas entrevistas, muitos dizem ter conhecido alguns desses compradores,
testemunham também que as terras onde moram foram compradas por seus pais e familiares
nas mãos de alguns destes sócios.
               Na entrevista com um filho de um desses sócios, ele afirmou que já deu várias
escrituras das terras e que até hoje ele tem poder pra fazer isso. Ele pode expedir escritura das
terras em qualquer local da cidade de Queimadas, pois os sócios não dividiram as terras por

24
     Idem
25
     Livro. 3-D. Transcrição das Transmissões: As fls 94. Ano de 1943. Nº de ordem: 5.611.
lotes. A parte que eles compraram pertencia a todos. E que o pai dele foi um dos poucos que
deixara um inventário para os filhos.


3- A idéia de castigo


             Depois do processo criminal a imagem de Santo Antônio supostamente
desapareceu. Ninguém sabe o paradeiro da imagem, como dissemos acima. O mesmo
aconteceu com a documentação do processo judicial que até hoje não foi encontrada nos
arquivos de Água Fria, de Queimadas, de Irará, pra onde foi transferida a sede da comarca,
nem no Arquivo público da Bahia.
             Décadas depois, alguns políticos locais tentaram reaver o processo e recuperar a
imagem para trazê–la à cidade de Queimadas, mas a tentativa foi inútil: eles não conseguiram
encontrar nem a imagem, nem o processo judicial.
             Não se sabe precisamente a data desse acontecimento. Não foi encontrado nenhum
documento que indique uma data precisa para esse processo de julgamento civil. Tem
algumas especulações por alguns jornais e um memorialista local sobre datas prováveis, final
do século XVIII, início do século XIX, mas nada decisivo. “Assim corre e ressurge para os
moradores da região a velha história da maldição, que data dos fins dos séculos XVIII.”26.
             Os entrevistados afirmam que esta história era contada por seus bisavós, avós,
pais, tios ou pessoas de mais idade.


                             Desde quando eu me entendi por gente que eu lembro que as pessoas mais velhas
                             falavam que Santo Antonio, a imagem de Santo Antônio apareceu lá onde é a
                             igreja de Santo Antônio hoje, e depois prenderam esta imagem levaram pra Água
                                                                                      27
                             Fria e depois de Água Fria sumiu, ninguém sabe pra onde.


             Depois do episódio do julgamento foi cultivada uma idéia de castigo e maldição,
tanto para Água Fria, quanto para Queimadas. “Eu acredito (na idéia de castigo), Água Fria
acabou, não tem nada. Aqui o povo ainda faz alguma coisa, mas a cidade é fraca, é
derrubada.”28.
             Água Fria, era um centro comercial muito importante, era sede da comarca de toda
a região. Segundo o jornal da Bahia, foi depois do julgamento da imagem de Santo Antônio,
que Água Fria perdeu sua autonomia de comarca para Irará, que foi um dos seus distritos. A

26
   Jornal da Bahia, 13 de junho de 1972. Preso o Santo, esta cidade deu pra trás.
27
   Entrevista realizada com Dona Maria* no dia 22 de Outubro de 2009
28
   Entrevista realizada com a Srª Joana* no dia 15 de novembro de 2009
cidade começou a perder sua importância e sua riqueza, muitos moradores se mudaram para
outra cidade, a cidade começou a “morrer”. Até hoje a cidade não conseguiu se desenvolver.


                            A partir da prisão do Santo Antônio e do seu julgamento, a miséria se abateu,
                            principalmente sobre Água Fria, onde ele ficou enclausurado no quarto da força, da
                            cadeia local. Se verdade ou não, o certo é que Água Fria que exercia domínio
                            econômico de Juazeiro ao porto de Cachoeira, hoje não passa de ruínas. Perdeu
                                                                                                         29
                            inclusive, dias após o julgamento de Santo Antônio sua autonomia para Irará.

                            A partir daí a cidade de Água Fria começou a morrer. Hoje, do importante centro
                            comercial que foi outrora, não passa de ruínas, silencio. Com menos de mil
                            habitantes, ruas vazias, a grande praça verde, a grandiosa igreja de outrora, as
                                                                                  30
                            ruínas da cadeia antiga vai desaparecendo aos poucos.


             Em Queimadas esta idéia de maldição também foi cultiva, por muitos
supersticiosos, ligando tudo o que acontecia de ruim à cidade a prisão de Santo Antônio.
             Entre 1910 e 1911, Queimadas sofreu a duas enchentes do rio Itapicuru-Açu a
primeira em 26 de dezembro de 1910 e a segunda no final de fevereiro de 1911. Estas
enchentes consecutivas destruíram a cidade, das 450 casas existentes só restaram cinquenta. A
população de 2.500 habitantes foi reduzida a mil. Isto só fortaleceu a idéia de castigo sobre
Queimadas.


                           Em menos de vinte e quatro horas a impetuosidade do Itapicuru-Açu arrastou rio a
                           baixo quase que totalidade das casas, restando em pé 28 residência erguidas em
                           1845 e mais 22 outras, nas colinas a margem esquerda da ferrovia. De 2.500 foi
                           reduzida para mil a população da cidade e isto provocou em 6 de março de 1911, a
                           transferência da sede do Termo para o arraial de Itiúba . Era a maldição que se
                                  31
                           repetia.


             Até hoje encontramos escombros das casas que foram destruídas nesta época, boa
parte da igreja Matriz, que estava sendo construída toda de pedra, foi derrubada ficando
apenas a fachada, até hoje existente nas intermediações dos Lions Clube.
             Depois deste episódio, Queimadas foi reconstruída distante das margens do rio
Itapicuru, onde está localizada a prefeitura e a cadeia pública. As casas foram construídas
nesta área, mas com o aumento da população muitas pessoas construíram suas casas no
mesmo local onde as enchentes destruíram as antigas casas de Queimadas. Essas sofreram


29
   Jornal da Bahia, Edição Especial, 10-05-1976. Prisão de Santo foi maldição para Queimadas e Água Fria
30
   Idem
31
   Idem
várias outras enchentes e permanecem erguidas graças ao material utilizado atualmente que
são mais fortes, como tijolo, cimento, cal..., do que o adobe, a taipa, o barro que era usado pra
construir as casas antigamente.
            Queimadas sofreu com mais dois acontecimentos catastróficos que para muitos
místicos só é mais uma prova de que Queimadas é um lugar amaldiçoado: a guerra de
Canudos (1896) e um assalto cometido por Lampião (1929) os quais tiraram à paz da cidade.
            Durante a Guerra de Canudos, Queimadas serviu de ponto de chegada e de partida
das tropas dos soldados, jornalistas, médicos e políticos, que vieram combater em Canudos.
Assustando os moradores a ponto de largarem suas casas e se esconderem dentro do mato.
            Da mesma forma, o assalto que Lampião realizou em Queimadas em 22 de
dezembro de 1929 foi também um momento muito difícil para seus moradores, pois além de
saquear toda a cidade ele assassinou sete soldados que prestavam serviços na segurança da
cidade. Este episódio foi interpretado como mais uma forma de castigar a cidade de
Queimadas por causa da condenação de Santo Antônio.
            Em algumas entrevistas ainda vemos que esta idéia de maldição ainda permanece
no imaginário das pessoas, fixando a idéia que os moradores de Queimadas pagam pelos erros
cometidos no passado por seus antepassados, pois a cidade não progride, até consegue
algumas vitórias, mas logo depois as perde. Como afirma Wunenburger “o imaginário serve
para dotar os homens de memória fornecendo-lhes relatos que sintetizam e reconstroem o
passado e justificam o presente.32”


                           Santo Antônio foi um Santo muito sofrido eu lembro que a minha avó falava que na
                           época tinha um padre que saiu de Queimadas e bateu a terra das sandálias dizendo:
                           que Queimadas era de ser queimadas pro resto da vida. E dessa vez, acho que nós
                                                                                           33
                           hoje não temos nada com isso, estamos pagando alguma coisa, né?


                           Depois disto vieram àqueles capuchinhos e disse que Queimadas tinha que ser
                           queimadinha, que ia ter um dilúvio que ia acabar com a cidade, justamente no ano
                           de 11, passou a enchente carregou a metade da igreja da Matriz e aí vem
                           acontecendo isso, Queimadas ta cada vez mais afundando e parece que tem que ser
                                                                                                34
                           Queimadinha mesmo! Tudo indica que parece, cada vez vai piorando.




32
   WUNENBURGER. O imaginário. São Paulo. Loyola, 2007. p.63
33
   Entrevista realizada com Dona Maria* no dia 22 de Outubro de 2009
34
   Entrevista realizada com Sr. João* no dia 10 de Julho de 2009
Queimadas é chamada por muitos dos seus moradores da cidade do “que já teve”,
pois durante os seus 125 anos de existência já foi bastante próspera, com o maior núcleo
populacional da região. E hoje é uma cidade sem muitos progressos.
               Cidade do que já teve, consolidou como um ditado popular por causa das coisas
que já existiram em Queimadas e que com o tempo não progrediram, ao contrário se
dissiparam. Queimadas vivia praticamente da produção de sisal, hoje quase que não
encontramos cultivo de sisal na cidade, as batedeiras – locais onde se processava o sisal para
depois ser exportado para outras cidades – quase que não funcionam mais. “Os homens
inventam, desenvolvem e legitimam suas crenças em imaginários na medida em que essa
relação como imaginário obedece as necessidades, satisfações, efeitos a curto e a longo prazo
que são inseparáveis da natureza humana.” 35
               Houve várias agências bancárias – Baneb, Brasil, Nordeste - hoje apenas existe
Banco do Brasil e uma cooperativa de crédito de produtores e cooperados - ASCOOB. Teve
duas filarmônicas; Queimadas foi sede da COELBA – empresa responsável de distribuição de
energia da Bahia; as tradições populares estão minguando a cada ano que se passa existiam
várias festas populares como cantos de reis, carnaval, São João, desfile cultural no dia da
lavagem da igreja de Santo Antônio, hoje transformada em micareta, dentre outras.
“Queimadas já teve, já teve várias coisas que acaba! Várias coisas e caiu, teve duas coletorias,
teve federal e teve estadual, perdeu. Até a Coelba que era daqui perdeu também, foi pra outra
cidade, até a embasa é dominada de Santa luz.”36
               Queimadas já teve algumas fábricas que possibilitaram a muitos jovens e pais de
família a terem um emprego na própria cidade, mas infelizmente não durou muito tempo
fechando e forçando a ida de muitas pessoas tentarem melhorias de vida em outras cidades
maiores com mais chances de empregos.
               Outro fato que entristece a população inteira é o abandono do rio Itapicuru, rio que
banha a cidade, que sustenta muitas famílias e que poderia sustentar muito mais, está
morrendo a cada dia. Recebendo os esgotos da cidade inteira, sem tratamento, entulhado por
areia em pontos centrais, as encostas estão sendo devastadas, as pessoas jogam lixo na beira
do rio.
               A cidade hoje é sustentada basicamente pelos empregos que a prefeitura
disponibiliza alguns empregos estaduais, pelos aposentados que às vezes sustenta famílias
inteiras, pelo pequeno comércio local, por pequenos agricultores e pecuaristas. Nada muito

35
     WUNENBURGER. Op.cit. p.54
36
     Entrevista realizada com Sr. João* no dia 10 de Julho de 2009
significativo, grande prova disso é que a maioria dos jovens sai em busca de condições
financeira para uma melhoria de sua vida.
               Este ditado da cidade do que já teve é conhecido também em várias outras cidades,
pessoas que já moraram ou que tem parentes em Queimadas ou turistas atribuem este ditado a
cidade diante dos acontecimentos.
               Muitos dos entrevistados concordam com o ditado e afirmam que é resultado da
prisão de Santo Antônio, como uma forma de castigo para pagar tal atitude que envergonha a
cidade.
                Mas também temos muitas pessoas que concordam com o ditado da “cidade do
que já teve”, porém não concordam com a idéia de castigo. E sim que as coisas que deixaram
de existir em Queimadas é reflexo das atitudes do corpo administrativo que desde o início
comandam a cidade, os quais só pensam em crescer suas contas bancárias e não pensam no
bem do povo e da cidade.


                               Bem esse ditado é interessante né, por que as vezes as pessoas fazem essa gozação
                               da própria cidade , né, mas se a gente observar bem toda cidade, é cidade do já
                               teve, né, por que as coisas se evoluem, então hoje tem precisão de ter uma coisa,
                               uma organização, e bom tem, amanha as coisas mudam, também essas coisas vai
                               passando vai se multiplicando ,essa gozação que o povo tem é por que as vezes
                               umas coisas que parecem que florescem, não é , de uma hora pra outra esmorecem,
                               mas isso é na minha opinião é coisa comum, não é só em Queimadas que acontece
                                     37
                               isso!

                               A idéia do já teve existe. O que a senhora pensar Queimadas já teve. Queimadas
                               já teve três bandas de músicas, Queimadas já teve três clubes, hoje não tem
                               nenhum funcionando, né, agora, é uma infinidade de coisas que Queimadas já teve
                               que não tem mais. (...) Mas não tem influência disso (a prisão de Santo Antônio). É
                                                                                              38
                               que nossos políticos não se interessam em adquirir as coisas...




               Queimadas é uma cidade centenária que tem um desenvolvimento tardio, seus
moradores terminam se acomodando com a situação uns atribuindo isto ao julgamento do
santo como forma de pagar por este pecado e outros culpando a ação dos administradores em
geral, mas sem se colocarem como agente ativo deste desenvolvimento e também responsável
pelo retrocesso da cidade.




37
     Entrevista realizada com Sr. Marcelo* no dia 23 de julho de 2009
38
     Entrevista realizada com Sr Zeca* no dia 18 de agosto de 2009
Conclusão
           A história da fundação da cidade de Queimadas está atrelada ao suposto
aparecimento da imagem de Santo Antônio. Depois da construção da capela os romeiros
vinham venerá-la e muitos desses ficaram definitivamente morando em Queimadas. E com a
facilidade dada pela dona das fazendas, Maria Isabel Guedes de Brito, para quem quisesse
residir, a localidade começou a crescer e se desenvolver.
           As trezenas que acontece todo ano, 1 a 13 de junho, atraem várias pessoas de
cidades vizinhas e dos povoados em torno de Queimadas, para acompanhar as procissões, as
orações e os leilões.
           O julgamento da imagem de Santo Antônio é um episódio misterioso, não temos
explicações para tal atitude na lei humana. Levando em conta que a veneração e o respeito
que era prestada a todos os santos, principalmente a Santo Antônio que era um santo muito
requisitado pelos fiéis para resolver todo o tipo de problemas, passando por arrumar um
marido, achar coisas perdidas até curar doenças. Até títulos militares ele ganhou por causa da
sua proteção.
           Mesmo não tendo fontes documentais que comprove que a imagem de Santo
Antônio das Queimadas passou por um julgamento criminal, esta história foi passada por
gerações através da oralidade, ficando viva até hoje no imaginário dos queimadenses, sendo
um forte fato que faz parte do histórico da cidade.
           Diante de todas as observações leva-nos a pensar que houve uma necessidade da
população de apropriar-se da representação da condenação de um santo para justificar a
decadência da cidade.
           Apesar da idéia de castigo ainda permanecer no imaginário de alguns moradores
queimadenses, muitos já se libertaram desta idéia responsabilizando o homem como o único
culpado pela regressão acontecida a cidade. E que o homem é também responsável pelo
progresso e que deve lutar por isso, sem ficar se escondendo atrás de uma lenda, usando-a
para querer justificar tudo de ruim que acontece.
Referências


ANTONIO               Guedes           de        Brito.            Disponível           em
<http://pt.wikipedia.org/wiki/Antonio_Guedes_de_Brito>

ARAÚJO, Regina Mendes de. Proprietárias de escravos e terras da Vila do Carmo, Vila Rica
e    Vila    de    São     João    Del    Rei    –     1718-1761.      Disponível    em:
<http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_176.pdf >

AS TERRAS de Guedes de Brito Revista Trimestral do Instituto Geográfico e Histórico da
Bahia, 1916. Ano XXIII, Vol. XI n.42., p. 69-74

ARANTES, Antônio Augusto. O que é cultura popular. São Paulo: Brasiliense, 2007.

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Os Deuses do Povo: um estudo sobre a religião popular.
Brasiliense, 1986

BURKE, Peter. A Escrita da História: novas perspectivas. São Paulo: UNESP, 1992

CARTA                  de               Sesmaria.              Disponível              em:
<http://www.filologia.org.br/scripta_philologica/01/Carta_de_Sesmaria >

CASCUDO, Luiz da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 4ª Ed. rev.e aum. São Paulo.
Melhoramentos,[Brasília]: INL, 1979. p. 62-63

CODIGO CRIMINAL Do Império Do Brazil. Parte Primeira. Dos Crimes e das Penas. Art.
28. Disponível em: <http://www.Ciespi.Org.Br/Base_Legis/Legislação./COD11a.Html>
Acesso em: 13out 2009

DOUTORES da Igreja. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Doutores_da_Igreja>

DURAND, Gilbert. O imaginário: ensaio acerca das ciências e da filosofia da imagem. 3ª ed.
Rio de Janeiro: DIFEL, 2004.

DURKHEIM, Émile. As formas elementares de vida religiosa: o sistema totêmico na
Austrália. São Paulo: Paulinas, 1989

GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes: o cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido
pela Inquisição. São Paulo: Companhia das letras, 1987

HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2006.

LAPLANTINE, François; TRINDADE, Liana Sálvia. O que é imaginário. São Paulo;
Brasiliense, 2003.

MARQUES, Nonato. Santo Antônio das Queimadas. S. l.: s. n. 1984

MEIHY, José Carlos Sebe Bom. Manual de história oral. 5ª ed. São Paulo: Loyola, 2005
MOTT, Luiz. Cotidiano e vivência religiosa: entre a capela e o calundu. In: SOUZA. Laura de
Melo; NOVAIS. Fernando (orgs). História da Vida Privada no Brasil: cotidiano e vida
privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia da Letras, 1997.

PALLARES- BURKE, Maria Lúcia Garcia. Introdução. In: As muitas faces da história. Nove
entrevistas. São Paulo: UNESP, 2000.

PRESO O SANTO, ESTA CIDADE DEU PRA TRÁS. Jornal da Bahia. Salvador, 13 de jun
1972, p.3

PRISÃO DE SANTO FOI MALDIÇÃO PARA QUEIMADAS E ÁGUA FRIA. Jornal da
Bahia Edição Especial, 13 de jun 1976, p.?

QUEIMADAS. Disponível em: <http://wikimapia.org/653868/pt/Queimadas-Bahia-Brasil>

RIO São Francisco. Disponível em: < www.wikipedia.org/wiki/Rio_São_Francisco>

SANTO ANTÔNIO – CORONEL. A Tarde, 13 de jun. 1970, p.?

SILVA, Lourenço Pereira. Memória Histórica e Geográfica de Bonfim. [s.l]: [s.ed], 19...

VARIEDADE Histórica: A patente de Santo Antônio. Revista Trimestral do Instituto
Geográfico e Histórico da Bahia. Ano VI, Vol. VI, n. 21. Setembro de 1899. Variedade
Histórica: A patente de Santo Antônio. P. 469-472.

VASCONCELOS, Suani de Almeida. Carta de Sesmaria- Seculo XIX: Edição
Semidiplomática e Estudo Histórico. Disponivel em : <http:// www.filologia.org.br/scripta
philologica/01//Carta_de_Sesmaria_–_Século_XIX_ Acesso em: 22 julh. 2009

WUNENBURGER, Jean-Jacques. O imaginário. São Paulo. Loyola, 2007.

Mais conteúdo relacionado

Mais procurados

Matéria "A Greve de 1951"
Matéria "A Greve de 1951"Matéria "A Greve de 1951"
Matéria "A Greve de 1951"marcusNOGUEIRA
 
Auto da compadecida
Auto da compadecidaAuto da compadecida
Auto da compadecidaJosi Motta
 
Teoria textual - contexto, discurso e ideologia
Teoria textual - contexto, discurso e ideologiaTeoria textual - contexto, discurso e ideologia
Teoria textual - contexto, discurso e ideologiaProfFernandaBraga
 
Qual o significado de Jesus ser chamado de verme
Qual o significado de Jesus ser chamado de vermeQual o significado de Jesus ser chamado de verme
Qual o significado de Jesus ser chamado de vermeJuraci Rocha
 
INTRODUÇÃO A LITERATURA BRASILEIRA, Resumo Do Antigo Estado à Máquina Mercante
INTRODUÇÃO A LITERATURA BRASILEIRA, Resumo Do Antigo Estado à Máquina MercanteINTRODUÇÃO A LITERATURA BRASILEIRA, Resumo Do Antigo Estado à Máquina Mercante
INTRODUÇÃO A LITERATURA BRASILEIRA, Resumo Do Antigo Estado à Máquina MercanteUFMG
 
Fernando Pessoa e Heterônimos: Uma proposta intertextual para o Ensino Médio
Fernando Pessoa e Heterônimos: Uma proposta intertextual para o Ensino MédioFernando Pessoa e Heterônimos: Uma proposta intertextual para o Ensino Médio
Fernando Pessoa e Heterônimos: Uma proposta intertextual para o Ensino MédioFelipe De Souza Costa
 
Revisão literatura - quinhentismo - barroco - arcadismo - romantismo
Revisão   literatura - quinhentismo - barroco - arcadismo - romantismoRevisão   literatura - quinhentismo - barroco - arcadismo - romantismo
Revisão literatura - quinhentismo - barroco - arcadismo - romantismojasonrplima
 
Técnicas etnográficas - Social Analytics Summit - Débora Zanini
Técnicas etnográficas - Social Analytics Summit - Débora ZaniniTécnicas etnográficas - Social Analytics Summit - Débora Zanini
Técnicas etnográficas - Social Analytics Summit - Débora ZaniniDébora Zanini
 
A influência da Igreja Católica na Escola de Serviço Social de São Paulo (pio...
A influência da Igreja Católica na Escola de Serviço Social de São Paulo (pio...A influência da Igreja Católica na Escola de Serviço Social de São Paulo (pio...
A influência da Igreja Católica na Escola de Serviço Social de São Paulo (pio...Micherline Teodosio
 
Quincas Borba - Machado de Assis
Quincas Borba - Machado de AssisQuincas Borba - Machado de Assis
Quincas Borba - Machado de AssisAllan Ferreira
 

Mais procurados (20)

Memória - Ensaio do Livro História e Memória - Le Goff
Memória - Ensaio do Livro História e Memória - Le GoffMemória - Ensaio do Livro História e Memória - Le Goff
Memória - Ensaio do Livro História e Memória - Le Goff
 
Matéria "A Greve de 1951"
Matéria "A Greve de 1951"Matéria "A Greve de 1951"
Matéria "A Greve de 1951"
 
Auto da compadecida
Auto da compadecidaAuto da compadecida
Auto da compadecida
 
Teoria textual - contexto, discurso e ideologia
Teoria textual - contexto, discurso e ideologiaTeoria textual - contexto, discurso e ideologia
Teoria textual - contexto, discurso e ideologia
 
Acolitos
AcolitosAcolitos
Acolitos
 
Antropologia e cultura tylor boas e malinowski
Antropologia e cultura tylor boas e malinowskiAntropologia e cultura tylor boas e malinowski
Antropologia e cultura tylor boas e malinowski
 
Qual o significado de Jesus ser chamado de verme
Qual o significado de Jesus ser chamado de vermeQual o significado de Jesus ser chamado de verme
Qual o significado de Jesus ser chamado de verme
 
Lapbook Missa Nova
Lapbook Missa NovaLapbook Missa Nova
Lapbook Missa Nova
 
RESUMO DA OBRA "AS CONFISSÕES"
RESUMO DA OBRA "AS CONFISSÕES"RESUMO DA OBRA "AS CONFISSÕES"
RESUMO DA OBRA "AS CONFISSÕES"
 
INTRODUÇÃO A LITERATURA BRASILEIRA, Resumo Do Antigo Estado à Máquina Mercante
INTRODUÇÃO A LITERATURA BRASILEIRA, Resumo Do Antigo Estado à Máquina MercanteINTRODUÇÃO A LITERATURA BRASILEIRA, Resumo Do Antigo Estado à Máquina Mercante
INTRODUÇÃO A LITERATURA BRASILEIRA, Resumo Do Antigo Estado à Máquina Mercante
 
Fernando Pessoa e Heterônimos: Uma proposta intertextual para o Ensino Médio
Fernando Pessoa e Heterônimos: Uma proposta intertextual para o Ensino MédioFernando Pessoa e Heterônimos: Uma proposta intertextual para o Ensino Médio
Fernando Pessoa e Heterônimos: Uma proposta intertextual para o Ensino Médio
 
As sufragistas
As sufragistasAs sufragistas
As sufragistas
 
Estudo de Usuários - Conceitos e Aplicações
Estudo de Usuários - Conceitos e AplicaçõesEstudo de Usuários - Conceitos e Aplicações
Estudo de Usuários - Conceitos e Aplicações
 
Ficha de leitura
Ficha de leituraFicha de leitura
Ficha de leitura
 
Revisão literatura - quinhentismo - barroco - arcadismo - romantismo
Revisão   literatura - quinhentismo - barroco - arcadismo - romantismoRevisão   literatura - quinhentismo - barroco - arcadismo - romantismo
Revisão literatura - quinhentismo - barroco - arcadismo - romantismo
 
Aparições de Nossa Senhora
Aparições de Nossa SenhoraAparições de Nossa Senhora
Aparições de Nossa Senhora
 
Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019
Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019
Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019
 
Técnicas etnográficas - Social Analytics Summit - Débora Zanini
Técnicas etnográficas - Social Analytics Summit - Débora ZaniniTécnicas etnográficas - Social Analytics Summit - Débora Zanini
Técnicas etnográficas - Social Analytics Summit - Débora Zanini
 
A influência da Igreja Católica na Escola de Serviço Social de São Paulo (pio...
A influência da Igreja Católica na Escola de Serviço Social de São Paulo (pio...A influência da Igreja Católica na Escola de Serviço Social de São Paulo (pio...
A influência da Igreja Católica na Escola de Serviço Social de São Paulo (pio...
 
Quincas Borba - Machado de Assis
Quincas Borba - Machado de AssisQuincas Borba - Machado de Assis
Quincas Borba - Machado de Assis
 

Destaque

Dale coutinho aquário sp 2012
Dale coutinho   aquário sp 2012Dale coutinho   aquário sp 2012
Dale coutinho aquário sp 2012DaleCoutinho
 
Kimberly dayanna díaz junca
Kimberly dayanna díaz juncaKimberly dayanna díaz junca
Kimberly dayanna díaz juncaariandrea
 
Slides iaraeandri
Slides iaraeandriSlides iaraeandri
Slides iaraeandriiaraandri
 
Tuinbouw en de toekomst van de stad Districtsconferentie Rotary
Tuinbouw en de toekomst van de stad Districtsconferentie RotaryTuinbouw en de toekomst van de stad Districtsconferentie Rotary
Tuinbouw en de toekomst van de stad Districtsconferentie RotaryRotaryD1550
 
Harper government Against First Nations
Harper government Against First NationsHarper government Against First Nations
Harper government Against First NationsGitxsansVoice
 
TCC de Edisvânio do Nascimento Pereira
TCC de Edisvânio do Nascimento PereiraTCC de Edisvânio do Nascimento Pereira
TCC de Edisvânio do Nascimento PereiraUNEB
 

Destaque (9)

Dale coutinho aquário sp 2012
Dale coutinho   aquário sp 2012Dale coutinho   aquário sp 2012
Dale coutinho aquário sp 2012
 
Kimberly dayanna díaz junca
Kimberly dayanna díaz juncaKimberly dayanna díaz junca
Kimberly dayanna díaz junca
 
Robson Cezarino
Robson CezarinoRobson Cezarino
Robson Cezarino
 
Slides iaraeandri
Slides iaraeandriSlides iaraeandri
Slides iaraeandri
 
Tuinbouw en de toekomst van de stad Districtsconferentie Rotary
Tuinbouw en de toekomst van de stad Districtsconferentie RotaryTuinbouw en de toekomst van de stad Districtsconferentie Rotary
Tuinbouw en de toekomst van de stad Districtsconferentie Rotary
 
Harper government Against First Nations
Harper government Against First NationsHarper government Against First Nations
Harper government Against First Nations
 
TCC de Edisvânio do Nascimento Pereira
TCC de Edisvânio do Nascimento PereiraTCC de Edisvânio do Nascimento Pereira
TCC de Edisvânio do Nascimento Pereira
 
Utopia
UtopiaUtopia
Utopia
 
Assegurando condições mínimas às famílias para uma atenção adequada à primeir...
Assegurando condições mínimas às famílias para uma atenção adequada à primeir...Assegurando condições mínimas às famílias para uma atenção adequada à primeir...
Assegurando condições mínimas às famílias para uma atenção adequada à primeir...
 

Semelhante a Julgamento de Santo no Sertão

A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luz
A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luzA festa de santa luzia segundo fiéis de santa luz
A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luzUNEB
 
A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luz
A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luzA festa de santa luzia segundo fiéis de santa luz
A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luzUNEB
 
A Religiosidade na América Portuguesa
A Religiosidade na América PortuguesaA Religiosidade na América Portuguesa
A Religiosidade na América PortuguesaEdenilson Morais
 
Festas juninas em bandiaçu dos anos de 1990 a 2011
Festas juninas em bandiaçu dos anos de 1990 a 2011Festas juninas em bandiaçu dos anos de 1990 a 2011
Festas juninas em bandiaçu dos anos de 1990 a 2011UNEB
 
Património Cultural Português -Origem das Festas de Santo António de Lisbo...
Património Cultural Português -Origem das Festas de Santo António de Lisbo...Património Cultural Português -Origem das Festas de Santo António de Lisbo...
Património Cultural Português -Origem das Festas de Santo António de Lisbo...Artur Filipe dos Santos
 
Em defesa dos_indios
Em defesa dos_indiosEm defesa dos_indios
Em defesa dos_indiosRui Pacheco
 
A origem de Bacurituba
A origem de BacuritubaA origem de Bacurituba
A origem de BacuritubaCid Silva
 
Cultura na Colônia.ppt
Cultura na Colônia.pptCultura na Colônia.ppt
Cultura na Colônia.pptbernardoborges
 
Historia da espiritualidade [1] / Aldir Crocoli
Historia da espiritualidade [1] / Aldir CrocoliHistoria da espiritualidade [1] / Aldir Crocoli
Historia da espiritualidade [1] / Aldir CrocoliEugenio Hansen, OFS
 
A origem de bacurituba
A origem de bacuritubaA origem de bacurituba
A origem de bacuritubaCid Silva
 
Jb news informativo nr. 1170
Jb news   informativo nr. 1170Jb news   informativo nr. 1170
Jb news informativo nr. 1170JBNews
 
Agostinho santo[1]. confissões
Agostinho  santo[1]. confissõesAgostinho  santo[1]. confissões
Agostinho santo[1]. confissõesDireito2012sl08
 
Construção do catolicismo em conc. do coité da coloinização ao primeiro cente...
Construção do catolicismo em conc. do coité da coloinização ao primeiro cente...Construção do catolicismo em conc. do coité da coloinização ao primeiro cente...
Construção do catolicismo em conc. do coité da coloinização ao primeiro cente...UNEB
 
1 isaia o campo religioso brasileiro e suas transformações históricas
1   isaia o campo religioso brasileiro e suas transformações históricas1   isaia o campo religioso brasileiro e suas transformações históricas
1 isaia o campo religioso brasileiro e suas transformações históricasElisa Rodrigues
 
Trabalho de historia: Religiosidade Popular na Colonia
Trabalho de historia: Religiosidade Popular na ColoniaTrabalho de historia: Religiosidade Popular na Colonia
Trabalho de historia: Religiosidade Popular na Coloniabvaguinho
 
A crônica como escrita autobiográfica
A crônica como escrita autobiográficaA crônica como escrita autobiográfica
A crônica como escrita autobiográficaJordan Bruno
 
Aula os cristãos protestante podem brincar festa junina
Aula os cristãos protestante podem brincar festa juninaAula os cristãos protestante podem brincar festa junina
Aula os cristãos protestante podem brincar festa juninaMetodista_Barreto
 
Jb news informativo nr. 0085
Jb news   informativo nr. 0085Jb news   informativo nr. 0085
Jb news informativo nr. 0085JB News
 

Semelhante a Julgamento de Santo no Sertão (20)

A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luz
A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luzA festa de santa luzia segundo fiéis de santa luz
A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luz
 
A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luz
A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luzA festa de santa luzia segundo fiéis de santa luz
A festa de santa luzia segundo fiéis de santa luz
 
A Religiosidade na América Portuguesa
A Religiosidade na América PortuguesaA Religiosidade na América Portuguesa
A Religiosidade na América Portuguesa
 
Festas juninas em bandiaçu dos anos de 1990 a 2011
Festas juninas em bandiaçu dos anos de 1990 a 2011Festas juninas em bandiaçu dos anos de 1990 a 2011
Festas juninas em bandiaçu dos anos de 1990 a 2011
 
Património Cultural Português -Origem das Festas de Santo António de Lisbo...
Património Cultural Português -Origem das Festas de Santo António de Lisbo...Património Cultural Português -Origem das Festas de Santo António de Lisbo...
Património Cultural Português -Origem das Festas de Santo António de Lisbo...
 
Em defesa dos_indios
Em defesa dos_indiosEm defesa dos_indios
Em defesa dos_indios
 
A origem de Bacurituba
A origem de BacuritubaA origem de Bacurituba
A origem de Bacurituba
 
Cultura na Colônia.ppt
Cultura na Colônia.pptCultura na Colônia.ppt
Cultura na Colônia.ppt
 
Historia da espiritualidade [1] / Aldir Crocoli
Historia da espiritualidade [1] / Aldir CrocoliHistoria da espiritualidade [1] / Aldir Crocoli
Historia da espiritualidade [1] / Aldir Crocoli
 
A origem de bacurituba
A origem de bacuritubaA origem de bacurituba
A origem de bacurituba
 
Aldeia de iriritiba missagia
Aldeia de iriritiba missagiaAldeia de iriritiba missagia
Aldeia de iriritiba missagia
 
Jb news informativo nr. 1170
Jb news   informativo nr. 1170Jb news   informativo nr. 1170
Jb news informativo nr. 1170
 
Agostinho santo[1]. confissões
Agostinho  santo[1]. confissõesAgostinho  santo[1]. confissões
Agostinho santo[1]. confissões
 
Construção do catolicismo em conc. do coité da coloinização ao primeiro cente...
Construção do catolicismo em conc. do coité da coloinização ao primeiro cente...Construção do catolicismo em conc. do coité da coloinização ao primeiro cente...
Construção do catolicismo em conc. do coité da coloinização ao primeiro cente...
 
1 isaia o campo religioso brasileiro e suas transformações históricas
1   isaia o campo religioso brasileiro e suas transformações históricas1   isaia o campo religioso brasileiro e suas transformações históricas
1 isaia o campo religioso brasileiro e suas transformações históricas
 
Trabalho de historia: Religiosidade Popular na Colonia
Trabalho de historia: Religiosidade Popular na ColoniaTrabalho de historia: Religiosidade Popular na Colonia
Trabalho de historia: Religiosidade Popular na Colonia
 
A crônica como escrita autobiográfica
A crônica como escrita autobiográficaA crônica como escrita autobiográfica
A crônica como escrita autobiográfica
 
Os Santos Populares
Os Santos PopularesOs Santos Populares
Os Santos Populares
 
Aula os cristãos protestante podem brincar festa junina
Aula os cristãos protestante podem brincar festa juninaAula os cristãos protestante podem brincar festa junina
Aula os cristãos protestante podem brincar festa junina
 
Jb news informativo nr. 0085
Jb news   informativo nr. 0085Jb news   informativo nr. 0085
Jb news informativo nr. 0085
 

Mais de UNEB

TCC de Morana Liss Morais de Oliveira
TCC de Morana Liss Morais de OliveiraTCC de Morana Liss Morais de Oliveira
TCC de Morana Liss Morais de OliveiraUNEB
 
TCC de Laudécio Carnerio e Paulo Giovane
TCC de Laudécio Carnerio e Paulo GiovaneTCC de Laudécio Carnerio e Paulo Giovane
TCC de Laudécio Carnerio e Paulo GiovaneUNEB
 
TCC de Jussara Borges Alves
TCC de Jussara Borges AlvesTCC de Jussara Borges Alves
TCC de Jussara Borges AlvesUNEB
 
TCC de Douglas Santos, Jussara Oliveira e Luís Aselmo
TCC de Douglas Santos, Jussara Oliveira e Luís AselmoTCC de Douglas Santos, Jussara Oliveira e Luís Aselmo
TCC de Douglas Santos, Jussara Oliveira e Luís AselmoUNEB
 
Memorial de Camila Oliveira Santos
Memorial de Camila Oliveira SantosMemorial de Camila Oliveira Santos
Memorial de Camila Oliveira SantosUNEB
 
TCC de Camila Oliveira Santos
TCC de Camila Oliveira SantosTCC de Camila Oliveira Santos
TCC de Camila Oliveira SantosUNEB
 
TCC de Batriz dos Santos e Gezarela da Silva
TCC de Batriz dos Santos e Gezarela da SilvaTCC de Batriz dos Santos e Gezarela da Silva
TCC de Batriz dos Santos e Gezarela da SilvaUNEB
 
Monografia de Laisa Dioly da Silva Ferreira
Monografia de Laisa Dioly da Silva FerreiraMonografia de Laisa Dioly da Silva Ferreira
Monografia de Laisa Dioly da Silva FerreiraUNEB
 
Monografia de Débora Araújo da Silva Ferraz
Monografia de Débora Araújo da Silva FerrazMonografia de Débora Araújo da Silva Ferraz
Monografia de Débora Araújo da Silva FerrazUNEB
 
Monografia de Wagner Simões de Oliveira
Monografia de Wagner Simões de OliveiraMonografia de Wagner Simões de Oliveira
Monografia de Wagner Simões de OliveiraUNEB
 
Monografia de Josiélia Oliveira Pereira
Monografia de Josiélia Oliveira PereiraMonografia de Josiélia Oliveira Pereira
Monografia de Josiélia Oliveira PereiraUNEB
 
Monografia de Leila de Lima Oliveira
Monografia de Leila de Lima OliveiraMonografia de Leila de Lima Oliveira
Monografia de Leila de Lima OliveiraUNEB
 
Monografia de Kelly Tainan Santos Oliveira
Monografia de Kelly Tainan Santos OliveiraMonografia de Kelly Tainan Santos Oliveira
Monografia de Kelly Tainan Santos OliveiraUNEB
 
Monografia de Glécia de Santana Miranda
Monografia de Glécia de Santana MirandaMonografia de Glécia de Santana Miranda
Monografia de Glécia de Santana MirandaUNEB
 
Monografia de Deiseluce de Oliveira Ramos
Monografia de Deiseluce de Oliveira RamosMonografia de Deiseluce de Oliveira Ramos
Monografia de Deiseluce de Oliveira RamosUNEB
 
Monografia de Bonifácio Carvalho Santos
Monografia de Bonifácio Carvalho SantosMonografia de Bonifácio Carvalho Santos
Monografia de Bonifácio Carvalho SantosUNEB
 
MONOGRAFIA DE ANA ZILÁ RAMOS OLIVEIRA DA SILVA
MONOGRAFIA DE ANA ZILÁ RAMOS OLIVEIRA DA SILVAMONOGRAFIA DE ANA ZILÁ RAMOS OLIVEIRA DA SILVA
MONOGRAFIA DE ANA ZILÁ RAMOS OLIVEIRA DA SILVAUNEB
 
As estratégias de aprendizagem utilizadas por alunos do sexto ano de língua i...
As estratégias de aprendizagem utilizadas por alunos do sexto ano de língua i...As estratégias de aprendizagem utilizadas por alunos do sexto ano de língua i...
As estratégias de aprendizagem utilizadas por alunos do sexto ano de língua i...UNEB
 
1984 - literatura e Modernidde
1984 - literatura e Modernidde1984 - literatura e Modernidde
1984 - literatura e ModerniddeUNEB
 
A crítica orwelliana aos regimes totalitaristas hélio pereira barreto
A crítica orwelliana aos regimes totalitaristas   hélio pereira barretoA crítica orwelliana aos regimes totalitaristas   hélio pereira barreto
A crítica orwelliana aos regimes totalitaristas hélio pereira barretoUNEB
 

Mais de UNEB (20)

TCC de Morana Liss Morais de Oliveira
TCC de Morana Liss Morais de OliveiraTCC de Morana Liss Morais de Oliveira
TCC de Morana Liss Morais de Oliveira
 
TCC de Laudécio Carnerio e Paulo Giovane
TCC de Laudécio Carnerio e Paulo GiovaneTCC de Laudécio Carnerio e Paulo Giovane
TCC de Laudécio Carnerio e Paulo Giovane
 
TCC de Jussara Borges Alves
TCC de Jussara Borges AlvesTCC de Jussara Borges Alves
TCC de Jussara Borges Alves
 
TCC de Douglas Santos, Jussara Oliveira e Luís Aselmo
TCC de Douglas Santos, Jussara Oliveira e Luís AselmoTCC de Douglas Santos, Jussara Oliveira e Luís Aselmo
TCC de Douglas Santos, Jussara Oliveira e Luís Aselmo
 
Memorial de Camila Oliveira Santos
Memorial de Camila Oliveira SantosMemorial de Camila Oliveira Santos
Memorial de Camila Oliveira Santos
 
TCC de Camila Oliveira Santos
TCC de Camila Oliveira SantosTCC de Camila Oliveira Santos
TCC de Camila Oliveira Santos
 
TCC de Batriz dos Santos e Gezarela da Silva
TCC de Batriz dos Santos e Gezarela da SilvaTCC de Batriz dos Santos e Gezarela da Silva
TCC de Batriz dos Santos e Gezarela da Silva
 
Monografia de Laisa Dioly da Silva Ferreira
Monografia de Laisa Dioly da Silva FerreiraMonografia de Laisa Dioly da Silva Ferreira
Monografia de Laisa Dioly da Silva Ferreira
 
Monografia de Débora Araújo da Silva Ferraz
Monografia de Débora Araújo da Silva FerrazMonografia de Débora Araújo da Silva Ferraz
Monografia de Débora Araújo da Silva Ferraz
 
Monografia de Wagner Simões de Oliveira
Monografia de Wagner Simões de OliveiraMonografia de Wagner Simões de Oliveira
Monografia de Wagner Simões de Oliveira
 
Monografia de Josiélia Oliveira Pereira
Monografia de Josiélia Oliveira PereiraMonografia de Josiélia Oliveira Pereira
Monografia de Josiélia Oliveira Pereira
 
Monografia de Leila de Lima Oliveira
Monografia de Leila de Lima OliveiraMonografia de Leila de Lima Oliveira
Monografia de Leila de Lima Oliveira
 
Monografia de Kelly Tainan Santos Oliveira
Monografia de Kelly Tainan Santos OliveiraMonografia de Kelly Tainan Santos Oliveira
Monografia de Kelly Tainan Santos Oliveira
 
Monografia de Glécia de Santana Miranda
Monografia de Glécia de Santana MirandaMonografia de Glécia de Santana Miranda
Monografia de Glécia de Santana Miranda
 
Monografia de Deiseluce de Oliveira Ramos
Monografia de Deiseluce de Oliveira RamosMonografia de Deiseluce de Oliveira Ramos
Monografia de Deiseluce de Oliveira Ramos
 
Monografia de Bonifácio Carvalho Santos
Monografia de Bonifácio Carvalho SantosMonografia de Bonifácio Carvalho Santos
Monografia de Bonifácio Carvalho Santos
 
MONOGRAFIA DE ANA ZILÁ RAMOS OLIVEIRA DA SILVA
MONOGRAFIA DE ANA ZILÁ RAMOS OLIVEIRA DA SILVAMONOGRAFIA DE ANA ZILÁ RAMOS OLIVEIRA DA SILVA
MONOGRAFIA DE ANA ZILÁ RAMOS OLIVEIRA DA SILVA
 
As estratégias de aprendizagem utilizadas por alunos do sexto ano de língua i...
As estratégias de aprendizagem utilizadas por alunos do sexto ano de língua i...As estratégias de aprendizagem utilizadas por alunos do sexto ano de língua i...
As estratégias de aprendizagem utilizadas por alunos do sexto ano de língua i...
 
1984 - literatura e Modernidde
1984 - literatura e Modernidde1984 - literatura e Modernidde
1984 - literatura e Modernidde
 
A crítica orwelliana aos regimes totalitaristas hélio pereira barreto
A crítica orwelliana aos regimes totalitaristas   hélio pereira barretoA crítica orwelliana aos regimes totalitaristas   hélio pereira barreto
A crítica orwelliana aos regimes totalitaristas hélio pereira barreto
 

Julgamento de Santo no Sertão

  • 1. UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS XIV LICENCIATURA EM HISTÓRIA Ariene Pinto Góes Matos “QUE A JUSTIÇA DE ÁGUA FRIA TE CONDENE”. O JULGAMENTO DE UM SANTO NO SERTÃO BAIANO Conceição do Coité Fevereiro de 2010
  • 2. UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA – UNEB DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS XIV LICENCIATURA EM HISTÓRIA Ariene Pinto Góes Matos “QUE A JUSTIÇA DE ÁGUA FRIA TE CONDENE”. O JULGAMENTO DE UM SANTO NO SERTÃO BAIANO Trabalho de conclusão de curso apresentado ao curso de Licenciatura em História para obtenção do título de licenciada, sob a orientação da Professora Suzana Severs. Conceição do Coité Fevereiro de 2010
  • 3. Resumo Este artigo conta a história do julgamento e condenação da imagem de Santo Antônio das Queimadas a qual foi responsabilizada por um assassinato na região de Queimadas em razão de ter recebido toda a herança de uma devota, proprietária desta imagem e, dentre ela estar um escravo, autor do crime. A legislação de final do século XVIII e início do XIX, quando este episódio parece se desenvolver, atribui responsabilidade de crimes cometidos por escravos a seus donos. Sendo assim, a imagem do santo foi obrigada a pagar por um crime e condenado à perda dos seus bens para custear as despesas do processo. Por ausência de comprovação do julgamento, esta história faz parte do imaginário coletivo de Queimadas sendo responsável, algumas vezes, pelos infortúnios que ocorrem no município. E é este aspecto que apuramos neste trabalho. Palavras-chave: Religiosidade popular; Santo Antônio; Imaginário, Sertão baiano Introdução Este é um trabalho de cunho descritivo que se preocupou em levantar informações para contar a história do julgamento civil de Santo Antônio em Queimadas, Bahia, ocorrido em data incerta, entre o final do século XVIII ou o início do século XIX. Queimadas, cidade do sertão baiano, foi palco de um episódio curioso. O juiz da comarca de Água Fria teria submetido à imagem de Santo Antônio das Queimadas a um julgamento civil, para responder por um crime cometido por um dos seus escravos, baseado na lei imperial que responsabilizava o senhor de escravos por quaisquer delitos e danos causados por eles. Santo Antônio era dono de terras, gados e escravos que lhes tinham sido doado por Dona Maria Isabel Guedes de Brito. Depois do julgamento a imagem desapareceu sem deixar vestígios, o mesmo aconteceu com o processo criminal. Como foi impossível encontrar o processo do julgamento, história que contamos no corpo deste artigo, optamos por levantar a história do julgamento no imaginário da população, nos dias de hoje. Posto que encontramos em algumas falas a idéia de regresso e decadência da cidade ligado a este fato.
  • 4. Para ajudar em nossa reflexão utilizamos como referencial teórico Jean-Jacques Wunenburger sobre imaginário e os escritos sobre religiosidade de Luiz Mott. Metodologicamente, para dar conta da pesquisa tão fragmentada, lançamos mão das entrevistas nos moldes da história oral proposta por José Carlos Sebe Bom Meihy, ainda que não classifiquemos este artigo como um trabalho de história oral propriamente dito, utilizamos as entrevistas apenas como um recurso complementar dos textos mais estruturados. Optamos por não identificar as pessoas entrevistadas para preservar a sua identidade. 1- Santo Antônio no Brasil Por arte de umas leis ou do Demônio levaram a imagem para os tribunais, condenaram no júri a Santo Antônio que ali mesmo perdeu os cabedais. Perdeu tudo o que tinha de uma vez: terras, escravos, roças e boiadas deixaram pobre o insigne português. O caso fez escândalo no céu, porque foi Santo Antônio das Queimadas o único santo que também foi réu... Nonato Marques Um dos traços marcantes da espiritualidade dos católicos sempre foi à devoção aos santos, tendo uma relação de adulação e rituais. Os santos têm um papel essencial na vida religiosa, tanto para resolver problemas mundanos quanto espirituais. Os católicos se valem de promessas e novenas aos santos a fim de realizar seus pedidos como um mercado de troca. A concepção de Santo é explicitada por Luiz Mott quando diz que: Santo é que se adula... diz um ditado antigo repetido na Bahia de todos os Santos. De fato, na religiosidade popular do Brasil de antanho, a intimidade dos devotos vis-à-vis certos santos e oragos percorria um continuum de amor e ódio, que incluía louvores, adulação, rituais propiciatórios, intimidação e até agressão física explicita. 1 Dentro do rol dos santos o lusitano Santo Antônio é o campeão da devoção popular. Dedicou toda a sua vida aos ensinamentos de Deus, conhecedor e praticante dos 1 MOTT, Luiz. Cotidiano e vivência religiosa: entre a capela e o calundu. In: SOUZA. Laura de Melo; NOVAIS. Fernando (orgs). História da Vida Privada no Brasil. p.184.
  • 5. ensinamentos da Bíblia Sagrada recebeu o título de Doutor da Igreja 2. Um grande pregador dos evangelhos e apoiado por uma popularidade que sempre crescia de época em época, Santo Antonio foi canonizado em apenas um ano após a sua morte (1232). Santo Antônio é conhecido como Santo Antônio de Lisboa e também como Santo Antonio de Pádua, em razão de ser o patrono de Portugal, por ter nascido na capital, Lisboa (1195), e de Pádua (Itália), porque foi lá que passou dez anos evangelizando até sua morte, 13 de junho de 1231, data que se tornou celebrativa de sua memória e devoção. Desde então a cada 13 de junho, fiéis o celebram com trezenas e procissões lembrando seus feitos em vida e também os milagres realizados por ele depois de sua morte. Santo Antônio foi uns dos santos trazidos para o Brasil pelos portugueses, os quais eram devotos fervorosos do santo franciscano, tinham um culto com sentido patriótico. Eles determinaram Santo Antônio como o padroeiro da Bahia, sendo que ele já era patrono de Portugal. Existem no Brasil diversas cidades que têm igrejas ou capelas consagradas a este santo. E muitas igrejas que não são consagradas, possuem sua imagem em um dos altares laterais. Além disso, muitos devotos têm em sua própria casa a imagem de Santo Antônio, expressando a influência portuguesa aos brasileiros na veneração ao santo franciscano. Na religiosidade popular brasileira Santo Antônio foi e continua sendo um dos santos mais requisitado pelos fiéis. Ele é bastante procurado para resolver problemas conjugais - o “santo casamenteiro”. Mas nem sempre foi assim, na época colonial ele era procurado para solucionar diversos problemas dos seus devotos, desde a cura de uma doença a achar coisas perdidas e principalmente ele era solicitado como um colaborador dos senhores na captura de negros fujões. Várias torturas eram aplicadas a Santo Antônio pelos fiéis - colocar pedra sobre sua imagem, retirar o menino Jesus de seus braços, colocá-lo de cabeça pra baixo, arrancar- lhe o esplendor - com o objetivo de realizar seus pedidos, desde a intercessões em aproximações amorosas e enlaces conjugais, como hoje ainda acontece e também para recuperar os escravos fugitivos e encontrar coisas perdidas. Em um registro do século XIX, de Thomas Ewbank, viajante inglês há o relato de uma senhora que confessa que sua mãe realizava torturas a Santo Antônio a fim de localizar 2 Na Igreja Católica, Doutor e Doutora da Igreja , são homens e mulheres cujos pensamentos, pregações, escritos e forma de vida enalteceram o cristianismo.Todos eles foram considerados modelos de santidade e que contribuiram de alguma forma original (e ortodoxa) para a doutrina e espiritualidade cristã, tendo sido o título reconhecido quer por um Papa, quer por um concílio ecuménico (embora nenhum concílio tenha jamais exercido essa prerrogativa); trata-se de uma honra rara (a Igreja conta apenas 33 doctores ecclesiæ entre os seus múltiplos santos), atribuída apenas a título póstumo e após a canonização.
  • 6. seu escravo fugido. Dando várias receitas de como castigá-lo para alcançar suas solicitações, as quais foram ensinadas por sua própria mãe. Ela afirmava que, ao torturar a imagem, acelerava o atendimento do pedido e que o santo, por ter desejado em vida o sacramento do martírio, não se importaria3. Padre Antônio Vieira, que foi um grande admirador de Santo Antônio, a quem dedicou inúmeros sermões e proclamava-o Santo Universal, afirmava que a prática desses maus tratos ao santo podia ser interpretada como uma dívida, um condicionamento do santo ao cumprimento do pedido. 4 Na mentalidade dos fiéis estas práticas eram normais, apenas uma forma de alcançar os seus pedidos com mais rapidez e eficácia. Apesar de toda tortura, existe o respeito e a veneração. 1.1 A patente de Santo Antônio Durante o período colonial no Brasil a imagem de Santo Antônio recebeu diversos títulos da graduação militar, sendo promovido a patente de capitão em várias cidades, recebeu o título de tenente-coronel do próprio D. João VI quando ainda era príncipe regente, em 1814, os soldos referentes ao título militar era recebido pelos responsáveis das igrejas da cidade as quais o santo era homenageado. No período do Brasil Colônia, pela carta-régia de 07 de abril de 1707, o governo português facultou praça de Capitão, com o respectivo soldo, à Imagem do Santo Antônio do Convento de São Francisco da Bahia. Em 21 de março de 1711, confirma no posto de capitão à Imagem do Santo Antônio do Rio de Janeiro; a de Goiás, em 19 de novembro de 1750 com o soldo de 480 mil reis anuais; em 22 de fevereiro de 1784, é dado o posto de capitão à Imagem do Santo Antônio de Ouro Preto. Por decreto de 13 de setembro de 1810, D. João VI eleva o glorioso Santo, venerado aqui em nossa Cidade do Salvador, ao posto de Major de Infantaria, percebendo o soldo desta patente; promovido a Tenente-coronel com o respectivo 5 soldo... 3 MOTT, Luiz. Cotidiano e vivência religiosa: entre a capela e o calundu. In: SOUZA. Laura de Melo; NOVAIS. Fernando (orgs). História da Vida Privada no Brasil. p.187. 4 Idem, p.187 5 Jornal A Tarde de 13 de Junho de 1970. Santo Antônio – Coronel
  • 7. Um artigo publicado na Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia 6 transcreve a carta de patente de Tenente-coronel feita por D, João em 1814. Faço saber aos que esta minha carta patente virem que sendo da minha particular devoção o glorioso Santo Antônio, a quem o povo desta corte incessantemente e com a maior fé dedica os seus votos; e tendo o céu abençoado os esforços dos meus exércitos com a paz que se dignou conceder a monarquia portuguesa, crendo eu piamente que a eficaz intercessão do mesmo santo tem concorrido para tão felizes resultados: Hei por bem elevai-o ao posto de Tenente-Coronel de infantaria e com ele haverá o respectivo soldo... Estes títulos foram dados à imagem de Santo Antônio como forma de pagamento pela proteção dada durante batalhas e invasões de povos inimigos. O governador da capitania de Pernambuco concede o título de Praça a Santo Antônio antes de sair para Guerra dos Palmares. O governador desta capitania, João do Souto Maior, por portaria datada de 13 de Setembro de 1685, mandou abrir assento de Praça a Santo Antônio, afim de seguir a sua viagem para a guerra dos palmares e proteger as armas reais na conquista desse quilombo; e ao mesmo tempo expediu as necessárias ordens, para que se pagasse ao sindico do convento de Olinda o soldo e importância do fardamento que lhe 7 competiam. Com toda esta veneração, encontramos Santo Antônio em Queimadas, terra do sertão baiano, como herdeiro de uma fazenda, gados e escravos. Herança esta que lhe rendeu um processo na justiça como veremos adiante. 2- Santo Antônio no banco dos réus 2.1 As Terras de Guedes de Brito No início do século XVI, Portugal instituiu doações de terras com o objetivo de povoar as regiões em que viviam populações indígenas e as terras que eram sempre ameaçadas por invasores estrangeiros. No início do século XVI, quando Portugal, no reinado de D. João III, estabeleceu concessões de terras com o fim de povoamento em vastas regiões, nas quais viviam populações indígenas e cujas terras eram ameaçadas constantemente por invasores estrangeiros, no caso, os holandeses. Através desse processo de ocupação territorial os capitães donatários recebiam gratuitamente 50 léguas de costa, tornando-se reais proprietários de apenas 20% das terras. Os outros 80% deveriam ser distribuídas 6 Revista Trimestral do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. Ano VI, Vol. VI, n. 21. Setembro de 1899. Variedade Histórica: A patente de Santo Antônio. P. 469-472 7 Idem; p 470
  • 8. sem qualquer ônus, a título de sesmaria, cujos sesmeiros se obrigavam a cultivá-las 8 num prazo máximo de cinco anos. Através desse processo de ocupação territorial, as terras mais afastadas do litoral eram doadas a títulos de sesmaria. Tais concessões deram origem à formação de grandes latifúndios como é o caso dos Guedes de Brito. O vasto império dos Guedes de Brito foi iniciado por Antônio de Brito Correa e sua esposa Maria Guedes, e teve continuidade pelo herdeiro da família, Antônio Guedes de Brito9. A vasta extensão territorial do patrimônio dos Guedes de Brito percorria a distância entre Morro do Chapéu, Ba. até Ouro Preto, Mg, isso significava 1.333 km de terras. Antônio Guedes de Brito anexou essas terras a outras que herdara dos pais e tios no norte da Capitania da Bahia formando o segundo maior latifúndio da América portuguesa, superado apenas pelos D‟ávila, da Casa da Torre, cujos domínios estendiam-se por áreas atualmente sob jurisdição de várias unidades da federação, desde a Bahia até ao Maranhão. A leitura realizada no documento também mostra a grandiosidade das posses territoriais que os Guedes de Brito amealharam durante o período colonial seja por via familiar (herança), seja por ocupação forçada. A incorporação de outras sesmarias ao patrimônio Guedes de Brito deu-se também mediante serviços prestados à Coroa por esta família ajudando na defesa da Colônia e através do acolhimento que dava às tropas portuguesas em suas terras, Em conseqüência desses relevantes serviços, foi concedido a Antonio de Brito Correa e depois legado 10 ao seu filho - Antonio Guedes de Brito - o título de Mestre-de–Campo. Em 1676 a Coroa portuguesa designou o desembargador Sebastião Cardoso Sampaio para fiscalizar a situação das sesmarias que até aquela data haviam sido concedidas. Todos os sesmeiros fizeram declaração das suas terras com provas dos respectivos títulos. Dentre estes declarantes estava Antônio Guedes de Brito, cuja declaração de bens foi publicada na integra na Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia 11 8 NEVES, Erivaldo Fagundes. Da Sesmaria ao Minifúndio (um estudo de história regional e local). Apud VASCONCELOS, Suani de Almeida. Carta de Sesmaria- Seculo XIX: Edição Semidiplomática e Estudo Histórico. www.filologia.org.br/.../Carta_de_Sesmaria_–_Século_XIX 9 O qual se transformou em um dos homens mais importantes da Bahia seiscentista, conquistando também vários títulos como: Mestre de campo, Fidalgo de Sua Majestade, Provedor da Santa Casa de Misericórdia (1663) e Capitão de infantaria, por carta patente de 26 de fevereiro de 1667. 10 VASCONCELOS, Suani de Almeida. Carta de Sesmaria- Seculo XIX: Edição Semidiplomática e Estudo Histórico. www.filologia.org.br/.../Carta_de_Sesmaria_–_Século_XIX_ 11 Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, 1916. Ano XXIII, Vol. XI n.42. As Terras de Guedes de Brito, p. 69-74
  • 9. „As fazendas de Curráes de gados nos districtos dório Real, possuo por título de herança de meu pai Antonio Brito Correa [...] as Fazendas de Itapicurú desta parte da Bahia por escritura de compra [...] as Fazendas dos Tocós por hum título de sesmaria dado a minha Mãy Maria Guedes [...] Possuo metade da Matta de S. João, por arrematação [...] Tenho huma Fazenda de Cana em Maré...‟ O documento mostra a grandiosidade das posses territoriais que os Guedes de Brito possuíam durante o período colonial sejam por sesmarias, por herança, compradas, ou por ocupação forçada. Muitas vezes ele declara o pedido de ampliação de determinados territórios às autoridades responsáveis. Acima destas Fazendas do Itapicurú merim pedimos meu pai e eu ao Conde de Castelo melhor Governador que foi deste Estado em 26 de Outubro de 1652, principiando no Caguague, ou Caguaguena até a Serra do Tuyuyuba com oito léguas de largo. E em 2 de Março de 1665, pedi na mesma Caguague, junto ao Itapicurú por ele acima até as suas nascenças com seis léguas de largo por haverem muitos matos e serras com que não fazia toda a distância habitável, logo as povoei 12 de meus próprios currais ... Dentro desta minuciosa declaração Antônio Guedes de Brito mencionou as fazendas dos Tocós, que segundo Nonato Marques13 foi nesta parte do território dos Guedes de Brito que o município de Queimadas foi fundado. Possuo as Fazendas dos Tocos por um título de sesmaria dado a minha mãe Maria Guedes, ao Padre Manoel Guedes Lobo, a Sebastiana de Brito, a Ana Guedes em 14 de Dezembro de 1612 pelo Governador D. Diogo de Menezes. E dito Padre meu tio me fez a doação do que lhe tocava... E o Capitão Francisco Barbosa Paiva, marido de minha tia, Sebastiana de Brito fizeram venda ao meu pai do que lhes pertencia ... as quais terras povoei, descobrindo-as, fazendo estradas e pazes com os 14 índios Cariocas, Sapoias e Carapaus ... A margem direita do rio Itapicuru-Açu, existiam duas fazendas chamadas “As Queimadas”, ambas pertencentes à Dona Isabel Maria Guedes de Brito herdeira de imensos territórios deixados por seu pai Antônio Guedes de Brito. As fazendas eram chamadas de Queimadas, por causa das constantes queimas que faziam na caatinga para conseguir espaço para plantação. Durante todo processo de elevação da fazenda seja em arraial, depois em freguesia (1842), e anos depois em vila (1884) o nome do santo esteve presente na denominação desta 12 Idem, p. 70 e 71 13 Nonato Marques foi um memorialista queimadense que escreveu um livro relatando toda a história de Queimadas, desde o desbravamento das terras pelos Guedes de Brito até 1980. 14 Revista do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, 1916. Ano XXIII, Vol. XI n.42. As Terras de Guedes de Brito, p.71
  • 10. localidade. Apenas em 1915, com a lei estadual nº 1.081, que a cidade passou de Santo Antônio das Queimadas para ser simplificado apenas a Queimadas. E foi aí que começou a história do julgamento de Santo Antônio das Queimadas, a qual abordaremos a seguir. 2.2 Aparecimento da imagem de Santo Antônio em Queimadas Foi neste espaço do sertão nordestino que ocorreu a curiosa aparição de uma imagem de Santo Antônio. Segundo a história transmitida por gerações, a imagem deste Santo apareceu, inexplicavelmente, debaixo de uma árvore no alto de uma colina, local em que mais tarde, a igreja de Santo Antônio das Queimadas foi construída, lá permanecendo até hoje. A imagem foi encontrada por um vaqueiro debaixo de uma árvore, e infelizmente perdeu-se no tempo. Depois do julgamento, a imagem teria sumido e ninguém sabe seu paradeiro. Autoria: Rosa Ramos, 1980. Acervo de D. Minita. Igreja de Santo Antônio. Queimadas-Ba. Foto: Ariene Góes Queimadas-Ba Matos. 2009 As entrevistas realizadas com moradores da cidade mostram certa contradição em relação ao tipo de árvore onde a imagem teria sido encontrada. Temos várias versões: licurizeiro, pindobeira, arirí, quixabeira, figueira. Não há um consenso em relação a isso, já que a árvore foi arrancada para a construção da capela e afirmam que onde se encontra o altar principal foi o local que encontraram a imagem de Santo Antônio. Ao se deparar com a imagem, o vaqueiro a levou para a casa da dona das fazendas, Dona Isabel Maria Guedes de Brito, e ela o colocou no seu oratório. Curiosamente, no dia seguinte a imagem havia desaparecido. Mais tarde, foi encontrada no mesmo local que tinha aparecido pela primeira vez. Esse deslocamento ocorreu diversas vezes: ao sumir da casa da
  • 11. fazenda a imagem era sempre achada no local em que o vaqueiro a encontrou pela primeira vez. O fato foi dado como milagre. [...] Queimadas começou a surgir ao redor dessas queimas da fazenda então daí o nome de Queimadas, e também tem uma ligação com a imagem de Santo Antônio, o povo conta que apareceu essa imagem dejunto [sic] de uma pindoba e então os escravos que encontraram levaram até a casa da fazenda. A senhora da fazenda muito piedosa chamou todo mundo para avisar e deixou a imagem dentro da casa da fazenda, daqui a uns dias a imagem desapareceu e foi achada de novo no lugar 15 onde tinha sido encontrada no início e assim outras vezes [...] Os sucessivos aparecimentos e desaparecimentos da imagem de Santo Antônio chegaram ao conhecimento de alguns missionários capuchinhos que lá estavam de passagem. Eles aconselharam Dona Isabel Guedes de Brito a construir uma capela em consagração ao santo no mesmo local onde a imagem apareceu transformando, daquele dia em diante, Santo Antônio em padroeiro da localidade, que passou a se chamar Santo Antônio das Queimadas. A história do aparecimento da imagem de Santo Antônio em Queimadas logo foi conhecida por toda redondeza. Logo após a construção da capela, começou as romarias e peregrinações dos sertanejos, os quais vinham conhecer a imagem que tinha aparecido misteriosamente. Vinham prestar veneração, fazer e pagar promessas ao Santo tão milagroso. Depois da construção da capela, Dona Isabel franqueou terras a quem quisesse morar naquela localidade. Assim o povoado começou a se formar a margem direita do rio Itapicuru. Muitos destes novos moradores eram peregrinos que vieram para venerar a imagem de Santo Antônio e resolveram residir no local. Neste espaço nordestino que por si só é um local místico, onde o povo tem muita fé, Santo Antônio recebeu de Dona Isabel Maria Guedes de Brito, a dona das fazendas, uma herança. Segundo Nonato Marques, memorialista queimadense, após a morte de Dona Isabel seus bens foram legados àquela imagem de Santo Antônio: terras, escravos, gados. Estes bens eram administrados pela freguesia de Sant‟Ana do Tucano, que jurisdicionava Santo Antônio das Queimadas16. 2.3 - A prisão de Santo Antônio 15 Entrevista realizada com Sr. Marcelo* no dia 23 de julho de 2009* (Os nomes dos entrevistados são aqui substituídos por nomes fictícios a fim de preservar suas identidades.) 16 MARQUES, Nonato. Santo Antônio das Queimadas. Salvador, 1984. p.94
  • 12. Segundo a memória coletiva dos queimadenses, entre o final do século XVIII e início do século XIX (não temos como comprovar com exatidão data por falta de documentação), Queimadas teria passado por um dos episódios mais pitorescos da história da religiosidade brasileira: o julgamento civil da imagem de Santo Antônio. Depois de uma noite de louvação a Santo Antônio, um homem foi assassinado e o corpo foi colocado no adro da igreja. No sertão daquela época se fosse encontrado um morto na frente da porta da casa de qualquer pessoa, o dono da casa seria responsável pelo crime. Nós sabemos que a lei daquela época quando tinha um crime, uma morte violenta de alguma pessoa onde se encontrasse o cadáver da pessoa o dono da casa respondia processo. Dizem os antigos que houve uma festa e uma briga entre os escravos e então houve um crime e deixaram o corpo na frente da igreja Santo Antônio e por isso foi como a lei mandava, foi aberto um processo contra Santo 17 Antônio. Tinha aquela lei que onde aparecia a arma do crime, quem era condenado era o dono da casa onde a arma tinha aparecido, aí eles mataram um escravo e 18 deixaram a arma, a faca lá na igreja, aí quem foi condenado foi Santo Antônio. Sendo assim o crime foi atribuído a um escravo que pertencia a Santo Antônio, pois o mesmo teria desaparecido neste dia sem explicações e nunca mais foi encontrado. Diante do acontecido à imagem do santo foi responsabilizada pelo crime cometido por seu escravo. Isso se deu por causa de uma lei do período que penalizava o senhor pelos delitos cometidos pelos seus escravos, caso este não o entregasse na mão da justiça. [...] um escravo de Santo Antônio que cometeu o crime e fugiu, e tinha uma lei naquele período que era muito respeitada, nessa região, que afirmava que se um escravo cometesse um crime qualquer, quem pagaria por aquele crime era o dono 19 do escravo [...] Segundo alguns entrevistados era uma lei colonial, mas Câmara Cascudo comenta sobre o episódio do julgamento de Santo Antônio citando que era uma lei do código criminal do império, artigo 28, que segundo ele dizia que “o senhor do escravo era responsável pela 17 Entrevista realizada com Sr. Marcelo* no dia 23 de julho de 2009 18 Entrevista realizada com Sr. José * no dia 13 de novembro de 2009 19 Entrevista realizada com Marcelo* no dia 19 de outubro de 2009
  • 13. 20 pena pecuniária devida pelo servo até os limites do seu próprio valor”. Mas o código criminal do império, artigo 28,21 diz o seguinte: Art. 28. Serão obrigados a satisfação, posto que não delinqüentes: 1º senhor pelo escravo até o valor deste. 2º que gratuitamente tiver participado dos produtos do crime até a concorrente quantia. Em razão da interpretação desta lei, a imagem de Santo Antônio teria sido obrigada a pagar pelo crime do seu escravo. Aprisionaram a imagem do santo nas terras dos Guedes de Brito amarando-a no lombo de um jegue ou de um burro e levaram para a comarca de Água Fria a mando do juiz, pois a localidade de Santo Antônio das Queimadas pertencia à comarca de Água Fria. O Santo passou 30 dias preso na cadeia local no quarto da forca, e o místico pavor dos moradores fez com que enquanto durasse a prisão do Santo, a cadeia se transformasse na igreja da cidade. Centenas de pessoas iam para ali rezar e pedir perdão ao Santo. Mas os juizes, famosos pela sua austeridade, submeteram Santo Antônio a um longo julgamento. (...) sabe apenas que a imagem participou de duas audiências, sentou-se no banco dos réus, teve defensor e que duas testemunhas da 22 apresentação da prisão foram ouvidas. A justiça de Água Fria que tinha um poder temido em toda região, julgou e condenou a imagem do santo à perda dos seus bens, os quais herdara, como já foi mencionado, de sua devota, Isabel Maria Guedes de Brito. Os bens de Santo Antônio foram confiscados e levados hasta pública para pagar à custa do processo. Segundo Nonato Marques, um coronel chamado Francisco de Paula Araújo Brito, fazendeiro da Inhambupe comprou as terras, mas não foi tomar posse. Naturalmente Santo Antônio não podia ter feito esse crime não é, mas foi a julgamento justamente para ser esclarecido que Santo Antônio não foi o criminoso, e sim que tinha que encontrar criminosos em outras bandas né! [...] mas tinha que pagar as custas do processo, então o único que tinha bens era Santo Antônio, então correu pra achar os bens de Santo Antônio que era gado , era escravos, que era as terras, e correu pra achar esses bens , sobretudo das terras , por que as donas do 23 terreno tinha deixado 6 léguas em volta de propriedade de Santo Antônio. 20 CASCUDO, Luiz da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 4ª Ed. São Paulo. Melhoramentos, 1979. p. 62 – 63 Verbete: Antônio 21 Código Criminal do Império do Brasil. Parte Primeira. Dos Crimes e das Penas. Art. 28. Disponível em: <www.ciespi.org.br/base_legis/legislacao/COD11a.html> 22 Jornal da Bahia, Edição Especial, 10-05-1976. Prisão de Santo foi maldição para Queimadas e Água Fria. 23 Entrevista realizada com Sr. Marcelo* no dia 23 de julho de 2009
  • 14. Anos depois da compra destas terras, os herdeiros de Francisco de Paula é que foram reivindicar estas terras, porém boa parte delas já estavam sendo habitada por muitas pessoas. Estes herdeiros começaram a cobrar imposto destas pessoas, os chamados foros das terras. Esse leilão vamos dizer assim ficou deserto , ninguém queria arrematar essas terras, até quando apareceu um português que tinha um pouco de condição né, em Salvador, então disseram: olha tem umas terras ai assim, assim, no leilão...vai lá no fórum, e ai ele foi e adquiriu essas terras, né. Mas nunca veio tomar posse, então as terras ficaram indivisas. Cada qual construiu a sua casinha onde queria e pronto. Até esse senhor português morreu teve dois filhos, não é, então um dos dois filhos achou que podia explorar isso, chegar em Queimadas e dizer essas terra é minha , eu sou o herdeiro, então cada qual me paga a sua taxa da terra onde 24 construíram. Não temos a data em que estes herdeiros chegaram a Queimadas, apenas a data de 1943 em que alguns moradores se uniram e compraram as terras a estes herdeiros. Segundo alguns entrevistados, os moradores que compraram estes terras tinham um poder aquisitivo melhor que os outros, se uniram e fizeram uma sociedade para comprarem a metade das terras de Queimadas, dividindo a quantia para cada um, mas há uma contradição na quantidade destes moradores, tendo uma variação de 25, 35, quarenta e 42 pessoas. Existe uma certidão de compra de terras expedida pela comarca de Bonfim, em 1943, que especifica os 36 moradores que tinham comprado as terras de Queimadas nas mãos do Senhor Eduardo Pondé de Mendonça e sua esposa Olinda Brito Pondé25. Outro senhor chamado Jaconias comprou a outra metade das terras de Queimadas. Não temos conhecimento das mãos de quem o senhor Jaconias teria comprado a outra parte, pois não tivemos acesso a nenhuma documentação sobre o assunto. Apenas a fala de um dos entrevistados que diz que havia seis herdeiros das terras de Queimadas, e que este senhor teria comprado a parte das terras de cinco herdeiros e os outros que se associaram compraram a parte de apenas um herdeiro. Estes novos donos das terras de Queimadas passaram a doar e a vender os lotes destas terras. Nas entrevistas, muitos dizem ter conhecido alguns desses compradores, testemunham também que as terras onde moram foram compradas por seus pais e familiares nas mãos de alguns destes sócios. Na entrevista com um filho de um desses sócios, ele afirmou que já deu várias escrituras das terras e que até hoje ele tem poder pra fazer isso. Ele pode expedir escritura das terras em qualquer local da cidade de Queimadas, pois os sócios não dividiram as terras por 24 Idem 25 Livro. 3-D. Transcrição das Transmissões: As fls 94. Ano de 1943. Nº de ordem: 5.611.
  • 15. lotes. A parte que eles compraram pertencia a todos. E que o pai dele foi um dos poucos que deixara um inventário para os filhos. 3- A idéia de castigo Depois do processo criminal a imagem de Santo Antônio supostamente desapareceu. Ninguém sabe o paradeiro da imagem, como dissemos acima. O mesmo aconteceu com a documentação do processo judicial que até hoje não foi encontrada nos arquivos de Água Fria, de Queimadas, de Irará, pra onde foi transferida a sede da comarca, nem no Arquivo público da Bahia. Décadas depois, alguns políticos locais tentaram reaver o processo e recuperar a imagem para trazê–la à cidade de Queimadas, mas a tentativa foi inútil: eles não conseguiram encontrar nem a imagem, nem o processo judicial. Não se sabe precisamente a data desse acontecimento. Não foi encontrado nenhum documento que indique uma data precisa para esse processo de julgamento civil. Tem algumas especulações por alguns jornais e um memorialista local sobre datas prováveis, final do século XVIII, início do século XIX, mas nada decisivo. “Assim corre e ressurge para os moradores da região a velha história da maldição, que data dos fins dos séculos XVIII.”26. Os entrevistados afirmam que esta história era contada por seus bisavós, avós, pais, tios ou pessoas de mais idade. Desde quando eu me entendi por gente que eu lembro que as pessoas mais velhas falavam que Santo Antonio, a imagem de Santo Antônio apareceu lá onde é a igreja de Santo Antônio hoje, e depois prenderam esta imagem levaram pra Água 27 Fria e depois de Água Fria sumiu, ninguém sabe pra onde. Depois do episódio do julgamento foi cultivada uma idéia de castigo e maldição, tanto para Água Fria, quanto para Queimadas. “Eu acredito (na idéia de castigo), Água Fria acabou, não tem nada. Aqui o povo ainda faz alguma coisa, mas a cidade é fraca, é derrubada.”28. Água Fria, era um centro comercial muito importante, era sede da comarca de toda a região. Segundo o jornal da Bahia, foi depois do julgamento da imagem de Santo Antônio, que Água Fria perdeu sua autonomia de comarca para Irará, que foi um dos seus distritos. A 26 Jornal da Bahia, 13 de junho de 1972. Preso o Santo, esta cidade deu pra trás. 27 Entrevista realizada com Dona Maria* no dia 22 de Outubro de 2009 28 Entrevista realizada com a Srª Joana* no dia 15 de novembro de 2009
  • 16. cidade começou a perder sua importância e sua riqueza, muitos moradores se mudaram para outra cidade, a cidade começou a “morrer”. Até hoje a cidade não conseguiu se desenvolver. A partir da prisão do Santo Antônio e do seu julgamento, a miséria se abateu, principalmente sobre Água Fria, onde ele ficou enclausurado no quarto da força, da cadeia local. Se verdade ou não, o certo é que Água Fria que exercia domínio econômico de Juazeiro ao porto de Cachoeira, hoje não passa de ruínas. Perdeu 29 inclusive, dias após o julgamento de Santo Antônio sua autonomia para Irará. A partir daí a cidade de Água Fria começou a morrer. Hoje, do importante centro comercial que foi outrora, não passa de ruínas, silencio. Com menos de mil habitantes, ruas vazias, a grande praça verde, a grandiosa igreja de outrora, as 30 ruínas da cadeia antiga vai desaparecendo aos poucos. Em Queimadas esta idéia de maldição também foi cultiva, por muitos supersticiosos, ligando tudo o que acontecia de ruim à cidade a prisão de Santo Antônio. Entre 1910 e 1911, Queimadas sofreu a duas enchentes do rio Itapicuru-Açu a primeira em 26 de dezembro de 1910 e a segunda no final de fevereiro de 1911. Estas enchentes consecutivas destruíram a cidade, das 450 casas existentes só restaram cinquenta. A população de 2.500 habitantes foi reduzida a mil. Isto só fortaleceu a idéia de castigo sobre Queimadas. Em menos de vinte e quatro horas a impetuosidade do Itapicuru-Açu arrastou rio a baixo quase que totalidade das casas, restando em pé 28 residência erguidas em 1845 e mais 22 outras, nas colinas a margem esquerda da ferrovia. De 2.500 foi reduzida para mil a população da cidade e isto provocou em 6 de março de 1911, a transferência da sede do Termo para o arraial de Itiúba . Era a maldição que se 31 repetia. Até hoje encontramos escombros das casas que foram destruídas nesta época, boa parte da igreja Matriz, que estava sendo construída toda de pedra, foi derrubada ficando apenas a fachada, até hoje existente nas intermediações dos Lions Clube. Depois deste episódio, Queimadas foi reconstruída distante das margens do rio Itapicuru, onde está localizada a prefeitura e a cadeia pública. As casas foram construídas nesta área, mas com o aumento da população muitas pessoas construíram suas casas no mesmo local onde as enchentes destruíram as antigas casas de Queimadas. Essas sofreram 29 Jornal da Bahia, Edição Especial, 10-05-1976. Prisão de Santo foi maldição para Queimadas e Água Fria 30 Idem 31 Idem
  • 17. várias outras enchentes e permanecem erguidas graças ao material utilizado atualmente que são mais fortes, como tijolo, cimento, cal..., do que o adobe, a taipa, o barro que era usado pra construir as casas antigamente. Queimadas sofreu com mais dois acontecimentos catastróficos que para muitos místicos só é mais uma prova de que Queimadas é um lugar amaldiçoado: a guerra de Canudos (1896) e um assalto cometido por Lampião (1929) os quais tiraram à paz da cidade. Durante a Guerra de Canudos, Queimadas serviu de ponto de chegada e de partida das tropas dos soldados, jornalistas, médicos e políticos, que vieram combater em Canudos. Assustando os moradores a ponto de largarem suas casas e se esconderem dentro do mato. Da mesma forma, o assalto que Lampião realizou em Queimadas em 22 de dezembro de 1929 foi também um momento muito difícil para seus moradores, pois além de saquear toda a cidade ele assassinou sete soldados que prestavam serviços na segurança da cidade. Este episódio foi interpretado como mais uma forma de castigar a cidade de Queimadas por causa da condenação de Santo Antônio. Em algumas entrevistas ainda vemos que esta idéia de maldição ainda permanece no imaginário das pessoas, fixando a idéia que os moradores de Queimadas pagam pelos erros cometidos no passado por seus antepassados, pois a cidade não progride, até consegue algumas vitórias, mas logo depois as perde. Como afirma Wunenburger “o imaginário serve para dotar os homens de memória fornecendo-lhes relatos que sintetizam e reconstroem o passado e justificam o presente.32” Santo Antônio foi um Santo muito sofrido eu lembro que a minha avó falava que na época tinha um padre que saiu de Queimadas e bateu a terra das sandálias dizendo: que Queimadas era de ser queimadas pro resto da vida. E dessa vez, acho que nós 33 hoje não temos nada com isso, estamos pagando alguma coisa, né? Depois disto vieram àqueles capuchinhos e disse que Queimadas tinha que ser queimadinha, que ia ter um dilúvio que ia acabar com a cidade, justamente no ano de 11, passou a enchente carregou a metade da igreja da Matriz e aí vem acontecendo isso, Queimadas ta cada vez mais afundando e parece que tem que ser 34 Queimadinha mesmo! Tudo indica que parece, cada vez vai piorando. 32 WUNENBURGER. O imaginário. São Paulo. Loyola, 2007. p.63 33 Entrevista realizada com Dona Maria* no dia 22 de Outubro de 2009 34 Entrevista realizada com Sr. João* no dia 10 de Julho de 2009
  • 18. Queimadas é chamada por muitos dos seus moradores da cidade do “que já teve”, pois durante os seus 125 anos de existência já foi bastante próspera, com o maior núcleo populacional da região. E hoje é uma cidade sem muitos progressos. Cidade do que já teve, consolidou como um ditado popular por causa das coisas que já existiram em Queimadas e que com o tempo não progrediram, ao contrário se dissiparam. Queimadas vivia praticamente da produção de sisal, hoje quase que não encontramos cultivo de sisal na cidade, as batedeiras – locais onde se processava o sisal para depois ser exportado para outras cidades – quase que não funcionam mais. “Os homens inventam, desenvolvem e legitimam suas crenças em imaginários na medida em que essa relação como imaginário obedece as necessidades, satisfações, efeitos a curto e a longo prazo que são inseparáveis da natureza humana.” 35 Houve várias agências bancárias – Baneb, Brasil, Nordeste - hoje apenas existe Banco do Brasil e uma cooperativa de crédito de produtores e cooperados - ASCOOB. Teve duas filarmônicas; Queimadas foi sede da COELBA – empresa responsável de distribuição de energia da Bahia; as tradições populares estão minguando a cada ano que se passa existiam várias festas populares como cantos de reis, carnaval, São João, desfile cultural no dia da lavagem da igreja de Santo Antônio, hoje transformada em micareta, dentre outras. “Queimadas já teve, já teve várias coisas que acaba! Várias coisas e caiu, teve duas coletorias, teve federal e teve estadual, perdeu. Até a Coelba que era daqui perdeu também, foi pra outra cidade, até a embasa é dominada de Santa luz.”36 Queimadas já teve algumas fábricas que possibilitaram a muitos jovens e pais de família a terem um emprego na própria cidade, mas infelizmente não durou muito tempo fechando e forçando a ida de muitas pessoas tentarem melhorias de vida em outras cidades maiores com mais chances de empregos. Outro fato que entristece a população inteira é o abandono do rio Itapicuru, rio que banha a cidade, que sustenta muitas famílias e que poderia sustentar muito mais, está morrendo a cada dia. Recebendo os esgotos da cidade inteira, sem tratamento, entulhado por areia em pontos centrais, as encostas estão sendo devastadas, as pessoas jogam lixo na beira do rio. A cidade hoje é sustentada basicamente pelos empregos que a prefeitura disponibiliza alguns empregos estaduais, pelos aposentados que às vezes sustenta famílias inteiras, pelo pequeno comércio local, por pequenos agricultores e pecuaristas. Nada muito 35 WUNENBURGER. Op.cit. p.54 36 Entrevista realizada com Sr. João* no dia 10 de Julho de 2009
  • 19. significativo, grande prova disso é que a maioria dos jovens sai em busca de condições financeira para uma melhoria de sua vida. Este ditado da cidade do que já teve é conhecido também em várias outras cidades, pessoas que já moraram ou que tem parentes em Queimadas ou turistas atribuem este ditado a cidade diante dos acontecimentos. Muitos dos entrevistados concordam com o ditado e afirmam que é resultado da prisão de Santo Antônio, como uma forma de castigo para pagar tal atitude que envergonha a cidade. Mas também temos muitas pessoas que concordam com o ditado da “cidade do que já teve”, porém não concordam com a idéia de castigo. E sim que as coisas que deixaram de existir em Queimadas é reflexo das atitudes do corpo administrativo que desde o início comandam a cidade, os quais só pensam em crescer suas contas bancárias e não pensam no bem do povo e da cidade. Bem esse ditado é interessante né, por que as vezes as pessoas fazem essa gozação da própria cidade , né, mas se a gente observar bem toda cidade, é cidade do já teve, né, por que as coisas se evoluem, então hoje tem precisão de ter uma coisa, uma organização, e bom tem, amanha as coisas mudam, também essas coisas vai passando vai se multiplicando ,essa gozação que o povo tem é por que as vezes umas coisas que parecem que florescem, não é , de uma hora pra outra esmorecem, mas isso é na minha opinião é coisa comum, não é só em Queimadas que acontece 37 isso! A idéia do já teve existe. O que a senhora pensar Queimadas já teve. Queimadas já teve três bandas de músicas, Queimadas já teve três clubes, hoje não tem nenhum funcionando, né, agora, é uma infinidade de coisas que Queimadas já teve que não tem mais. (...) Mas não tem influência disso (a prisão de Santo Antônio). É 38 que nossos políticos não se interessam em adquirir as coisas... Queimadas é uma cidade centenária que tem um desenvolvimento tardio, seus moradores terminam se acomodando com a situação uns atribuindo isto ao julgamento do santo como forma de pagar por este pecado e outros culpando a ação dos administradores em geral, mas sem se colocarem como agente ativo deste desenvolvimento e também responsável pelo retrocesso da cidade. 37 Entrevista realizada com Sr. Marcelo* no dia 23 de julho de 2009 38 Entrevista realizada com Sr Zeca* no dia 18 de agosto de 2009
  • 20. Conclusão A história da fundação da cidade de Queimadas está atrelada ao suposto aparecimento da imagem de Santo Antônio. Depois da construção da capela os romeiros vinham venerá-la e muitos desses ficaram definitivamente morando em Queimadas. E com a facilidade dada pela dona das fazendas, Maria Isabel Guedes de Brito, para quem quisesse residir, a localidade começou a crescer e se desenvolver. As trezenas que acontece todo ano, 1 a 13 de junho, atraem várias pessoas de cidades vizinhas e dos povoados em torno de Queimadas, para acompanhar as procissões, as orações e os leilões. O julgamento da imagem de Santo Antônio é um episódio misterioso, não temos explicações para tal atitude na lei humana. Levando em conta que a veneração e o respeito que era prestada a todos os santos, principalmente a Santo Antônio que era um santo muito requisitado pelos fiéis para resolver todo o tipo de problemas, passando por arrumar um marido, achar coisas perdidas até curar doenças. Até títulos militares ele ganhou por causa da sua proteção. Mesmo não tendo fontes documentais que comprove que a imagem de Santo Antônio das Queimadas passou por um julgamento criminal, esta história foi passada por gerações através da oralidade, ficando viva até hoje no imaginário dos queimadenses, sendo um forte fato que faz parte do histórico da cidade. Diante de todas as observações leva-nos a pensar que houve uma necessidade da população de apropriar-se da representação da condenação de um santo para justificar a decadência da cidade. Apesar da idéia de castigo ainda permanecer no imaginário de alguns moradores queimadenses, muitos já se libertaram desta idéia responsabilizando o homem como o único culpado pela regressão acontecida a cidade. E que o homem é também responsável pelo progresso e que deve lutar por isso, sem ficar se escondendo atrás de uma lenda, usando-a para querer justificar tudo de ruim que acontece.
  • 21. Referências ANTONIO Guedes de Brito. Disponível em <http://pt.wikipedia.org/wiki/Antonio_Guedes_de_Brito> ARAÚJO, Regina Mendes de. Proprietárias de escravos e terras da Vila do Carmo, Vila Rica e Vila de São João Del Rei – 1718-1761. Disponível em: <http://www.abep.nepo.unicamp.br/encontro2006/docspdf/ABEP2006_176.pdf > AS TERRAS de Guedes de Brito Revista Trimestral do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, 1916. Ano XXIII, Vol. XI n.42., p. 69-74 ARANTES, Antônio Augusto. O que é cultura popular. São Paulo: Brasiliense, 2007. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Os Deuses do Povo: um estudo sobre a religião popular. Brasiliense, 1986 BURKE, Peter. A Escrita da História: novas perspectivas. São Paulo: UNESP, 1992 CARTA de Sesmaria. Disponível em: <http://www.filologia.org.br/scripta_philologica/01/Carta_de_Sesmaria > CASCUDO, Luiz da Câmara. Dicionário do Folclore Brasileiro. 4ª Ed. rev.e aum. São Paulo. Melhoramentos,[Brasília]: INL, 1979. p. 62-63 CODIGO CRIMINAL Do Império Do Brazil. Parte Primeira. Dos Crimes e das Penas. Art. 28. Disponível em: <http://www.Ciespi.Org.Br/Base_Legis/Legislação./COD11a.Html> Acesso em: 13out 2009 DOUTORES da Igreja. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/Doutores_da_Igreja> DURAND, Gilbert. O imaginário: ensaio acerca das ciências e da filosofia da imagem. 3ª ed. Rio de Janeiro: DIFEL, 2004. DURKHEIM, Émile. As formas elementares de vida religiosa: o sistema totêmico na Austrália. São Paulo: Paulinas, 1989 GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes: o cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela Inquisição. São Paulo: Companhia das letras, 1987 HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Centauro, 2006. LAPLANTINE, François; TRINDADE, Liana Sálvia. O que é imaginário. São Paulo; Brasiliense, 2003. MARQUES, Nonato. Santo Antônio das Queimadas. S. l.: s. n. 1984 MEIHY, José Carlos Sebe Bom. Manual de história oral. 5ª ed. São Paulo: Loyola, 2005
  • 22. MOTT, Luiz. Cotidiano e vivência religiosa: entre a capela e o calundu. In: SOUZA. Laura de Melo; NOVAIS. Fernando (orgs). História da Vida Privada no Brasil: cotidiano e vida privada na América portuguesa. São Paulo: Companhia da Letras, 1997. PALLARES- BURKE, Maria Lúcia Garcia. Introdução. In: As muitas faces da história. Nove entrevistas. São Paulo: UNESP, 2000. PRESO O SANTO, ESTA CIDADE DEU PRA TRÁS. Jornal da Bahia. Salvador, 13 de jun 1972, p.3 PRISÃO DE SANTO FOI MALDIÇÃO PARA QUEIMADAS E ÁGUA FRIA. Jornal da Bahia Edição Especial, 13 de jun 1976, p.? QUEIMADAS. Disponível em: <http://wikimapia.org/653868/pt/Queimadas-Bahia-Brasil> RIO São Francisco. Disponível em: < www.wikipedia.org/wiki/Rio_São_Francisco> SANTO ANTÔNIO – CORONEL. A Tarde, 13 de jun. 1970, p.? SILVA, Lourenço Pereira. Memória Histórica e Geográfica de Bonfim. [s.l]: [s.ed], 19... VARIEDADE Histórica: A patente de Santo Antônio. Revista Trimestral do Instituto Geográfico e Histórico da Bahia. Ano VI, Vol. VI, n. 21. Setembro de 1899. Variedade Histórica: A patente de Santo Antônio. P. 469-472. VASCONCELOS, Suani de Almeida. Carta de Sesmaria- Seculo XIX: Edição Semidiplomática e Estudo Histórico. Disponivel em : <http:// www.filologia.org.br/scripta philologica/01//Carta_de_Sesmaria_–_Século_XIX_ Acesso em: 22 julh. 2009 WUNENBURGER, Jean-Jacques. O imaginário. São Paulo. Loyola, 2007.