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JAIME BISPO DO NASCIMENTO
ARTE MÁQUINA E O SUPORTE SUCATA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL
DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÕES E ARTES
CURSO DE ARTES VISUAIS – BACHARELADO
CAMPO GRANDE
2011
JAIME BISPO DO NASCIMENTO
ARTE MÁQUINA E O SUPORTE SUCATA
Projeto submetido à apreciação da
Banca examinadora como exigência
parcial para a obtenção do grau de
Bacharelado em Artes Visuais
elaborado sob a orientação do
Professor Msc. Elomar Bakonyi.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL
DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÕES E ARTES
CURSO DE ARTES VISUAIS – BACHARELADO
CAMPO GRANDE
2011
RESUMO
Esta monografia: Arte Máquina e o Suporte Sucata, leva esse título porque relata a
elaboração de uma obra de arte que utiliza como suporte recipientes (latas) de 18
litros, de perímetro cúbico, utilizadas para embalar tintas e similares em estado
líquido, e, após a utilização nessa função, imediatamente descartadas como lixo.
Recuperadas e tratadas com um mínimo de interferência na sua formatação original
de embalagem utilizada, as latas assumem a condição de suporte para a veículação
de uma linguagem visual, contextualizando todo o volume científico e tecnológico
embutidos na sua concepção e fabricação como embalagem especializada. Esse
suporte apresenta, além das possibilidades plásticas, a relação conceitual
suporte/conteúdo; antes transportando a tinta para aplicação em outros suportes;
agora como suporte para as configurações esculturais e picturais dessa nova
condição, demonstrando a evolução do estado de sucata de embalagem de produto
líquido, para a expressividade elaborada por adesivagem, que vem a ser tinta
impressa sobre material plástico em estado sólido, aplicada sobre as superfícies
internas e externas dessas latas, concebendo grafismos de leitura expressionista,
especificamente expressionismo abstrato, configurado pela aplicação dos adesivos
de cor em molduras geométricas, sobre as texturas de fundo, elaboradas por
abrasão, nas superfícies dos objetos, concluindo a função de suporte pictórico. Os
conjuntos de 4, 8 ou 16 peças, apresentam variadas composições obtidas pelo
encadeamento dos volumes, posicionamento das peças e variações na maneira de
expor; afixados, pendurados ou apoiados em plintos, oferecem leituras cromáticas
estimulantes. A linguagem escultórica das unidades ou dos conjuntos é interpretada
como material concreto, limitadas por formas e elaboradas por manufatura em
espaço tridimensional, tendo como finalidade tornar aparentes as soluções plásticas
e estéticas a partir dessas composições. Esses procedimentos clássicos permitem
organizar o modo de expor um ponto de vista plástico, mediante arranjos das leituras
veiculadas pelo suporte; combinando as linguagens da escultura e da pintura no
Assemblage: o objeto de arte desta monografia.
Palavras-chave: Suporte, Escultura, Pintura, Expressionismo, Sustentabilidade.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................04
CAP. 1 – TOTENS TÁTEIS.......................................................................................09
CAP. 2 – SUPORTES SELETIVOS...........................................................................17
CAP. 3 – SUACATA SUADA................................................................................... 19
CONCLUSÃO............................................................................................................22
BIBLIOGRAFIA.........................................................................................................24
INTRODUÇÃO
A arte é o suporte da cultura. Inexistindo a arte, a cultura não se organiza
como expressão coletiva, porque alguém deve transmitir para alguém mediado por
algum tipo de codificação, emocionalmente compreensível e visualmente
estimulada: função da obra de arte.
Arte Máquina e o Suporte Sucata é o título desta monografia, formatada
como relatório de uma pesquisa orientada para se obter um suporte durável, para
uma linguagem plástica intuída e concebida, especificamente, para a veiculação
nesse mesmo suporte.
A expressão “Arte Máquina”, que compõe o título, indica a origem do
conceito que o complementa (“Suporte Sucata”), apontando para a natureza material
do objeto, produzido em uma linha de montagem industrial com significativa
aplicação de parâmetros científicos e tecnológicos na sua confecção. O objeto,
reutilizado e modificado pela extração de partes da sua configuração original, sem
prejuízo para as finalidades propostas, é redirecionado na condição de suporte para
o relacionamento expressivo que se pretende neste trabalho.
Na sua caracterização como assemblage (palavra de gênero masculino e
origem francesa que significa reunir, montar, juntar), aquele suporte e seu contexto,
assumem a função de obra de arte composta de dez dimensões: sendo cinco
dimensões externas: uma altura, duas larguras iguais, dois comprimentos iguais,
mais as cinco dimensões internas equivalentes a essas; aonde a aplicação e a
fixação do sistema de cromático aqui utilizado, oferecem plasticidade às metáforas
visuais.
O termo assemblage, inventado pelo artista Jean Dubuffet (1901-1985) e
incorporado às artes em 1953, refere-se a trabalhos que “vão além das colagens”.
A referência de Dubuffet às colagens não é casual; ao abrigar no espaço do
suporte elementos retirados da realidade – papéis, tecidos, madeiras, metais etc,
verifica-se a ampliação do tratamento plástico, sobrepondo-os às limitações da
superfície; A pintura passa então a ser concebida como uma construção sobre um
suporte, diluindo de certa forma, as fronteiras entre a pintura e a escultura.
Na obra de Dubuffet, a ênfase recai sobre a matéria, desde as
Texturologias, produzidas em fins da década de 1950, que se caracterizam, como o
título indica, pelas texturas experimentadas com cores e materiais diversos.
5
A obra reproduzida na Fig. 01 é representativa quanto ao uso de material no
assemblage: Reza a lenda que Dubuffet tinha acumulado no piso do seu estúdio
pinturas em papel; ao observar os arranjos espontâneos das sobreposições dessas
pinturas, cortou-as, utilizando os pedaços para fazer uma montagem; essa obra
pertence a uma série de cerca de uma centena de colagens que o artista denominou
"Teatros da Memória", porque esse assemblage combina evocações de cenas em
diferentes lugares.
Fig.01- Jean Dubuffet (1901-1985),“Les Vicissitudes” 1977- Acrílico s/ papel, s/ tela- 210X339cm
A pintura passa a ser concebida como construção sobre um suporte, o que
pode dificultar o estabelecimento de fronteiras rígidas entre pintura e escultura. As
combine paintings de Robert Rauschenberg (1925-2008) (Fig. 02), confirma o
assemblage como procedimento passe a ser utilizada a partir da década de 1950
por artistas muito diferentes entre si.
Fig.2 - Bed”(Cama) 1955 Robert Rauschenberg (1925-2008), (Óleo e lápis sobre travesseiro e
colcha sobre suporte de madeira – 191 x 80 x 23 cm)
6
Na Itália, Alberto Burri (1915), autor de pinturas e colagens, volta-se na
década de 1950 para pesquisas semelhantes, explorando as potencialidades
expressivas da matéria, soldando, costurando e colando sacos, madeiras, papéis
queimados, paus, latas e plásticos (Saco, 1953, Combustões, 1957, e Ferros, 1958)
obtendo resultados distintos. Suas pesquisas com lixo e sucata prefiguram a arte
junk norte-americana e a arte povera italiana. (Fig. 03)
Fig.03 – (a) Fig. 04 –(b)
(a) Alberto Burri (1915-1995) “Blanco Plastica” 1966, Combustão s/celotex(100 x 75 cm)
(b) Antoni Tapiés (1923) “Palla y Fusta”1969. Assemblage s/tela (150 x 116 cm)
Na Espanha, a "pintura matérica" realizada por Antoni Tápies (1923), no
mesmo período, utiliza cimento, argila, pó de mármore, materiais de refugo (restos
de papel, barbante e tecidos), partes de móveis velhos etc. As possibilidades do
assemblage e a versatilidade dos materiais cotidianos resultou na obra mostrada na
Fig. 04, onde a sensibilidade conceitual do artista ficou patente.
A origem das técnicas de acabamento do assemblage é a mesma da “pintura
matérica”; assim denominada pelas aplicações picturais sobre objetos e materiais
colados ou costurados na superfície dos suportes de telas de tecidos de
consistências diversas. O assemblage, paralelamente, segue o mesmo
procedimento, ao afixar qualquer tipo de material ou objeto sobre um determinado
suporte, que não a tela, podendo ser, incluisive, outro objeto.
7
Artistas brasileiros como Nelson Leirner (Fig.05), Rubens Gerchman (1942 -
2008) (Fig.08), Rochelle Costi (Fig.07) e Leda Catunda (Fig.06) também se
expressaram através do assemblage como se constata pelas imagens aqui
reproduzidas.
Fig, 05 - (a) Fig. 06 - (b)
(a) Nelson Leirner “Homenagem a Fontana” 1967, (lona e ziper, 180 x 125 cm)
(b) Leda Catunda, “Jardim das Vacas”, 1988 (Pintura acrílica sobre couro afixado em madeira,
146 x 158 cm)
Fig, 07 - (c) Fig. 08- (d)
(c) Rochelle Costi, “Mapa”2002, (Lantejoulas sobre fotografia, 47,5 x 32,5 x 4 cm)
(d) Rubens Gerchman, “Ar”, 1965, (Pintura acrílica s/ madeira recortada e colada, 60 x 60 cm)
8
O princípio que orienta a feitura do assemblage é a estética da acumulação:
entendendo-se que toda a expressividade, seja ela material ou filosófica deva ser
incorporada à concepção da obra de arte, para que a sua modelagem, mediada
pelos acabamentos visualmente equilibrados, expresse a poética reveladora.
Fig. 9 – Jayme Bispon, “Dois pensamentos” 2011, (Composição móvel composta por 8 objetos
c/ adesivagem sobre metal tratado , 210 X 105 X 24 cm)
O trabalho aqui relatado propõe o deslocamento de um objeto das suas
finalidades/funcionalidades terminais, resgatando-o da sua condição de lixo poluidor,
utensílio doméstico de salubridade discutível ou como matéria-prima para o
enfrentamento da miséria, fornecida pelo sistema urbano de coleta, como sucata
para reprocessamento industrial, alçando-o a fruição dos espaços da convivência
humana.
“A arte deverá passar pela tecnologia porque esta contém
aquela. E necessita reaproveitar o que foi utilizado enquanto
meios materiais” (CHIPP1988)
9
CAPITULO 1
TOTENS TÁTEIS
Os assemblage concebidos para este trabalho, compreendem vários
conjuntos de peças (pares múltiplos), combinadas entre si por configurações
denominadas “Totens Táteis” (referem-se historicamente aos totens e menires
utilizados por culturas ameríndias). Por opção existencial do autor, ao assimilar em
seu aprendizado, os parâmetros da cultura visual acadêmica européia,
interpretando-os, de memória, linguagens plásticas nativas, utilizando sucata de
material de consumo urbano e preservando recursos naturais.
O objeto de arte aqui descrito foi planejado para obter resultados visuais dos
planos e superfícies cúbicas vazadas, das latas de 18 litros. Sem os fundos e as
tampas, as latas transformam-se em peças tubulares de seções quadradas ou
cilíndricas, permitindo articulações e montagens. (Figs. 9 10 e 11)
Fig. 09 – Latas de 3 e18 litros Fig.10– “Ensaio W” Fig.11– “Ensaio X”
A inclusão desse suporte específico busca estruturar uma linguagem
expressiva em objetos existentes para outras funções, diferentes da função de
objeto de arte apropriando-se “minimalisticamente” (expressão recorrente à noção
de minimalismo: tendência das artes visuais que ocorre no fim dos anos 1950 e
início 60 em Nova York; os trabalhos de arte, nessa concepção, são simplesmente
objetos com outra destinação e, com um mínimo de interferência plástica pelo
artista, transformados em portadores de idéias ou emoções); o acabamento
industrializado das latas, facilita o manuseio, economia de tempo e mão-de-obra nos
procedimentos preliminares durante a aplicação dos tratamentos plásticos nas
superfícies desse suporte, enfatizando assim os diálogos visuais e volumétricos
pertinentes à linguagem desenhada para (suporte) o objeto.
10
Agora transformados em objetos intelectuais verdadeiramente úteis
configuram-se em repositórios ou embalagens de produtos imateriais de
inquestionável valor: a expressividade emocional plena de visualidade.
As superfícies externas e internas dessas latas estruturam o suporte como se
fossem aparência e intelecto nas suas aplicações pictóricas e materiais, buscando
resultados plásticos para finalidades estéticas, nos diálogos espaciais entre sujeito
fruidor e objeto transmissor com seus planos multidimensionais (dentro e fora),
estimulados pela combinação visual dos grafismos aplicados nessas mesmas
superfícies (Figs. 12 e 13)
Fig.12– Ensaio A - Detalhe Fig. 13 – Ensaio B - 2011.
As caracterizações formuladas nesta monografia encontraram, no ensaio do
filósofo e historiador da arte Arthur C. Danto: A transfiguração do lugar-comum
(2005), fundamentação teórica para prosseguir na sua elaboração.
(...) uma obra de arte é um objeto apropriadamente chamado
de expressão porque sua causa é um sentimento ou emoção
particular de quem a realizou e quem ela efetivamente
expressa. Segundo essa concepção, uma ação e uma obra
de arte se distinguem por suas respectivas ordens de causas
mentais e, além disso, pela diferença entre corresponder a
uma intenção e exprimir um sentimento, (DANTO. 2005,
p.40).
Utilizando o paradigma proposto por Danto para promover o diálogo
sensorial com o espaço, o plano e a superfície do suporte, optou-se por uma
linguagem plástica expressa através dos grafismos de configuração geométrica,
obtidos pela adesivagem das cores, que emolduram os efeitos expressionistas
obtidos por abrasão nas superfícies das latas com acabamento envernizado,
processo de durabilidade média que propiciará as várias transformações impostas
ao suporte pelas intempéries, previsíveis para as conseqüências plásticas da obra,
como se constata nas imagens ( Figs. 14, e 15.).
11
O expressionismo é uma tendência permanente e universal da arte, definida
como a manifestação exterior de uma necessidade interna do indivíduo.
Fig. 14 – Ensaio C - 2011 Fig.15– Ensaio D - 2011
No sentido histórico o expressionismo é uma tendência da arte européia moderna
(1910 e 1914); noção empregada pela primeira vez em 1911 na revista Der Sturm o
mais importante veículo do movimento (Figs. 16, 17, 18).
Fig. 16 (a) Fig. 17 (b) Fig. 18 (c)
(a) Rudolf Bauer (1889-1916) “Exposição dos Expressionistas”, 1916 Litografia (70x49cm)
(b) Franz Marc (1880-1910) “Tyrol”, 1914 Óleo s/tela (135x144cm)
(c) “Der Sturm” Capa de revista 1911, Tipografia (23x31cm)
Expressionismo Abstrato refere-se a um movimento artístico iniciado em
Nova York logo após a 2ª Guerra Mundial, noção utilizada pela primeira vez em 1952
pelo crítico H. Rosenberg, constituindo-se essa tendência, desde então, como o
estilo pictórico norte-americano.
No expressionismo abstrato a ausência de modelos, a idéia de
espontaneidade relacionada ao trabalho artístico e a gestualidade do artista,
decompondo a realidade, consolida a identificação temática como um retorno às
origens, buscando forças elementares e emoções primárias.
12
Ao optar pelo pensamento primitivo - visto como alternativa à racionalidade
acadêmica - recupera as heranças arcaicas e a compreensão da natureza como um
manancial de forças, instintos e transformações (rupturas).
Fig, 19 (a) Fig. 20 (b)
(a) Ad Reinhardt (1913-1967)”Colagem” 1940. Papel impresso colado s/painel, (39 x 33 cm)
(b) Mark Rothko (1903-1970)“Sem título” 1949(Violet, Black, Orange, Yellow on White and Red)
Óleo s/tela, (207 x 168 cm)
Artistas do porte de Arshille Gorki, Ad Reihardt, Adolf Gotlieb, Mark Rohtko,
Jacson Pollock, Willem De Kooning e Wassily Kandinski entre outros, confirmam o
expressionismo abstrato como um movimento que ganhou este nome porque
combina a intensidade emocional do expressionismo alemão com a estética das
escolas européias, como o futurismo, a Bauhaus e o cubismo.
Ao incorporar o emprego de uma palheta agressiva e vibrante (fauvista), o
expressionismo abstrato redescobre as configurações geométricas, atribuindo
velocidade à captação intuitiva dos motivos aleatórios, com espessas e rústicas
camadas de pigmentos sobrepostos, seja por volume de tinta ou por pedaços de
materiais aplicados, uns sobre os outros, na superfície do suporte.
13
O modo de pintar americano elegeu como suporte a parede e o chão,
permitindo que o artista tivesse estabilidade e acessibilidade ao suporte para
trabalhar por todo o seu perímetro; passando a trabalhar dentro (fisicamente) da
obra e extraindo obras-primas como se constata nas imagens das obras aqui
selecionadas dos expoentes do expressionismo abstrato.(Figs.19 a 24)
Fig. 21 (a) Fig. 22 (b)
(a) Adolf Gotlieb (1903-1974), “ Mist”, 1961. Óleo s/tela, (182.9 x 121.9 cm).
(b) Willem de Kooning (1904-1997),”Composição”1955. Óleo temp e carvão s/tela, (201x175
cm).
Fig. 23 (a) Fig. 24 (b)
(a) Vassili Kandinsky (1866-1944),“Cruz Branca” 1922. Óleo s/tela, (100 x 110 cm)
(b) Jackson Pollock (1912-1956), “Circuncisão” 1946. Óleo s/tela, (142 x 168)
Vale citar Fernand Leger (1881-1955), pioneiro na referência do elemento mecânico
como possibilidade plástica, pontuando a respeito em “Funções da Pintura”:
O elemento mecânico, como todo o resto, é apenas um meio,
não um fim.Mas, se quisermos fazer uma obra forte, firme,
com intensidade plástica, se quisermos fazer uma obra
orgânica, se quisermos criar e obter a equivalência do “objeto
belo” que a indústria às vezes produz, é tentador nos
servirmos desses materiais como matéria-prima.(LEGER,
1989, p.49).
14
Os objetos transformados em “não-objetos”, que é o caso das latas
(embalagens) descartadas, se regenerariam como “novos objetos”, paradigmáticos
das transformações observadas na natureza, como, por exemplo, os diamantes:
produtos da regeneração de outros minerais.
A confirmação desta pesquisa como linguagem passa por Marcel Duchamp
e seus ready made; uma tentativa de escapar, segundo Duchamp, da "arte
retiniana", confrontando o espectador, oferecendo-lhes algo já visto, forçando-o a
pensar e refletir sobre a questão da arte enquanto linguagem; como pontua Ricardo
N. Fabbrini in “A arte depois das vanguardas”, afirmando como segue:
[...] Depois que as vanguardas conceituais alargaram de
modo definitivo o campo da experiência artística, não
podemos mais, com base na percepção sensível, distinguir
um simples objeto de uma obra de arte. Um mictório e a
Fonte de Duchamp, uma roda encravada num banco e fase
da interrogação sobre a “essência da obra de arte” encerrou-
se de modo que a arte conceitual, ou seja, a reflexão sobre o
quadro institucional do “mundo da arte”, é aceita por críticos e
boa parte do público tanto quanto a arte retiniana baseada
num suporte material, como a tela, e num “médium artístico”,
como a tinta, ambas constitutivas da arte atual, sua Roda de
bicicleta histórica , são “ réplicas indiscerníveis” que possuem
“fundamentos ontológicos diversos”.(FABRINI 2002, p.145)
A arte de Marcel Duchamp, que se opunha aquilo que ele próprio dizia ser a
"arte retiniana", ou seja, uma arte que agrada à vista; entendendo-se toda a arte de
Duchamp como um esforço para se afastar da "arte retiniana" e passar para uma
arte mais reflexiva contextualizada nos aspectos mais intelectuais do fazer artístico,
como testemunham as imagens das suas obras (Figs. 25e 26)
Fig. 25 (a) – Marcel Duchamp (1887-1968) Fig. 26 (b) – R. Mutt (pseudônimo)”
(a) “Roda de Bicicleta” 1913 - (h 124cm) (b) “Fonte” 1917 – (h 60 cm)
15
A pesquisa que resultou neste trabalho foi estimulada pela obra do escultor
David Smith (1906-1965):“um cânon de formas e gosto tomadas despudoradamente
de Gonzalez, Picasso, Matisse e Miró, que agrada por não ofender os olhos que
aprenderam a gostar da arte cubista.” revelando “o aspecto autêntico e preciso do
cubismo que o artista desenvolveu sozinho a partir das próprias necessidades”
afirma Clement Greenberg, crítico e historiador especialista na obra de David Smith
que inspirou a direção que esta pesquisa deveria tomar (Figs. 27, 28 e 29).
Fig.27 (a) Fig.28 (b) Fig.29 (c)
(a) David Smith “CUBI VI” 1963 (b) J. Gonzalez (1876-1942) (c) David Smith (1906-1965)
“CUBI VI 1963” “Monsieur Cactus”1939 “CUBI XXVII”1965
As peças executadas em chapas de aço inoxidável ou de ferro, soldadas,
apresentam-se como um utensílio artístico fabricado e visualmente disciplinado,
Por outro lado os objetos acabados (latas) dialoga espacialmente com as peças
concebidas em aço inoxidável pelo artista (David Smith) que emula este trabalho.
Fig. 30 – Ensaio E - 2010 Fig. 31 - Ensaio F - 2011 Fig. 32 - Ensaio G – 2011
16
Esta pesquisa busca justificar a utilização de um tipo de suporte para o
registro expressivo, sob a forma de assemblage, na concepção de diálogos visuais
próprios da escultura, no que diz respeito às penetrações dos interiores e a aura dos
volumes superficiais daqueles objetos, como são mostrados nas imagens (Figs.30,
31 e 32) composições ensaiadas para esta demonstração.
O suporte e a sua natureza – material industrializado, metálico, recuperado –
estão aqui introduzidos como protagonistas principais por oferecerem conteúdos
práticos (pronto para o manuseio) e reflexivos como autênticos veículos da
verdadeira finalidade expressiva da obra; sem, entretanto, diminuir a sua importância
funcional e estética no desempenho plástico da obra.
A busca da autêntica expressividade que move este trabalho desenvolve e
testa arranjos possíveis na utilização de todos os planos e volumes, visíveis ou
sugeridos no suporte, oferecidos pelas superfícies internas e externas das latas, que
oferecem composições visuais estimulantes, factíveis em um conjunto de volumetria
escultórica visualmente harmonioso e espacialmente equilibrado, compartilhando
olhar e espírito, uma fruição dinâmica, instigante e reveladora. (Fig. 33)
Em sua tese de mestrado Tatiana Sampaio Ferraz ( CAP/ECA –USP /1986),
identificando práticas artísticas contemporâneas fundamentadas na experiência do
deslocamento; esclarecendo que deslocamento designa ao mesmo tempo, além do
significado original (espacialidade ou temporalidade), “proposições que inauguram
um fazer artístico para além daqueles conhecidos nos domínios institucionais da
arte”. Nesse mesmo texto a autora enxerga: “O caráter experimental desses
trabalhos apontam para o estiramento do “objeto de arte” estabelecidos a partir de
novos contornos quanto à sua formalização (“suportes”) e ou a sua atuação
(“lugares da arte”)”.
Fig.33 - Ensaio ( Detalhe de um conjunto ) 2011
17
CAPITULO 2
SUPORTES SELETIVOS
O objeto aqui proposto como suporte contém as expressividades físicas e
abstratas veiculadas pelo assemblage. O objeto físico é tangível na volumetria
unitária dos componentes de cada conjunto; entretanto, não foi concebido para ser
manipulado, no que diz respeito à sua configuração plástica, quando exposto em
conjunto de duas, oito, ou seus múltiplos pares, como nos ensaios das Figs. 34 e 35.
Fig.34 - Ensaio H – 2011 Fig.35 - Ensaio I - 2011
Quando desmontado cada assemblage poderá ser reconfigurado, ou não,
mediante a combinação pictórica que agrade ao proprietário da peça, na fruição dos
grafismos resultantes da combinação das superfícies interna e externa, obtida pela
expressividade das quatro faces de cada unidade (lata) componente do conjunto.
18
Ao proceder a pintura sobre o suporte metálico (Fig. 36), verificou-se que a
utilização das tintas, similares àquelas embaladas nas latas em sua função original,
seccionava conceitualmente a relação suporte/conteúdo, que consubstancia este
trabalho, pela inexistência da condição de “sucata de tinta”.
Fig. 36 - Jayme Bispon, “Pensadora” 2010 Fig. 37 - Ensaio k (Detalhe Conjunto)
(Esmalte s/folha de flandres usada- 94x35cm)
A existência residual da película para adesivagem de cores nos
acabamentos e sinalizações de objetos utilitários, ajustou-se adequadamente às
finalidades picturais complementando o assemblage, quanto ao conceito material da
proposta. (Fig.37).
A utilização desse material, perfeitamente ajustado à linguagem intuída, permitiu
somarem-se ganhos quanto à sustentabilidade, concluindo às finalidades
conceituais do assemblage.
19
CAPITULO 3
SUCATA SUADA
Cumpre registrar nesta monografia o percurso cronológico para a obtenção
das latas e material pictórico complementar: 1) procura de latas descartadas nas
caçambas posicionadas nos logradouros públicos, 2) localização de obras da
construção civil em fase de acabamento, 3) entrevista com os encarregados das
obras para obter a autorização da coleta, 4) encomenda das latas se as mesmas
ainda não estiverem à disposição, 5) localização e coleta do material dentro do
canteiro, 6) disputas pela posse do material com catadores de sucata desvinculados
à entidades, 7) recolhimento de unidades abandonadas em logradouros públicos. A
procura, localização e coleta do material consumiram de 10 a 12 meses
ininterruptos, na visitação a obras, procura por responsáveis pela liberação do
material, remoção e separação de resíduos de toda natureza em caçambas para
recolher as latas onde estivessem disponíveis.
Fig 37 – Vista do local de armazenagem das latas. Na parte inferior vê-se o material como foi
recolhido; na parte superior latas já preparadas para a fase de finalização.
Obtidas as latas no estado em que se encontravam, e logo armazenadas em
local protegido de intempéries (Fig. 37), iniciam-se os procedimentos de limpeza e
preparação: Localizadas e recolhidas, cada lata teve todos os resíduos, de tinta ou
rotulagem removida a fogo; posteriormente lixados, rebitados e lavados em jornadas
que duravam em média 2 horas para cada peça.
20
Nas extremidades perimetrais de cada peça (lata) foram executados 8 furos
destinados aos encadeamentos das peças entre si e sustentação das mesmas em
arranjos de suspensos e afins. Para a ancoragem das composições foram
desenvolvidas sapatas de concreto armado dimensionadas em 23,5x23,5x5cm para
o encaixe das latas no lastreamento (Fig. 38).
Fig.38 – Ensaio j – 2011 Fig. 39 – Ensaio k - 2011
O outro item que compõe a linguagem plástica deste trabalho é o tratamento
pictórico do objeto receptor (a lata); para essa finalidade foi utilizada sucata
(retalhos) de película adesiva colorida de PVC (tinta em estado sólido impressa em
filme), fonte de cor (Pantone) para comunicação visual, sinalização e envelopamento
(aplicação da película sobre a pintura original de automóveis e eletrodomésticos),
coerentemente com os parâmetros da obra aqui relatada, esse produto vem a ser a
evolução natural da tecnologia e da indústria para o uso controlado da tinta, além de
produzir uma sucata perfeitamente ajustada ao conceito aqui desenvolvido (Fig. 39).
Fig. 40 – Jayme Bispon, “Platéia” 2010 (Latas de cerveja e tampas de latas em grade de ferro,
160 x 100cm)
21
As embalagens de alumínio, por outro lado, acrescentam o movimento às
linguagens devido ao peso; quanto ao volume do conjunto atendem a
contextualizações visuais figurativas de grande impacto conforme experimentações
logísticas e pictóricas (Fig. 40). Outros itens provenientes do mesmo tipo de material
permitem um tratamento plástico onde se aplicam linguagens que requerem
apurados acabamentos de superfície devido a conformação desses suportes,
combinados com incidências luminosas, possibilitando efeitos inusitados (Fig. 41)
Fig. 41 Jayme Bispon, “Reticulado” 2010 (Tampinhas de garrafa s/painel de madeira 90x60cm)
Entendendo que a utilidade do objeto produzido a partir dos recursos
naturais não cessa após atender às demandas para as quais foi concebido,
Herschell B. Chipp em Teorias da arte moderna (SP :1988), pontua: “ A arte deverá
passar pela tecnologia porque esta contém aquela, reaproveitando o que foi utilizado
enquanto meios materiais.”
22
CONCLUSÃO
A conclusão desta monografia/relatório é uma reflexão/inventário sobre a
elaboração de uma linguagem – o assemblage – definida como a justaposição de
vários materiais recorrentes a um processo pictórico expressionista abstrato.
O crítico e historiador da arte Clement Greenberg, em Arte e cultura /
Ensaios críticos ( 2001), reflete: “A arte é uma questão estritamente de experiência,
não de princípios, e o que conta na arte em primeiro e último lugar, é a qualidade:
todas as outras coisas são secundárias” e aponta , estendendo as suas observações
até o artista que emulou este trabalho:
[...] A pretensão artística é geralmente o sintoma de um
medo de que a obra de arte não exiba suficientemente sua
identidade enquanto arte e seja confundida como um objeto
utilitário ou puramente arbitrário. (...) As exceções entre os
artistas são precisamente aquelas que constituem as poucas
exceções à decepção geral que a escultura modernista tem
sido na última década. A mais notável delas é David Smith
que não hesito em chamar de o melhor escultor de sua
geração (GREENBERG, 2001, p.210).
Este trabalho, entretanto, limita-se à utilização de apenas dois materiais, ou
objetos, denominados sucatas, conduzindo a pesquisa quanto a formatação das
peças (número de latas utilizadas, encadeamento das peças entre si e modos de
exibição).
O resultado plástico obtido pela abrasão das superfícies das latas e a
aplicação da película auto-adesiva, na obtenção do tratamento cromático/pictórico
utilizando-se cores prontas (Pantone) patenteadas, posiciona a obra em um patamar
exclusivo que será explorado a partir deste trabalho.
23
Formulando uma equação da natureza, verificamos que aonde prolifera o
excesso, ocorre o controle. No caso dos ratos e gatos, esses, predadores, ao se
alimentarem daqueles, garantem a própria sobrevivência e equilibram a oferta dos
outros recursos naturais para o bioma.
Este trabalho utiliza o paradigma da natureza como referência temática para
estruturar a proposta de valorização dos suportes artísticos, mediante o
aproveitamento das embalagens metálicas descartadas destinadas à reciclagem, ou
não, elaborando montagens escultóricas ou desenvolvendo linguagens picturais
sugeridas a partir dessas montagens, obtidas pela combinação dos formatos e
volumes do material recolhido, transformando-as definitivamente em outros objetos.
Essas latas e seus componentes, definitivamente recuperados das
estatísticas da poluição, são repensados para o usufruto da expressividade visual.
24
BIBLIOGRAFIA
ALBERS, Josef. La interacion del color. 3ª ed. Madrid: Alianza Editorial, 1982
ARCHER, Michael. Arte contemporânea: uma história concisa. São Paulo,
Martins Fontes, 2001.
ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. 2ª ed. São Paulo, Cia da Letras, 1993.
ARNHEIM, Rudolf. Arte & Percepção Visual. São Paulo, Pioneira Editora, 1996.
BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo, Martins Fontes, 1989.
BRILL, Alice. Da arte e da linguagem. São Paulo, Perspectiva Editora, 1988.
CHIPP, Herschell Browning. Teorias da arte moderna. 2ªed. São Paulo, Martins
Fontes, 1996.
CAUQUELIN, Anne. Arte Contemporânea: uma introdução. São Paulo, Martins
Fontes, 2005
DANTO, Arthur C. – A Transfiguração do Lugar-Comum São Paulo : CosacNaify,
2005
EHRENZWEIG, Anton. A ordem oculta da arte. Rio de Janeiro, Zahar, 1977.
FABBRINI, Ricardo Nascimento. A arte depois das vanguardas. Campinas,
Ed.UNICAMP, 2002.
FERRAZ, Tatiana Sampaio.Trabalhos de escala ambiental: da escultura
moderna a situações contemporâneas. (Dissertação de mestrado), São Paulo,
ECA USP, 1986.
GREENBERG Clement. Arte e Cultura; Ensaios Críticos, São Paulo, Editora Ática,
2001.
KANDINSKY, Vassily. Do espiritual na arte. São Paulo, Martins Fontes, 1996.
KRAUSS, Rosalind. Caminhos da escultura moderna. São Paulo, Martins Fontes,
1998.
LANGER, Susanne. Sentimento e Forma. São Paulo, Editora Perspectiva , 1980.
LEGER, Fernand. Funções da pintura, SP: Nobel, 1989.
SUBIRATS, Eduardo. Da vanguarda ao pós-moderno. 4ª ed. São Paulo: Nobel,
1991.
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Arte Máquina e o Suporte Sucata

  • 1. JAIME BISPO DO NASCIMENTO ARTE MÁQUINA E O SUPORTE SUCATA UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÕES E ARTES CURSO DE ARTES VISUAIS – BACHARELADO CAMPO GRANDE 2011
  • 2. JAIME BISPO DO NASCIMENTO ARTE MÁQUINA E O SUPORTE SUCATA Projeto submetido à apreciação da Banca examinadora como exigência parcial para a obtenção do grau de Bacharelado em Artes Visuais elaborado sob a orientação do Professor Msc. Elomar Bakonyi. UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL DEPARTAMENTO DE COMUNICAÇÕES E ARTES CURSO DE ARTES VISUAIS – BACHARELADO CAMPO GRANDE 2011
  • 3. RESUMO Esta monografia: Arte Máquina e o Suporte Sucata, leva esse título porque relata a elaboração de uma obra de arte que utiliza como suporte recipientes (latas) de 18 litros, de perímetro cúbico, utilizadas para embalar tintas e similares em estado líquido, e, após a utilização nessa função, imediatamente descartadas como lixo. Recuperadas e tratadas com um mínimo de interferência na sua formatação original de embalagem utilizada, as latas assumem a condição de suporte para a veículação de uma linguagem visual, contextualizando todo o volume científico e tecnológico embutidos na sua concepção e fabricação como embalagem especializada. Esse suporte apresenta, além das possibilidades plásticas, a relação conceitual suporte/conteúdo; antes transportando a tinta para aplicação em outros suportes; agora como suporte para as configurações esculturais e picturais dessa nova condição, demonstrando a evolução do estado de sucata de embalagem de produto líquido, para a expressividade elaborada por adesivagem, que vem a ser tinta impressa sobre material plástico em estado sólido, aplicada sobre as superfícies internas e externas dessas latas, concebendo grafismos de leitura expressionista, especificamente expressionismo abstrato, configurado pela aplicação dos adesivos de cor em molduras geométricas, sobre as texturas de fundo, elaboradas por abrasão, nas superfícies dos objetos, concluindo a função de suporte pictórico. Os conjuntos de 4, 8 ou 16 peças, apresentam variadas composições obtidas pelo encadeamento dos volumes, posicionamento das peças e variações na maneira de expor; afixados, pendurados ou apoiados em plintos, oferecem leituras cromáticas estimulantes. A linguagem escultórica das unidades ou dos conjuntos é interpretada como material concreto, limitadas por formas e elaboradas por manufatura em espaço tridimensional, tendo como finalidade tornar aparentes as soluções plásticas e estéticas a partir dessas composições. Esses procedimentos clássicos permitem organizar o modo de expor um ponto de vista plástico, mediante arranjos das leituras veiculadas pelo suporte; combinando as linguagens da escultura e da pintura no Assemblage: o objeto de arte desta monografia. Palavras-chave: Suporte, Escultura, Pintura, Expressionismo, Sustentabilidade.
  • 4. SUMÁRIO INTRODUÇÃO...........................................................................................................04 CAP. 1 – TOTENS TÁTEIS.......................................................................................09 CAP. 2 – SUPORTES SELETIVOS...........................................................................17 CAP. 3 – SUACATA SUADA................................................................................... 19 CONCLUSÃO............................................................................................................22 BIBLIOGRAFIA.........................................................................................................24
  • 5. INTRODUÇÃO A arte é o suporte da cultura. Inexistindo a arte, a cultura não se organiza como expressão coletiva, porque alguém deve transmitir para alguém mediado por algum tipo de codificação, emocionalmente compreensível e visualmente estimulada: função da obra de arte. Arte Máquina e o Suporte Sucata é o título desta monografia, formatada como relatório de uma pesquisa orientada para se obter um suporte durável, para uma linguagem plástica intuída e concebida, especificamente, para a veiculação nesse mesmo suporte. A expressão “Arte Máquina”, que compõe o título, indica a origem do conceito que o complementa (“Suporte Sucata”), apontando para a natureza material do objeto, produzido em uma linha de montagem industrial com significativa aplicação de parâmetros científicos e tecnológicos na sua confecção. O objeto, reutilizado e modificado pela extração de partes da sua configuração original, sem prejuízo para as finalidades propostas, é redirecionado na condição de suporte para o relacionamento expressivo que se pretende neste trabalho. Na sua caracterização como assemblage (palavra de gênero masculino e origem francesa que significa reunir, montar, juntar), aquele suporte e seu contexto, assumem a função de obra de arte composta de dez dimensões: sendo cinco dimensões externas: uma altura, duas larguras iguais, dois comprimentos iguais, mais as cinco dimensões internas equivalentes a essas; aonde a aplicação e a fixação do sistema de cromático aqui utilizado, oferecem plasticidade às metáforas visuais. O termo assemblage, inventado pelo artista Jean Dubuffet (1901-1985) e incorporado às artes em 1953, refere-se a trabalhos que “vão além das colagens”. A referência de Dubuffet às colagens não é casual; ao abrigar no espaço do suporte elementos retirados da realidade – papéis, tecidos, madeiras, metais etc, verifica-se a ampliação do tratamento plástico, sobrepondo-os às limitações da superfície; A pintura passa então a ser concebida como uma construção sobre um suporte, diluindo de certa forma, as fronteiras entre a pintura e a escultura. Na obra de Dubuffet, a ênfase recai sobre a matéria, desde as Texturologias, produzidas em fins da década de 1950, que se caracterizam, como o título indica, pelas texturas experimentadas com cores e materiais diversos. 5
  • 6. A obra reproduzida na Fig. 01 é representativa quanto ao uso de material no assemblage: Reza a lenda que Dubuffet tinha acumulado no piso do seu estúdio pinturas em papel; ao observar os arranjos espontâneos das sobreposições dessas pinturas, cortou-as, utilizando os pedaços para fazer uma montagem; essa obra pertence a uma série de cerca de uma centena de colagens que o artista denominou "Teatros da Memória", porque esse assemblage combina evocações de cenas em diferentes lugares. Fig.01- Jean Dubuffet (1901-1985),“Les Vicissitudes” 1977- Acrílico s/ papel, s/ tela- 210X339cm A pintura passa a ser concebida como construção sobre um suporte, o que pode dificultar o estabelecimento de fronteiras rígidas entre pintura e escultura. As combine paintings de Robert Rauschenberg (1925-2008) (Fig. 02), confirma o assemblage como procedimento passe a ser utilizada a partir da década de 1950 por artistas muito diferentes entre si. Fig.2 - Bed”(Cama) 1955 Robert Rauschenberg (1925-2008), (Óleo e lápis sobre travesseiro e colcha sobre suporte de madeira – 191 x 80 x 23 cm) 6
  • 7. Na Itália, Alberto Burri (1915), autor de pinturas e colagens, volta-se na década de 1950 para pesquisas semelhantes, explorando as potencialidades expressivas da matéria, soldando, costurando e colando sacos, madeiras, papéis queimados, paus, latas e plásticos (Saco, 1953, Combustões, 1957, e Ferros, 1958) obtendo resultados distintos. Suas pesquisas com lixo e sucata prefiguram a arte junk norte-americana e a arte povera italiana. (Fig. 03) Fig.03 – (a) Fig. 04 –(b) (a) Alberto Burri (1915-1995) “Blanco Plastica” 1966, Combustão s/celotex(100 x 75 cm) (b) Antoni Tapiés (1923) “Palla y Fusta”1969. Assemblage s/tela (150 x 116 cm) Na Espanha, a "pintura matérica" realizada por Antoni Tápies (1923), no mesmo período, utiliza cimento, argila, pó de mármore, materiais de refugo (restos de papel, barbante e tecidos), partes de móveis velhos etc. As possibilidades do assemblage e a versatilidade dos materiais cotidianos resultou na obra mostrada na Fig. 04, onde a sensibilidade conceitual do artista ficou patente. A origem das técnicas de acabamento do assemblage é a mesma da “pintura matérica”; assim denominada pelas aplicações picturais sobre objetos e materiais colados ou costurados na superfície dos suportes de telas de tecidos de consistências diversas. O assemblage, paralelamente, segue o mesmo procedimento, ao afixar qualquer tipo de material ou objeto sobre um determinado suporte, que não a tela, podendo ser, incluisive, outro objeto. 7
  • 8. Artistas brasileiros como Nelson Leirner (Fig.05), Rubens Gerchman (1942 - 2008) (Fig.08), Rochelle Costi (Fig.07) e Leda Catunda (Fig.06) também se expressaram através do assemblage como se constata pelas imagens aqui reproduzidas. Fig, 05 - (a) Fig. 06 - (b) (a) Nelson Leirner “Homenagem a Fontana” 1967, (lona e ziper, 180 x 125 cm) (b) Leda Catunda, “Jardim das Vacas”, 1988 (Pintura acrílica sobre couro afixado em madeira, 146 x 158 cm) Fig, 07 - (c) Fig. 08- (d) (c) Rochelle Costi, “Mapa”2002, (Lantejoulas sobre fotografia, 47,5 x 32,5 x 4 cm) (d) Rubens Gerchman, “Ar”, 1965, (Pintura acrílica s/ madeira recortada e colada, 60 x 60 cm) 8
  • 9. O princípio que orienta a feitura do assemblage é a estética da acumulação: entendendo-se que toda a expressividade, seja ela material ou filosófica deva ser incorporada à concepção da obra de arte, para que a sua modelagem, mediada pelos acabamentos visualmente equilibrados, expresse a poética reveladora. Fig. 9 – Jayme Bispon, “Dois pensamentos” 2011, (Composição móvel composta por 8 objetos c/ adesivagem sobre metal tratado , 210 X 105 X 24 cm) O trabalho aqui relatado propõe o deslocamento de um objeto das suas finalidades/funcionalidades terminais, resgatando-o da sua condição de lixo poluidor, utensílio doméstico de salubridade discutível ou como matéria-prima para o enfrentamento da miséria, fornecida pelo sistema urbano de coleta, como sucata para reprocessamento industrial, alçando-o a fruição dos espaços da convivência humana. “A arte deverá passar pela tecnologia porque esta contém aquela. E necessita reaproveitar o que foi utilizado enquanto meios materiais” (CHIPP1988) 9
  • 10. CAPITULO 1 TOTENS TÁTEIS Os assemblage concebidos para este trabalho, compreendem vários conjuntos de peças (pares múltiplos), combinadas entre si por configurações denominadas “Totens Táteis” (referem-se historicamente aos totens e menires utilizados por culturas ameríndias). Por opção existencial do autor, ao assimilar em seu aprendizado, os parâmetros da cultura visual acadêmica européia, interpretando-os, de memória, linguagens plásticas nativas, utilizando sucata de material de consumo urbano e preservando recursos naturais. O objeto de arte aqui descrito foi planejado para obter resultados visuais dos planos e superfícies cúbicas vazadas, das latas de 18 litros. Sem os fundos e as tampas, as latas transformam-se em peças tubulares de seções quadradas ou cilíndricas, permitindo articulações e montagens. (Figs. 9 10 e 11) Fig. 09 – Latas de 3 e18 litros Fig.10– “Ensaio W” Fig.11– “Ensaio X” A inclusão desse suporte específico busca estruturar uma linguagem expressiva em objetos existentes para outras funções, diferentes da função de objeto de arte apropriando-se “minimalisticamente” (expressão recorrente à noção de minimalismo: tendência das artes visuais que ocorre no fim dos anos 1950 e início 60 em Nova York; os trabalhos de arte, nessa concepção, são simplesmente objetos com outra destinação e, com um mínimo de interferência plástica pelo artista, transformados em portadores de idéias ou emoções); o acabamento industrializado das latas, facilita o manuseio, economia de tempo e mão-de-obra nos procedimentos preliminares durante a aplicação dos tratamentos plásticos nas superfícies desse suporte, enfatizando assim os diálogos visuais e volumétricos pertinentes à linguagem desenhada para (suporte) o objeto.
  • 11. 10 Agora transformados em objetos intelectuais verdadeiramente úteis configuram-se em repositórios ou embalagens de produtos imateriais de inquestionável valor: a expressividade emocional plena de visualidade. As superfícies externas e internas dessas latas estruturam o suporte como se fossem aparência e intelecto nas suas aplicações pictóricas e materiais, buscando resultados plásticos para finalidades estéticas, nos diálogos espaciais entre sujeito fruidor e objeto transmissor com seus planos multidimensionais (dentro e fora), estimulados pela combinação visual dos grafismos aplicados nessas mesmas superfícies (Figs. 12 e 13) Fig.12– Ensaio A - Detalhe Fig. 13 – Ensaio B - 2011. As caracterizações formuladas nesta monografia encontraram, no ensaio do filósofo e historiador da arte Arthur C. Danto: A transfiguração do lugar-comum (2005), fundamentação teórica para prosseguir na sua elaboração. (...) uma obra de arte é um objeto apropriadamente chamado de expressão porque sua causa é um sentimento ou emoção particular de quem a realizou e quem ela efetivamente expressa. Segundo essa concepção, uma ação e uma obra de arte se distinguem por suas respectivas ordens de causas mentais e, além disso, pela diferença entre corresponder a uma intenção e exprimir um sentimento, (DANTO. 2005, p.40). Utilizando o paradigma proposto por Danto para promover o diálogo sensorial com o espaço, o plano e a superfície do suporte, optou-se por uma linguagem plástica expressa através dos grafismos de configuração geométrica, obtidos pela adesivagem das cores, que emolduram os efeitos expressionistas obtidos por abrasão nas superfícies das latas com acabamento envernizado, processo de durabilidade média que propiciará as várias transformações impostas ao suporte pelas intempéries, previsíveis para as conseqüências plásticas da obra, como se constata nas imagens ( Figs. 14, e 15.).
  • 12. 11 O expressionismo é uma tendência permanente e universal da arte, definida como a manifestação exterior de uma necessidade interna do indivíduo. Fig. 14 – Ensaio C - 2011 Fig.15– Ensaio D - 2011 No sentido histórico o expressionismo é uma tendência da arte européia moderna (1910 e 1914); noção empregada pela primeira vez em 1911 na revista Der Sturm o mais importante veículo do movimento (Figs. 16, 17, 18). Fig. 16 (a) Fig. 17 (b) Fig. 18 (c) (a) Rudolf Bauer (1889-1916) “Exposição dos Expressionistas”, 1916 Litografia (70x49cm) (b) Franz Marc (1880-1910) “Tyrol”, 1914 Óleo s/tela (135x144cm) (c) “Der Sturm” Capa de revista 1911, Tipografia (23x31cm) Expressionismo Abstrato refere-se a um movimento artístico iniciado em Nova York logo após a 2ª Guerra Mundial, noção utilizada pela primeira vez em 1952 pelo crítico H. Rosenberg, constituindo-se essa tendência, desde então, como o estilo pictórico norte-americano. No expressionismo abstrato a ausência de modelos, a idéia de espontaneidade relacionada ao trabalho artístico e a gestualidade do artista, decompondo a realidade, consolida a identificação temática como um retorno às origens, buscando forças elementares e emoções primárias.
  • 13. 12 Ao optar pelo pensamento primitivo - visto como alternativa à racionalidade acadêmica - recupera as heranças arcaicas e a compreensão da natureza como um manancial de forças, instintos e transformações (rupturas). Fig, 19 (a) Fig. 20 (b) (a) Ad Reinhardt (1913-1967)”Colagem” 1940. Papel impresso colado s/painel, (39 x 33 cm) (b) Mark Rothko (1903-1970)“Sem título” 1949(Violet, Black, Orange, Yellow on White and Red) Óleo s/tela, (207 x 168 cm) Artistas do porte de Arshille Gorki, Ad Reihardt, Adolf Gotlieb, Mark Rohtko, Jacson Pollock, Willem De Kooning e Wassily Kandinski entre outros, confirmam o expressionismo abstrato como um movimento que ganhou este nome porque combina a intensidade emocional do expressionismo alemão com a estética das escolas européias, como o futurismo, a Bauhaus e o cubismo. Ao incorporar o emprego de uma palheta agressiva e vibrante (fauvista), o expressionismo abstrato redescobre as configurações geométricas, atribuindo velocidade à captação intuitiva dos motivos aleatórios, com espessas e rústicas camadas de pigmentos sobrepostos, seja por volume de tinta ou por pedaços de materiais aplicados, uns sobre os outros, na superfície do suporte.
  • 14. 13 O modo de pintar americano elegeu como suporte a parede e o chão, permitindo que o artista tivesse estabilidade e acessibilidade ao suporte para trabalhar por todo o seu perímetro; passando a trabalhar dentro (fisicamente) da obra e extraindo obras-primas como se constata nas imagens das obras aqui selecionadas dos expoentes do expressionismo abstrato.(Figs.19 a 24) Fig. 21 (a) Fig. 22 (b) (a) Adolf Gotlieb (1903-1974), “ Mist”, 1961. Óleo s/tela, (182.9 x 121.9 cm). (b) Willem de Kooning (1904-1997),”Composição”1955. Óleo temp e carvão s/tela, (201x175 cm). Fig. 23 (a) Fig. 24 (b) (a) Vassili Kandinsky (1866-1944),“Cruz Branca” 1922. Óleo s/tela, (100 x 110 cm) (b) Jackson Pollock (1912-1956), “Circuncisão” 1946. Óleo s/tela, (142 x 168) Vale citar Fernand Leger (1881-1955), pioneiro na referência do elemento mecânico como possibilidade plástica, pontuando a respeito em “Funções da Pintura”: O elemento mecânico, como todo o resto, é apenas um meio, não um fim.Mas, se quisermos fazer uma obra forte, firme, com intensidade plástica, se quisermos fazer uma obra orgânica, se quisermos criar e obter a equivalência do “objeto belo” que a indústria às vezes produz, é tentador nos servirmos desses materiais como matéria-prima.(LEGER, 1989, p.49).
  • 15. 14 Os objetos transformados em “não-objetos”, que é o caso das latas (embalagens) descartadas, se regenerariam como “novos objetos”, paradigmáticos das transformações observadas na natureza, como, por exemplo, os diamantes: produtos da regeneração de outros minerais. A confirmação desta pesquisa como linguagem passa por Marcel Duchamp e seus ready made; uma tentativa de escapar, segundo Duchamp, da "arte retiniana", confrontando o espectador, oferecendo-lhes algo já visto, forçando-o a pensar e refletir sobre a questão da arte enquanto linguagem; como pontua Ricardo N. Fabbrini in “A arte depois das vanguardas”, afirmando como segue: [...] Depois que as vanguardas conceituais alargaram de modo definitivo o campo da experiência artística, não podemos mais, com base na percepção sensível, distinguir um simples objeto de uma obra de arte. Um mictório e a Fonte de Duchamp, uma roda encravada num banco e fase da interrogação sobre a “essência da obra de arte” encerrou- se de modo que a arte conceitual, ou seja, a reflexão sobre o quadro institucional do “mundo da arte”, é aceita por críticos e boa parte do público tanto quanto a arte retiniana baseada num suporte material, como a tela, e num “médium artístico”, como a tinta, ambas constitutivas da arte atual, sua Roda de bicicleta histórica , são “ réplicas indiscerníveis” que possuem “fundamentos ontológicos diversos”.(FABRINI 2002, p.145) A arte de Marcel Duchamp, que se opunha aquilo que ele próprio dizia ser a "arte retiniana", ou seja, uma arte que agrada à vista; entendendo-se toda a arte de Duchamp como um esforço para se afastar da "arte retiniana" e passar para uma arte mais reflexiva contextualizada nos aspectos mais intelectuais do fazer artístico, como testemunham as imagens das suas obras (Figs. 25e 26) Fig. 25 (a) – Marcel Duchamp (1887-1968) Fig. 26 (b) – R. Mutt (pseudônimo)” (a) “Roda de Bicicleta” 1913 - (h 124cm) (b) “Fonte” 1917 – (h 60 cm)
  • 16. 15 A pesquisa que resultou neste trabalho foi estimulada pela obra do escultor David Smith (1906-1965):“um cânon de formas e gosto tomadas despudoradamente de Gonzalez, Picasso, Matisse e Miró, que agrada por não ofender os olhos que aprenderam a gostar da arte cubista.” revelando “o aspecto autêntico e preciso do cubismo que o artista desenvolveu sozinho a partir das próprias necessidades” afirma Clement Greenberg, crítico e historiador especialista na obra de David Smith que inspirou a direção que esta pesquisa deveria tomar (Figs. 27, 28 e 29). Fig.27 (a) Fig.28 (b) Fig.29 (c) (a) David Smith “CUBI VI” 1963 (b) J. Gonzalez (1876-1942) (c) David Smith (1906-1965) “CUBI VI 1963” “Monsieur Cactus”1939 “CUBI XXVII”1965 As peças executadas em chapas de aço inoxidável ou de ferro, soldadas, apresentam-se como um utensílio artístico fabricado e visualmente disciplinado, Por outro lado os objetos acabados (latas) dialoga espacialmente com as peças concebidas em aço inoxidável pelo artista (David Smith) que emula este trabalho. Fig. 30 – Ensaio E - 2010 Fig. 31 - Ensaio F - 2011 Fig. 32 - Ensaio G – 2011
  • 17. 16 Esta pesquisa busca justificar a utilização de um tipo de suporte para o registro expressivo, sob a forma de assemblage, na concepção de diálogos visuais próprios da escultura, no que diz respeito às penetrações dos interiores e a aura dos volumes superficiais daqueles objetos, como são mostrados nas imagens (Figs.30, 31 e 32) composições ensaiadas para esta demonstração. O suporte e a sua natureza – material industrializado, metálico, recuperado – estão aqui introduzidos como protagonistas principais por oferecerem conteúdos práticos (pronto para o manuseio) e reflexivos como autênticos veículos da verdadeira finalidade expressiva da obra; sem, entretanto, diminuir a sua importância funcional e estética no desempenho plástico da obra. A busca da autêntica expressividade que move este trabalho desenvolve e testa arranjos possíveis na utilização de todos os planos e volumes, visíveis ou sugeridos no suporte, oferecidos pelas superfícies internas e externas das latas, que oferecem composições visuais estimulantes, factíveis em um conjunto de volumetria escultórica visualmente harmonioso e espacialmente equilibrado, compartilhando olhar e espírito, uma fruição dinâmica, instigante e reveladora. (Fig. 33) Em sua tese de mestrado Tatiana Sampaio Ferraz ( CAP/ECA –USP /1986), identificando práticas artísticas contemporâneas fundamentadas na experiência do deslocamento; esclarecendo que deslocamento designa ao mesmo tempo, além do significado original (espacialidade ou temporalidade), “proposições que inauguram um fazer artístico para além daqueles conhecidos nos domínios institucionais da arte”. Nesse mesmo texto a autora enxerga: “O caráter experimental desses trabalhos apontam para o estiramento do “objeto de arte” estabelecidos a partir de novos contornos quanto à sua formalização (“suportes”) e ou a sua atuação (“lugares da arte”)”. Fig.33 - Ensaio ( Detalhe de um conjunto ) 2011
  • 18. 17 CAPITULO 2 SUPORTES SELETIVOS O objeto aqui proposto como suporte contém as expressividades físicas e abstratas veiculadas pelo assemblage. O objeto físico é tangível na volumetria unitária dos componentes de cada conjunto; entretanto, não foi concebido para ser manipulado, no que diz respeito à sua configuração plástica, quando exposto em conjunto de duas, oito, ou seus múltiplos pares, como nos ensaios das Figs. 34 e 35. Fig.34 - Ensaio H – 2011 Fig.35 - Ensaio I - 2011 Quando desmontado cada assemblage poderá ser reconfigurado, ou não, mediante a combinação pictórica que agrade ao proprietário da peça, na fruição dos grafismos resultantes da combinação das superfícies interna e externa, obtida pela expressividade das quatro faces de cada unidade (lata) componente do conjunto.
  • 19. 18 Ao proceder a pintura sobre o suporte metálico (Fig. 36), verificou-se que a utilização das tintas, similares àquelas embaladas nas latas em sua função original, seccionava conceitualmente a relação suporte/conteúdo, que consubstancia este trabalho, pela inexistência da condição de “sucata de tinta”. Fig. 36 - Jayme Bispon, “Pensadora” 2010 Fig. 37 - Ensaio k (Detalhe Conjunto) (Esmalte s/folha de flandres usada- 94x35cm) A existência residual da película para adesivagem de cores nos acabamentos e sinalizações de objetos utilitários, ajustou-se adequadamente às finalidades picturais complementando o assemblage, quanto ao conceito material da proposta. (Fig.37). A utilização desse material, perfeitamente ajustado à linguagem intuída, permitiu somarem-se ganhos quanto à sustentabilidade, concluindo às finalidades conceituais do assemblage.
  • 20. 19 CAPITULO 3 SUCATA SUADA Cumpre registrar nesta monografia o percurso cronológico para a obtenção das latas e material pictórico complementar: 1) procura de latas descartadas nas caçambas posicionadas nos logradouros públicos, 2) localização de obras da construção civil em fase de acabamento, 3) entrevista com os encarregados das obras para obter a autorização da coleta, 4) encomenda das latas se as mesmas ainda não estiverem à disposição, 5) localização e coleta do material dentro do canteiro, 6) disputas pela posse do material com catadores de sucata desvinculados à entidades, 7) recolhimento de unidades abandonadas em logradouros públicos. A procura, localização e coleta do material consumiram de 10 a 12 meses ininterruptos, na visitação a obras, procura por responsáveis pela liberação do material, remoção e separação de resíduos de toda natureza em caçambas para recolher as latas onde estivessem disponíveis. Fig 37 – Vista do local de armazenagem das latas. Na parte inferior vê-se o material como foi recolhido; na parte superior latas já preparadas para a fase de finalização. Obtidas as latas no estado em que se encontravam, e logo armazenadas em local protegido de intempéries (Fig. 37), iniciam-se os procedimentos de limpeza e preparação: Localizadas e recolhidas, cada lata teve todos os resíduos, de tinta ou rotulagem removida a fogo; posteriormente lixados, rebitados e lavados em jornadas que duravam em média 2 horas para cada peça.
  • 21. 20 Nas extremidades perimetrais de cada peça (lata) foram executados 8 furos destinados aos encadeamentos das peças entre si e sustentação das mesmas em arranjos de suspensos e afins. Para a ancoragem das composições foram desenvolvidas sapatas de concreto armado dimensionadas em 23,5x23,5x5cm para o encaixe das latas no lastreamento (Fig. 38). Fig.38 – Ensaio j – 2011 Fig. 39 – Ensaio k - 2011 O outro item que compõe a linguagem plástica deste trabalho é o tratamento pictórico do objeto receptor (a lata); para essa finalidade foi utilizada sucata (retalhos) de película adesiva colorida de PVC (tinta em estado sólido impressa em filme), fonte de cor (Pantone) para comunicação visual, sinalização e envelopamento (aplicação da película sobre a pintura original de automóveis e eletrodomésticos), coerentemente com os parâmetros da obra aqui relatada, esse produto vem a ser a evolução natural da tecnologia e da indústria para o uso controlado da tinta, além de produzir uma sucata perfeitamente ajustada ao conceito aqui desenvolvido (Fig. 39). Fig. 40 – Jayme Bispon, “Platéia” 2010 (Latas de cerveja e tampas de latas em grade de ferro, 160 x 100cm)
  • 22. 21 As embalagens de alumínio, por outro lado, acrescentam o movimento às linguagens devido ao peso; quanto ao volume do conjunto atendem a contextualizações visuais figurativas de grande impacto conforme experimentações logísticas e pictóricas (Fig. 40). Outros itens provenientes do mesmo tipo de material permitem um tratamento plástico onde se aplicam linguagens que requerem apurados acabamentos de superfície devido a conformação desses suportes, combinados com incidências luminosas, possibilitando efeitos inusitados (Fig. 41) Fig. 41 Jayme Bispon, “Reticulado” 2010 (Tampinhas de garrafa s/painel de madeira 90x60cm) Entendendo que a utilidade do objeto produzido a partir dos recursos naturais não cessa após atender às demandas para as quais foi concebido, Herschell B. Chipp em Teorias da arte moderna (SP :1988), pontua: “ A arte deverá passar pela tecnologia porque esta contém aquela, reaproveitando o que foi utilizado enquanto meios materiais.”
  • 23. 22 CONCLUSÃO A conclusão desta monografia/relatório é uma reflexão/inventário sobre a elaboração de uma linguagem – o assemblage – definida como a justaposição de vários materiais recorrentes a um processo pictórico expressionista abstrato. O crítico e historiador da arte Clement Greenberg, em Arte e cultura / Ensaios críticos ( 2001), reflete: “A arte é uma questão estritamente de experiência, não de princípios, e o que conta na arte em primeiro e último lugar, é a qualidade: todas as outras coisas são secundárias” e aponta , estendendo as suas observações até o artista que emulou este trabalho: [...] A pretensão artística é geralmente o sintoma de um medo de que a obra de arte não exiba suficientemente sua identidade enquanto arte e seja confundida como um objeto utilitário ou puramente arbitrário. (...) As exceções entre os artistas são precisamente aquelas que constituem as poucas exceções à decepção geral que a escultura modernista tem sido na última década. A mais notável delas é David Smith que não hesito em chamar de o melhor escultor de sua geração (GREENBERG, 2001, p.210). Este trabalho, entretanto, limita-se à utilização de apenas dois materiais, ou objetos, denominados sucatas, conduzindo a pesquisa quanto a formatação das peças (número de latas utilizadas, encadeamento das peças entre si e modos de exibição). O resultado plástico obtido pela abrasão das superfícies das latas e a aplicação da película auto-adesiva, na obtenção do tratamento cromático/pictórico utilizando-se cores prontas (Pantone) patenteadas, posiciona a obra em um patamar exclusivo que será explorado a partir deste trabalho.
  • 24. 23 Formulando uma equação da natureza, verificamos que aonde prolifera o excesso, ocorre o controle. No caso dos ratos e gatos, esses, predadores, ao se alimentarem daqueles, garantem a própria sobrevivência e equilibram a oferta dos outros recursos naturais para o bioma. Este trabalho utiliza o paradigma da natureza como referência temática para estruturar a proposta de valorização dos suportes artísticos, mediante o aproveitamento das embalagens metálicas descartadas destinadas à reciclagem, ou não, elaborando montagens escultóricas ou desenvolvendo linguagens picturais sugeridas a partir dessas montagens, obtidas pela combinação dos formatos e volumes do material recolhido, transformando-as definitivamente em outros objetos. Essas latas e seus componentes, definitivamente recuperados das estatísticas da poluição, são repensados para o usufruto da expressividade visual.
  • 25. 24 BIBLIOGRAFIA ALBERS, Josef. La interacion del color. 3ª ed. Madrid: Alianza Editorial, 1982 ARCHER, Michael. Arte contemporânea: uma história concisa. São Paulo, Martins Fontes, 2001. ARGAN, Giulio Carlo. Arte Moderna. 2ª ed. São Paulo, Cia da Letras, 1993. ARNHEIM, Rudolf. Arte & Percepção Visual. São Paulo, Pioneira Editora, 1996. BACHELARD, Gaston. A poética do espaço. São Paulo, Martins Fontes, 1989. BRILL, Alice. Da arte e da linguagem. São Paulo, Perspectiva Editora, 1988. CHIPP, Herschell Browning. Teorias da arte moderna. 2ªed. São Paulo, Martins Fontes, 1996. CAUQUELIN, Anne. Arte Contemporânea: uma introdução. São Paulo, Martins Fontes, 2005 DANTO, Arthur C. – A Transfiguração do Lugar-Comum São Paulo : CosacNaify, 2005 EHRENZWEIG, Anton. A ordem oculta da arte. Rio de Janeiro, Zahar, 1977. FABBRINI, Ricardo Nascimento. A arte depois das vanguardas. Campinas, Ed.UNICAMP, 2002. FERRAZ, Tatiana Sampaio.Trabalhos de escala ambiental: da escultura moderna a situações contemporâneas. (Dissertação de mestrado), São Paulo, ECA USP, 1986. GREENBERG Clement. Arte e Cultura; Ensaios Críticos, São Paulo, Editora Ática, 2001. KANDINSKY, Vassily. Do espiritual na arte. São Paulo, Martins Fontes, 1996. KRAUSS, Rosalind. Caminhos da escultura moderna. São Paulo, Martins Fontes, 1998. LANGER, Susanne. Sentimento e Forma. São Paulo, Editora Perspectiva , 1980. LEGER, Fernand. Funções da pintura, SP: Nobel, 1989. SUBIRATS, Eduardo. Da vanguarda ao pós-moderno. 4ª ed. São Paulo: Nobel, 1991.