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Encaminhar para a saúde quem vai mal na educação: um ciclo vicioso?
(texto publicado pela Revista Educação, SME, 2004)




Adriana Marcondes Machado

psicóloga do Serviço de Psicologia Escolar do Instituto de Psicologia da USP e doutora em Psicologia
Social pelo IPUSP.




Tenho participado, com alguns educadores da rede pública, da discussão sobre a relação da saúde
com a educação quando a cena que se estabelece é o encaminhamento de alguns alunos para que
os psicólogos façam uma avaliação psicológica dos mesmos. Optei, neste texto, por recuperar
algumas das perguntas que têm sido formuladas nestas discussões, pois como muitos autores nos
ensinaram, as perguntas revelam concepções, e podemos, portanto, refletir quais estão presentes
nas indagações. Vejamos.

* Quais os critérios para encaminhar uma criança para avaliação psicológica? O que investigar em
sala de aula? Como redigir essa investigação?

* Em que medida o diagnóstico da saúde auxilia o fazer pedagógico? Como esses laudos podem
interferir no trabalho pedagógico? Até que ponto o professor precisa da avaliação psicológica para
poder trabalhar com a criança?

* O que fazer quando o relatório psicológico tem um conteúdo que não coincide com o que
conhecemos da criança? Por que tantos laudos são tão parecidos? As Salas de Apoio para alunos
com deficiência mental recebem avaliações de instituições conveniadas. Qual a diferença, para o
trabalho do professor, de uma avaliação que revele deficiência mental de outra que fale de distúrbio
global de desenvolvimento?

* Como se aproximar dos familiares das crianças que apresentam dificuldade, na medida em que
eles são os que menos vão à escola quando chamados?

Trabalho como psicóloga do Serviço de Psicologia Escolar do Instituto de Psicologia da USP. Neste
serviço temos recebido encaminhamentos, pedidos de avaliação psicológica e demandas de
professores que nos indagam: “o que esse aluno tem?”, “qual o problema dele?”, “como trabalhar
com ele?”.

Muitos trabalhos psicológicos, desde o surgimento da psicologia, têm tido a atitude de falar sobre
o sujeito, de levantar causas sobre o seu funcionamento psíquico, justificando aquilo que acontece
nas relações, nas instituições, como algo causado apenas devido às características individuais
dos sujeitos. Mais do que uma atitude, podemos dizer que essa tem sido a função da psicologia:
isentar o sistema social, econômico e político, da responsabilidade pela produção da desigualdade
social, culpabilizando o indivíduo isolado por aquilo que acontece a ele1. Passou a ser senso-
comum pensarmos que as conquistas dependem dos esforços individuais de cada um. É comum
assistirmos a programas na televisão que relatam histórias nas quais se reforça a idéia de que
as pessoas, individualmente, é que precisam lutar para conseguiram o que querem. O sistema
capitalista se constitui nesta ideologia - defende que as pessoas que fracassam não aproveitaram
bem as oportunidades que lhes foram dadas. Ora, pensar assim é fortalecer a ilusão de que vivemos
condições de possibilidade igualitárias. O preço dessa ilusão é a privatização da responsabilidade
pública e suas conseqüentes doenças contemporâneas no corpo do sujeito.

Sabemos que os alunos (e todos nós) agem de maneiras diferentes conforme a relação e o contexto.
Esse saber é uma contraposição à essa concepção que culpabiliza unicamente o sujeito e, poderíamos
dizer, está presente no cotidiano escolar. Por isso, tantas vezes, discute-se a possibilidade do aluno
de uma certa professora vir a freqüentar a classe de uma outra professora com a qual se dá melhor.
Sabemos que diferentes relações engendram diferentes possibilidades. Sabemos que faz diferença
um aluno da 1a série ter tido quatro professoras em um ano letivo, ou pertencer a uma classe para os
alunos que estão aprendendo menos do que o esperado, ou ser um aluno que acabou de chegar de
outro Estado deixando toda sua família para trás, ou ter um comprometimento físico que interfere
em sua maneira de andar, ou ter bons amigos e estar feliz na escola. Sabemos, portanto, que essas
práticas produzem efeitos diferentes nos sujeitos.

Pensemos então: que diferenças são essas que se produzem nessas histórias? Como considerar
essas diferenças em nossos trabalhos?

Diferenças. Isso nos dá dicas importantes sobre a padronização denunciada em uma das perguntas
formuladas pelas professoras e apresentadas no início: muitos relatórios e laudos psicológicos são
parecidos. Desconsideram as diferenças, reduzem os sujeitos encaminhados a funcionamentos
padrões, realizando trabalhos que enquadram o sujeito em uma estrutura na qual fica parecendo
que o sujeito é determinado apenas por questões intrínsecas e familiares. Lembro-me de quando
estava no 5o ano do curso de Psicologia2, e estava redigindo pela quarta vez (em meu quarto
caso de atendimento infantil), que o aluno encaminhado vivia sua agressividade de forma muito
destrutiva e por isso agia de maneira agressiva. Ora, o sintoma - a agressão -, era interpretado
apenas por questões intrínsecas e padronizadas – isto é, haveria uma forma de agir ideal na qual
a destrutividade teria um certo nível para que a agressividade fosse adequada, e essa forma de
agir se constituiria dependendo da história pessoal e familiar da criança. Esse tipo de trabalho
desconsiderava os territórios nos quais o sintoma se produz. Ao desconsiderar o processo de
produção desses sintomas revela uma concepção de sujeito e de mundo na qual o sujeito é tratado
como objeto. Desconsiderava também a realidade produzida por esse tipo de relatório que não é
apenas “uma opinião técnica” como alguns psicólogos defendem. É comum o efeito de impotência
na professora que lê esse tipo de relatório. Muitas nos relatam o sacrifício das mães em levarem
seus filhos para avaliação psicológica e a decepção com um relatório que não dialoga com o dia-a-
dia escolar, desconsiderando, portanto, o contexto no qual o encaminhamento foi formulado. Esse
tipo de avaliação tem um efeito enfraquecedor no fazer pedagógico.

Quando falamos das diferenças que se produzem nas histórias, estamos nos remetendo aos
efeitos subjetivos que são produzidos nas vivências, nas práticas, nas relações. Portanto, nosso
questionamento passou a ser: como analisar os efeitos subjetivos, a produção de subjetividade,
ou melhor, o processo de subjetivação engendrado nas práticas em que vivemos? Pensemos em
um exemplo: as classes especiais para alunos com deficiência mental. Conhecendo as “crianças de
classe especial”3 - como muitas vezes são chamadas -, conhecemos uma diversidade de situações:
crianças normais (segundo padrões diagnósticos) que gostam de estar naquela sala, outras querem
sair de lá, crianças com comprometimentos físicos ou mentais que têm medo das salas regulares e se
sentem protegidas nas classes especiais, outras sentem-se excluídas por estar lá. Mas, todas essas
crianças, todas, têm em comum viver uma prática escolar que lhes ensina que elas podem freqüentar
a escola somente nesse lugar – no lugar de “crianças de classe especial”; ensina também que as
crianças que estão nas classes regulares não devem estar com as crianças das classes especiais, não
se beneficiariam convivendo com crianças que apresentam algum tipo de comprometimento. Essas
produções subjetivas circulam nas falas das crianças, dos pais, das professoras: crianças DE classe
especial, crianças DE classe regular – uma geografia que nos fixa como normais e anormais. Como
temos visto hoje nas escolas, essas crianças têm sido chamadas de crianças DE inclusão.

Assim como, quando um aluno da escola pública não pode ir a um passeio escolar, pois seus pais
não têm condição de pagar, estamos ensinando a todos os alunos que, para aprender, para participar
das atividades pedagógicas, é necessário ter condições financeiras para isso. Um dia uma aluna da
2a série me disse: “eu não vou ao zoológico porque minha mãe não pode pagar”, acreditando que o
direito de ir ao zoológico é para quem pode pagar – não podendo perceber a diferença entre direito
e privilégio -, acreditando que seria natural a escola pública agir da mesma maneira que outras
instituições: quem pode pagar se beneficia. Ensinamos a todos – também a quem pode pagar e ir
ao passeio -, que o fato de existirem alguns que não podem pagar, é problema individual desses
alguns.

Portanto, ao pesquisarmos o processo de produção da queixa escolar, de um sintoma, de um afeto,
buscamos os saberes e as práticas nos quais essa queixa, sintoma ou afeto, foi engendrado. Para
quê? Para podermos pensar em maneiras de intervir na produção daquilo que nos é encaminhado.

Aqui apontamos uma discussão interessante: sem dúvida, ao atendermos um aluno, um sujeito,
estamos entrando em contato com um funcionamento psíquico. É comum lermos pronomes
possessivos nos relatórios psicológicos e nos prontuários dos alunos – “funcionamento dele”, o
“jeito dele”. Mas, primeiro: ao conhecer isso que estamos nomeando como funcionamento psíquico,
estaremos fazendo esta investigação tendo concepções, carregando nossas hipóteses, valores,
enfim, outros funcionamentos psíquicos. Isso já é discurso comum: “não existe conhecimento
neutro”. Se afirmamos essa maneira de pensar, devemos então estar atentos para o fato de que
nossas hipóteses e concepções não têm estado presentes em nossos relatórios. O que faz um
profissional acreditar que os problemas de aprendizagem podem ter relação com o fato de os pais
da criança, estarem se separando? Como se avalia isso? Como se articula isso? Muitas professoras
fazem as seguintes indagações lendo os relatórios psicológicos: “o que o fato de a criança ter “pai
ausente” como escrito em alguns relatórios, interfere na aprendizagem”? “O que fazer com isso”?
“Como explicam então o fato de tantos alunos viverem situações familiares difíceis e estarem indo
bem na escola”? Portanto, segundo: intervir nisso que chamamos “dele”, “da pessoa”, implica intervir
nas relações nas quais o sujeito se constitui. Portanto, se não nos remetemos a essas relações e
práticas, a função de nosso trabalho passa a ser reforçar, dar nome, rotular, o que já existe.

Uma vez que nos é encaminhado um aluno que se sente incapaz, teremos como desafio pensar em
maneiras de intervir na produção da incapacidade. As professoras de nossas escolas nos mostram
esse saber quando criam práticas, dinâmicas, tarefas, que permitem que seus alunos arrisquem,
desejem. Mas, quando falamos de alunos que permanecem muito tempo sem aprender, ou com
problemas disciplinares ou alunos com deficiências, principalmente deficiência mental, intensifica-
se a procura de ajuda dos profissionais da saúde. Acreditamos que esses casos transcendem a
relação professor-aluno, isto é, exigem devolvermos ao coletivo aquilo que foi individualizado no
corpo da criança. Por exemplo, sabemos que a presença de tantos alunos semi-alfabetizados nas
sétimas e oitavas séries, exige problematizarmos as estratégias de cada escola para dar conta da
implantação da progressão continuada (chamada por muitos de promoção automática, sendo que
outro dia ouvi ser chamada de prorrogação continuada). Seria um absurdo avaliar individualmente
um aluno nessas condições sem considerar as mudanças no sistema de avaliação pedagógica da
educação.

O objetivo do trabalho psicológico frente ao encaminhamento4 é problematizar o próprio processo
de produção do mesmo. Temos percebido que as sensações e os saberes das professoras (enquanto
coletivo), dos alunos, dos pais e mães participam da produção do encaminhamento de maneira
enfraquecida. Portanto, quando nos é relatado um problema, uma queixa, uma preocupação, nossa
função deve ser buscar as hipóteses sobre a produção desses problemas no interior da escola. É
na escola que o aluno estará cerca de metade de seu dia, e aí está a potência desse território para
intervirmos naquilo que se apresenta. Problemas familiares existem. Mas, nossa função é criar
dispositivos que movimentem aquilo que se apresenta cristalizado no interior da escola. Esses
dispositivos têm relação com as práticas, as ações e as crenças estabelecidas no cotidiano escolar.
Uma crença intensa no interior da escola, é que os pais não ajudam da forma como deveriam
ajudar, que muitas das situações de fracasso acontecem devido a problemas familiares. O que nos
chama a atenção nessas situações, é que muitas vezes os pais são chamados na escola e saem mais
impotentes do que entraram. O desafio que se coloca é: como potencializar esse encontro entre pais
e educadoras? Temos acompanhado alguns projetos nos quais as reuniões de pais passaram a ser
um espaço para apresentação dos objetivos e das práticas escolares, permitindo que as mães e os
pais tenham maior acesso aos princípios e às estratégias utilizadas pelos profissionais da escola.

Portanto, a demanda da educação para a saúde deve ser repensada, assim como a prática da
saúde para com a demanda escolar5. O que se quer ao encaminhar uma criança para avaliação
psicológica? Se o que se pretende é que um profissional da saúde ajude a pensar em hipóteses
para a produção dos fenômenos psicológicos com o objetivo de criar estratégias de enfrentamento
para os problemas do cotidiano escolar, então é necessário conhecermos e problematizarmos esse
cotidiano escolar. Muitas vezes percebemos maiores possibilidades de criarmos hipóteses e idéias
de intervenção quando vamos à escola conversar com as professoras sobre o aluno que está sendo
encaminhado. Nessas conversas, retomamos a história escolar do aluno, as estratégias já tentadas,
as várias versões sobre o aluno. É no grupo de professoras que os encaminhamentos devem ser
discutidos.

Com esse tipo de trabalho, vamos tendo acesso às práticas cotidianas, aos afetos que circulam pelo
grupo de professoras em relação àquele aluno específico, às possibilidades que aparecem. É comum
alguma professora (que muitas vezes nem estava ciente do encaminhamento) apresentar idéias
interessantes para se trabalhar com aluno alvo das discussões.

Perguntamos: por que os saberes produzidos em um certo coletivo se encontram tão enfraquecidos?
É comum algumas professoras terem opiniões, críticas, sugestões, e optarem por não apresentá-
las. Podemos afirmar que seria absurda a idéia de encaminhar essas professoras silenciadas para
avaliação psicológica (faço esse comentário, pois é muito comum, ao participarmos das reuniões
das professoras, existirem brincadeiras sobre o fato de que são elas, individualmente, que precisam
de um atendimento psicológico). O problema não é DELAS. É NELAS, que atravessa intensamente
algo que revela um funcionamento do grupo – a dificuldade em se ter controvérsias, desacordos,
discussões, contradições. Conversando com as professoras elas falam do medo de magoar, da
dificuldade em ouvir críticas, de que nada adianta falar, pois não se é ouvido. Ora, essas falas
revelam-nos a importância da função do coordenador pedagógico e a necessidade de as instâncias
deliberativas – como os conselhos de escola -, terem seu poder legitimado.
A tendência a individualizar as causas no corpo “do aluno”, “do professor”, “da família”, tem relação
com o enfraquecimento do coletivo. Prova disso é o fato de ao indagarmos às professoras de
Salas de Apoio (para alunos com necessidades educacionais especiais) o que querem saber sobre
o trabalho do psicólogo, as perguntas que nos formulam são aquelas que apresentamos no início.
Mas, quando perguntamos quais são as maiores dificuldades no trabalho das professoras de sala
de apoio, elas respondem algo que não está relacionado à dúvida diagnóstica em relação ao seu
aluno e sim ao fato de haver discriminação e receio em relação aos alunos que vão para as salas de
apoio e que têm dificuldades ou deficiências, à dificuldade em manter um trabalho conjunto com
as professoras de classe regular, ao fato de algumas professoras delegarem à sala de apoio todo o
trabalho educativo, ao preconceito que os alunos sofrem no cotidiano escolar6. Essas dificuldades
nos revelam a importância de considerarmos os processos de subjetivação que se produz no
coletivo. São produções da ordem do coletivo que exigem os seguintes desafios – e portanto, outras
perguntas -: como fortalecer o grupo de professoras para o enfrentamento de discussões que
geram intensas controvérsias? Como incluir, nessa discussão, aqueles que têm sido reiteradamente
excluídos dos espaços de reflexão: pais, mães e alunos? Quais estratégias criar, como sistematizar
ações7, encontros e funções, que possibilitem projetos nos quais a presença de crianças com
comprometimentos ou com necessidades educacionais especiais seja um benefício para todos?
Bibliografia


AMARAL, L. A. Pensar a diferença/deficiência. Brasília - Coordenadoria Nacional para integração da
pessoa portadora de deficiência - CORDE, 1994.

BOURDIEU, P. A miséria do mundo. Rio de Janeiro: Vozes, 1997.

COLLARES, C. A. L.; MOYSES, M. A. Preconceitos no cotidiano escolar. São Paulo: Cortez, 1996.

HELLER, A. O cotidiano e a História. São Paulo: Paz e Terra, 1992.

MACHADO, A. M. Crianças de Classe Especial. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1994.

MACHADO, Adriana Marcondes. Avaliação Psicológica na Educação: Mudanças Necessárias. In:
TANAMASCHI, E.; PROENÇA, M. R. Psicologia e Educação: desafios teórico-práticos, São Paulo: Casa
do Psicólogo, 2000.

PATTO, Maria Helena Souza. A produção do fracasso escolar. São Paulo: T.A.Queiroz, 1990.

Revista Psicologia USP/ Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, vol.8, n.1 - 1997.


(Footnotes)

1 Ver livro de Maria Helena Souza Patto: A produção do Fracasso Escolar. Ed T.A. Queiroz, São Paulo,
1990.

2 Opto por trazer esse exemplo para reforçar a necessidade de considerarmos as implicações de
nossa formação nas práticas que desconsideram o que é da ordem do coletivo.

3 Aprofundamos essa discussão no livro Crianças de Classe Especial da Ed. Casa do Psicólogo,
publicado em 1994

4 Discutimos mais profundamente a prática da avaliação psicológica na relação com a educação em
dois capítulos de dois diferentes livros.

-       Machado A. M. - Avaliação e Fracasso: a produção coletiva da queixa escolar. In Aquino, J.G.
(org), Erro e Fracasso na Escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, 1997.

-       Machado A. M. – Avaliação Psicológica na Educação: Mudanças Necessárias. In Tanamachi
E., Proença M. e Rocha M. (org), Psicologia e Educação: desafios teórico-práticos. São Paulo: Casa do
Psicólogo, 2000.

5 Vale a pena ver a Resolução 007/2003 editada pelo Conselho Federal de Psicologia sobre
documentos decorrentes da avaliação psicológica. Nela apresenta-se o que deve constar de um
relatório psicológico enfatizando a necessidade da análise da demanda. Site http://www.pol.org.br.
Clicar em Resoluções.

6 Ver livro de Amaral, L. A. Pensar a diferença/deficiência. Brasília - Coordenadoria Nacional para
integração da pessoa portadora de deficiência - CORDE, 1994

7 Uma das idéias surgidas entre as professoras de Salas de Apoio, foi a possibilidade de elas
elaborarem estratégias para que as professoras das salas regulares pudessem ver as conquistas
dos alunos com necessidades educacionais especiais em relação às atitudes, inserção no grupo de
alunos, entendimento dos procedimentos utilizados na rotina escolar e etc.

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Joaquim gonçalves
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  • 1. Encaminhar para a saúde quem vai mal na educação: um ciclo vicioso? (texto publicado pela Revista Educação, SME, 2004) Adriana Marcondes Machado psicóloga do Serviço de Psicologia Escolar do Instituto de Psicologia da USP e doutora em Psicologia Social pelo IPUSP. Tenho participado, com alguns educadores da rede pública, da discussão sobre a relação da saúde com a educação quando a cena que se estabelece é o encaminhamento de alguns alunos para que os psicólogos façam uma avaliação psicológica dos mesmos. Optei, neste texto, por recuperar algumas das perguntas que têm sido formuladas nestas discussões, pois como muitos autores nos ensinaram, as perguntas revelam concepções, e podemos, portanto, refletir quais estão presentes nas indagações. Vejamos. * Quais os critérios para encaminhar uma criança para avaliação psicológica? O que investigar em sala de aula? Como redigir essa investigação? * Em que medida o diagnóstico da saúde auxilia o fazer pedagógico? Como esses laudos podem interferir no trabalho pedagógico? Até que ponto o professor precisa da avaliação psicológica para poder trabalhar com a criança? * O que fazer quando o relatório psicológico tem um conteúdo que não coincide com o que conhecemos da criança? Por que tantos laudos são tão parecidos? As Salas de Apoio para alunos com deficiência mental recebem avaliações de instituições conveniadas. Qual a diferença, para o trabalho do professor, de uma avaliação que revele deficiência mental de outra que fale de distúrbio global de desenvolvimento? * Como se aproximar dos familiares das crianças que apresentam dificuldade, na medida em que eles são os que menos vão à escola quando chamados? Trabalho como psicóloga do Serviço de Psicologia Escolar do Instituto de Psicologia da USP. Neste serviço temos recebido encaminhamentos, pedidos de avaliação psicológica e demandas de professores que nos indagam: “o que esse aluno tem?”, “qual o problema dele?”, “como trabalhar com ele?”. Muitos trabalhos psicológicos, desde o surgimento da psicologia, têm tido a atitude de falar sobre o sujeito, de levantar causas sobre o seu funcionamento psíquico, justificando aquilo que acontece nas relações, nas instituições, como algo causado apenas devido às características individuais dos sujeitos. Mais do que uma atitude, podemos dizer que essa tem sido a função da psicologia: isentar o sistema social, econômico e político, da responsabilidade pela produção da desigualdade social, culpabilizando o indivíduo isolado por aquilo que acontece a ele1. Passou a ser senso- comum pensarmos que as conquistas dependem dos esforços individuais de cada um. É comum assistirmos a programas na televisão que relatam histórias nas quais se reforça a idéia de que as pessoas, individualmente, é que precisam lutar para conseguiram o que querem. O sistema capitalista se constitui nesta ideologia - defende que as pessoas que fracassam não aproveitaram
  • 2. bem as oportunidades que lhes foram dadas. Ora, pensar assim é fortalecer a ilusão de que vivemos condições de possibilidade igualitárias. O preço dessa ilusão é a privatização da responsabilidade pública e suas conseqüentes doenças contemporâneas no corpo do sujeito. Sabemos que os alunos (e todos nós) agem de maneiras diferentes conforme a relação e o contexto. Esse saber é uma contraposição à essa concepção que culpabiliza unicamente o sujeito e, poderíamos dizer, está presente no cotidiano escolar. Por isso, tantas vezes, discute-se a possibilidade do aluno de uma certa professora vir a freqüentar a classe de uma outra professora com a qual se dá melhor. Sabemos que diferentes relações engendram diferentes possibilidades. Sabemos que faz diferença um aluno da 1a série ter tido quatro professoras em um ano letivo, ou pertencer a uma classe para os alunos que estão aprendendo menos do que o esperado, ou ser um aluno que acabou de chegar de outro Estado deixando toda sua família para trás, ou ter um comprometimento físico que interfere em sua maneira de andar, ou ter bons amigos e estar feliz na escola. Sabemos, portanto, que essas práticas produzem efeitos diferentes nos sujeitos. Pensemos então: que diferenças são essas que se produzem nessas histórias? Como considerar essas diferenças em nossos trabalhos? Diferenças. Isso nos dá dicas importantes sobre a padronização denunciada em uma das perguntas formuladas pelas professoras e apresentadas no início: muitos relatórios e laudos psicológicos são parecidos. Desconsideram as diferenças, reduzem os sujeitos encaminhados a funcionamentos padrões, realizando trabalhos que enquadram o sujeito em uma estrutura na qual fica parecendo que o sujeito é determinado apenas por questões intrínsecas e familiares. Lembro-me de quando estava no 5o ano do curso de Psicologia2, e estava redigindo pela quarta vez (em meu quarto caso de atendimento infantil), que o aluno encaminhado vivia sua agressividade de forma muito destrutiva e por isso agia de maneira agressiva. Ora, o sintoma - a agressão -, era interpretado apenas por questões intrínsecas e padronizadas – isto é, haveria uma forma de agir ideal na qual a destrutividade teria um certo nível para que a agressividade fosse adequada, e essa forma de agir se constituiria dependendo da história pessoal e familiar da criança. Esse tipo de trabalho desconsiderava os territórios nos quais o sintoma se produz. Ao desconsiderar o processo de produção desses sintomas revela uma concepção de sujeito e de mundo na qual o sujeito é tratado como objeto. Desconsiderava também a realidade produzida por esse tipo de relatório que não é apenas “uma opinião técnica” como alguns psicólogos defendem. É comum o efeito de impotência na professora que lê esse tipo de relatório. Muitas nos relatam o sacrifício das mães em levarem seus filhos para avaliação psicológica e a decepção com um relatório que não dialoga com o dia-a- dia escolar, desconsiderando, portanto, o contexto no qual o encaminhamento foi formulado. Esse tipo de avaliação tem um efeito enfraquecedor no fazer pedagógico. Quando falamos das diferenças que se produzem nas histórias, estamos nos remetendo aos efeitos subjetivos que são produzidos nas vivências, nas práticas, nas relações. Portanto, nosso questionamento passou a ser: como analisar os efeitos subjetivos, a produção de subjetividade, ou melhor, o processo de subjetivação engendrado nas práticas em que vivemos? Pensemos em um exemplo: as classes especiais para alunos com deficiência mental. Conhecendo as “crianças de classe especial”3 - como muitas vezes são chamadas -, conhecemos uma diversidade de situações: crianças normais (segundo padrões diagnósticos) que gostam de estar naquela sala, outras querem sair de lá, crianças com comprometimentos físicos ou mentais que têm medo das salas regulares e se sentem protegidas nas classes especiais, outras sentem-se excluídas por estar lá. Mas, todas essas crianças, todas, têm em comum viver uma prática escolar que lhes ensina que elas podem freqüentar
  • 3. a escola somente nesse lugar – no lugar de “crianças de classe especial”; ensina também que as crianças que estão nas classes regulares não devem estar com as crianças das classes especiais, não se beneficiariam convivendo com crianças que apresentam algum tipo de comprometimento. Essas produções subjetivas circulam nas falas das crianças, dos pais, das professoras: crianças DE classe especial, crianças DE classe regular – uma geografia que nos fixa como normais e anormais. Como temos visto hoje nas escolas, essas crianças têm sido chamadas de crianças DE inclusão. Assim como, quando um aluno da escola pública não pode ir a um passeio escolar, pois seus pais não têm condição de pagar, estamos ensinando a todos os alunos que, para aprender, para participar das atividades pedagógicas, é necessário ter condições financeiras para isso. Um dia uma aluna da 2a série me disse: “eu não vou ao zoológico porque minha mãe não pode pagar”, acreditando que o direito de ir ao zoológico é para quem pode pagar – não podendo perceber a diferença entre direito e privilégio -, acreditando que seria natural a escola pública agir da mesma maneira que outras instituições: quem pode pagar se beneficia. Ensinamos a todos – também a quem pode pagar e ir ao passeio -, que o fato de existirem alguns que não podem pagar, é problema individual desses alguns. Portanto, ao pesquisarmos o processo de produção da queixa escolar, de um sintoma, de um afeto, buscamos os saberes e as práticas nos quais essa queixa, sintoma ou afeto, foi engendrado. Para quê? Para podermos pensar em maneiras de intervir na produção daquilo que nos é encaminhado. Aqui apontamos uma discussão interessante: sem dúvida, ao atendermos um aluno, um sujeito, estamos entrando em contato com um funcionamento psíquico. É comum lermos pronomes possessivos nos relatórios psicológicos e nos prontuários dos alunos – “funcionamento dele”, o “jeito dele”. Mas, primeiro: ao conhecer isso que estamos nomeando como funcionamento psíquico, estaremos fazendo esta investigação tendo concepções, carregando nossas hipóteses, valores, enfim, outros funcionamentos psíquicos. Isso já é discurso comum: “não existe conhecimento neutro”. Se afirmamos essa maneira de pensar, devemos então estar atentos para o fato de que nossas hipóteses e concepções não têm estado presentes em nossos relatórios. O que faz um profissional acreditar que os problemas de aprendizagem podem ter relação com o fato de os pais da criança, estarem se separando? Como se avalia isso? Como se articula isso? Muitas professoras fazem as seguintes indagações lendo os relatórios psicológicos: “o que o fato de a criança ter “pai ausente” como escrito em alguns relatórios, interfere na aprendizagem”? “O que fazer com isso”? “Como explicam então o fato de tantos alunos viverem situações familiares difíceis e estarem indo bem na escola”? Portanto, segundo: intervir nisso que chamamos “dele”, “da pessoa”, implica intervir nas relações nas quais o sujeito se constitui. Portanto, se não nos remetemos a essas relações e práticas, a função de nosso trabalho passa a ser reforçar, dar nome, rotular, o que já existe. Uma vez que nos é encaminhado um aluno que se sente incapaz, teremos como desafio pensar em maneiras de intervir na produção da incapacidade. As professoras de nossas escolas nos mostram esse saber quando criam práticas, dinâmicas, tarefas, que permitem que seus alunos arrisquem, desejem. Mas, quando falamos de alunos que permanecem muito tempo sem aprender, ou com problemas disciplinares ou alunos com deficiências, principalmente deficiência mental, intensifica- se a procura de ajuda dos profissionais da saúde. Acreditamos que esses casos transcendem a relação professor-aluno, isto é, exigem devolvermos ao coletivo aquilo que foi individualizado no corpo da criança. Por exemplo, sabemos que a presença de tantos alunos semi-alfabetizados nas sétimas e oitavas séries, exige problematizarmos as estratégias de cada escola para dar conta da implantação da progressão continuada (chamada por muitos de promoção automática, sendo que
  • 4. outro dia ouvi ser chamada de prorrogação continuada). Seria um absurdo avaliar individualmente um aluno nessas condições sem considerar as mudanças no sistema de avaliação pedagógica da educação. O objetivo do trabalho psicológico frente ao encaminhamento4 é problematizar o próprio processo de produção do mesmo. Temos percebido que as sensações e os saberes das professoras (enquanto coletivo), dos alunos, dos pais e mães participam da produção do encaminhamento de maneira enfraquecida. Portanto, quando nos é relatado um problema, uma queixa, uma preocupação, nossa função deve ser buscar as hipóteses sobre a produção desses problemas no interior da escola. É na escola que o aluno estará cerca de metade de seu dia, e aí está a potência desse território para intervirmos naquilo que se apresenta. Problemas familiares existem. Mas, nossa função é criar dispositivos que movimentem aquilo que se apresenta cristalizado no interior da escola. Esses dispositivos têm relação com as práticas, as ações e as crenças estabelecidas no cotidiano escolar. Uma crença intensa no interior da escola, é que os pais não ajudam da forma como deveriam ajudar, que muitas das situações de fracasso acontecem devido a problemas familiares. O que nos chama a atenção nessas situações, é que muitas vezes os pais são chamados na escola e saem mais impotentes do que entraram. O desafio que se coloca é: como potencializar esse encontro entre pais e educadoras? Temos acompanhado alguns projetos nos quais as reuniões de pais passaram a ser um espaço para apresentação dos objetivos e das práticas escolares, permitindo que as mães e os pais tenham maior acesso aos princípios e às estratégias utilizadas pelos profissionais da escola. Portanto, a demanda da educação para a saúde deve ser repensada, assim como a prática da saúde para com a demanda escolar5. O que se quer ao encaminhar uma criança para avaliação psicológica? Se o que se pretende é que um profissional da saúde ajude a pensar em hipóteses para a produção dos fenômenos psicológicos com o objetivo de criar estratégias de enfrentamento para os problemas do cotidiano escolar, então é necessário conhecermos e problematizarmos esse cotidiano escolar. Muitas vezes percebemos maiores possibilidades de criarmos hipóteses e idéias de intervenção quando vamos à escola conversar com as professoras sobre o aluno que está sendo encaminhado. Nessas conversas, retomamos a história escolar do aluno, as estratégias já tentadas, as várias versões sobre o aluno. É no grupo de professoras que os encaminhamentos devem ser discutidos. Com esse tipo de trabalho, vamos tendo acesso às práticas cotidianas, aos afetos que circulam pelo grupo de professoras em relação àquele aluno específico, às possibilidades que aparecem. É comum alguma professora (que muitas vezes nem estava ciente do encaminhamento) apresentar idéias interessantes para se trabalhar com aluno alvo das discussões. Perguntamos: por que os saberes produzidos em um certo coletivo se encontram tão enfraquecidos? É comum algumas professoras terem opiniões, críticas, sugestões, e optarem por não apresentá- las. Podemos afirmar que seria absurda a idéia de encaminhar essas professoras silenciadas para avaliação psicológica (faço esse comentário, pois é muito comum, ao participarmos das reuniões das professoras, existirem brincadeiras sobre o fato de que são elas, individualmente, que precisam de um atendimento psicológico). O problema não é DELAS. É NELAS, que atravessa intensamente algo que revela um funcionamento do grupo – a dificuldade em se ter controvérsias, desacordos, discussões, contradições. Conversando com as professoras elas falam do medo de magoar, da dificuldade em ouvir críticas, de que nada adianta falar, pois não se é ouvido. Ora, essas falas revelam-nos a importância da função do coordenador pedagógico e a necessidade de as instâncias deliberativas – como os conselhos de escola -, terem seu poder legitimado.
  • 5. A tendência a individualizar as causas no corpo “do aluno”, “do professor”, “da família”, tem relação com o enfraquecimento do coletivo. Prova disso é o fato de ao indagarmos às professoras de Salas de Apoio (para alunos com necessidades educacionais especiais) o que querem saber sobre o trabalho do psicólogo, as perguntas que nos formulam são aquelas que apresentamos no início. Mas, quando perguntamos quais são as maiores dificuldades no trabalho das professoras de sala de apoio, elas respondem algo que não está relacionado à dúvida diagnóstica em relação ao seu aluno e sim ao fato de haver discriminação e receio em relação aos alunos que vão para as salas de apoio e que têm dificuldades ou deficiências, à dificuldade em manter um trabalho conjunto com as professoras de classe regular, ao fato de algumas professoras delegarem à sala de apoio todo o trabalho educativo, ao preconceito que os alunos sofrem no cotidiano escolar6. Essas dificuldades nos revelam a importância de considerarmos os processos de subjetivação que se produz no coletivo. São produções da ordem do coletivo que exigem os seguintes desafios – e portanto, outras perguntas -: como fortalecer o grupo de professoras para o enfrentamento de discussões que geram intensas controvérsias? Como incluir, nessa discussão, aqueles que têm sido reiteradamente excluídos dos espaços de reflexão: pais, mães e alunos? Quais estratégias criar, como sistematizar ações7, encontros e funções, que possibilitem projetos nos quais a presença de crianças com comprometimentos ou com necessidades educacionais especiais seja um benefício para todos?
  • 6. Bibliografia AMARAL, L. A. Pensar a diferença/deficiência. Brasília - Coordenadoria Nacional para integração da pessoa portadora de deficiência - CORDE, 1994. BOURDIEU, P. A miséria do mundo. Rio de Janeiro: Vozes, 1997. COLLARES, C. A. L.; MOYSES, M. A. Preconceitos no cotidiano escolar. São Paulo: Cortez, 1996. HELLER, A. O cotidiano e a História. São Paulo: Paz e Terra, 1992. MACHADO, A. M. Crianças de Classe Especial. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1994. MACHADO, Adriana Marcondes. Avaliação Psicológica na Educação: Mudanças Necessárias. In: TANAMASCHI, E.; PROENÇA, M. R. Psicologia e Educação: desafios teórico-práticos, São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000. PATTO, Maria Helena Souza. A produção do fracasso escolar. São Paulo: T.A.Queiroz, 1990. Revista Psicologia USP/ Instituto de Psicologia, Universidade de São Paulo, vol.8, n.1 - 1997. (Footnotes) 1 Ver livro de Maria Helena Souza Patto: A produção do Fracasso Escolar. Ed T.A. Queiroz, São Paulo, 1990. 2 Opto por trazer esse exemplo para reforçar a necessidade de considerarmos as implicações de nossa formação nas práticas que desconsideram o que é da ordem do coletivo. 3 Aprofundamos essa discussão no livro Crianças de Classe Especial da Ed. Casa do Psicólogo, publicado em 1994 4 Discutimos mais profundamente a prática da avaliação psicológica na relação com a educação em dois capítulos de dois diferentes livros. - Machado A. M. - Avaliação e Fracasso: a produção coletiva da queixa escolar. In Aquino, J.G. (org), Erro e Fracasso na Escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo: Summus, 1997. - Machado A. M. – Avaliação Psicológica na Educação: Mudanças Necessárias. In Tanamachi E., Proença M. e Rocha M. (org), Psicologia e Educação: desafios teórico-práticos. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2000. 5 Vale a pena ver a Resolução 007/2003 editada pelo Conselho Federal de Psicologia sobre documentos decorrentes da avaliação psicológica. Nela apresenta-se o que deve constar de um relatório psicológico enfatizando a necessidade da análise da demanda. Site http://www.pol.org.br. Clicar em Resoluções. 6 Ver livro de Amaral, L. A. Pensar a diferença/deficiência. Brasília - Coordenadoria Nacional para integração da pessoa portadora de deficiência - CORDE, 1994 7 Uma das idéias surgidas entre as professoras de Salas de Apoio, foi a possibilidade de elas elaborarem estratégias para que as professoras das salas regulares pudessem ver as conquistas dos alunos com necessidades educacionais especiais em relação às atitudes, inserção no grupo de alunos, entendimento dos procedimentos utilizados na rotina escolar e etc.