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O Sábado na Bíblia
Por que Deus faz questão de um dia
Sumario
Prefacio
1. Princípios de Interpretação Bíblica
Métodos de interpretação bíblica
Filtros da mensagem bíblica
A Bíblia como sua própria intérprete
Resumo
2. Origem do Sábado
O relato de Gênesis 1-11
Os "dias" da criação O sétimo dia da criação Resumo
3. O Sábado no Antigo Testamento
O sábado do Éden ao Sinai
O sábado na aliança do Sinai
O sábado durante a peregrinação no deserto
O sábado na terra prometida
O sábado nos dias dos profetas
O sábado no período pós-exílico
Resumo
4. O Sábado no Período Intertestamentário
O sábado nos dias dos Macabeus
O sábado sob os mestres do judaísmo
Resumo
5. O Sábado no Novo Testamento Cristo e a lei
Colhendo espigas no sábado Curando no sábado O sábado e a paixão de Cristo O sábado e a
queda de Jerusalém O sábado na igreja apostólica Alusões ao "primeiro dia da semana" A igualdade
entre os dias A perpetuidade do sábado Resumo
6. Mudança do Sábado Para o Domingo
O culto ao Sol no Império Romano
O domingo no cristianismo pós-apostólico
Mudança de ênfase
Resumo
7. O Significado do Sábado
Natureza do sábado
Abandono e restauração do sábado
Bênçãos do sábado
Resumo
8. A Observância do Sábado
Ruptura com a rotina da vida
Preparação para o sábado
Recepção e despedida do sábado
Atividades impróprias para o sábado
Atividades próprias para o sábado
Situações especiais Resumo
Conclusão
PREFÁCIO
O mundo moderno acelerou o ritmo da vida de grande parte da população a uma velocidade sem
precedentes na história humana. Na esfera profissional, espera-se uma produção cada vez maior e de
melhor qualidade. No âmbito acadêmico, os estudantes devem assimilar um volume crescente de
informações, que vão se desdobrando em profundidade e complexidade. Com a globalização das
comunicações e, consequentemente, das informações, muitas pessoas hoje vivem cumprindo agendas
predeterminadas, quase sem tempo para a vida espiritual, familiar e social. Não tendo sido
originalmente criadas para conviver com tantas responsabilidades e preocupações ao mesmo tempo, as
pessoas são obrigadas a conviver com elevados graus de estresse individual e coletivo. Num mundo em
que as coisas e os compromissos são quase mais importantes do que a própria vida, a observância do
sábado bíblico é de uma relevância incalculável. O sábado representa uma ruptura com a tirania das coisas e
a rotina da vida, para prover um tempo especial dedicado a Deus, à família, aos amigos e às pessoas
necessitadas. Mais do que mero feriado semanal, esse dia é, em realidade, um canal das bênçãos divinas
(Gn 2:3; Is 58:13, 14) e um "sinal" da lealdade ao Criador (Êx 31:16, 17). Prescrita pelo próprio dedo de
Deus sobre tábuas de pedra (Êx 31:13-18; Dt 4:13; 9:9-11), a observância do sábado precisa ser redescoberta
e reenfatizada no mundo contemporâneo. Várias obras foram publicadas nos últimos anos nos Estados
Unidos sobre o significado e a relevância da observância do sábado.1
Mas a histórica discussão sobre o
verdadeiro dia de guarda cristão (sábado ou domingo)2
continua acesa nos círculo cristãos.3
É importante
reconhecermos a existência de uma antiga tradição britânica e norte-americana de usar o termo
religioso Sabbath (sábado) para designar o Sunday (domingo civil), e a expressão seventh-day Sabbath
(sábado do sétimo dia) para o Saturday (sábado civil). Seguindo essa tradição, muitos autores
modernos continuam usando o termo Sabbath em alusão ao descanso dominical. Este estudo tem por
objetivo apresentar urna visão geral do ensino bíblico sobre o sábado baseada em princípios de
interpretação que permitam que a própria Bíblia exponha o que ela tem a dizer sobre o assunto. Assim,
o primeiro capítulo demonstra as principais dificuldades com alguns métodos inadequados de
interpretação bíblica e alguns filtros que conspiram contra uma compreensão honesta das Escrituras,
sugerindo princípios fundamentais de interpretação. Com base no princípio da Bíblia como sua própria
intérprete, os capítulos 2 a 5 consideram o tema do sábado ao longo das Escrituras. A questão da mudança
do sábado para o domingo é abordada no capítulo 6. E, por último, os capítulos 7 e 8 tratam
respectivamente do significado e da observância do sábado. Sou imensamente grato pelo apoio de minha
esposa, Marly, e a compreensão dos nossos filhos, Suellen, William e Shelley, durante o período de
pesquisa e redação deste projeto. A Marly acabou assumindo bondosamente muitas das atividades que
deviam ter contado com a minha participação.
Uma palavra especial de apreciação a Elias Brasil de Souza, Marcos De Benedícto, Mario Riveros
Echeverry e Roberto Pereyra, por terem lido o conteúdo básico do livro e oferecido pertinentes sugestões;
bem como a Cristina Morán, minha secretária, pela assistência ao longo do projeto. Porém, minha gratidão
suprema é dedicada a Deus, que instituiu e preservou o sábado como um canal de bênçãos à humanidade.
PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO BÍBLICA
Em um vôo dos Estados Unidos para o Brasil tive um diálogo interessante com urna jovem
norte-americana, que vinha ao nosso país como estudante missionária. Ela me disse que estudava
Teologia em uma instituição conservadora norte-americana que tomava a Bíblia realmente a sério. Ao
me identificar como teólogo adventista do sétimo dia, seu interesse pelo diálogo aumentou ainda mais.
Não contendo sua curiosidade, ela disse: "Jamais tive a oportunidade de conversar com um adventista
do sétimo dia. Você poderia me explicar as principais crenças de sua igreja?" Após discorrermos sobre
alguns ensinamentos bíblicos, mencionei que uma das razões que levam os adventistas a observar o
sábado é o fato de Deus ter não apenas descansado no sábado, mas também abençoado e santificado
esse dia (Gn 2:2, 3). A jovem reagiu espontaneamente: "Mas você não pode tomar esse relato como
literal, uma vez que todo o conteúdo de Gênesis 1-11 é apenas simbólico!" Ponderei, então, com ela: "Se
você estuda em uma instituição conservadora, que toma 'a Bíblia realmente a sério', por que considera o
conteúdo de Gênesis 1-11 apenas simbólico?" O diálogo continuou de maneira respeitosa e
amigável, mas uma coisa ficou bem clara em minha mente: grande parte dos debates ao longo da
história cristã sobre a observância do sábado e do domingo tem sido de natureza hermenêutica, sendo
nutridos por divergentes métodos de interpretação bíblica e tendenciosos filtros pessoais. Em outras
palavras, a questão da perpetuidade, da descontinuidade ou da substituição do sábado como dia de
repouso cristão depende da perspectiva pela qual a pessoa estuda as Escrituras Sagradas.
Métodos de Interpretação Bíblica
Gerhard Ebeling sugere que "a história do cristianismo é a história da exposição das Escrituras".1
Portanto, a familiaridade com os diferentes métodos de interpretação bíblica é fundamental para a
compreensão dos debates em torno das doutrinas bíblicas, incluindo o próprio sábado. O conteúdo a
seguir aborda resumidamente como a Bíblia e o sábado têm sido encarados sob o impacto de alguns dos
métodos de interpretação mais influentes do pensamento cristão. No período pós-apostólico,
intérpretes cristãos comprometidos com a filosofia grega passaram a alegorizar o texto sagrado a ponto
de o método alegórico se tornar predominante no cristianismo medieval.2
Muitos sentidos ocultos e
artificiais impostos à Bíblia foram defendidos por autoridades eclesiásticas. Assim, textos bíblicos que
confirmam a observância do sábado passaram a ser relidos alegoricamente, de modo a dar espaço à
emergente observância do domingo.3
Por exemplo, o próprio relato da criação, que estabelece a
observância do "sétimo dia" (Gn 2:2, 3), era usado em favor do domingo, pois foi no "primeiro dia" que
Deus criou a luz (Gn l :3-5).4
Com esse tipo de reinterpretação, o sábado bíblico acabou sendo
destituído de seu significado. Outro golpe na doutrina do sábado veio através do método crítico-histórico,
que recebeu significativo impulso no fim do século 18, com o surgimento do racionalismo iluminista.5
Este
método de análise literária, quando aplicado ao estudo da Bíblia, reduz o texto sagrado a mero produto do
contexto sociocultural em que o referido texto veio à existência.6
Dessa forma, muitos ensinos bíblicos
acabaram perdendo seu caráter normativo. Considerando o conteúdo de Gênesis 1-11 como mitológico,
o sábado passou a ser visto, por exemplo, como um antigo costume babilônico7
ou cananita,8
incorporado
posteriormente pelos hebreus, e não mais pertinente para os cristãos modernos. Na passagem do século
19 para o século 20 começou a se popularizar entre os evangélicos norte-americanos o método
dispensacionalista de interpretação bíblica, que normalmente divide a história humana em sete
dispensações ou períodos diferentes.9
Sendo que cada dispensação é tida como distinta das demais, os
princípios de uma não se aplicam necessariamente às outras. Limitando a vigência do sábado à chamada
"dispensação da lei" (para o antigo Israel), os adeptos desse método consideram a observância do sábado
antiquada para a atual "dispensação da igreja" (para a igreja cristã).10
Já no fim do século 20 estava sendo difundido em muitos círculos cristãos liberais o
métoáo-pós-moderno de considerar o próprio leitor o referencial de interpretação ("reader-oriented
approach").11
Rompendo tanto com o caráter normativo do texto bíblico quanto com as tradições
eclesiásticas predominantes, este método, de natureza essencialmente pluralista, deixa as Escrituras
abertas a uma grande variedade de interpretações conflitantes. Assim, a aceitação ou não do sábado
passou a ser uma questão individual. Cada pessoa deve decidir, com base no que mais lhe convier, o que
fazer e o que deixar de fazer nesse dia. Os métodos anteriormente mencionados surgiram em diferentes
períodos da história, mas continuam sendo usados ainda hoje por importantes segmentos cristãos. Por
mais atrativos que pareçam e difundidos que sejam, eles são inaceitáveis para aqueles que reconhecem
o caráter normativo das Escrituras como Palavra de Deus, e as interpretam com base nos princípios da
sola Scríptura (exclusividade das Escrituras) e da tota Scríptura (totalidade das Escrituras). E
indispensável, portanto, que se use um método adequado, que respeite o que o texto bíblico está
realmente dizendo, sem atribuir a ele significados artificiais.
Filtros da Mensagem Bíblica
O compromisso pessoal com "toda palavra que procede da boca de Deus" (Mt 4:4), incluindo a
observância do sábado, tem sido minimizado também pelo uso de diferentes filtros pessoais. Por
exemplo, os tradicionalistas limitam a interpretação bíblica às tradições eclesiásticas predominantes.
Como a partir do 4° século d.C. a grande maioria dos cristãos passou a observar o domingo, e apenas
pequenos segmentos do cristianismo ainda continuaram observando o sábado,12
os tradicionalistas insistem
que o domingo é indiscutivelmente o dia de guarda para os cristãos.
Os racionalistas colocam a razão humana acima das Escrituras, aceitando delas apenas as
porções que melhor se encaixam em sua moldura ideológica e mais se harmonizam com sua
própria forma de pensar. Como, além do exemplo divino (ver Gn 2:1-3) e do mandamento divino
(ver Êx 20:8-1 1), não existe uma razão astronômica lógica para a observância do sábado, esta é
considerada pelos racionalistas uma prática obsoleta que só pode ser mantida através de uma
ingênua credulidade religiosa.
Já os culturalistas distorcem o sentido óbvio das Escrituras através de releituras culturalmente
condicionadas. Para eles, a própria essência da mensagem bíblica deve ser contextualizada às diferentes
culturas modernas, sem exercer influência transformadora sobre os respectivos contextos culturais. Dessa
forma, a Palavra de Deus perde sua autoridade normativa. Como a cultura ocidental não estimula nem
favorece a observância do sábado, esta é considerada uma instituição anticultural. Por sua vez, os
carismáticos tendem a substituir o conteúdo objetivo da Palavra de Deus por suas subjetivas
experiências pessoais.13
Interpretando tendenciosamente a declaração "porque a letra mata, mas o
espírito vivifica" (2Co 3:6),H
eles costumam aceitar das Escrituras apenas as partes endossadas por
supostas revelações pessoais do Espírito Santo. Não sendo a validade do sábado confirmada por tais
revelações, ela passa a ser considerada uma prática legalista (porque "a letra mata"), antagônica à
experiência daqueles que são guiados pelo Espírito (porque "o espírito vivifica").
Existem ainda os familistas,15
que colocam seus vínculos familiares acima da Palavra de Deus. Pouca
relevância é atribuída às palavras de Cristo: "Quem ama a seu pai ou sua mãe mais do que a Mim não é
digno de Mim; quem ama seu filho ou sua filha mais do que a Mim não é digno de Mim; e quem não toma
a sua cruz e vem após Mim não é digno de Mim" (Mt 10:37, 38). Para os familistas, a observância do sábado
é uma instituição inaceitável, que acabaria rompendo a tradição familiar e a harmonia social que eles tanto
prezam. Um estudo sério e objetivo das Escrituras, inclusive da doutrina bíblica do sábado, jamais
deveria estar condicionado às tradições eclesiásticas, à lógica humana, à cultura moderna, às
experiências pessoais ou aos vínculos familiares c sociais. Esses elementos, por mais importantes que
sejam, são aceitáveis apenas ao nível em que não conflitem cornos ensinos normativos da Palavra de Deus.
Sempre que tais elementos entrem em desacordo com a vontade divina, a postura do cristão deve ser a
mesma de Pedro e dos demais apóstolos: "Antes, importa obedecer a Deus do que aos homens" (At 5:29).
A Bíblia Como Sua Própria Intérprete
A mitologia grega faz alusão a um assaltante chamado Procrustes, que seqüestrava os viajantes que
passavam por uma estrada de acesso a Atenas. O assaltante possuía duas camas: uma longa e outra curta.
Ele amarrava as pessoas de baixa estatura na cama longa, e as pessoas altas, na cama curta. Então
esticava as pessoas baixas até que atingissem o tamanho da cama longa, e cortava a parte inferior das
pernas das pessoas altas para não excederem o comprimento da cama curta, "provocando inevitavelmente
a morte de todos".16
Desconhecendo a advertência de não fazermos acréscimos nem supressões às
Escrituras (ver Ap 22:18, 19), muitos cristãos ainda hoje usam uma postura semelhante à de
Procrustes em seu estudo do texto sagrado. Existe, na realidade, uma forte tendência de se adaptar
subjetivamente o conteúdo da Palavra de Deus aos gostos e interesses pessoais. Todo estudo honesto da
Bíblia que deseje evitar riscos e distorções deve ser informado e controlado por alguns princípios
básicos de interpretação.
Um desses princípios é o da exclusividade das Escrituras. A própria Bíblia condena a aceitação de
tradições humanas que invalidem "a palavra de Deus" (ver Mt 15:3, 6, 9); de argumentos humanos
que contradigam o pensamento divino (ver Is 55:8, 9); e de experiências carismáticas em desacordo
com "a vontade de Meu Pai, que está nos Céus" (ver Mt 7:21-23). O contraste entre as efêmeras
opiniões humanas e a eterna palavra de Deus é salientado em Isaías 40:6-8: "Toda a carne é erva, e
toda a sua glória, como a flor da erva; seca-se a erva, e caem as flores, soprando nelas o hálito do
Senhor. Na verdade, o povo é erva; seca-se a erva, e cai a sua flor, mas a palavra de nosso Deus
permanece eternamente."
Outro princípio básico de interpretação é o da totalidade das Escrituras, Cristo afirmou
que o genuíno cristão é alguém que permite que o Espírito Santo o guie "a toda a verdade" (Jo 16:13);
que vive "de toda palavra que procede da boca de Deus" (Mt 4:4; cf. Dt 8:3); e que ensina a outros "todas
as coisas" ordenadas por Cristo (Mt 28:20). De acordo com o apóstolo Paulo, "toda a Escritura é inspirada
por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça" (2Tm
3:16). Portanto, a própria Bíblia condena a prática seletiva de aceitar dos ensinos bíblicos apenas o
que se gosta, e de rejeitar o que não se gosta.
Um terceiro princípio básico de interpretação é reconhecer e aceitar o desenvolvimento
natural dos temas bíblicos, sem impor-Ihes interpretações artificiais extrabíblicas. Nesse
desenvolvimento, os ensinamentos de Cristo e dos apóstolos, registrados no Novo Testamento, são os
intérpretes inspirados do Antigo Testamento. No entanto, reconhecendo a Bíblia como sua própria
intérprete, não se pode aceitar releituras pós-apostólicas que distorçam o significado natural do texto
bíblico.
Além da exclusividade, da totalidade e do desenvolvimento natural do texto bíblico, é
também indispensável interpretar literalmente o texto bíblico, exceto onde for evidente
o simbolismo. É certo que na Bíblia existem inúmeras figuras de linguagem, parábolas e mesmo
visões apocalípticas que devem ser interpretadas como tais. Mas um dos mais graves "equívocos
hermenêuticos é a tentativa de interpretar simbolicamente as porções literais do texto bíblico,
incluindo suas descrições históricas. Essa prática acaba distorcendo o sentido óbvio do texto
sagrado, expondo-o a inúmeras releituras tendenciosas.
Um quinto princípio básico de interpretação é a rejeição de falsas analogias que usam
indevidamente um assunto para provar outro assunto.17
Sem dúvida, nas Escrituras
encontramos profecias e seus respectivos cumprimentos históricos; tipos (ou símbolos) e seus respectivos
cumprimentos antitípicos (ou realidades). Mas, se quisermos ser leais ao texto bíblico, não podemos impor
a ele relacionamentos tipológicos não sugeridos pelo próprio texto.
Por último, é indispensável reconhecer o caráter normativo e universal dos ensinos bíblicos e viverem
conformidade com eles. O conteúdo das Escrituras está permeado de princípios universais e de aplicações
temporais desses princípios em diferentes contextos culturais. Mas mesmo as aplicações temporais cuja
forma se restringe ao contexto sociocultural da época estão embasadas em princípios universais nor-
mativos e pertinentes para todos os tempos e lugares. Na analogia dos dois fundamentos (ver Mt 7:24-27),
Cristo declara que edificar a casa espiritual sobre a rocha significa ouvir e praticar Suas "palavras".
Resumo
Todo estudo que visa descobrir o que a Bíblia tem a dizer realmente sobre diferentes assuntos
(inclusive o sábado) deve, por um lado, evitar métodos e filtros que distorçam o sentido
natural do texto bíblico, e, por outro, adotar princípios adequados de interpretação bíblica.
Entre os métodos a ser evitados estão
(1) o método alegórico, que destitui o texto bíblico do seu verdadeiro significado
(2) o método crítico-histórico, que elimina o caráter normativo de muitos dos ensinos bíblicos
(3) o método dispensacionalista, que fragmenta a unidade geral das Escrituras
(4) o método pós-moderno, que transfere a autoridade do texto bíblico para o leitor, deixando as
Escrituras abertas a uma grande variedade de interpretações conflitantes.
E indispensável evitar também alguns filtros pessoais, como
(1) o tradicionalismo, que limita a interpretação bíblica às tradições eclesiásticas predominantes
(2) o racionalismo, que aceita das Escrituras apenas as porções que melhor se encaixam em sua
moldura ideológica e mais se harmonizam com sua própria forma de pensar
(3) o culturalismo, que distorce o sentido óbvio das Escrituras através de releituras culturalmente
condicionadas
(4) o existencialismo, que tende a substituir o conteúdo objetivo da Palavra de Deus por subjetivas
experiências pessoais
(5) o familismo, que coloca os vínculos familiares e sociais acima da Palavra de Deus.
Por outro lado, um estudo adequado do texto bíblico, que reconhece a Bíblia como sua própria
intérprete, deve ser informado e controlado pelos princípios
(1) da exclusividade das Escrituras
(2) da totalidade das Escrituras
(3) do desenvolvimento natural dos temas bíblicos
(4) da interpretação literal do texto bíblico, exceto onde for evidente o simbolismo
(5) da rejeição de falsas analogias;
(6) do reconhecimento do caráter normativo e universal dos ensinos bíblicos, e da conformidade pessoal
com eles. Esses princípios constituem o embasamento hermenêutico do estudo sobre o sábado exposto
nos capítulos que se seguem.
ORIGEM DO SÁBADO
No diálogo com a estudante missionária norte-americana, mencionado no capítulo l, ela argumentou,
como muitos intérpretes modernos, que o conteúdo de Gênesis 1-11 não é literal, mas simbólico. Dessa
forma, esse texto, incluindo a descrição bíblica sobre a origem do sábado (ver Gn 2:1-3), acaba sendo
exposto a várias interpretações artificiais e contraditórias. Por exemplo, o assiriologista alemão Friedrich
Delitzsch crê que o sábado se originou em Babilônia.1
Julian Morgenstern acredita que tal observância
surgiu no contexto da cultura agrícola cananita.2
Já Cuthbert A. Simpson alega que o sábado era uma
reminiscência da suposta "adoração da deusa Lua" pelos próprios israelitas em suas peregrinações
noturnas pelo deserto.3
Por sua vez, Paul K. Jewett reflete a teoria popular de que Deus instituiu o sábado
somente após o êxodo de Israel do Egito.4
Por mais criativas que sejam, essas teorias são inaceitáveis
àqueles que tomam a sério o que a própria Bíblia diz sobre.o assunto. Fundamental no ensino bíblico
sobre a origem do sábado é a compreensão da natureza (1) do relato de Gênesis 1-11; (2) dos "dias"
da criação; e (3) do sétimo dia da criação. O conteúdo a seguir considera brevemente cada um desses
temas.
O Relato de Gênesis 1-11
Os defensores do método crítico-histórico negam a literalidade do relato de Gênesis 1-11, sugerindo que seu
conteúdo é apenas mitológico.5
No entanto, para sermos consistentes com o princípio de "a Bíblia como
sua própria intérprete", devemos levar em consideração como os demais escritores bíblicos si- referem ao
conteúdo dos primeiros onze capítulos das Escrituras Sagradas. Tais escritores consideram esse conteúdo
corno mitológico ou histórico? Alusões bíblicas posteriores ao relato da criação, à queda de Adão e Eva,
ao homicídio de Abel, ao dilúvio e às genealogias relacionadas com Adão e Sem ajudam a elucidar essa
questão.A autenticidade do relato da criação (Gn l, 2) é confirmada por vários textos bíblicos, Por
exemplo, o mandamento do sábado afirma que, "em seis dias, fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo
o que neles há e, ao sétimo dia, descansou" (Ex 20:11). O livro dos Salmos declara que "os céus por Sua
palavra [de Deus] se fizeram"; "pois Ele falou, e tudo se fez; Ele ordenou, e tudo passou a existir" (SI 33:6,
9). O próprio Cristo Se refere ao "mundo, que Deus criou" (Mc 13:19), e afirma que, "desde o princípio
da criação, Deus os fez homem e mulher" (Mc 10:6; também Mt 19:4). O apóstolo Paulo confirma
que Deus criou a luz (2Co 4:6), bem como o homem e a mulher (lCo 11:9). O apóstolo Pedro
menciona que a terra "surgiu da água e através da água pela palavra de Deus" (2Pe 3:5). O apóstolo
João atesta que "todas as coisas" foram criadas por Deus (Jo 1:1-3, 10), que "fez o céu, e a terra, e o
mar, e as fontes das águas" (Ap 14:7). A realidade da queda de Adão e Eva (Gn 3) é confirmada por Paulo,
ao dizer que "por um só homem [Adão] entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte" (Rm 5:12;
também Rm 5:12-21; ICo 15:22, 45; !Tm2:13, 14). O homicídio de Abel (Gn 4:1-16) é tido como um
fato tanto por Cristo (Mt 23:35; Lc 11:51) quanto pela epístola aos Hebreus (Hb 11:4; 12:24). A história
de Noé e o dilúvio (Gn 6-9) é confirmada no livro do profeta Isaías (Is 54:9), pelo próprio Cristo (Mt
24:37-39; Lc 17:26, 27), na epístola aos Hebreus (Hb 11:7), bem como nos escritos do apóstolo Pedro
(IPe 3:20; 2Pe 2:5; 3:5, 6). As genealogias dos descendentes de Adão e Sem (Gn 5:1-32; 11:10-32) são
confirmadas por Lucas na genealogia de Jesus (Lc 3:23-38). Portanto, uma leitura do texto bíblico é
suficiente para confirmar que Cristo e os demais profetas bíblicos consideravam Gênesis 1-11 uma
descrição histórica literal. Já uma releitura mitológica do referido texto acaba distorcendo sua natureza e
propósito. Em harmonia com o ensinamento bíblico, o presente estudo considera o relato em discussão
histórico c não mitológico.
Os "Dias" da Criação
A tentativa de harmonizar o relato bíblico da criação (Gn l, 2) com a teoria evolucionista levou
alguns intérpretes bíblicos a propor um evolucionismo teísta,6
no qual cada "dia" da semana da
criação representaria uma "era" geológica de mil anos.
Apoio bíblico para essa proposta tem sido buscado nas declarações de que "mil anos, aos Teus
olhos, são como o dia de ontem que se foi e como a vigília da noite" (SI 90:4) e "para o Senhor, um
dia é como mil anos, e mil anos, como um dia" (2Pe 3:8). Como nenhuma dessas declarações se
refere aos dias da criação, tal associação não passa de falsa analogia. Eruditos no estudo do Antigo
Testamento reconhecem que cada "dia" (hebraico yôm [dia] e não aeon [era]) deve ser en-
tendido em Gênesis 1:1 a 2:3 como um dia literal de 24 horas. Por exemplo, C. F. Keil e F.
Delitzsch afirmam que, "se os dias da criação são regulados pelo recorrente intercâmbio de
luz e trevas, eles não devem ser considerados períodos de tempo de duração incalculável, de
anos ou milhares de anos, mas simples dias terrestres".7
Gordon J. Wenham acrescenta:
Pode haver pouca dúvida de que aqui "dia" tem o sentido básico de um período de 24 horas. A
menção de tarde e manhã, a enumeração dos dias e o descanso divino no sétimo dia demonstram
que uma semana de atividades divinas está sendo descrita aqui. Em outros lugares, obviamente,
"no dia em que" e expressões similares podem significar simplesmente "quando" (por exemplo, 2:4;
5:1, etc.). O Salmo 90:4 diz, em realidade, que mil anos são para Deus como um dia. Mas é
perigoso tentar correlacionar a teoria científica com a revelação bíblica apelando para esses textos.8
Gerhard F. Hasel argumenta que- a estrutura lingüística de Gênesis l, a seqüência dos eventos nele-
descritos e o testemunho de outros textos bíblicos (Ex 20:8- I I ; 41:12-17) confirmam que os "dias"
da semana ia criação só podem ser entendidos como uma seqüência cronológica e ininterrupta de
sete dias literais de 24 horas cada.9
De acordo com Cuthbert A. Simpson, "não resta dúvida de que
por 'dia o autor pretendia dizer precisamente o que nós entendemos o tempo necessário para uma
volta da Terra ao redor do seu eixo". Portanto, a tentativa de interpretar os "dias" da semana da
criação como se fossem "eras" bem mais longas acaba "minimizando a grandeza de Deus" e "o Seu
poder de realizar tanto em um dia".10
* Ainda em relação aos "dias" da semana da criação, pode-se
observar que apenas os seis primeiros dias são qualificados pela expressão "tarde e manhã" (Gn 1:5,
8, 13, 19, 23, 31), e não o "dia sétimo" (Gn 2:2, 3). Significaria isso que o "dia sétimo" teria sido
maior do que os outros dias, ou mesmo um período de tempo indefinido? Existem pelo menos dois
motivos para se considerar a duração do sétimo dia igual à dos demais dias. Em primeiro lugar, a
palavra "dia" (hebraico yôm) é a mesma para todos os sete dias. Assim, se nos seis primeiros dias ela
representa um período literal de 24 horas, a mesma duração deve ser atribuída também ao sétimo dia.
Em segundo lugar, o sétimo dia da semana da criação só serve de modelo para a observância do
sábado semanal se aquele foi um dia literal como os sábados subseqüentes (Êx 20:8-11; 31:12-17;
Hb 4:4-11). Portanto, a ausência da expressão "tarde e manhã" em relação ao sétimo dia jamais
deveria ser usada para atribuir-lhe uma duração maior do que a sugerida pelo próprio texto bíblico.
O Sétimo Dia da Criação
A primeira alusão bíblica ao descanso no sétimo dia aparece em Gênesis 2:2 e 3, que diz: "E,
havendo Deus terminado no dia sétimo a Sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a Sua
obra que tinha feito. E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou; porque nele descansou de toda
a obra que, como Criador, fizera." Alguns comentaristas que consideram o sábado uma instituição
meramente judaica negam que esse texto estabeleça a observância do sábado para a humanidade,
pois (l) naquela época ainda não existia nenhum judeu; (2) a expressão usada é "sétimo dia" e não
"sábado"; e (3) a alusão é apenas ao descanso de Deus e não dos seres humanos. Mas tais argumentos
carecem de consistência. *A teoria de que o sábado teria sido estabelecido apenas para os judeus
não faz sentido, pois o próprio Cristo confirmou a universalidade do sábado ao mencionar que "o
sábado foi estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado" (Mc 2:27). Além
disso, o profeta Isaías fala que o sábado seria observado na era messiânica por eunucos e
estrangeiros (Is 56:1-8). Por sua vez, a mera ausência do termo "sábado" em Gênesis 2:2 e 3 não
enfraquece o conteúdo do texto, uma vez que o próprio mandamento do sábado define que "o sétimo
dia é o sábado do Senhor, teu Deus" (Êx 20:10).
A questão não é tanto o uso do termo "sábado" quanto a ênfase no conceito do descanso semanal
no sétimo dia. * O descanso de Deus, que "nem Se cansa, nem Se fatiga" (Is 40:28), proveu para
os seres humanos o modelo do descanso semanal (Êx 20:8-11; 31:12-17; Hb 4:4-11). De acordo
com Gerhard F. Hasel, "Deus Se manifestou em cessar Sua obra e em descansar como divino
exemplo para a raça humana".11
Sendo que Adão e Eva foram criados no sexto dia (Gn l :26-28), e
Deus descansou no sétimo (Gn 2:2, 3), é evidente que para aquele casal o sábado foi o primeiro
dia completo de existência, no qual participaram pela graça de Deus do descanso sabático. Karl
Barth argumenta que "o testemunho bíblico une tão expressa e diretamente a atividade divina no
sétimo dia da criação com a instituição do sábado que o homem deve observar que é impossível
entendê-lo por outro ângulo".12
O mesmo autor acrescenta: Obviamente, os testemunhos bíblicos
não sugerem que a criação, tendo o homem como cabeça, trabalhou nesse dia de descanso divino,
após o último dia de atividade. A clara inferência é que a criação, e supremamente o homem, descansou
com Deus no sétimo dia e participou da Sua liberdade, descanso e alegria, mesmo não tendo ainda
realizado nenhum trabalho do qual cessar. Sua liberdade, descanso e alegria no sábado podiam apenas
contemplar a obra de l Deus, e não a sua própria.13
* Alem de descansar no "dia sétimo", Deus também "abençoou" e "santificou esse dia (Gn 2:2, 3).
Quaisquer dúvidas quanto ao significado do "dia sétimo" são dissipadas por uma compreensão adequada
desse tríplice ato de Deus descansar, abençoar e santificar. Se o descanso de Deus em si já implica na
instituição do sábado para Suas criaturas, o fato de ter Ele abençoado e santificado esse dia confirma tal
instituição. Quando Deus abençoa e santifica algo, Ele sempre o faz em benefício de Suas criaturas. Esse
tríplice ato de Deus comprova a origem edênica do sábado (Gn 2:2, 3), anterior à queda de Adão e Eva (Gn
3), quando tudo ainda "era muito bom" (Gn 1:31). Portanto, 0 sábado é de natureza moral e de abrangência
universal, cuja validade não se restringe a tempo, lugar ou povo específico. Ao Deus escolher um meio
especial de comunhão com Suas criaturas, por que teria Ele escolhido um dia específico (o sábado), em vez de
um lugar específico no jardim do Éden? Sakae Kubo sugere que Deus "escolheu um segmento de tempo"
para comungar com Suas criaturas por três motivos: (l) porque o tempo é universal e está em toda parte; (2)
porque o tempo é imaterial, apontando para as coisas espirituais, além do espaço e da matéria; e (3) porque o
tempo é todo-abarcante, jamais oscilando em intensidade.14
São essas características do tempo que permitem
que o sábado chegue igualmente a todos os seres humanos (ricos e pobres, cultos e incultos) como um genuíno
"santuário no tempo".15
*
Resumo
Um estudo mais detido sobre a origem do sábado deve levar em consideração a natureza do relato de
Gênesis 1-11, dos "dias" da criação, do sétimo dia da criação. O testemunho das Escrituras confirma
que Cristo e os demais profetas bíblicos consideravam Gênesis 1 -1 I uma descrição histórica literal.
Qualquer releitura mitológica do referido texto acaba distorcendo sua natureza e propósito. O presente
estudo, baseado no princípio da Bíblia como sua própria intérprete, considera o relato histórico e não
mitológico. Os "dias" da semana da criação só podem ser entendidos como dias literais de 24 horas,
levando-se em consideração a estrutura lingüística de Gênesis l, a seqüência dos eventos descritos e o
testemunho de outros textos bíblicos (Ex 20:8-1 1; 31:12-17). Mesmo não sendo qualificado pela
expressão "tarde e manhã", o "dia sétimo" (Gn 2:2, 3) deve ser considerado como tendo a mesma
duração dos demais dias, pois a palavra "dia" (hebraico yôm) é a mesma para todos os sete dias; e o sétimo
dia da semana da criação só serve de modelo para a observância do sábado semanal se aquele foi um dia
literal (Êx20:8-ll;31:12-17;Hb 4:4-11). A origem edênica do sábado é confirmada pelo fato de
Deus ter descansado nesse dia, bem como o abençoado e santificado (Gn 2:2, 3). Descansando no
sábado, Deus proveu um exemplo para Suas criaturas. Abençoando esse dia, Ele o transformou em
um canal de bênçãos para elas. E, santificando o sábado, Ele o separou para uso sagrado. Esse tríplice
ato confirma que Deus instituiu o sábado para benefício da humanidade. Escolhendo um segmento de
tempo, em vez de um lugar específico, Deus disponibilizou o sábado a todos os seres humanos em todos
os tempos e lugares. Mas a história bíblica demonstra que nem sempre o povo de Deus foi leal a esse
legado.
O SÁBADO NO ANTIGO TESTAMENTO
A história do povo de Deus no Antigo Testamento está repleta de episódios relacionados à observância
do sábado. Em ocasiões solenes, Deus enunciou mandamentos orientando essa observância.
Afastando-se o povo das prescrições divinas, Ele usou profetas para adverti-lo e condenar a apostasia. É
importante que nos familiarizemos com esses episódios, pois foram registrados "para advertência nossa,
de nós outros sobre quem os fins dos séculos têm chegado" (l Cor 10:11). O conteúdo deste capítulo
considera aspectos importantes relacionados ao sábado (1) do Éden ao Sinai; (2) na aliança do Sinai; (3)
durante a peregrinação no deserto; (4) na Terra Prometida; (5) nos dias dos profetas; e (6) no período
pós-exílico.
O Sábado do Éden ao Sinai
O ciclo semanal de sete dias, instituído na criação do mundo (Gn l: 1-2:3), foi perpetuado de forma
ininterrupta ao longo da história humana, graças à observância do sábado em cada sétimo dia. Evidências
desse ciclo transparecem bem antes da proclamação do Decálogo no Sinai. Por exemplo, já no contexto
do dilúvio aparecem expressões como "outros sete dias" e "mais sete dias" (Gn 8:10, 12). Na descrição do
casamento de Jacó e Lia existem duas alusões à "semana" dessa noiva (Gn 29:27, 28). Tais períodos
podem não ter coincidido com o início e o término do próprio ciclo semanal, mas confirmam que a
semana de sete dias era conhecida pelos patriarcas.1
* Durante a opressão do cativeiro egípcio (Êx
3:7-9), os israelitas negligenciaram a obediência aos mandamentos divinos (cf. Gn 26:5), que
certamente incluíam a observância do sábado (Êx l 6:25-28). O éxodo do Egito visava restaurar tanto o
sistema sacrifica] (Ex 3:18) quanto a obediência aos "preceitos" e "leis" de Deus (SI 105:43-45).
Mas Faraó reagiu negativamente, indagando por que interrompiam "o povo no seu trabalho" (Êx 5:4)
e acusando os israelitas de estar "ociosos" (Ex 5:8, 17). C. F. Keil e F. Delitzsch declaram:
"Faraó não queria ouvir nada a respeito de adoração. Ele cria que a solicitação era simplesmente
uma escusa para buscar feriados para o povo, ou dias de descanso de seus labores."2
George
Rawlinson acrescenta que, "como os antigos egípcios não tinham uma instituição como o sábado
semanal, e certamente não tolerariam a abstinência do trabalho por parte dos escravos hebreus num
dia em sete, devemos supor que o descanso sabático, se já conhecido dos hebreus, havia caído em
desuso durante sua permanência no Egito".3
*
Assim sendo, é provável que na própria acusação de que os israelitas estavam "ociosos" (Ex 5:8, 17) haja
indícios de uma restauração da observância do sábado, resultando em opressão ainda maior (Ex 5:6-14). Um
mês após saírem do Egito (Ex 12:2, 6, 11, 12, 37), os israelitas chegaram ao deserto de Sim (Êx 16:1),
onde o Senhor passou a alimentá-los com o maná, na intenção de prová-los e ver se andariam na Sua "lei
ou não" (Êx 16:4). No relato desse incidente (ver Êx 16) aparece pela primeira vez a palavra "sábado"
no Antigo Testamento (Êx 16:23), e seu conteúdo é de fundamental importância para a compreensão
da origem e desenvolvimento da observância do sábado nos primórdios da história humana. Em Êxodo
16:25-30 lemos:
Então, disse Moisés: Comei-o hoje, porquanto o sábado é do Senhor; hoje, não o achareis no campo.
Seis dias o colhe-reis, mas o sétimo dia é o sábado; nele, não haverá. Ao sétimo dia, saíram alguns do
povo para o colher, porém não o acharam. Então, disse o Senhor a Moisés: Até quando recusareis
guardar os Meus mandamentos e as Minhas leis? Considerai que o Senhor vos deu o sábado; por
isso, Ele-, no sexto dia, vos dá pão para dois dias; cada um fique onde está, ninguém saia do seu lugar
no sétimo dia. Assim, descansou o povo no sétimo dia.
De acordo com G. H. Waterman,
Esta passagem [Êx 26:28, 29] mostra que o sábado foi certamente tornado conhecido a Israel antes que
a lei fosse dada no Sinai. Os israelitas não chegaram ao Sinai antes do mês seguinte (16:1; 19:1). A
passagem mostra também que essa não foi a primeira instituição do sábado. A maneira acidental como
o assunto é introduzido e a admoestação do Senhor em relação à desobediência do povo pressupõem
que o sábado era previamente conhecido. A indagação do Senhor: "Até quando recusareis guardar os
Meus mandamentos e as Minhas leis?" [Êx 16:28] soa como se ele existisse havia um longo tempo. Em
realidade, a equação do sábado com o sétimo dia, a declaração de que o Senhor deu aos israelitas o sá-
bado, e a menção de que o povo, pelo mandamento de Deus, descansou no sétimo dia, tudo isso indica
indubitavelmente a primitiva instituição do sábado.4
Portanto, Êxodo 16:26 deixa claro que, bem antes da proclamação do Decálogo no Sinai, já existiam "leis" e
"mandamentos" divinos ordenando a observância do sábado. A própria dádiva do maná durante seis dias da
semana e o milagre de sua preservação durante o sábado (Êx 16:22-24), que acompanhariam os israelitas
durante os 40 anos de peregrinação no deserto (Êx 16:35; Js 5:12), eram a confirmação divina da
santidade desse dia. Já presenciando esse milagre a cada sábado, Deus conduziu os israelitas do deserto
de Sim à encosta do monte Sinai, onde estabeleceria com eles a Sua aliança.
O Sábado na Aliança do Sinai
• Muitas discussões existem sobre a natureza da aliança de Deus com Israel no Sinai (ver Ex 19-24),
envolvendo a proclamação do Decálogo (ver Ex: 20:3-17). Uma análise acurada do texto bíblico revela
que essa aliança não foi enunciada de forma legalista, pois, nesse caso, o próprio Deus teria ensinado
um caminho equivocado de salvação (cf. SI 6:4; Is 55:1). Tanto a eleição de Israel (Dt 7:7, 8)
quanto sua libertação do cativeiro egípcio (Ex 14:13, 14) foram motivadas pela graça divina. Deus
primeiro libertou Seu povo eleito para depois proclamar Sua lei e exigir obediência, como resposta
humana à salvação divina. O próprio Decálogo é introdu2ido com as palavras "Eu sou o Senhor, teu
Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão" (Êx 20:2). Portanto, "desde sua origem, a
lei está firmemente estabelecida em um contexto de graça".6
A repetição da lei em Deuteronômio
(ver Dt 5:7-21) também aparece em um contexto de graça. Gerhard von Rad esclarece que é
impossível, pois, considerar os mandamentos do Deuteronômio como uma "lei", no sentido
teológico, que leve Israel a merecer a salvação pela observação global das exigências divinas. Os
mandamentos do Deuteronômio são antes uma grande explicação do mandamento do amor por
Yahweh e de apego exclusivo a Ele (Dt 6:4s). Esse amor é a resposta de Israel ao amor divino que
lhe foi mostrado. Os numerosos imperativos do Deuteronômio são apelos implícitos ou explícitos a
um reconhecimento ativo e são fáceis de observar. [...] Entretanto, mesmo nesses imperativos, cujo
motivo é uma recompensa a obter ("fazei isto e vivereis, sereis bem-sucedidos, entrareis na terra"), a
grande oferta da salvação não é eliminada, pois o Deuteronômio não ensina um caminho legalista.
Mesmo as palavras que parecem estabelecer uma dependência da salvação em relação à obediência a
Yahweh são precedidas da proclamação da eleição e do amor por Yahweh. Trata-se antes de um
convite dirigido a Israel para que se aproprie pessoalmente de uma realidade já estabelecida e
para que se instale nessa realidade através da obediência e em atitude de reconhecimento. Também
aí, antes do imperativo, há o indicativo deuteronomista: "sois agora o povo posto à parte por Yahweh".7
O
quarto mandamento do Decálogo, que ordena a observância do sábado (ver Ex 20:8-11), é parte
integrante da aliança do Sinai (Dt 4:13; 5:1-21) e "ocupa um lugar central nessa aliança, servindo como
elo entre os mandamentos que dizem respeito aos deveres para com Deus [Ex 20:3-11] e os que tratam
dos deveres para com o homem [Ex 20:12-17]".8
Esse mandamento foi registrado em Êxodo 20:8-11
nos seguintes termos: Lembra-te do dia de sábado, para o santificar. Seis dias trabalharás e farás
toda a tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado do Senhor, teu Deus; não farás nenhum trabalho, nem tu,
nem o teu filho, nem a tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o forasteiro
das tuas portas para dentro; porque, em seis dias, fez o Senhor os céus e a Terra, o mar e tudo o que
neles há e, ao sétimo dia, descansou; por isso, o Senhor abençoou o dia de sábado e o santificou.
O mandamento define o sábado como uma instituição vigente antes da proclamação da lei no Sinai.
Enquanto a expressão "lembra-te", no verso 8, sugere familiaridade com o sábado, o verso 11 confirma
sua origem no tríplice ato divino - descansar, abençoar e santificar - no sétimo dia da criação (Gn
2:1-3). G. H. Waterman declara corretamente:
O próprio quarto mandamento não dá a entender que seja a primeira promulgação do sábado. Suas
palavras introdutórias - "Lembra-te do dia do sábado" (Ex 20:8) - sugerem que o sábado havia sido
previamente conhecido, mas fora esquecido ou negligenciado. A razão apresentada no mandamento
para a santificação do dia do sábado foi o exemplo de Deus ao término da criação (20:9-1 1). O
mandamento aponta para a instituição original do sábado.''
Inserido no Decálogo pelo próprio Deus, o quarto mandamento compartilha da mesma natureza moral
que caracteriza os outros nove preceitos. De acordo com o apóstolo Paulo, se a lei "é santa; e o
mandamento, santo, e justo, e bom" (Rm 7:12), então o quarto mandamento também deve ser
considerado santo, justo e bom. Sua natureza moral e imutável é atestada (1) pelo fato de o sábado ter
sido instituído na criação, antes da queda do homem; (2) por ser Deus seu autor; (3) por estar inserido na
lei moral do Decálogo; (4) pela forma peculiar corno Deus o revelou no Sinai (Êx 19:10-20:17;
31:12-18); e (5) por ser o único dos dez mandamentos em que aparecem explicitamente o nome, o título,
a autoridade e a jurisprudência de Deus como legislador. Portanto, qualquer alteração no conteúdo
desse mandamento é ilegal e representa um atentado direto à autoridade divina (ver Dn 7:25). O uso
dos termos "servo", "serva", "animal"10
e "forasteiro" (Êx 20:10) é apenas uma aplicação do
mandamento à cultura da época, sem com isso transformá-lo em uma ordenança cerimonial e transi-
tória. Com linguagem compreensível aos israelitas, o mandamento confirma o princípio moral de que o
descanso do sábado não se restringe ao indivíduo em si, mas é extensivo aos demais seres humanos e
animais sob sua direta influência e liderança. Por sua vez, a expressão "o sétimo dia é o sábado do
Senhor, teu Deus" (Êx 20:10; ver 16:26; 31:15; Lv 23:3; Dt 5:14) impede a transferência da
santidade do sábado para qualquer outro dia da semana, independentemente da lógica
eclesiástica utilizada. A alegação de que o preceito do sábado "na primeira Aliança prepara o
domingo da nova e eterna Aliança"11
só pode ser mantida através do uso do método alegórico, que
desconhece a Bíblia como sua própria intérprete. A nova aliança não altera o dia de guarda, mas
apenas condena o mau uso da lei como meio de salvação (Rm 3:28, 31; Gl 2:16; 3:21; Um
1:8). Embora o Decálogo apareça inserido na aliança do Sinai, ele transcende essa aliança,
sendo de aplicação universal, ou seja, é válido para todos os seres humanos, em todos os
tempos e lugares (SI 119:142; Ec 12:13, 14). Além do sábado semanal (Lv 23:.-?), contido no
Decálogo, foram instituídos no Sinai sete sábados cerimoniais ou "festas fixas do Senhor", espalhados
ao longo do calendário religioso israelita.
Esses sábados anuais são identificados em Levítico 23 como
(1) o primeiro dia da Festa dos Pães Asmos (v. 7)
(2) o último dia da Festa dos Pães Asmos (v. 8)
(3) o Pentecostes (v. 21)
(4) o primeiro dia do sétimo mês ou Festa das Trombetas (v. 24, 25)
(5) o Dia da Expiação (v. 27, 28)
(6) o primeiro dia da Festa dos tabernáculos (v. 34, 35)
(7) o último dia da Festa dos tabernáculos (v. 36).
Cada um desses sábados é qualificado como um dia de "santa convocação", no qual "nenhuma obra
servil" deveria ser feita. Foi ordenado também que cada sétimo ano seria um ano sábatico, ou seja,
um "sábado de descanso solene para a terra", durante o qual esta deveria ficar sem ser cultivada (Lv
25:1-7). Os sábados semanais e os sábados cerimoniais são completamente distintos uns dos outros.12
No que diz respeito à origem, o sábado semanal foi instituído por Deus na semana da criação (Gn 2:2,
3), enquanto os sábados cerimoniais foram instituídos no Sinai (Lv 23:4-44).
Quanto à natureza, o sábado semanal, instituído antes da entrada do pecado no mundo, tem caráter
moral e permanente; já os sábados cerimoniais, prescritos após a entrada do pecado, são
cerimoniais e transitórios. Em relação ao propósito, o sábado semanal é um "sinal para sempre" entre
Deus e Seu povo (Êx 31:17; ver 31:13; Ez 20:12, 20); mas os sábados cerimoniais eram apenas
"sombra dos bens vindouros" (Hb 10:1; ver 8:5), cuja celebração deveria cessar com a morte de Cristo
na cruz do Calvário (Ef 2:15; Cl 2:14). Em termos de registro, o mandamento do sábado semanal foi
escrito pelo próprio dedo de Deus em tábuas de pedra guardadas dentro da arca da aliança (Êx 31:18;
40:20; Dt4:13; 10:5; Hb 9:4); mas, em contraste, os sábados cerimoniais foram registrados por
Moisés em um livro colocado "ao lado da arca" da aliança (Dt 31:26). Além disso, enquanto os
sábados semanais eram chamados por Deus de "Meus sábados" (l ,v 26:2; Is 56:4; Ez 20:12-24), os
sábados cerimoniais eram designados como "vossos sábados" e "seus sábados" (Lv 23:32; ()s 2: l l).
Portanto, o Decálogo, escrito em tábuas de pedra pelo dedo de Deus (Êx 31: l 8), não Foi dado
exclusivamente aos hebreus; mas Deus os honrou como depositários e observadores de Sua lei. Assim,
depois de quase uni ano acampados na encosta do Sinai (Êx 19:1; Nm 10:11, 12), os israelitas partiram
levando consigo o Decálogo, contendo o mandamento do sábado, como um sagrado legado de Deus
para a humanidade.
O Sábado Durante a Peregrinação no Deserto
Poucas alusões explícitas ao sábado na história de Israel são encontradas entre a experiência do Sinai e a
entrada dos israelitas na terra de Canaã. Mesmo assim, durante os 40 anos de peregrinação no deserto
(Êx 16:3 5), por mais de duas mil vezes repetiu-se o milagre do rnaná em relação à observância do sábado
(Êx 16:22-30). O milagre semanal que os acompanhava visava a impressioná-los com a santidade do
sábado, evitar que dele se esquecessem e prover-lhes as condições adequadas para sua observância.
Logo após a sedição do povo e a ordem divina de continuarem sua peregrinação pelo deserto durante
40 anos (Nm 14:1-38), um homem foi encontrado "apanhando lenha no dia de sábado" (Nm 15:32).
Diante da clara enunciação do quarto mandamento (Êx 20:8-11) e da completa ausência de maná
no sábado (Êx 16:22-30), a atitude desse homem não pode ser considerada mero pecado por
ignorância.13
Foi, sem dúvida, um ato premeditado de "aberto desafio à autoridade divina",14
que não
podia ser deixado impune. O homem foi então levado a Moisés e Arão, que apresentaram o caso
diante do Senhor. O veredito divino foi claro: "Tal homem será morto; toda a congregação o
apedrejará fora do arraial" (Nm 15:35). Através da pena capital, o homem recebeu o castigo por sua
ousada rebelião contra Deus e o povo foi advertido contra semelhante atitude. Entre as "ofertas
contínuas" registradas em Números 28, aparece a ordenança de que os sacrifícios e ofertas "de cada
sábado" deveriam ser o dobro do oferecido em cada um dos demais dias da semana (v. 9, 10). C.
F. Keil e F. Delitisch argumentam que o sábado era "enaltecido acima dos outros dias da
semana, como dia santificado ao Senhor em um grau mais elevado que os demais, por um número
maior de holocaustos, ofertas de manjares e libações".15
Cristo estava Se referindo provavelmente a
essa ordenança quando disse: "Ou não lestes na lei que, aos sábados, os sacerdotes no templo
violam o sábado e ficam sem culpa?" (Mt 12:5). Ao término dos 40 anos de peregrinação no
deserto, antes que os israelitas entrassem na terra de Canaã, Moisés proferiu uma série de discursos
registrados no livro de Deuteronômio. No início do segundo discurso (Dt 5-26), Moisés repetiu o
Decálogo com uma alteração significativa no enunciado do quarto mandamento. Enquanto o motivo
para a observância do sábado em Êxodo 20:11 é a criação - "porque, em seis dias, fez o Senhor os
céus e a Terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou; por isso, o Senhor
abençoou o dia de sábado e o santificou", em Deuteronômio 5:15 o motivo é a redenção "porque te
lembrarás que foste servo na terra do Egito e que o Senhor, teu Deus, te tirou dali com mão poderosa e
braço estendido; pelo que o Senhor, teu Deus, te ordenou que guardasses o dia de sábado". Essa
aparente discrepância é explicada por Gleason L. Archer nos seguintes termos:
Deve-se compreender que o propósito do Deuteronômio era fornecer uma paráfrase seletiva da lei de
Deus revelada a Moisés nos três livros anteriores: Êxodo, Levítico e Números. Não pretendia ser uma
repetição palavra por palavra do texto desses livros, e sim uma aplicação homilética e exortativa dos
seus ensinos à nova geração que atingiu a maioridade durante os 40 anos de peregrinação pelo
deserto.16
Como já mencionado, "desde sua origem, a lei está firmemente estabelecida em um contexto do
graça".17
Mas, em Deuteronômio 5:12-15, a própria observância do sábado é inserida nesse mesmo
contexto. Não é de surpreender, portanto, que o tema da redenção, com o qual o Decálogo havia sido
introduzido (ver Êx 20:2; Dt 5:6; lambem Ex 13:13), tenha sido associado por Moisés, sob inspiração do
Espírito Santo (2Pe 1:19-21), mais especificamente ao mandamento d» sábado. Dessa forma, Israel
entraria na terra de Canaã com urna clara revelação do sábado como memorial da criação e da
redenção.
O Sábado na Terra Prometida
Os primeiros 500 anos da permanência dos israelitas em Canaã são marcados por um
persistente silêncio a respeito do sábado. Nenhuma referência a ele é encontrada nos livros
históricos de Josué, Juizes, Rute, l Samuel, 2 Samuel e l Reis. Na seqüência em que os livros
históricos foram dispostos no cânon bíblico, a primeira referência ao sábado seria 2 Reis 4:23.
Mas, em termos cronológicos, ela aparece em l Crônicas 9:23, na época de Davi.18
Em vez de
sugerir um suposto abandono da observância do sábado, esse silêncio evidencia sua continuidade,
pois, tão logo o sábado voltou a ser negligenciado, Deus enviou reprovações através dos profetas.
Existem, no entanto, dois incidentes ocorridos na parte inicial desse período que têm sido apontados
por alguns como conspirando contra a observância do sábado. Um deles está relacionado ao cerco de
Jerico (ver Js 6). Sendo que, por ordem divina, a cidade foi rodeada em sete dias consecutivos (Js 6:3,
4), é evidente que um deles coincidiu com o sábado. Contudo, Adam Clarke comenta que "não parece
que pudesse haver transgressão do sábado pelo fato de o povo simplesmente rodear a cidade, levando
consigo a arca, e os sacerdotes tocarem as trombetas sagradas". Afinal, "tratava-se de mera procissão
religiosa, levada a efeito por ordem de Deus, na qual nenhuma obra servil foi realizada".19
Outro
incidente usado pelos críticos contra a observância do sábado é o dia longo na batalha entre Israel e
os amorreus (ver Js 10:12-14). Nessa batalha, Josué clamou ao Senhor, e "o Sol se deteve, e a Lua parou
até que o povo se vingou de seus inimigos" (v. 13).
J. N. Andrews esclarece:
O prolongamento de um dos seis dias pela intervenção de Deus não podia impedir a real chegada do
sétimo dia, embora o retardasse; nem pôde destruir sua identidade. O incidente envolve uma
dificuldade para aqueles que defendem a teoria de que Deus santificou a sétima parte do tempo, e
não o sétimo dia; pois nesse caso a sétima parte do tempo não coincidiu com o sábado. Mas não existe
nenhuma dificuldade para aqueles que crêem que Deus separou o sétimo dia para ser guardado
quando este chega, em memória do Seu próprio descanso.20
Como já mencionado, a primeira referência cronológica ao sábado nos livros históricos apareceu no tempo
de Davi, e diz: "Outros dos seus [de Matitias] irmãos, dos filhos dos coatitas, tinham o encargo de
preparar os pães da proposição para todos os sábados" (lCr 9:32). Cerca de 150 anos mais tarde aparecem
algumas alusões esporádicas ao sábado, isso já nos dias do profeta Eliseu (2Rs 4:23; 11:5-9; 2Cr 23:4-8).
Mas não podemos descartar a possibilidade de o Salmo 92, sob o título "cântico para o dia de
sábado", ter sido escrito no período entre Davi e Eliseu.21
E, porém, nos escritos dos profetas
pré-exílicos que o tema do sábado volta a ser abordado com significativa freqüência.
•
O Sábado nos Dias dos Profetas
Os livros proféticos do Antigo Testamento apresentam várias alusões ao sábado. Em sua maioria,
são admoestações contra a negligência na observância do sábado, que estava se generalizando
tanto no reino do Norte (Israel) quanto no reino do Sul (Judá).22
No remado de Jeroboão II
(793-753 a.C.) em Israel, o profeta Amos (8:4-6) descreveu a apostasia da nação nos seguintes
termos: Ouvi isto, vós que tendes gana contra o necessitado e destruís os miseráveis da terra,
dizendo: Quando passará a Festa da Lua Nova, para vendermos os cereais? E o sábado, para
abrirmos os celeiros de trigo, diminuindo o efa, aumentando o siclo, e procedendo dolosamente
com balanças enganadoras, para comprarmos os pobres por dinheiro e os necessitados por um par
de sandálias e vendermos o refugo do trigo? Algumas das mais belas e profundas declarações bíblicas
sobre o sábado aparecem no livro do profeta Isaías, conhecido com o "profeta messiânico". Por exemplo,
Isaías 56:1-8 enfatiza o caráter universal do sábado:
Assim diz o Senhor: Mantende o juízo e fazei justiça, porque a Minha salvação está prestes a vir,
e a Minha justiça, prestes a manifestar-se. Bem-aventurado o homem que faz isto, e o filho do
homem que nisto se firma, que se guarda de profanar o sábado e guarda a sua mão de cometer
algum mal. Não fale o estrangeiro que se houver chegado ao Senhor, dizendo: O Senhor, com
efeito, me separará do Seu povo; nem tampouco diga o eunuco: Eis que eu sou uma árvore seca.
Porque assim diz o Senhor: Aos eunucos que guardam os Meus sábados, escolhem aquilo que
Me agrada e abraçam a Minha aliança, darei na Minha casa e dentro dos Meus muros, um
memorial e um nome melhor do que filhos e filhas; um nome eterno darei a cada um deles,
que nunca se apagará. Aos estrangeiros que se chegam ao Senhor, para O servirem e para
amarem o nome do Senhor, sendo deste modo servos Seus, sim, todos os que guardam o
sábado, não o profanando, e abraçam a Minha aliança, também os levarei ao Meu santo
monte e os alegrarei na Minha Casa de Oração; os seus holocaustos e os seus sacrifícios
serão aceitos no Meu altar, porque a Minha casa será chamada Casa de Oração para todos os
povos. Assim diz o Senhor Deus, que congrega os dispersos de Israel: Ainda congregarei outros
aos que já se acham reunidos.
Como visto anteriormente, em êxeto 20:8-1 l e Deuteronômio 5:12-15 o mandamento do sábado é
enunciado no contexto da graça redentora de Deus, que libertou o povo de Israel da escravidão egípcia
(Êx20:2; Dt 5:6, 15). De modo semelhante, em Isaías 56:1-8 a observância do sábado é associada à
graça salvadora, mencionada em Isaías 55:1 como disponível a todos gratuitamente, "sem dinheiro e
sem preço". Transpondo todas as fronteiras políticas e barreiras étnicas, o convite à observância do
sábado é estendido também aos "estrangeiros" e eunucos (Is 56:3, 6), com tal abrangência que o
templo de Jerusalém seria chamado de "Casa de Oração para todos os povos" (Is 56:7).
Consequentemente, a tentativa de considerar a observância do sábado uma instituição
meramente judaica acaba desconhecendo (1) a origem edênica do sábado (Gn 2:2, 3), antes da
entrada do pecado no mundo (Gn 3) e quando ainda não existiam judeus (Gn 29:31-30:26; 35:16-26)
(2) a natureza moral do mandamento do sábado, semelhante à dos demais mandamentos do
Decálogo (Êx 20:3-17; Dt 5:7-21); (3) a abrangência universal da observância do sábado, enfatizada
em Isaías 56:1-8; e (4) a declaração do próprio Cristo de que "o sábado foi estabelecido por causa do
homem" (Mc 2:27), e não apenas dos judeus. Isaías 58:13 e 14 menciona importantes detalhes sobre a
forma de se observar o sábado, bem como as bênçãos que resultam da genuína observância do sábado. O
texto diz:
Se desviares o pé de profanar o sábado e de cuidar dos teus próprios interesses no Meu santo dia; se
chamares ao sábado deleitoso e santo dia do Senhor, digno de honra, e o honrares não seguindo os
teus caminhos, não pretendendo fazer a tua própria vontade, nem falando palavras vãs, então, te
deleitarás no Senhor. Eu te farei cavalgar sobre os altos da Terra e te sustentarei com a herança de
Jacó, teu pai, porque a boca do Senhor o disse.
A genuína observância do sábado é descrita neste texto como abrangendo não apenas as atividades
físicas, mas também os próprios motivos e as intenções mais profundas. O ser humano como um todo -
física, mental, social e espiritualmente - é convidado a se envolver a cada sábado com o verdadeiro
espírito do sábado. Os insistentes apelos para deixar de lado os "teus próprios interesses", "os teus
caminhos' e "a tua própria vontade", e descansar no Senhor, colocam o sábado corno o clímax da
experiência da justificação pela fé nos méritos de Cristo (cf. Hb 3-4). Portanto, a verdadeira observância
do sábado bíblico é um forte antídoto contra o legalismo, que busca a salvação pelas próprias obras. É
interessante observar que Isaías 56:1-8 salienta a universalidade do sábado, como destinado "para todos os
povos"; e que Isaías 58:13 e 14 enfatiza a abrangência do sábado, como influenciando todas as
dimensões da vida humana. Mas Isaías 66:22 e 23 reconhece a peryetuidade do sábado, como
prosseguindo até o fim da história humana e adentrando os próprios portais da eternidade. Esse texto
declara: "Porque, como os novos céus e a nova Terra, que hei de fazer, estarão diante de Mim, diz o
Senhor, assim há de estar a vossa posteridade e o vosso nome. E será que, de uma Festa da Lua Nova à
outra e de um sábado a outro, virá toda a carne a adorar perante Mim, diz o Senhor." A idéia de que o
sábado semanal não mais será observado no "novo céu e nova Terra" (Ap 21:1), porque então os
remidos viverão em um sábado perene, é destituída de fundamento bíblico. Embora o texto mencione
elementos de natureza cerimonial, como o ritual da lua nova (ver Nm 10:10; 28:11-14; Am 8:5), o
sábado é aqui projetado para além do contexto nacional da aliança com Israel no Sinai, envolvendo "toda
a carne" e continuando durante a eternidade. Portanto, o livro de Isaías apresenta uma tríplice aplicação
do sábado (1) ao povo de Israel como nação (58:1, 12-14); (2) à humanidade como um todo (56:1-8); e
(3) aos próprios remidos que habitarão "os novos céus e a nova Terra" (66:22, 23). Por sua vez, os
profetas Jeremias e Ezequiel foram contemporâneos e exerceram seu ministério no contexto do
cativeiro babilônico (Jr 39; Ez 1:1-3). O reino do Norte não mais existia e o do Sul caracterizava-se
por uma crescente apostasia nacional.23
Antes da conquista de Jerusalém por Nabucodonosor em
605 a.C., Deus ainda propôs, através de Jeremias (17:19-27), que, se o povo judeu empreendesse
uma genuína reforma na observância do sábado, Jerusalém seria "para sempre habitada". Se, todavia,
tal reforma não ocorresse, a cidade seria completamente destruída. Por meio de Ezequiel (20:1-44),
Deus relembrou que os israelitas, depois do êxodo, não entraram na terra prometida porque "não
andaram nos Meus estatutos" e "profanaram grandemente os Meus sábados" (v. 13), estabelecidos
como "sinal entre Mim e eles" (v. 12, 20). Lamentavelmente, os apelos divinos não foram tomados a
sério, e Jerusalém, símbolo da morada de Deus com Seu povo, acabou sendo conquistada pelos exércitos
de Babilônia. Lemos em 2 Crônicas 36:15-21: O Senhor, Deus de seus pais, começando de madruga-
da, falou-lhes por intermédio dos Seus mensageiros, porque Se compadecera do Seu povo e da Sua
própria morada. Eles, porém, zombavam dos mensageiros, desprezavam as palavras de Deus e
mofavam dos Seus profetas, até que subiu a ira do Senhor contra o Seu povo, e não houve remédio
algum. Por isso, o Senhor fez subir contra ele o rei dos caldeus, o qual matou os seus jovens à espada,
na casa do seu santuário; e não teve piedade nem dos jovens nem das donzelas, nem dos velhos nem
dos mais avançados em idade; a todos os deu nas suas mãos. Todos os utensílios da Casa de Deus,
grandes e pequenos, os tesouros da Casa do Senhor e os tesouros do rei e dos seus príncipes, tudo
levou ele para a Babilônia. Queimaram a Casa de Deus e derribaram os muros de Jerusalém; todos os
seus palácios queimaram, destruindo também todos os seus preciosos objetos. Os que escaparam da
espada, a esses levou ele para a Babilônia, onde se tornaram seus servos e de seus filhos, até ao tempo
do reino da Pérsia; para que se cumprisse a palavra do Senhor, por boca de Jeremias,, até que a terra se
agradasse dos seus sábados; todos os dias da desolação repousou, até que os setenta anos se cumpriram.
Na realidade, Jeremias predisse que o cativeiro babilônico de Judá duraria 70 anos (Jr 25:11, 12; 29:10; cf.
2Cr 36:21; Dn 9:2). Ezequiel também antevia o retorno dos cativos para Jerusalém, onde o templo seria
reconstruído e seus serviços sagrados seriam restaurados (Ez 36-37, 40-48). Esse processo envolveria
também a restauração da observância do sábado (Ez44:24; 45:17; 46:1-4, 12), que se tornaria "central" ao
judaísmo pós-exílico.24
-
O Sábado no Período Pós-Exílico
Os judeus foram levados cativos para Babilônia por terem se afastado de Deus (2Cr 36:15-21).
Durante sua permanência no exílio, eles sofreram a influência paganizadora da nova cultura na
qual estavam inseridos. Somente uma profunda reforma espiritual poderia levá-los de volta à
verdadeira religião de Deus. Assim, após o retorno dos judeus do cativeiro babilônico, Esdras e
Neemias empreenderam uma profunda reforma espiritual entre o povo. O serviço religioso, que se
estendeu por vários dias, começou com a leitura do livro da lei (Ne 8:1-12) e a celebração da Festa
dos Tabernáculos (Ne 8:13-18). O povo se comprometeu, em solene aliança, a não mais continuar
profanando o sábado (Ne 9:38; 10:28-31). Mas, como o povo voltou a profanar o sábado, Neemias se
valeu de sua autoridade como governador e restabeleceu oficialmente a observância do sábado
(ver Ne 13:15-22). Ordenou que as portas da cidade fossem fechadas "dando já sombra as portas
de Jerusalém antes do sábado", para que "nenhuma carga entrasse no dia de sábado" (Ne 13:19).
O texto não apenas confirma que o sábado se inicia ao pôr do sol de sexta-feira e termina ao pôr do
sol de sábado (cf. Lv 23:32; Dt 16:6),25
mas também esclarece que todas as atividades seculares
devem ser deixadas de lado antes do início do sábado.
Resumo
O sábado, como santuário de Deus no tempo, foi estabelecido ao término da semana da criação (Cn
2:2,3; Ex 20:11; Hb 4:4, 10), quando todas as coisas ainda eram perfeitas. Mesmo com a entrada do
pecado no mundo, Deus continuou legando o sábado aos seres humanos. Do Éden ao Sinai existem
evidências da observância do sábado, que se tornam mais explícitas com a experiência do maná no
deserto de Sim (Êx 16:11-35). Na aliança do Sinai, a natureza moral do sábado foi confirmada por sua
presença no Decálogo, como memorial da criação (Êx 20:8-11). Ao término da peregrinação no deserto,
o mandamento do sábado foi enunciado também como memorial da redenção (Dt 5:12-15). Os
primeiros 500 anos da permanência dos israelitas em Canaã são marcados por um persistente silêncio a
respeito do sábado, que deve ser entendido como evidência de sua observância. Quando o sábado
começou a ser profanado de maneira mais generalizada, Deus enviou profetas para advertir o povo de
suas transgressões. O profeta Isaías enfatizou a universalidade do sábado "para todos os povos"
(56:1-8), a abrangência do sábado em todas as dimensões da vida humana (58:13, 14) e a perpetuidade
do sábado até o fim da história humana e mesmo durante a eternidade (66:22, 23). A persistente
profanação do sábado foi uma das principais causas do exílio babilônico (Jr 17:19-27). Mas as reformas
espirituais levadas a efeito por Esdras e Neemias contribuíram para restaurar a observância do sábado no
período pós-exílico (Ne 9:38; 10:28-31; 13:15-22). Alguém poderia conjecturar que o ciclo semanal e a
observância do sábado teriam se perdido nos primórdios da história humana. Mas foi a própria
observância do sábado que manteve esse ciclo inalterado ao longo da história. Ainda que tivesse sido
esquecido, ele acabaria sendo divinamente restaurado e reajustado por meio (1) do próprio milagre da
ausência cio maná no sábado (Êx 16); (2) da observância do quarto mandamento do Decálogo sob
supervisão divina (Êx 20:8-11; Dt 5:12-1 5); c (3) das orientações proféticas sobre a genuína observância
do sábado (Is 58:12-14). Portanto, assim como Deus instituiu originalmente o sábado ao término da
semana da criação (Gn 2:2, J), Ele também o preservou inalterado para as sucessivas gerações
O SÁBADO NO PERÍODO INTERTESTAMENTÁRIO
O cativeiro babilônico exerceu profunda e duradoura influência sobre a religião judaica. Se a grande
tentação do período pré-exílico era a idolatria, a do período pós-exílico passou a ser o legalismo. A
motivação era simples: havendo o povo sido levado cativo pelo seu afastamento das leis divinas (2Rs
36:15-20), os líderes judeus imaginavam que um novo cativeiro poderia ser evitado através da obediência
restrita a essas leis, incluindo a observância do sábado (cf. Jr 17:20-27). Deixando de ser visto como um
símbolo da graça divina, o sábado passou a ser desvirtuado por um acentuado formalismo.
A compreensão de algumas das práticas judaicas adotadas no período intertestamentário é
fundamental para se entender o contexto por trás dos conflitos entre Jesus e os escribas e fariseus com
respeito à observância do sábado. Por isso, este capítulo aborda brevemente aspectos dessa
observância (l) nos dias dos macabeus e (2) sob a influência dos mestres do judaísmo.
O Sábado nos Dias dos Macabeus
Alguns exemplos marcantes de corajosa observância do sábado foram deixados no 2° século a.C. pelos
macabeus nos conflitos com seus inimigos. De acordo com G. H. Waterman, "sob a influência dos
escribas judaicos, o sábado se tornou tão profundamente arraigado na consciência judaica [...] que, nos
dias dos macabeus, muitos escolheram morrer a profaná-lo".' Recusando terminantemente a batalhar em
dia de sábado, muitos judeus foram mortos pelos selêucidas (l Mc 2:29-38; 2Mc 5:25, 26; 6:11). Como a
atitude de completa passividade no sábado se mostrou desastrosa para os judeus, Matatias e seus
companheiros decidiram que pelejariam nesse dia em defesa própria, apenas quando atacados (IMc
2:39-41). A regra era: "Todo aquele que vier nos atacar em dia de sábado, nós o afrontaremos
abertamente. Assim não morreremos todos, como morreram nossos irmãos em seus esconderijos"
(lMc 2:41). A mesma postura foi seguida também por Jônatas, aos serem os judeus novamente
atacados em dia de sábado (lMc 9:43-49). Essa postura, que se demonstrou eficaz contra os
selêucidas, não impediu que os exércitos romanos, comandados pelo general Pompeu, finalmente
conquistassem Jerusalém (aproximadamente em 63 a.C.). Como os judeus pelejavam no sábado
apenas quando eram atacados, os romanos se valeram desse dia para construir, junto ao muro de
Jerusalém, uma grande plataforma que servisse de rampa para conquistar aquela cidade. Flávio Josefo
comenta a estratégia nos seguintes termos:
Os romanos trabalharam com infatigável ardor para elevar as plataformas e, para isso, cortaram
todas as árvores em redor. Depois, atacaram o templo com máquinas que Pompeu tinha feito vir de
Tiro e que lançavam grandes pedras à maneira de balas. Eles não teriam podido realizar esse feito,
com as plataformas, se a observância das leis de nossos antepassados, que proíbem trabalhar no dia
de sábado, não tivessem impedido os sitiados de se oporem a esse trabalho naquele dia. Sabendo
disso, os romanos não lançavam pedras nem atacavam de qualquer outro modo, mas continuavam a
elevar as plataformas e a fazer avançar as máquinas, para se servirem delas no dia seguinte.
Pode-se imaginar nosso zelo para com Deus e pela observância de nossas leis, pois nem o medo de
sermos atacados nos afastou da celebração de nossos sacrifícios.2
Sem dúvida, os conflitos com os selêucidas e com os romanos desafiaram significativamente os judeus
quanto à observância do sábado. Em contraste com a profanação pré-exílica tio sábado, esses conflitos
contribuíram para que os judeus se apegassem mais rigidamente ao sábado, que acabou sendo revestido
de uma roupagem legalista.
O Sábado Sob os Mestres do Judaísmo
Na parte final do período intertestamentário, os mestres do judaísmo não mediram esforços para
transformar o sábado na mais importante instituição judaica. O quarto mandamento do Decálogo
passou a ser considerado "como equivalendo em importância a todos os demais preceitos da Torah juntos".3
Mesmo considerando o sábado um dia de alegria, sua observância foi sendo revestida de um caráter cada
vez mais negativo, através do acréscimo de grande número de proibições, como está evidente no Livro
dos Jubileus (c. 150 a.C.) e no Documento de Damasco (c. 100 a.C.). Muitas dessas tradições foram
posteriormente compiladas na Mishnah (c. 200 d.C.), que, por sua vez, foi incorporada no Talmude (c.
500 d.C.), acrescida de comentários rabínicos (Gemara).4
O Livro dos Jubileus é considerado a mais
antiga lista judaica de atividades proibidas no sábado.5
Nele o sábado aparece como já sendo guardado "nos
Céus antes de ser revelado" aos seres humanos sobre a Terra (2:30).
Mas a universalidade do sábado (ver Is 56:1-8; Mc 2:27) é restrita a uma visão etnocêntrica; pois, na
opinião do autor da referida obra, o Criador "não santificou também todos os povos e nações para
guardar o sábado, mas apenas Israel" (2:31). Pena de morte é prescrita a todo o que no sábado, por
exemplo, empreender uma viagem, acender fogo, andar de barco ou mesmo jejuar (50:12, 13). No Livro
dos Jubileus é dito que qualquer que trabalhar no sábado "certamente morrerá eternamente" (2:27). O
Documento de Damasco proíbe no sábado discussões "sobre questões de riqueza e lucro" e "de
trabalhos e obras a ser realizados na manhã seguinte" (13:4, 5). Estabelece também que, "no sábado,
ninguém deve andar fora da sua cidade mais de mil cúbitos" (13:7), e que "nenhum homem deve jejuar por
sua própria vontade no sábado" (13:13). Além disso, durante o sábado, "nenhum homem deve ajudar um
animal no seu parto", e, se este "cair em uma cova ou fosso, ele não o deve levantar" (13:22, 23). As mais
importantes codificações judaicas a respeito da o b servância do sábado aparecem em dois tratados da
Mishnah in-titulados "Shabbat" e "Erubin". Enquanto o Shabbat enumera as regras básicas para a
observância do sábado, o Erubin apresenta evasivas para sua transgressão, sem incorrer em culpa. O
Shabbat (7:2) declara:
As categorias geradoras dos atos de trabalho (proibidos no sábado) são quarenta menos uma:
(1) aquele que semeia, (2) ara, (3) sega, (4) ata em feixes, (5) debulha, (6) joeira, (7) seleciona (o bom
produto ou colheita do ruim), (8) tritura, (9) peneira, (10) amassa, (11) assa; (12) aquele que tosa a lã,
(13) a lava, (14) a bate, (15) a tinge; (16) fia, (17) tece, (18) faz dois laços, (19) entrelaça dois fios,
(20) separa dois fios; (21) amarra, (22) desamarra, (23) costura dois pontos, (24) rasga para costurar
dois pontos; (25) aquele que pega um veado em emboscada, (26) o mata, (27) o esfola, (28) o
salga, (29) curte sua pele, (30) o limpa, (31) o corta em pedaços; (31) aquele que escreve duas
letras, (33) apaga duas letras para escrever duas letras; (34) aquele que constrói, (35) destrói; (36)
aquele que apaga fogo, (37) acende fogo; (38) aquele que bate com um martelo; (39) aquele que
transporta um objeto de um lugar para outro - veja, estes são os quarenta atos geradores de trabalho
menos um.
Embora essa relação de 39 categorias seja de natureza funda mental, ela não abrange todos os
detalhes das proibições rabímcas. Com o tempo, as 39 categorias foram expandidas para l .52 l (-• V) x 39)
desdobramentos.7
Mesmo na própria Mishnah aparecem outras regras pormenorizadas sobre a
observância do sábado. Por exemplo, o Shabbat 2:4 estabelece que "uma pessoa não deve encher uma
casca de ovo cem azeite e colocá-la na abertura de uma lâmpada de modo que (o azeite) pingue (e
abasteça a lâmpada)". Segundo o Enubin 4:7, se alguém estiver caminhando quando escurecer (na
sexta-feira à noitinha) e se referir a uma árvore ou a uma cerca nos seguintes termos: "Meu lugar de
residência para o sábado será sob ela", não disse nada de significativo. Mas, se disser: "Meu lugar de
residência para o sábado é a sua raiz", então ele poderá caminhar 2.000 cúbitos do lugar em que se
encontra até aquela raiz, e outros 2.000 cúbitos dali até sua casa.8
Por sua vez, no Talmude (Shabbat 23) é
dito que "um homem não deve olhar-se em um espelho no sábado", para não ser tentado a aparar o
cabelo. Embora sob circunstâncias normais ninguém pudesse carregar roupas adicionais no sábado,
o Talmude (Erubin 10) menciona que, em caso de incêndio, os rabinos permitiam a "um homem vestir
tantas roupas quantas" quisesse. Assim, tecnicamente, as roupas adicionais não estariam sendo carregadas,
pois faziam parte de sua própria vestimenta. A supervalorização do sábado na tradição judaica
transparece também nas seguintes afirmações rabínicas registradas no Talmude Babilônico (Shabbath
118b): "Aquele que observa o sábado de acordo com suas leis, mesmo praticando idolatria como a
geração de Enoque, está perdoado." "Se Israel tivesse guardado o primeiro sábado, nenhuma nação ou
língua teria conseguido dominá-lo." "Se Israel tivesse guardado dois sábados de acordo com as
respectivas leis, os israelitas teriam sido redimidos imediatamente." O Talmude (Yerushalmi Taanit 1:1)
acrescenta: "Se Israel guardasse um único sábado corretamente, então o filho de Davi viria."
Resumo
Durante o período intertestamentário, o sábado foi marcado por uma forte consciência de que a
sobrevivência de Israel como nação dependia de um apego rígido à observância desse dia.
Afastando-se da tradicional profanação pré-exílica, os judeus mantiveram sua lealdade ao sábado
mesmo diante dos mais severos conflitos com os selêucidas e os romanos. Sendo atacados
freqüentemente em dia de sábado pelos selêucidas, os judeus se voltaram para a guerra defensiva,
batalhando nesse dia apenas quando atacados por seus inimigos. Porém, os romanos aproveitaram o
sábado não para atacar os judeus, mas para construir rampas que facilitaram a invasão de Jerusalém. Na
parte final do período intertestamentário, os mestres do judaísmo começaram a enaltecer o sábado
como a mais importante instituição judaica. Removido do contexto de graça em que havia sido
originalmente instituído por Deus, o sábado foi revestido de um acentuado legalismo. Deixando de ser
visto como um símbolo da graça divina, o sábado passou a ser considerado um fim em si mesmo.
Portanto, o sábado precisava ser libertado dessa roupagem legalista e restaurado ao seu verdadeiro
significado bíblico. Essa importante missão foi levada a efeito por Cristo durante Seu ministério terrestre.
O SÁBADO NO NOVO TESTAMENTO
Hoje, muitos cristãos questionam os ensinamentos de suas respectivas denominações sobre o dia de
guarda ensinado no Novo Testamento. Entre as perguntas mais comuns estão as seguintes: Que dia de
guarda era observado por Cristo e os apóstolos? Teria a morte de Cristo na cruz do Calvário anulado o
Decálogo? O fato de Cristo haver ressuscitado no "primeiro dia da semana" (Mt 28:1; Mc 16:2, 9; Lc
24:1; Jo 20:1) teria realmente transferido a santidade do sábado para o domingo? O que o próprio Novo
Testamento tem a dizer a respeito do assunto? Essas indagações têm sido respondidas de diferentes
formas ao longo da história do cristianismo, dependendo dos métodos de interpretação bíblica adotados.
Os adeptos dos métodos alegórico, crítico-histórico, dispensacionalista e pós-moderno sempre encontram
maneiras criativas de impor ao texto bíblico suas próprias teorias. Mas, se quisermos entender o que o
Novo Testamento tem a dizer sobre o assunto, precisamos deixar que a Bíblia seja sua própria intérprete.1
Em outras palavras, devemos permitir que o Novo Testamento responda a essas questões, sem impormos a
ele desenvolvimentos históricos pós-apostólicos. O conteúdo a seguir aborda respectivamente (1)
Cristo e a lei; (2) os discípulos colhendo espigas no sábado; (3) Cristo curando no sábado; (4) o sábado
em relação à morte e ressurreição de Cristo; (5) o sábado e a queda de Jerusalém; (6) o sábado na igreja
apostólica; (7) o apóstolo Paulo e a observância do sábado; (8) considerações sobre João 20:19; (9)
considerações sobre l Coríntios 16:2; (10) considerações sobre Atos 20:7; (l 1) considerações sobre
Romanos 14:5; (12) considerações sobre Colossenses 2:16 c l 7; (l 3) considerações sobre Gaiatas 4:10;
(14) considerações sobre Apocalipse 1:10; (15) o sábado em Hebreus 4:4-11; e (16) o sábado em
Apocalipse 14:6-12.
Cristo e a Lei
O relacionamento de Cristo com a lei é elucidado por dois conceitos básicos. O primeiro di/.
respeito à autoridade de Cristo como Doador da lei. Em Sua afirmação "antes que Abraão existisse,
EU SOU [grego egõ eimi]" (Jo 8:58), Cristo Se identificou como sendo o grande "EU SOU" e "EU
SOU O QUE SOU" que aparecera a Moisés na sarça ardente (Êx 3:14). De acordo com Estêvão, esse
mesmo "Anjo do Senhor" (Êx 3:2), que Se autodenominara "EU SOU O QUE SOU" (Êx 3:14), era o
próprio Cristo que "no monte Sinai" enunciou o Decálogo (At 7:30-38). Na qualidade de
legislador, Cristo possui plena autoridade para definir como a lei deve ser observada. O segundo
conceito básico sobre o relacionamento de Cristo com a lei é a maneira pela qual a lei deveria ser
observada sob a nova aliança. Em Jeremias 31:31-33 aparece a seguinte promessa:
Eis aí vêm dias, diz o Senhor, em que firmarei nova aliança com a casa de Israel e com a casa de
Judá. Não conforme a aliança que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão, para os
tirar da terra do Egito; porquanto eles anularam a Minha aliança, não obstante Eu os haver
desposado, diz o Senhor. Porque esta é a aliança que firmarei com a casa de Israel, depois
daqueles dias, diz o Senhor: Na mente, lhes imprimirei as Minhas leis, também no coração lhas
inscreverei; Eu serei o seu Deus, e eles serão o Meu povo.
Essa "nova aliança" de que laia o profeta Jeremias foi confirmada pelo sangue de Cristo (Ml 26:28; Mc
14:24; Lc 22:20; ICo 11:25), constituindo-se no próprio Fundamento da igreja (2Co 3:6; Hb 8:8-12;
10:16, 17). A mesma lei moral do Decálogo, que era a base da antiga aliança (Êx 19:5), seria perpetuada
sob a nova aliança, mas com uma diferença fundamental. A antiga aliança, estabelecida originalmente na
graça divina (Dt 7:7, 8), acabou sendo desvirtuada pelos israelitas era uni conjunto de regras exteriores (Mt
15:1-20; 23:1-36). Porém, sob a nova aliança, essa mesma lei seria inscrita na "mente" e no "coração"
dos crentes (Jr 31:33; Hb 8:10; 10:16). No Sermão do Monte, Cristo cumpriu a promessa de Jeremias.
Depois de afirmar que não viera para "revogar a lei ou os profetas", mas "para cumprir" (Mt 5:17), Cristo
aprofundou o significado dos mandamentos do Decálogo. Por exemplo, a transgressão do mandamento
"Não matarás" (Êx 20:13) inicia já com a ira mental contra o próximo (Mt 5:21 -26). Da mesma forma, a
violação do mandamento "Não adulterarás' (Êx 20:14) começa com o próprio sensualismo mental que
estimula o ato sexual (Mt 5:27-32). E evidente, portanto, que Cristo veio não para anular o Decálogo, e
sim para aprofundar seu significado. A teoria de que a morte de Cristo na cruz teria abolido o Decálogo c
destituída de significado e acaba rompendo o relacionamento tipológico entre o santuário da antiga
aliança (terrestre) e o santuário da nova aliança (celestial) (Hb 9:1, 11). Se a aspersão do sangue sobre o
propiciatório da arca da aliança no santuário terrestre (Lv 16:14, 15) não abolia a lei que estava contida
dentro daquela arca (Êx 31:18; 40:20), por que então o sangue de Cristo deveria abolir a lei contida na
arca da aliança do santuário celestial (Ap 11:19)? O apóstolo Paulo esclarece que ele "não teria conhecido
o pecado, senão por intermédio da lei" (Rm 7:7); pois, sem dúvida, "o pecado é a transgressão da lei"
(IJo 3:4). Ora, se "o pecado é a transgressão da lei", e a lei foi abolida, então o pecado não mais existe, e
já não precisamos de salvação. Consequentemente, a própria missão de Cristo - "porque Ele salvará o
Seu povo dos pecados deles" (Mt 1:21) acaba perdendo seu sentido. Não é sem motivo que o próprio
Cristo afirmou que não viera "revogar a lei" (Mt 5:17), e o apóstolo Paulo acrescenta: "Anulamos, pois, a
lei pela fé? Não, de maneira nenhuma! Antes, confirmamos a lei" (Rm 3:31). Portanto, nos ensinos de
Cristo encontramos a verdadeira dimensão espiritual do Decálogo livre das tradições c "doutrinas que
são preceitos de homens" (Mt 15:9; cl. Is 29:13). Essa dimensão espiritual abrange também o quarto
mandamento, que ordena a observância do sábado (Êx 20:8-1 1).
Colhendo Espigas no Sábado
Jesus, sendo judeu, tinha o "costume" de freqüentar a sinagoga aos sábados (Lc 4:16), da mesma forma
que Seus discípulos. Mas o conhecido incidente no qual os discípulos de Jesus colheram espigas no
sábado levou os fariseus a acusá-los de violação do sábado (ver Mt 12:1-8; Mc 2:23-28; Lc 6:1-5). O
relato bíblico esclarece que, enquanto passavam "pelas searas, os Seus discípulos colhiam e comiam
espigas, debulhando-as com as mãos" (Lc 6:1). "Os fariseus, porém, vendo isso, disseram-lhe: Eis que
os Teus discípulos fazem o que não é lícito fazer em dia de sábado" (Mt 12:2). A acusação dos
fariseus não envolvia a questão de Cristo e os discípulos passarem pelas searas no sábado. Como os
próprios fariseus estavam juntos, em condições de ver o incidente e dialogar com Cristo a respeito, é
provável que o grupo estivesse regressando da sinagoga. Também não era o fato dos discípulos
estarem comendo cereais de propriedade alheia, pois em Deuteronômio (23:25) existe a seguinte
provisão: "Quando entrares na seara do teu próximo, com as mãos arrancarás as espigas; porém na seara
não meterás a foice." A verdadeira questão envolvida na acusação dos fariseus era se os discípulos de
Jesus tinham o direito de colher e comer espigas no sábado, "debulhando-as com as mãos" (Lc 6:1).
Segundo a tradição rabínica, esse ato envolvia várias atividades proibidas no dia de sábado. Samuele
Bacchiocchi esclarece que, "ao colherem as espigas, eles eram culpados de segar; ao esfregá-las com as
mãos, eram culpados de debulhar; ao separar os grãos da palha, eram culpados de joeirar; e, por todo o
processo, eram culpados de preparar uma refeição no dia de sábado".2
Em Sua resposta aos fariseus, Cristo mencionou dois exemplos do Antigo Testamento, relembrou a
verdadeira natureza do sábado e enfatizou Sua própria autoridade* sobre esse dia. O primeiro exemplo foi
o de Davi e seus companheiros que* entraram no tabernáculo e comeram pães da proposição ( Mc 2:25,
26). De acordo com o relato de l Samuel 21:1-6, Davi e seus homens estavam famintos, e não havia
"pão comum" disponível (v. 4); eles estavam cerimonialmente puros, pois não haviam tido relações sexuais
durante sua campanha (v. 4, 5); e os pães comidos eram os "que se tiraram de diante do Senhor, quando
trocados, no devido dia, por pão quente" (v. 6). As leis cerimoniais estabeleciam que pães frescos fossem
colocados sobre a mesa "em cada sábado", e que os pães velhos, uma vez removidos, fossem comidos
exclusivarnente pelos sacerdotes "no lugar santo" (Lv 24:5-9; l Cr 9:32). Ralph W. Klein argumenta que
"Jesus citou esse incidente como uma violação desculpável de uma regra cúltica".3
O segundo exemplo
foi o dos "sacerdotes no templo que violam o sábado e ficam sem culpa" (Mt 12:5). Como já
mencionado,4
os sacrifícios e ofertas "de cada sábado" deveriam ser o dobro do oferecido cm cada um dos
demais dias da semana (Nm 28:9, 10). Dessa forma, segundo C. F. Keil e F. Delitzsch, o sábado era
"enaltecido acima dos outros dias da semana [...], por um número maior de holocaus-tos, ofertas de
manjares e libações".5
O próprio Talmude Babilônico (Shabbath 132b) reconhecia que "o serviço
sacrificai tem prioridade sobre o sábado". Além disso, os sacerdotes no templo faziam uma obra especial
para Deus, que jamais poderia ser enquadrada na proibição de "cuidar dos teus próprios interesses no
Meu santo dia" (Is 58:13). Após citar os dois exemplos anteriores, Cristo afirmou que "o sábado foi
estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado" (Mc 2:27). O substantivo
"homem" (grego ánthrõpos) é aqui usado como "um termo genérico para a criatura humana", referindo-se
à criação dos primeiros seres humanos como "homem e mulher" (Gn 1:26, 27).6
Portanto, as palavras
de Cristo confirmam a origem edênica do sábado, desfazendo a teoria popular de que o sábado seria uma
instituição exclusivamente israelita ou judaica (Jb 2:31). Além disso, a declaração de Cristo redefine as
prioridades entre o sábado e o ser humano. Robert A. Guelich comenta que "o sábado foi criado para
benefício da criatura humana e, como dádiva criada por Deus, permanece a serviço da humanidade, e
não a humanidade a serviço do sábado".7
Cristo então reivindicou Sua autoridade para definir a verda-
deira observância do sábado. Em Sua declaração "Aqui está quem é maior que o templo" (Mt 12:6),
Cristo deixou evidente que o templo com seus cerimoniais eram apenas sombras que apontavam para
Ele mesmo (cf. Jo 1:29; Hb 8:5). Em Sua afirmação "o Filho do homem é Senhor do sábado" (Mt
12:8), Ele ratificou Seu status como Criador (Gn 2:2, 3; cf. Jo 1:1-3) e Legislador (At 7:38) do sábado.
Portanto, não havia ninguém mais abalizado do que Ele para desvencilhar o sábado das tradições
rabínicas pós-exílicas. Permitindo que os discípulos colhessem algumas espigas no sábado, com o mero
propósito de comer seus grãos, Cristo estava rompendo com essas tradições.
Curando no Sábado
Os evangelhos mencionam pelo menos sete milagres que Cristo operou no dia de sábado: (1) a cura do
paralítico de Betesda (Jo 5:1-15); (2) a cura de um endemoninhado em Cafarnaum (Mc 1:21-28); (3) a
cura da sogra de Pedro (Mc 1:29-31); (4) a cura do homem da mão ressecada (Mc 3:1-6); (5) a cura de
um cego de nascença (Jo 9:1-41); (6) a cura da mulher encurvada (Lc 13:10-17); e (7) a cura de um
hidrópico (Lc 14:1-6). Essas curas foram feitas, em geral, por iniciativa do próprio Cristo, e não dos
doentes ou dos familiares destes. No relato de Lucas 13 sobre a mulher encurvada, Jesus usa três vezes
o verbo "libertar" (grego lúein), traduzido na versão Almeida Revista e Atualizada como "estás livre" (v.
12), "desprende" (v. 15) e "livrar" (v. 16). Sem dúvida, o sábado é, por excelência, um dia de libertação.8
O fato de que as curas mencionadas ocorreram em dia de sábado gerou forte oposição dos líderes
judaicos. Em nenhum dos casos o ponto em discussão foi a validade do sábado como dia de guarda,
mas apenas a forma de ser ele observado. Enquanto Cristo procurava restaurar a dimensão espiritual
do sábado, os fariseus defendiam a tradição rabínica que o transformara em um verdadeiro fardo (cf.
Mt23:4;Lc 11:46).
E. J. Young esclarece: Cristo identificou-Se como o Senhor do sábado (Mc 2: 28). Ao assim falai,
Ele não estava depreciando a importância e a significação do sábado, nem de forma alguma estava
eni contravenção contra a legislação do Antigo Testamento. Ele estava simplesmente apontando para
a verdadeira significação do sábado no que diz respeito ao homem, e indicava o Seu direito de falar,
visto que Ele mesmo era o Senhor do sábado. [...] Em Seu conflito com os fariseus (Mt 12:1-14; Mc
2:23-28; Lc 6:1-1 1) nosso Senhor salientou perante os judeus o fato de que eles mal entendiam
completamente os mandamentos do Antigo Testamento. Buscavam tornar a observância do
sábado mais rigorosa do que Deus havia ordenado. Não era errado comer no sábado, ainda que o
alimento tivesse de ser obtido ao debulhar os grãos da espiga nas mãos. Semelhantemente, não era
errado fazer o bem no dia de sábado. As curas eram obra de misericórdia, e o Senhor do sábado é
misericordioso (cf. Jo 5:1-18; Lc 13:10-17; 14:l-6).9
Mesmo tendo que deixar de lado nossos próprios interesses durante o sábado (Êx 20:9; Is 58:13), esse
dia jamais deveria ser considerado um período de inútil ociosidade. Em Suas controvérsias com os
fariseus, Cristo deixou claro que "é licito, nos sábados, fazer o bem" (Mt 12:12), e chegou mesmo a
declarar: "Meu Pai trabalha até agora, e Eu trabalho também" (Jo 5:17). Isso se refere, sem dúvida,
ao incessante trabalho de Deus em favor de Suas criaturas, que mesmo durante o sábado continua
vivificando e mantendo o Universo. Ellen White pondera: Deveria Deus impedir o Sol de cumprir
sua missão no sábado, obstar seus fecundos raios de aquecer a Terra e nutrir a vegetação?
Deveriam os sistemas planetários quedar imóveis durante aquele santo dia? Ordenaria às fontes
que se abstivessem de regar os campos e as florestas, mandaria às ondas do mar que detivessem seu
incessante fluir e refluir? Deveriam o trigo e o milho deixar de crescer, e o maturante cacho adiar
seu belo colorido? Não hão de as árvores florescer, nem desabrochar as flores no sábado?10
Os milagres que Cristo operou no sábado não visavam apenas aliviar o sofrimento físico das
pessoas. Eram sinais que anunciavam a vinda do reino de Deus (cf. Mt 12:28; Jo 20:30, 31), e
prenuncies de que o mundo voltará à sua condição edênica, quando Deus "enxugará dos olhos
toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as pri-
meiras coisas passaram" (Ap 21:4; cf. Lc 4:14-19). O sábado, portanto, é uma reminiscência do
paraíso perdido que aponta para o paraíso restaurado.
O Sábado e a Paixão de Cristo
Os evangelhos afirmam que Cristo morreu em uma sexta-feira, na hora do sacrifício da tarde (Mt
27:46-50; Mc 15:34-37), descansou no sábado na sepultura (Mc 15:42-16:2) e ressuscitou no "primeiro
dia da semana" (Mt 28:1; Mc 16:1, 2; Lc 24:1; Jo 20:1). O relato de Lucas 23:50-24:1 é muito
elucidativo: E eis que certo homem, chamado José, membro do Sinédrio, homem bom e justo (que
não tinha concordado com o desígnio e ação dos outros), natural de Arimateia, cidade dos judeus, e
que esperava o reino de Deus, tendo procurado a Pilatos, pediu-lhe o corpo de Jesus, e, tirando-o do
madeiro, envolveu-o num lençol de linho, e o depositou num túmulo aberto em rocha, onde ainda
ninguém havia sido sepultado. Era o dia da preparação, e começava o sábado. As mulheres que tinham
vindo da Galileia com Jesus, seguindo, viram o túmulo e como o corpo fora ali depositado. Então, se
retiraram para preparar aromas e bálsamos. E, no sábado, descansaram, segundo o mandamento. Mas,
no primeiro dia da semana, alta madrugada, l oram elas ao túmulo, levando os aromas que haviam
preparado. Esse texto esclarece que, mesmo após a morte de Cristo, Seus seguidores continuaram
observando o sábado. Em primeiro lugar, a motivação para tal observância não era o apego à tradição
judaica, mas o compromisso com o quarto mandamento do Decálogo (Ex 20:8-1 1), como endente na
expressão "segundo o mandamento" (Lc 23:56). Em segundo lugar, os que observaram aquele sábado
eram discípulos de Cristo, que O haviam acompanhado desde a Galileia (Lc 23:55).
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O Sábado na Bíblia Alberto R. Timm - Completo.pdf

  • 1.
  • 2. O Sábado na Bíblia Por que Deus faz questão de um dia Sumario Prefacio 1. Princípios de Interpretação Bíblica Métodos de interpretação bíblica Filtros da mensagem bíblica A Bíblia como sua própria intérprete Resumo 2. Origem do Sábado O relato de Gênesis 1-11 Os "dias" da criação O sétimo dia da criação Resumo 3. O Sábado no Antigo Testamento O sábado do Éden ao Sinai O sábado na aliança do Sinai O sábado durante a peregrinação no deserto O sábado na terra prometida O sábado nos dias dos profetas O sábado no período pós-exílico Resumo 4. O Sábado no Período Intertestamentário O sábado nos dias dos Macabeus O sábado sob os mestres do judaísmo Resumo 5. O Sábado no Novo Testamento Cristo e a lei Colhendo espigas no sábado Curando no sábado O sábado e a paixão de Cristo O sábado e a queda de Jerusalém O sábado na igreja apostólica Alusões ao "primeiro dia da semana" A igualdade entre os dias A perpetuidade do sábado Resumo 6. Mudança do Sábado Para o Domingo O culto ao Sol no Império Romano O domingo no cristianismo pós-apostólico Mudança de ênfase Resumo
  • 3. 7. O Significado do Sábado Natureza do sábado Abandono e restauração do sábado Bênçãos do sábado Resumo 8. A Observância do Sábado Ruptura com a rotina da vida Preparação para o sábado Recepção e despedida do sábado Atividades impróprias para o sábado Atividades próprias para o sábado Situações especiais Resumo Conclusão PREFÁCIO O mundo moderno acelerou o ritmo da vida de grande parte da população a uma velocidade sem precedentes na história humana. Na esfera profissional, espera-se uma produção cada vez maior e de melhor qualidade. No âmbito acadêmico, os estudantes devem assimilar um volume crescente de informações, que vão se desdobrando em profundidade e complexidade. Com a globalização das comunicações e, consequentemente, das informações, muitas pessoas hoje vivem cumprindo agendas predeterminadas, quase sem tempo para a vida espiritual, familiar e social. Não tendo sido originalmente criadas para conviver com tantas responsabilidades e preocupações ao mesmo tempo, as pessoas são obrigadas a conviver com elevados graus de estresse individual e coletivo. Num mundo em que as coisas e os compromissos são quase mais importantes do que a própria vida, a observância do sábado bíblico é de uma relevância incalculável. O sábado representa uma ruptura com a tirania das coisas e a rotina da vida, para prover um tempo especial dedicado a Deus, à família, aos amigos e às pessoas necessitadas. Mais do que mero feriado semanal, esse dia é, em realidade, um canal das bênçãos divinas (Gn 2:3; Is 58:13, 14) e um "sinal" da lealdade ao Criador (Êx 31:16, 17). Prescrita pelo próprio dedo de Deus sobre tábuas de pedra (Êx 31:13-18; Dt 4:13; 9:9-11), a observância do sábado precisa ser redescoberta e reenfatizada no mundo contemporâneo. Várias obras foram publicadas nos últimos anos nos Estados Unidos sobre o significado e a relevância da observância do sábado.1 Mas a histórica discussão sobre o verdadeiro dia de guarda cristão (sábado ou domingo)2 continua acesa nos círculo cristãos.3 É importante reconhecermos a existência de uma antiga tradição britânica e norte-americana de usar o termo religioso Sabbath (sábado) para designar o Sunday (domingo civil), e a expressão seventh-day Sabbath (sábado do sétimo dia) para o Saturday (sábado civil). Seguindo essa tradição, muitos autores modernos continuam usando o termo Sabbath em alusão ao descanso dominical. Este estudo tem por objetivo apresentar urna visão geral do ensino bíblico sobre o sábado baseada em princípios de interpretação que permitam que a própria Bíblia exponha o que ela tem a dizer sobre o assunto. Assim, o primeiro capítulo demonstra as principais dificuldades com alguns métodos inadequados de interpretação bíblica e alguns filtros que conspiram contra uma compreensão honesta das Escrituras, sugerindo princípios fundamentais de interpretação. Com base no princípio da Bíblia como sua própria intérprete, os capítulos 2 a 5 consideram o tema do sábado ao longo das Escrituras. A questão da mudança do sábado para o domingo é abordada no capítulo 6. E, por último, os capítulos 7 e 8 tratam respectivamente do significado e da observância do sábado. Sou imensamente grato pelo apoio de minha esposa, Marly, e a compreensão dos nossos filhos, Suellen, William e Shelley, durante o período de pesquisa e redação deste projeto. A Marly acabou assumindo bondosamente muitas das atividades que deviam ter contado com a minha participação.
  • 4. Uma palavra especial de apreciação a Elias Brasil de Souza, Marcos De Benedícto, Mario Riveros Echeverry e Roberto Pereyra, por terem lido o conteúdo básico do livro e oferecido pertinentes sugestões; bem como a Cristina Morán, minha secretária, pela assistência ao longo do projeto. Porém, minha gratidão suprema é dedicada a Deus, que instituiu e preservou o sábado como um canal de bênçãos à humanidade. PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO BÍBLICA Em um vôo dos Estados Unidos para o Brasil tive um diálogo interessante com urna jovem norte-americana, que vinha ao nosso país como estudante missionária. Ela me disse que estudava Teologia em uma instituição conservadora norte-americana que tomava a Bíblia realmente a sério. Ao me identificar como teólogo adventista do sétimo dia, seu interesse pelo diálogo aumentou ainda mais. Não contendo sua curiosidade, ela disse: "Jamais tive a oportunidade de conversar com um adventista do sétimo dia. Você poderia me explicar as principais crenças de sua igreja?" Após discorrermos sobre alguns ensinamentos bíblicos, mencionei que uma das razões que levam os adventistas a observar o sábado é o fato de Deus ter não apenas descansado no sábado, mas também abençoado e santificado esse dia (Gn 2:2, 3). A jovem reagiu espontaneamente: "Mas você não pode tomar esse relato como literal, uma vez que todo o conteúdo de Gênesis 1-11 é apenas simbólico!" Ponderei, então, com ela: "Se você estuda em uma instituição conservadora, que toma 'a Bíblia realmente a sério', por que considera o conteúdo de Gênesis 1-11 apenas simbólico?" O diálogo continuou de maneira respeitosa e amigável, mas uma coisa ficou bem clara em minha mente: grande parte dos debates ao longo da história cristã sobre a observância do sábado e do domingo tem sido de natureza hermenêutica, sendo nutridos por divergentes métodos de interpretação bíblica e tendenciosos filtros pessoais. Em outras palavras, a questão da perpetuidade, da descontinuidade ou da substituição do sábado como dia de repouso cristão depende da perspectiva pela qual a pessoa estuda as Escrituras Sagradas. Métodos de Interpretação Bíblica Gerhard Ebeling sugere que "a história do cristianismo é a história da exposição das Escrituras".1 Portanto, a familiaridade com os diferentes métodos de interpretação bíblica é fundamental para a compreensão dos debates em torno das doutrinas bíblicas, incluindo o próprio sábado. O conteúdo a seguir aborda resumidamente como a Bíblia e o sábado têm sido encarados sob o impacto de alguns dos métodos de interpretação mais influentes do pensamento cristão. No período pós-apostólico, intérpretes cristãos comprometidos com a filosofia grega passaram a alegorizar o texto sagrado a ponto de o método alegórico se tornar predominante no cristianismo medieval.2 Muitos sentidos ocultos e artificiais impostos à Bíblia foram defendidos por autoridades eclesiásticas. Assim, textos bíblicos que confirmam a observância do sábado passaram a ser relidos alegoricamente, de modo a dar espaço à emergente observância do domingo.3 Por exemplo, o próprio relato da criação, que estabelece a observância do "sétimo dia" (Gn 2:2, 3), era usado em favor do domingo, pois foi no "primeiro dia" que Deus criou a luz (Gn l :3-5).4 Com esse tipo de reinterpretação, o sábado bíblico acabou sendo destituído de seu significado. Outro golpe na doutrina do sábado veio através do método crítico-histórico, que recebeu significativo impulso no fim do século 18, com o surgimento do racionalismo iluminista.5 Este método de análise literária, quando aplicado ao estudo da Bíblia, reduz o texto sagrado a mero produto do contexto sociocultural em que o referido texto veio à existência.6 Dessa forma, muitos ensinos bíblicos acabaram perdendo seu caráter normativo. Considerando o conteúdo de Gênesis 1-11 como mitológico, o sábado passou a ser visto, por exemplo, como um antigo costume babilônico7 ou cananita,8 incorporado posteriormente pelos hebreus, e não mais pertinente para os cristãos modernos. Na passagem do século 19 para o século 20 começou a se popularizar entre os evangélicos norte-americanos o método dispensacionalista de interpretação bíblica, que normalmente divide a história humana em sete dispensações ou períodos diferentes.9 Sendo que cada dispensação é tida como distinta das demais, os princípios de uma não se aplicam necessariamente às outras. Limitando a vigência do sábado à chamada "dispensação da lei" (para o antigo Israel), os adeptos desse método consideram a observância do sábado antiquada para a atual "dispensação da igreja" (para a igreja cristã).10
  • 5. Já no fim do século 20 estava sendo difundido em muitos círculos cristãos liberais o métoáo-pós-moderno de considerar o próprio leitor o referencial de interpretação ("reader-oriented approach").11 Rompendo tanto com o caráter normativo do texto bíblico quanto com as tradições eclesiásticas predominantes, este método, de natureza essencialmente pluralista, deixa as Escrituras abertas a uma grande variedade de interpretações conflitantes. Assim, a aceitação ou não do sábado passou a ser uma questão individual. Cada pessoa deve decidir, com base no que mais lhe convier, o que fazer e o que deixar de fazer nesse dia. Os métodos anteriormente mencionados surgiram em diferentes períodos da história, mas continuam sendo usados ainda hoje por importantes segmentos cristãos. Por mais atrativos que pareçam e difundidos que sejam, eles são inaceitáveis para aqueles que reconhecem o caráter normativo das Escrituras como Palavra de Deus, e as interpretam com base nos princípios da sola Scríptura (exclusividade das Escrituras) e da tota Scríptura (totalidade das Escrituras). E indispensável, portanto, que se use um método adequado, que respeite o que o texto bíblico está realmente dizendo, sem atribuir a ele significados artificiais. Filtros da Mensagem Bíblica O compromisso pessoal com "toda palavra que procede da boca de Deus" (Mt 4:4), incluindo a observância do sábado, tem sido minimizado também pelo uso de diferentes filtros pessoais. Por exemplo, os tradicionalistas limitam a interpretação bíblica às tradições eclesiásticas predominantes. Como a partir do 4° século d.C. a grande maioria dos cristãos passou a observar o domingo, e apenas pequenos segmentos do cristianismo ainda continuaram observando o sábado,12 os tradicionalistas insistem que o domingo é indiscutivelmente o dia de guarda para os cristãos. Os racionalistas colocam a razão humana acima das Escrituras, aceitando delas apenas as porções que melhor se encaixam em sua moldura ideológica e mais se harmonizam com sua própria forma de pensar. Como, além do exemplo divino (ver Gn 2:1-3) e do mandamento divino (ver Êx 20:8-1 1), não existe uma razão astronômica lógica para a observância do sábado, esta é considerada pelos racionalistas uma prática obsoleta que só pode ser mantida através de uma ingênua credulidade religiosa. Já os culturalistas distorcem o sentido óbvio das Escrituras através de releituras culturalmente condicionadas. Para eles, a própria essência da mensagem bíblica deve ser contextualizada às diferentes culturas modernas, sem exercer influência transformadora sobre os respectivos contextos culturais. Dessa forma, a Palavra de Deus perde sua autoridade normativa. Como a cultura ocidental não estimula nem favorece a observância do sábado, esta é considerada uma instituição anticultural. Por sua vez, os carismáticos tendem a substituir o conteúdo objetivo da Palavra de Deus por suas subjetivas experiências pessoais.13 Interpretando tendenciosamente a declaração "porque a letra mata, mas o espírito vivifica" (2Co 3:6),H eles costumam aceitar das Escrituras apenas as partes endossadas por supostas revelações pessoais do Espírito Santo. Não sendo a validade do sábado confirmada por tais revelações, ela passa a ser considerada uma prática legalista (porque "a letra mata"), antagônica à experiência daqueles que são guiados pelo Espírito (porque "o espírito vivifica"). Existem ainda os familistas,15 que colocam seus vínculos familiares acima da Palavra de Deus. Pouca relevância é atribuída às palavras de Cristo: "Quem ama a seu pai ou sua mãe mais do que a Mim não é digno de Mim; quem ama seu filho ou sua filha mais do que a Mim não é digno de Mim; e quem não toma a sua cruz e vem após Mim não é digno de Mim" (Mt 10:37, 38). Para os familistas, a observância do sábado é uma instituição inaceitável, que acabaria rompendo a tradição familiar e a harmonia social que eles tanto prezam. Um estudo sério e objetivo das Escrituras, inclusive da doutrina bíblica do sábado, jamais deveria estar condicionado às tradições eclesiásticas, à lógica humana, à cultura moderna, às experiências pessoais ou aos vínculos familiares c sociais. Esses elementos, por mais importantes que sejam, são aceitáveis apenas ao nível em que não conflitem cornos ensinos normativos da Palavra de Deus. Sempre que tais elementos entrem em desacordo com a vontade divina, a postura do cristão deve ser a mesma de Pedro e dos demais apóstolos: "Antes, importa obedecer a Deus do que aos homens" (At 5:29).
  • 6. A Bíblia Como Sua Própria Intérprete A mitologia grega faz alusão a um assaltante chamado Procrustes, que seqüestrava os viajantes que passavam por uma estrada de acesso a Atenas. O assaltante possuía duas camas: uma longa e outra curta. Ele amarrava as pessoas de baixa estatura na cama longa, e as pessoas altas, na cama curta. Então esticava as pessoas baixas até que atingissem o tamanho da cama longa, e cortava a parte inferior das pernas das pessoas altas para não excederem o comprimento da cama curta, "provocando inevitavelmente a morte de todos".16 Desconhecendo a advertência de não fazermos acréscimos nem supressões às Escrituras (ver Ap 22:18, 19), muitos cristãos ainda hoje usam uma postura semelhante à de Procrustes em seu estudo do texto sagrado. Existe, na realidade, uma forte tendência de se adaptar subjetivamente o conteúdo da Palavra de Deus aos gostos e interesses pessoais. Todo estudo honesto da Bíblia que deseje evitar riscos e distorções deve ser informado e controlado por alguns princípios básicos de interpretação. Um desses princípios é o da exclusividade das Escrituras. A própria Bíblia condena a aceitação de tradições humanas que invalidem "a palavra de Deus" (ver Mt 15:3, 6, 9); de argumentos humanos que contradigam o pensamento divino (ver Is 55:8, 9); e de experiências carismáticas em desacordo com "a vontade de Meu Pai, que está nos Céus" (ver Mt 7:21-23). O contraste entre as efêmeras opiniões humanas e a eterna palavra de Deus é salientado em Isaías 40:6-8: "Toda a carne é erva, e toda a sua glória, como a flor da erva; seca-se a erva, e caem as flores, soprando nelas o hálito do Senhor. Na verdade, o povo é erva; seca-se a erva, e cai a sua flor, mas a palavra de nosso Deus permanece eternamente." Outro princípio básico de interpretação é o da totalidade das Escrituras, Cristo afirmou que o genuíno cristão é alguém que permite que o Espírito Santo o guie "a toda a verdade" (Jo 16:13); que vive "de toda palavra que procede da boca de Deus" (Mt 4:4; cf. Dt 8:3); e que ensina a outros "todas as coisas" ordenadas por Cristo (Mt 28:20). De acordo com o apóstolo Paulo, "toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça" (2Tm 3:16). Portanto, a própria Bíblia condena a prática seletiva de aceitar dos ensinos bíblicos apenas o que se gosta, e de rejeitar o que não se gosta. Um terceiro princípio básico de interpretação é reconhecer e aceitar o desenvolvimento natural dos temas bíblicos, sem impor-Ihes interpretações artificiais extrabíblicas. Nesse desenvolvimento, os ensinamentos de Cristo e dos apóstolos, registrados no Novo Testamento, são os intérpretes inspirados do Antigo Testamento. No entanto, reconhecendo a Bíblia como sua própria intérprete, não se pode aceitar releituras pós-apostólicas que distorçam o significado natural do texto bíblico. Além da exclusividade, da totalidade e do desenvolvimento natural do texto bíblico, é também indispensável interpretar literalmente o texto bíblico, exceto onde for evidente o simbolismo. É certo que na Bíblia existem inúmeras figuras de linguagem, parábolas e mesmo visões apocalípticas que devem ser interpretadas como tais. Mas um dos mais graves "equívocos hermenêuticos é a tentativa de interpretar simbolicamente as porções literais do texto bíblico, incluindo suas descrições históricas. Essa prática acaba distorcendo o sentido óbvio do texto sagrado, expondo-o a inúmeras releituras tendenciosas. Um quinto princípio básico de interpretação é a rejeição de falsas analogias que usam indevidamente um assunto para provar outro assunto.17 Sem dúvida, nas Escrituras encontramos profecias e seus respectivos cumprimentos históricos; tipos (ou símbolos) e seus respectivos cumprimentos antitípicos (ou realidades). Mas, se quisermos ser leais ao texto bíblico, não podemos impor a ele relacionamentos tipológicos não sugeridos pelo próprio texto.
  • 7. Por último, é indispensável reconhecer o caráter normativo e universal dos ensinos bíblicos e viverem conformidade com eles. O conteúdo das Escrituras está permeado de princípios universais e de aplicações temporais desses princípios em diferentes contextos culturais. Mas mesmo as aplicações temporais cuja forma se restringe ao contexto sociocultural da época estão embasadas em princípios universais nor- mativos e pertinentes para todos os tempos e lugares. Na analogia dos dois fundamentos (ver Mt 7:24-27), Cristo declara que edificar a casa espiritual sobre a rocha significa ouvir e praticar Suas "palavras". Resumo Todo estudo que visa descobrir o que a Bíblia tem a dizer realmente sobre diferentes assuntos (inclusive o sábado) deve, por um lado, evitar métodos e filtros que distorçam o sentido natural do texto bíblico, e, por outro, adotar princípios adequados de interpretação bíblica. Entre os métodos a ser evitados estão (1) o método alegórico, que destitui o texto bíblico do seu verdadeiro significado (2) o método crítico-histórico, que elimina o caráter normativo de muitos dos ensinos bíblicos (3) o método dispensacionalista, que fragmenta a unidade geral das Escrituras (4) o método pós-moderno, que transfere a autoridade do texto bíblico para o leitor, deixando as Escrituras abertas a uma grande variedade de interpretações conflitantes. E indispensável evitar também alguns filtros pessoais, como (1) o tradicionalismo, que limita a interpretação bíblica às tradições eclesiásticas predominantes (2) o racionalismo, que aceita das Escrituras apenas as porções que melhor se encaixam em sua moldura ideológica e mais se harmonizam com sua própria forma de pensar (3) o culturalismo, que distorce o sentido óbvio das Escrituras através de releituras culturalmente condicionadas (4) o existencialismo, que tende a substituir o conteúdo objetivo da Palavra de Deus por subjetivas experiências pessoais (5) o familismo, que coloca os vínculos familiares e sociais acima da Palavra de Deus. Por outro lado, um estudo adequado do texto bíblico, que reconhece a Bíblia como sua própria intérprete, deve ser informado e controlado pelos princípios (1) da exclusividade das Escrituras (2) da totalidade das Escrituras (3) do desenvolvimento natural dos temas bíblicos (4) da interpretação literal do texto bíblico, exceto onde for evidente o simbolismo (5) da rejeição de falsas analogias; (6) do reconhecimento do caráter normativo e universal dos ensinos bíblicos, e da conformidade pessoal com eles. Esses princípios constituem o embasamento hermenêutico do estudo sobre o sábado exposto nos capítulos que se seguem.
  • 8. ORIGEM DO SÁBADO No diálogo com a estudante missionária norte-americana, mencionado no capítulo l, ela argumentou, como muitos intérpretes modernos, que o conteúdo de Gênesis 1-11 não é literal, mas simbólico. Dessa forma, esse texto, incluindo a descrição bíblica sobre a origem do sábado (ver Gn 2:1-3), acaba sendo exposto a várias interpretações artificiais e contraditórias. Por exemplo, o assiriologista alemão Friedrich Delitzsch crê que o sábado se originou em Babilônia.1 Julian Morgenstern acredita que tal observância surgiu no contexto da cultura agrícola cananita.2 Já Cuthbert A. Simpson alega que o sábado era uma reminiscência da suposta "adoração da deusa Lua" pelos próprios israelitas em suas peregrinações noturnas pelo deserto.3 Por sua vez, Paul K. Jewett reflete a teoria popular de que Deus instituiu o sábado somente após o êxodo de Israel do Egito.4 Por mais criativas que sejam, essas teorias são inaceitáveis àqueles que tomam a sério o que a própria Bíblia diz sobre.o assunto. Fundamental no ensino bíblico sobre a origem do sábado é a compreensão da natureza (1) do relato de Gênesis 1-11; (2) dos "dias" da criação; e (3) do sétimo dia da criação. O conteúdo a seguir considera brevemente cada um desses temas. O Relato de Gênesis 1-11 Os defensores do método crítico-histórico negam a literalidade do relato de Gênesis 1-11, sugerindo que seu conteúdo é apenas mitológico.5 No entanto, para sermos consistentes com o princípio de "a Bíblia como sua própria intérprete", devemos levar em consideração como os demais escritores bíblicos si- referem ao conteúdo dos primeiros onze capítulos das Escrituras Sagradas. Tais escritores consideram esse conteúdo corno mitológico ou histórico? Alusões bíblicas posteriores ao relato da criação, à queda de Adão e Eva, ao homicídio de Abel, ao dilúvio e às genealogias relacionadas com Adão e Sem ajudam a elucidar essa questão.A autenticidade do relato da criação (Gn l, 2) é confirmada por vários textos bíblicos, Por exemplo, o mandamento do sábado afirma que, "em seis dias, fez o Senhor os céus e a terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou" (Ex 20:11). O livro dos Salmos declara que "os céus por Sua palavra [de Deus] se fizeram"; "pois Ele falou, e tudo se fez; Ele ordenou, e tudo passou a existir" (SI 33:6, 9). O próprio Cristo Se refere ao "mundo, que Deus criou" (Mc 13:19), e afirma que, "desde o princípio da criação, Deus os fez homem e mulher" (Mc 10:6; também Mt 19:4). O apóstolo Paulo confirma que Deus criou a luz (2Co 4:6), bem como o homem e a mulher (lCo 11:9). O apóstolo Pedro menciona que a terra "surgiu da água e através da água pela palavra de Deus" (2Pe 3:5). O apóstolo João atesta que "todas as coisas" foram criadas por Deus (Jo 1:1-3, 10), que "fez o céu, e a terra, e o mar, e as fontes das águas" (Ap 14:7). A realidade da queda de Adão e Eva (Gn 3) é confirmada por Paulo, ao dizer que "por um só homem [Adão] entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte" (Rm 5:12; também Rm 5:12-21; ICo 15:22, 45; !Tm2:13, 14). O homicídio de Abel (Gn 4:1-16) é tido como um fato tanto por Cristo (Mt 23:35; Lc 11:51) quanto pela epístola aos Hebreus (Hb 11:4; 12:24). A história de Noé e o dilúvio (Gn 6-9) é confirmada no livro do profeta Isaías (Is 54:9), pelo próprio Cristo (Mt 24:37-39; Lc 17:26, 27), na epístola aos Hebreus (Hb 11:7), bem como nos escritos do apóstolo Pedro (IPe 3:20; 2Pe 2:5; 3:5, 6). As genealogias dos descendentes de Adão e Sem (Gn 5:1-32; 11:10-32) são confirmadas por Lucas na genealogia de Jesus (Lc 3:23-38). Portanto, uma leitura do texto bíblico é suficiente para confirmar que Cristo e os demais profetas bíblicos consideravam Gênesis 1-11 uma descrição histórica literal. Já uma releitura mitológica do referido texto acaba distorcendo sua natureza e propósito. Em harmonia com o ensinamento bíblico, o presente estudo considera o relato em discussão histórico c não mitológico. Os "Dias" da Criação A tentativa de harmonizar o relato bíblico da criação (Gn l, 2) com a teoria evolucionista levou alguns intérpretes bíblicos a propor um evolucionismo teísta,6 no qual cada "dia" da semana da criação representaria uma "era" geológica de mil anos.
  • 9. Apoio bíblico para essa proposta tem sido buscado nas declarações de que "mil anos, aos Teus olhos, são como o dia de ontem que se foi e como a vigília da noite" (SI 90:4) e "para o Senhor, um dia é como mil anos, e mil anos, como um dia" (2Pe 3:8). Como nenhuma dessas declarações se refere aos dias da criação, tal associação não passa de falsa analogia. Eruditos no estudo do Antigo Testamento reconhecem que cada "dia" (hebraico yôm [dia] e não aeon [era]) deve ser en- tendido em Gênesis 1:1 a 2:3 como um dia literal de 24 horas. Por exemplo, C. F. Keil e F. Delitzsch afirmam que, "se os dias da criação são regulados pelo recorrente intercâmbio de luz e trevas, eles não devem ser considerados períodos de tempo de duração incalculável, de anos ou milhares de anos, mas simples dias terrestres".7 Gordon J. Wenham acrescenta: Pode haver pouca dúvida de que aqui "dia" tem o sentido básico de um período de 24 horas. A menção de tarde e manhã, a enumeração dos dias e o descanso divino no sétimo dia demonstram que uma semana de atividades divinas está sendo descrita aqui. Em outros lugares, obviamente, "no dia em que" e expressões similares podem significar simplesmente "quando" (por exemplo, 2:4; 5:1, etc.). O Salmo 90:4 diz, em realidade, que mil anos são para Deus como um dia. Mas é perigoso tentar correlacionar a teoria científica com a revelação bíblica apelando para esses textos.8 Gerhard F. Hasel argumenta que- a estrutura lingüística de Gênesis l, a seqüência dos eventos nele- descritos e o testemunho de outros textos bíblicos (Ex 20:8- I I ; 41:12-17) confirmam que os "dias" da semana ia criação só podem ser entendidos como uma seqüência cronológica e ininterrupta de sete dias literais de 24 horas cada.9 De acordo com Cuthbert A. Simpson, "não resta dúvida de que por 'dia o autor pretendia dizer precisamente o que nós entendemos o tempo necessário para uma volta da Terra ao redor do seu eixo". Portanto, a tentativa de interpretar os "dias" da semana da criação como se fossem "eras" bem mais longas acaba "minimizando a grandeza de Deus" e "o Seu poder de realizar tanto em um dia".10 * Ainda em relação aos "dias" da semana da criação, pode-se observar que apenas os seis primeiros dias são qualificados pela expressão "tarde e manhã" (Gn 1:5, 8, 13, 19, 23, 31), e não o "dia sétimo" (Gn 2:2, 3). Significaria isso que o "dia sétimo" teria sido maior do que os outros dias, ou mesmo um período de tempo indefinido? Existem pelo menos dois motivos para se considerar a duração do sétimo dia igual à dos demais dias. Em primeiro lugar, a palavra "dia" (hebraico yôm) é a mesma para todos os sete dias. Assim, se nos seis primeiros dias ela representa um período literal de 24 horas, a mesma duração deve ser atribuída também ao sétimo dia. Em segundo lugar, o sétimo dia da semana da criação só serve de modelo para a observância do sábado semanal se aquele foi um dia literal como os sábados subseqüentes (Êx 20:8-11; 31:12-17; Hb 4:4-11). Portanto, a ausência da expressão "tarde e manhã" em relação ao sétimo dia jamais deveria ser usada para atribuir-lhe uma duração maior do que a sugerida pelo próprio texto bíblico. O Sétimo Dia da Criação A primeira alusão bíblica ao descanso no sétimo dia aparece em Gênesis 2:2 e 3, que diz: "E, havendo Deus terminado no dia sétimo a Sua obra, que fizera, descansou nesse dia de toda a Sua obra que tinha feito. E abençoou Deus o dia sétimo e o santificou; porque nele descansou de toda a obra que, como Criador, fizera." Alguns comentaristas que consideram o sábado uma instituição meramente judaica negam que esse texto estabeleça a observância do sábado para a humanidade, pois (l) naquela época ainda não existia nenhum judeu; (2) a expressão usada é "sétimo dia" e não "sábado"; e (3) a alusão é apenas ao descanso de Deus e não dos seres humanos. Mas tais argumentos carecem de consistência. *A teoria de que o sábado teria sido estabelecido apenas para os judeus não faz sentido, pois o próprio Cristo confirmou a universalidade do sábado ao mencionar que "o sábado foi estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado" (Mc 2:27). Além disso, o profeta Isaías fala que o sábado seria observado na era messiânica por eunucos e estrangeiros (Is 56:1-8). Por sua vez, a mera ausência do termo "sábado" em Gênesis 2:2 e 3 não enfraquece o conteúdo do texto, uma vez que o próprio mandamento do sábado define que "o sétimo dia é o sábado do Senhor, teu Deus" (Êx 20:10).
  • 10. A questão não é tanto o uso do termo "sábado" quanto a ênfase no conceito do descanso semanal no sétimo dia. * O descanso de Deus, que "nem Se cansa, nem Se fatiga" (Is 40:28), proveu para os seres humanos o modelo do descanso semanal (Êx 20:8-11; 31:12-17; Hb 4:4-11). De acordo com Gerhard F. Hasel, "Deus Se manifestou em cessar Sua obra e em descansar como divino exemplo para a raça humana".11 Sendo que Adão e Eva foram criados no sexto dia (Gn l :26-28), e Deus descansou no sétimo (Gn 2:2, 3), é evidente que para aquele casal o sábado foi o primeiro dia completo de existência, no qual participaram pela graça de Deus do descanso sabático. Karl Barth argumenta que "o testemunho bíblico une tão expressa e diretamente a atividade divina no sétimo dia da criação com a instituição do sábado que o homem deve observar que é impossível entendê-lo por outro ângulo".12 O mesmo autor acrescenta: Obviamente, os testemunhos bíblicos não sugerem que a criação, tendo o homem como cabeça, trabalhou nesse dia de descanso divino, após o último dia de atividade. A clara inferência é que a criação, e supremamente o homem, descansou com Deus no sétimo dia e participou da Sua liberdade, descanso e alegria, mesmo não tendo ainda realizado nenhum trabalho do qual cessar. Sua liberdade, descanso e alegria no sábado podiam apenas contemplar a obra de l Deus, e não a sua própria.13 * Alem de descansar no "dia sétimo", Deus também "abençoou" e "santificou esse dia (Gn 2:2, 3). Quaisquer dúvidas quanto ao significado do "dia sétimo" são dissipadas por uma compreensão adequada desse tríplice ato de Deus descansar, abençoar e santificar. Se o descanso de Deus em si já implica na instituição do sábado para Suas criaturas, o fato de ter Ele abençoado e santificado esse dia confirma tal instituição. Quando Deus abençoa e santifica algo, Ele sempre o faz em benefício de Suas criaturas. Esse tríplice ato de Deus comprova a origem edênica do sábado (Gn 2:2, 3), anterior à queda de Adão e Eva (Gn 3), quando tudo ainda "era muito bom" (Gn 1:31). Portanto, 0 sábado é de natureza moral e de abrangência universal, cuja validade não se restringe a tempo, lugar ou povo específico. Ao Deus escolher um meio especial de comunhão com Suas criaturas, por que teria Ele escolhido um dia específico (o sábado), em vez de um lugar específico no jardim do Éden? Sakae Kubo sugere que Deus "escolheu um segmento de tempo" para comungar com Suas criaturas por três motivos: (l) porque o tempo é universal e está em toda parte; (2) porque o tempo é imaterial, apontando para as coisas espirituais, além do espaço e da matéria; e (3) porque o tempo é todo-abarcante, jamais oscilando em intensidade.14 São essas características do tempo que permitem que o sábado chegue igualmente a todos os seres humanos (ricos e pobres, cultos e incultos) como um genuíno "santuário no tempo".15 * Resumo Um estudo mais detido sobre a origem do sábado deve levar em consideração a natureza do relato de Gênesis 1-11, dos "dias" da criação, do sétimo dia da criação. O testemunho das Escrituras confirma que Cristo e os demais profetas bíblicos consideravam Gênesis 1 -1 I uma descrição histórica literal. Qualquer releitura mitológica do referido texto acaba distorcendo sua natureza e propósito. O presente estudo, baseado no princípio da Bíblia como sua própria intérprete, considera o relato histórico e não mitológico. Os "dias" da semana da criação só podem ser entendidos como dias literais de 24 horas, levando-se em consideração a estrutura lingüística de Gênesis l, a seqüência dos eventos descritos e o testemunho de outros textos bíblicos (Ex 20:8-1 1; 31:12-17). Mesmo não sendo qualificado pela expressão "tarde e manhã", o "dia sétimo" (Gn 2:2, 3) deve ser considerado como tendo a mesma duração dos demais dias, pois a palavra "dia" (hebraico yôm) é a mesma para todos os sete dias; e o sétimo dia da semana da criação só serve de modelo para a observância do sábado semanal se aquele foi um dia literal (Êx20:8-ll;31:12-17;Hb 4:4-11). A origem edênica do sábado é confirmada pelo fato de Deus ter descansado nesse dia, bem como o abençoado e santificado (Gn 2:2, 3). Descansando no sábado, Deus proveu um exemplo para Suas criaturas. Abençoando esse dia, Ele o transformou em um canal de bênçãos para elas. E, santificando o sábado, Ele o separou para uso sagrado. Esse tríplice ato confirma que Deus instituiu o sábado para benefício da humanidade. Escolhendo um segmento de tempo, em vez de um lugar específico, Deus disponibilizou o sábado a todos os seres humanos em todos os tempos e lugares. Mas a história bíblica demonstra que nem sempre o povo de Deus foi leal a esse legado.
  • 11. O SÁBADO NO ANTIGO TESTAMENTO A história do povo de Deus no Antigo Testamento está repleta de episódios relacionados à observância do sábado. Em ocasiões solenes, Deus enunciou mandamentos orientando essa observância. Afastando-se o povo das prescrições divinas, Ele usou profetas para adverti-lo e condenar a apostasia. É importante que nos familiarizemos com esses episódios, pois foram registrados "para advertência nossa, de nós outros sobre quem os fins dos séculos têm chegado" (l Cor 10:11). O conteúdo deste capítulo considera aspectos importantes relacionados ao sábado (1) do Éden ao Sinai; (2) na aliança do Sinai; (3) durante a peregrinação no deserto; (4) na Terra Prometida; (5) nos dias dos profetas; e (6) no período pós-exílico. O Sábado do Éden ao Sinai O ciclo semanal de sete dias, instituído na criação do mundo (Gn l: 1-2:3), foi perpetuado de forma ininterrupta ao longo da história humana, graças à observância do sábado em cada sétimo dia. Evidências desse ciclo transparecem bem antes da proclamação do Decálogo no Sinai. Por exemplo, já no contexto do dilúvio aparecem expressões como "outros sete dias" e "mais sete dias" (Gn 8:10, 12). Na descrição do casamento de Jacó e Lia existem duas alusões à "semana" dessa noiva (Gn 29:27, 28). Tais períodos podem não ter coincidido com o início e o término do próprio ciclo semanal, mas confirmam que a semana de sete dias era conhecida pelos patriarcas.1 * Durante a opressão do cativeiro egípcio (Êx 3:7-9), os israelitas negligenciaram a obediência aos mandamentos divinos (cf. Gn 26:5), que certamente incluíam a observância do sábado (Êx l 6:25-28). O éxodo do Egito visava restaurar tanto o sistema sacrifica] (Ex 3:18) quanto a obediência aos "preceitos" e "leis" de Deus (SI 105:43-45). Mas Faraó reagiu negativamente, indagando por que interrompiam "o povo no seu trabalho" (Êx 5:4) e acusando os israelitas de estar "ociosos" (Ex 5:8, 17). C. F. Keil e F. Delitzsch declaram: "Faraó não queria ouvir nada a respeito de adoração. Ele cria que a solicitação era simplesmente uma escusa para buscar feriados para o povo, ou dias de descanso de seus labores."2 George Rawlinson acrescenta que, "como os antigos egípcios não tinham uma instituição como o sábado semanal, e certamente não tolerariam a abstinência do trabalho por parte dos escravos hebreus num dia em sete, devemos supor que o descanso sabático, se já conhecido dos hebreus, havia caído em desuso durante sua permanência no Egito".3 * Assim sendo, é provável que na própria acusação de que os israelitas estavam "ociosos" (Ex 5:8, 17) haja indícios de uma restauração da observância do sábado, resultando em opressão ainda maior (Ex 5:6-14). Um mês após saírem do Egito (Ex 12:2, 6, 11, 12, 37), os israelitas chegaram ao deserto de Sim (Êx 16:1), onde o Senhor passou a alimentá-los com o maná, na intenção de prová-los e ver se andariam na Sua "lei ou não" (Êx 16:4). No relato desse incidente (ver Êx 16) aparece pela primeira vez a palavra "sábado" no Antigo Testamento (Êx 16:23), e seu conteúdo é de fundamental importância para a compreensão da origem e desenvolvimento da observância do sábado nos primórdios da história humana. Em Êxodo 16:25-30 lemos: Então, disse Moisés: Comei-o hoje, porquanto o sábado é do Senhor; hoje, não o achareis no campo. Seis dias o colhe-reis, mas o sétimo dia é o sábado; nele, não haverá. Ao sétimo dia, saíram alguns do povo para o colher, porém não o acharam. Então, disse o Senhor a Moisés: Até quando recusareis guardar os Meus mandamentos e as Minhas leis? Considerai que o Senhor vos deu o sábado; por isso, Ele-, no sexto dia, vos dá pão para dois dias; cada um fique onde está, ninguém saia do seu lugar no sétimo dia. Assim, descansou o povo no sétimo dia.
  • 12. De acordo com G. H. Waterman, Esta passagem [Êx 26:28, 29] mostra que o sábado foi certamente tornado conhecido a Israel antes que a lei fosse dada no Sinai. Os israelitas não chegaram ao Sinai antes do mês seguinte (16:1; 19:1). A passagem mostra também que essa não foi a primeira instituição do sábado. A maneira acidental como o assunto é introduzido e a admoestação do Senhor em relação à desobediência do povo pressupõem que o sábado era previamente conhecido. A indagação do Senhor: "Até quando recusareis guardar os Meus mandamentos e as Minhas leis?" [Êx 16:28] soa como se ele existisse havia um longo tempo. Em realidade, a equação do sábado com o sétimo dia, a declaração de que o Senhor deu aos israelitas o sá- bado, e a menção de que o povo, pelo mandamento de Deus, descansou no sétimo dia, tudo isso indica indubitavelmente a primitiva instituição do sábado.4 Portanto, Êxodo 16:26 deixa claro que, bem antes da proclamação do Decálogo no Sinai, já existiam "leis" e "mandamentos" divinos ordenando a observância do sábado. A própria dádiva do maná durante seis dias da semana e o milagre de sua preservação durante o sábado (Êx 16:22-24), que acompanhariam os israelitas durante os 40 anos de peregrinação no deserto (Êx 16:35; Js 5:12), eram a confirmação divina da santidade desse dia. Já presenciando esse milagre a cada sábado, Deus conduziu os israelitas do deserto de Sim à encosta do monte Sinai, onde estabeleceria com eles a Sua aliança. O Sábado na Aliança do Sinai • Muitas discussões existem sobre a natureza da aliança de Deus com Israel no Sinai (ver Ex 19-24), envolvendo a proclamação do Decálogo (ver Ex: 20:3-17). Uma análise acurada do texto bíblico revela que essa aliança não foi enunciada de forma legalista, pois, nesse caso, o próprio Deus teria ensinado um caminho equivocado de salvação (cf. SI 6:4; Is 55:1). Tanto a eleição de Israel (Dt 7:7, 8) quanto sua libertação do cativeiro egípcio (Ex 14:13, 14) foram motivadas pela graça divina. Deus primeiro libertou Seu povo eleito para depois proclamar Sua lei e exigir obediência, como resposta humana à salvação divina. O próprio Decálogo é introdu2ido com as palavras "Eu sou o Senhor, teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão" (Êx 20:2). Portanto, "desde sua origem, a lei está firmemente estabelecida em um contexto de graça".6 A repetição da lei em Deuteronômio (ver Dt 5:7-21) também aparece em um contexto de graça. Gerhard von Rad esclarece que é impossível, pois, considerar os mandamentos do Deuteronômio como uma "lei", no sentido teológico, que leve Israel a merecer a salvação pela observação global das exigências divinas. Os mandamentos do Deuteronômio são antes uma grande explicação do mandamento do amor por Yahweh e de apego exclusivo a Ele (Dt 6:4s). Esse amor é a resposta de Israel ao amor divino que lhe foi mostrado. Os numerosos imperativos do Deuteronômio são apelos implícitos ou explícitos a um reconhecimento ativo e são fáceis de observar. [...] Entretanto, mesmo nesses imperativos, cujo motivo é uma recompensa a obter ("fazei isto e vivereis, sereis bem-sucedidos, entrareis na terra"), a grande oferta da salvação não é eliminada, pois o Deuteronômio não ensina um caminho legalista. Mesmo as palavras que parecem estabelecer uma dependência da salvação em relação à obediência a Yahweh são precedidas da proclamação da eleição e do amor por Yahweh. Trata-se antes de um convite dirigido a Israel para que se aproprie pessoalmente de uma realidade já estabelecida e para que se instale nessa realidade através da obediência e em atitude de reconhecimento. Também aí, antes do imperativo, há o indicativo deuteronomista: "sois agora o povo posto à parte por Yahweh".7 O quarto mandamento do Decálogo, que ordena a observância do sábado (ver Ex 20:8-11), é parte integrante da aliança do Sinai (Dt 4:13; 5:1-21) e "ocupa um lugar central nessa aliança, servindo como elo entre os mandamentos que dizem respeito aos deveres para com Deus [Ex 20:3-11] e os que tratam dos deveres para com o homem [Ex 20:12-17]".8 Esse mandamento foi registrado em Êxodo 20:8-11 nos seguintes termos: Lembra-te do dia de sábado, para o santificar. Seis dias trabalharás e farás toda a tua obra. Mas o sétimo dia é o sábado do Senhor, teu Deus; não farás nenhum trabalho, nem tu, nem o teu filho, nem a tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu animal, nem o forasteiro das tuas portas para dentro; porque, em seis dias, fez o Senhor os céus e a Terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou; por isso, o Senhor abençoou o dia de sábado e o santificou.
  • 13. O mandamento define o sábado como uma instituição vigente antes da proclamação da lei no Sinai. Enquanto a expressão "lembra-te", no verso 8, sugere familiaridade com o sábado, o verso 11 confirma sua origem no tríplice ato divino - descansar, abençoar e santificar - no sétimo dia da criação (Gn 2:1-3). G. H. Waterman declara corretamente: O próprio quarto mandamento não dá a entender que seja a primeira promulgação do sábado. Suas palavras introdutórias - "Lembra-te do dia do sábado" (Ex 20:8) - sugerem que o sábado havia sido previamente conhecido, mas fora esquecido ou negligenciado. A razão apresentada no mandamento para a santificação do dia do sábado foi o exemplo de Deus ao término da criação (20:9-1 1). O mandamento aponta para a instituição original do sábado.'' Inserido no Decálogo pelo próprio Deus, o quarto mandamento compartilha da mesma natureza moral que caracteriza os outros nove preceitos. De acordo com o apóstolo Paulo, se a lei "é santa; e o mandamento, santo, e justo, e bom" (Rm 7:12), então o quarto mandamento também deve ser considerado santo, justo e bom. Sua natureza moral e imutável é atestada (1) pelo fato de o sábado ter sido instituído na criação, antes da queda do homem; (2) por ser Deus seu autor; (3) por estar inserido na lei moral do Decálogo; (4) pela forma peculiar corno Deus o revelou no Sinai (Êx 19:10-20:17; 31:12-18); e (5) por ser o único dos dez mandamentos em que aparecem explicitamente o nome, o título, a autoridade e a jurisprudência de Deus como legislador. Portanto, qualquer alteração no conteúdo desse mandamento é ilegal e representa um atentado direto à autoridade divina (ver Dn 7:25). O uso dos termos "servo", "serva", "animal"10 e "forasteiro" (Êx 20:10) é apenas uma aplicação do mandamento à cultura da época, sem com isso transformá-lo em uma ordenança cerimonial e transi- tória. Com linguagem compreensível aos israelitas, o mandamento confirma o princípio moral de que o descanso do sábado não se restringe ao indivíduo em si, mas é extensivo aos demais seres humanos e animais sob sua direta influência e liderança. Por sua vez, a expressão "o sétimo dia é o sábado do Senhor, teu Deus" (Êx 20:10; ver 16:26; 31:15; Lv 23:3; Dt 5:14) impede a transferência da santidade do sábado para qualquer outro dia da semana, independentemente da lógica eclesiástica utilizada. A alegação de que o preceito do sábado "na primeira Aliança prepara o domingo da nova e eterna Aliança"11 só pode ser mantida através do uso do método alegórico, que desconhece a Bíblia como sua própria intérprete. A nova aliança não altera o dia de guarda, mas apenas condena o mau uso da lei como meio de salvação (Rm 3:28, 31; Gl 2:16; 3:21; Um 1:8). Embora o Decálogo apareça inserido na aliança do Sinai, ele transcende essa aliança, sendo de aplicação universal, ou seja, é válido para todos os seres humanos, em todos os tempos e lugares (SI 119:142; Ec 12:13, 14). Além do sábado semanal (Lv 23:.-?), contido no Decálogo, foram instituídos no Sinai sete sábados cerimoniais ou "festas fixas do Senhor", espalhados ao longo do calendário religioso israelita. Esses sábados anuais são identificados em Levítico 23 como (1) o primeiro dia da Festa dos Pães Asmos (v. 7) (2) o último dia da Festa dos Pães Asmos (v. 8) (3) o Pentecostes (v. 21) (4) o primeiro dia do sétimo mês ou Festa das Trombetas (v. 24, 25) (5) o Dia da Expiação (v. 27, 28) (6) o primeiro dia da Festa dos tabernáculos (v. 34, 35) (7) o último dia da Festa dos tabernáculos (v. 36). Cada um desses sábados é qualificado como um dia de "santa convocação", no qual "nenhuma obra servil" deveria ser feita. Foi ordenado também que cada sétimo ano seria um ano sábatico, ou seja, um "sábado de descanso solene para a terra", durante o qual esta deveria ficar sem ser cultivada (Lv 25:1-7). Os sábados semanais e os sábados cerimoniais são completamente distintos uns dos outros.12 No que diz respeito à origem, o sábado semanal foi instituído por Deus na semana da criação (Gn 2:2, 3), enquanto os sábados cerimoniais foram instituídos no Sinai (Lv 23:4-44).
  • 14. Quanto à natureza, o sábado semanal, instituído antes da entrada do pecado no mundo, tem caráter moral e permanente; já os sábados cerimoniais, prescritos após a entrada do pecado, são cerimoniais e transitórios. Em relação ao propósito, o sábado semanal é um "sinal para sempre" entre Deus e Seu povo (Êx 31:17; ver 31:13; Ez 20:12, 20); mas os sábados cerimoniais eram apenas "sombra dos bens vindouros" (Hb 10:1; ver 8:5), cuja celebração deveria cessar com a morte de Cristo na cruz do Calvário (Ef 2:15; Cl 2:14). Em termos de registro, o mandamento do sábado semanal foi escrito pelo próprio dedo de Deus em tábuas de pedra guardadas dentro da arca da aliança (Êx 31:18; 40:20; Dt4:13; 10:5; Hb 9:4); mas, em contraste, os sábados cerimoniais foram registrados por Moisés em um livro colocado "ao lado da arca" da aliança (Dt 31:26). Além disso, enquanto os sábados semanais eram chamados por Deus de "Meus sábados" (l ,v 26:2; Is 56:4; Ez 20:12-24), os sábados cerimoniais eram designados como "vossos sábados" e "seus sábados" (Lv 23:32; ()s 2: l l). Portanto, o Decálogo, escrito em tábuas de pedra pelo dedo de Deus (Êx 31: l 8), não Foi dado exclusivamente aos hebreus; mas Deus os honrou como depositários e observadores de Sua lei. Assim, depois de quase uni ano acampados na encosta do Sinai (Êx 19:1; Nm 10:11, 12), os israelitas partiram levando consigo o Decálogo, contendo o mandamento do sábado, como um sagrado legado de Deus para a humanidade. O Sábado Durante a Peregrinação no Deserto Poucas alusões explícitas ao sábado na história de Israel são encontradas entre a experiência do Sinai e a entrada dos israelitas na terra de Canaã. Mesmo assim, durante os 40 anos de peregrinação no deserto (Êx 16:3 5), por mais de duas mil vezes repetiu-se o milagre do rnaná em relação à observância do sábado (Êx 16:22-30). O milagre semanal que os acompanhava visava a impressioná-los com a santidade do sábado, evitar que dele se esquecessem e prover-lhes as condições adequadas para sua observância. Logo após a sedição do povo e a ordem divina de continuarem sua peregrinação pelo deserto durante 40 anos (Nm 14:1-38), um homem foi encontrado "apanhando lenha no dia de sábado" (Nm 15:32). Diante da clara enunciação do quarto mandamento (Êx 20:8-11) e da completa ausência de maná no sábado (Êx 16:22-30), a atitude desse homem não pode ser considerada mero pecado por ignorância.13 Foi, sem dúvida, um ato premeditado de "aberto desafio à autoridade divina",14 que não podia ser deixado impune. O homem foi então levado a Moisés e Arão, que apresentaram o caso diante do Senhor. O veredito divino foi claro: "Tal homem será morto; toda a congregação o apedrejará fora do arraial" (Nm 15:35). Através da pena capital, o homem recebeu o castigo por sua ousada rebelião contra Deus e o povo foi advertido contra semelhante atitude. Entre as "ofertas contínuas" registradas em Números 28, aparece a ordenança de que os sacrifícios e ofertas "de cada sábado" deveriam ser o dobro do oferecido em cada um dos demais dias da semana (v. 9, 10). C. F. Keil e F. Delitisch argumentam que o sábado era "enaltecido acima dos outros dias da semana, como dia santificado ao Senhor em um grau mais elevado que os demais, por um número maior de holocaustos, ofertas de manjares e libações".15 Cristo estava Se referindo provavelmente a essa ordenança quando disse: "Ou não lestes na lei que, aos sábados, os sacerdotes no templo violam o sábado e ficam sem culpa?" (Mt 12:5). Ao término dos 40 anos de peregrinação no deserto, antes que os israelitas entrassem na terra de Canaã, Moisés proferiu uma série de discursos registrados no livro de Deuteronômio. No início do segundo discurso (Dt 5-26), Moisés repetiu o Decálogo com uma alteração significativa no enunciado do quarto mandamento. Enquanto o motivo para a observância do sábado em Êxodo 20:11 é a criação - "porque, em seis dias, fez o Senhor os céus e a Terra, o mar e tudo o que neles há e, ao sétimo dia, descansou; por isso, o Senhor abençoou o dia de sábado e o santificou", em Deuteronômio 5:15 o motivo é a redenção "porque te lembrarás que foste servo na terra do Egito e que o Senhor, teu Deus, te tirou dali com mão poderosa e braço estendido; pelo que o Senhor, teu Deus, te ordenou que guardasses o dia de sábado". Essa aparente discrepância é explicada por Gleason L. Archer nos seguintes termos:
  • 15. Deve-se compreender que o propósito do Deuteronômio era fornecer uma paráfrase seletiva da lei de Deus revelada a Moisés nos três livros anteriores: Êxodo, Levítico e Números. Não pretendia ser uma repetição palavra por palavra do texto desses livros, e sim uma aplicação homilética e exortativa dos seus ensinos à nova geração que atingiu a maioridade durante os 40 anos de peregrinação pelo deserto.16 Como já mencionado, "desde sua origem, a lei está firmemente estabelecida em um contexto do graça".17 Mas, em Deuteronômio 5:12-15, a própria observância do sábado é inserida nesse mesmo contexto. Não é de surpreender, portanto, que o tema da redenção, com o qual o Decálogo havia sido introduzido (ver Êx 20:2; Dt 5:6; lambem Ex 13:13), tenha sido associado por Moisés, sob inspiração do Espírito Santo (2Pe 1:19-21), mais especificamente ao mandamento d» sábado. Dessa forma, Israel entraria na terra de Canaã com urna clara revelação do sábado como memorial da criação e da redenção. O Sábado na Terra Prometida Os primeiros 500 anos da permanência dos israelitas em Canaã são marcados por um persistente silêncio a respeito do sábado. Nenhuma referência a ele é encontrada nos livros históricos de Josué, Juizes, Rute, l Samuel, 2 Samuel e l Reis. Na seqüência em que os livros históricos foram dispostos no cânon bíblico, a primeira referência ao sábado seria 2 Reis 4:23. Mas, em termos cronológicos, ela aparece em l Crônicas 9:23, na época de Davi.18 Em vez de sugerir um suposto abandono da observância do sábado, esse silêncio evidencia sua continuidade, pois, tão logo o sábado voltou a ser negligenciado, Deus enviou reprovações através dos profetas. Existem, no entanto, dois incidentes ocorridos na parte inicial desse período que têm sido apontados por alguns como conspirando contra a observância do sábado. Um deles está relacionado ao cerco de Jerico (ver Js 6). Sendo que, por ordem divina, a cidade foi rodeada em sete dias consecutivos (Js 6:3, 4), é evidente que um deles coincidiu com o sábado. Contudo, Adam Clarke comenta que "não parece que pudesse haver transgressão do sábado pelo fato de o povo simplesmente rodear a cidade, levando consigo a arca, e os sacerdotes tocarem as trombetas sagradas". Afinal, "tratava-se de mera procissão religiosa, levada a efeito por ordem de Deus, na qual nenhuma obra servil foi realizada".19 Outro incidente usado pelos críticos contra a observância do sábado é o dia longo na batalha entre Israel e os amorreus (ver Js 10:12-14). Nessa batalha, Josué clamou ao Senhor, e "o Sol se deteve, e a Lua parou até que o povo se vingou de seus inimigos" (v. 13). J. N. Andrews esclarece: O prolongamento de um dos seis dias pela intervenção de Deus não podia impedir a real chegada do sétimo dia, embora o retardasse; nem pôde destruir sua identidade. O incidente envolve uma dificuldade para aqueles que defendem a teoria de que Deus santificou a sétima parte do tempo, e não o sétimo dia; pois nesse caso a sétima parte do tempo não coincidiu com o sábado. Mas não existe nenhuma dificuldade para aqueles que crêem que Deus separou o sétimo dia para ser guardado quando este chega, em memória do Seu próprio descanso.20 Como já mencionado, a primeira referência cronológica ao sábado nos livros históricos apareceu no tempo de Davi, e diz: "Outros dos seus [de Matitias] irmãos, dos filhos dos coatitas, tinham o encargo de preparar os pães da proposição para todos os sábados" (lCr 9:32). Cerca de 150 anos mais tarde aparecem algumas alusões esporádicas ao sábado, isso já nos dias do profeta Eliseu (2Rs 4:23; 11:5-9; 2Cr 23:4-8). Mas não podemos descartar a possibilidade de o Salmo 92, sob o título "cântico para o dia de sábado", ter sido escrito no período entre Davi e Eliseu.21 E, porém, nos escritos dos profetas pré-exílicos que o tema do sábado volta a ser abordado com significativa freqüência. •
  • 16. O Sábado nos Dias dos Profetas Os livros proféticos do Antigo Testamento apresentam várias alusões ao sábado. Em sua maioria, são admoestações contra a negligência na observância do sábado, que estava se generalizando tanto no reino do Norte (Israel) quanto no reino do Sul (Judá).22 No remado de Jeroboão II (793-753 a.C.) em Israel, o profeta Amos (8:4-6) descreveu a apostasia da nação nos seguintes termos: Ouvi isto, vós que tendes gana contra o necessitado e destruís os miseráveis da terra, dizendo: Quando passará a Festa da Lua Nova, para vendermos os cereais? E o sábado, para abrirmos os celeiros de trigo, diminuindo o efa, aumentando o siclo, e procedendo dolosamente com balanças enganadoras, para comprarmos os pobres por dinheiro e os necessitados por um par de sandálias e vendermos o refugo do trigo? Algumas das mais belas e profundas declarações bíblicas sobre o sábado aparecem no livro do profeta Isaías, conhecido com o "profeta messiânico". Por exemplo, Isaías 56:1-8 enfatiza o caráter universal do sábado: Assim diz o Senhor: Mantende o juízo e fazei justiça, porque a Minha salvação está prestes a vir, e a Minha justiça, prestes a manifestar-se. Bem-aventurado o homem que faz isto, e o filho do homem que nisto se firma, que se guarda de profanar o sábado e guarda a sua mão de cometer algum mal. Não fale o estrangeiro que se houver chegado ao Senhor, dizendo: O Senhor, com efeito, me separará do Seu povo; nem tampouco diga o eunuco: Eis que eu sou uma árvore seca. Porque assim diz o Senhor: Aos eunucos que guardam os Meus sábados, escolhem aquilo que Me agrada e abraçam a Minha aliança, darei na Minha casa e dentro dos Meus muros, um memorial e um nome melhor do que filhos e filhas; um nome eterno darei a cada um deles, que nunca se apagará. Aos estrangeiros que se chegam ao Senhor, para O servirem e para amarem o nome do Senhor, sendo deste modo servos Seus, sim, todos os que guardam o sábado, não o profanando, e abraçam a Minha aliança, também os levarei ao Meu santo monte e os alegrarei na Minha Casa de Oração; os seus holocaustos e os seus sacrifícios serão aceitos no Meu altar, porque a Minha casa será chamada Casa de Oração para todos os povos. Assim diz o Senhor Deus, que congrega os dispersos de Israel: Ainda congregarei outros aos que já se acham reunidos. Como visto anteriormente, em êxeto 20:8-1 l e Deuteronômio 5:12-15 o mandamento do sábado é enunciado no contexto da graça redentora de Deus, que libertou o povo de Israel da escravidão egípcia (Êx20:2; Dt 5:6, 15). De modo semelhante, em Isaías 56:1-8 a observância do sábado é associada à graça salvadora, mencionada em Isaías 55:1 como disponível a todos gratuitamente, "sem dinheiro e sem preço". Transpondo todas as fronteiras políticas e barreiras étnicas, o convite à observância do sábado é estendido também aos "estrangeiros" e eunucos (Is 56:3, 6), com tal abrangência que o templo de Jerusalém seria chamado de "Casa de Oração para todos os povos" (Is 56:7). Consequentemente, a tentativa de considerar a observância do sábado uma instituição meramente judaica acaba desconhecendo (1) a origem edênica do sábado (Gn 2:2, 3), antes da entrada do pecado no mundo (Gn 3) e quando ainda não existiam judeus (Gn 29:31-30:26; 35:16-26) (2) a natureza moral do mandamento do sábado, semelhante à dos demais mandamentos do Decálogo (Êx 20:3-17; Dt 5:7-21); (3) a abrangência universal da observância do sábado, enfatizada em Isaías 56:1-8; e (4) a declaração do próprio Cristo de que "o sábado foi estabelecido por causa do homem" (Mc 2:27), e não apenas dos judeus. Isaías 58:13 e 14 menciona importantes detalhes sobre a forma de se observar o sábado, bem como as bênçãos que resultam da genuína observância do sábado. O texto diz: Se desviares o pé de profanar o sábado e de cuidar dos teus próprios interesses no Meu santo dia; se chamares ao sábado deleitoso e santo dia do Senhor, digno de honra, e o honrares não seguindo os teus caminhos, não pretendendo fazer a tua própria vontade, nem falando palavras vãs, então, te deleitarás no Senhor. Eu te farei cavalgar sobre os altos da Terra e te sustentarei com a herança de Jacó, teu pai, porque a boca do Senhor o disse.
  • 17. A genuína observância do sábado é descrita neste texto como abrangendo não apenas as atividades físicas, mas também os próprios motivos e as intenções mais profundas. O ser humano como um todo - física, mental, social e espiritualmente - é convidado a se envolver a cada sábado com o verdadeiro espírito do sábado. Os insistentes apelos para deixar de lado os "teus próprios interesses", "os teus caminhos' e "a tua própria vontade", e descansar no Senhor, colocam o sábado corno o clímax da experiência da justificação pela fé nos méritos de Cristo (cf. Hb 3-4). Portanto, a verdadeira observância do sábado bíblico é um forte antídoto contra o legalismo, que busca a salvação pelas próprias obras. É interessante observar que Isaías 56:1-8 salienta a universalidade do sábado, como destinado "para todos os povos"; e que Isaías 58:13 e 14 enfatiza a abrangência do sábado, como influenciando todas as dimensões da vida humana. Mas Isaías 66:22 e 23 reconhece a peryetuidade do sábado, como prosseguindo até o fim da história humana e adentrando os próprios portais da eternidade. Esse texto declara: "Porque, como os novos céus e a nova Terra, que hei de fazer, estarão diante de Mim, diz o Senhor, assim há de estar a vossa posteridade e o vosso nome. E será que, de uma Festa da Lua Nova à outra e de um sábado a outro, virá toda a carne a adorar perante Mim, diz o Senhor." A idéia de que o sábado semanal não mais será observado no "novo céu e nova Terra" (Ap 21:1), porque então os remidos viverão em um sábado perene, é destituída de fundamento bíblico. Embora o texto mencione elementos de natureza cerimonial, como o ritual da lua nova (ver Nm 10:10; 28:11-14; Am 8:5), o sábado é aqui projetado para além do contexto nacional da aliança com Israel no Sinai, envolvendo "toda a carne" e continuando durante a eternidade. Portanto, o livro de Isaías apresenta uma tríplice aplicação do sábado (1) ao povo de Israel como nação (58:1, 12-14); (2) à humanidade como um todo (56:1-8); e (3) aos próprios remidos que habitarão "os novos céus e a nova Terra" (66:22, 23). Por sua vez, os profetas Jeremias e Ezequiel foram contemporâneos e exerceram seu ministério no contexto do cativeiro babilônico (Jr 39; Ez 1:1-3). O reino do Norte não mais existia e o do Sul caracterizava-se por uma crescente apostasia nacional.23 Antes da conquista de Jerusalém por Nabucodonosor em 605 a.C., Deus ainda propôs, através de Jeremias (17:19-27), que, se o povo judeu empreendesse uma genuína reforma na observância do sábado, Jerusalém seria "para sempre habitada". Se, todavia, tal reforma não ocorresse, a cidade seria completamente destruída. Por meio de Ezequiel (20:1-44), Deus relembrou que os israelitas, depois do êxodo, não entraram na terra prometida porque "não andaram nos Meus estatutos" e "profanaram grandemente os Meus sábados" (v. 13), estabelecidos como "sinal entre Mim e eles" (v. 12, 20). Lamentavelmente, os apelos divinos não foram tomados a sério, e Jerusalém, símbolo da morada de Deus com Seu povo, acabou sendo conquistada pelos exércitos de Babilônia. Lemos em 2 Crônicas 36:15-21: O Senhor, Deus de seus pais, começando de madruga- da, falou-lhes por intermédio dos Seus mensageiros, porque Se compadecera do Seu povo e da Sua própria morada. Eles, porém, zombavam dos mensageiros, desprezavam as palavras de Deus e mofavam dos Seus profetas, até que subiu a ira do Senhor contra o Seu povo, e não houve remédio algum. Por isso, o Senhor fez subir contra ele o rei dos caldeus, o qual matou os seus jovens à espada, na casa do seu santuário; e não teve piedade nem dos jovens nem das donzelas, nem dos velhos nem dos mais avançados em idade; a todos os deu nas suas mãos. Todos os utensílios da Casa de Deus, grandes e pequenos, os tesouros da Casa do Senhor e os tesouros do rei e dos seus príncipes, tudo levou ele para a Babilônia. Queimaram a Casa de Deus e derribaram os muros de Jerusalém; todos os seus palácios queimaram, destruindo também todos os seus preciosos objetos. Os que escaparam da espada, a esses levou ele para a Babilônia, onde se tornaram seus servos e de seus filhos, até ao tempo do reino da Pérsia; para que se cumprisse a palavra do Senhor, por boca de Jeremias,, até que a terra se agradasse dos seus sábados; todos os dias da desolação repousou, até que os setenta anos se cumpriram. Na realidade, Jeremias predisse que o cativeiro babilônico de Judá duraria 70 anos (Jr 25:11, 12; 29:10; cf. 2Cr 36:21; Dn 9:2). Ezequiel também antevia o retorno dos cativos para Jerusalém, onde o templo seria reconstruído e seus serviços sagrados seriam restaurados (Ez 36-37, 40-48). Esse processo envolveria também a restauração da observância do sábado (Ez44:24; 45:17; 46:1-4, 12), que se tornaria "central" ao judaísmo pós-exílico.24 -
  • 18. O Sábado no Período Pós-Exílico Os judeus foram levados cativos para Babilônia por terem se afastado de Deus (2Cr 36:15-21). Durante sua permanência no exílio, eles sofreram a influência paganizadora da nova cultura na qual estavam inseridos. Somente uma profunda reforma espiritual poderia levá-los de volta à verdadeira religião de Deus. Assim, após o retorno dos judeus do cativeiro babilônico, Esdras e Neemias empreenderam uma profunda reforma espiritual entre o povo. O serviço religioso, que se estendeu por vários dias, começou com a leitura do livro da lei (Ne 8:1-12) e a celebração da Festa dos Tabernáculos (Ne 8:13-18). O povo se comprometeu, em solene aliança, a não mais continuar profanando o sábado (Ne 9:38; 10:28-31). Mas, como o povo voltou a profanar o sábado, Neemias se valeu de sua autoridade como governador e restabeleceu oficialmente a observância do sábado (ver Ne 13:15-22). Ordenou que as portas da cidade fossem fechadas "dando já sombra as portas de Jerusalém antes do sábado", para que "nenhuma carga entrasse no dia de sábado" (Ne 13:19). O texto não apenas confirma que o sábado se inicia ao pôr do sol de sexta-feira e termina ao pôr do sol de sábado (cf. Lv 23:32; Dt 16:6),25 mas também esclarece que todas as atividades seculares devem ser deixadas de lado antes do início do sábado. Resumo O sábado, como santuário de Deus no tempo, foi estabelecido ao término da semana da criação (Cn 2:2,3; Ex 20:11; Hb 4:4, 10), quando todas as coisas ainda eram perfeitas. Mesmo com a entrada do pecado no mundo, Deus continuou legando o sábado aos seres humanos. Do Éden ao Sinai existem evidências da observância do sábado, que se tornam mais explícitas com a experiência do maná no deserto de Sim (Êx 16:11-35). Na aliança do Sinai, a natureza moral do sábado foi confirmada por sua presença no Decálogo, como memorial da criação (Êx 20:8-11). Ao término da peregrinação no deserto, o mandamento do sábado foi enunciado também como memorial da redenção (Dt 5:12-15). Os primeiros 500 anos da permanência dos israelitas em Canaã são marcados por um persistente silêncio a respeito do sábado, que deve ser entendido como evidência de sua observância. Quando o sábado começou a ser profanado de maneira mais generalizada, Deus enviou profetas para advertir o povo de suas transgressões. O profeta Isaías enfatizou a universalidade do sábado "para todos os povos" (56:1-8), a abrangência do sábado em todas as dimensões da vida humana (58:13, 14) e a perpetuidade do sábado até o fim da história humana e mesmo durante a eternidade (66:22, 23). A persistente profanação do sábado foi uma das principais causas do exílio babilônico (Jr 17:19-27). Mas as reformas espirituais levadas a efeito por Esdras e Neemias contribuíram para restaurar a observância do sábado no período pós-exílico (Ne 9:38; 10:28-31; 13:15-22). Alguém poderia conjecturar que o ciclo semanal e a observância do sábado teriam se perdido nos primórdios da história humana. Mas foi a própria observância do sábado que manteve esse ciclo inalterado ao longo da história. Ainda que tivesse sido esquecido, ele acabaria sendo divinamente restaurado e reajustado por meio (1) do próprio milagre da ausência cio maná no sábado (Êx 16); (2) da observância do quarto mandamento do Decálogo sob supervisão divina (Êx 20:8-11; Dt 5:12-1 5); c (3) das orientações proféticas sobre a genuína observância do sábado (Is 58:12-14). Portanto, assim como Deus instituiu originalmente o sábado ao término da semana da criação (Gn 2:2, J), Ele também o preservou inalterado para as sucessivas gerações O SÁBADO NO PERÍODO INTERTESTAMENTÁRIO O cativeiro babilônico exerceu profunda e duradoura influência sobre a religião judaica. Se a grande tentação do período pré-exílico era a idolatria, a do período pós-exílico passou a ser o legalismo. A motivação era simples: havendo o povo sido levado cativo pelo seu afastamento das leis divinas (2Rs 36:15-20), os líderes judeus imaginavam que um novo cativeiro poderia ser evitado através da obediência restrita a essas leis, incluindo a observância do sábado (cf. Jr 17:20-27). Deixando de ser visto como um símbolo da graça divina, o sábado passou a ser desvirtuado por um acentuado formalismo.
  • 19. A compreensão de algumas das práticas judaicas adotadas no período intertestamentário é fundamental para se entender o contexto por trás dos conflitos entre Jesus e os escribas e fariseus com respeito à observância do sábado. Por isso, este capítulo aborda brevemente aspectos dessa observância (l) nos dias dos macabeus e (2) sob a influência dos mestres do judaísmo. O Sábado nos Dias dos Macabeus Alguns exemplos marcantes de corajosa observância do sábado foram deixados no 2° século a.C. pelos macabeus nos conflitos com seus inimigos. De acordo com G. H. Waterman, "sob a influência dos escribas judaicos, o sábado se tornou tão profundamente arraigado na consciência judaica [...] que, nos dias dos macabeus, muitos escolheram morrer a profaná-lo".' Recusando terminantemente a batalhar em dia de sábado, muitos judeus foram mortos pelos selêucidas (l Mc 2:29-38; 2Mc 5:25, 26; 6:11). Como a atitude de completa passividade no sábado se mostrou desastrosa para os judeus, Matatias e seus companheiros decidiram que pelejariam nesse dia em defesa própria, apenas quando atacados (IMc 2:39-41). A regra era: "Todo aquele que vier nos atacar em dia de sábado, nós o afrontaremos abertamente. Assim não morreremos todos, como morreram nossos irmãos em seus esconderijos" (lMc 2:41). A mesma postura foi seguida também por Jônatas, aos serem os judeus novamente atacados em dia de sábado (lMc 9:43-49). Essa postura, que se demonstrou eficaz contra os selêucidas, não impediu que os exércitos romanos, comandados pelo general Pompeu, finalmente conquistassem Jerusalém (aproximadamente em 63 a.C.). Como os judeus pelejavam no sábado apenas quando eram atacados, os romanos se valeram desse dia para construir, junto ao muro de Jerusalém, uma grande plataforma que servisse de rampa para conquistar aquela cidade. Flávio Josefo comenta a estratégia nos seguintes termos: Os romanos trabalharam com infatigável ardor para elevar as plataformas e, para isso, cortaram todas as árvores em redor. Depois, atacaram o templo com máquinas que Pompeu tinha feito vir de Tiro e que lançavam grandes pedras à maneira de balas. Eles não teriam podido realizar esse feito, com as plataformas, se a observância das leis de nossos antepassados, que proíbem trabalhar no dia de sábado, não tivessem impedido os sitiados de se oporem a esse trabalho naquele dia. Sabendo disso, os romanos não lançavam pedras nem atacavam de qualquer outro modo, mas continuavam a elevar as plataformas e a fazer avançar as máquinas, para se servirem delas no dia seguinte. Pode-se imaginar nosso zelo para com Deus e pela observância de nossas leis, pois nem o medo de sermos atacados nos afastou da celebração de nossos sacrifícios.2 Sem dúvida, os conflitos com os selêucidas e com os romanos desafiaram significativamente os judeus quanto à observância do sábado. Em contraste com a profanação pré-exílica tio sábado, esses conflitos contribuíram para que os judeus se apegassem mais rigidamente ao sábado, que acabou sendo revestido de uma roupagem legalista. O Sábado Sob os Mestres do Judaísmo Na parte final do período intertestamentário, os mestres do judaísmo não mediram esforços para transformar o sábado na mais importante instituição judaica. O quarto mandamento do Decálogo passou a ser considerado "como equivalendo em importância a todos os demais preceitos da Torah juntos".3 Mesmo considerando o sábado um dia de alegria, sua observância foi sendo revestida de um caráter cada vez mais negativo, através do acréscimo de grande número de proibições, como está evidente no Livro dos Jubileus (c. 150 a.C.) e no Documento de Damasco (c. 100 a.C.). Muitas dessas tradições foram posteriormente compiladas na Mishnah (c. 200 d.C.), que, por sua vez, foi incorporada no Talmude (c. 500 d.C.), acrescida de comentários rabínicos (Gemara).4 O Livro dos Jubileus é considerado a mais antiga lista judaica de atividades proibidas no sábado.5 Nele o sábado aparece como já sendo guardado "nos Céus antes de ser revelado" aos seres humanos sobre a Terra (2:30).
  • 20. Mas a universalidade do sábado (ver Is 56:1-8; Mc 2:27) é restrita a uma visão etnocêntrica; pois, na opinião do autor da referida obra, o Criador "não santificou também todos os povos e nações para guardar o sábado, mas apenas Israel" (2:31). Pena de morte é prescrita a todo o que no sábado, por exemplo, empreender uma viagem, acender fogo, andar de barco ou mesmo jejuar (50:12, 13). No Livro dos Jubileus é dito que qualquer que trabalhar no sábado "certamente morrerá eternamente" (2:27). O Documento de Damasco proíbe no sábado discussões "sobre questões de riqueza e lucro" e "de trabalhos e obras a ser realizados na manhã seguinte" (13:4, 5). Estabelece também que, "no sábado, ninguém deve andar fora da sua cidade mais de mil cúbitos" (13:7), e que "nenhum homem deve jejuar por sua própria vontade no sábado" (13:13). Além disso, durante o sábado, "nenhum homem deve ajudar um animal no seu parto", e, se este "cair em uma cova ou fosso, ele não o deve levantar" (13:22, 23). As mais importantes codificações judaicas a respeito da o b servância do sábado aparecem em dois tratados da Mishnah in-titulados "Shabbat" e "Erubin". Enquanto o Shabbat enumera as regras básicas para a observância do sábado, o Erubin apresenta evasivas para sua transgressão, sem incorrer em culpa. O Shabbat (7:2) declara: As categorias geradoras dos atos de trabalho (proibidos no sábado) são quarenta menos uma: (1) aquele que semeia, (2) ara, (3) sega, (4) ata em feixes, (5) debulha, (6) joeira, (7) seleciona (o bom produto ou colheita do ruim), (8) tritura, (9) peneira, (10) amassa, (11) assa; (12) aquele que tosa a lã, (13) a lava, (14) a bate, (15) a tinge; (16) fia, (17) tece, (18) faz dois laços, (19) entrelaça dois fios, (20) separa dois fios; (21) amarra, (22) desamarra, (23) costura dois pontos, (24) rasga para costurar dois pontos; (25) aquele que pega um veado em emboscada, (26) o mata, (27) o esfola, (28) o salga, (29) curte sua pele, (30) o limpa, (31) o corta em pedaços; (31) aquele que escreve duas letras, (33) apaga duas letras para escrever duas letras; (34) aquele que constrói, (35) destrói; (36) aquele que apaga fogo, (37) acende fogo; (38) aquele que bate com um martelo; (39) aquele que transporta um objeto de um lugar para outro - veja, estes são os quarenta atos geradores de trabalho menos um. Embora essa relação de 39 categorias seja de natureza funda mental, ela não abrange todos os detalhes das proibições rabímcas. Com o tempo, as 39 categorias foram expandidas para l .52 l (-• V) x 39) desdobramentos.7 Mesmo na própria Mishnah aparecem outras regras pormenorizadas sobre a observância do sábado. Por exemplo, o Shabbat 2:4 estabelece que "uma pessoa não deve encher uma casca de ovo cem azeite e colocá-la na abertura de uma lâmpada de modo que (o azeite) pingue (e abasteça a lâmpada)". Segundo o Enubin 4:7, se alguém estiver caminhando quando escurecer (na sexta-feira à noitinha) e se referir a uma árvore ou a uma cerca nos seguintes termos: "Meu lugar de residência para o sábado será sob ela", não disse nada de significativo. Mas, se disser: "Meu lugar de residência para o sábado é a sua raiz", então ele poderá caminhar 2.000 cúbitos do lugar em que se encontra até aquela raiz, e outros 2.000 cúbitos dali até sua casa.8 Por sua vez, no Talmude (Shabbat 23) é dito que "um homem não deve olhar-se em um espelho no sábado", para não ser tentado a aparar o cabelo. Embora sob circunstâncias normais ninguém pudesse carregar roupas adicionais no sábado, o Talmude (Erubin 10) menciona que, em caso de incêndio, os rabinos permitiam a "um homem vestir tantas roupas quantas" quisesse. Assim, tecnicamente, as roupas adicionais não estariam sendo carregadas, pois faziam parte de sua própria vestimenta. A supervalorização do sábado na tradição judaica transparece também nas seguintes afirmações rabínicas registradas no Talmude Babilônico (Shabbath 118b): "Aquele que observa o sábado de acordo com suas leis, mesmo praticando idolatria como a geração de Enoque, está perdoado." "Se Israel tivesse guardado o primeiro sábado, nenhuma nação ou língua teria conseguido dominá-lo." "Se Israel tivesse guardado dois sábados de acordo com as respectivas leis, os israelitas teriam sido redimidos imediatamente." O Talmude (Yerushalmi Taanit 1:1) acrescenta: "Se Israel guardasse um único sábado corretamente, então o filho de Davi viria."
  • 21. Resumo Durante o período intertestamentário, o sábado foi marcado por uma forte consciência de que a sobrevivência de Israel como nação dependia de um apego rígido à observância desse dia. Afastando-se da tradicional profanação pré-exílica, os judeus mantiveram sua lealdade ao sábado mesmo diante dos mais severos conflitos com os selêucidas e os romanos. Sendo atacados freqüentemente em dia de sábado pelos selêucidas, os judeus se voltaram para a guerra defensiva, batalhando nesse dia apenas quando atacados por seus inimigos. Porém, os romanos aproveitaram o sábado não para atacar os judeus, mas para construir rampas que facilitaram a invasão de Jerusalém. Na parte final do período intertestamentário, os mestres do judaísmo começaram a enaltecer o sábado como a mais importante instituição judaica. Removido do contexto de graça em que havia sido originalmente instituído por Deus, o sábado foi revestido de um acentuado legalismo. Deixando de ser visto como um símbolo da graça divina, o sábado passou a ser considerado um fim em si mesmo. Portanto, o sábado precisava ser libertado dessa roupagem legalista e restaurado ao seu verdadeiro significado bíblico. Essa importante missão foi levada a efeito por Cristo durante Seu ministério terrestre. O SÁBADO NO NOVO TESTAMENTO Hoje, muitos cristãos questionam os ensinamentos de suas respectivas denominações sobre o dia de guarda ensinado no Novo Testamento. Entre as perguntas mais comuns estão as seguintes: Que dia de guarda era observado por Cristo e os apóstolos? Teria a morte de Cristo na cruz do Calvário anulado o Decálogo? O fato de Cristo haver ressuscitado no "primeiro dia da semana" (Mt 28:1; Mc 16:2, 9; Lc 24:1; Jo 20:1) teria realmente transferido a santidade do sábado para o domingo? O que o próprio Novo Testamento tem a dizer a respeito do assunto? Essas indagações têm sido respondidas de diferentes formas ao longo da história do cristianismo, dependendo dos métodos de interpretação bíblica adotados. Os adeptos dos métodos alegórico, crítico-histórico, dispensacionalista e pós-moderno sempre encontram maneiras criativas de impor ao texto bíblico suas próprias teorias. Mas, se quisermos entender o que o Novo Testamento tem a dizer sobre o assunto, precisamos deixar que a Bíblia seja sua própria intérprete.1 Em outras palavras, devemos permitir que o Novo Testamento responda a essas questões, sem impormos a ele desenvolvimentos históricos pós-apostólicos. O conteúdo a seguir aborda respectivamente (1) Cristo e a lei; (2) os discípulos colhendo espigas no sábado; (3) Cristo curando no sábado; (4) o sábado em relação à morte e ressurreição de Cristo; (5) o sábado e a queda de Jerusalém; (6) o sábado na igreja apostólica; (7) o apóstolo Paulo e a observância do sábado; (8) considerações sobre João 20:19; (9) considerações sobre l Coríntios 16:2; (10) considerações sobre Atos 20:7; (l 1) considerações sobre Romanos 14:5; (12) considerações sobre Colossenses 2:16 c l 7; (l 3) considerações sobre Gaiatas 4:10; (14) considerações sobre Apocalipse 1:10; (15) o sábado em Hebreus 4:4-11; e (16) o sábado em Apocalipse 14:6-12. Cristo e a Lei O relacionamento de Cristo com a lei é elucidado por dois conceitos básicos. O primeiro di/. respeito à autoridade de Cristo como Doador da lei. Em Sua afirmação "antes que Abraão existisse, EU SOU [grego egõ eimi]" (Jo 8:58), Cristo Se identificou como sendo o grande "EU SOU" e "EU SOU O QUE SOU" que aparecera a Moisés na sarça ardente (Êx 3:14). De acordo com Estêvão, esse mesmo "Anjo do Senhor" (Êx 3:2), que Se autodenominara "EU SOU O QUE SOU" (Êx 3:14), era o próprio Cristo que "no monte Sinai" enunciou o Decálogo (At 7:30-38). Na qualidade de legislador, Cristo possui plena autoridade para definir como a lei deve ser observada. O segundo conceito básico sobre o relacionamento de Cristo com a lei é a maneira pela qual a lei deveria ser observada sob a nova aliança. Em Jeremias 31:31-33 aparece a seguinte promessa:
  • 22. Eis aí vêm dias, diz o Senhor, em que firmarei nova aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá. Não conforme a aliança que fiz com seus pais, no dia em que os tomei pela mão, para os tirar da terra do Egito; porquanto eles anularam a Minha aliança, não obstante Eu os haver desposado, diz o Senhor. Porque esta é a aliança que firmarei com a casa de Israel, depois daqueles dias, diz o Senhor: Na mente, lhes imprimirei as Minhas leis, também no coração lhas inscreverei; Eu serei o seu Deus, e eles serão o Meu povo. Essa "nova aliança" de que laia o profeta Jeremias foi confirmada pelo sangue de Cristo (Ml 26:28; Mc 14:24; Lc 22:20; ICo 11:25), constituindo-se no próprio Fundamento da igreja (2Co 3:6; Hb 8:8-12; 10:16, 17). A mesma lei moral do Decálogo, que era a base da antiga aliança (Êx 19:5), seria perpetuada sob a nova aliança, mas com uma diferença fundamental. A antiga aliança, estabelecida originalmente na graça divina (Dt 7:7, 8), acabou sendo desvirtuada pelos israelitas era uni conjunto de regras exteriores (Mt 15:1-20; 23:1-36). Porém, sob a nova aliança, essa mesma lei seria inscrita na "mente" e no "coração" dos crentes (Jr 31:33; Hb 8:10; 10:16). No Sermão do Monte, Cristo cumpriu a promessa de Jeremias. Depois de afirmar que não viera para "revogar a lei ou os profetas", mas "para cumprir" (Mt 5:17), Cristo aprofundou o significado dos mandamentos do Decálogo. Por exemplo, a transgressão do mandamento "Não matarás" (Êx 20:13) inicia já com a ira mental contra o próximo (Mt 5:21 -26). Da mesma forma, a violação do mandamento "Não adulterarás' (Êx 20:14) começa com o próprio sensualismo mental que estimula o ato sexual (Mt 5:27-32). E evidente, portanto, que Cristo veio não para anular o Decálogo, e sim para aprofundar seu significado. A teoria de que a morte de Cristo na cruz teria abolido o Decálogo c destituída de significado e acaba rompendo o relacionamento tipológico entre o santuário da antiga aliança (terrestre) e o santuário da nova aliança (celestial) (Hb 9:1, 11). Se a aspersão do sangue sobre o propiciatório da arca da aliança no santuário terrestre (Lv 16:14, 15) não abolia a lei que estava contida dentro daquela arca (Êx 31:18; 40:20), por que então o sangue de Cristo deveria abolir a lei contida na arca da aliança do santuário celestial (Ap 11:19)? O apóstolo Paulo esclarece que ele "não teria conhecido o pecado, senão por intermédio da lei" (Rm 7:7); pois, sem dúvida, "o pecado é a transgressão da lei" (IJo 3:4). Ora, se "o pecado é a transgressão da lei", e a lei foi abolida, então o pecado não mais existe, e já não precisamos de salvação. Consequentemente, a própria missão de Cristo - "porque Ele salvará o Seu povo dos pecados deles" (Mt 1:21) acaba perdendo seu sentido. Não é sem motivo que o próprio Cristo afirmou que não viera "revogar a lei" (Mt 5:17), e o apóstolo Paulo acrescenta: "Anulamos, pois, a lei pela fé? Não, de maneira nenhuma! Antes, confirmamos a lei" (Rm 3:31). Portanto, nos ensinos de Cristo encontramos a verdadeira dimensão espiritual do Decálogo livre das tradições c "doutrinas que são preceitos de homens" (Mt 15:9; cl. Is 29:13). Essa dimensão espiritual abrange também o quarto mandamento, que ordena a observância do sábado (Êx 20:8-1 1). Colhendo Espigas no Sábado Jesus, sendo judeu, tinha o "costume" de freqüentar a sinagoga aos sábados (Lc 4:16), da mesma forma que Seus discípulos. Mas o conhecido incidente no qual os discípulos de Jesus colheram espigas no sábado levou os fariseus a acusá-los de violação do sábado (ver Mt 12:1-8; Mc 2:23-28; Lc 6:1-5). O relato bíblico esclarece que, enquanto passavam "pelas searas, os Seus discípulos colhiam e comiam espigas, debulhando-as com as mãos" (Lc 6:1). "Os fariseus, porém, vendo isso, disseram-lhe: Eis que os Teus discípulos fazem o que não é lícito fazer em dia de sábado" (Mt 12:2). A acusação dos fariseus não envolvia a questão de Cristo e os discípulos passarem pelas searas no sábado. Como os próprios fariseus estavam juntos, em condições de ver o incidente e dialogar com Cristo a respeito, é provável que o grupo estivesse regressando da sinagoga. Também não era o fato dos discípulos estarem comendo cereais de propriedade alheia, pois em Deuteronômio (23:25) existe a seguinte provisão: "Quando entrares na seara do teu próximo, com as mãos arrancarás as espigas; porém na seara não meterás a foice." A verdadeira questão envolvida na acusação dos fariseus era se os discípulos de Jesus tinham o direito de colher e comer espigas no sábado, "debulhando-as com as mãos" (Lc 6:1). Segundo a tradição rabínica, esse ato envolvia várias atividades proibidas no dia de sábado. Samuele Bacchiocchi esclarece que, "ao colherem as espigas, eles eram culpados de segar; ao esfregá-las com as mãos, eram culpados de debulhar; ao separar os grãos da palha, eram culpados de joeirar; e, por todo o processo, eram culpados de preparar uma refeição no dia de sábado".2
  • 23. Em Sua resposta aos fariseus, Cristo mencionou dois exemplos do Antigo Testamento, relembrou a verdadeira natureza do sábado e enfatizou Sua própria autoridade* sobre esse dia. O primeiro exemplo foi o de Davi e seus companheiros que* entraram no tabernáculo e comeram pães da proposição ( Mc 2:25, 26). De acordo com o relato de l Samuel 21:1-6, Davi e seus homens estavam famintos, e não havia "pão comum" disponível (v. 4); eles estavam cerimonialmente puros, pois não haviam tido relações sexuais durante sua campanha (v. 4, 5); e os pães comidos eram os "que se tiraram de diante do Senhor, quando trocados, no devido dia, por pão quente" (v. 6). As leis cerimoniais estabeleciam que pães frescos fossem colocados sobre a mesa "em cada sábado", e que os pães velhos, uma vez removidos, fossem comidos exclusivarnente pelos sacerdotes "no lugar santo" (Lv 24:5-9; l Cr 9:32). Ralph W. Klein argumenta que "Jesus citou esse incidente como uma violação desculpável de uma regra cúltica".3 O segundo exemplo foi o dos "sacerdotes no templo que violam o sábado e ficam sem culpa" (Mt 12:5). Como já mencionado,4 os sacrifícios e ofertas "de cada sábado" deveriam ser o dobro do oferecido cm cada um dos demais dias da semana (Nm 28:9, 10). Dessa forma, segundo C. F. Keil e F. Delitzsch, o sábado era "enaltecido acima dos outros dias da semana [...], por um número maior de holocaus-tos, ofertas de manjares e libações".5 O próprio Talmude Babilônico (Shabbath 132b) reconhecia que "o serviço sacrificai tem prioridade sobre o sábado". Além disso, os sacerdotes no templo faziam uma obra especial para Deus, que jamais poderia ser enquadrada na proibição de "cuidar dos teus próprios interesses no Meu santo dia" (Is 58:13). Após citar os dois exemplos anteriores, Cristo afirmou que "o sábado foi estabelecido por causa do homem, e não o homem por causa do sábado" (Mc 2:27). O substantivo "homem" (grego ánthrõpos) é aqui usado como "um termo genérico para a criatura humana", referindo-se à criação dos primeiros seres humanos como "homem e mulher" (Gn 1:26, 27).6 Portanto, as palavras de Cristo confirmam a origem edênica do sábado, desfazendo a teoria popular de que o sábado seria uma instituição exclusivamente israelita ou judaica (Jb 2:31). Além disso, a declaração de Cristo redefine as prioridades entre o sábado e o ser humano. Robert A. Guelich comenta que "o sábado foi criado para benefício da criatura humana e, como dádiva criada por Deus, permanece a serviço da humanidade, e não a humanidade a serviço do sábado".7 Cristo então reivindicou Sua autoridade para definir a verda- deira observância do sábado. Em Sua declaração "Aqui está quem é maior que o templo" (Mt 12:6), Cristo deixou evidente que o templo com seus cerimoniais eram apenas sombras que apontavam para Ele mesmo (cf. Jo 1:29; Hb 8:5). Em Sua afirmação "o Filho do homem é Senhor do sábado" (Mt 12:8), Ele ratificou Seu status como Criador (Gn 2:2, 3; cf. Jo 1:1-3) e Legislador (At 7:38) do sábado. Portanto, não havia ninguém mais abalizado do que Ele para desvencilhar o sábado das tradições rabínicas pós-exílicas. Permitindo que os discípulos colhessem algumas espigas no sábado, com o mero propósito de comer seus grãos, Cristo estava rompendo com essas tradições. Curando no Sábado Os evangelhos mencionam pelo menos sete milagres que Cristo operou no dia de sábado: (1) a cura do paralítico de Betesda (Jo 5:1-15); (2) a cura de um endemoninhado em Cafarnaum (Mc 1:21-28); (3) a cura da sogra de Pedro (Mc 1:29-31); (4) a cura do homem da mão ressecada (Mc 3:1-6); (5) a cura de um cego de nascença (Jo 9:1-41); (6) a cura da mulher encurvada (Lc 13:10-17); e (7) a cura de um hidrópico (Lc 14:1-6). Essas curas foram feitas, em geral, por iniciativa do próprio Cristo, e não dos doentes ou dos familiares destes. No relato de Lucas 13 sobre a mulher encurvada, Jesus usa três vezes o verbo "libertar" (grego lúein), traduzido na versão Almeida Revista e Atualizada como "estás livre" (v. 12), "desprende" (v. 15) e "livrar" (v. 16). Sem dúvida, o sábado é, por excelência, um dia de libertação.8 O fato de que as curas mencionadas ocorreram em dia de sábado gerou forte oposição dos líderes judaicos. Em nenhum dos casos o ponto em discussão foi a validade do sábado como dia de guarda, mas apenas a forma de ser ele observado. Enquanto Cristo procurava restaurar a dimensão espiritual do sábado, os fariseus defendiam a tradição rabínica que o transformara em um verdadeiro fardo (cf. Mt23:4;Lc 11:46).
  • 24. E. J. Young esclarece: Cristo identificou-Se como o Senhor do sábado (Mc 2: 28). Ao assim falai, Ele não estava depreciando a importância e a significação do sábado, nem de forma alguma estava eni contravenção contra a legislação do Antigo Testamento. Ele estava simplesmente apontando para a verdadeira significação do sábado no que diz respeito ao homem, e indicava o Seu direito de falar, visto que Ele mesmo era o Senhor do sábado. [...] Em Seu conflito com os fariseus (Mt 12:1-14; Mc 2:23-28; Lc 6:1-1 1) nosso Senhor salientou perante os judeus o fato de que eles mal entendiam completamente os mandamentos do Antigo Testamento. Buscavam tornar a observância do sábado mais rigorosa do que Deus havia ordenado. Não era errado comer no sábado, ainda que o alimento tivesse de ser obtido ao debulhar os grãos da espiga nas mãos. Semelhantemente, não era errado fazer o bem no dia de sábado. As curas eram obra de misericórdia, e o Senhor do sábado é misericordioso (cf. Jo 5:1-18; Lc 13:10-17; 14:l-6).9 Mesmo tendo que deixar de lado nossos próprios interesses durante o sábado (Êx 20:9; Is 58:13), esse dia jamais deveria ser considerado um período de inútil ociosidade. Em Suas controvérsias com os fariseus, Cristo deixou claro que "é licito, nos sábados, fazer o bem" (Mt 12:12), e chegou mesmo a declarar: "Meu Pai trabalha até agora, e Eu trabalho também" (Jo 5:17). Isso se refere, sem dúvida, ao incessante trabalho de Deus em favor de Suas criaturas, que mesmo durante o sábado continua vivificando e mantendo o Universo. Ellen White pondera: Deveria Deus impedir o Sol de cumprir sua missão no sábado, obstar seus fecundos raios de aquecer a Terra e nutrir a vegetação? Deveriam os sistemas planetários quedar imóveis durante aquele santo dia? Ordenaria às fontes que se abstivessem de regar os campos e as florestas, mandaria às ondas do mar que detivessem seu incessante fluir e refluir? Deveriam o trigo e o milho deixar de crescer, e o maturante cacho adiar seu belo colorido? Não hão de as árvores florescer, nem desabrochar as flores no sábado?10 Os milagres que Cristo operou no sábado não visavam apenas aliviar o sofrimento físico das pessoas. Eram sinais que anunciavam a vinda do reino de Deus (cf. Mt 12:28; Jo 20:30, 31), e prenuncies de que o mundo voltará à sua condição edênica, quando Deus "enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as pri- meiras coisas passaram" (Ap 21:4; cf. Lc 4:14-19). O sábado, portanto, é uma reminiscência do paraíso perdido que aponta para o paraíso restaurado. O Sábado e a Paixão de Cristo Os evangelhos afirmam que Cristo morreu em uma sexta-feira, na hora do sacrifício da tarde (Mt 27:46-50; Mc 15:34-37), descansou no sábado na sepultura (Mc 15:42-16:2) e ressuscitou no "primeiro dia da semana" (Mt 28:1; Mc 16:1, 2; Lc 24:1; Jo 20:1). O relato de Lucas 23:50-24:1 é muito elucidativo: E eis que certo homem, chamado José, membro do Sinédrio, homem bom e justo (que não tinha concordado com o desígnio e ação dos outros), natural de Arimateia, cidade dos judeus, e que esperava o reino de Deus, tendo procurado a Pilatos, pediu-lhe o corpo de Jesus, e, tirando-o do madeiro, envolveu-o num lençol de linho, e o depositou num túmulo aberto em rocha, onde ainda ninguém havia sido sepultado. Era o dia da preparação, e começava o sábado. As mulheres que tinham vindo da Galileia com Jesus, seguindo, viram o túmulo e como o corpo fora ali depositado. Então, se retiraram para preparar aromas e bálsamos. E, no sábado, descansaram, segundo o mandamento. Mas, no primeiro dia da semana, alta madrugada, l oram elas ao túmulo, levando os aromas que haviam preparado. Esse texto esclarece que, mesmo após a morte de Cristo, Seus seguidores continuaram observando o sábado. Em primeiro lugar, a motivação para tal observância não era o apego à tradição judaica, mas o compromisso com o quarto mandamento do Decálogo (Ex 20:8-1 1), como endente na expressão "segundo o mandamento" (Lc 23:56). Em segundo lugar, os que observaram aquele sábado eram discípulos de Cristo, que O haviam acompanhado desde a Galileia (Lc 23:55).