Este documento apresenta um livro sobre construções sustentáveis contendo artigos publicados em uma revista no período de dezembro de 2008 a julho de 2009. O livro inclui informações sobre as autoras, direitos autorais, sumário dos artigos, biografias dos autores e equipe de produção.
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Esse livro contém os artigos publicados na Revista Obras
Online no período de dezembro de 2008 a julho de 2009.
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VERSÃO DEMONSTRATIVA
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Quem somos
Sustentabilidade e Construção Civil
Arquitetura Essencial
Águas e áreas verdes
Edifícios Enfermos e Qualidade de Vida
Certificações: transição para uma nova zona de conforto
O Sol e o redesign das cidades
SustenRentabilidade
O 4º Tripé da Sustentabilidade – 1ª Parte
O 4º tripé da sustentabilidade – 2ª parte
Pag 5
Pag 6
Pag 9
Pag 11
Pag 14
Pag 16
Pag 18
Pag 20
Pag 22
Pag 24
Indice
4. Página 4
Os atuais problemas urbanos são o resultado
De um design e de um estilo de vida do passado.
O que nós estamos projetando agora?
O futuro ainda não é, ele pode vir a ser
O que nos estamos sonhando agora?
Mais do que construir, morar, trabalhar,
Deslocar de forma diferente,
Precisamos ocupar o planeta de forma diferente
Precisamos de um outro tipo de mente
Precisamos de um projeto diferente
Projeto e design estão na mente
O design atual
Está na arte de projetar
Na era das Redes
A mente dá forma
A mente projeta e ocupa os espaços
Uma mente diferente projeta de forma diferente,
Ocupa espaços, se movimenta
Interage com a natureza, materiais
E formas em um design diferente.
Uma mente diferente enxerga
Relações visíveis e invisíveis
Que estão entre e nas
Partículas
Espaços
Formas
Materiais
Pessoas.
Uma mente diferente
Desenha para a vida,
Constrói relações prósperas,
Não se apropria: USUFRUI
De espaços e formas,
Constrói espaços que
Inspiram, motivam, transcendem
Constrói espaços que não degradam o seu entorno
Ergue cidades harmônicas que proporcionam verdadeiramente
Um futuro de infinitas possibilidades na Terra
A mudança da cultura das empresas demanda
Mudança de cultura de profissionais,
Investidores, consumidores: PESSOAS
Alinhamento entre pensar, projetar e comercializar
Dentro de um novo paradigma, um novo conceito
Chamado de sustentabilidade
Que exige um construir sem destruir.
Como? Eis a questão!
Precisamos de parcerias que nos ajudem
A buscar soluções dentro de um
Pensar global e agir local.
Precisamos construir sem destruir
Deborah Munhoz
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Deborah Munhoz, MSc
deborahmunhoz@gmail.com
E-portfólio: www.deborahmunhoz.wordpress.com
Mineira, nascida em Belo Horizonte e com muitas horas de vôo e estrada
pelo Brasil. Palestrante, consultora e coach em Gestão da Qualidade
de Vida & Sustentabilidade * Química e Mestre em Saneamento, Meio
Ambiente e Recursos Hídricos (UFMG). Formada em Permacultura &
Design e Bioconstrução pelo Ecocentro IPEC. Trabalhou como técnica da
Gerência de Meio Ambiente da FIEMG onde formou-se como consultora
de Produção Mais Limpa pelo CNTL/SENAI/RS. Coordenou o projeto de
cooperaçãoBrasil-AlemanhaHorizonte21quevisouainserçãodaeducação
ambiental na educação profissional do SENAI. Atuou como consultora do
Núcleo de P+L de Minas Gerais e trabalhou na construção da Agenda
21 Brasileira como representante do segmento empresarial. Professora do
MBA do IETEC em Belo Horizonte* Foi bolsista da embaixada dos Países
Baixos no curso de Ecologia do Carbono do IEB, a partir do qual passou a
se interessar pela redução à vulnerabilidade das populações às mudanças
climáticas. Busca aplicar o conhecimento adquirido ao longo de sua
experiência profissional no desenvolvimento de novos profissionais de
engenharia e arquitetura para o século XXI visando a sustentabilidade das
cidades. Articulista da Revista Obras Online. Criadora da comunidade:
cidadesustentavel.ning.com. Integra o movimento Nossa BH. Apoia a ONG
4 Cantos do Mundo e a AIESEC BH – maior rede de lideranças jovens do
mundo fundada após a 2ª Guerra Mundial para promover a colaboração
entre diferentes nações e promover a cultura de paz.
Fernanda Coelho
fernandafmcoelho@gmail.com
Mineira, nascida em Belo Horizonte, com muitas horas de vôo pelo exterior.
Arquiteta e Urbanista formada pelo Izabela Hendrix. Especialista em Conforto
e Edificações Sustentáveis e em Engenharia Ambiental Integrada. Trabalha
como gerente de projetos da WSDG Brasil – empresa referência mundial em
acústica arquitetônica. Idealizadora do WSDG GREEN – proposta de implantar
os conceitos de sustentabilidade dentro da acústica, buscando materiais menos
agressivos a natureza e a saúde. Colabora com os projetos sociais da WSDG
Brasil desenvolvidos junto ao Centro Cultural “A Fábrica”, na Lagoinha, Zona
Noroeste de Belo Horizonte Possui participações em projetos em Angola, México
e Estados Unidos. Busca aplicar o conhecimento adquirido ao longo de sua
extensa formação na área de Arquitetura Bioclimática, Permacultura (IPEC),
Arquitetura de Terra, Tintas Ecológicas (IDHEA), às práticas de arquitetura e
urbanismo. Articulista da Revista Obras Online.
Gabriel de Almeida – gabrielhenriqueap@gmail.com
Guilherme Caldas – gcveloso@gmail.com
Lucas Thomé – lucasrethome@gmail.com
Ilustração e Editoração
Mineiros, nascidos em Belo Horizonte. Gabriel, graduado em Publicidade e
Propaganda e pós-graduando em MBA em Gestão Estratégica de Marketing;
Guilherme, estudante de Design Gráfico; e Lucas, graduado em Publicidade e
Propaganda.
Todos eles são membros na AIESEC em Belo Horizonte, a maior organização
jovem do mundo, presente em mais de 100 países, e que promove a descoberta e o
desenvolvimento do potencial de liderança de seus membros para que impactem
positivamente na sociedade. A AIESEC possibilita aos jovens uma experiência
integrada que desenvolve competências pessoais e profissionais a partir do
trabalho na organização, da vivência internacional, troca de conhecimentos,
valorização da diversidade e gestão de equipes.
Devido à experiência adquirida na AIESEC, Gabriel, Guilherme e Lucas estão em
processo de desenvolvimento da TBL Comunicação Sustentável, uma agência de
comunicação mais responsável, social e ambientalmente.
Quem somos
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Recentemente, a Câmara da Indústria da Construção em Minas
Gerais lançou o “GUIA DE SUSTENTABILIDADE NA CONSTRUÇÃO”, o
que marcou a entrada do setor na busca por formas mais equilibradas
de empreender. Segundo o Prof. Vanderley M. John, do Depto. de
Engenharia Civil da USP, a Construção Civil consome cerca de 70%
dos recursos naturais extraídos da Terra, sendo uma das atividades
menos sustentáveis do planeta.
Para compreender esse conceito é necessário conhecer as relações estabelecidas em um
ecossistema segundo os chamados princípios ecológicos. A sustentabilidade significa a
capacidade de um ecossistema natural se manter ao longo do tempo. É uma propriedade
que emerge a partir da complexa interação de diversos seres vivos entre si e com o ar, solo,
água e energia, em um planeta de recursos finitos. A cidade é considerada um ecossistema
incompleto e caracterizada por elementos que se relacionam e evoluem conjuntamente
ao longo do tempo, consumindo enormes quantidades de matérias primas e energia dos
demais ecossistemas naturais. Toda edificação de uma cidade faz parte de uma teia, de
um contexto, de uma história. Todo produto usado na sua construção tem um ciclo de
vida específico, relacionado a outros. Uma edificação nunca está só. Ela está impactando
e sendo impactada pelo ambiente social, cultural, econômico e interagindo com as forças
da natureza. Sendo assim, não é possível que uma construção, sozinha, seja sustentável.
SUSTENTABILIDADE
E CONSTRUÇÃO CIVIL
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As edificações de uma época refletem os valores predominantes de sua cultura. O
espaço construído é marcado por relações de interdependência entre diferentes elos de
sua cadeia produtiva distribuídos em diferentes localidades. Nesse contexto, a cultura
de consumidores que priorizam a estética tem grande influência sobre a demanda de
projetos construtivos que não adotam a sustentabilidade como valor essencial. Podemos
citar o uso excessivo do vidro em fachadas, como alternativa estética, desconsiderando
seu mau desempenho como isolante térmico, o que gera altas demandas energéticas
devido ao constante uso de ar condicionado. Alguns profissionais procuram, através
de inovação, resgatar a harmonia entre estética, conforto (térmico, lumínico, acústico,
ergonômico) e as questões climáticas, cada vez mais críticas no ambiente urbano.
Encontram, porém, grande dificuldade na aceitação destes projetos. A ilusão de uma
economia em curto prazo tem maior apelo do que as perdas econômicas e de qualidade
de vida em médio e longo prazo.
Considerando os desafios ambientais deste novo século e ainda os fortes problemas
sociais do Brasil, o país necessita de iniciativas como o BED ZED (Beddington Zero
Energy Development), localizado em Wallignton, ao sul de Londres. O bairro ecológico,
desenvolvido pelo arquiteto Bill Dunster, proporciona um modo de vida sustentável,
sem sacrificar o estilo urbano. A integração das unidades habitacionais com áreas de
trabalho no mesmo empreendimento, a proximidade do transporte público e o clube
de compartilhamento de carros oferece aos residentes a oportunidade de reduzir o
seu uso. Além disso, a adoção de sistemas passivos de climatização e iluminação, a
geração de energia a partir de painéis fotovoltaicos, o tratamento e reaproveitamento
das águas e o desenho em harmonia com o clima e entorno garantem a máxima
eficiência na utilização dos recursos energéticos e materiais. Além disso, combinam
atração e conforto superiores, com custo operacional mais baixo.
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De acordo com o físico Fritoj Capra, a sustentabilidade das comunidades
humanas surge como conseqüência da nossa capacidade de entender
os princípios ecológicos e viver em conformidade com eles. Dentro do
universo da construção civil, implica na adoção de projetos e produtos
arquitetônicos que levem à concepção de cidades sustentáveis. Uma
mudança qualitativa dos novos empreendimentos deve surgir em função
de iniciativas como a “etiquetagem” dos edifícios. O Brasil lançou em 2007
a “Regulamentação para Etiquetagem Voluntária do Nível de Eficiência
Energética de Edifícios Comerciais, de Serviços e Públicos”, uma iniciativa
do Programa Procel EDIFICA em convênio formado com a Eletrobrás.
Atualmente voluntária, passará a ser obrigatória até 2012. Também se
faz estratégica a educação dos compradores (empresas ou pessoas), uma
vez que, através de suas escolhas e preferências, são co-responsáveis pelas
características da construção. Nesse novo cenário, consumidores devem
saber que, conforme sua escolha, sua edificação pode ser um passivo ou
um ativo ambiental.
Imagem: Fernanda Coelho
Instalação temporária na forma de caixões feita por Yoko Ono realizada
em 2005 na Cidade das Artes e das Ciências , em Valência/Espanha. A
exposição foi feita com a intenção de chamar a atenção das pessoas
para o ciclo da vida e de onde nos todos viemos: Terra
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ARQUITETURA
ESSENCIAL
Nada mais confortável do que sentir-se em casa, mas quantas
pessoas hoje podem realmente se sentir bem no ambiente onde
moram? Muitas pessoas buscam a resposta mudando-se para
condomínios residenciais com áreas verdes. A qualidade de vida, no
entanto, envolve muitos outros fatores como a saúde, a interação com
o ambiente, a interação de cada pessoa consigo mesma, as relações
sociais, a vida afetiva, situação financeira, entre outras. O resultado da
complexa interação desses fatores com nossos desejos mais internos
pode proporcionar ou não uma experiência de vida com qualidade.
O planejamento de uma edificação considerando critérios básicos de
sustentabilidade contribui com todos os fatores acima descritos.
A inserção dos elementos básicos de conforto proporciona a conexão das pessoas com
suas casas e destas, com o local onde são construídas. E o conforto nada mais é do que a
sensação de bem estar do ser humano em relação ao seu ambiente, a ausência de estresse
de natureza física, térmica, visual, sonora e emocional.
A arquitetura é uma linguagem não verbal capaz de comunicar, de provocar experiências
sensoriais e estados emocionais. De inspirar ou não bons pensamentos. O bem viver e
o bom conviver transcende a felicidade baseada no ter e na aparência de elementos
construtivos meramente decorativos. Em épocas de profundas transformações da natureza,
quando nossa capacidade de continuar a existir é colocada em cheque, torna-se vital uma
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transição da Arquitetura da Aparência para uma Arquitetura da Essência. É
preciso criar a consciência de que cada material utilizado em uma edificação
possui uma bagagem ecológica. Veio da natureza, passou por um processo
industrial, consumiu energia, gerou resíduos.
A qualidade de vida que essencialmente buscamos como seres humanos
está além da complexidade da tecnologia artificial e muito mais próxima
da tecnologia natural. Uma edificação que tenha iluminação e ventilação
naturais, paredes porosas capazes de promover trocas gasosas entre os
ambientes internos e externos, cores adequadas ao perfil de seus habitantes
e um desenho criativo e belo, certamente favorecerá a saúde de seus
ocupantes.
Ao construir com a natureza e não contra ela, chega-se a uma edificação
de baixo impacto ambiental e baixo custo de manutenção. Dentro deste
conceito, podemos citar os trabalhos de arquitetos como o espanhol Luiz
de Garrido e os colombianos Luis Carlos Rios e Simon Vélez. O conceito de
construir para a felicidade dos usuários baseia-se na experiência humana
de habitar um lugar que seja “religado” com a natureza.
A complexidade desse século exige a formação de equipes interdisciplinares
para a criação de espaços aliados a princípios ecológicos que proporcionem
qualidade de vida a seus usuários, não como uma experiência efêmera, mas
de uma arquitetura essencial.
Imagem: Luiz de Garrido
La Casa mariposa - Projeto do arquiteto espanhol Luis de Garrido
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ÁGUAS E ÁREAS VERDES:
Adaptação das cidades ao novo cenário climático
A entrada de 2009 levou a cidade de Belo Horizonte a olhar
novamente para uma questão que é reincidente nas cidades brasileiras:
a má relação entre planejamento urbano, água e as áreas verdes. Tendo
em vista que eventos climáticos extremos, como os que atingiram a
cidade no réveillon vieram para ficar e tendem a se intensificar, como
adaptar as cidades brasileiras ao novo cenário climático do século XXI?
O relatório sobre Mudanças Climáticas de 2007 elaborado pelo Painel
Intergovernamental de Mudanças Climáticas - IPCC e amplamente
divulgado pela imprensa, deixou bem claro que, além da elevação da
temperatura, haverá aumento da incidência de temporais e chuvas de
granizo acompanhados de ventos de alta velocidade.
Em 2008, a capital mineira sentiu uma pequena parcela dos eventos climáticos previstos
pelo relatório. Em setembro, a cidade foi surpreendida por uma intensa chuva de granizo
e ventos que chegaram a mais de 50 Km/h em algumas regiões. Cerca de 800 casas foram
destelhadas, muitas pessoas ficaram feridas e milhares de carros foram amassados, dentre
outros prejuízos. Após 30 anos sem problemas, o Rio Arrudas voltou a transbordar. Inúmeras
residências e lojas foram destruídas. Muito além dos prejuízos econômicos das famílias,
comerciantes e contribuintes, está o passivo ambiental e emocional deixado pelos estragos
de uma enchente nessas proporções. Algo que poderia ter sido evitado caso a água seguisse
o seu ciclo natural: infiltrar e abastecer o lençol freático.
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O padrão das edificações e intervenções urbanas em desarmonia com o meio natural
criou um ecossistema artificial, caracterizado pela baixa presença de vegetação, alta
concentração de poluentes na atmosfera e uma elevada demanda energética e de
recursos naturais. Estas características associadas ao tipo de material utilizado nas
construções acabam por reduzir o conforto e a qualidade de vida nas cidades. Esses
aspectos estão intimamente ligados à cobertura vegetal que, a cada dia que passa,
perde espaço para uma infra-estrutura na qual predominam o concreto, o vidro e
o asfalto. Muitas vezes, a Lei de Uso e Ocupação do solo não é respeitada. Após
a aprovação dos projetos e obtenção do Habite-se, as áreas permeáveis exigidas
por lei, tais como jardins e pisos drenantes são substituídas por pavimentos que
impermeabilizam o solo, ou dão lugar a construções anexas (os famosos puxadinhos).
Desta forma, a própria sociedade torna-se co-responsável pelas inundações que vem
ocorrendo com tanta freqüência. Além da necessidade de fiscalização e punição,
também é importante a conscientização dos cidadãos sobre a conseqüência e a
repercussão de seus atos além da escala de sua moradia.
Imagem: Deborah Munhoz
Telhado destruído pelo
granizo em Belo Horizont
Pressão da cidade
sobre Parque Lagoa
do Nado, próximo à
Lagoa da Pampulha,
em Belo Horizonte.
A redução das áreas
de recarga do lençol
freático reduzem a
água das nascentes
da lagoa.
Detalhe da
ortofotocarta de
BH, Folha No 6.
EMBRAFOTO
Fonte: MUNHOZ, 1996
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A baixa permeabilidade do solo urbano afeta consideravelmente o
movimento natural da água. Impedida de infiltrar no solo e abastecer o
lençol freático, ela escoa pelas ruas e avenidas em alta velocidade, atingindo
rapidamente os rios e redes de esgoto, provocando inundações.
A mesma lógica de impermeabilização ocorre nos condomínios
residenciais horizontais. Apesar do baixo fluxo de veículos, muitos adotam
o asfaltamento das vias e pavimentação quase completa das calçadas.
Tanto árvores como a vegetação rasteira são importantes para a recarga
do lençol freático e para a higiene e saúde das cidades.
É urgente e estratégico incentivar a ampliação, construção e manutenção
de áreas verdes em locais públicos e privados. A implantação de “Calçadas
Verdes”, a exemplo do que vem acontecendo no bairro Pompéia, na
zona oeste da cidade de São Paulo, pode servir como modelo para novos
projetos. A iniciativa, bancada por uma construtora local, foi apresentada
no Ecobuilding 2008.
A implantação de projetos que contemplem telhados verdes e a captação
de água de chuva é fundamental para garantir maior conforto nas cidades
e mitigar os efeitos negativos dos extremos climáticos. O aproveitamento
da água de chuva leva à economia da conta de água e reduz o consumo de
insumo durante o processo de tratamento pelas empresas de abastecimento
e esgoto. Também evita que as águas pluviais sejam levadas diretamente
para o sistema de esgoto. Os telhados verdes são uma alternativa para
compensar a cobertura vegetal tomada pelo ambiente construído e para
melhorar o conforto interno das edificações e do micro clima local. Além
de reintegrar a água ao espaço urbano e valorizar a paisagem, as áreas
verdes promovem a melhoria microclimática através do sombreamento e
da elevação da umidade relativa do ar, limpam a atmosfera, funcionam
como anteparo às correntes de vento e barreiras para diminuição de
ruídos, preservam a fauna e flora urbana e ainda, asseguram espaços de
aproximação dos habitantes da cidade com a natureza.
Em época de aquecimento global, as construções devem estar cada vez
mais preparadas para o agravamento das adversidades do clima. Então,
vale ressaltar que toda área verde colabora com o tão famoso “seqüestro
de carbono” que nada mais é do que o simples fenômeno de fotossíntese.
Com tantas funções nobres, por que não dar a elas destaque nos conceitos
projetuais? Cidades secas e áridas tornam as pessoas igualmente secas e
áridas. Sendo a arquitetura uma linguagem não verbal, conceber edificações
em harmonia com a água e com a riqueza da flora brasilera contribue, no
fundo, para reaproximar o ser humano de si mesmo. Cidades mais verdes
alem de mais humanas, são também mais belas. E como dizia Vinícius de
Moraes, beleza é fundamental.
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Na era da velocidade, a construção de uma edificação passou a
ser vista como um processo semelhante a uma linha de montagem. O
produto, que deveria se transformar em um lugar de bem viver, muitas
vezes, está longe de proporcionar saúde e bem estar a seus usuários,
mesmo quando construídos em áreas verdes. O adoecimento de pessoas
em edificações passou a chamar a atenção a partir da década de 80.
Em 1984, um relatório da Organização Mundial de Saúde estimou que
30% dos edifícios novos ou remodelados apresentavam alto índice de
reclamações relacionadas à qualidade do ar. O termo Síndrome do
Edifício Enfermo (SEE) passou a ser usado para descrever situações
em que pelo menos 20% dos ocupantes relatem desconforto ou que
tenham a saúde afetada devido à permanência nesses edifícios.
A SEE está relacionada, principalmente, à falta de ventilação natural e à impossibilidade
das edificações de dispersar poluentes presentes em seu interior. Os filtros dos aparelhos
de ar condicionado, geralmente não recebem a devida manutenção, servindo de poderoso
meio de cultura para fungos e bactérias. Desta forma, os usuários ficam expostos a um ar
viciado e contaminado e apresentam sintomas como alergias, náuseas, dores de cabeça,
secura ocular, dificuldade de concentração, entre outros. Além da má ventilação, estas
ocorrências estão relacionadas ao desconforto térmico, formação de cargas iônicas no ar
do interior da edificação, partículas em suspensão, exposição ao amianto e fibra de vidro,
gases e vapores provenientes dos materiais utilizados e outros agentes.
EDIFÍCIOS ENFERMOS
E QUALIDADE DE VIDA
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em maior benefício social, dentro dos limites da
viabilidade econômica.
A luz solar, por exemplo, pode ser devidamente
explorada com a utilização de elementos que
protejam as aberturas da insolação direta,
mas permitam a entrada de luminosidade. A
iluminação natural, além de evitar as manchas na
pelo por exposição, traz sensação de bem estar
para os usuários, melhorando sua disposição e
produtividade.
É fundamental que construtores, engenheiros
e arquitetos informem-se também sobre as
propriedades dos materiais, avaliando o seu
comportamento térmico, além de sua toxicidade.
Um trabalho de conscientização também precisa
ser feito junto ao mercado consumidor, para que
esse faça escolhas conscientes em relação à sua
salubridade e à qualidade de vida que terá no
local onde escolheu habitar e trabalhar.
O desenvolvimento da química de materiais para a construção civil disponibilizou no
mercado, uma variedade de tintas, pigmentos a base de metais pesados, colas, vernizes,
solventes derivados de petróleo e uma infinidade de plásticos e fibras sintéticas presentes em
materiais como forros e carpetes. Esses materiais não foram criados dentro de princípios de
biocompatibilidade, mas somente dentro de uma lógica econômica, funcional e estética. Os
usuários também estão expostos a ruídos, vibrações, emissões eletromagnéticas ou ionizantes
produzidas por linhas de média e baixa tensão, televisores, microondas, fotocopiadoras, ar
condicionado e outros equipamentos eletrônicos.
Um exemplo de Síndrome do Edifício Enfermo ocorreu na recém inaugurada sede da
Companhia de Gás de Barcelona. Em fevereiro de 2007, aproximadamente cento e cinquenta
trabalhadores apresentaram vermelhidão cutânea na região das pernas. Mil trabalhadores
foram afastados do edifício pelo período de dois dias para medidas corretivas. Estudos
considerados conservadores da Agência de Proteção Ambiental Americana, estimam que as
perdas de produtividade relacionadas à SEE e à falta de conforto nos edifícios chegam a 70
bilhões de dólares por ano.
O problema vem se perpetuando através de um hábito comum dos arquitetos. Na fase
de projeto, em um país como o Brasil, eles privilegiam o uso do ar condicionado e a
iluminação artificial, em detrimento ao aproveitamento da iluminação e ventilação naturais,
principalmente em prédios comerciais. Estudos realizados em edifícios europeus apontam
que 46% dos problemas estão localizados na fase de projeto (BENIN, 1988). É exatamente
durante a fase mais barata do processo, que a preocupação com a qualidade de vida dos
moradores e a redução do impacto ambiental de uma edificação precisa ser incorporada.
Uma construção mais sustentável depende da seleção correta de materiais e componentes,
combinada com o detalhamento adequado do projeto. Isso resulta em impactos menores e
Referência Bibliográfica:
BONIN, L.C. Manutenção de edifícios: uma revisão conceitual.
In: Seminário sobre manutenção de edifícios, Porto Alegre. Anais
– v. I. Porto Alegre: URFGS, 1988. p. 1-31.
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Vários sistemas de certificação foram desenvolvidos ao redor
do mundo. Alguns de caráter privado, outros de iniciativa pública.
Cada sistema estabelece parâmetros de desempenho que devem ser
alcançados pelos projetos ou construções, para receber determinada
classificação. Dentre eles podemos citar: BREEAM – Building Research
Establishment Environmental Assessment Method, no Reino Unido;
CASBEE–ComprehensiveAssessmentSystemforBuildingEnvironmental
Efficiency, no Japão; HQE – Haute Qualité Environnementale dês
Batiments, na França; GREEN STAR, na Austrália e o LEED –
Leadership in Energy and Environmental Design, nos Estados Unidos.
Todos estes sistemas são membros do World Green Building Council e
foram concebidos dentro de uma realidade socioeconômica, cultural,
tecnológica e ambiental de seus países de origem.
Em 2007, o Brasil lançou a Regulamentação para Etiquetagem Voluntária do Nível de
Eficiência Energética de Edifícios Comerciais, de Serviços e Públicos, com área útil total
mínima de 500m2. Inicialmente voluntária, passará a ser obrigatória a partir de 2012. O
documento foi elaborado pelo Laboratório de Eficiência Energética em Edificações do
Departamento de Engenharia Civil da Universidade Federal de Santa Catarina no âmbito
do Programa PROCEL EDIFICA. A regulamentação contempla três fases do edifício: projeto,
edificação concluída e reforma. Além disso, classifica o nível de eficiência de três diferentes
quesitos: envoltória, sistema de iluminação e sistema de condicionamento de ar. Esses
CERTIFICAÇÕES:
transição para uma nova zona
de conforto
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recebem classificação do nível de eficiência de A (mais eficiente) a
E (menos eficiente). A regulamentação também inclui incentivos
para implementação de sistemas como energia fotovoltaica ou
cogeração. Espera-se agora a ampliação da regulamentação
existente para a tipologia residencial, assim como para edificações
com área inferior a 500m2.
Enquanto a iniciativa nacional começa a se difundir, a utilização
de parâmetros estrangeiros para certificação de edificações
brasileiras tem recebido críticas, devido às especificidades do
contexto social e climático do nosso país. Apesar disso, a adoção
de tais procedimentos dentro da prática projetual tem ajudado a
mobilizar o setor da Construção Civil e a retirar seus profissionais
da zona de conforto, acelerando o processo de transição de uma
arquitetura focada apenas no lucro para uma arquitetura também
focada no lucro. Grande parte dos profissionais, no entanto, não
está preparada para conceber edifícios que interajam de forma
mais harmônica com a natureza.
Os edifícios geram impactos ambientais ao longo de seu ciclo de
vida nas fases de projeto, extração de matéria-prima, fabricação
de materiais, construção, utilização e demolição. Esses impactos
ganharam proporção a partir da revolução industrial. O paradigma
da produção industrial tem em suas bases a utilização dos recursos
energéticos de fontes não renováveis e dos materiais como se esses
fossem infinitos e de perpétua renovação. A produção industrial
considera o processo de extração, produção e distribuição
como um sistema aberto e linear. Desconsidera, portanto, que
todas as etapas do processo de produção de uma edificação
se dão em um mesmo lugar: o planeta Terra. Esta lógica foi
levada ao setor da Construção Civil a partir da utilização de
soluções arquitetônicas estandardizadas, descontextualizadas,
desconsiderando fatores como clima, relevo, oferta de materiais
locais, cultura e outros.
A arquitetura tem como um de seus princípios nos proteger dos
extremos climáticos. Hoje chegamos a construir edifícios com
menos conforto do que os primeiros abrigos pré-históricos.
Independente dos sistemas de certificação deveria ser implícito
a arquitetura sustentável ou bioclimática. Uma edificação com
melhor performance ambiental será também uma edificação
mais econômica, terá maior valor agregado para quem compra
e menor impacto sobre os recursos naturais. Vale lembrar
que economia e ecologia derivam da mesma palavra grega:
“oikos”. Pela sobrevivência dos negócios e pela nossa própria
sobrevivência, precisamos adotar estratégias oikosnômicas e
não meramente econômicas nas soluções projetuais.
gases e vapores provenientes dos materiais utilizados e outros
agentes.
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A escritora Marina Colasanti, em seu texto ”Eu sei, mas não
devia” diz:
“A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não
ter outra vista que não as janelas ao redor. E, porque não tem vista,
logo se acostuma a não olhar para fora. E, porque não olha para
fora, logo se acostuma a não abrir de todo as cortinas. E, porque
não abre as cortinas, logo se acostuma a acender mais cedo a luz.
E, à medida que se acostuma, esquece o sol, esquece o ar, esquece
a amplidão.”
No processo de construção e crescimento das cidades, o sol passou a entrar cada
vez menos nas habitações, nas ruas e consequentemente, na vida das pessoas. O
sombreamento causado pelo pouco espaço entre uma construção e outra foi deixando
os lares e escritórios cinza, taciturnos. A falta de vista provocada pelo cercamento do
olhar também empobreceu a capacidade das pessoas de olhar além, olhar para fora, de
bem viver e bem conviver.
O SOL E O
REDESIGN DAS CIDADES
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Além do aspecto psicológico, a falta de iluminação natural tem
um reflexo direto sobre o consumo energético das habitações.
Associada ao uso do ar condicionado, equipamentos
eletrônicos de baixa eficiência energética e fiações elétricas
antigas, aumenta cada vez mais o custo de energia para os
consumidores. O risco do “apagão” e a elevação das tarifas de
energia elétrica contribuíram para que a energia solar fosse
mais ponderada nos projetos arquitetônicos, principalmente
para o aquecimento de água. O sol, no entanto, deve ser
considerado, de forma mais ampla, como um item fundamental
para a saúde das pessoas, das habitações e da cidade. O direito
a ele deve ser fator determinante para a escolha da posição da
construção em um terreno, das formas das edificações, assim
como do projeto de aberturas e vãos.
O estudo e aplicação das cartas solares são fundamentais para
a execução de bons projetos. Loteamentos e construções,
planejadas apenas para maximizarem os lucros em detrimento
do bem estar de seus usuários, geram custos maiores diante
das mudanças climáticas, adoecimento da população e
dos conflitos sociais emergentes. A depressão instalada nas
grandes cidades, a elevação das alergias respiratórias ou o
baixo potencial criativo nos ambientes de trabalho são alguns
reflexos da cultura da edificação de cidades gris. Para planejar
cidades no novo cenário climático planetário é preciso um
novo perfil de investidores e uma nova geração de profissionais
do setor da construção civil, capazes de elevar os olhos além
das pranchetas e do AUTOCAD.
O setor da construção civil necessita repensar questões como
a sua responsabilidade social. Ele deve aprender a impactar
positivamente e a gerar externalidades positivas, que não se
limitemàgeraçãodeempregos,masquepermitamonascimento
das verdadeiras cidades solares com uma população e cultura
mais iluminada.
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SUSTENRENTABILIDADE
É possível equilibrar o uso de recursos naturais de forma racional,
criando ambientes construídos que possam gerar impactos positivos,
promovendo a saúde e a qualidade de vida de seus moradores e, ainda
assim, serem lucrativos? Existem profissionais, institutos e empresários
que acreditam que sim. O instituto Rocky Mountain, no Colorado,
EUA, faz parte desse time. Com o novo conceito de relação, ele tem
ajudado empresas a conceber edifícios comerciais que garantam
maior conforto, economia de energia e melhoria na produtividade,
sem aumentar os custos com a construção. É bom para a empresa,
para os funcionários e para a natureza. Esse constitui um dos muitos
exemplos citados por Paul Hawken, Amory Lovins e L. Hunter Lovins,
no livro “Capitalismo Natural”. Para que o setor da construção civil
transcenda o medo de arriscar em empreendimentos que incorporem
verdadeiramente o conceito de sustentabilidade, ele precisa quebrar
paradigmas.
Nesse artigo, vamos brincar um pouco com as palavras e chamar essa visão explícita da
ganha- ganha de SustenRentabilidade. Muitas vezes, percebemos que empreendimentos
caros chegam a ter espaços tão ou mais desvitalizantes quanto ambientes construídos sem
o auxilio dos “designers”. Espaços desvitalizados podem ser destrutivos do ponto de vista
das relações humanas, servindo de cenário para violência, doenças e baixa produtividade,
como pode ser facilmente percebido em grandes centros urbanos. As estruturas urbanas,
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assim como os edifícios, expressam a lógica do sistema econômico em que estão
inseridos. O capitalismo industrial não reconhece a interdependência entre a produção
e uso do capital com o consumo e conservação do capital natural.
O “Capital Natural” é constituído dos recursos naturais, sistemas vivos e os serviços
do ecossistema (produção de água limpa, polinização de flores, etc.). Ao contrário
das nossas edificações, dos sistemas urbanos ou de qualquer outro sistema industrial
construído pelo ser humano, o capital natural garante a manutenção da vida no
planeta, assim com dá suporte às atividades industriais. Atualmente, o sistema
capitalista liquida os sistemas naturais para gerar somente lucro e a Construção Civil,
assim como as diversas profissões ligadas ao setor, está operando dentro deste velho
paradigma. A verdade inconveniente é que sem capital natural não há como sustentar
nenhuma cadeia produtiva, para atender às necessidades humanas. Então como fazer
a SustenRentabilidade reverberar no setor da construção civil?
Concordamos com Paul Hawken, Amory e L. H Lovins, que é preciso repensar projetos
que ganhem pela eficiência e não pela ineficiência. As estruturas urbanas e os
edifícios refletem a lógica de um sistema que reduz o capital natural e subestima
o capital humano. No inicio da revolução industrial havia escassez de mão-de-obra
e abundância de recursos naturais. Máquinas e sistemas foram projetados para usar
os recursos como se eles fossem infinitos. Dentro desse pensamento, era aceitável
que seu desempenho fosse ineficiente. Hoje, temos outro cenário: as pessoas e o
conhecimento são abundantes e os recursos naturais, escassos. É preciso projetar,
portanto, dentro de outra lógica.
O surgimento de inovações nos projetos arquitetônicos é lento e
desestimulado devido à baixa remuneração do Design (planejamento), o
que deixa pouca abertura e tempo para a criatividade. É pratica comum no
mercado, a remuneração/comissão dos profissionais em função do preço
final da edificação que estão concebendo, ou seja, do que é gasto e não
do que economizam em função de seus usuários e da natureza. Desta
forma, o produto final não precisa ser ecoeficiente, gerar saúde, qualidade
de vida e economia, mas ser o mais lucrativo para a cadeia imobiliária.
Como produção e consumo são dois lados da mesma moeda, do outro
lado do problema estão os consumidores que desejam uma edificação para
ostentação. A demanda vai além do abrigo e se torna símbolo de status. É
a cultura do “morar para o outro” que influencia na composição do preço
final do produto.
Dentro desta lógica, estão inseridos os produtos da Arquitetura Espetáculo,
das edificações Outdoors. Muitos desses espaços, embora caros, são
desvitalizantes. Temos conhecimento suficiente para entender a relação dos
componentes materiais e imateriais que compõe os espaços das cidades e de
suas construções, com o comportamento, saúde, bem estar e preservação de
ecossistemas. É exatamente na habilidade de incorporar tal conhecimento
que está a chave para a SustenRentabilidade de uma construção. É urgente
planejar e implementar um processo de transição estratégico, tanto do
ponto de vista da sobrevivência do negócio, quanto da própria espécie
humana. É preciso repensar as formas de elaborar propostas, de remunerar
profissionais, estabelecer tabelas de honorários e as prioridades do design.
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A expressão “Triple botton line” ou “Tripé da Sustentabilidade”
usada para se referir aos aspectos econômicos, sociais e ambientais da
sustentabilidade, vem se tornando comum no discurso de pessoas e
empresas. O questionamento que fazemos é se um negócio apoiado
somente nesse tripé sobreviverá às demandas desse novo século.
Pensamos que não. Tudo depende de um contexto cultural favorável.
A cultura pode ser entendida como um jeito de pensar e de fazer
as coisas, portanto, pode ser considerada como um quarto tripé da
sustentabilidade. Empresas que entram nesse paradigma dependem de
consumidoresedepolíticaspúblicasqueapóieminiciativassustentáveis,
conforme citado na Agenda 21 – documento gerado pela Conferência
das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento
Sustentável (Rio-92). Elas necessitam de um mercado educado e
disposto a pagar.
Fomos educados em uma cultura que nos faz perceber e abordar os desafios atuais, de
forma fragmentada, como se o mundo fosse uma coleção de objetos, quando ele não é. O
cenário atual exige que desloquemos nossa atenção dos objetos isolados para as relações
entre eles e seu contexto. Vários edifícios “sustentáveis” não fazem uma cidade sustentável.
Aliás, não existe um edifício sustentável (Revista Obras Online, Ano 5, No 58, dez/08). Nesse
início de século, a forma predominante de pensar e de fazer construções sustentáveis no
O 4ºTRIPÉ DA SUSTENTABILIDADE
PARTE 1
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Brasil ocorre de maneira fragmentada. Seja na escala humana,
do edifício ou das cidades, é necessária a intervenção de pessoas
com visão sistêmica, capazes de perceber as interrelações entre os
elementos que compõe o ecossistema urbano e de tomar decisões,
planejar a partir delas.
Os atuais problemas urbanos são consequência de um design
do passado, concebido a partir de um paradigma que não deu
certo. E o que estamos projetando agora? Não basta investir
em tecnologias e processos, pois o fator humano interfere
e a cultura influencia. São as pessoas que sonham, planejam,
executam, votam e compram imóveis. Também são as pessoas
que devem dar respostas para a resolução dos problemas urbanos.
Para exemplificar, citaremos modelos de abordagem sistêmica
nas escalas urbana e do edifício, que objetivaram a melhoria da
qualidade de vida de todos e não só de uma camada especifica da
população. Na escala urbana, vale lembrar as experiências latino-
americanas de Curitiba e Bogotá, assim como a de Londres e,
recentemente, de Manhattan. Jaime Lerner e Enrique Peñalosa,
prefeitos das duas primeiras cidades citadas, respectivamente,
demonstraram que a limitação do tráfego de veículos e a criação
de grandes calçadas para pedestres transformam positivamente
as cidades. A medida trouxe benefícios econômicos para todas as
partes interessadas.
Em Londres, podemos citar a taxação de veículos para circulação
no centro. Recentemente, o prefeito de Manhattan deu início à
criação experimental de ilhas para pedestres. Isso mostra uma
tendência a priorizar as pessoas e o transporte público, visando
à redução significativa da poluição, do dióxido de carbono e dos
engarrafamentos. Um exemplo de política pública que, entre
outros benefícios, provoca a redução dos custos de manutenção
das edificações, danificadas pela poluição atmosférica, e dos custos
relacionados ao adoecimento da população e limpeza doméstica.
Na escala do edifício, ressaltamos novamente a experiência da
BED ZED em Londres, que provou que o setor privado, além
de constituir um grande agente de mudanças, também pode se
beneficiar com empreendimentos que promovam estilos de vida
mais sustentáveis.
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Por mais que as tecnologias evoluam, a melhoria do ambiente
urbano ocorre de forma lenta, quando acontece. Já existe um grande
número de técnicas, tecnologias e experiências de referências, em
vários lugares do mundo. Iniciativas isoladas, no entanto, pouco
contribuem para uma mudança sistêmica e das relações estabelecidas
no tecido urbano. Assim como apenas a aplicação de indicadores
de sustentabilidade aos aspectos construtivos de um edifício também
não são suficientes.
A sustentabilidade deve ser inserida desde o aspecto conceitual de uma edificação,
passando por todas as fases de projeto, até as relações da edificação com seu entorno. A
crença na tecnologia como solução dos problemas urbanos nos parece tão limitada quanto
à crença de que o crescimento econômico em si resolveria grande parte das mazelas
sociais. É preciso ousadia e coragem para mudar efetivamente o paradigma das cidades
latino americanas. Assim demonstraram Jaime Lerner, ao transformar Curitiba, e Enrique
Peñalosa, ao fazer emergir uma nova Bogotá. Na visão do ex-prefeito colombiano, ações
que geram mudanças mais profundas dependem muito pouco de questões técnicas, mas
de uma compreensão de quem serão os reais beneficiários de determinada atitude.
O 4ºTRIPÉ DA SUSTENTABILIDADE
PARTE 2
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Enquanto o planeta esquenta e a maior parte da população das cidades nos países em
desenvolvimento e subdesenvolvidos se estabelece em favelas, vários fóruns e artigos são
desenvolvidos a respeito da sustentabilidade na construção civil, com o foco predominante
na cidade formal. A onda da sustentabilidade nas edificações estará contribuindo
para manter as desigualdades sociais em nosso país? Pequenas construtoras poderão
disponibilizar edificações sustentáveis no mercado? Quem poderá adquirir tais imóveis?
Podemos falar de sustentabilidade sem uma cultura de inclusão social?
Falar de sustentabilidade no contexto das nossas cidades significa ter consciência de que
os limites sociais já foram atingidos, antes mesmo dos ambientais. Resolver os problemas
da sustentabilidade na construção civil significa resolver também todos os problemas
urbanos. Significa que o setor precisa exercer sua responsabilidade social e contemplar
todos os atores, ricos e pobres, com o objetivo de promover a equidade no acesso aos
serviços urbanos básicos como lazer (áreas verdes), saneamento e transporte público,
adotando a sustentabilidade como um valor.
Luiz de Garrido, eleito como o arquiteto do ano, em 2008, pela Associação Internacional de
Arquitetura Modular Metálica (ISBA), propõe como um critério de construção sustentável
a diminuição do preço de construção e dos custos de manutenção. Isso democratiza o
acesso ao bem construído. A sustentabilidade, portanto, não se apóia somente na mudança
cultural da sociedade com poder aquisitivo para comprar produtos sustentáveis. Ela detém
um forte alicerce em uma nova cultura de fazer negócios para as atuais e futuras gerações
de todos os setores da construção civil.