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“Do inferno para o céu”
Noite serena; o céu, tomado pelas luzes da cidade, as invejava. Queria
exibir suas estrelas, mas os pontinhos luminosos lá embaixo não as deixavam
aparecer. Um jovem solitário, à janela de um apartamento, observava a lua.
Queria pegá-la. Debruçou-se sobre o parapeito e esticou os braços: não a
alcançava. Insistiu até sentir a mão deslizar em falso e, assustado pelo perigo da
queda, virou as costas para a janela. Deparou-se com um cômodo escuro; apenas
um abajur aceso ao centro, proporcionando sombras psicodélicas ao redor.
Demônios com as mais diversas faces escondiam-se, corriam, dançavam,
enquanto os móveis tomavam formas estranhas. Sentiu o braço arder: era a
seringa, há pouco usada a fim de encontrar mais uma vez aquele mundo, ainda
espetada nele.
Seus olhos vagavam perdidos em meio àqueles ilusões quando, subtamente,
deparou-se com o retrato de sua avó – na verdade mãe, pois fora ela quem o
criara desde a morte dos pais. Suas feições sorridentes derreteram,
convertendo-se numa expressão macábra, de luto. E por que sorriria? Ali era o
inferno; a morte envolvia o jovem neto, tomava seu corpo aos poucos com o que
nós, mortais, chamamos de vírus. De repente, vozes. O jovem, dominado por
horror, encolheu-se ao chão e por entre as mechas de seu cabelo negro jogado
ao rosto, viu as criaturas demoníacas a encará-lo, dizendo “Ninguém mandou
usar drogas”, “Se tivesse ouvido sua avó”, “Aids? É merecido, seu drogado! Ta aí
seu prêmio por...”. “CHEGA”, gritou o garoto.
Sintia-se cansado. Cansado pela fadiga gerada pela doença, diagnosticada
há alguns meses e, principalmente, cansado de sua solidão. Arrependera-se de
usar drogas, mas o vício era mais forte que ele e mais forte ainda era o
preconceito vivido após contrair Aids. Pagava seus pecados através da doença e
suportando os olhares alheios a condená-lo, a contemplar sua desgraça como
merecida. E não suportando toda a condenação, recorria a seringa novamente.
“Cadê a seringa?” Encontrando-a, injetou novamente a droga. Em sua circulação,
condenação e morte corriam juntos.
Agora sim. O mundo já não era tão obscuro, a cabeça não pesava, o coração
não se remoía. Vovó sorria. Ele sorria. Os demônios transformavam-se em
borboletas multicoloridas e anjos, muito brilhantes. “Será que vieram me
buscar?” Apesar de todos o condenarem, queria ir para o céu. E por que não iria?
É tradição a humanidade atribuir ao doente a culpa de seus males, fazer o
inferno aqui e agora além de garantí-lo para o amanhã, após a morte. Mas e
Deus? Seria Ele assim tão mal? Incompreensível? Claro que não! Até lhe enviara
anjos! Com certeza o Senhor, criador dos céus e de terra, teria piedade. Teria
de ter! Afinal, tirara-lhe os pais, o desolara e o fizera infeliz. Merecia um céu,
enfim. O céu...
Voltou-se novamente a janela, a qual enquadrava o paraíso ali, tão perto.
Lembrou-se da namorada, a quem amava tanto. Ela o deixara após saber da
doença. Era uma moça tão linda; olhos escuros, lábios grossos. E gostava da lua.
Quando fosse para o céu, daria um jeito de lhe enviar a lua numa caixinha de
presentes. Quem sabe assim voltasse para ele, quisesse ir para o céu também.
Daí poderia até conhecer seus pais! Ah, como eram bons, seus pais. Amava-os
tanto, tanto. Enfim, depois de tanto tempo, iria os rever.
Debruçou-se novamente sobre a janela. Aquele céu prometia-lhe tantas
coisas, tanta felicidade e até estrelas. Inclinou o corpo à frente. E lá estariam
seus pais e até Deus, os quais não o condenariam, o deixariam em paz. As mãos
deslizaram. Só que dessa vez, não foi em falso. Ele foi atrás de seu céu e seus
anjos o seguiram. Era uma noite muito, muito serena.

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  • 1. “Do inferno para o céu” Noite serena; o céu, tomado pelas luzes da cidade, as invejava. Queria exibir suas estrelas, mas os pontinhos luminosos lá embaixo não as deixavam aparecer. Um jovem solitário, à janela de um apartamento, observava a lua. Queria pegá-la. Debruçou-se sobre o parapeito e esticou os braços: não a alcançava. Insistiu até sentir a mão deslizar em falso e, assustado pelo perigo da queda, virou as costas para a janela. Deparou-se com um cômodo escuro; apenas um abajur aceso ao centro, proporcionando sombras psicodélicas ao redor. Demônios com as mais diversas faces escondiam-se, corriam, dançavam, enquanto os móveis tomavam formas estranhas. Sentiu o braço arder: era a seringa, há pouco usada a fim de encontrar mais uma vez aquele mundo, ainda espetada nele. Seus olhos vagavam perdidos em meio àqueles ilusões quando, subtamente, deparou-se com o retrato de sua avó – na verdade mãe, pois fora ela quem o criara desde a morte dos pais. Suas feições sorridentes derreteram, convertendo-se numa expressão macábra, de luto. E por que sorriria? Ali era o inferno; a morte envolvia o jovem neto, tomava seu corpo aos poucos com o que nós, mortais, chamamos de vírus. De repente, vozes. O jovem, dominado por horror, encolheu-se ao chão e por entre as mechas de seu cabelo negro jogado ao rosto, viu as criaturas demoníacas a encará-lo, dizendo “Ninguém mandou usar drogas”, “Se tivesse ouvido sua avó”, “Aids? É merecido, seu drogado! Ta aí seu prêmio por...”. “CHEGA”, gritou o garoto. Sintia-se cansado. Cansado pela fadiga gerada pela doença, diagnosticada há alguns meses e, principalmente, cansado de sua solidão. Arrependera-se de usar drogas, mas o vício era mais forte que ele e mais forte ainda era o preconceito vivido após contrair Aids. Pagava seus pecados através da doença e suportando os olhares alheios a condená-lo, a contemplar sua desgraça como merecida. E não suportando toda a condenação, recorria a seringa novamente. “Cadê a seringa?” Encontrando-a, injetou novamente a droga. Em sua circulação, condenação e morte corriam juntos. Agora sim. O mundo já não era tão obscuro, a cabeça não pesava, o coração não se remoía. Vovó sorria. Ele sorria. Os demônios transformavam-se em
  • 2. borboletas multicoloridas e anjos, muito brilhantes. “Será que vieram me buscar?” Apesar de todos o condenarem, queria ir para o céu. E por que não iria? É tradição a humanidade atribuir ao doente a culpa de seus males, fazer o inferno aqui e agora além de garantí-lo para o amanhã, após a morte. Mas e Deus? Seria Ele assim tão mal? Incompreensível? Claro que não! Até lhe enviara anjos! Com certeza o Senhor, criador dos céus e de terra, teria piedade. Teria de ter! Afinal, tirara-lhe os pais, o desolara e o fizera infeliz. Merecia um céu, enfim. O céu... Voltou-se novamente a janela, a qual enquadrava o paraíso ali, tão perto. Lembrou-se da namorada, a quem amava tanto. Ela o deixara após saber da doença. Era uma moça tão linda; olhos escuros, lábios grossos. E gostava da lua. Quando fosse para o céu, daria um jeito de lhe enviar a lua numa caixinha de presentes. Quem sabe assim voltasse para ele, quisesse ir para o céu também. Daí poderia até conhecer seus pais! Ah, como eram bons, seus pais. Amava-os tanto, tanto. Enfim, depois de tanto tempo, iria os rever. Debruçou-se novamente sobre a janela. Aquele céu prometia-lhe tantas coisas, tanta felicidade e até estrelas. Inclinou o corpo à frente. E lá estariam seus pais e até Deus, os quais não o condenariam, o deixariam em paz. As mãos deslizaram. Só que dessa vez, não foi em falso. Ele foi atrás de seu céu e seus anjos o seguiram. Era uma noite muito, muito serena.