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agosto de 20 08 • Ciência Hoje • 57
opinião
O lançamento de um novo
medicamento às vezes
provoca grande interesse
da população, gerando intensa
procura e atraindo a atenção
dos meios de comunicação
de massa. As pessoas,
em muitos casos, desconhecem
possíveis efeitos colaterais,
presentes em praticamente
todos os fármacos.
Isso parece ocorrer com
o mais novo remédio para
emagrecer, o rimonabant.
Conhecer a lógica por trás
dos efeitos colaterais desse
composto, que age sobre
os mesmos receptores
cerebrais em que atua
a maconha, pode ajudar
a evitar conseqüências
mais sérias.
Magrinho, mas triste
Fabrício Pamplona
Laboratório de Psicofarmacologia (doutorando), Departamento de Farmacologia,
Universidade Federal de Santa Catarina,
e Instituto Max Planck de Psiquiatria (Munique, Alemanha)
Um questionamento sempre
veio à tona desde que come-
cei a apresentar publicamente
meus estudos em psicofarmacolo-
gia de canabinóides: “Como resul-
tados em animais podem se tra-
duzir em algo significativo para os
seres humanos?” Nada mais apro-
priado. Além da desgastada justi-
ficativa de que modelos animais
permitem compreender a estrutu-
ra e dinâmica biológica de um
organismo vivo, o uso de animais
de laboratório com a finalidade de
desenvolver novos medicamentos
me parece essencial.
Os canabinóides são um gru­-
po de compostos químicos mais
conhecidos por sua presença na
maconha – nome popular da plan-
ta Cannabis sativa. Quando al-
guém fuma maconha, esses com-
postos ligam-se a receptores mo-
leculares localizados na superfí­-
cie dos neurônios (identificados
pela sigla CB1
), o que reduz a
trans­missão de sinais entre as cé-
lulas cerebrais e provoca diver­­-
sos efeitos físicos e psíquicos,
en­tre eles o aumento do apetite.
Esse efeito estimulou a busca de
substâncias que atuassem de for-
ma contrária, visando combater a
obesidade.
O recente lançamento, no Bra-
sil, do primeiro medicamento – o
rimonabant (de nome comercial
Acomplia) – capaz de bloquear os
receptores CB1
levou-me a anali-
sar os estudos clínicos que emba-
saram sua aprovação em mais de
20 países. O objetivo foi tentar
traçar um paralelo entre os resul-
tados que nosso grupo de pesqui-
sa e outros, dentro e fora do Brasil,
têm obtido em estudos pré-clíni-
cos em animais de laboratório, de
um lado, e os efeitos psicológicos/
comportamentais relatados por
pacientes que usam a substância,
de outro. O composto, batizado
com base no nome de um dos pes-
quisadores que o sintetizou (Ri-
naldi-Carmona), começou a ser
vendido no Brasil cerca de 14 anos
após a primeira descrição de seu
mecanismo de ação (em 1994).
Atentação é grande, mas, farmaco­
logicamente falando, não é corre-
to dizer que o rimonabant pro-
voca efeitos opostos aos da ma­
conha. Primeiro, porque a maco-
nha é uma planta que, além do
principal canabinóide psicoativo
(delta-9-tetrahidrocanabinol, ou
delta-9-THC), tem cerca de outros
60 com­postos com ação canabi-
nóide, sem falar de outros tipos de
moléculas capazes de interferir
em processos orgânicos. Segun­do,
porque fármacos como o rimo­
nabant bloqueiam os receptores
canabinóides, impedindo a ação
de substâncias produzidas pelo
próprio organismo para, quando
necessário, interagir com esses
receptores. A grande diferença
entre essas substâncias orgânicas
(chamadas de endocanabinóides)
e a maconha está em que as pri-
meiras agem apenas ‘quando e 
opinião
58 • Ciência Hoje • vol. 42 • nº 251
O novo fármaco de fato provoca um quadro de
sintomas semelhantes à ansiedade e à depressão
em camundongos e ratos, principalmente
se testados em situações estressantes
onde’ sua presença é exigida,
enquanto os efeitos da maconha
ocorrem indiscriminadamente,
no cérebro e em outros órgãos e
tecidos.
Sabe-se hoje que o sistema en­­­
docanabinóide está envolvido
em muitas funções do organis-
mo, des­de efeitos periféricos an-
tiinflamatórios e de inibição da
dor até efeitos cerebrais, como
aumento do apetite e manuten-
ção da homeostase cerebral (o
‘equilíbrio’ da ati­vidade dos neu-
rônios). Foi justamente a proprie-
dade do rimonabant de inibir os
mecanismos canabinóides de es-
timulação do apetite que atraiu
cientistas do mundo todo interes-
sados nesse grande filão do mer-
cado farmacêu­tico. Além disso,
o rimonabant exi­be uma grande
vantagem em relação aos outros
medicamentos usados para ema-
grecer, pois parece inibir também
o armazenamento de gordura na
região abdominal e contribuir
para a produção do ‘bom coleste-
rol’ (HDL), o que traz potenciais
benefícios para os sistemas car-
diovascular e hormonal.
Como qualquer medicamento,
porém, o rimonabant não está li-
vre de produzir efeitos colaterais.
Se os receptores em que age estão
envolvidos em diversas funções
fisiológicas, é de se imaginar que
o bloqueio crônico dos mesmos
tenha resultados indesejáveis.
Pesquisadores envolvidos nos es-
tudos clínicos do fármaco verifi-
caram diversos sintomas, e entre
eles os mais preocupantes foram
aumentos na ansiedade e na de-
pressão, muitas vezes acompa-
nhados de irritabilidade e insônia.
É importante lembrar que foram
excluídos do estudo pacientes
com histórico prévio de ansiedade
ou depressão, de modo que o sur-
gimento desses sintomas prova-
velmente indica um efeito farma-
cológico do medicamento, geran-
do um estado psiquiátrico ‘de
doença’ ao invés de um estado ‘de
saúde’. Fato bastante preocupante
foi a expressão, por alguns indiví-
duos, de idéias suicidas, embora
isso tenha ocorrido com parcela
pequena dos que tomaram o rimo-
nabant cronicamente.
Voltando ao objetivo inicial, o
que isso tudo tem a ver com os
testes em animais de laboratório?
Se os testes pré-clínicos têm mes-
mo alguma validade, esses efeitos
‘prejudiciais’ do rimonabant não
deveriam ter sido previamente
detectados?
Sim, e eles foram. Desde seu des-
cobrimento, o rimonabant vem
sendo testado em animais de la-
boratório quanto aos seus efeitos
neuropsiquiátricos. O que se sabe
há bastante tempo é que – apesar
dos receios dos pesquisadores em
‘traduzir’ esses resultados como
possíveis sintomas em humanos
– o novo fármaco de fato provoca
um quadro de sintomas semelhan-
tes à ansiedade e à depressão em
camundongos e ratos, principal-
mente se testados em situações
estressantes.
Uma breve explicação sobre os
testes pode facilitar a compreensão
do leitor. Em laboratório, a prin-
cipal forma de avaliar a ansiedade
são testes que geram situações de
conflito, nas quais o animal pre-
cisa ‘decidir’ entre se arriscar e
explorar um ambiente desconhe-
cido ou ficar escondido no am-
biente protegido e seguro. Já a
depressão é comumente avaliada
com testes que verificam a von­tade
do animal de sobreviver diante de
um desafio natural. Animais an-
siosos e/ou depressivos têm um
comportamento mais passivo, ten-
dendo a procurar lugares protegi-
dos (ansiosos) e a não lutar por
sua sobrevivência (depressivos).
A administração do rimonabant
provoca estados de ansiedade e
depressão nos animais quando o
teste envolve uma situação estres-
sante. Nos testes de ansieda­de, por
exemplo, o estresse pode ser gera-
do pelo aumento da iluminação
do ambiente, que é desagradável
para os roedores. Essa modificação
amplia o efeito ansiogênico do
bloqueio de receptores canabi­
nóides. Isso ocorre porque o sis-
tema endocanabinóide foi ‘molda-
do’ ao longo da evolução para
proteger o organismo, controlando
a reação aos efeitos do estresse.
Como tudo na vida, o que co-
mumente chamamos de estresse
tem seu lado bom e seu lado ruim.
Baixos níveis de estresse são sau-
dáveis e nos deixam alertas para
realizar tarefas importantes e que
exigem nossa atenção. Níveis al-
tos, porém, geram uma situação
de grave abalo psicológico. Apa-
rentemente, o sistema endocana-
binóide só é ativado se os níveis
do fator estressor forem muito al-
tos ou contínuos, protegendo as-
sim o indivíduo contra os efeitos
danosos do estresse.
Nosso grupo também tem estu-
dado a participação do sistema
endocanabinóide na flexibilidade
comportamental – a capacidade
dos indivíduos de, diante de uma
alteração no ambiente, se adaptar
à nova situação e se comportar de
maneira diferente da habitual. Em
linguagem científica, esse proces-
opinião
agosto de 20 08 • CiênCia Hoje • 59
so é chamado de extinção da me-
mória e tem relação direta com a
adaptação ao estresse. Um exem-
plo simples é o de uma pessoa que
retorna do trabalho ou da escola
pelo mesmo caminho, todos os
dias, mas em certa ocasião um
engarrafamento no trânsito o obri-
ga a mudar o trajeto. Estudos re-
velaram que os receptores canabi-
nóides são fundamentais nessa
mudança de estratégia comporta-
mental: o desempenho de tarefas
desse tipo é grandemente prejudi-
cado em animais de laboratório
nos quais esses receptores estão
ausentes (por modificação genéti-
ca) ou bloqueados (por fármacos).
Por outro lado, a ativação dos re-
ceptores canabinóides por subs-
tâncias externas ao organismo (o
delta-9-THC da maconha, por
exemplo) favorece a flexibilidade
comportamental, que em outras
palavras pode ser considerada um
processo de reaprendizagem.
Vivendo em uma sociedade di-
nâmica, com o mundo mudando
a todo momento, estamos sujei-
tos a grandes desconfortos decor-
rentes das pressões cotidianas, o
que exige adaptação contínua a
esse ritmo – ou seja, um reapren-
dizado constante. Brincando, cos-
tumo dizer que a falta de flexibi-
lidade comportamental faz com
que a pessoa fique ‘teimosa’, mas
poderia seriamente supor que,
com o passar do tempo, uma subs-
tância que limite essa flexibilida-
de provocará maior intolerância
ou mesmo um sentimento de in-
compatibilidade com o mundo.
Hipoteticamente, poderiam surgir
daí respostas emocionais exage-
radas, como as idéias suicidas já
comentadas.
Existem diversos fatores que,
combinados, contribuem para que
um bloqueador dos receptores ca-
nabinóides induza um desequilí-
brio emocional em um indivíduo.
Podemos, no entanto, avaliar a
relação custo/benefício em um
tratamento como esse. O próprio
fabricante não recomenda o uso
do rimonabant por quem deseja
apenas “perder uns quilinhos para
o verão” ou para “aquela festa es-
pecial”. Apesar dos efeitos ad-
versos possíveis, certamente esse
medicamento deve ser visto como
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obesidade patológica, que traz pe-
rigosas conseqüências para a saú-
de. Este alerta serve para conter
um pouco do entusiasmo exage-
rado com que a mídia trata o as-
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cada novidade que surge nas far-
mácias. Serve também como um
exercício para que nós, cientistas,
nos mantenhamos atentos às con-
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em animais, que trazem uma base
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pêutica. A ciência importante se
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
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Magrinho mas triste ch online - Fabricio Pamplona

  • 1. agosto de 20 08 • Ciência Hoje • 57 opinião O lançamento de um novo medicamento às vezes provoca grande interesse da população, gerando intensa procura e atraindo a atenção dos meios de comunicação de massa. As pessoas, em muitos casos, desconhecem possíveis efeitos colaterais, presentes em praticamente todos os fármacos. Isso parece ocorrer com o mais novo remédio para emagrecer, o rimonabant. Conhecer a lógica por trás dos efeitos colaterais desse composto, que age sobre os mesmos receptores cerebrais em que atua a maconha, pode ajudar a evitar conseqüências mais sérias. Magrinho, mas triste Fabrício Pamplona Laboratório de Psicofarmacologia (doutorando), Departamento de Farmacologia, Universidade Federal de Santa Catarina, e Instituto Max Planck de Psiquiatria (Munique, Alemanha) Um questionamento sempre veio à tona desde que come- cei a apresentar publicamente meus estudos em psicofarmacolo- gia de canabinóides: “Como resul- tados em animais podem se tra- duzir em algo significativo para os seres humanos?” Nada mais apro- priado. Além da desgastada justi- ficativa de que modelos animais permitem compreender a estrutu- ra e dinâmica biológica de um organismo vivo, o uso de animais de laboratório com a finalidade de desenvolver novos medicamentos me parece essencial. Os canabinóides são um gru­- po de compostos químicos mais conhecidos por sua presença na maconha – nome popular da plan- ta Cannabis sativa. Quando al- guém fuma maconha, esses com- postos ligam-se a receptores mo- leculares localizados na superfí­- cie dos neurônios (identificados pela sigla CB1 ), o que reduz a trans­missão de sinais entre as cé- lulas cerebrais e provoca diver­­- sos efeitos físicos e psíquicos, en­tre eles o aumento do apetite. Esse efeito estimulou a busca de substâncias que atuassem de for- ma contrária, visando combater a obesidade. O recente lançamento, no Bra- sil, do primeiro medicamento – o rimonabant (de nome comercial Acomplia) – capaz de bloquear os receptores CB1 levou-me a anali- sar os estudos clínicos que emba- saram sua aprovação em mais de 20 países. O objetivo foi tentar traçar um paralelo entre os resul- tados que nosso grupo de pesqui- sa e outros, dentro e fora do Brasil, têm obtido em estudos pré-clíni- cos em animais de laboratório, de um lado, e os efeitos psicológicos/ comportamentais relatados por pacientes que usam a substância, de outro. O composto, batizado com base no nome de um dos pes- quisadores que o sintetizou (Ri- naldi-Carmona), começou a ser vendido no Brasil cerca de 14 anos após a primeira descrição de seu mecanismo de ação (em 1994). Atentação é grande, mas, farmaco­ logicamente falando, não é corre- to dizer que o rimonabant pro- voca efeitos opostos aos da ma­ conha. Primeiro, porque a maco- nha é uma planta que, além do principal canabinóide psicoativo (delta-9-tetrahidrocanabinol, ou delta-9-THC), tem cerca de outros 60 com­postos com ação canabi- nóide, sem falar de outros tipos de moléculas capazes de interferir em processos orgânicos. Segun­do, porque fármacos como o rimo­ nabant bloqueiam os receptores canabinóides, impedindo a ação de substâncias produzidas pelo próprio organismo para, quando necessário, interagir com esses receptores. A grande diferença entre essas substâncias orgânicas (chamadas de endocanabinóides) e a maconha está em que as pri- meiras agem apenas ‘quando e 
  • 2. opinião 58 • Ciência Hoje • vol. 42 • nº 251 O novo fármaco de fato provoca um quadro de sintomas semelhantes à ansiedade e à depressão em camundongos e ratos, principalmente se testados em situações estressantes onde’ sua presença é exigida, enquanto os efeitos da maconha ocorrem indiscriminadamente, no cérebro e em outros órgãos e tecidos. Sabe-se hoje que o sistema en­­­ docanabinóide está envolvido em muitas funções do organis- mo, des­de efeitos periféricos an- tiinflamatórios e de inibição da dor até efeitos cerebrais, como aumento do apetite e manuten- ção da homeostase cerebral (o ‘equilíbrio’ da ati­vidade dos neu- rônios). Foi justamente a proprie- dade do rimonabant de inibir os mecanismos canabinóides de es- timulação do apetite que atraiu cientistas do mundo todo interes- sados nesse grande filão do mer- cado farmacêu­tico. Além disso, o rimonabant exi­be uma grande vantagem em relação aos outros medicamentos usados para ema- grecer, pois parece inibir também o armazenamento de gordura na região abdominal e contribuir para a produção do ‘bom coleste- rol’ (HDL), o que traz potenciais benefícios para os sistemas car- diovascular e hormonal. Como qualquer medicamento, porém, o rimonabant não está li- vre de produzir efeitos colaterais. Se os receptores em que age estão envolvidos em diversas funções fisiológicas, é de se imaginar que o bloqueio crônico dos mesmos tenha resultados indesejáveis. Pesquisadores envolvidos nos es- tudos clínicos do fármaco verifi- caram diversos sintomas, e entre eles os mais preocupantes foram aumentos na ansiedade e na de- pressão, muitas vezes acompa- nhados de irritabilidade e insônia. É importante lembrar que foram excluídos do estudo pacientes com histórico prévio de ansiedade ou depressão, de modo que o sur- gimento desses sintomas prova- velmente indica um efeito farma- cológico do medicamento, geran- do um estado psiquiátrico ‘de doença’ ao invés de um estado ‘de saúde’. Fato bastante preocupante foi a expressão, por alguns indiví- duos, de idéias suicidas, embora isso tenha ocorrido com parcela pequena dos que tomaram o rimo- nabant cronicamente. Voltando ao objetivo inicial, o que isso tudo tem a ver com os testes em animais de laboratório? Se os testes pré-clínicos têm mes- mo alguma validade, esses efeitos ‘prejudiciais’ do rimonabant não deveriam ter sido previamente detectados? Sim, e eles foram. Desde seu des- cobrimento, o rimonabant vem sendo testado em animais de la- boratório quanto aos seus efeitos neuropsiquiátricos. O que se sabe há bastante tempo é que – apesar dos receios dos pesquisadores em ‘traduzir’ esses resultados como possíveis sintomas em humanos – o novo fármaco de fato provoca um quadro de sintomas semelhan- tes à ansiedade e à depressão em camundongos e ratos, principal- mente se testados em situações estressantes. Uma breve explicação sobre os testes pode facilitar a compreensão do leitor. Em laboratório, a prin- cipal forma de avaliar a ansiedade são testes que geram situações de conflito, nas quais o animal pre- cisa ‘decidir’ entre se arriscar e explorar um ambiente desconhe- cido ou ficar escondido no am- biente protegido e seguro. Já a depressão é comumente avaliada com testes que verificam a von­tade do animal de sobreviver diante de um desafio natural. Animais an- siosos e/ou depressivos têm um comportamento mais passivo, ten- dendo a procurar lugares protegi- dos (ansiosos) e a não lutar por sua sobrevivência (depressivos). A administração do rimonabant provoca estados de ansiedade e depressão nos animais quando o teste envolve uma situação estres- sante. Nos testes de ansieda­de, por exemplo, o estresse pode ser gera- do pelo aumento da iluminação do ambiente, que é desagradável para os roedores. Essa modificação amplia o efeito ansiogênico do bloqueio de receptores canabi­ nóides. Isso ocorre porque o sis- tema endocanabinóide foi ‘molda- do’ ao longo da evolução para proteger o organismo, controlando a reação aos efeitos do estresse. Como tudo na vida, o que co- mumente chamamos de estresse tem seu lado bom e seu lado ruim. Baixos níveis de estresse são sau- dáveis e nos deixam alertas para realizar tarefas importantes e que exigem nossa atenção. Níveis al- tos, porém, geram uma situação de grave abalo psicológico. Apa- rentemente, o sistema endocana- binóide só é ativado se os níveis do fator estressor forem muito al- tos ou contínuos, protegendo as- sim o indivíduo contra os efeitos danosos do estresse. Nosso grupo também tem estu- dado a participação do sistema endocanabinóide na flexibilidade comportamental – a capacidade dos indivíduos de, diante de uma alteração no ambiente, se adaptar à nova situação e se comportar de maneira diferente da habitual. Em linguagem científica, esse proces-
  • 3. opinião agosto de 20 08 • CiênCia Hoje • 59 so é chamado de extinção da me- mória e tem relação direta com a adaptação ao estresse. Um exem- plo simples é o de uma pessoa que retorna do trabalho ou da escola pelo mesmo caminho, todos os dias, mas em certa ocasião um engarrafamento no trânsito o obri- ga a mudar o trajeto. Estudos re- velaram que os receptores canabi- nóides são fundamentais nessa mudança de estratégia comporta- mental: o desempenho de tarefas desse tipo é grandemente prejudi- cado em animais de laboratório nos quais esses receptores estão ausentes (por modificação genéti- ca) ou bloqueados (por fármacos). Por outro lado, a ativação dos re- ceptores canabinóides por subs- tâncias externas ao organismo (o delta-9-THC da maconha, por exemplo) favorece a flexibilidade comportamental, que em outras palavras pode ser considerada um processo de reaprendizagem. Vivendo em uma sociedade di- nâmica, com o mundo mudando a todo momento, estamos sujei- tos a grandes desconfortos decor- rentes das pressões cotidianas, o que exige adaptação contínua a esse ritmo – ou seja, um reapren- dizado constante. Brincando, cos- tumo dizer que a falta de flexibi- lidade comportamental faz com que a pessoa fique ‘teimosa’, mas poderia seriamente supor que, com o passar do tempo, uma subs- tância que limite essa flexibilida- de provocará maior intolerância ou mesmo um sentimento de in- compatibilidade com o mundo. Hipoteticamente, poderiam surgir daí respostas emocionais exage- radas, como as idéias suicidas já comentadas. Existem diversos fatores que, combinados, contribuem para que um bloqueador dos receptores ca- nabinóides induza um desequilí- brio emocional em um indivíduo. Podemos, no entanto, avaliar a relação custo/benefício em um tratamento como esse. O próprio fabricante não recomenda o uso do rimonabant por quem deseja apenas “perder uns quilinhos para o verão” ou para “aquela festa es- pecial”. Apesar dos efeitos ad- versos possíveis, certamente esse medicamento deve ser visto como opção terapêutica em condição de obesidade patológica, que traz pe- rigosas conseqüências para a saú- de. Este alerta serve para conter um pouco do entusiasmo exage- rado com que a mídia trata o as- sunto, gerando grande alvoroço e busca a todo custo (e preço) de cada novidade que surge nas far- mácias. Serve também como um exercício para que nós, cientistas, nos mantenhamos atentos às con- seqüências de nossas pesquisas e à grande relevância dos estudos em animais, que trazem uma base mais racional para a prática tera- pêutica. A ciência importante se faz passo a passo, com muito tra- balho e dedicação, mas a recom- pensa é saber que ela pode trazer avanços inimagináveis para a qua- lidade de vida das pessoas. ■  do rimonabant por quem deseja apenas “perder uns quilinhos para PEÇA JÁ SEU EXEMPLAR SAIBA NESTE LIVRO COMO A FÍSICA MUDOU A SUA VIDA LIGUE 0800 727 8999 OU VISITE www.cienciahoje.org.br USINAS NUCLEARES, IMAGENS DE TOMOGRAFIA, CIRURGIAS A LASER, TELAS DE CRISTAL LÍQUIDO...