SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 168
Baixar para ler offline
Fernando José de Lira
. I
ai
ucza e da pobreza de Alagoas.
201628 Ex. 3 Pat.: 124647
UFAL
V
J
té -
Formação da riqueza
e da pobr~za de Alagoas
Maceió, 2007
1 •
L768c
UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS
Reitora
Ana Dayse Rezende Dorea
Vice-reitor
Eurico de Barros lôbo Filho
Diretora da Edufal
Sheila Diab Molut
Conselho Editorial
Sheila Díab Molut (Presidente)
Cícero Péricles de Oliveira Corvolho
Maria do Socorro Aguiar de Oliveira covalcante
Roberto Sarmento lima
lrocílda Morío de Mouro lima
Llndemberg Medeiros de Araújo
Flóvio Antônio Mirando de souza
Eurico Pinto de Lemos
Antonio de Pódua Cavalcante
Crlstlane Cyrlno Estevõo Oliveira
Supervisão gráfica: Mórcio Roberto Vieira de Melo
Projeto gróflco e diagramação: Vivíon Rocha
Cotologoçõo no fonte
UnNersidode Federal de Alagoas
Biblioteca Central - Divisão de Tro tamento Técnico
Bibllotecório Responsável: Helena Cris11na Pimentel do Vale
lira. Fernando José de.
Formação d o riqueza e da pabreza de Alagoas I Fernando Lira. - Maceió :
EDUFAL. 2007.
320p. : il.. grofs.. tabs.
Bibliografia: p. 313-320.
l . Economia regional - Alagoas. 3. Alagoas -Aspectos sociais. 3. Riqueza -
Alagoas. 4. Pobreza - Alagoas. 1. Título.
CDU: 332.1 (813.5)
ISBN 85·71 77-31 3-4
Direitos desta edlÇõo reservados à
Edutal - Edlte<o dO Universidade Federal de Alagoas
Campus AC. Simões. BR 104, Km. 97,6-Fone/Fox:(82) 3214 1111
Tabuleiro do Martins· CEP· 57.072·970 ·Maceió · Alagoas
E-mail:edufal@edufal.urol.br - Site: www.edufal.ufal.br
À minha mãe Aliete e ao meu pai João.
A Adeilda e a milha querida filha Ilana.
Aos meus irmãos e irmãs, especialmente a Petrúcio.
Agradecimentos
Este trabalho é fruto de pesquisas feitas com estudantes
de graduação, em trabalho de iniciação científica, com
mestrandos do Programa Regional de Desenvolvimento
e Meio Ambiente (PRODEMA), em dissertação de
mestrado e, portanto, a essas pessoas, que contribuíram
direta e indiretamente, os nossos agradecimentos.
Agradecimentos especiais aos colegas professores Cícero
Péricles de Carvalho e Rodrigo Ramalho Filho que leram
os originais. O conteúdo apresentado e os erros cometidos
são de minha inteira responsabilidade.
Agradecemos, ainda o SEBRAE pelo apoio fornecido,
particularmente ao Marcos Vieira.
Sumário
Introdução, 1
Capítulo 1: Formação do paraíso sucroalcooleiro, 9
1.1 - A conquista da terra, 15
1.2 - Reprodução e subordinação da força de trabalho, 39
Capítulo II: O poder de base agrária, 51
2.1 - As raízes do poder em alagoas, 52
2.2 - Os proprietários do poder, 80
2.3 - Um padrão de crescimento excludente, 87
2.4 - O aumento da riqueza, 93
2.5 - O modo latifundiário de produção, 97
Capítulo III: A ilusão da inclusão, 103
3 .1 - Características locais, 105
3.1.l - Leste, 109
3.1.2 - Agreste, 110
3.1.3 - Sertão, 111
3.3 - Formas de ocupação, 113
3.4 - A indústria do Estado de Alagoas, 123
3.4.1 - Caracterização tecnológica, 124
3.4.2 - Estratégias de gestão da produção, 126
3.4.3 - Estratégias voltadas ao meio ambiente, 130
3.4.4 - Emprego e recursos humanos, 132
3.4.5 - Treinamento e educação formal, 150
3.4.6 - Caracterização geral das empresas inovadoras,156
3.5 - A economia dos serviços em Alagoas, 158
3.6 - Emprego e recursos humanos, 164
3.7 - Requisitos de escolaridade formal, 173
Capítulo IV
4.1 - Ocupação, renda e exclusão, 179
4.2 - Retrato dos sem futuro, 193
4.3 - Os trabalhadores fora da lei, 211
Capítulo V: Alagoas aos pedaços, 221
5.1 - C~ract~rização socioeconômicas das sub-regiões, 224
5.2 - Dmâm1ca econômica, 225
5.3 - Aspectos sociais, 225
Capítulo VI: Estrutura produção monopolista, 251
6.1 - Emprego e renda, 281
6.2 - Natureza e realidade das empresas nas sub-regiões, 285
Considerações finais, 305
Blibiografia consultada, 313
Introdução
Em Alagoas, as sesmarias doadas aos futuros
senhores de engenhos localizavam-se nas melhores terras.
Favorecida por solos de massapé, várzeas, encostas e rios todos
caudalosos e navegáveis, a atividade açucareira encontrou, nessa
província, condições excelentes para a implantação e expansão
dos engenhos de açúcar. Os engenhos, a princípio, localizados
em Porto Calvo, logo aumentaramemárea e número, alcançando
todo o litoral e Zona da Mata alagoana.
Assim, com o apoio imperial, que tinha o açúcar como o
grande negócio estabelecido na colônia, a partir do século XVIII,
Alagoas transformou-se numa província de predominância
absoluta da cana-de-açúcar. Os amigos do governo provincial e
do Imperador recebiamsesmarias, recursos financeiros e escravos
para avançarem nas ocupações da região alagoana e,
conseqüentemente, produzirem mais açúcar para ser exportado
para a Europa.
No intuito de aumentarem a produção e a exportação de
açúcar, os senhores de engenho derrubavam as matas,
expulsavam os índios, confinando-os em aldeia, de modo a
permitir que o avanço da plantação de cana, na forma de
monocultura,fizesse de Alagoas a segunda região mais produtora
de açúcar, no Brasil colonial.
Esse domínio da monocultura da cana-de-açúcar, baseada
na doação de sesmaria e na mão-de-obra escrava, fazia dos
senhores de engenhos grandes latifundiários e possuidores de
poder econômico e políticona província alagoana. A terra, doada
Formaçõo do riqueza o do pobreza de Alagoas 1
l'Jn ubumllndo, para os senhores de engenho plantarem cana,
l'ru d~· dif(d Jac0sso aos pequenos produtores de culturas voltadas
t p rodução de alimento para abastecer a população. Por
conseguinte, toda a população de Alagoas vivia na dependência
da importação de alimentos e dos grandes latifundiários, que
usavam a terra como um forte instrumento de poder.
Então, corno senhores de engenho e do poder absoluto,
receberam todo o apoio da Corte Portuguesa, do governo impe-
rial brasileiro, bem como dos governos republicano e estadual.
Por mais de três séculos, o engenho de açúcar era a única unidade
de produção socialmente dominante e economicamente viável
que existia em Alagoas. As outras atividades surgiram derivadas
das necessidades do engenho. Assim foi com a pecuária, com a
produção de alimentos, com os pequenos produtores
independentes e com os comerciantes.
Nesse sentido, a formação econômica, social e política de
Alagoas tem raízes profundas no modo de implantação da
atividade canavieira, no Estado. Por conseguinte, do século XVI
ao século XX, a história de Alagoas tem como núdeo a história
da agroindústria do açúcar.
Nessas condições históricas, o padrão adotado é o agrário
tradicional que, pelasuaimportância econômica e política, acaba
por definir o comportamento da agropecuária, da indústria, do
setor serviço, do setor público e da sociedade em geral. Nesse
modelo, a prioridade é a grande empresa - com mais de 100
empregados, onde existe pouca diferenciação da produção, baixa
competitividade sistêrnica e relações de trabalho predo-
min~ntemente informais, gerando forte exclusão social rum
ambiente desfavorável aos pequenos e microempreendedores.
No setor agricola, corno já destacamos, predomina a cultura
da cana-de-açúcar e a pecuária de leite praticadas em grandes
propriedades - acima de 1.000 hectares de terras - ocupando uma
área de538mile295milhectares respectivamentee,porconseguinte,
2 Fernando José de Lira
a cana-de-açúcar ocupa 69,3% da área cultivada, sendo que sua
predominância está na Zona da Mata e nos Tabuleiros Coste~o~. ~
pecuária de leite no Sertão, principalmente em tomo do muruop10
de Batalha, representa 97,7% da área com pecuária.
Quanto à ocupação de mão-de-obra em2000, a tabela1 deixa
claro que as culturas da cana-de-açúcar, mandioca e milho for~m
as que mais empregaram. Na pecuária, a bovinocultura de leite
demandou 80% dos ocupados nessa atividade. As culturas de
mandioca, milho, arroz e feijão, cultivadas por pequenos produtores
- com até 100 ha de terras - foram responsáveis por 12,3%, 10,2%,
4,6% e 3,4%, respectivamente, do total de mão-de-obra.
Juntas, essas culturas demandaram quase um terço dos
ocupados agrícolas. Localizadas principalmente no A~reste e
na região do Baixo São Francisco, são cultivadas em s1~temas
agrícolas de baixo nível tecnológico e destinadas ao abastecrmento
do mercado interno.
A cultura do fumo é uma atividade de alta produtividade
e, no passado recente, também de alta rentabilidade, a~ém .de
grande empregadora de mão-de-obra. A região fumageir~ fica
situada no Agreste, tendo por base o município de Arapuaca,
centro produtor, industrializador e distribuidor do produto. ~n­
tre 1973e1983, a taxa de crescimento da produção de fumo foi de
5% ao ano, praticamente como resultado da expansão da área
plantada. Já no período de 1984 a 1994, a produção caiu 3,4% ao
ano, tanto na área cultivada como no rendimento da terra.
Atualmente, o fumo apresen:ta baixo dinamismo, devido à
insuficiência em pesquisa, controle de qualidade e assistência
técnica, além de baixo preço.
No setor industrial, destacam-se as grandes unidades
agroindustriais das atividadessucroalcooleiras,representa~as por
alimentos e bebidas que, em 1999, possuíam 49 umdades
industriais, ocupavam39,5% do total e 81,3% da mão-de-obra do
setor. A indústria intermediária, de bens de capital e de consumo
Formação do riqueza e do pobreza de Alagoas 3
d11mvc•l1-1, t pouco representativa e é basicamente indústria
qu11nk11 t' dl.! combustíveis que ocupa 68,5% dos empregados do
lul1il d11s inuústrias desse ramo.
Eni suma, a característica mais marcante da indústria
nlugoana é a enorme importância da divisão de alimentos e
bebidas decorrente da produção de açúcar. Essas indústrias
empregam81%de todas as pessoas ocupadas na indústria e junto
com os 9% dos trabalhadores empregados no segmento de
química e combustíveis, que tambémcontéma produçãode álcool
combustível, demonstram a verdadeira importância econômica
e política do complexo sucroalcooleiro.
. A dis~ibuição espacialdesse tipo de indústria não privilegia
a rrucrorreg1ão de Maceió, uma vez que a usina de açúcar e a
de~tilaria de álcool localizam-sejunto à fonte de matéria-prima e
mao-de-obra, contribuindo para o emprego de mão-de-obra
agrícola não qualificada e gerando muitas ocupações não-
agrícolas no meio rural.
Portanto, a agropecuária e a indústria alagoana, ao contrário
do que ocorreemSanta Catarinae nos demais Estados brasileiros,
são constituídas, principalmente, por unidades de grande porte,
o que se deve ao tipo de produção das usinas de açúcar que
demandam áreas de grande tamanho. É possível, todavia, que
~equenos produtores, organizados em cooperativas, possamcul-
tivar a cana-de-açúcar com grandes possibilidades de sucesso.
Emrelação às condições de trabalho, em 2001, eram bastante
precárias, pois 86,8% dos ocupados na agricultura eram
trabalhadores informais. Na indústria, a informalidade chegava
a 60,5% dos empregados e, no setor serviço, mais de 72% não
tinham carteira de trabalho assinada e não contribuíam para a
previdência social.
Quanto ao nível de informalidade das ocupações, de forma ·
desagregada, a construção civil é o ramo que possui a maior
proporção de ocupados informais, 97,4%; seguida da agricultura
4 Fernando José de Lira
com 86,8%; outras atividades com 81,2%; o comércio de
mercadoria apresentando 76,6% e, nos serviços auxiliares da
atividade econômica, existiam 55,2% dos ocupados sem carteira
de trabalho assinada. Porseu turno, as atividades com maior grau
de formalidade eram o setor público, com 81,8% dos ocupados;
serviços, 76,5%; transportes e comunicação, 74,8%; e outras
atividades industriais nas quais 69,4%das pessoas tinhamcarteira
de trabalho assinada.
Assim, o padrão de desenvolvimento adotado partiu da
premissa de que o crescimentoeconômicoseria capazde ~:on:over
0 desenvolvimento humano. Sabemos, hoje, pela expenenc1a de
três décadas de aumento vigoroso da riqueza, que esse modelo
não se mostrou eficaz no que se propunha, entre outros motivos,
porque, oferecendo nível mínimo de desenvolvimento social às
sociedades, acarreta dificuldades para se expandirem de forma
sustentável. De acordo com Franco (2001), para uma sociedade
atingir o estágio de desenvolvimento, a acumulação do capital
humano e do capital social são dois fatores decisivos.
Nesse padrão adotado, o crescimento do Produto Interno
Bruto consegue acumular-se por um período limitado, mas não
alcança um nível de desenvolvimento sustentável. Esse é
justamente o caso de Alagoas, onde o capital social e o huma~o
fkam muito abaixo da média do Nordeste, estando entre os mais
dt'sfavoráveis do Brasil.
Franco (2001) argumenta, ainda, que, do ponto de vista do
rnpilo1social, a cooperaçãoé o primeirofatorque cria uman:1biente
fovm6vcl ao desenvolvimento. E, paraque esse desenvolvimento
seja suslcntável, é necessário que se instale, na coletividad~, u~a
cultura uccooperaçãosistêmica. O padrão vertical de orgaruzaçao
mais a subordinação e dependência que existem em Alagoas, no
setor agropecuário, impedem a geração, a acm~ulação e.ª
reprodução do capitalhumano e do social emcondiçõesfavoráveIS
ao desenvolvimento da sociedade como um todo.
Formaçõo do riqueza e da pobreza de Alagoas 5
Ainda de acordo com Franco (2000), a acumulação de
capital social se dá num ambiente de cooperação em formação
de rede, ou seja, numa cultura de network e de democracia,
significando dizer que a democracia é, juntamente com a rede,
um ambiente necessário ao desenvolvimento.
Assim, criar wn ambiente favorável ao desenvolvimento so-
cial e humano sustentável é começar investindo no capital social e
no capital hwnano, sobretudo nas atividades de natureza familiar.
Alagoas é um espaço político, econômico e social que
garante certas especificidades no desenvolvimento social e
humano. Sua identidade foi construída através das imposições
de um setor agroindustrial dominante, cuja elite desenvolveu
~ormas de controle rígido e antidemocrático, apropriado a seus
mteresses econômicos e de poder.
Esse poder político que, ao definir suas prioridades,
privilegiou uns poucos eexcluiuo grosso da população da riqueza
gerada, é um poder autocrático, porque gera um ambiente
eco~ômico, social e político que dificulta a acumulação de capital
social e humano, bem como o acesso aos meios de sobrevivência
à maioria da população.
Nessesentido, o modelo deprodução não-agrícola e agrícola
dominante na microrregião de Maceió e no restante do Estado é
um pa~rão fechado, de consenso muito restrito, mas que
subordina toda a economia de Alagoas no que diz respeito à
produção, relações de.trabalho, ocupação, cooperação, inovação
tecnológica, criação de redes e capacidade empreendedora, etc.
_O Estado, fora da microrregião de Maceió e daquelas
donunadas pela cana-de-açúcar, é um vazio econômico que ainda
está por ser explorado de forma produtiva e empreendedora.
O modelo agrícola adotado pela maioria dos pequenos
produtores é herdado do período colonial, e, na verdade, vem
sofrendo apenas pequenas transformações. As práticas agrícolas
quase feudais, cujas ferramentas de trabalho são a enxada,
0
6 Fernando José de lira
machado e o facão, perduram até os dias atuais. São pequenos
produtores com até 2 empregados, na sua maior parte
analfabetos funcionais e com baixa acumulação de capitalsocial,
mas passíveis de se transformaremem pequenos empreendedores
cm atividades agrícolas e não-agrícolas no meio rural.
Na seqüência, no primeiro capítulo, trataremos da forma
de implantação e avanço da cana-de-açúcar, desde o período co-
lonial até os dias atuais. No capítulo II, faremos uma abordagem
sobre o modo de produção da atividade açucareira e das relações
de propriedade, de produção, de trabalho e sociais, que esse modo
de produção engendrou. No capítulo III, faremos a análise do
modelo de desenvolvimento econômico e social adotado em
/lagoas, bemcomo do papel das elites canavieiras na formação e
sustentação desse modelo. Finalmente, na conclusão,
mostraremos que a economia e a sociedade alagoana estão
umbilícalmente dependentes das atividades geradas pela
ugroindústria canavieira.
Formação do rlquezo e do pobreza de Alagoas 7
Capítulo 1
Formação do paraíso sucroalcooleiro
Os portugueses que, em 1500, viviam a fase do
capitalismo mercantil, ao chegarem à Bahia, estavam ~~is
preocup~4_os com eIJcontr.ar, no Brasil, produtos comerciais
possívêis d~seremexport_a'!._os p~aEuropa, quêlhes permitissem
fazer fortuna. Inicialmente, exploraram o pau-brasil que, em
abundância e facilmente extraído no litoral brasileiro, tinha grande
aceitação no mercado externo, como matéria-prima para
fabricação de tintas corantes.
Assim, a descoberta de uma nova colônia promissora
estimulou o governo português a enviar ao Brasil outras
expediçõesimportantes no processo de colonização. A expedição
de Martins Afonso de Souza e~tava interessada em explorar
atividades comerciais que, além de_gerarem produtos aceitos no
mercado externo, conb'ib-uí~m par~ a efetiva ocupação da nova
colônia, no sentido de consolidar a presença portuguesa em
território brasileiro.
Para alcançar os dois objetivos, um imediato, que era a
exportação de produtos da terra, e outro - mais de médio e longo
prazos- a colonização~ a Corte Portuguesa via, no açú~§lr E:Q~~-zi_do
a partir da cana, Q pfõ"aiito idealp;r~ g~a~tir segs obj~tiyos.
Informada da abundância de terras no Brasi.!,_Er~c~a~ à cana-de--
açúcar, a Corte Portugues~roporcionou apoio~ à i~plan_!aç@ e
exploração da ati; idade âçucareira em esc~la_c~rcial.
Introduzida no Brasil, no século XVI, é, principalmente na
Bahia, em Pernambuco e São Vicente, que a cana-de-açúcar vai
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 9
:nconlT~r as condições de clima, solo e mão-de-obra capazes de
tmpul~1onarem sua expansão. Além disso, como produto
comer~ialment:aceito no mundo inteiroe comoatividade agrícola
e ag~omdustnal, que ocupa muita terra e mão-de-obra, foi
consid~rada prioritária para o processo de povoamento e
ocupaçao da nova colônia.
Dividido o Brasil em capitanias hereditárias, nos séculos
~ e XVII, as capitanias da Bahia e Pernambuco foram as que
mais prosperaram. Seus donatários, sob orientação da Corte
Portuguesa, criaram as chamadas sesmarias, que compreendiam
vasta extensão de terras cultiváveis. Essas sesmarias eramdoadas
às pessoas amigas ou próximas ao poder de um donatário e do
Imperadpr, preferencialmente para o cultivo de cana-de-açúcar.
A política de Portugal consistia no estímulo à empresa
comercialcom base em poucos produtos exportáveis, produzidos
er:i grande escala e baseados na grande propriedade. Conforme
afuma Mendes Jr. (1976, p.68), no século XV, o açúcar era uma
especiaria utilizada como remédio ou condimento exótico-)
Somente no século XVI, passou a ser um produto de consumo de
massa e de alto valor comercial no mercado europeu.
. Nã~ se sabe bem a data em que a cana-de-açúcar foi
introduzida no Brasil, todavia nas décadas de 1530e1540 a sua
produçãojá eraimportante. Já em1532, Martins Afonso deSouza
em expedi~:ºª.º Brasil,_~ouxeportugueses, italianos e flamengo;
com ~xpenenc1a n~ atividade açucareira, adquirida na Ilha da
Madeir~, que era uma colônia portuguesa com grande sucesso
no cultivo da cana e fabrico do açúcar de boa qualidade, aceito
em todo o continente europeu.
A partirda década de trinta, do século XVI, plantou-~ecana
em todas as cap~tanias brasileiras. Porém, na verdade, os grandes
c~ntro~aç~careiros da colônia foram Pernambuco, Alagoas, Ba-
hia,e.Sao Vicente, em São Paulo. Fatores climáticos, geográficos,
pohticos e econômicos justificam essa localização.
1O Fernando José de lira
As capitanias de Pernambuco e da Bahia possuíam boa
111111lidnde de solo, um adequado regime de chuvas e estavam
1, tl ,, lizadas mais perto dos centros importadores da Europa.
l 1J11tavam, também, com relativa facilidade de escoamento da
pmdução, pois Salvador e Recife se tomariam, como se sabe,
Importantes portos de exportação.
t Paraatingir essa expansão, a cana necessitou de muita terra,
1iu10-de-obra e vias de escoamento. A terra foi doada aos
produtores na forma de sesmarias muitas vezes sem limites
definidos. Havia algumas cujos limites eram os rios, já outras
possuíam em tomo de 32 mil quilômetros quadrados. Por essas
uimensões, percebe-se o tamanho exageradamente grande da
propriedade onde a cana-de-açúcar começou a ser cultivada.
Essas grandes áreas de terra, aparentemente livres, não
t!ram tão livres assim. Em muitas delas, os seus proprietários,
que as rec~biam como doação, tinham que conquistar, na
prática, cada quilômetro da propriedade, pois os índios que
ali viviam também se consideravam donos. Eles não
aceitavam pacificamente a sua expropriação, ,resistindo com
os meios que possuíam.
Acostv.madosa viverem na mata, osíndiosconheciamcomo
ninguém os seus esconderijos e se embrenhavam na floresta em
posições de ataque ou defesa, todavia suas armas eram muito
primitivas e de pequeno alcance. Quanto aos europeus, estavam
bemarmados e viam os índios como grandes irúmigos pessoais e
do progresso, portanto usavam de todos os meios para elimiriá-
los ou expulsá-los para lugares mais distantes, até forçar a
desocupação das terras pertencentes aos sesmeiros.
Nessas condições, muitos índios morreram de fome ou se
suicidaram. Aqueles que suportaram o aldeamento eram
discdminados e perseguidos pelos colonos. Por tudo isso, o
avanço da cana-de-açúcar representou urna grande tragédia à
pQpµ_laç~o indígena do Nordeste.
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 11
De acordo com Boris Fausto (2000, p.155) a escravidão
dos índios enfrentou uma série de dificuldades, tendo em vista
os objetivos dos plantadores de cana. Os índios tinham uma
<.:ultura incompatível com o trabalho intensivo e regular que era
exigido pela atividade açucareira, principalmente se esse
trabalho fosse prestado na forma de escravidão.
Como os colonizadores queriam cultivar a cana-de-açúcar
num modo de produção racional, a escravidão dos índios teria
que ser feita também nesse modelo econômico de fluxos de
despesas, receitas e lucros, sem qualquer respeito à cultura
indígena, obrigando-os a trabalharem de sol a sol e a viverem em
condições de habitação, saúde, transporte e trabalho
extremamente difíceis.
. Os cuslos de captura, a recusa do trabalho forçado, a fuga
relativamente fácil e a resistência pela guerra faziam dos índios
uma força de trabalho de custo baixo, mas totalmente desajustada
ao modo capitalista de prodúção que prevalecia nocaso da cana-
de-açúcar.
Outro fator desfavorável à escravidão dos índios, apontado
por Carlos Fausto (1992, p.80), diz respeito às epidemias
adquiridas com o contato com os colonizadores. Sem possuírem
imunidadeàs doenças dos brancos, elesforam vítimasfáceis, pelo
menos do sarampo, da varíola e, principalmente, da gripe.
Emface dessa forte limitação do trabalho escravo prestado
~elos ~dios, a partir da década de 1570, a coroa portuguesa
mcentivou a adoção de escravos africanos, e foram feitas várias
leis, proibindoa escravidão indígena. Em 1758 (quase dois séculos
depois), foi determinada a liberdade definitiva dos índios.
A partir de 1574, iniciou-se a escravidão africana. Em 1638,
africanos e afro-brasileiros, compunham a força de trabalho. Esse
tipo de mão-de-obra veiosubstituira escravidão indígena, pois, por
seremmais disciplinadosno trabalho,maisprodutivoseporestarem
emterras estranhas, os negros produziam muito mais que osíndios.
12 Fernando José de lira
No século XVI, a Guiné e a Costa do Marfim forneceram o
111 11111 numero de escravos. A partir do século XVII, Congo e
Ang11ln tornaram-se os centros de exportação mais importantes.
1 1111·1· 1550 e 1e55, entraram pelos portos brasileiros milhões deles.
Al.1noas recebeu muitos de Angol~. .
Em1860, a população de Alagoas era de 249.704 habitantes.
lJi•'1SC total, 44.418 eram escravos, sendo que 88,5% desses
.t.1vam no meio rural e trabalhavam na cana-de-açúcar. Na
, , rdade, o povoamento de Alagoas iniciou-se n.o século XVII,
, 1111ccntrando sua população em Porto Calvo, Alagoas do Sul,
· lngoas do Norte, Penedo e Atalaia. A cana-de-açúcar e,
11..Hociado a ela, o negro, foram responsáveis por assegurar o
povoamento da província.
O senhor de engenho achava-se dono do escravo, pois tinha
1
,11go preçoelevado porcadaafricano. Exigia.que trab'.1111as~e além
do limite de sua capacidade física e, por isso, mmtos ficavam
dlH..>ntes ou inválidos. Por qualquer falha cometida, o escravo
11•cebia punição.
Quanto às terras, essas eram doadas aos senhores de
1•ngenho paraque planta1?semcana e povoassem toda a área.Para
t>lógues Júnior, (1976, p.70), o povoamento de Alagoas começou
i•íolivamente a partir de Cristóvão Lins. Sua expedição, realizada
i•m 1585, povoou o norte de Alagoas. A cana-de-açúcar se
tornaria, portanto, o principal produto comercial que veio
usscgurar o povoamento e a vida econômica, social e política da
província de Alagoas. Esse povoamento e essa formação dão-se
inicialmente em tomo de rios e lagoas.
Por outro lado, o povoamento do Sertão dar-se-ia,
principalmente, através do RioSãoFrancisco. Fixando-senas s~~s
margens e aproveitando-se da riqueza dos seus vales, ina
desenvolver-se a colonização da província de Alagoas, baseada
na cultura da cana-de-açúcar, tendo corno figura central a
chamada de senhor de engenho.
Formação do riqueza e do pobreza de Alagoas 13
Em Alagoas, aproximadamente dez fanúlias de senh
de e g nh ores
n e o, que eram donas de quase todas as terras do Estado
e que, na época, cultivavam cana, eram, também, as responsáveis
pelo povoamento das principais vilas e cidades do Estado.
N_esse se~ti~o, o senhor de engenho está no núcleo da
~r:~ç~o economica, social e política do Estado, portanto a
s na o açúcar, em Alagoas, confunde-se coma própria histó .
da s f - - na
~~ .ormaçao. A formaçao e o crescimento dos principais
mumc1p1os do Litoral, da Zona da Mata, do Baixo São Francisco
e até do Sertão alagoano devem-se ao avanço do senhor de
engen~o na a~ropriação de novas terras, aumentando a
produçao de açucare pecuária.
A a~vidade canavieira, com o sistema de produção que
a~o~ou, nao consegufu conviver harmoniosamente com outras
atividades agrícolas e não-agrícolas, que não estivessem em
colaboração estreita com o seu modo de produção. Assim foi, por
exernp~o, co~ a pecuária. Os senhores de engenho, necessitando
de muitos anunais p , .
ara exercerem vanas tarefas nos canaviais
passarama criar cavalos, burros e bovinos, mas 0
feiJ'ão
0
mi1h '
d • tinh I O e
a man ioca am suas áreas limitadas pela cana.
~o século XIX, no Brasil e no Nordeste, passou-se a culti-
~armu1t~ algod~opor muito tempo, pois o seu preço no mercado
mterna~1onal fo1 bastante atrativo. Essa grande rentabilidade
econô~ca do algodão não chegou, todavia, a afetar a atividade
canav1e1ra. Apenas nµm período muito curto, imaginou-se que o
algodão poderia vir a ser uma segunda alternativa à cana
. , ma~
com a_concorr~nc1a americana, logo esse surto de exportação de
algodao reduzm-se drasticamente.
Várias fo~am as crises da falta de alimentos na província.
Escassez ~e feIJão e farinha foram as principais. Em algumas
d~~sas cnses, o presidente da província, reconhecendo as
~ificuldades por que passava a população, tomava a decisão de
importar os produtos de outros países, e o próprio Estado fazia a
14 Fernando José de lira
11Nll thuição nos engenhos. Em 1723, por exemplo, houve uma
B' Vl' crise de falta de farinha. O presidente teve que adotar
nwll1d.is especiais para importar esse produto.
A dependência da província de Alagoas do Estado de
f'1 111.1mbuco trazia uma série de problemas políticos, econômicos
~ 11 Irninistrativos para os senhores de engenho, o que motivou
lllll movimento de independência, conquistada em 1817.
Assim, em 1817, Alagoas tornou-se independente de
l11•rnambuco, entretan to, completamente dependente da
11llvH.lade açucareira.
Com a independência, o poder político dos senhores de
i•11g11nho irradiou-se por todo o Estado. Ver~adores, prefeitos,
il1•putados, senadores e governadores eramsenhores de engenho,
1111 membros de sua família. O modo de vida social e cultural da
p11pulação estadual era ditado pela unidade familiar, que
ll'llll'Sentavà o senhor de engenho. ·
De acordo com Diégues Júnior (1986, p.60), "o engenho era
11 nucleo político e social do Estado. Foi nos engenhos que se
n"wntou a formação da família e sociedade alagoana, e o senhor
l1· 1·ngenho era a grande figura da paisagemsocial de Alagoas. É
111•li•que se centraliza a organização social da família alagoana."
Portanto, o senhor de engenho não era apenas o chefe de
811 1 propriedade. Seu prestígio dominava todo o espaço que o
11•nVa. Ele gerava um modelo de desenvolvimento que definiu
,,,. linhas básicas de um sistema de produção, baseado na grande
pwpriedade e no escravo que, após a sua libertação, marcou
1h•finHivamente a história do Estado.
1.1 - A conquista da terra
Considerações de ordem política, tais como possibilidade
dl invasões de outros países e da própria França, que só
n•conhecia como dono da terra aquele país que efetivamente a
Formoçõo do riqueza e da pobre:zo de Alagoas 15
ocupasse, a Coroa Portuguesa passou a ter a convicção de que
era necessário colonizar a nova terra descoberta. A partir de
1530, Portugal, temendo perder o controle da colônia, resolveu
fazer uma política de povoamento.
Em Alagoas, Duarte Coelho foi o primeiro colonizador a
plantar cana e também doar terras aos amigos. Procurou
escravizar os índios e conseguiu financiamento para instalação
de en~enho, mas, de acordo com And~ade· (1998, p.50), as
sesn:anas podiam ter dimensões ilimitadas. A partir de 1695,
porem: passaram a ter extensões máximas de 4 léguas de
comprimento por uma légua de largura. No século XIX,
passaram a ser de uma légua em quadrado.
Na realidade, Duarte Coelho, num período de 20 anos,
conquistou poucas terras, e coube a Gerônimo de Albuquerque,
após 1553, a conquista das várzeas, ampliando consideravelmente
a área plantada com cana. Os filhos do donatário, Jorge e Duarte
Coelho de Albuquerque realizaram, na sétima década do século
XVI, a conquista das várzeas dos rios Jaboatão, Ipojuca, Serin e
Pararnarim, além de estenderem o povoamento europeu quase
até à foz do Rio São Francisco.
Para Andrade (1998, p.40), essa expansão fulminante para
o sul do Estadofoi resultado do fortalecimento dos colonizadores
e da necessidade de terra para plantar cana. Esse avanço pelo
território indígena era feito comgrande energia. Aomesmo tempo
em que lhes tomavam a terra, aprisionavam-nos, colhiam-lhes as
lavouras encontradàs e plantavam cana.
Considerando que, no início do processo de colonização, o
Brasil não tinha concorrente na produção de açúcar no mercado
internacional, e os preços eram muito favoráveis, esses fatores
serviamde estímulo paraque os senhores de engenho ocupassem
novas terras na província de Alagoas.
Assim, o senhor de engenho vai se transformando num
símbolo da propriedade, confundindo-se com o latifúndio que,
16 Fernando José de lira
,1té nossos dias, caracteriza atividade canavieira. Com esse
l.iistema de produção à base da grande propriedade, o engenho
tornou-se o sustentáculo da colonização de Alagoas. Ser grande
proprietário e bem-sucedido significava plantar cana e possuir
i•ngenho de açúcar. A tabela 1.1 mostra a forte co~ce~tr~çã~ ~e
terra registrada em 1950 pelo IBGE, resultado da ma distnb~1çao
da propriedade da terra, iniciada a partir das sesmanas e
fortalecida com a Lei de Terra, de 1850, que só permitiu a posse
da terra, através da compra ou herança.
TABELA l .l - Alagoas: Distribuição percentual do núr;iero
de estabelecimentos agropecuários e de sua area
correspondente, no ano de 1950.
.. EM PERCENTAGEM
EXTRATOS 1950
EM HECTARES NÚMERO EM% 00 EM %
MENOS DE 10 72% 8,4%
OE 10AMENOS DE 100 23% 23%
DE lOOAMAIS 5% 8,6%
TOTAL 100% 100%
Como se vê, foi através da atividade açucareira feita à base
da grande propriedade que se expandiu a economia. .
O período democrático, que vai de 1945a 1963, f01 também
muito favorável à atividade canavieira. A 18 de setembro de 1945,
t'l'O promulgada a nova Constituição Brasileira, com base na
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 17
ideologia liberal democrática. O Brasil foi definido como uma
República Federativa, estabelecendo as atribuições à União,
Estados e Municípios. A representação política favorecia mais os
Estados menores, como Alagoas, Sergipe e o Espírito Santo, etc.
No início da década de cinqüenta, o governo federal
promoveu várias medidas destinadas a incentivarem o
desenvolvimento econômico nacional, com ênfase na
industrialização. Uma delas, a fundação do Banco Nacional de
Desenvolvimento (BNDE), em1952,paracuidarda infra-estrutura
de estradas, energia e comunicação.
O desenvolvimento industrial era estimulado pela
concessão de crédito fácil ao setor privado, por parte dos bancos
oficiais, especialmente do Banco do Brasil. Esse interesse pela
industrialização não afastou Getúlio Vargas dos grupos
econômicos dominantes em âmbito regional e local, como o do
café em São Paulo e o do açúcar no Nordeste.
A partir de 1956, Juscelino Kubstchek assume o governo
com as mesmas preocupações de Getúlio, no tocante ao processo
de industrialização. Também faz uma aliança comas oligarquias
regionais, garantindo privilégios e poder para os produtores de
açúcar do Nordeste.
O governo João Goulart era populista e defendia as reformas
de base,entreelasareformaagrária, quedeveriaprotegerapopulação
do campo, aumentar a produção de alimentos e gerar uma nova
demanda para os produtos industriais. Por isso, a elite nacional,
principalmenteosgrândes latifundiáriosdo açúcar, deixa de apoiaro
governo, muito contribuindo para a suaqueda, de forma que, em31
demarço de1964,os militaresassumemopoder,numgolpedeEstado.
A criação do IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool), no
governo Vargas, aprofundou a relação do Estado como complexo
canavieiro de Alagoas. Ao determinar os preços vantajosos e ao
buscar também um desenvolvimento equilibrado, no sentido de
que a produção de açúcar de São Paulo não inviabilizasse a
18 Fernando José de Lira
11i11dução nordestina, o IAA acabou beneficiando duplamente
(1!1 u.-.lneiros do Nordeste.
Com o crescimento da produção paulista, desde os anos de
J•l l()1 já na safra de 1951/52, São Paulo passou a superar o princi-
Jhil produtor, que era Pernambuco. Assimpressionou o IAA para
q111•liberasse as cotas. .
Aproveitando-se do clima democrático no país, os paulistas
1 1 111~eguiram aumentarsua participação no mercado deSão ~au!º·
tnnlo Alagoas como P~rnambuco ficaram abastecendo o Distrito
ftt•dl'rill, e o excedente era exportado.
Com apoios favoráveis, a produção de açúcar de Alagoas e
t'i•rnambuco continuou crescendo, como vinha ocorrendo antes,
11 wd iante incorporação de novas terras antes ocupadas por
111111•ac.lores, fornecedores, foreiros, arrendatários, que cultivavam
pnitlutos consumidos no mercado local. . .
Em face dessa expropriação de terra, feita pelos usme1ros,
flnu vc vários sinais de descontentamentos no meio rural,
I''hll'ipalmentecomacriaçãodas ligascamponesas, dos sindicatos
1111 11iR e das cooperativas de fornecedores.
Para acalmar a situação do campo, foram garantidas cotas
ili• produção de açúcar para os fornecedores e idealizou~se o
11..1.iluto c;lo Trabalhador Rural, que estendia aos desse meio os
nwsmos benefícios que a legislaçãooutorgavaaos do meio urbano.
Esse estatuto não teve o efeito esperado. Ao contrário, muitos
11/jinciros procuraram preteriro trabalhador permanente e con.tr~tar
l'l''l"IOas semqualquer vínculoempregatício,através~~ emprelt~rro,
qtH' fl'Crutava trabalhadores temporários, o que dificultou, ainda
llMI~, ns condições de vida dos trabalhadores rurais de Alagoas.
Ar. condições favoráveis oferecidas pelo governo à atividade
,,~ ur.ureira não davam margem a qualquer risco de preço e de
l11,.1manda do açúcar. Foi um forte estímulo para que houvesse uma
1~nmde concorrência entre os usineiros de Alagoas ~m ~dquir~em
ruais terras para a produção de cana e, por consegwnte, de açucar.
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 19
Com a concorrência acurada, os usineiros começaram a
adquirir terras, muitas delas fazendas consideradas
inapropr~adas ~arao plantio de cana, as quais, entretanto, depois
de altos mvestimentos agrícolas em adubação e mecanização,
transformaram-se nas melhores terras para essa produção.
. Pa~a Andrade (1997, p.55), quando o grupo pernambucano
dos 1rmaos Coutinho comprou a Usina Sinimbu, ela estava
condenada a ser uma pequena usina, porfalta de terras. Todavia,
quando o governo ofereceu as condições privilegiadas à cana
garantindo preço e compra da produção, os Coutinhos:
entusiasmados, resolveram investir nos tabuleiios e passaram a
derrubar florestas, expulsar colonos e sitiantes e a plantar cana.
A partir daí, com o aumento da área cultivada, a usina
começou a ser viável. Avançou muito em expansão de terra com
cana plantada. Essa expansão em diieção aos tabuleiros, iniciada
pela Usina Sinimbu e, também, seguida por outras usinas,
provocou um grande desmatamento e a desapropriação de terras
de pequenos agricultores que, expulsos da Zona da Mata do
.Litor~1 e do Sertão, haviam buscado refúgio naquelas terras ;nde
1magmavam que a cana nunca pudesse chegar.
Foi através dessa expansão das usinas nas terras dos
tabuleiros, na primeira metade do século XX, que Alagoas
transformou-se no maior produtor de açúcar do Nordeste
chegando a ocupar o segundo lugar no país. '
Essa forte exp~ão veio completar a ocupação das terras de
Alagoas. Assim, alémdeestender-sepelo Litoral, Zonada Mata, Baixo
SãoFrancisco, partedoSertãoe Agreste,aatividadecanavieirapassou
tambéma ocuparo planaltoalagoano, porque, plantada na forma de
~onocu1tura, acarretava a elirrúnação dos produtores agrícolas de
~entos, obr~g~do o Estado a importar a maioria dos produtos
agr1colas de pnmerra necessidadepara a populaçãofaminta.
Na visão de Andrade (1998, p.60), o que estava ocorrendo
era que as usinas, com elevada capacidade de esmagamento de
20 Fernando José de Lira
11111o1, lratavam de adquirir mais terras para satisfazer a fome de
11111.i de suas moendas. A ampliação das terras das usinas iria
11111•ntivar, cada vez mais, a concentração da propriedade da terra,
11111111Ja no período colonial, com a doação das sesmarias.
Essa concentração aprofundou-se a partir de 1890 e se
111111n!!ificou com a criação do IAA, na década de 1930. De 1930 a
l'l'~O, avançou muito em Alagoas e no Nordeste. Levando-se em
u111lt1 que o principal, senão o único, meio de vida da população
l"•t.1vana agricultura, a falta de terra deixaa sobrevivênciado grosso
d11 população de Alagoas subordinada à vontade dos usineiios.
Em face desse avanço desmedido e da destruição dos
l'•'llllcnos e médios produtores de cana, em 1941, o governo
t1"H>lveu, ainda que tardiamente, estabelecer o Estatuto da
l.11voura Canavieiia. Tinha como objetivo principal fortalecer os
pi-,ruenos fornecedores e engenhos que ainda resistiam à
11propriação, durante mais de três décadas de destruição.
Para Ramos (1999, p.90), a Lei número 3855, de 21 de
1111wmbro de1941, dizia que os usineiros não poderiam moermais
d11 que 60% de cana própria, e os outros 40% deveriamser de cana
rl1• 111rnecedores. Com essa lei, o governo procurava preservar da
1•llnçüo a média propriedade produtora de cana. Esse avanço da
, 11mpra e concentração da propriedade da terra vinha ocorrendo
dP1'ldc os anos de 1850, com a Lei da Terra. No caso de Alagoas, a
l.1 •i nº 3855 veio tarde, pois já havia sido destruída a possibilidade
d1•se criar uma classe média no meio rural e, por conseguinte,
liwlabilizadaaformação de ummercado internoimportante,capaz
d11uar suporte a um vigoroso processo de industrialização do
1iHhdO, bemcorno às outras atividades auxiliares da indústria e à
IH'l'tl uo setor serviç.o.
Na verdade, mesmo havendo preocupação como aumento
dt•sconb:olado da produção de açúcar, nunca se conseguiu
dl•lcr o seu avanço. Produzir mais cana significava ter mais
n•cursos subsidiados do governo para comprar mais terra.
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 21
Conseqüentemente, apesar de toda a legislação feita para proteger
os fornecedores de cana e para conter o excesso de produção, na
prática, essa legislação nunca produziu os resultados pretendidos.
Os usineiros eram º" principais beneficiários Ja legi!>laçao.
O maior incremento da produção de açúcar ocorreu nas
décadas de 50 e 60, quando, mesmo aumentando o seu consumo,
a produção gerava um excesso significativo, que era comprado
pelo governo. Por conseguinte, o apoio do Estado à produção e,
como conseqliência, o avanço do latifúndio aumentaram
independentemente da capacidade de absorção de açúcar no
mercado interno ou externo.
A década de 50 foi, particularmente, muito favorável para
os usineiros de Alagoas, pois passam a ocupar os tabuleiros que,
como dissemos, nos anos 1930, eram tidos como área imprópria
para o plantio de cana. Nesse período, alguns usineiros de
Pernambuco não perderam a oportunidade de expansão e se
transferiram para Alagoas. Viam, no Estado, a possibilidade de
aumentaremsuas terras eaté mesmo de compraremusinas inteiras.
De acordo com Andrade (1997, p.100), essa transformação
iniciou-se, principalmente, com os irmãos Coutinho, que foram
seguidos pelas famílias Assis, Inojosa, Maranhão, Brito, Bezerra
de Melo, Grupo Sampaio e pelos Lyra, fazendo aumentar muito
a disputa e valorização das terras férteis do Estado. O crescimento
da atividade canavicira e da produção de açúcar dependia, mais
e mais, de terras ª.serem incorporadas às usinas.
Para se ter idéia do avanço das usinas em território alagoano,
cm 1965,o Estadojácontavacom29 usinas. &sasaumentaram muito
a produção, o que significa passar a incorporar mais terras na fonna
delatifúndio. O Mapa1 mostra (cm vermelho) agrandeáreacultivada
com cana-de-açúcar por produtores que possuem mais de 100 hec-
tares. Só a usina Caeté, dispondo de grandes extensões de terra de
várzea e tabuleiro em São Miguel dos Campos, chegoua ultrapassar
a produção de 1 milhão de sacos de açúcar na safra 1976/77.
22 Fernando José de Lira
FIGURA 1.1 - No primeiro plano, notam-se os
instalações da usina Cae1é e. no segundo. ao
fundo. observo-se a cidad e de São Miguel dos
Campos.
FIGURA 1.2 - Cano-de-açúcar plantada pela usina
caeté em área de Tabuleiro. Observa-se a grande
extensão do área cultivada. pois a topografia plano
permite maior mecanização.
Formação do riqueza e do pobreza de Alagoas 23
f:v"APA 1 - Alagoas
~rea em cinza escuro: propriedades com
areas plantadas com cana-de-açúcar
em 1995/96 '
FONTE: JBGE, Censo agropecuário, 1995/96.
Co · f. .. mo vimos, a orte expansão das usinas deu-se sob grande
m~e~tlvo do governo à mecanização e ao uso de pesticidas o
ehrnmou ,'d , ' que
. , . um cons1 erável numero de postos de trabalho
tempor~nos e de moradores, substituídos por trabalhadores
eventuais, que ficavam ocupados menos tempo.
Isso gerou grande excedente de mão-de-obra no c
que cresceu à ~~<lida que as usinas expropriavam os peq:::;
produtores e sitiantes, com suas culturas de subsistência N-
encontrando espaço no campo passaram a m. · ~o
b . ' igrar para o rne10
ur ano, particularmente para Maceió.
Mes~oaqueles que passarama prestarserviços temporários
nos canav1a1s foram residir na periferia das cidades Pe bt . rce eu-se
p~r a~to, que o avanço da cana mudou significativamente a;
re açoes de trabalho bem como o espaço urbano A
traball d · · gora, o
~a .or presta serviço à usina, mas está subordinado a um
empre1teuoque, na maioria das vezes, era empregadoou morador
24 Fernando José de Lira
"' q111•, 111111 ,, l'Xpropriação de sua terra, tambémfoi morar
t lntlt•tt 1'111xi111.1s dos usinas, com todas as conseqüências que
t ilt 1 1 11 gP1·11 m> meio urbano.
nr.li 11111111çõcsurbanas, e nao mais as fazendas, passaram
t 11 1111v1,. h1caisde residência de trabalhadores rurais, sitiantes
1 mp11•g11dos d.as usinas, ex-pequenos produtores e ex-
fhUh 11 l'111'11 Beatriz (1998, p.40), os pequenos produtores
h11m 111 lg1•m nas sucessivas fragmentações das terras, em
tH 1c111 111, principalmente, da partilha de médias e grandes
p1h•d.td1•s, por motivo de herança.
11 pm,·asso de expropriação a que foram submetidos nas
;tllitt' ~ll• 60, 70 e 80, contemplava a compra da terra, pois, no
p.tu1•n11 1istado de Alagoas, já não havia terras desocupadas.
C111110, inicialmente, as terras não tinham muito valor, os
'4u1•111>1i produtores vendiam-nas para comprarem áreas
h111•t1, 1.•m locais mais distantes e menos férteis. Ocorre que o
1m~11 da cana chegou, também, a essas localidades,
lt1'Ji1111111lhilitando aos pequenos produtores a compra de novas
lt n.. plll$os preços eram muito superiores aos que lhes tinham
1il11 p.1gus, fato que os fez transformarem-se em trabalhadores
ti ti! wilnas.
Assim, o aumento das usinas, no Estado de Alagoas, além
1l1l1•rnr uma forte concentração de terra e grandes conseqüências
11111 l11is - incluindo a dificuldade de sobrevivência de ex-pequenos
1•111prietários, que lidavam com produtos de subsistência, e de
111111-..1uores e sitiantes dentro da própria propriedade da usina -
111w1ou, também, irreparáveis danos à fauna e à flora alagoanas.
De acordo com Andrade (1999, p.100), os herbicidas e
pPslicidas usados em grande escala mataram animais e plantas.
/s poucas florestas que ainda existiam na década de 60, nos
1.1buleiros, foram totalmente derrubadas. A tiborna das usinas,
que jogavam nos leitos dos rios, acabou por contaminar todos
11s que banhavam a Zona da Mata, Litoral e Tabuleiros.
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 25
Essas condições ambientais desfavoráveis dliicultaram a
vida de várias comunidades do Estado, que necessitavam de
água potável para uso doméstico, bem como inviabilizaram a
criação de peixes e crustáceos em escala comercial ou de
subsistência.
A poluição dos rios prejudicou bastante as populações
ribeirinhas que, além de ficarem privadas do uso da água e da
criação de peixe, passarama contrair muitas doenças endêmicas,
sobretudo as verminoses, incluindo a esquistossomose. Esse
problema de poluição foi particularmente importante no período
de implantação do Proálcool.
SegundoRamos (1999, p.100), para 1 litro de álcool, gastam-
se 35 litros de água potável e produzem-se 13 litros de vinhoto,
dos quais só uma pequena parcela pode ser utilizada emadubação
do solodos tabuleiros. Sua maiorparteé jogada nos rios do Estado,
causando a degradação do meio ambiente.
De acordo com Lima (1998, p.60), de todos os programas
lançados pelo governo federal nos anos 50, para expandir a
produção e oferecer condições privilegiadas aos usineiros, o
Proálcool foi o que proporcionou o maior aumento da produção
de cana e, conseqüentemente, resultouno mais intensivo processo
de poluição ambiental já registrado desde 1930. O aumento da
produção de álcool não foi conseqüência do aumento da
produtividade, mas tão somente de crescimento da área plantada,
com a lavoura qmavieira. O gráfico 1.1 mostra que, enquanto
59% de toda área agricultável de Alagoas são cultivadas com
cana-de-açúcar, as outras culturas, principalmente o algodão,
o coco e o fumo, utilizam uma área de tamanho irrisório.
26 Fernando José de Lira
( NAI lt O 1.1 - Alagoas: Área colhida das principais
l ~Jllu1us temporárias e permanentes, em 2001.
54,50%
1,60%
4,10%
5,90%
1,30%
ARCA CULTIVADA DAS PRINCIPAIS CULTURAS TEMPORÁRIAS E
PERMANENTES
CCANA·DE·AÇÚCAR •FEIJÃO
O MANDIOCA •ALGODÃO
•BANANA O LARANJA
FONTE: IBGE- SIDRA, 2002.
O MILHO
[}COCO-DA-BAIA
Formação da riqueza e do pobreza de Alagoas 27
Na década de noventa, entre as permanentes, predomina
o coco-da-baía, havendo urna queda significativa na área
colhida, que passou de 68,6%, em 1990, para 54,5% A banana,
de importância relativa para o Estado, sofreu queda da área
plantada em toda a década, ao contrário da laranja, que
apresentou um crescimento vigoroso, registrando de 2,4% da
área colhida, em 1990, para 18,2%, em 2001.
Em relação às culturas temporárias, percebeu-se,
claramente, o predomínio da cana-de-açúcar, mantendo
praticamente um percentual de área colhida próximo dos 70%,
seguida do feijão, com um comportamento muito inferior a esse,
crescendo de 1991a1995, para depois cair e permanecer na faixa
entre 12% e 13% da área colhida.
O que vale ressaltar é ofato deque, mesmo após duas décadas
de crise financeira profunda que afetou todos os produtores
agropecuários, a cana-de-açúcarnão registra queda da área colhida.
Ao contrário, a partir da segunda metade da década de 90,
apr~senta crescimento vigoroso, enquanto a mandioca, o algodão,
o nulho e o fumo são culturas pouco expressivas em termos de área
co~da, observando-se, quanto ao seu comportamento, pequenas
variações nos dois primeirosequeda drástica nos dois últimos anos
no final do período abordado. '
Em Alagoas, em 1975, foram cultivados 228 mil hectares
de terra com can~, o que corresponde a 65% de toda a área de
cultivo agrícola. Em 1987, passou-se a plantar 688 mil hectares,
o que representa aproximadamente 80% de toda a área cultivada
do Estado, e um aumento de área de 302%.
. A crise econômica e financeira que vem afetando Alagoas, a
par~ ~a segu~da metade da década de 80, decorreu da crise que
depnrruu drasticamentea agroindústria açucareira. O Brasil, a partir
da segunda metade dos anos80, também entra emcrise financeira.
Não dispondo de recursos internacionais enacionais, cortouquase
todos ossubsídios agrícolas em todo o território nacional, deixando
28 Fernando José de lira
Mll'1d1tdcs da produção de cana-de-açúcar e álcool em extrema
Uh ultl.1dc.Assim, segundo Lima (1998, p.40), não dispondo mais
11l11r ·ms e subsídios oferecidos pelo Proálcool, a atividade
111 ll'il ,, entraemcrise, diminuindo osimpostos pagosao Estado.
V1turiosos em ação judicial em todo o Brasil, os usineiros
1111(11n <lc pagar o Imposto de Circulação de Mercadoria (ICMS)
1l•1t1u1·i1m1 própria. Mas,em Alagoas, além de não pagar o ICMS,
t h, r un <le volta o montante já pago. Emcomum acordo como
1 1•1111> da época, os usineiros deveriam receber o montante em
1Op11m•los corrigidas monetariamente. Portanto, como mostra a
lll!i'I 1 12, a receita de ICMS das atividades sucroalcooleiras foi
1• 1111nuo e, a partir de 1989, caiu vertiginosamente.
AJrLA 1.2 - Alagoas: Participação das atividades
r ik ooleiras na arrecadação de ICMS, no período de
' l 1991.
11183
1984
1985
EM PERCENTAGEM
ARRECADAÇÃO
DE ICMS EM PERCENTAGEM %
58,02%
51,46%
43,86%
31,95%
33,21%
16,84%
4,48%
6,12%
148%
•N 11 : Mi11btério da Fazenda, 1995.
formaçôo do riqueza e da pobreza do Alagoas 29
C~mo a economia e a receita do Estado de Alagoas
U<'pcnc.ltam, em quase 60%, da atividade açucareira, a crise que
essa agroindústria passou a sofrer a partir de 1985, com
0
fim
do Proá.kool, teve reflexos catastróficos em todos os setores da
eco~onua ala~oana, muito particularmente na manutenção dos
serviços públicos essenciais à população mais pobre bem com
. d , o
no cust~10 a folha de pagamento dos servidores públicos.
Lima (1998, p.40) confirma que, no período de 1983 a 1991,
houve uma severa redução de impostos pagos pelos usineiros
que, em 1983, contribuíam com 58,02% do ICMS pago ao Estado
de Alagoas; em 1988, passaram a contribuir com apenas 16,84%
e, em 1991, pagaram tão somente 1,48%.
O fato de Alagoas não ter diversificado suas atividades
econômicas agrícolas e não-agrícolas deixou 0
Estado
completamente dependente de uma única atividade,
concentradora de terra, também a principal responsável pela
elevad~ concentração de renda do Estado e pela formação de
uma elite com poderes enraizados em todos os setores da vida
social de Alagoas.
Assim, q.u~ndo a agroindústria açucareíra vai bem, a riqueza
gerad~ beneficia apenas 24 famílias detentoras de grandes
extensoe~de terras e de capital, bemcomo dos meios de produção
necessários à sobrevivência de toda a população do Estado ao
g~alnão traz maiorproveito. Todavia, quando vai mal ou enfrenta
cn~es prolongadas, a p~pulação fica em situação desesperadora,
p01s o e~pr:~o, o comércio, a receita do Estado e o pagamento
dos func1onanos públicos .ficam comprometidos.
Essa é uma armadilha econômica, social e política que tem
a~etado o Es~ado de Alagoas desde a época colonial, pois, até os
dias ~e ho1e, o Estado continua dependente quase que
exclusivamente da atividade canavieira.
Como sabemos,essa é uma situaçãomuito peculiar, porque,
tanto em Pernambuco comoemSão Paulo, há uma diversificação
30 Fernando José de Lira
d11s atividades agrícolas e não-agrícolas, e a cana, ao contrário
do que ocorre em Alagoas, é apenas urna dentre tantas outras
1tividades agroindustriais.
No Estado de São Paulo - que é o maior produtor de álcool
do Brasil - observaram-se as seguintes diferenças básicas
1·l'lativamenteao modelo praticado emAlagoas: o plantioda cana-
de-açúcar iniciou-se nas áreas do planalto, não no Litoral; a
propriedade da terra também se dava na forma de latifúndio
nos municípios onde essa cultura foi mais importante, mas a
L'Sb:utura de posse da terra permitia sua utilização para o cultivo
de alimentos, atividade praticamente inviabilizada pelo padrão
udotado em Alagoas.
No Nordeste, o próprio Estado da Bahia logo percebeu as
dificuldades que enfrentaria, se dependesse exclusivamente da
produçãode açúcar. A partir dos anos 30 e, muito particularmente,
dos anos 60, passou a diversificar sua produção agrícola,
plantando, também em escala comercial, outros produtos como
soja, feijão, cacau, café, etc.
Este espaço privilegiado de atuação das usinas, que tem
sido o Estado de Alagoas, pode ser explicado pela singularidade
da força política da atividade açucareira, que tem demonstrado
uma grande capacidade de organização interna, formando um
poderoso grupo de pressão, capaz de garantir o apoio do Estado
para se manter. Corno afirma Carvalho (2000, p.14), "essa
manutenção de uma boa performance política organizacional
tem conferido ao capitalsucroalcooleiro do Nordeste um grande
poder de lobby, para pressionar e assegurar a proteção e o apoio
do Estado para compensar sua base econômica diferente ou
pouco competitiva".
Como vimos, desde o período imperial, a atividade
açucarcira vem tendo o apoio do Estado. O perdão da dívida dos
senhores de engenho, a prorrogação dos prazos de pagamento
dos empréstimos, feitos junto aos estabelecimentos bancários
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 31
federais e estaduais, foram práticas constantes nas décadas de
50, 60 e 70. Com investimento maciço nessa atividade, faltavam
oo Estado meios para estimular a germinação de outras
cltividades agrícolas e nao-agr1colas, concentrando a maioria dos
recursos públicos nas mãos de, aproximadamente, 24 famílias
de produtores de açúcar.
A forte concentração da terra, a baixa produtividade e
o sistema de monocultura causaram, inevitavelmente, uma
forte concentração de recursos públicos e privados nas mãos
de uma pequena fração da população. Com essa base
produtiva, 10% dos maiores produtores agrícolas do Estado
detêm mais da metade da receita agrícola, ou seja, 54%. Por
outro lado, 40% dos menores produtores detêm apenas 7%
do total da receita agrícola do Estado.
Está, portanto, na concentração de renda, a origem de
todos os problemas econômicos, sociais, ecológicos e
políticos que, há séculos, assolam o Estado de Alagoas. O
analfabetismo, a miséria (com mais de 44,3% da população
vivendo abaixo da linha de pobreza), a mortalidade infantil
elevada e a baixa expectativa de vida dos alagoanos (em
torno de 60 anos de idade) denunciam, claramente, a baixa
eficiência social do carro-chefe da economia alagoana, que é
a atividade açucareira.
32 Fernando José de Lira
FIGURA 1.3 - Vista parcial do cidade de
Branquinha. O município é totalmente dependente
da cana-de-açúcar. Nota-se, no figura, que esse
plantio obrigou a população a construir suas casas
à margem do rio Mundoú, um dos mais poluídos
de Alagoas.
FIGURA 1.4 - Vista parcial de uma das ruas do
cidade de Branquinho, onde se nota, claramente,
que os condições de vida da população estão
entre os mais precárias de Alagoas.
Formação do riqueza e da pobreza de Alagoas 33
Por isso mesmo, a partir de 1990, com a crise do setor
açucareiro, o quadro social se agrava progressivamente,
chegando, em 1997, à situação praticamente de calamidade
pública. Com a queda de preços nos mercados nacional e
internacional, a agroindústria do açúcar não consegue pagar
impostos e dívidas junto ao Estado e às estatais, principalmente
à CompanhiaEnergéticade Alagoas (Ceai), nem criaros empregos
socialmente necessários.
Segundo Carvalho (2000, p.20), a partir de 1985, a Ceai
passou a sofrer graves conseqüências com a inadimplência de 40
milhões devidos pelos produtores de açúcar. O banco estadual
(Produban) não recebeu dos usineiros uma soma calculada em
torno de 76 milhões em empréstimos vencidos. Para completar o
quadro da crise estadual, um acordo fiscal, assinado em 1989,
transferiu para as usinas, durante seus 8 anos de duração,
aproximadamente 800 milhões de reais.
Para Lima (1998, p.20), também nas décadas de setenta e
oitenta, o endividamento dos usineiros junto aos órgãos federais
e estaduais foi sempre elevado. Na década de noventa, com a
crise aberta na atividade açucareira, os usineiros aprofundaram
essa dívida no Banco do Brasil, Tesouro Nacional, Receita Fede-
ral, INSS, Banco do Estado de Alagoas e no IAA. Só em 1993,
alcançava o montante de 1,02 bilhões de dólares.
Ainda segundo Lima (1998, p.60), a crise da atividade
açucareira, iniciada na segunda metade da década de oitenta,
provocou uma grande sangria de recursos públicos. No período
de 1986 a 1995, no início da crise, a receita tributária, em Alagoas,
. .. atingiu um patamar negativo da ordem de 0,98%, deixando o
Estado impossibilitado de cumprir com seus deveres sociais,
financeiros e económicos básicos, gerando uma crise sem
precedente na história recente da economia alagoana.
Atualmente, ainda dependente da cana e exposto aos
reflexos da crise da agroindústria canavieira, o Estado começa a
34 Fernando José de Lira
Jf=~L -r-t::_Cf crNíRAL
B8LÜI .
pensar em outras alternativas de produção agrícola e não-
agrícola. Na agricultura, pensa-se na diversificação com
produção de cereais, olericultura e fruticultura; no meio urbano,
a prioridade do governo estadual tem sido o turismo.
Como vimos, nas décadas de setenta e oitenta, Alagoas
passou a ter 70% de sua área agricultável com cana. Além disso,
essa área é composta das melhores terras do Estado, que estão na
Zona da Mata, Planalto e Litoral, onde o clima é mais favorável
do que o do Agreste e do Sertão. Essas terras são de propriedade
dos usineiros que, com a sua concepção de grande latifúndio,
não disponibilizam parte delas para a prática de outras culturas,
que não sejam a cana ou a pecuária. Esse elevado índice de
concentração dificulta uma ação forte do Estado na diversificação
das atividades agrícolas, cuja conseqüência seria a fixação do
homem no meio rural onde acarretaria o surgimentode uma classe
média significativa.
Atabela 1.3 mostra a grande concentração da posse da terra
em Alagoas. Da observação direta de seus dados percebe-se que,
cm 1995, os pequenos proprietários, que possuem menos de 10
hectares de terra, representavam cerca de 81% do total de
produtores, todavia detinham uma exígua área de apenas 13%
da área total do Estado. Por outrolado, os grandes latifundiários,
com áreas superiores a 100 hectares, eram, em 1995, 3% do total
dos proprietários, mas possuíam 62% de toda área agricultável
do Estado.
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 35
TABELA l .3 - Alagoas: Distribuição percentual do número
de estabelecimentos agropecuários e de sua área
correspondente, no ano de 1995.
EM PERCENTAGEM
EXTRATOS 1995
HECTARES (ha) NÚMERO% ÁREA%
MENOS DE10 81% 13%
DE 10 A MENOS DE 100 16% 25%
DE 100A MAIS 3% 62%
TOTAL 100% 100%
FONTE: IBGE - Censos Agropecuários.
Reduzir essa má distribuição da posse da terra é a medida
prioritária para melhorar as condições de vida no meio rural e
urbano do Estado. A divisão da propriedade da terra em frações
menores, quando associada à assistência técnica de qualidade e
ao crédito agrícola subsidiado, motivará maior diversificação
da produção, melhoria na produtividade por hectare e efetiva
criação de emprego no campo. Na cidade, melhor conservação
do meio ambiente e, sobretudo, menor dependência da
população rural e urbana em relação aos usineiros que pensam
e agem como grandes latifundiários, não como industriais,
segundo os parâmetros modernos concebidos em administração.
Essa desconcentração da propriedade da terra levará,ainda,
a uma desconcentração da renda gue, por sua vez, terá um efeito
multiplicador muito maior na economia estadual, pois a maior
distribuição dosmeios deproduçãogerará várias atividadesagrícolas
e não-agrícolas no meio rural, dotando uma maior fração da
população do campo e da cidade de melhores condições de vida.
36 Fernando José de Lira
Para Beatriz (1986, p.40), as feiras públicas das áreas de
usinas têm uma movimentação de recursos financeiros e de
produtos vendidos em menor escala, secomparadas comas feiras
do Agreste. Isso ocorre, porque a Zona da Mata e o Litoral são
ureas de predominância do grande latifundiário que, além de
1.~mpregar pouca mão-de-obra, paga salários irrisórios. No
Agreste, onde a posse da terra é mais bem distribuída, há um
maior número de pequenos produtores com maior capacidade
de renda e certa variedade na produção agrícola e não-agrícola.
Por conseguinte, as suas feiras livres são mais dinâmicas, como a
de Caruaru e de Arapiraca, onde ocorre melhor circulação da
riqueza gerada.
Portanto, a posse dos meios de produção, muito
particularmente a da terra, submetida a uma distribuição
.dequada, sob o enfoque de uma administração eficaz, abre
perspectivas para a germinação de um conjunto de atividades
agrícolas, difíceis de serem praticadas no regime de grandes
propriedades, bem como para o surgimento de outras não-
ogrícolas e de todos os benefícios que esse cenário oferece.
Em Alagoas, como vemos na tabela 1.4, a posse da terra
está distribuída naforma de extremos. De um lado, têm-se poucos
proprietáriosdominando grandesáreas, chamadas de latifúndios
e, de outro, grande número de pequenos produtores, com áreas
inferiores a 10 hectares, chamadas de minifúndios. Essa situação
gera uma grande injustiça e ineficiência na alocação dos recursos
públicos e privados, nos meios urbano e rural, ressentido-se este,
principalmente, de recursos financeiros.
Formação do nquelO o do pobreza de Alagoas 37
TABELA 1.4 - Alagoas: Distribuição percentual do número
de estabelecimentos agropecuários e de sua área
correspondente. no período de 1970/1985.
EM PERCENTAGEM
EXTRATOS 1970 1985
HECTARES (ha) NÚM.% ÁREA% NÚM.% AREA %
MENOS DE 10 75% 10% 82% 11%
DE 10 A MENOS
DE 100 21,6% 28,6% 15% 27%
DE 100A MAIS 3,4% 61,4% 3ºt.'.
'º 61%
TOTAL 100% 100% 100% 100%
FONTE: IBGE - Censos Agropecuários.
Os fatos mostram que essa distribuição e a concentração
da propriedade da terra não surgiram do dia para a noite. São o
fruto d.e um processo histórico, que se inicia no século XVI, e
vem avançando ao longo de quase quatro séculos. Considerando
que o Estado é, essencialmente, agrícola, sua dependência do
latifúndio também é muito forte.
Foram os próprios latifundiários que mais lutaram pela
independência do Estado, visando a atender a seus interesses
locais. Dessa forma, poderiam mais facilmente dominar as
instituiçõesestaduais e federais e direcionar os recursos do Estado
para benefício próprio. Comessa hegemonia da burguesiaagrária
no aparelho estadual, o planejamentodas ações do Estadoorienta-
se para atender às necessidades dos grandes latifundiários, em
detrimento de uma atuação socialmente justa que beneficiasse a
maior fração da população.
É assim que as rodovias, as ferrovias e as hidrovias de
Alagoas foram e são construídas para atender, prioritariamente,
38 Fernando José de Lira
às necessidades do senhor de engenho e dos usineiros. As áreas
que não eram e não são d.e interesse da atividade canavieira
nunca foram prioridades do poder público.
Com isso, os pequenos e médios produtores do Agreste e
do Sertão sempre viveram no mais absoluto isolamento. A falta
de assistência técnica, de estradas, de energia e de comunicação
faz com que suas atividades agrícolas sejam marginais ou de
pura subsistência, pouco contribuindo para o desenvolvimento
estadual.
Nesse sentido, a dependência do Estado em relação à
atividade canavieira era e continua sendo quase que total.
Atualmente, a forte crise por que passa essa atividade abre boas
perspectivas na direção da geração de novas oportunidades de
produção, de emprego e de renda.
1.2 - Reprodução e subordinação da força de
trabalho
Durante todo o século XVI, XVII e até a metade do século
XVIII, os índios faziam parte da maior fração da força de trabalho
no engenho. Muitos indígenas, ao serem libertos, permaneceram
no engenho. A derrubada da mata, a poluição dos rios e a
dificuldade de encontrar peixes e caças não lhes permitiam
encontrarem os alimentos necessários à subsistência nas terras
que passaram a ser de propriedade dos senhores de engenho.
A partir de 1758, os senhores de engenho procuraram
substituir os índios pelos negros, pois os portugueses já tinham
experiência com escravos africanos nas ilhas do Atlântico onde
esses demonstravam uma produtividade muito maior do que a
obtida aqui, com aqueles. Além disso, os escravos negros não
tinham as mesmas facilidades de fuga como possuíamosindígenas.
Mesmo demandando um maior investimento, entre 1550 e
1815 entrou pela costa brasileira um elevado número de escravos
Formação do riqueza e da pobreza de Alagoas 39
africanos, mais do que o suficiente para suprir as exigências de
trabalho da cana. A partir desse período, a atividade açucareira
iria passar por três séculos de uso dessa mão-de-obra que vai
constituir-se na prmc1pal força de geração de fortuna para os
senhores de engenho bem como de miséria, discriminação e
perseguição ao negro africano, ao afro-brasileiro e aos pobres em
geral,constituídosdessa raça e de umamiscigenação emsua maior
parte.
Ao contrário do ocorrido com os índios, nem a igreja nem a
coroa se opuseram à escravidão do negro. As ordens religiosas,
como as beneditinas, estiveram até mesmo entre os grandes
latifundiários de terra, que exploravam o h·abalho escravo.
Outro fator favorável ao trabalho desses escravos era uma
certa imunidade que tinham às doenças tropfcais dos brancos, o
que não ocorria com os índios. Todavia, apesar da resistência
imunológica e física dos negros, as condições de trabalho, de
habitação,alimentação e subordinaçãoao senhorde engenhoeram
tão desumanas que, na segunda metade do século XIX, enquanto
no Brasil um escravo masculino tinha uma expectativa média de
vida de 18 anos, nos Estados Unidos essa expectativa era supe-
rior a 35 anos.
Quase todos os escravos de que o Brasil necessitava eram
importados, pois as condições de vida desfavoráveis faziam com
que as escravas tivessem uma baixa fertilidade. Criar uma criança
por 12 ou 14 anos, nas condições desumanas da escravidão, era
considerado um investimento elevado e de alto risco, a que o
senhor de engenho não queria submeter-se.
Com essa mão-de-obra abundante, o cultivo da cana e a
produção de açúcar aumentaram assustadoramente. Na verdade,
o negro era representante de uma civilização agrícola e já estava
acostumado ao regime servil na África. Daí a preferência, apesar
do elevado custo, por essa opção de força de trabalho. Mesmo
com a alta mortalidade, devida aos fatores já mencionados e aos
40 Fernando José de Lira
castigos severos, o alto preço e os quilombos não impediram os
senhores de engenho de continuarema importar negros da África.
Cada engenho era uma unidade econômica na forma de
complexo rural. Em um engenho médio, existiam de 50 a 60
escravos, que vinham de Angola ou da Guiné. Os negros eram
obrigados a trabalhar todo o dia. Reunidos, formavam um
verdadeiro exército e recebiam ordem de um feitor. Só lhes era
permitido o descanso aos domingos e dias santificados.
-8...§s_ip;_l, a expansão da cana à base do trabalho escravo e da
-- .
grande propriedade definiu as linhas básicas de um sistema de
produção que caracterizou o Estado, marcando-lhe,_·
definitivamente, osaspectos políticos, sociais e econômicos. Nesse
sentido, o escravo negro deu uma grande contribuição para o
aumento da riqueza dos senhores de engenho e para a formação
econômica e social do Estado, que perdura até hoje.
Como diz Diégues Júnior (1976, p.100), o negro foi a princi-
pal força que permitiu o aumento da produção no meio rural e a
formação de centros urbanos importantes. Tornou-se essencial
às fazendas dos senhores de engenho, malgrado o tratamento
desumano que lhe davam. Sabiam que, sem os mesmos, não se
poderia aumentar a riqueza na forma de grande propriedade.
Desempenhando papel tão relevante na economia de
Alagoas, quando, no século XVIIt iniciou-se, na Europa, um
movimento de libertação dos escravos, os senhores de engenho
do Nordesteficaram desesperados, poisafinalhaviam empregado
. grande soma de recursos na compra do negro.
No final do período colonial, Alagoas tinha uma população
de 111.973 habitantes, dos quais 42.879 eram livres e 69.094,
escravos. Esses números demonstram, claramente, a importância
que teve o negro no povoamento, na produção e no
desenvolvimento econômico, social e cultural do Estado.
Como rígido controle do processo de libertação dos negros,
em 1885 foi aprovada a Lei dos Sexagenários, que concedia
Formação da riqueza e do pobreza de Alagoas 41
.,.,
liberdade aos cativos maiores de sessenta anos e estabelecia
normas para a libertação gradual de todos os escravos, mediante
a indenização do Estado ao senhor de engenho. Somente em 13
de maio de 1888 - após indenizar todos os senhores de engenho
que tinham comprado escravos, foi aprovada a Lei Áurea.
Os escravos libertos, que não foram indenizados e não
dispunham de meios de produção ou de recursos para bancarem
sua subsistência, foram obrigadosapermanecer no engenho como
moradores ou, simplesmente, como mão-de-obra livre, assalariada,
responsabilizando-sepela própriasobrevivência, o que osobrigava
a trabalharem todos os dias, exceto, pelo menos, nos dias santos e
feriados. Isso evidencia a ineficácia da Lei para mudar a
mentalidade dos senhores e a insuficiência desse ato legal, como
medida solitária, para transformar esse histórico cenário.
Como trabalhadores livres, a remuneração que !ecebiam
não dava para manterem seu próprio sustento. Portanto,
reservavam os finais de semana para cultivarem, num pequeno
sítio, os produtos básicos de alimentação, a exemplo do feijão,
milho e mandioca, etc.
Dessa forma, a libertação dos escravos contribuiu para
aumentar, significativamente, a produtividade do trabalho no
plantio, nos tratos culturais, na colheita da cana, bem corno no
fabrico do açúcar. Com isso foi possível aumentar, ainda mais, a
área cultivada com cana e, conseqüentemente, elevar a
acumulação de capital do senhor de engenho.
O processo de libertação dos escravos e a expropriação
do pequeno produtor formaram um enorme contingente de mão-
de-obra disponível. Essa força de trabalho excedia a quantidade
de braços necessários nos engenhos, obrigando o trabalhador a
submeter-se a baixas remunerações e a condições de trabalho
excessivamente precárias, visto que acana-de-açúcar foi a primeira
atividade econômica praticada em grande escala, nos períodos
colonial, imperial e republicano.
42 Fernando José de Lira
Com a Independência do País, os Reis Dom Pedro I e Dom
1'1•dro II continuaram apoiando a atividade açucareira,
I''mcipalmenteno âmbito financeiro, comcréditosfornecidos pelo
11.tnco do Brasil que, criado em1808, era uma instituição poderosa
110 auxílio aos senhores de engenho, sobretudo liberando
1·rnpréstimos para comprarem terra e aumentarem a produção.
Com a República, esperava-se que as elites locais perdessem
lorça, todavia isso não ocorreu. Ao contrário, a burguesia agrária
1•-ltadual manteve o seu poder e a cana-de-açúcar continuou
.1vançando do litoral em direção à Zona da Mata, daí chegando
11té o Sertão do São Francisco.
Durante essa conjuntura, que nasceu no período colonial e
11lravessou o imperialeorepublicano, os trabalhadoresnãopossuíam
11ualqucrdireito trabalhista. O senhordeengenho pagava-lhescomo
qaJário aquilo que lhe convinha e que, quase sempre, ficava abaixo
do necessário para a manutenção fisiológica da família.
Nesse período, a expansão da cana-de-açúcar foi tal que,
.1 partirdo início do século XX, Alagoas era uma espéciede paraíso
da cana. Possuía mais de 90% da Zona da Mata cultivada com
lana-de-açúcar. Para isso, usou quatro modalidades de trabalho:
u trabalhador morador, o trabalhador sitiante, o trabalhador
permanente e o pequeno produtor, fornecedor de cana.
Para se ter idéia da ocupação da terra de Alagoas com cana,
Beatriz (1998, p.20) informa que, a partir da segunda metade do
século XVIII, o número de engenhos da Província de Alagoas
passou de 73 em 1824, para 234, em 1850, alcançando 360, no
início do século XX. Entretanto, embora o controle das terras
produtivas fosse condição necessária para o aumento da produção
de cana, não era suficiente para assegurar trabalho à massa de
h·abalhadores disponível, e era insuficiente a quantidade de terra,
necessária ao funcionamento dos engenhos.
Paragarantir o trabalho a essa massa de assalariados e gerar
excedente de mão-de-obra, os senhores de engenhos teriam que
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 43
avançar aM as terras não aptas para a cana, as que eram
cultivadas pelos pequenos produtores, na forma de culturas de
subsist~ncia. Proprietários dessas terras, os senhores de engenho
transformaram-nas em pequenos sítios, cultivados pelos
moradores de engenho. Com isso, ficaram obrigados a prestar
serviços para o engenho, na cana e fabricação do açúcar, em
condições bastante subordinadas, perdendo a liberdade e as
condições de vida razoáveis.
Na medida em que a cana avançou, o trabalhadCfr morador
passou a receber uma casa com uma pequena área onde tinha a
possibilidade de desenvolver e cultivar seu roçado, prestando,
corno contrapartida, trabalho ao proprietário.
De acordo com Beatriz (1986, p.60), esse trabalho seria
desenvolvido nas condições de tempo e de tudo o mais exigidas
pelo senhor de engenho, que requeria do morador entre 4 a 5
dias da semana, reservando-se os demais para cuidar de sua
subsistência, sendo que ele só poderia trabalhar no sítio e morar
na propriedade, caso se subordinasse às exigências impostas pelo
proprietário. Caso contrário, o moradorseria dispensado daquele,
tendo que se submeter às mesmas condições em outros engenhos
de Alagoas ou de Pernambuco.
Comoo engenho era a forma socialdeprodução dominante,
nas áreas onde se desenvolveu inibiu outras alternativas
econômicas de sobrevivência. Eram, portanto, os mesmos
pequenos produtores expropriados que procuravam os senhores
de engenho para pedir moradia e trabalho. Nessas ocasiões, o
próprio senhor de engenho era quem entrevistava o candidato e
decidia sua admissão, que só era possível depois de cumpridos
alguns requisitos.
Baseavam-se em informações sobre a história de vida do
candidato, inclusive sobre as razões pelas quais ele havia
abandonado seu último trabalho. Dava-se preferência a
moradores que fossem chefes de família, com esposa e filho.
44 Fernando José de Lira
Nessas condições, ao chegar ao novo engenho, o morador
tho tinha contraído apenas uma dívida monetária, porque vinha
,,•forçada por uma forte subordinação nas relações de trabalho e
moradia no novo engenho, bem como, amda, por uma obngação
de grande lealdade ao patrão. Aparentemente, ele era bem
remunerado, pois, além de receber pagamento pelo trabalho
realizado para o senhor de engenho, possuía os produtos
cultivadosno roçado, que deveriampermitir-lhesaldarsuadívida
no barracão, sobrando-lhe o suficiente para adquirir os demais
bens necessários ao consumo da semana seguinte. Entretanto,
issonemsempre ocorria. Freqüentemente, o morador permanecia
· por muitos anos - em dívida com o patrão.
O morador recém-admitido tinha que internalizar que o
trabalho realizado no roçado individual, para proveito pessoal,
só era possível como conseqüência do trabalho coletivo e prévio
que erafeito parao senhorde engenho. Essa relação de dominação
materializava-se, também, no armazém da propriedade,
conhecido como barracão.
O senhor de engenho, visando à reprodução da relação
morador/senhor, fazia um esforço permanente para intervir de
diferentesformas eem todos os níveis na vida dosseussubordinados.
Esse esforço incluía a utilização de alguns de sua confiança que,
duranteajornadade trabalho,sobordens, percorriama propriedade
a cavalo, visitavam os moradores isolados nos sítios, ou ainda, nas
horas de descanso, na varanda da Casa Grande, observavamo que
ocorria no espaço coletivo do engenho.
Para Beatriz (1986, p.60), nos dias de trabalho, ou seja, du-
rante a semana, só era permitido ao morador sair do engenho
quando autorizado pelo própriosenhor,comexceçãodos feriados,
quando a saída era livre.
O comprometimento assumido não era somente do chefe
da família, mas de toda a família. No conjunto das atividades
do engenho e no roçado, com culturas de subsistência, a esposa
Formação do riqueza e da pobreza de Alagoas 45
do mor~dor e seu~ filhos solteiros - enquanto membros do grupo
domés~co - contribuíam conjuntamente com 0 morador para a
execuçao das tarefas exigidas, ainda que de forma diferente,
segundo o sexo e a idade
~~a~corporado ou permaneciacomomorador do engenho,
com direito a casa e ao roçado ou sítio, se fosse chefe de fanúlia. Os
ho~ens ~olt~iros ou aqueles que ficassem sozinhos por qualquer
motivo nao tinham esse direito. Eram alojados em galpões, que os
acomodavam em grande quantidade e precariamente.
A condição de maioridade só era obtida mediante 0
casamento, quando o filho tinha a possibilidade de tornar-se,
também, morad~r. Assim, embora significasse, de fato, garantia
em termos morais, a fanúlia significava, também, a possibilidade
de reprodução de novos moradores no seu interior. Dessa forma
assegura~a.-se a continuidade do próprio engenho. Tendo ~
responsabilidadede sustentara familia, o morador oferecia, ainda,
o resultado da produção de subsistência, como forma de
compromisso com sua continuidade no trabalho em
cumprimento ao conjunto de obrigações que lhe eram irnp~stas.
Com a transformação de alguns engenhos em usinas,
mudou também a relação de produção e de trabalho, porque as
moendas passarama exigir muito mais canas.Parasatisfazeressa
exigência, era necessário o avanço na ocupação das terras da
própria _us~a P?r todos os lados do território alagoano, 0
que,
num pnmeu~ ~nstante, ~ignificou a expulsão dos pequenos
produtores sitiantes, roceiros arrendatários e colonos dos
tabuleiros, transformando-os, assim, nos primeiros trabalhadores
rurais sem-terra. Esse fenômeno e a mecanização adotada em
todas as áreas planas de Alagoas contribuíram para 0
aumento
do número de trabalhadores temporários. Nosegundo momento,
e.s~endeu-se o mesmo tratamento aos próprios moradores,
s1~antes, pequenos fornecedores da fazenda, impelindo-os da
usma para a periferia de cidades e vilas mais próximas.
46 Fernando José de Lira
Para Loureiro (1970, p.24), a ocupação, em grande escala,
dos Tabuleiros com cana iniciou-se em 1960, com a usina Sinimbu,
'•l'ndoseguida por outras usinas, aumentando as áreas dos grandes
1'roprietários ~ resultando, <..Om o passar dos anos, na grande
l'xpansão do cultivo e na ocupação total dos tabuleiros existentes.
Beatriz (1986, p.11) indica que essa ocupação redundou
num aumento significativo do número de grandes propriedades
e, principalmente, na instalação de novas e grandes usinas e
destilarias, aumentando, exponencialmente, a produção de açúcar
e a oferta de mão-de-obra.
Comisso, a grande massa de trabalhadores disporúveis, parte
dela incorporada às atividades agrícolas de cultivo de cana, passou
a não possuir vínculos de trabalho diretamente com os grandes
proprietários. Como diz Beatriz (1986, p.30), "essa relação passou a
ser mediada por um empreiteiro que recrutava a mão-de-obra
necessáriaàs atividadesdas fazendas. Somenteos trabalhadoresmais
especializados permaneceram com carteira de trabalho assinada".
Os empreiteiros não têm carteira de trabalho assinada e
trabalham para grandes usineiros. Eles procuram recrutar os
trabalhadores necessários a determinada tarefa e, muitas vezes,
permanecem nas propriedades das usinas, junto com os
trabalhadores que lá se fixam durante a semana.
Nesse modelo, cada trabalhador recebe por produção, no
final da semana. É muito comum o trabalhador receber parte de
seu trabalho já realizado na forma de vale a ser descontado no
dia do pagamento. Como explica Beatriz (1986, p.50), a existência
·desse intermediário é considerada uma forma de exploração,
que se apresenta mais conflitante quando o empreiteiro é dono
do barracão da usina, ondeos trabalhadores fazem suascompras.
Os preços das mercadorias são freqüentemente muito mais
elevados do que os praticados em outros locais de venda.
A presença do empreiteiro é muito favorável para os
usineiros, porque lhes assegura fixação permanente do
Formação do riqueza e do pobreza de Alagoas 47
."'
trnbulhac.Jor na propriedade, sem arcarem com os custos de uma
ligaçdo direta e formal, que incluiria a existência de vínculos
trabalhistas e das obrigações decorrentes dessa situação.
Alguns moradores remanescentes na propriedade são
forçados a executar tarefas rejeitadas pelos trabalhadores do
empreiteiro, pois são vistos pelo usineiro como subordinados e
'portanto, mais sujeitos às determinações do administrador da
fazenda. As casas mostradas abaixo representam as condições
da habitação a eles destinada.
FIGURA 1.5 - Habitação típica do trabalhador e sua
família na atividade canavieira de Porto Calvo.
Quanto à remuneração percebida, os trabalhadores
temporários usam-na para pagar dívidas no barracão. Se
sobrar algum dinheiro, fazem compras nas feiras próximas
às usinas. Quando trabalham o mês inteiro, chegam a
ganhar pouco mais do que o salário mínimo, alcançando
somente dois terços dele, se não tiverem ocupação
permanente. A renda média dos trabalhadores moradores é
48 Fernando José de Lira
inferior à dos temporários, atingindo em torno de 50% do
i;alário mínimo por mé?s trabalhado.
É muito comum pequenos produtores do Agreste e do
Sertão prestarem trabalho nos canaviais, para complementar sua
renda. Como sua área de terra é muito pequena, principalmente
nas crises de produção ou em períodos de pouca chuva, os
pequenos produtores migram para as usinas mais próximas para
cortar cana. Logo que se inicia o período de chuva, voltam para
cultivar seu pequeno pedaço de terra.
FIGURA 1.6 - Trabalhador rural temporário,
trabalhando por produção, percebendo
rendimento em torno de US$ 3,20 por dia de
trabalho.
Conforme afirma Beatriz (1986, p.60), "o trabalhador
residente na fazenda das usinas, no momento em que diminui
a demanda por trabalho no interior da propriedade, para poder
concorrer com os trabalhadores que vêm de fora, vê-se obrigado
até a dormir no local de trabalho, para garantir o próprio dia
de serviço".
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 49
.'.
Freqüentemente, a falta de trabalho para os moradores
da usina é utilizada pelo usineiro como mecanismo para forçar
o abandono da propriedade pelo morador, o que vem ocorrendo
muito, desde o início da década de noventa.
Portanto, o trabalho assalariado temporário passou a ser a
única fonte de renda para a grande massa de pessoas residentes
no campo. Ao submeter-se a isso, o chefe de família, para garantir
a sobrevivência, teve que colocar toda a família na atividade
canavieira. É sob essas condições que, desde cedo, aparecem as
crianças trabalhando nos canaviais, em condições que vêm
deteriorando-se ao longo dos anos.
Em suma, todos os fatores referidos geraram um grande
excedente de mão-de-obra, que vive no meio rural, na periferia
das pequenas, médias e grandes cidades. Em caso de maior
necessidade, muitossãochamados a prestarserviços à usina, sem
qualquer vínculo.
50 Fernando José de Lira
Capítulo li
O poder de base agrária
A divisão geográfica, social e econômica do território
brasileiro em espaços estaduais deve ser entendida como
resultado de uma ação política. E, assim, os espaços nacionais
foram organizados e construídos histórica e politicamente. Por
conseguinte, as condições peculiares a cada Estado decorr:~ de
um sistema político com relações externas e internas específicas.
Nesse sentido, o processo de manutenção do poder político
estadual pode desenvolver suas próprias alternativas de
desenvolvimento económico, que podem estar ou não em
consonância com o poder econômico regional ou nacional, mas
sempre o estarão comosinteresses específicos das elites e.staduais
e com suas relações com o poder político regional e nacional, no
sentido de garantir a preservação desses interesses. .
Alagoas é, portanto, um espaço político-social que p~ssui
especificidades nos processos político e social e, por con~egum~e,
deve ser um espaço geográfico da sociedade local em mteraçao
parcial ou total com a sociedade global, porém comportando-:e
de forma diferenciada. Assim, Alagoas é justamente a expressao
autêntica de suas diferenças culturais, sociais e do processo de
produção e de diferenciação do espaço geográfico1. Um Estado,
mesmo possuindo relações com outros das regiões do País ao
qual pertence, possui vinculações internas autônomas que lhe
conferem um caráter próprio e diferenciado.
1
Arespeito do conceito de região veja-seLipietz (1980) e Castro (1992:30).
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 51
Um Estado e sua identidade são construídos através das
imposições de uma classe dominante, objetivando expandir sua
própria base material, bem como o uso do controle da
administração local para alcançar seus efeitos. Por isso, as elites
dominantes desenvolvem formas de controle político apropriado
a seus interesses econômicos e de poder, fazendo com que o
Estado assuma aspecto político peculiar, quando comparado com
outros Estados2
• Desse modo, a própria identidade estadual é
influenciada pelo comportamento das suas elites em relação à
sua região, ao poder nacional e a outros Estados.
2.1 - As raízes do poder em Alagoas
Do período colonial até o início da República, ser senhor de
engenho significavater vastas propriedades, o que deixava muita
gente sem terra, dependente desses grandes proprietários.
Esses possuíam muito poder. Quanto maior fosse a área de
terra e o número de escravos possuídos, tanto maior era o poder que
o senhor detinha, irradiando-se para além dos limites do engenho,
alcançando o meio urbano, ondeelegia prefeito, vereador, deputado,
senador e governador, influenciando, ainda, a nomeação de juízes e
pessoas do alto escalão do governo estaduale, até, federal.
Essessenhores formavam uma elite quase homogênea, com
poderes especiais. Núcleo político-social, o engenho era também
um núcleo demográfico( servindo de base à formação da familia
e da sociedade alagoana. Por conseguinte, qualquer núcleo que
se constituiu em Alagoas encontrou a sua base de formação no
Engenho Bangüê.
Como diz DiéguesJúnior (1976, p.40), "o senhor de engenho
é a grande figura da paisagem social de Alagoas. É nele que se
centraliza a organização da família. As cidades de Alagoas são, na
2
Conforme Roberts (1981, p.50).
52 Fernando José de Lira
wdade, um prolongamento do engenho, e o senhor de engenho
, 0 chefe político da família ede toda a genteque vive no engenho".
Na hierarquia social da atividade canavieira, estavam os
~11·nhores de engenho e os lavradores, que não podiam ter
1•ngenho, embora dispusessem de terras, ouque não tinham terra
1•, nesse caso, cultivavam a cana nas terras do senhor. Conforme
ll posse da terra de que dispunham para cultivar cana, o número
de escravos que possuíam e as safras que produziam, os
ltwradores, também chamados de fornecedores, tinham maior
uu menor importância social.
A relação entre os lavradores e o senhor de engenho era de
muita desconfiança. Freqüentemente, o senhor de engenho
proibia aos lavradores a entrada na casa de purgar, durante a
moagem de sua cana. Alegava que a sua presença implicava
fiscalização e, conseqüentemente, uma desconfiança.
A estrutura econômica dominante no Estado, bem como
sua organização político-social dela emanada, permitiam que
muitos abusos de autoridade fossem cometidos impunemente
pelos senhores de engenho. Nesse sentido, a posse da terra e
sua ocupação com a monocultura da cana davam o poder
absoluto sobre os lavradores, agregados, trabalhadores e a
imensa maioria de pobres livres, que necessitavam de terra
para sobrevivência.
Para Diégues Júnior (1976, p.80), "a transformação dos
engenhos em usinas levou o antigo senhor de engenho a
morar na cidade, para onde levou seus hábitos, seus cos-
tumes e seu modo de vida, os quais iria transmitir para toda
a sociedade".
A mudança tecnológica, que ocorre a partir do início do
século XX, com a transformação do engenho numa indústria
moderna e com a utilização do arado na agricultura, não altera
a estrutura de produção e de poder da atividade canavieira.
Ao contrário, os antigos senhores de engenho, transformados
Formação do riqueza e da pobreza de Alagoas 53
em usineiros, discriminam seus antigos companheiros que,
por não terem terra e recursos financeiros suficientes,
permaneceram como senhores de engenho e, com o tempo,
tornaram-se fornecedores de cana para as maiores usinas.
Poucos se transformaram em usineiros, já que, nessa nova
condição, necessitavam de muita terra para plantarem cana e
obteremcrédito junto ao governo. Houve usinas que chegaram
a incorporar dez engenhos. Todavia, é curioso que as 24
famílias de senhores de engenho tradicionais de Alagoas
transformaram-se em usineiros, aumentando muitas vezes as
áreas de suas propriedades e o número de fornecedores.
Esse processo de concentração de terra e indústria no
meio rural, nas mãos de poucas famílias, teve amplo apoio
financeiro dos governos federal, estadual e municipal.
Portanto, a história da cana-de-açúcar, em Alagoas, é a
história da relação entre propriedade latifundiária e poder.
Essa herança histórica é determinante da estrutura agrícola,
econômica e social do Estado.
Os senhores de engenho e, depois, os usineiros, que
tinha m o controle da propriedade fundiá ria, possuíam
também a base do poder político que usavam, muito bem, na
obtenção de privilégios, transformando a sociedade alagoana
num Estado praticamente dependente de urna única atividade
econômica.
Em Alagoas, em 1931, havia 27 usinas, convivendo com
618 engenhos bangüês, que produziam cerca de 31%do açúcar
alagoano. Com o novo surto de desenvolvimento das usinas,
. .,_ provocado pela Segunda Guerra Mundial, elas não só
aumentaram a sua produção, como também, devido ao uso do
caminhão e ao melhoramento das rodovias, passaram a ampliar
sua área de influência, estendendo o plantio.
O governo federal, através do IAA (Instituto do Açúcar
e do Álcool), fundado na era Vargas, cria uma série de
54 Fernando José de Lira
UFAL T~CA CEN1RAl
BBL0 ~
medidas que acabam por financiar a compra de terra e,
conseqüentemente, o aumento da área cultivada com cana,
rhcgando a atingir a Zona da Mata, o Litoral e o Plan alto,
também chamado de Tabuleiro.
Como afirma Pedro Ramos (1999, p.80), "entre 1885 a 1890
o governo de Pernambuco e o de Alagoas subsidiaramfortemente
n montagem de diversas usinas. As facilidades oferecidas pelo
governo republicano, para a montagem dessa unidade fabril
isolada,foram tantas que mesmo os médios fornecedores de cana
• • ~ • • li
ururam-se e cnaram sua propna usma .
Seguindo essa linha de apoio do período republicano,
os outros subseqüentes também ofereceram os mesmos
pl'ivilégios e mantiveram intacta a estrutura de dominação
vigente na atividade agropecuária, só que mais ampliada,
nlingindo todos os setores da sociedade alagoana. Essa ação
paternalista do Estado, ao criar forte sistema de defesa da
utividade açucareira, acabou por reforçar o atraso relativo das
11tividades praticadas pelos usineiros, que tinham
mentalidade de grandes latifundiários.
Para Pedro Ramos (1999,p.70), os diversos mecanismosque
o Estado utilizou em benefício de um único segmento social
serviram tão somente paraconsolidaruma estrutura de produção,
que não se justifica do ponto de vista social. Como se sabe, a
estrutura fundiária concentrada, herdada do passado colonial,
foi fortalecida pelos sucessivos governos que têm marcado a
sociedade alagoana.
Com os subsídios estatais e a concentração da propriedade
da terra, os senhores de engenho, desde o século XVIII, e os
usineiros, a partir do final do século XIX, usam sua força política
(ll·ansferida de pais para filhos), fazendo valer seus interesses e
mantendo o comportamento típico da classe senhorial, com
reflexos profundos na sociedade alagoana, inibindo, inclusive,
quaisquer reformas e mudanças.
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 55
Para Pedro Ramos (1999, p.80), o poder políticodos senhores
de engenho e, em tempos mais modernos, o dos usineiros decorre
do fato de serem grandes proprietários de terra, numa espécie de
monopólio da posse dos meios de produção.
Mesmo as reformas modernizantes das atividades agrícolas
enão-agricolas foram bloqueadas. Aidéiade criação dos engenhos
centrais, que separava a propriedade da indústria da propriedade
da terra, logo foi inviabilizada pelos senhores de engenho, que
temiamperdero poder de latifundiário, passandoa seremsimples
fornecedores de cana.
Com a crise decorrente da grande concorrência do açúcar
brasileiro no mercado externo, o governo resolveu modernizar a
atividade, procurando aumentar sua produtividade, oferecendo
cré~ito abundante, fácil e de baixo custo no âmbito federal e apoio
da irúra-estrutura física das esferas estaduais e municipais. Esse
incentivo, porém, funcionou contrariamente ao esperado, como
estímulo para o usineiro resistir ao processo de modernização da
produção açucareira.
Sensível às pressões desse segmento, o governo acabou
por concordar em fornecer algumas garantias, como o
tabelamento do preço da cana, que favoreceu o usineiro na
compra das cotas obrigatórias da produção dos fornecedores,
com prejuízo para estes.
Outrofatorquedemonstrouopoderdosusineirosfoiodecorrente
do a·escimento da produção.paulista que ameaçava a do Nordeste, de
custo mais elevado. Preocupados em manter seus privilégios, os
usineiros dessa região declaram-se ineficientes e exigiram do governo
federal não só o estabelecimento de cotas por região, por estado e por
usina, como também a equalização de custos. Com o argumento de
queseuscustoserammaiselevadosdoqueosdeSãoPaulo,reivindicam
um preço maior para o açúcar do Nordeste.
Nessa nova fase deconcorrência,sobreviveramaquelas usinas
que tinham mais condições de possuir mais terra. Os pequenos
56 Fernando José de Lira
fornecedores, mesmo organizados em cooperativas, foram os
primeiros a serem expulsos de suas terras que as usinas passarama
incorporar à sua área de influência, procedendo igualmente comos
medios fornecedores que tmham pequenas usinas.
Reconhecendo a crise da baixa produtividade, na segunda
metade do século XIX, o governo republicano tratou de modernizar
,1 produção açucareira. Para isso, foi idealizada a implantação dos
L•ngenhos centrais, com máquinas modernas capazes de esmagar
li canade vários engenhos bangüêse defabricar o açúcar de melhor
qualidade, mais aceito no mercado externo.
Na sua concepção, os engenhos centrais separariam a
otividadeindustrial da atividade agrícola. Montados e garantidos
pelo governo, deveriam pertencera companhias estrangeiras, que
não poderiam cultivar cana, não usariam braços escravos e
ueveriam construir estradas de ferro para o transporte de cana
uté a fábrica, substituindo os carros de boi, que se limitariam a
levar as canas de áreas distantes das estradas de ferro.
Com essa visão, o Estado também tratou de determinar a
localização dos engenhos centrais, a fim de que cada um tivesse
,1 sua zona de influência e de que não houvesse concorrência
predatória entre eles.
EmAlagoas,naúltima décadadoséculoXIX, foramimplantados
os engenhos centrais Brasileiro, Utinga Leão e Sinimbu. Apesar da
importânciadaidéia,essa implantaçãonão recebeuapoiodos senhores
ele engenho bangüê, que temiam perder o poder de serem donos do
nçúcar, ficando submetidos a grandes industriais, que iriam utilizar
suas canas no fabrico do açúcar. Ou seja, haveria a separação das
atividades de produção de cana e de produção do açúcar.
A resistência dos senhores de engenho a essa idéia deu
origem à transformação do engenho bangüê em usina, onde o
senhor, agora usineiro, passaria a ser dono da cana e do açúcar,
continuando, portanto,como industrial e, ao mesmo tempo, como
grande latifundiário.
Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 57
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas
Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas

Mais conteúdo relacionado

Semelhante a Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas

IECJ - Cap. 9 - A organização do espaço nordestino
IECJ - Cap. 9 - A organização do espaço nordestinoIECJ - Cap. 9 - A organização do espaço nordestino
IECJ - Cap. 9 - A organização do espaço nordestinoprofrodrigoribeiro
 
Projeto açaí vida verde implantação itapuã 2016
Projeto açaí vida verde   implantação itapuã 2016Projeto açaí vida verde   implantação itapuã 2016
Projeto açaí vida verde implantação itapuã 2016Leonardo Pool
 
Geo h e_7o_cap11_nordeste
Geo h e_7o_cap11_nordesteGeo h e_7o_cap11_nordeste
Geo h e_7o_cap11_nordesteTI Medianeira
 
Santana caracterização
Santana caracterizaçãoSantana caracterização
Santana caracterizaçãoDuarte Nunes
 
Produção de alimentos x fome
Produção de alimentos x fomeProdução de alimentos x fome
Produção de alimentos x fomeEdenilson Morais
 
Rev codo relatorio dados segundarios 2015
Rev codo  relatorio dados segundarios 2015Rev codo  relatorio dados segundarios 2015
Rev codo relatorio dados segundarios 2015Felipe Mourad
 
AmandiocaFernandoEzetaDocumentos41981.pdf
AmandiocaFernandoEzetaDocumentos41981.pdfAmandiocaFernandoEzetaDocumentos41981.pdf
AmandiocaFernandoEzetaDocumentos41981.pdfMarcioSitoe1
 
MONOGRAFIA EM CANA-DE-AÇÚCAR-ANTONIO INACIO FERRAZ, TÉCNICO EM ELETRONICA, AG...
MONOGRAFIA EM CANA-DE-AÇÚCAR-ANTONIO INACIO FERRAZ, TÉCNICO EM ELETRONICA, AG...MONOGRAFIA EM CANA-DE-AÇÚCAR-ANTONIO INACIO FERRAZ, TÉCNICO EM ELETRONICA, AG...
MONOGRAFIA EM CANA-DE-AÇÚCAR-ANTONIO INACIO FERRAZ, TÉCNICO EM ELETRONICA, AG...Antonio Inácio Ferraz
 
Desenvolvimento e agroindustria familair
Desenvolvimento e agroindustria familairDesenvolvimento e agroindustria familair
Desenvolvimento e agroindustria familairGilson Santos
 
Matrizes produtivas do tocantins
Matrizes produtivas do tocantinsMatrizes produtivas do tocantins
Matrizes produtivas do tocantinsDanuzia Dalat
 
UE7 - O Espaço Agropecuário Brasileiro
UE7 - O Espaço Agropecuário Brasileiro UE7 - O Espaço Agropecuário Brasileiro
UE7 - O Espaço Agropecuário Brasileiro Silvio Araujo de Sousa
 
Oficinas de Sistemas Agroflorestais: Território do Alto Jurua-AM
Oficinas de Sistemas Agroflorestais: Território do Alto Jurua-AMOficinas de Sistemas Agroflorestais: Território do Alto Jurua-AM
Oficinas de Sistemas Agroflorestais: Território do Alto Jurua-AMAugusto Rocha
 
Geografia turismo região sudeste (103)
Geografia   turismo região sudeste (103)Geografia   turismo região sudeste (103)
Geografia turismo região sudeste (103)Felipe Andrade
 

Semelhante a Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas (20)

IECJ - Cap. 9 - A organização do espaço nordestino
IECJ - Cap. 9 - A organização do espaço nordestinoIECJ - Cap. 9 - A organização do espaço nordestino
IECJ - Cap. 9 - A organização do espaço nordestino
 
Diario eletronico
Diario eletronicoDiario eletronico
Diario eletronico
 
Região sudeste slides1
Região sudeste slides1Região sudeste slides1
Região sudeste slides1
 
Projeto açaí vida verde implantação itapuã 2016
Projeto açaí vida verde   implantação itapuã 2016Projeto açaí vida verde   implantação itapuã 2016
Projeto açaí vida verde implantação itapuã 2016
 
Geo h e_7o_cap11_nordeste
Geo h e_7o_cap11_nordesteGeo h e_7o_cap11_nordeste
Geo h e_7o_cap11_nordeste
 
Santana caracterização
Santana caracterizaçãoSantana caracterização
Santana caracterização
 
Produção de alimentos x fome
Produção de alimentos x fomeProdução de alimentos x fome
Produção de alimentos x fome
 
Regiões brasileiras 2013
Regiões brasileiras 2013Regiões brasileiras 2013
Regiões brasileiras 2013
 
Historia geografia parana
Historia geografia paranaHistoria geografia parana
Historia geografia parana
 
Rev codo relatorio dados segundarios 2015
Rev codo  relatorio dados segundarios 2015Rev codo  relatorio dados segundarios 2015
Rev codo relatorio dados segundarios 2015
 
Região Sul
Região SulRegião Sul
Região Sul
 
Cartilha cultivo de_tilápias_em_gaiolas
Cartilha cultivo de_tilápias_em_gaiolasCartilha cultivo de_tilápias_em_gaiolas
Cartilha cultivo de_tilápias_em_gaiolas
 
AmandiocaFernandoEzetaDocumentos41981.pdf
AmandiocaFernandoEzetaDocumentos41981.pdfAmandiocaFernandoEzetaDocumentos41981.pdf
AmandiocaFernandoEzetaDocumentos41981.pdf
 
MONOGRAFIA EM CANA-DE-AÇÚCAR-ANTONIO INACIO FERRAZ, TÉCNICO EM ELETRONICA, AG...
MONOGRAFIA EM CANA-DE-AÇÚCAR-ANTONIO INACIO FERRAZ, TÉCNICO EM ELETRONICA, AG...MONOGRAFIA EM CANA-DE-AÇÚCAR-ANTONIO INACIO FERRAZ, TÉCNICO EM ELETRONICA, AG...
MONOGRAFIA EM CANA-DE-AÇÚCAR-ANTONIO INACIO FERRAZ, TÉCNICO EM ELETRONICA, AG...
 
Desenvolvimento e agroindustria familair
Desenvolvimento e agroindustria familairDesenvolvimento e agroindustria familair
Desenvolvimento e agroindustria familair
 
Matrizes produtivas do tocantins
Matrizes produtivas do tocantinsMatrizes produtivas do tocantins
Matrizes produtivas do tocantins
 
UE7 - O Espaço Agropecuário Brasileiro
UE7 - O Espaço Agropecuário Brasileiro UE7 - O Espaço Agropecuário Brasileiro
UE7 - O Espaço Agropecuário Brasileiro
 
Oficinas de Sistemas Agroflorestais: Território do Alto Jurua-AM
Oficinas de Sistemas Agroflorestais: Território do Alto Jurua-AMOficinas de Sistemas Agroflorestais: Território do Alto Jurua-AM
Oficinas de Sistemas Agroflorestais: Território do Alto Jurua-AM
 
Agronegocio no mercosul
Agronegocio no mercosulAgronegocio no mercosul
Agronegocio no mercosul
 
Geografia turismo região sudeste (103)
Geografia   turismo região sudeste (103)Geografia   turismo região sudeste (103)
Geografia turismo região sudeste (103)
 

Mais de Myllena Azevedo

Certeau a cultura no plural
Certeau a cultura no pluralCerteau a cultura no plural
Certeau a cultura no pluralMyllena Azevedo
 
Ferrare Josemary A preservação do patrimônio histórico um re pensar Marechal ...
Ferrare Josemary A preservação do patrimônio histórico um re pensar Marechal ...Ferrare Josemary A preservação do patrimônio histórico um re pensar Marechal ...
Ferrare Josemary A preservação do patrimônio histórico um re pensar Marechal ...Myllena Azevedo
 
Barros Rogato A aventura do sonho das imagens em Alagoas
Barros Rogato A aventura do sonho das imagens em AlagoasBarros Rogato A aventura do sonho das imagens em Alagoas
Barros Rogato A aventura do sonho das imagens em AlagoasMyllena Azevedo
 
Cauquelin a invenção da paisagem
Cauquelin a invenção da paisagemCauquelin a invenção da paisagem
Cauquelin a invenção da paisagemMyllena Azevedo
 
Sant'ana uma associação centenária
Sant'ana uma associação centenáriaSant'ana uma associação centenária
Sant'ana uma associação centenáriaMyllena Azevedo
 
Ramos viventes das alagoas
Ramos viventes das alagoasRamos viventes das alagoas
Ramos viventes das alagoasMyllena Azevedo
 
Carneiro silva jardins de burle marx nordeste
Carneiro silva jardins de burle marx nordesteCarneiro silva jardins de burle marx nordeste
Carneiro silva jardins de burle marx nordesteMyllena Azevedo
 
Sant'ana efemérides alagoanas
Sant'ana efemérides alagoanasSant'ana efemérides alagoanas
Sant'ana efemérides alagoanasMyllena Azevedo
 
Burle Marx arte e paisagem 2
Burle Marx arte e paisagem 2Burle Marx arte e paisagem 2
Burle Marx arte e paisagem 2Myllena Azevedo
 
Marx nosso chão do sagrado ao profano 4
Marx nosso chão do sagrado ao profano 4Marx nosso chão do sagrado ao profano 4
Marx nosso chão do sagrado ao profano 4Myllena Azevedo
 
Gomes a condição urbana
Gomes a condição urbanaGomes a condição urbana
Gomes a condição urbanaMyllena Azevedo
 
Tagari andrade schlee sistemas de espaços livres
Tagari andrade schlee sistemas de espaços livresTagari andrade schlee sistemas de espaços livres
Tagari andrade schlee sistemas de espaços livresMyllena Azevedo
 
Lira Crise, privilégio e pobreza 3
Lira Crise, privilégio e pobreza 3Lira Crise, privilégio e pobreza 3
Lira Crise, privilégio e pobreza 3Myllena Azevedo
 
Lindoso a interpretação da província 2
Lindoso a interpretação da província 2Lindoso a interpretação da província 2
Lindoso a interpretação da província 2Myllena Azevedo
 
Saldanha o jardim e a praça
Saldanha o jardim e a praçaSaldanha o jardim e a praça
Saldanha o jardim e a praçaMyllena Azevedo
 
Habermas mudança estrutural da esfera pública
Habermas mudança estrutural da esfera públicaHabermas mudança estrutural da esfera pública
Habermas mudança estrutural da esfera públicaMyllena Azevedo
 
Segawa arquiteturas no brasil 2
Segawa arquiteturas no brasil 2Segawa arquiteturas no brasil 2
Segawa arquiteturas no brasil 2Myllena Azevedo
 
Pedrosa histórias do velho jaraguá 2
Pedrosa histórias do velho jaraguá 2Pedrosa histórias do velho jaraguá 2
Pedrosa histórias do velho jaraguá 2Myllena Azevedo
 

Mais de Myllena Azevedo (20)

PPT PF 08jul2014 2.pdf
PPT PF 08jul2014 2.pdfPPT PF 08jul2014 2.pdf
PPT PF 08jul2014 2.pdf
 
Certeau a cultura no plural
Certeau a cultura no pluralCerteau a cultura no plural
Certeau a cultura no plural
 
Ferrare Josemary A preservação do patrimônio histórico um re pensar Marechal ...
Ferrare Josemary A preservação do patrimônio histórico um re pensar Marechal ...Ferrare Josemary A preservação do patrimônio histórico um re pensar Marechal ...
Ferrare Josemary A preservação do patrimônio histórico um re pensar Marechal ...
 
Barros Rogato A aventura do sonho das imagens em Alagoas
Barros Rogato A aventura do sonho das imagens em AlagoasBarros Rogato A aventura do sonho das imagens em Alagoas
Barros Rogato A aventura do sonho das imagens em Alagoas
 
Cauquelin a invenção da paisagem
Cauquelin a invenção da paisagemCauquelin a invenção da paisagem
Cauquelin a invenção da paisagem
 
Sant'ana uma associação centenária
Sant'ana uma associação centenáriaSant'ana uma associação centenária
Sant'ana uma associação centenária
 
Ramos viventes das alagoas
Ramos viventes das alagoasRamos viventes das alagoas
Ramos viventes das alagoas
 
Carneiro silva jardins de burle marx nordeste
Carneiro silva jardins de burle marx nordesteCarneiro silva jardins de burle marx nordeste
Carneiro silva jardins de burle marx nordeste
 
Sant'ana efemérides alagoanas
Sant'ana efemérides alagoanasSant'ana efemérides alagoanas
Sant'ana efemérides alagoanas
 
Burle Marx arte e paisagem 2
Burle Marx arte e paisagem 2Burle Marx arte e paisagem 2
Burle Marx arte e paisagem 2
 
Marx nosso chão do sagrado ao profano 4
Marx nosso chão do sagrado ao profano 4Marx nosso chão do sagrado ao profano 4
Marx nosso chão do sagrado ao profano 4
 
Gomes a condição urbana
Gomes a condição urbanaGomes a condição urbana
Gomes a condição urbana
 
Tagari andrade schlee sistemas de espaços livres
Tagari andrade schlee sistemas de espaços livresTagari andrade schlee sistemas de espaços livres
Tagari andrade schlee sistemas de espaços livres
 
Lira Crise, privilégio e pobreza 3
Lira Crise, privilégio e pobreza 3Lira Crise, privilégio e pobreza 3
Lira Crise, privilégio e pobreza 3
 
Lindoso a interpretação da província 2
Lindoso a interpretação da província 2Lindoso a interpretação da província 2
Lindoso a interpretação da província 2
 
Gomes o brasil de jk
Gomes o brasil de jkGomes o brasil de jk
Gomes o brasil de jk
 
Saldanha o jardim e a praça
Saldanha o jardim e a praçaSaldanha o jardim e a praça
Saldanha o jardim e a praça
 
Habermas mudança estrutural da esfera pública
Habermas mudança estrutural da esfera públicaHabermas mudança estrutural da esfera pública
Habermas mudança estrutural da esfera pública
 
Segawa arquiteturas no brasil 2
Segawa arquiteturas no brasil 2Segawa arquiteturas no brasil 2
Segawa arquiteturas no brasil 2
 
Pedrosa histórias do velho jaraguá 2
Pedrosa histórias do velho jaraguá 2Pedrosa histórias do velho jaraguá 2
Pedrosa histórias do velho jaraguá 2
 

Último

Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdfRecomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdfFrancisco Márcio Bezerra Oliveira
 
matematica aula didatica prática e tecni
matematica aula didatica prática e tecnimatematica aula didatica prática e tecni
matematica aula didatica prática e tecniCleidianeCarvalhoPer
 
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptxSlides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptxLuizHenriquedeAlmeid6
 
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! SertãConstrução (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! SertãIlda Bicacro
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - AGRONOMIA.pdf AGRONOMIAAGRONOMIA
PROJETO DE EXTENSÃO I - AGRONOMIA.pdf AGRONOMIAAGRONOMIAPROJETO DE EXTENSÃO I - AGRONOMIA.pdf AGRONOMIAAGRONOMIA
PROJETO DE EXTENSÃO I - AGRONOMIA.pdf AGRONOMIAAGRONOMIAHELENO FAVACHO
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...azulassessoria9
 
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividadesRevolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividadesFabianeMartins35
 
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de HotéisAbout Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéisines09cachapa
 
"É melhor praticar para a nota" - Como avaliar comportamentos em contextos de...
"É melhor praticar para a nota" - Como avaliar comportamentos em contextos de..."É melhor praticar para a nota" - Como avaliar comportamentos em contextos de...
"É melhor praticar para a nota" - Como avaliar comportamentos em contextos de...Rosalina Simão Nunes
 
Jogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para crianças
Jogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para criançasJogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para crianças
Jogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para criançasSocorro Machado
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdf
PROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdfPROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdf
PROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdfHELENO FAVACHO
 
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdfLeloIurk1
 
Slide - EBD ADEB 2024 Licao 02 2Trim.pptx
Slide - EBD ADEB 2024 Licao 02 2Trim.pptxSlide - EBD ADEB 2024 Licao 02 2Trim.pptx
Slide - EBD ADEB 2024 Licao 02 2Trim.pptxedelon1
 
Projeto_de_Extensão_Agronomia_adquira_ja_(91)_98764-0830.pdf
Projeto_de_Extensão_Agronomia_adquira_ja_(91)_98764-0830.pdfProjeto_de_Extensão_Agronomia_adquira_ja_(91)_98764-0830.pdf
Projeto_de_Extensão_Agronomia_adquira_ja_(91)_98764-0830.pdfHELENO FAVACHO
 
Considere a seguinte situação fictícia: Durante uma reunião de equipe em uma...
Considere a seguinte situação fictícia:  Durante uma reunião de equipe em uma...Considere a seguinte situação fictícia:  Durante uma reunião de equipe em uma...
Considere a seguinte situação fictícia: Durante uma reunião de equipe em uma...azulassessoria9
 
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdfCurrículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdfTutor de matemática Ícaro
 
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptxTeoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptxTailsonSantos1
 
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdfApresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdfcomercial400681
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...HELENO FAVACHO
 
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdfProjeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdfHELENO FAVACHO
 

Último (20)

Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdfRecomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
Recomposiçao em matematica 1 ano 2024 - ESTUDANTE 1ª série.pdf
 
matematica aula didatica prática e tecni
matematica aula didatica prática e tecnimatematica aula didatica prática e tecni
matematica aula didatica prática e tecni
 
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptxSlides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
Slides Lição 05, Central Gospel, A Grande Tribulação, 1Tr24.pptx
 
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! SertãConstrução (C)erta - Nós Propomos! Sertã
Construção (C)erta - Nós Propomos! Sertã
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - AGRONOMIA.pdf AGRONOMIAAGRONOMIA
PROJETO DE EXTENSÃO I - AGRONOMIA.pdf AGRONOMIAAGRONOMIAPROJETO DE EXTENSÃO I - AGRONOMIA.pdf AGRONOMIAAGRONOMIA
PROJETO DE EXTENSÃO I - AGRONOMIA.pdf AGRONOMIAAGRONOMIA
 
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
PROVA - ESTUDO CONTEMPORÂNEO E TRANSVERSAL: COMUNICAÇÃO ASSERTIVA E INTERPESS...
 
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividadesRevolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
Revolução russa e mexicana. Slides explicativos e atividades
 
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de HotéisAbout Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
About Vila Galé- Cadeia Empresarial de Hotéis
 
"É melhor praticar para a nota" - Como avaliar comportamentos em contextos de...
"É melhor praticar para a nota" - Como avaliar comportamentos em contextos de..."É melhor praticar para a nota" - Como avaliar comportamentos em contextos de...
"É melhor praticar para a nota" - Como avaliar comportamentos em contextos de...
 
Jogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para crianças
Jogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para criançasJogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para crianças
Jogo de Rimas - Para impressão em pdf a ser usado para crianças
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdf
PROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdfPROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdf
PROJETO DE EXTENSÃO I - SERVIÇOS JURÍDICOS, CARTORÁRIOS E NOTARIAIS.pdf
 
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
421243121-Apostila-Ensino-Religioso-Do-1-ao-5-ano.pdf
 
Slide - EBD ADEB 2024 Licao 02 2Trim.pptx
Slide - EBD ADEB 2024 Licao 02 2Trim.pptxSlide - EBD ADEB 2024 Licao 02 2Trim.pptx
Slide - EBD ADEB 2024 Licao 02 2Trim.pptx
 
Projeto_de_Extensão_Agronomia_adquira_ja_(91)_98764-0830.pdf
Projeto_de_Extensão_Agronomia_adquira_ja_(91)_98764-0830.pdfProjeto_de_Extensão_Agronomia_adquira_ja_(91)_98764-0830.pdf
Projeto_de_Extensão_Agronomia_adquira_ja_(91)_98764-0830.pdf
 
Considere a seguinte situação fictícia: Durante uma reunião de equipe em uma...
Considere a seguinte situação fictícia:  Durante uma reunião de equipe em uma...Considere a seguinte situação fictícia:  Durante uma reunião de equipe em uma...
Considere a seguinte situação fictícia: Durante uma reunião de equipe em uma...
 
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdfCurrículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
Currículo - Ícaro Kleisson - Tutor acadêmico.pdf
 
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptxTeoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
Teoria heterotrófica e autotrófica dos primeiros seres vivos..pptx
 
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdfApresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
Apresentação ISBET Jovem Aprendiz e Estágio 2023.pdf
 
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
PROJETO DE EXTENSÃO I - TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO Relatório Final de Atividade...
 
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdfProjeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
Projeto de Extensão - ENGENHARIA DE SOFTWARE - BACHARELADO.pdf
 

Formação da riqueza e da pobreza em Alagoas

  • 2. . I ai ucza e da pobreza de Alagoas. 201628 Ex. 3 Pat.: 124647 UFAL V J té - Formação da riqueza e da pobr~za de Alagoas Maceió, 2007
  • 3. 1 • L768c UNIVERSIDADE FEDERAL DE ALAGOAS Reitora Ana Dayse Rezende Dorea Vice-reitor Eurico de Barros lôbo Filho Diretora da Edufal Sheila Diab Molut Conselho Editorial Sheila Díab Molut (Presidente) Cícero Péricles de Oliveira Corvolho Maria do Socorro Aguiar de Oliveira covalcante Roberto Sarmento lima lrocílda Morío de Mouro lima Llndemberg Medeiros de Araújo Flóvio Antônio Mirando de souza Eurico Pinto de Lemos Antonio de Pódua Cavalcante Crlstlane Cyrlno Estevõo Oliveira Supervisão gráfica: Mórcio Roberto Vieira de Melo Projeto gróflco e diagramação: Vivíon Rocha Cotologoçõo no fonte UnNersidode Federal de Alagoas Biblioteca Central - Divisão de Tro tamento Técnico Bibllotecório Responsável: Helena Cris11na Pimentel do Vale lira. Fernando José de. Formação d o riqueza e da pabreza de Alagoas I Fernando Lira. - Maceió : EDUFAL. 2007. 320p. : il.. grofs.. tabs. Bibliografia: p. 313-320. l . Economia regional - Alagoas. 3. Alagoas -Aspectos sociais. 3. Riqueza - Alagoas. 4. Pobreza - Alagoas. 1. Título. CDU: 332.1 (813.5) ISBN 85·71 77-31 3-4 Direitos desta edlÇõo reservados à Edutal - Edlte<o dO Universidade Federal de Alagoas Campus AC. Simões. BR 104, Km. 97,6-Fone/Fox:(82) 3214 1111 Tabuleiro do Martins· CEP· 57.072·970 ·Maceió · Alagoas E-mail:edufal@edufal.urol.br - Site: www.edufal.ufal.br À minha mãe Aliete e ao meu pai João. A Adeilda e a milha querida filha Ilana. Aos meus irmãos e irmãs, especialmente a Petrúcio.
  • 4. Agradecimentos Este trabalho é fruto de pesquisas feitas com estudantes de graduação, em trabalho de iniciação científica, com mestrandos do Programa Regional de Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA), em dissertação de mestrado e, portanto, a essas pessoas, que contribuíram direta e indiretamente, os nossos agradecimentos. Agradecimentos especiais aos colegas professores Cícero Péricles de Carvalho e Rodrigo Ramalho Filho que leram os originais. O conteúdo apresentado e os erros cometidos são de minha inteira responsabilidade. Agradecemos, ainda o SEBRAE pelo apoio fornecido, particularmente ao Marcos Vieira.
  • 5. Sumário Introdução, 1 Capítulo 1: Formação do paraíso sucroalcooleiro, 9 1.1 - A conquista da terra, 15 1.2 - Reprodução e subordinação da força de trabalho, 39 Capítulo II: O poder de base agrária, 51 2.1 - As raízes do poder em alagoas, 52 2.2 - Os proprietários do poder, 80 2.3 - Um padrão de crescimento excludente, 87 2.4 - O aumento da riqueza, 93 2.5 - O modo latifundiário de produção, 97 Capítulo III: A ilusão da inclusão, 103 3 .1 - Características locais, 105 3.1.l - Leste, 109 3.1.2 - Agreste, 110 3.1.3 - Sertão, 111 3.3 - Formas de ocupação, 113 3.4 - A indústria do Estado de Alagoas, 123 3.4.1 - Caracterização tecnológica, 124 3.4.2 - Estratégias de gestão da produção, 126 3.4.3 - Estratégias voltadas ao meio ambiente, 130 3.4.4 - Emprego e recursos humanos, 132 3.4.5 - Treinamento e educação formal, 150 3.4.6 - Caracterização geral das empresas inovadoras,156 3.5 - A economia dos serviços em Alagoas, 158 3.6 - Emprego e recursos humanos, 164 3.7 - Requisitos de escolaridade formal, 173
  • 6. Capítulo IV 4.1 - Ocupação, renda e exclusão, 179 4.2 - Retrato dos sem futuro, 193 4.3 - Os trabalhadores fora da lei, 211 Capítulo V: Alagoas aos pedaços, 221 5.1 - C~ract~rização socioeconômicas das sub-regiões, 224 5.2 - Dmâm1ca econômica, 225 5.3 - Aspectos sociais, 225 Capítulo VI: Estrutura produção monopolista, 251 6.1 - Emprego e renda, 281 6.2 - Natureza e realidade das empresas nas sub-regiões, 285 Considerações finais, 305 Blibiografia consultada, 313 Introdução Em Alagoas, as sesmarias doadas aos futuros senhores de engenhos localizavam-se nas melhores terras. Favorecida por solos de massapé, várzeas, encostas e rios todos caudalosos e navegáveis, a atividade açucareira encontrou, nessa província, condições excelentes para a implantação e expansão dos engenhos de açúcar. Os engenhos, a princípio, localizados em Porto Calvo, logo aumentaramemárea e número, alcançando todo o litoral e Zona da Mata alagoana. Assim, com o apoio imperial, que tinha o açúcar como o grande negócio estabelecido na colônia, a partir do século XVIII, Alagoas transformou-se numa província de predominância absoluta da cana-de-açúcar. Os amigos do governo provincial e do Imperador recebiamsesmarias, recursos financeiros e escravos para avançarem nas ocupações da região alagoana e, conseqüentemente, produzirem mais açúcar para ser exportado para a Europa. No intuito de aumentarem a produção e a exportação de açúcar, os senhores de engenho derrubavam as matas, expulsavam os índios, confinando-os em aldeia, de modo a permitir que o avanço da plantação de cana, na forma de monocultura,fizesse de Alagoas a segunda região mais produtora de açúcar, no Brasil colonial. Esse domínio da monocultura da cana-de-açúcar, baseada na doação de sesmaria e na mão-de-obra escrava, fazia dos senhores de engenhos grandes latifundiários e possuidores de poder econômico e políticona província alagoana. A terra, doada Formaçõo do riqueza o do pobreza de Alagoas 1
  • 7. l'Jn ubumllndo, para os senhores de engenho plantarem cana, l'ru d~· dif(d Jac0sso aos pequenos produtores de culturas voltadas t p rodução de alimento para abastecer a população. Por conseguinte, toda a população de Alagoas vivia na dependência da importação de alimentos e dos grandes latifundiários, que usavam a terra como um forte instrumento de poder. Então, corno senhores de engenho e do poder absoluto, receberam todo o apoio da Corte Portuguesa, do governo impe- rial brasileiro, bem como dos governos republicano e estadual. Por mais de três séculos, o engenho de açúcar era a única unidade de produção socialmente dominante e economicamente viável que existia em Alagoas. As outras atividades surgiram derivadas das necessidades do engenho. Assim foi com a pecuária, com a produção de alimentos, com os pequenos produtores independentes e com os comerciantes. Nesse sentido, a formação econômica, social e política de Alagoas tem raízes profundas no modo de implantação da atividade canavieira, no Estado. Por conseguinte, do século XVI ao século XX, a história de Alagoas tem como núdeo a história da agroindústria do açúcar. Nessas condições históricas, o padrão adotado é o agrário tradicional que, pelasuaimportância econômica e política, acaba por definir o comportamento da agropecuária, da indústria, do setor serviço, do setor público e da sociedade em geral. Nesse modelo, a prioridade é a grande empresa - com mais de 100 empregados, onde existe pouca diferenciação da produção, baixa competitividade sistêrnica e relações de trabalho predo- min~ntemente informais, gerando forte exclusão social rum ambiente desfavorável aos pequenos e microempreendedores. No setor agricola, corno já destacamos, predomina a cultura da cana-de-açúcar e a pecuária de leite praticadas em grandes propriedades - acima de 1.000 hectares de terras - ocupando uma área de538mile295milhectares respectivamentee,porconseguinte, 2 Fernando José de Lira a cana-de-açúcar ocupa 69,3% da área cultivada, sendo que sua predominância está na Zona da Mata e nos Tabuleiros Coste~o~. ~ pecuária de leite no Sertão, principalmente em tomo do muruop10 de Batalha, representa 97,7% da área com pecuária. Quanto à ocupação de mão-de-obra em2000, a tabela1 deixa claro que as culturas da cana-de-açúcar, mandioca e milho for~m as que mais empregaram. Na pecuária, a bovinocultura de leite demandou 80% dos ocupados nessa atividade. As culturas de mandioca, milho, arroz e feijão, cultivadas por pequenos produtores - com até 100 ha de terras - foram responsáveis por 12,3%, 10,2%, 4,6% e 3,4%, respectivamente, do total de mão-de-obra. Juntas, essas culturas demandaram quase um terço dos ocupados agrícolas. Localizadas principalmente no A~reste e na região do Baixo São Francisco, são cultivadas em s1~temas agrícolas de baixo nível tecnológico e destinadas ao abastecrmento do mercado interno. A cultura do fumo é uma atividade de alta produtividade e, no passado recente, também de alta rentabilidade, a~ém .de grande empregadora de mão-de-obra. A região fumageir~ fica situada no Agreste, tendo por base o município de Arapuaca, centro produtor, industrializador e distribuidor do produto. ~n­ tre 1973e1983, a taxa de crescimento da produção de fumo foi de 5% ao ano, praticamente como resultado da expansão da área plantada. Já no período de 1984 a 1994, a produção caiu 3,4% ao ano, tanto na área cultivada como no rendimento da terra. Atualmente, o fumo apresen:ta baixo dinamismo, devido à insuficiência em pesquisa, controle de qualidade e assistência técnica, além de baixo preço. No setor industrial, destacam-se as grandes unidades agroindustriais das atividadessucroalcooleiras,representa~as por alimentos e bebidas que, em 1999, possuíam 49 umdades industriais, ocupavam39,5% do total e 81,3% da mão-de-obra do setor. A indústria intermediária, de bens de capital e de consumo Formação do riqueza e do pobreza de Alagoas 3
  • 8. d11mvc•l1-1, t pouco representativa e é basicamente indústria qu11nk11 t' dl.! combustíveis que ocupa 68,5% dos empregados do lul1il d11s inuústrias desse ramo. Eni suma, a característica mais marcante da indústria nlugoana é a enorme importância da divisão de alimentos e bebidas decorrente da produção de açúcar. Essas indústrias empregam81%de todas as pessoas ocupadas na indústria e junto com os 9% dos trabalhadores empregados no segmento de química e combustíveis, que tambémcontéma produçãode álcool combustível, demonstram a verdadeira importância econômica e política do complexo sucroalcooleiro. . A dis~ibuição espacialdesse tipo de indústria não privilegia a rrucrorreg1ão de Maceió, uma vez que a usina de açúcar e a de~tilaria de álcool localizam-sejunto à fonte de matéria-prima e mao-de-obra, contribuindo para o emprego de mão-de-obra agrícola não qualificada e gerando muitas ocupações não- agrícolas no meio rural. Portanto, a agropecuária e a indústria alagoana, ao contrário do que ocorreemSanta Catarinae nos demais Estados brasileiros, são constituídas, principalmente, por unidades de grande porte, o que se deve ao tipo de produção das usinas de açúcar que demandam áreas de grande tamanho. É possível, todavia, que ~equenos produtores, organizados em cooperativas, possamcul- tivar a cana-de-açúcar com grandes possibilidades de sucesso. Emrelação às condições de trabalho, em 2001, eram bastante precárias, pois 86,8% dos ocupados na agricultura eram trabalhadores informais. Na indústria, a informalidade chegava a 60,5% dos empregados e, no setor serviço, mais de 72% não tinham carteira de trabalho assinada e não contribuíam para a previdência social. Quanto ao nível de informalidade das ocupações, de forma · desagregada, a construção civil é o ramo que possui a maior proporção de ocupados informais, 97,4%; seguida da agricultura 4 Fernando José de Lira com 86,8%; outras atividades com 81,2%; o comércio de mercadoria apresentando 76,6% e, nos serviços auxiliares da atividade econômica, existiam 55,2% dos ocupados sem carteira de trabalho assinada. Porseu turno, as atividades com maior grau de formalidade eram o setor público, com 81,8% dos ocupados; serviços, 76,5%; transportes e comunicação, 74,8%; e outras atividades industriais nas quais 69,4%das pessoas tinhamcarteira de trabalho assinada. Assim, o padrão de desenvolvimento adotado partiu da premissa de que o crescimentoeconômicoseria capazde ~:on:over 0 desenvolvimento humano. Sabemos, hoje, pela expenenc1a de três décadas de aumento vigoroso da riqueza, que esse modelo não se mostrou eficaz no que se propunha, entre outros motivos, porque, oferecendo nível mínimo de desenvolvimento social às sociedades, acarreta dificuldades para se expandirem de forma sustentável. De acordo com Franco (2001), para uma sociedade atingir o estágio de desenvolvimento, a acumulação do capital humano e do capital social são dois fatores decisivos. Nesse padrão adotado, o crescimento do Produto Interno Bruto consegue acumular-se por um período limitado, mas não alcança um nível de desenvolvimento sustentável. Esse é justamente o caso de Alagoas, onde o capital social e o huma~o fkam muito abaixo da média do Nordeste, estando entre os mais dt'sfavoráveis do Brasil. Franco (2001) argumenta, ainda, que, do ponto de vista do rnpilo1social, a cooperaçãoé o primeirofatorque cria uman:1biente fovm6vcl ao desenvolvimento. E, paraque esse desenvolvimento seja suslcntável, é necessário que se instale, na coletividad~, u~a cultura uccooperaçãosistêmica. O padrão vertical de orgaruzaçao mais a subordinação e dependência que existem em Alagoas, no setor agropecuário, impedem a geração, a acm~ulação e.ª reprodução do capitalhumano e do social emcondiçõesfavoráveIS ao desenvolvimento da sociedade como um todo. Formaçõo do riqueza e da pobreza de Alagoas 5
  • 9. Ainda de acordo com Franco (2000), a acumulação de capital social se dá num ambiente de cooperação em formação de rede, ou seja, numa cultura de network e de democracia, significando dizer que a democracia é, juntamente com a rede, um ambiente necessário ao desenvolvimento. Assim, criar wn ambiente favorável ao desenvolvimento so- cial e humano sustentável é começar investindo no capital social e no capital hwnano, sobretudo nas atividades de natureza familiar. Alagoas é um espaço político, econômico e social que garante certas especificidades no desenvolvimento social e humano. Sua identidade foi construída através das imposições de um setor agroindustrial dominante, cuja elite desenvolveu ~ormas de controle rígido e antidemocrático, apropriado a seus mteresses econômicos e de poder. Esse poder político que, ao definir suas prioridades, privilegiou uns poucos eexcluiuo grosso da população da riqueza gerada, é um poder autocrático, porque gera um ambiente eco~ômico, social e político que dificulta a acumulação de capital social e humano, bem como o acesso aos meios de sobrevivência à maioria da população. Nessesentido, o modelo deprodução não-agrícola e agrícola dominante na microrregião de Maceió e no restante do Estado é um pa~rão fechado, de consenso muito restrito, mas que subordina toda a economia de Alagoas no que diz respeito à produção, relações de.trabalho, ocupação, cooperação, inovação tecnológica, criação de redes e capacidade empreendedora, etc. _O Estado, fora da microrregião de Maceió e daquelas donunadas pela cana-de-açúcar, é um vazio econômico que ainda está por ser explorado de forma produtiva e empreendedora. O modelo agrícola adotado pela maioria dos pequenos produtores é herdado do período colonial, e, na verdade, vem sofrendo apenas pequenas transformações. As práticas agrícolas quase feudais, cujas ferramentas de trabalho são a enxada, 0 6 Fernando José de lira machado e o facão, perduram até os dias atuais. São pequenos produtores com até 2 empregados, na sua maior parte analfabetos funcionais e com baixa acumulação de capitalsocial, mas passíveis de se transformaremem pequenos empreendedores cm atividades agrícolas e não-agrícolas no meio rural. Na seqüência, no primeiro capítulo, trataremos da forma de implantação e avanço da cana-de-açúcar, desde o período co- lonial até os dias atuais. No capítulo II, faremos uma abordagem sobre o modo de produção da atividade açucareira e das relações de propriedade, de produção, de trabalho e sociais, que esse modo de produção engendrou. No capítulo III, faremos a análise do modelo de desenvolvimento econômico e social adotado em /lagoas, bemcomo do papel das elites canavieiras na formação e sustentação desse modelo. Finalmente, na conclusão, mostraremos que a economia e a sociedade alagoana estão umbilícalmente dependentes das atividades geradas pela ugroindústria canavieira. Formação do rlquezo e do pobreza de Alagoas 7
  • 10. Capítulo 1 Formação do paraíso sucroalcooleiro Os portugueses que, em 1500, viviam a fase do capitalismo mercantil, ao chegarem à Bahia, estavam ~~is preocup~4_os com eIJcontr.ar, no Brasil, produtos comerciais possívêis d~seremexport_a'!._os p~aEuropa, quêlhes permitissem fazer fortuna. Inicialmente, exploraram o pau-brasil que, em abundância e facilmente extraído no litoral brasileiro, tinha grande aceitação no mercado externo, como matéria-prima para fabricação de tintas corantes. Assim, a descoberta de uma nova colônia promissora estimulou o governo português a enviar ao Brasil outras expediçõesimportantes no processo de colonização. A expedição de Martins Afonso de Souza e~tava interessada em explorar atividades comerciais que, além de_gerarem produtos aceitos no mercado externo, conb'ib-uí~m par~ a efetiva ocupação da nova colônia, no sentido de consolidar a presença portuguesa em território brasileiro. Para alcançar os dois objetivos, um imediato, que era a exportação de produtos da terra, e outro - mais de médio e longo prazos- a colonização~ a Corte Portuguesa via, no açú~§lr E:Q~~-zi_do a partir da cana, Q pfõ"aiito idealp;r~ g~a~tir segs obj~tiyos. Informada da abundância de terras no Brasi.!,_Er~c~a~ à cana-de-- açúcar, a Corte Portugues~roporcionou apoio~ à i~plan_!aç@ e exploração da ati; idade âçucareira em esc~la_c~rcial. Introduzida no Brasil, no século XVI, é, principalmente na Bahia, em Pernambuco e São Vicente, que a cana-de-açúcar vai Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 9
  • 11. :nconlT~r as condições de clima, solo e mão-de-obra capazes de tmpul~1onarem sua expansão. Além disso, como produto comer~ialment:aceito no mundo inteiroe comoatividade agrícola e ag~omdustnal, que ocupa muita terra e mão-de-obra, foi consid~rada prioritária para o processo de povoamento e ocupaçao da nova colônia. Dividido o Brasil em capitanias hereditárias, nos séculos ~ e XVII, as capitanias da Bahia e Pernambuco foram as que mais prosperaram. Seus donatários, sob orientação da Corte Portuguesa, criaram as chamadas sesmarias, que compreendiam vasta extensão de terras cultiváveis. Essas sesmarias eramdoadas às pessoas amigas ou próximas ao poder de um donatário e do Imperadpr, preferencialmente para o cultivo de cana-de-açúcar. A política de Portugal consistia no estímulo à empresa comercialcom base em poucos produtos exportáveis, produzidos er:i grande escala e baseados na grande propriedade. Conforme afuma Mendes Jr. (1976, p.68), no século XV, o açúcar era uma especiaria utilizada como remédio ou condimento exótico-) Somente no século XVI, passou a ser um produto de consumo de massa e de alto valor comercial no mercado europeu. . Nã~ se sabe bem a data em que a cana-de-açúcar foi introduzida no Brasil, todavia nas décadas de 1530e1540 a sua produçãojá eraimportante. Já em1532, Martins Afonso deSouza em expedi~:ºª.º Brasil,_~ouxeportugueses, italianos e flamengo; com ~xpenenc1a n~ atividade açucareira, adquirida na Ilha da Madeir~, que era uma colônia portuguesa com grande sucesso no cultivo da cana e fabrico do açúcar de boa qualidade, aceito em todo o continente europeu. A partirda década de trinta, do século XVI, plantou-~ecana em todas as cap~tanias brasileiras. Porém, na verdade, os grandes c~ntro~aç~careiros da colônia foram Pernambuco, Alagoas, Ba- hia,e.Sao Vicente, em São Paulo. Fatores climáticos, geográficos, pohticos e econômicos justificam essa localização. 1O Fernando José de lira As capitanias de Pernambuco e da Bahia possuíam boa 111111lidnde de solo, um adequado regime de chuvas e estavam 1, tl ,, lizadas mais perto dos centros importadores da Europa. l 1J11tavam, também, com relativa facilidade de escoamento da pmdução, pois Salvador e Recife se tomariam, como se sabe, Importantes portos de exportação. t Paraatingir essa expansão, a cana necessitou de muita terra, 1iu10-de-obra e vias de escoamento. A terra foi doada aos produtores na forma de sesmarias muitas vezes sem limites definidos. Havia algumas cujos limites eram os rios, já outras possuíam em tomo de 32 mil quilômetros quadrados. Por essas uimensões, percebe-se o tamanho exageradamente grande da propriedade onde a cana-de-açúcar começou a ser cultivada. Essas grandes áreas de terra, aparentemente livres, não t!ram tão livres assim. Em muitas delas, os seus proprietários, que as rec~biam como doação, tinham que conquistar, na prática, cada quilômetro da propriedade, pois os índios que ali viviam também se consideravam donos. Eles não aceitavam pacificamente a sua expropriação, ,resistindo com os meios que possuíam. Acostv.madosa viverem na mata, osíndiosconheciamcomo ninguém os seus esconderijos e se embrenhavam na floresta em posições de ataque ou defesa, todavia suas armas eram muito primitivas e de pequeno alcance. Quanto aos europeus, estavam bemarmados e viam os índios como grandes irúmigos pessoais e do progresso, portanto usavam de todos os meios para elimiriá- los ou expulsá-los para lugares mais distantes, até forçar a desocupação das terras pertencentes aos sesmeiros. Nessas condições, muitos índios morreram de fome ou se suicidaram. Aqueles que suportaram o aldeamento eram discdminados e perseguidos pelos colonos. Por tudo isso, o avanço da cana-de-açúcar representou urna grande tragédia à pQpµ_laç~o indígena do Nordeste. Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 11
  • 12. De acordo com Boris Fausto (2000, p.155) a escravidão dos índios enfrentou uma série de dificuldades, tendo em vista os objetivos dos plantadores de cana. Os índios tinham uma <.:ultura incompatível com o trabalho intensivo e regular que era exigido pela atividade açucareira, principalmente se esse trabalho fosse prestado na forma de escravidão. Como os colonizadores queriam cultivar a cana-de-açúcar num modo de produção racional, a escravidão dos índios teria que ser feita também nesse modelo econômico de fluxos de despesas, receitas e lucros, sem qualquer respeito à cultura indígena, obrigando-os a trabalharem de sol a sol e a viverem em condições de habitação, saúde, transporte e trabalho extremamente difíceis. . Os cuslos de captura, a recusa do trabalho forçado, a fuga relativamente fácil e a resistência pela guerra faziam dos índios uma força de trabalho de custo baixo, mas totalmente desajustada ao modo capitalista de prodúção que prevalecia nocaso da cana- de-açúcar. Outro fator desfavorável à escravidão dos índios, apontado por Carlos Fausto (1992, p.80), diz respeito às epidemias adquiridas com o contato com os colonizadores. Sem possuírem imunidadeàs doenças dos brancos, elesforam vítimasfáceis, pelo menos do sarampo, da varíola e, principalmente, da gripe. Emface dessa forte limitação do trabalho escravo prestado ~elos ~dios, a partir da década de 1570, a coroa portuguesa mcentivou a adoção de escravos africanos, e foram feitas várias leis, proibindoa escravidão indígena. Em 1758 (quase dois séculos depois), foi determinada a liberdade definitiva dos índios. A partir de 1574, iniciou-se a escravidão africana. Em 1638, africanos e afro-brasileiros, compunham a força de trabalho. Esse tipo de mão-de-obra veiosubstituira escravidão indígena, pois, por seremmais disciplinadosno trabalho,maisprodutivoseporestarem emterras estranhas, os negros produziam muito mais que osíndios. 12 Fernando José de lira No século XVI, a Guiné e a Costa do Marfim forneceram o 111 11111 numero de escravos. A partir do século XVII, Congo e Ang11ln tornaram-se os centros de exportação mais importantes. 1 1111·1· 1550 e 1e55, entraram pelos portos brasileiros milhões deles. Al.1noas recebeu muitos de Angol~. . Em1860, a população de Alagoas era de 249.704 habitantes. lJi•'1SC total, 44.418 eram escravos, sendo que 88,5% desses .t.1vam no meio rural e trabalhavam na cana-de-açúcar. Na , , rdade, o povoamento de Alagoas iniciou-se n.o século XVII, , 1111ccntrando sua população em Porto Calvo, Alagoas do Sul, · lngoas do Norte, Penedo e Atalaia. A cana-de-açúcar e, 11..Hociado a ela, o negro, foram responsáveis por assegurar o povoamento da província. O senhor de engenho achava-se dono do escravo, pois tinha 1 ,11go preçoelevado porcadaafricano. Exigia.que trab'.1111as~e além do limite de sua capacidade física e, por isso, mmtos ficavam dlH..>ntes ou inválidos. Por qualquer falha cometida, o escravo 11•cebia punição. Quanto às terras, essas eram doadas aos senhores de 1•ngenho paraque planta1?semcana e povoassem toda a área.Para t>lógues Júnior, (1976, p.70), o povoamento de Alagoas começou i•íolivamente a partir de Cristóvão Lins. Sua expedição, realizada i•m 1585, povoou o norte de Alagoas. A cana-de-açúcar se tornaria, portanto, o principal produto comercial que veio usscgurar o povoamento e a vida econômica, social e política da província de Alagoas. Esse povoamento e essa formação dão-se inicialmente em tomo de rios e lagoas. Por outro lado, o povoamento do Sertão dar-se-ia, principalmente, através do RioSãoFrancisco. Fixando-senas s~~s margens e aproveitando-se da riqueza dos seus vales, ina desenvolver-se a colonização da província de Alagoas, baseada na cultura da cana-de-açúcar, tendo corno figura central a chamada de senhor de engenho. Formação do riqueza e do pobreza de Alagoas 13
  • 13. Em Alagoas, aproximadamente dez fanúlias de senh de e g nh ores n e o, que eram donas de quase todas as terras do Estado e que, na época, cultivavam cana, eram, também, as responsáveis pelo povoamento das principais vilas e cidades do Estado. N_esse se~ti~o, o senhor de engenho está no núcleo da ~r:~ç~o economica, social e política do Estado, portanto a s na o açúcar, em Alagoas, confunde-se coma própria histó . da s f - - na ~~ .ormaçao. A formaçao e o crescimento dos principais mumc1p1os do Litoral, da Zona da Mata, do Baixo São Francisco e até do Sertão alagoano devem-se ao avanço do senhor de engen~o na a~ropriação de novas terras, aumentando a produçao de açucare pecuária. A a~vidade canavieira, com o sistema de produção que a~o~ou, nao consegufu conviver harmoniosamente com outras atividades agrícolas e não-agrícolas, que não estivessem em colaboração estreita com o seu modo de produção. Assim foi, por exernp~o, co~ a pecuária. Os senhores de engenho, necessitando de muitos anunais p , . ara exercerem vanas tarefas nos canaviais passarama criar cavalos, burros e bovinos, mas 0 feiJ'ão 0 mi1h ' d • tinh I O e a man ioca am suas áreas limitadas pela cana. ~o século XIX, no Brasil e no Nordeste, passou-se a culti- ~armu1t~ algod~opor muito tempo, pois o seu preço no mercado mterna~1onal fo1 bastante atrativo. Essa grande rentabilidade econô~ca do algodão não chegou, todavia, a afetar a atividade canav1e1ra. Apenas nµm período muito curto, imaginou-se que o algodão poderia vir a ser uma segunda alternativa à cana . , ma~ com a_concorr~nc1a americana, logo esse surto de exportação de algodao reduzm-se drasticamente. Várias fo~am as crises da falta de alimentos na província. Escassez ~e feIJão e farinha foram as principais. Em algumas d~~sas cnses, o presidente da província, reconhecendo as ~ificuldades por que passava a população, tomava a decisão de importar os produtos de outros países, e o próprio Estado fazia a 14 Fernando José de lira 11Nll thuição nos engenhos. Em 1723, por exemplo, houve uma B' Vl' crise de falta de farinha. O presidente teve que adotar nwll1d.is especiais para importar esse produto. A dependência da província de Alagoas do Estado de f'1 111.1mbuco trazia uma série de problemas políticos, econômicos ~ 11 Irninistrativos para os senhores de engenho, o que motivou lllll movimento de independência, conquistada em 1817. Assim, em 1817, Alagoas tornou-se independente de l11•rnambuco, entretan to, completamente dependente da 11llvH.lade açucareira. Com a independência, o poder político dos senhores de i•11g11nho irradiou-se por todo o Estado. Ver~adores, prefeitos, il1•putados, senadores e governadores eramsenhores de engenho, 1111 membros de sua família. O modo de vida social e cultural da p11pulação estadual era ditado pela unidade familiar, que ll'llll'Sentavà o senhor de engenho. · De acordo com Diégues Júnior (1986, p.60), "o engenho era 11 nucleo político e social do Estado. Foi nos engenhos que se n"wntou a formação da família e sociedade alagoana, e o senhor l1· 1·ngenho era a grande figura da paisagemsocial de Alagoas. É 111•li•que se centraliza a organização social da família alagoana." Portanto, o senhor de engenho não era apenas o chefe de 811 1 propriedade. Seu prestígio dominava todo o espaço que o 11•nVa. Ele gerava um modelo de desenvolvimento que definiu ,,,. linhas básicas de um sistema de produção, baseado na grande pwpriedade e no escravo que, após a sua libertação, marcou 1h•finHivamente a história do Estado. 1.1 - A conquista da terra Considerações de ordem política, tais como possibilidade dl invasões de outros países e da própria França, que só n•conhecia como dono da terra aquele país que efetivamente a Formoçõo do riqueza e da pobre:zo de Alagoas 15
  • 14. ocupasse, a Coroa Portuguesa passou a ter a convicção de que era necessário colonizar a nova terra descoberta. A partir de 1530, Portugal, temendo perder o controle da colônia, resolveu fazer uma política de povoamento. Em Alagoas, Duarte Coelho foi o primeiro colonizador a plantar cana e também doar terras aos amigos. Procurou escravizar os índios e conseguiu financiamento para instalação de en~enho, mas, de acordo com And~ade· (1998, p.50), as sesn:anas podiam ter dimensões ilimitadas. A partir de 1695, porem: passaram a ter extensões máximas de 4 léguas de comprimento por uma légua de largura. No século XIX, passaram a ser de uma légua em quadrado. Na realidade, Duarte Coelho, num período de 20 anos, conquistou poucas terras, e coube a Gerônimo de Albuquerque, após 1553, a conquista das várzeas, ampliando consideravelmente a área plantada com cana. Os filhos do donatário, Jorge e Duarte Coelho de Albuquerque realizaram, na sétima década do século XVI, a conquista das várzeas dos rios Jaboatão, Ipojuca, Serin e Pararnarim, além de estenderem o povoamento europeu quase até à foz do Rio São Francisco. Para Andrade (1998, p.40), essa expansão fulminante para o sul do Estadofoi resultado do fortalecimento dos colonizadores e da necessidade de terra para plantar cana. Esse avanço pelo território indígena era feito comgrande energia. Aomesmo tempo em que lhes tomavam a terra, aprisionavam-nos, colhiam-lhes as lavouras encontradàs e plantavam cana. Considerando que, no início do processo de colonização, o Brasil não tinha concorrente na produção de açúcar no mercado internacional, e os preços eram muito favoráveis, esses fatores serviamde estímulo paraque os senhores de engenho ocupassem novas terras na província de Alagoas. Assim, o senhor de engenho vai se transformando num símbolo da propriedade, confundindo-se com o latifúndio que, 16 Fernando José de lira ,1té nossos dias, caracteriza atividade canavieira. Com esse l.iistema de produção à base da grande propriedade, o engenho tornou-se o sustentáculo da colonização de Alagoas. Ser grande proprietário e bem-sucedido significava plantar cana e possuir i•ngenho de açúcar. A tabela 1.1 mostra a forte co~ce~tr~çã~ ~e terra registrada em 1950 pelo IBGE, resultado da ma distnb~1çao da propriedade da terra, iniciada a partir das sesmanas e fortalecida com a Lei de Terra, de 1850, que só permitiu a posse da terra, através da compra ou herança. TABELA l .l - Alagoas: Distribuição percentual do núr;iero de estabelecimentos agropecuários e de sua area correspondente, no ano de 1950. .. EM PERCENTAGEM EXTRATOS 1950 EM HECTARES NÚMERO EM% 00 EM % MENOS DE 10 72% 8,4% OE 10AMENOS DE 100 23% 23% DE lOOAMAIS 5% 8,6% TOTAL 100% 100% Como se vê, foi através da atividade açucareira feita à base da grande propriedade que se expandiu a economia. . O período democrático, que vai de 1945a 1963, f01 também muito favorável à atividade canavieira. A 18 de setembro de 1945, t'l'O promulgada a nova Constituição Brasileira, com base na Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 17
  • 15. ideologia liberal democrática. O Brasil foi definido como uma República Federativa, estabelecendo as atribuições à União, Estados e Municípios. A representação política favorecia mais os Estados menores, como Alagoas, Sergipe e o Espírito Santo, etc. No início da década de cinqüenta, o governo federal promoveu várias medidas destinadas a incentivarem o desenvolvimento econômico nacional, com ênfase na industrialização. Uma delas, a fundação do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDE), em1952,paracuidarda infra-estrutura de estradas, energia e comunicação. O desenvolvimento industrial era estimulado pela concessão de crédito fácil ao setor privado, por parte dos bancos oficiais, especialmente do Banco do Brasil. Esse interesse pela industrialização não afastou Getúlio Vargas dos grupos econômicos dominantes em âmbito regional e local, como o do café em São Paulo e o do açúcar no Nordeste. A partir de 1956, Juscelino Kubstchek assume o governo com as mesmas preocupações de Getúlio, no tocante ao processo de industrialização. Também faz uma aliança comas oligarquias regionais, garantindo privilégios e poder para os produtores de açúcar do Nordeste. O governo João Goulart era populista e defendia as reformas de base,entreelasareformaagrária, quedeveriaprotegerapopulação do campo, aumentar a produção de alimentos e gerar uma nova demanda para os produtos industriais. Por isso, a elite nacional, principalmenteosgrândes latifundiáriosdo açúcar, deixa de apoiaro governo, muito contribuindo para a suaqueda, de forma que, em31 demarço de1964,os militaresassumemopoder,numgolpedeEstado. A criação do IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool), no governo Vargas, aprofundou a relação do Estado como complexo canavieiro de Alagoas. Ao determinar os preços vantajosos e ao buscar também um desenvolvimento equilibrado, no sentido de que a produção de açúcar de São Paulo não inviabilizasse a 18 Fernando José de Lira 11i11dução nordestina, o IAA acabou beneficiando duplamente (1!1 u.-.lneiros do Nordeste. Com o crescimento da produção paulista, desde os anos de J•l l()1 já na safra de 1951/52, São Paulo passou a superar o princi- Jhil produtor, que era Pernambuco. Assimpressionou o IAA para q111•liberasse as cotas. . Aproveitando-se do clima democrático no país, os paulistas 1 1 111~eguiram aumentarsua participação no mercado deSão ~au!º· tnnlo Alagoas como P~rnambuco ficaram abastecendo o Distrito ftt•dl'rill, e o excedente era exportado. Com apoios favoráveis, a produção de açúcar de Alagoas e t'i•rnambuco continuou crescendo, como vinha ocorrendo antes, 11 wd iante incorporação de novas terras antes ocupadas por 111111•ac.lores, fornecedores, foreiros, arrendatários, que cultivavam pnitlutos consumidos no mercado local. . . Em face dessa expropriação de terra, feita pelos usme1ros, flnu vc vários sinais de descontentamentos no meio rural, I''hll'ipalmentecomacriaçãodas ligascamponesas, dos sindicatos 1111 11iR e das cooperativas de fornecedores. Para acalmar a situação do campo, foram garantidas cotas ili• produção de açúcar para os fornecedores e idealizou~se o 11..1.iluto c;lo Trabalhador Rural, que estendia aos desse meio os nwsmos benefícios que a legislaçãooutorgavaaos do meio urbano. Esse estatuto não teve o efeito esperado. Ao contrário, muitos 11/jinciros procuraram preteriro trabalhador permanente e con.tr~tar l'l''l"IOas semqualquer vínculoempregatício,através~~ emprelt~rro, qtH' fl'Crutava trabalhadores temporários, o que dificultou, ainda llMI~, ns condições de vida dos trabalhadores rurais de Alagoas. Ar. condições favoráveis oferecidas pelo governo à atividade ,,~ ur.ureira não davam margem a qualquer risco de preço e de l11,.1manda do açúcar. Foi um forte estímulo para que houvesse uma 1~nmde concorrência entre os usineiros de Alagoas ~m ~dquir~em ruais terras para a produção de cana e, por consegwnte, de açucar. Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 19
  • 16. Com a concorrência acurada, os usineiros começaram a adquirir terras, muitas delas fazendas consideradas inapropr~adas ~arao plantio de cana, as quais, entretanto, depois de altos mvestimentos agrícolas em adubação e mecanização, transformaram-se nas melhores terras para essa produção. . Pa~a Andrade (1997, p.55), quando o grupo pernambucano dos 1rmaos Coutinho comprou a Usina Sinimbu, ela estava condenada a ser uma pequena usina, porfalta de terras. Todavia, quando o governo ofereceu as condições privilegiadas à cana garantindo preço e compra da produção, os Coutinhos: entusiasmados, resolveram investir nos tabuleiios e passaram a derrubar florestas, expulsar colonos e sitiantes e a plantar cana. A partir daí, com o aumento da área cultivada, a usina começou a ser viável. Avançou muito em expansão de terra com cana plantada. Essa expansão em diieção aos tabuleiros, iniciada pela Usina Sinimbu e, também, seguida por outras usinas, provocou um grande desmatamento e a desapropriação de terras de pequenos agricultores que, expulsos da Zona da Mata do .Litor~1 e do Sertão, haviam buscado refúgio naquelas terras ;nde 1magmavam que a cana nunca pudesse chegar. Foi através dessa expansão das usinas nas terras dos tabuleiros, na primeira metade do século XX, que Alagoas transformou-se no maior produtor de açúcar do Nordeste chegando a ocupar o segundo lugar no país. ' Essa forte exp~ão veio completar a ocupação das terras de Alagoas. Assim, alémdeestender-sepelo Litoral, Zonada Mata, Baixo SãoFrancisco, partedoSertãoe Agreste,aatividadecanavieirapassou tambéma ocuparo planaltoalagoano, porque, plantada na forma de ~onocu1tura, acarretava a elirrúnação dos produtores agrícolas de ~entos, obr~g~do o Estado a importar a maioria dos produtos agr1colas de pnmerra necessidadepara a populaçãofaminta. Na visão de Andrade (1998, p.60), o que estava ocorrendo era que as usinas, com elevada capacidade de esmagamento de 20 Fernando José de Lira 11111o1, lratavam de adquirir mais terras para satisfazer a fome de 11111.i de suas moendas. A ampliação das terras das usinas iria 11111•ntivar, cada vez mais, a concentração da propriedade da terra, 11111111Ja no período colonial, com a doação das sesmarias. Essa concentração aprofundou-se a partir de 1890 e se 111111n!!ificou com a criação do IAA, na década de 1930. De 1930 a l'l'~O, avançou muito em Alagoas e no Nordeste. Levando-se em u111lt1 que o principal, senão o único, meio de vida da população l"•t.1vana agricultura, a falta de terra deixaa sobrevivênciado grosso d11 população de Alagoas subordinada à vontade dos usineiios. Em face desse avanço desmedido e da destruição dos l'•'llllcnos e médios produtores de cana, em 1941, o governo t1"H>lveu, ainda que tardiamente, estabelecer o Estatuto da l.11voura Canavieiia. Tinha como objetivo principal fortalecer os pi-,ruenos fornecedores e engenhos que ainda resistiam à 11propriação, durante mais de três décadas de destruição. Para Ramos (1999, p.90), a Lei número 3855, de 21 de 1111wmbro de1941, dizia que os usineiros não poderiam moermais d11 que 60% de cana própria, e os outros 40% deveriamser de cana rl1• 111rnecedores. Com essa lei, o governo procurava preservar da 1•llnçüo a média propriedade produtora de cana. Esse avanço da , 11mpra e concentração da propriedade da terra vinha ocorrendo dP1'ldc os anos de 1850, com a Lei da Terra. No caso de Alagoas, a l.1 •i nº 3855 veio tarde, pois já havia sido destruída a possibilidade d1•se criar uma classe média no meio rural e, por conseguinte, liwlabilizadaaformação de ummercado internoimportante,capaz d11uar suporte a um vigoroso processo de industrialização do 1iHhdO, bemcorno às outras atividades auxiliares da indústria e à IH'l'tl uo setor serviç.o. Na verdade, mesmo havendo preocupação como aumento dt•sconb:olado da produção de açúcar, nunca se conseguiu dl•lcr o seu avanço. Produzir mais cana significava ter mais n•cursos subsidiados do governo para comprar mais terra. Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 21
  • 17. Conseqüentemente, apesar de toda a legislação feita para proteger os fornecedores de cana e para conter o excesso de produção, na prática, essa legislação nunca produziu os resultados pretendidos. Os usineiros eram º" principais beneficiários Ja legi!>laçao. O maior incremento da produção de açúcar ocorreu nas décadas de 50 e 60, quando, mesmo aumentando o seu consumo, a produção gerava um excesso significativo, que era comprado pelo governo. Por conseguinte, o apoio do Estado à produção e, como conseqliência, o avanço do latifúndio aumentaram independentemente da capacidade de absorção de açúcar no mercado interno ou externo. A década de 50 foi, particularmente, muito favorável para os usineiros de Alagoas, pois passam a ocupar os tabuleiros que, como dissemos, nos anos 1930, eram tidos como área imprópria para o plantio de cana. Nesse período, alguns usineiros de Pernambuco não perderam a oportunidade de expansão e se transferiram para Alagoas. Viam, no Estado, a possibilidade de aumentaremsuas terras eaté mesmo de compraremusinas inteiras. De acordo com Andrade (1997, p.100), essa transformação iniciou-se, principalmente, com os irmãos Coutinho, que foram seguidos pelas famílias Assis, Inojosa, Maranhão, Brito, Bezerra de Melo, Grupo Sampaio e pelos Lyra, fazendo aumentar muito a disputa e valorização das terras férteis do Estado. O crescimento da atividade canavicira e da produção de açúcar dependia, mais e mais, de terras ª.serem incorporadas às usinas. Para se ter idéia do avanço das usinas em território alagoano, cm 1965,o Estadojácontavacom29 usinas. &sasaumentaram muito a produção, o que significa passar a incorporar mais terras na fonna delatifúndio. O Mapa1 mostra (cm vermelho) agrandeáreacultivada com cana-de-açúcar por produtores que possuem mais de 100 hec- tares. Só a usina Caeté, dispondo de grandes extensões de terra de várzea e tabuleiro em São Miguel dos Campos, chegoua ultrapassar a produção de 1 milhão de sacos de açúcar na safra 1976/77. 22 Fernando José de Lira FIGURA 1.1 - No primeiro plano, notam-se os instalações da usina Cae1é e. no segundo. ao fundo. observo-se a cidad e de São Miguel dos Campos. FIGURA 1.2 - Cano-de-açúcar plantada pela usina caeté em área de Tabuleiro. Observa-se a grande extensão do área cultivada. pois a topografia plano permite maior mecanização. Formação do riqueza e do pobreza de Alagoas 23
  • 18. f:v"APA 1 - Alagoas ~rea em cinza escuro: propriedades com areas plantadas com cana-de-açúcar em 1995/96 ' FONTE: JBGE, Censo agropecuário, 1995/96. Co · f. .. mo vimos, a orte expansão das usinas deu-se sob grande m~e~tlvo do governo à mecanização e ao uso de pesticidas o ehrnmou ,'d , ' que . , . um cons1 erável numero de postos de trabalho tempor~nos e de moradores, substituídos por trabalhadores eventuais, que ficavam ocupados menos tempo. Isso gerou grande excedente de mão-de-obra no c que cresceu à ~~<lida que as usinas expropriavam os peq:::; produtores e sitiantes, com suas culturas de subsistência N- encontrando espaço no campo passaram a m. · ~o b . ' igrar para o rne10 ur ano, particularmente para Maceió. Mes~oaqueles que passarama prestarserviços temporários nos canav1a1s foram residir na periferia das cidades Pe bt . rce eu-se p~r a~to, que o avanço da cana mudou significativamente a; re açoes de trabalho bem como o espaço urbano A traball d · · gora, o ~a .or presta serviço à usina, mas está subordinado a um empre1teuoque, na maioria das vezes, era empregadoou morador 24 Fernando José de Lira "' q111•, 111111 ,, l'Xpropriação de sua terra, tambémfoi morar t lntlt•tt 1'111xi111.1s dos usinas, com todas as conseqüências que t ilt 1 1 11 gP1·11 m> meio urbano. nr.li 11111111çõcsurbanas, e nao mais as fazendas, passaram t 11 1111v1,. h1caisde residência de trabalhadores rurais, sitiantes 1 mp11•g11dos d.as usinas, ex-pequenos produtores e ex- fhUh 11 l'111'11 Beatriz (1998, p.40), os pequenos produtores h11m 111 lg1•m nas sucessivas fragmentações das terras, em tH 1c111 111, principalmente, da partilha de médias e grandes p1h•d.td1•s, por motivo de herança. 11 pm,·asso de expropriação a que foram submetidos nas ;tllitt' ~ll• 60, 70 e 80, contemplava a compra da terra, pois, no p.tu1•n11 1istado de Alagoas, já não havia terras desocupadas. C111110, inicialmente, as terras não tinham muito valor, os '4u1•111>1i produtores vendiam-nas para comprarem áreas h111•t1, 1.•m locais mais distantes e menos férteis. Ocorre que o 1m~11 da cana chegou, também, a essas localidades, lt1'Ji1111111lhilitando aos pequenos produtores a compra de novas lt n.. plll$os preços eram muito superiores aos que lhes tinham 1il11 p.1gus, fato que os fez transformarem-se em trabalhadores ti ti! wilnas. Assim, o aumento das usinas, no Estado de Alagoas, além 1l1l1•rnr uma forte concentração de terra e grandes conseqüências 11111 l11is - incluindo a dificuldade de sobrevivência de ex-pequenos 1•111prietários, que lidavam com produtos de subsistência, e de 111111-..1uores e sitiantes dentro da própria propriedade da usina - 111w1ou, também, irreparáveis danos à fauna e à flora alagoanas. De acordo com Andrade (1999, p.100), os herbicidas e pPslicidas usados em grande escala mataram animais e plantas. /s poucas florestas que ainda existiam na década de 60, nos 1.1buleiros, foram totalmente derrubadas. A tiborna das usinas, que jogavam nos leitos dos rios, acabou por contaminar todos 11s que banhavam a Zona da Mata, Litoral e Tabuleiros. Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 25
  • 19. Essas condições ambientais desfavoráveis dliicultaram a vida de várias comunidades do Estado, que necessitavam de água potável para uso doméstico, bem como inviabilizaram a criação de peixes e crustáceos em escala comercial ou de subsistência. A poluição dos rios prejudicou bastante as populações ribeirinhas que, além de ficarem privadas do uso da água e da criação de peixe, passarama contrair muitas doenças endêmicas, sobretudo as verminoses, incluindo a esquistossomose. Esse problema de poluição foi particularmente importante no período de implantação do Proálcool. SegundoRamos (1999, p.100), para 1 litro de álcool, gastam- se 35 litros de água potável e produzem-se 13 litros de vinhoto, dos quais só uma pequena parcela pode ser utilizada emadubação do solodos tabuleiros. Sua maiorparteé jogada nos rios do Estado, causando a degradação do meio ambiente. De acordo com Lima (1998, p.60), de todos os programas lançados pelo governo federal nos anos 50, para expandir a produção e oferecer condições privilegiadas aos usineiros, o Proálcool foi o que proporcionou o maior aumento da produção de cana e, conseqüentemente, resultouno mais intensivo processo de poluição ambiental já registrado desde 1930. O aumento da produção de álcool não foi conseqüência do aumento da produtividade, mas tão somente de crescimento da área plantada, com a lavoura qmavieira. O gráfico 1.1 mostra que, enquanto 59% de toda área agricultável de Alagoas são cultivadas com cana-de-açúcar, as outras culturas, principalmente o algodão, o coco e o fumo, utilizam uma área de tamanho irrisório. 26 Fernando José de Lira ( NAI lt O 1.1 - Alagoas: Área colhida das principais l ~Jllu1us temporárias e permanentes, em 2001. 54,50% 1,60% 4,10% 5,90% 1,30% ARCA CULTIVADA DAS PRINCIPAIS CULTURAS TEMPORÁRIAS E PERMANENTES CCANA·DE·AÇÚCAR •FEIJÃO O MANDIOCA •ALGODÃO •BANANA O LARANJA FONTE: IBGE- SIDRA, 2002. O MILHO [}COCO-DA-BAIA Formação da riqueza e do pobreza de Alagoas 27
  • 20. Na década de noventa, entre as permanentes, predomina o coco-da-baía, havendo urna queda significativa na área colhida, que passou de 68,6%, em 1990, para 54,5% A banana, de importância relativa para o Estado, sofreu queda da área plantada em toda a década, ao contrário da laranja, que apresentou um crescimento vigoroso, registrando de 2,4% da área colhida, em 1990, para 18,2%, em 2001. Em relação às culturas temporárias, percebeu-se, claramente, o predomínio da cana-de-açúcar, mantendo praticamente um percentual de área colhida próximo dos 70%, seguida do feijão, com um comportamento muito inferior a esse, crescendo de 1991a1995, para depois cair e permanecer na faixa entre 12% e 13% da área colhida. O que vale ressaltar é ofato deque, mesmo após duas décadas de crise financeira profunda que afetou todos os produtores agropecuários, a cana-de-açúcarnão registra queda da área colhida. Ao contrário, a partir da segunda metade da década de 90, apr~senta crescimento vigoroso, enquanto a mandioca, o algodão, o nulho e o fumo são culturas pouco expressivas em termos de área co~da, observando-se, quanto ao seu comportamento, pequenas variações nos dois primeirosequeda drástica nos dois últimos anos no final do período abordado. ' Em Alagoas, em 1975, foram cultivados 228 mil hectares de terra com can~, o que corresponde a 65% de toda a área de cultivo agrícola. Em 1987, passou-se a plantar 688 mil hectares, o que representa aproximadamente 80% de toda a área cultivada do Estado, e um aumento de área de 302%. . A crise econômica e financeira que vem afetando Alagoas, a par~ ~a segu~da metade da década de 80, decorreu da crise que depnrruu drasticamentea agroindústria açucareira. O Brasil, a partir da segunda metade dos anos80, também entra emcrise financeira. Não dispondo de recursos internacionais enacionais, cortouquase todos ossubsídios agrícolas em todo o território nacional, deixando 28 Fernando José de lira Mll'1d1tdcs da produção de cana-de-açúcar e álcool em extrema Uh ultl.1dc.Assim, segundo Lima (1998, p.40), não dispondo mais 11l11r ·ms e subsídios oferecidos pelo Proálcool, a atividade 111 ll'il ,, entraemcrise, diminuindo osimpostos pagosao Estado. V1turiosos em ação judicial em todo o Brasil, os usineiros 1111(11n <lc pagar o Imposto de Circulação de Mercadoria (ICMS) 1l•1t1u1·i1m1 própria. Mas,em Alagoas, além de não pagar o ICMS, t h, r un <le volta o montante já pago. Emcomum acordo como 1 1•1111> da época, os usineiros deveriam receber o montante em 1Op11m•los corrigidas monetariamente. Portanto, como mostra a lll!i'I 1 12, a receita de ICMS das atividades sucroalcooleiras foi 1• 1111nuo e, a partir de 1989, caiu vertiginosamente. AJrLA 1.2 - Alagoas: Participação das atividades r ik ooleiras na arrecadação de ICMS, no período de ' l 1991. 11183 1984 1985 EM PERCENTAGEM ARRECADAÇÃO DE ICMS EM PERCENTAGEM % 58,02% 51,46% 43,86% 31,95% 33,21% 16,84% 4,48% 6,12% 148% •N 11 : Mi11btério da Fazenda, 1995. formaçôo do riqueza e da pobreza do Alagoas 29
  • 21. C~mo a economia e a receita do Estado de Alagoas U<'pcnc.ltam, em quase 60%, da atividade açucareira, a crise que essa agroindústria passou a sofrer a partir de 1985, com 0 fim do Proá.kool, teve reflexos catastróficos em todos os setores da eco~onua ala~oana, muito particularmente na manutenção dos serviços públicos essenciais à população mais pobre bem com . d , o no cust~10 a folha de pagamento dos servidores públicos. Lima (1998, p.40) confirma que, no período de 1983 a 1991, houve uma severa redução de impostos pagos pelos usineiros que, em 1983, contribuíam com 58,02% do ICMS pago ao Estado de Alagoas; em 1988, passaram a contribuir com apenas 16,84% e, em 1991, pagaram tão somente 1,48%. O fato de Alagoas não ter diversificado suas atividades econômicas agrícolas e não-agrícolas deixou 0 Estado completamente dependente de uma única atividade, concentradora de terra, também a principal responsável pela elevad~ concentração de renda do Estado e pela formação de uma elite com poderes enraizados em todos os setores da vida social de Alagoas. Assim, q.u~ndo a agroindústria açucareíra vai bem, a riqueza gerad~ beneficia apenas 24 famílias detentoras de grandes extensoe~de terras e de capital, bemcomo dos meios de produção necessários à sobrevivência de toda a população do Estado ao g~alnão traz maiorproveito. Todavia, quando vai mal ou enfrenta cn~es prolongadas, a p~pulação fica em situação desesperadora, p01s o e~pr:~o, o comércio, a receita do Estado e o pagamento dos func1onanos públicos .ficam comprometidos. Essa é uma armadilha econômica, social e política que tem a~etado o Es~ado de Alagoas desde a época colonial, pois, até os dias ~e ho1e, o Estado continua dependente quase que exclusivamente da atividade canavieira. Como sabemos,essa é uma situaçãomuito peculiar, porque, tanto em Pernambuco comoemSão Paulo, há uma diversificação 30 Fernando José de Lira d11s atividades agrícolas e não-agrícolas, e a cana, ao contrário do que ocorre em Alagoas, é apenas urna dentre tantas outras 1tividades agroindustriais. No Estado de São Paulo - que é o maior produtor de álcool do Brasil - observaram-se as seguintes diferenças básicas 1·l'lativamenteao modelo praticado emAlagoas: o plantioda cana- de-açúcar iniciou-se nas áreas do planalto, não no Litoral; a propriedade da terra também se dava na forma de latifúndio nos municípios onde essa cultura foi mais importante, mas a L'Sb:utura de posse da terra permitia sua utilização para o cultivo de alimentos, atividade praticamente inviabilizada pelo padrão udotado em Alagoas. No Nordeste, o próprio Estado da Bahia logo percebeu as dificuldades que enfrentaria, se dependesse exclusivamente da produçãode açúcar. A partir dos anos 30 e, muito particularmente, dos anos 60, passou a diversificar sua produção agrícola, plantando, também em escala comercial, outros produtos como soja, feijão, cacau, café, etc. Este espaço privilegiado de atuação das usinas, que tem sido o Estado de Alagoas, pode ser explicado pela singularidade da força política da atividade açucareira, que tem demonstrado uma grande capacidade de organização interna, formando um poderoso grupo de pressão, capaz de garantir o apoio do Estado para se manter. Corno afirma Carvalho (2000, p.14), "essa manutenção de uma boa performance política organizacional tem conferido ao capitalsucroalcooleiro do Nordeste um grande poder de lobby, para pressionar e assegurar a proteção e o apoio do Estado para compensar sua base econômica diferente ou pouco competitiva". Como vimos, desde o período imperial, a atividade açucarcira vem tendo o apoio do Estado. O perdão da dívida dos senhores de engenho, a prorrogação dos prazos de pagamento dos empréstimos, feitos junto aos estabelecimentos bancários Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 31
  • 22. federais e estaduais, foram práticas constantes nas décadas de 50, 60 e 70. Com investimento maciço nessa atividade, faltavam oo Estado meios para estimular a germinação de outras cltividades agrícolas e nao-agr1colas, concentrando a maioria dos recursos públicos nas mãos de, aproximadamente, 24 famílias de produtores de açúcar. A forte concentração da terra, a baixa produtividade e o sistema de monocultura causaram, inevitavelmente, uma forte concentração de recursos públicos e privados nas mãos de uma pequena fração da população. Com essa base produtiva, 10% dos maiores produtores agrícolas do Estado detêm mais da metade da receita agrícola, ou seja, 54%. Por outro lado, 40% dos menores produtores detêm apenas 7% do total da receita agrícola do Estado. Está, portanto, na concentração de renda, a origem de todos os problemas econômicos, sociais, ecológicos e políticos que, há séculos, assolam o Estado de Alagoas. O analfabetismo, a miséria (com mais de 44,3% da população vivendo abaixo da linha de pobreza), a mortalidade infantil elevada e a baixa expectativa de vida dos alagoanos (em torno de 60 anos de idade) denunciam, claramente, a baixa eficiência social do carro-chefe da economia alagoana, que é a atividade açucareira. 32 Fernando José de Lira FIGURA 1.3 - Vista parcial do cidade de Branquinha. O município é totalmente dependente da cana-de-açúcar. Nota-se, no figura, que esse plantio obrigou a população a construir suas casas à margem do rio Mundoú, um dos mais poluídos de Alagoas. FIGURA 1.4 - Vista parcial de uma das ruas do cidade de Branquinho, onde se nota, claramente, que os condições de vida da população estão entre os mais precárias de Alagoas. Formação do riqueza e da pobreza de Alagoas 33
  • 23. Por isso mesmo, a partir de 1990, com a crise do setor açucareiro, o quadro social se agrava progressivamente, chegando, em 1997, à situação praticamente de calamidade pública. Com a queda de preços nos mercados nacional e internacional, a agroindústria do açúcar não consegue pagar impostos e dívidas junto ao Estado e às estatais, principalmente à CompanhiaEnergéticade Alagoas (Ceai), nem criaros empregos socialmente necessários. Segundo Carvalho (2000, p.20), a partir de 1985, a Ceai passou a sofrer graves conseqüências com a inadimplência de 40 milhões devidos pelos produtores de açúcar. O banco estadual (Produban) não recebeu dos usineiros uma soma calculada em torno de 76 milhões em empréstimos vencidos. Para completar o quadro da crise estadual, um acordo fiscal, assinado em 1989, transferiu para as usinas, durante seus 8 anos de duração, aproximadamente 800 milhões de reais. Para Lima (1998, p.20), também nas décadas de setenta e oitenta, o endividamento dos usineiros junto aos órgãos federais e estaduais foi sempre elevado. Na década de noventa, com a crise aberta na atividade açucareira, os usineiros aprofundaram essa dívida no Banco do Brasil, Tesouro Nacional, Receita Fede- ral, INSS, Banco do Estado de Alagoas e no IAA. Só em 1993, alcançava o montante de 1,02 bilhões de dólares. Ainda segundo Lima (1998, p.60), a crise da atividade açucareira, iniciada na segunda metade da década de oitenta, provocou uma grande sangria de recursos públicos. No período de 1986 a 1995, no início da crise, a receita tributária, em Alagoas, . .. atingiu um patamar negativo da ordem de 0,98%, deixando o Estado impossibilitado de cumprir com seus deveres sociais, financeiros e económicos básicos, gerando uma crise sem precedente na história recente da economia alagoana. Atualmente, ainda dependente da cana e exposto aos reflexos da crise da agroindústria canavieira, o Estado começa a 34 Fernando José de Lira Jf=~L -r-t::_Cf crNíRAL B8LÜI . pensar em outras alternativas de produção agrícola e não- agrícola. Na agricultura, pensa-se na diversificação com produção de cereais, olericultura e fruticultura; no meio urbano, a prioridade do governo estadual tem sido o turismo. Como vimos, nas décadas de setenta e oitenta, Alagoas passou a ter 70% de sua área agricultável com cana. Além disso, essa área é composta das melhores terras do Estado, que estão na Zona da Mata, Planalto e Litoral, onde o clima é mais favorável do que o do Agreste e do Sertão. Essas terras são de propriedade dos usineiros que, com a sua concepção de grande latifúndio, não disponibilizam parte delas para a prática de outras culturas, que não sejam a cana ou a pecuária. Esse elevado índice de concentração dificulta uma ação forte do Estado na diversificação das atividades agrícolas, cuja conseqüência seria a fixação do homem no meio rural onde acarretaria o surgimentode uma classe média significativa. Atabela 1.3 mostra a grande concentração da posse da terra em Alagoas. Da observação direta de seus dados percebe-se que, cm 1995, os pequenos proprietários, que possuem menos de 10 hectares de terra, representavam cerca de 81% do total de produtores, todavia detinham uma exígua área de apenas 13% da área total do Estado. Por outrolado, os grandes latifundiários, com áreas superiores a 100 hectares, eram, em 1995, 3% do total dos proprietários, mas possuíam 62% de toda área agricultável do Estado. Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 35
  • 24. TABELA l .3 - Alagoas: Distribuição percentual do número de estabelecimentos agropecuários e de sua área correspondente, no ano de 1995. EM PERCENTAGEM EXTRATOS 1995 HECTARES (ha) NÚMERO% ÁREA% MENOS DE10 81% 13% DE 10 A MENOS DE 100 16% 25% DE 100A MAIS 3% 62% TOTAL 100% 100% FONTE: IBGE - Censos Agropecuários. Reduzir essa má distribuição da posse da terra é a medida prioritária para melhorar as condições de vida no meio rural e urbano do Estado. A divisão da propriedade da terra em frações menores, quando associada à assistência técnica de qualidade e ao crédito agrícola subsidiado, motivará maior diversificação da produção, melhoria na produtividade por hectare e efetiva criação de emprego no campo. Na cidade, melhor conservação do meio ambiente e, sobretudo, menor dependência da população rural e urbana em relação aos usineiros que pensam e agem como grandes latifundiários, não como industriais, segundo os parâmetros modernos concebidos em administração. Essa desconcentração da propriedade da terra levará,ainda, a uma desconcentração da renda gue, por sua vez, terá um efeito multiplicador muito maior na economia estadual, pois a maior distribuição dosmeios deproduçãogerará várias atividadesagrícolas e não-agrícolas no meio rural, dotando uma maior fração da população do campo e da cidade de melhores condições de vida. 36 Fernando José de Lira Para Beatriz (1986, p.40), as feiras públicas das áreas de usinas têm uma movimentação de recursos financeiros e de produtos vendidos em menor escala, secomparadas comas feiras do Agreste. Isso ocorre, porque a Zona da Mata e o Litoral são ureas de predominância do grande latifundiário que, além de 1.~mpregar pouca mão-de-obra, paga salários irrisórios. No Agreste, onde a posse da terra é mais bem distribuída, há um maior número de pequenos produtores com maior capacidade de renda e certa variedade na produção agrícola e não-agrícola. Por conseguinte, as suas feiras livres são mais dinâmicas, como a de Caruaru e de Arapiraca, onde ocorre melhor circulação da riqueza gerada. Portanto, a posse dos meios de produção, muito particularmente a da terra, submetida a uma distribuição .dequada, sob o enfoque de uma administração eficaz, abre perspectivas para a germinação de um conjunto de atividades agrícolas, difíceis de serem praticadas no regime de grandes propriedades, bem como para o surgimento de outras não- ogrícolas e de todos os benefícios que esse cenário oferece. Em Alagoas, como vemos na tabela 1.4, a posse da terra está distribuída naforma de extremos. De um lado, têm-se poucos proprietáriosdominando grandesáreas, chamadas de latifúndios e, de outro, grande número de pequenos produtores, com áreas inferiores a 10 hectares, chamadas de minifúndios. Essa situação gera uma grande injustiça e ineficiência na alocação dos recursos públicos e privados, nos meios urbano e rural, ressentido-se este, principalmente, de recursos financeiros. Formação do nquelO o do pobreza de Alagoas 37
  • 25. TABELA 1.4 - Alagoas: Distribuição percentual do número de estabelecimentos agropecuários e de sua área correspondente. no período de 1970/1985. EM PERCENTAGEM EXTRATOS 1970 1985 HECTARES (ha) NÚM.% ÁREA% NÚM.% AREA % MENOS DE 10 75% 10% 82% 11% DE 10 A MENOS DE 100 21,6% 28,6% 15% 27% DE 100A MAIS 3,4% 61,4% 3ºt.'. 'º 61% TOTAL 100% 100% 100% 100% FONTE: IBGE - Censos Agropecuários. Os fatos mostram que essa distribuição e a concentração da propriedade da terra não surgiram do dia para a noite. São o fruto d.e um processo histórico, que se inicia no século XVI, e vem avançando ao longo de quase quatro séculos. Considerando que o Estado é, essencialmente, agrícola, sua dependência do latifúndio também é muito forte. Foram os próprios latifundiários que mais lutaram pela independência do Estado, visando a atender a seus interesses locais. Dessa forma, poderiam mais facilmente dominar as instituiçõesestaduais e federais e direcionar os recursos do Estado para benefício próprio. Comessa hegemonia da burguesiaagrária no aparelho estadual, o planejamentodas ações do Estadoorienta- se para atender às necessidades dos grandes latifundiários, em detrimento de uma atuação socialmente justa que beneficiasse a maior fração da população. É assim que as rodovias, as ferrovias e as hidrovias de Alagoas foram e são construídas para atender, prioritariamente, 38 Fernando José de Lira às necessidades do senhor de engenho e dos usineiros. As áreas que não eram e não são d.e interesse da atividade canavieira nunca foram prioridades do poder público. Com isso, os pequenos e médios produtores do Agreste e do Sertão sempre viveram no mais absoluto isolamento. A falta de assistência técnica, de estradas, de energia e de comunicação faz com que suas atividades agrícolas sejam marginais ou de pura subsistência, pouco contribuindo para o desenvolvimento estadual. Nesse sentido, a dependência do Estado em relação à atividade canavieira era e continua sendo quase que total. Atualmente, a forte crise por que passa essa atividade abre boas perspectivas na direção da geração de novas oportunidades de produção, de emprego e de renda. 1.2 - Reprodução e subordinação da força de trabalho Durante todo o século XVI, XVII e até a metade do século XVIII, os índios faziam parte da maior fração da força de trabalho no engenho. Muitos indígenas, ao serem libertos, permaneceram no engenho. A derrubada da mata, a poluição dos rios e a dificuldade de encontrar peixes e caças não lhes permitiam encontrarem os alimentos necessários à subsistência nas terras que passaram a ser de propriedade dos senhores de engenho. A partir de 1758, os senhores de engenho procuraram substituir os índios pelos negros, pois os portugueses já tinham experiência com escravos africanos nas ilhas do Atlântico onde esses demonstravam uma produtividade muito maior do que a obtida aqui, com aqueles. Além disso, os escravos negros não tinham as mesmas facilidades de fuga como possuíamosindígenas. Mesmo demandando um maior investimento, entre 1550 e 1815 entrou pela costa brasileira um elevado número de escravos Formação do riqueza e da pobreza de Alagoas 39
  • 26. africanos, mais do que o suficiente para suprir as exigências de trabalho da cana. A partir desse período, a atividade açucareira iria passar por três séculos de uso dessa mão-de-obra que vai constituir-se na prmc1pal força de geração de fortuna para os senhores de engenho bem como de miséria, discriminação e perseguição ao negro africano, ao afro-brasileiro e aos pobres em geral,constituídosdessa raça e de umamiscigenação emsua maior parte. Ao contrário do ocorrido com os índios, nem a igreja nem a coroa se opuseram à escravidão do negro. As ordens religiosas, como as beneditinas, estiveram até mesmo entre os grandes latifundiários de terra, que exploravam o h·abalho escravo. Outro fator favorável ao trabalho desses escravos era uma certa imunidade que tinham às doenças tropfcais dos brancos, o que não ocorria com os índios. Todavia, apesar da resistência imunológica e física dos negros, as condições de trabalho, de habitação,alimentação e subordinaçãoao senhorde engenhoeram tão desumanas que, na segunda metade do século XIX, enquanto no Brasil um escravo masculino tinha uma expectativa média de vida de 18 anos, nos Estados Unidos essa expectativa era supe- rior a 35 anos. Quase todos os escravos de que o Brasil necessitava eram importados, pois as condições de vida desfavoráveis faziam com que as escravas tivessem uma baixa fertilidade. Criar uma criança por 12 ou 14 anos, nas condições desumanas da escravidão, era considerado um investimento elevado e de alto risco, a que o senhor de engenho não queria submeter-se. Com essa mão-de-obra abundante, o cultivo da cana e a produção de açúcar aumentaram assustadoramente. Na verdade, o negro era representante de uma civilização agrícola e já estava acostumado ao regime servil na África. Daí a preferência, apesar do elevado custo, por essa opção de força de trabalho. Mesmo com a alta mortalidade, devida aos fatores já mencionados e aos 40 Fernando José de Lira castigos severos, o alto preço e os quilombos não impediram os senhores de engenho de continuarema importar negros da África. Cada engenho era uma unidade econômica na forma de complexo rural. Em um engenho médio, existiam de 50 a 60 escravos, que vinham de Angola ou da Guiné. Os negros eram obrigados a trabalhar todo o dia. Reunidos, formavam um verdadeiro exército e recebiam ordem de um feitor. Só lhes era permitido o descanso aos domingos e dias santificados. -8...§s_ip;_l, a expansão da cana à base do trabalho escravo e da -- . grande propriedade definiu as linhas básicas de um sistema de produção que caracterizou o Estado, marcando-lhe,_· definitivamente, osaspectos políticos, sociais e econômicos. Nesse sentido, o escravo negro deu uma grande contribuição para o aumento da riqueza dos senhores de engenho e para a formação econômica e social do Estado, que perdura até hoje. Como diz Diégues Júnior (1976, p.100), o negro foi a princi- pal força que permitiu o aumento da produção no meio rural e a formação de centros urbanos importantes. Tornou-se essencial às fazendas dos senhores de engenho, malgrado o tratamento desumano que lhe davam. Sabiam que, sem os mesmos, não se poderia aumentar a riqueza na forma de grande propriedade. Desempenhando papel tão relevante na economia de Alagoas, quando, no século XVIIt iniciou-se, na Europa, um movimento de libertação dos escravos, os senhores de engenho do Nordesteficaram desesperados, poisafinalhaviam empregado . grande soma de recursos na compra do negro. No final do período colonial, Alagoas tinha uma população de 111.973 habitantes, dos quais 42.879 eram livres e 69.094, escravos. Esses números demonstram, claramente, a importância que teve o negro no povoamento, na produção e no desenvolvimento econômico, social e cultural do Estado. Como rígido controle do processo de libertação dos negros, em 1885 foi aprovada a Lei dos Sexagenários, que concedia Formação da riqueza e do pobreza de Alagoas 41
  • 27. .,., liberdade aos cativos maiores de sessenta anos e estabelecia normas para a libertação gradual de todos os escravos, mediante a indenização do Estado ao senhor de engenho. Somente em 13 de maio de 1888 - após indenizar todos os senhores de engenho que tinham comprado escravos, foi aprovada a Lei Áurea. Os escravos libertos, que não foram indenizados e não dispunham de meios de produção ou de recursos para bancarem sua subsistência, foram obrigadosapermanecer no engenho como moradores ou, simplesmente, como mão-de-obra livre, assalariada, responsabilizando-sepela própriasobrevivência, o que osobrigava a trabalharem todos os dias, exceto, pelo menos, nos dias santos e feriados. Isso evidencia a ineficácia da Lei para mudar a mentalidade dos senhores e a insuficiência desse ato legal, como medida solitária, para transformar esse histórico cenário. Como trabalhadores livres, a remuneração que !ecebiam não dava para manterem seu próprio sustento. Portanto, reservavam os finais de semana para cultivarem, num pequeno sítio, os produtos básicos de alimentação, a exemplo do feijão, milho e mandioca, etc. Dessa forma, a libertação dos escravos contribuiu para aumentar, significativamente, a produtividade do trabalho no plantio, nos tratos culturais, na colheita da cana, bem corno no fabrico do açúcar. Com isso foi possível aumentar, ainda mais, a área cultivada com cana e, conseqüentemente, elevar a acumulação de capital do senhor de engenho. O processo de libertação dos escravos e a expropriação do pequeno produtor formaram um enorme contingente de mão- de-obra disponível. Essa força de trabalho excedia a quantidade de braços necessários nos engenhos, obrigando o trabalhador a submeter-se a baixas remunerações e a condições de trabalho excessivamente precárias, visto que acana-de-açúcar foi a primeira atividade econômica praticada em grande escala, nos períodos colonial, imperial e republicano. 42 Fernando José de Lira Com a Independência do País, os Reis Dom Pedro I e Dom 1'1•dro II continuaram apoiando a atividade açucareira, I''mcipalmenteno âmbito financeiro, comcréditosfornecidos pelo 11.tnco do Brasil que, criado em1808, era uma instituição poderosa 110 auxílio aos senhores de engenho, sobretudo liberando 1·rnpréstimos para comprarem terra e aumentarem a produção. Com a República, esperava-se que as elites locais perdessem lorça, todavia isso não ocorreu. Ao contrário, a burguesia agrária 1•-ltadual manteve o seu poder e a cana-de-açúcar continuou .1vançando do litoral em direção à Zona da Mata, daí chegando 11té o Sertão do São Francisco. Durante essa conjuntura, que nasceu no período colonial e 11lravessou o imperialeorepublicano, os trabalhadoresnãopossuíam 11ualqucrdireito trabalhista. O senhordeengenho pagava-lhescomo qaJário aquilo que lhe convinha e que, quase sempre, ficava abaixo do necessário para a manutenção fisiológica da família. Nesse período, a expansão da cana-de-açúcar foi tal que, .1 partirdo início do século XX, Alagoas era uma espéciede paraíso da cana. Possuía mais de 90% da Zona da Mata cultivada com lana-de-açúcar. Para isso, usou quatro modalidades de trabalho: u trabalhador morador, o trabalhador sitiante, o trabalhador permanente e o pequeno produtor, fornecedor de cana. Para se ter idéia da ocupação da terra de Alagoas com cana, Beatriz (1998, p.20) informa que, a partir da segunda metade do século XVIII, o número de engenhos da Província de Alagoas passou de 73 em 1824, para 234, em 1850, alcançando 360, no início do século XX. Entretanto, embora o controle das terras produtivas fosse condição necessária para o aumento da produção de cana, não era suficiente para assegurar trabalho à massa de h·abalhadores disponível, e era insuficiente a quantidade de terra, necessária ao funcionamento dos engenhos. Paragarantir o trabalho a essa massa de assalariados e gerar excedente de mão-de-obra, os senhores de engenhos teriam que Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 43
  • 28. avançar aM as terras não aptas para a cana, as que eram cultivadas pelos pequenos produtores, na forma de culturas de subsist~ncia. Proprietários dessas terras, os senhores de engenho transformaram-nas em pequenos sítios, cultivados pelos moradores de engenho. Com isso, ficaram obrigados a prestar serviços para o engenho, na cana e fabricação do açúcar, em condições bastante subordinadas, perdendo a liberdade e as condições de vida razoáveis. Na medida em que a cana avançou, o trabalhadCfr morador passou a receber uma casa com uma pequena área onde tinha a possibilidade de desenvolver e cultivar seu roçado, prestando, corno contrapartida, trabalho ao proprietário. De acordo com Beatriz (1986, p.60), esse trabalho seria desenvolvido nas condições de tempo e de tudo o mais exigidas pelo senhor de engenho, que requeria do morador entre 4 a 5 dias da semana, reservando-se os demais para cuidar de sua subsistência, sendo que ele só poderia trabalhar no sítio e morar na propriedade, caso se subordinasse às exigências impostas pelo proprietário. Caso contrário, o moradorseria dispensado daquele, tendo que se submeter às mesmas condições em outros engenhos de Alagoas ou de Pernambuco. Comoo engenho era a forma socialdeprodução dominante, nas áreas onde se desenvolveu inibiu outras alternativas econômicas de sobrevivência. Eram, portanto, os mesmos pequenos produtores expropriados que procuravam os senhores de engenho para pedir moradia e trabalho. Nessas ocasiões, o próprio senhor de engenho era quem entrevistava o candidato e decidia sua admissão, que só era possível depois de cumpridos alguns requisitos. Baseavam-se em informações sobre a história de vida do candidato, inclusive sobre as razões pelas quais ele havia abandonado seu último trabalho. Dava-se preferência a moradores que fossem chefes de família, com esposa e filho. 44 Fernando José de Lira Nessas condições, ao chegar ao novo engenho, o morador tho tinha contraído apenas uma dívida monetária, porque vinha ,,•forçada por uma forte subordinação nas relações de trabalho e moradia no novo engenho, bem como, amda, por uma obngação de grande lealdade ao patrão. Aparentemente, ele era bem remunerado, pois, além de receber pagamento pelo trabalho realizado para o senhor de engenho, possuía os produtos cultivadosno roçado, que deveriampermitir-lhesaldarsuadívida no barracão, sobrando-lhe o suficiente para adquirir os demais bens necessários ao consumo da semana seguinte. Entretanto, issonemsempre ocorria. Freqüentemente, o morador permanecia · por muitos anos - em dívida com o patrão. O morador recém-admitido tinha que internalizar que o trabalho realizado no roçado individual, para proveito pessoal, só era possível como conseqüência do trabalho coletivo e prévio que erafeito parao senhorde engenho. Essa relação de dominação materializava-se, também, no armazém da propriedade, conhecido como barracão. O senhor de engenho, visando à reprodução da relação morador/senhor, fazia um esforço permanente para intervir de diferentesformas eem todos os níveis na vida dosseussubordinados. Esse esforço incluía a utilização de alguns de sua confiança que, duranteajornadade trabalho,sobordens, percorriama propriedade a cavalo, visitavam os moradores isolados nos sítios, ou ainda, nas horas de descanso, na varanda da Casa Grande, observavamo que ocorria no espaço coletivo do engenho. Para Beatriz (1986, p.60), nos dias de trabalho, ou seja, du- rante a semana, só era permitido ao morador sair do engenho quando autorizado pelo própriosenhor,comexceçãodos feriados, quando a saída era livre. O comprometimento assumido não era somente do chefe da família, mas de toda a família. No conjunto das atividades do engenho e no roçado, com culturas de subsistência, a esposa Formação do riqueza e da pobreza de Alagoas 45
  • 29. do mor~dor e seu~ filhos solteiros - enquanto membros do grupo domés~co - contribuíam conjuntamente com 0 morador para a execuçao das tarefas exigidas, ainda que de forma diferente, segundo o sexo e a idade ~~a~corporado ou permaneciacomomorador do engenho, com direito a casa e ao roçado ou sítio, se fosse chefe de fanúlia. Os ho~ens ~olt~iros ou aqueles que ficassem sozinhos por qualquer motivo nao tinham esse direito. Eram alojados em galpões, que os acomodavam em grande quantidade e precariamente. A condição de maioridade só era obtida mediante 0 casamento, quando o filho tinha a possibilidade de tornar-se, também, morad~r. Assim, embora significasse, de fato, garantia em termos morais, a fanúlia significava, também, a possibilidade de reprodução de novos moradores no seu interior. Dessa forma assegura~a.-se a continuidade do próprio engenho. Tendo ~ responsabilidadede sustentara familia, o morador oferecia, ainda, o resultado da produção de subsistência, como forma de compromisso com sua continuidade no trabalho em cumprimento ao conjunto de obrigações que lhe eram irnp~stas. Com a transformação de alguns engenhos em usinas, mudou também a relação de produção e de trabalho, porque as moendas passarama exigir muito mais canas.Parasatisfazeressa exigência, era necessário o avanço na ocupação das terras da própria _us~a P?r todos os lados do território alagoano, 0 que, num pnmeu~ ~nstante, ~ignificou a expulsão dos pequenos produtores sitiantes, roceiros arrendatários e colonos dos tabuleiros, transformando-os, assim, nos primeiros trabalhadores rurais sem-terra. Esse fenômeno e a mecanização adotada em todas as áreas planas de Alagoas contribuíram para 0 aumento do número de trabalhadores temporários. Nosegundo momento, e.s~endeu-se o mesmo tratamento aos próprios moradores, s1~antes, pequenos fornecedores da fazenda, impelindo-os da usma para a periferia de cidades e vilas mais próximas. 46 Fernando José de Lira Para Loureiro (1970, p.24), a ocupação, em grande escala, dos Tabuleiros com cana iniciou-se em 1960, com a usina Sinimbu, '•l'ndoseguida por outras usinas, aumentando as áreas dos grandes 1'roprietários ~ resultando, <..Om o passar dos anos, na grande l'xpansão do cultivo e na ocupação total dos tabuleiros existentes. Beatriz (1986, p.11) indica que essa ocupação redundou num aumento significativo do número de grandes propriedades e, principalmente, na instalação de novas e grandes usinas e destilarias, aumentando, exponencialmente, a produção de açúcar e a oferta de mão-de-obra. Comisso, a grande massa de trabalhadores disporúveis, parte dela incorporada às atividades agrícolas de cultivo de cana, passou a não possuir vínculos de trabalho diretamente com os grandes proprietários. Como diz Beatriz (1986, p.30), "essa relação passou a ser mediada por um empreiteiro que recrutava a mão-de-obra necessáriaàs atividadesdas fazendas. Somenteos trabalhadoresmais especializados permaneceram com carteira de trabalho assinada". Os empreiteiros não têm carteira de trabalho assinada e trabalham para grandes usineiros. Eles procuram recrutar os trabalhadores necessários a determinada tarefa e, muitas vezes, permanecem nas propriedades das usinas, junto com os trabalhadores que lá se fixam durante a semana. Nesse modelo, cada trabalhador recebe por produção, no final da semana. É muito comum o trabalhador receber parte de seu trabalho já realizado na forma de vale a ser descontado no dia do pagamento. Como explica Beatriz (1986, p.50), a existência ·desse intermediário é considerada uma forma de exploração, que se apresenta mais conflitante quando o empreiteiro é dono do barracão da usina, ondeos trabalhadores fazem suascompras. Os preços das mercadorias são freqüentemente muito mais elevados do que os praticados em outros locais de venda. A presença do empreiteiro é muito favorável para os usineiros, porque lhes assegura fixação permanente do Formação do riqueza e do pobreza de Alagoas 47
  • 30. ."' trnbulhac.Jor na propriedade, sem arcarem com os custos de uma ligaçdo direta e formal, que incluiria a existência de vínculos trabalhistas e das obrigações decorrentes dessa situação. Alguns moradores remanescentes na propriedade são forçados a executar tarefas rejeitadas pelos trabalhadores do empreiteiro, pois são vistos pelo usineiro como subordinados e 'portanto, mais sujeitos às determinações do administrador da fazenda. As casas mostradas abaixo representam as condições da habitação a eles destinada. FIGURA 1.5 - Habitação típica do trabalhador e sua família na atividade canavieira de Porto Calvo. Quanto à remuneração percebida, os trabalhadores temporários usam-na para pagar dívidas no barracão. Se sobrar algum dinheiro, fazem compras nas feiras próximas às usinas. Quando trabalham o mês inteiro, chegam a ganhar pouco mais do que o salário mínimo, alcançando somente dois terços dele, se não tiverem ocupação permanente. A renda média dos trabalhadores moradores é 48 Fernando José de Lira inferior à dos temporários, atingindo em torno de 50% do i;alário mínimo por mé?s trabalhado. É muito comum pequenos produtores do Agreste e do Sertão prestarem trabalho nos canaviais, para complementar sua renda. Como sua área de terra é muito pequena, principalmente nas crises de produção ou em períodos de pouca chuva, os pequenos produtores migram para as usinas mais próximas para cortar cana. Logo que se inicia o período de chuva, voltam para cultivar seu pequeno pedaço de terra. FIGURA 1.6 - Trabalhador rural temporário, trabalhando por produção, percebendo rendimento em torno de US$ 3,20 por dia de trabalho. Conforme afirma Beatriz (1986, p.60), "o trabalhador residente na fazenda das usinas, no momento em que diminui a demanda por trabalho no interior da propriedade, para poder concorrer com os trabalhadores que vêm de fora, vê-se obrigado até a dormir no local de trabalho, para garantir o próprio dia de serviço". Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 49
  • 31. .'. Freqüentemente, a falta de trabalho para os moradores da usina é utilizada pelo usineiro como mecanismo para forçar o abandono da propriedade pelo morador, o que vem ocorrendo muito, desde o início da década de noventa. Portanto, o trabalho assalariado temporário passou a ser a única fonte de renda para a grande massa de pessoas residentes no campo. Ao submeter-se a isso, o chefe de família, para garantir a sobrevivência, teve que colocar toda a família na atividade canavieira. É sob essas condições que, desde cedo, aparecem as crianças trabalhando nos canaviais, em condições que vêm deteriorando-se ao longo dos anos. Em suma, todos os fatores referidos geraram um grande excedente de mão-de-obra, que vive no meio rural, na periferia das pequenas, médias e grandes cidades. Em caso de maior necessidade, muitossãochamados a prestarserviços à usina, sem qualquer vínculo. 50 Fernando José de Lira Capítulo li O poder de base agrária A divisão geográfica, social e econômica do território brasileiro em espaços estaduais deve ser entendida como resultado de uma ação política. E, assim, os espaços nacionais foram organizados e construídos histórica e politicamente. Por conseguinte, as condições peculiares a cada Estado decorr:~ de um sistema político com relações externas e internas específicas. Nesse sentido, o processo de manutenção do poder político estadual pode desenvolver suas próprias alternativas de desenvolvimento económico, que podem estar ou não em consonância com o poder econômico regional ou nacional, mas sempre o estarão comosinteresses específicos das elites e.staduais e com suas relações com o poder político regional e nacional, no sentido de garantir a preservação desses interesses. . Alagoas é, portanto, um espaço político-social que p~ssui especificidades nos processos político e social e, por con~egum~e, deve ser um espaço geográfico da sociedade local em mteraçao parcial ou total com a sociedade global, porém comportando-:e de forma diferenciada. Assim, Alagoas é justamente a expressao autêntica de suas diferenças culturais, sociais e do processo de produção e de diferenciação do espaço geográfico1. Um Estado, mesmo possuindo relações com outros das regiões do País ao qual pertence, possui vinculações internas autônomas que lhe conferem um caráter próprio e diferenciado. 1 Arespeito do conceito de região veja-seLipietz (1980) e Castro (1992:30). Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 51
  • 32. Um Estado e sua identidade são construídos através das imposições de uma classe dominante, objetivando expandir sua própria base material, bem como o uso do controle da administração local para alcançar seus efeitos. Por isso, as elites dominantes desenvolvem formas de controle político apropriado a seus interesses econômicos e de poder, fazendo com que o Estado assuma aspecto político peculiar, quando comparado com outros Estados2 • Desse modo, a própria identidade estadual é influenciada pelo comportamento das suas elites em relação à sua região, ao poder nacional e a outros Estados. 2.1 - As raízes do poder em Alagoas Do período colonial até o início da República, ser senhor de engenho significavater vastas propriedades, o que deixava muita gente sem terra, dependente desses grandes proprietários. Esses possuíam muito poder. Quanto maior fosse a área de terra e o número de escravos possuídos, tanto maior era o poder que o senhor detinha, irradiando-se para além dos limites do engenho, alcançando o meio urbano, ondeelegia prefeito, vereador, deputado, senador e governador, influenciando, ainda, a nomeação de juízes e pessoas do alto escalão do governo estaduale, até, federal. Essessenhores formavam uma elite quase homogênea, com poderes especiais. Núcleo político-social, o engenho era também um núcleo demográfico( servindo de base à formação da familia e da sociedade alagoana. Por conseguinte, qualquer núcleo que se constituiu em Alagoas encontrou a sua base de formação no Engenho Bangüê. Como diz DiéguesJúnior (1976, p.40), "o senhor de engenho é a grande figura da paisagem social de Alagoas. É nele que se centraliza a organização da família. As cidades de Alagoas são, na 2 Conforme Roberts (1981, p.50). 52 Fernando José de Lira wdade, um prolongamento do engenho, e o senhor de engenho , 0 chefe político da família ede toda a genteque vive no engenho". Na hierarquia social da atividade canavieira, estavam os ~11·nhores de engenho e os lavradores, que não podiam ter 1•ngenho, embora dispusessem de terras, ouque não tinham terra 1•, nesse caso, cultivavam a cana nas terras do senhor. Conforme ll posse da terra de que dispunham para cultivar cana, o número de escravos que possuíam e as safras que produziam, os ltwradores, também chamados de fornecedores, tinham maior uu menor importância social. A relação entre os lavradores e o senhor de engenho era de muita desconfiança. Freqüentemente, o senhor de engenho proibia aos lavradores a entrada na casa de purgar, durante a moagem de sua cana. Alegava que a sua presença implicava fiscalização e, conseqüentemente, uma desconfiança. A estrutura econômica dominante no Estado, bem como sua organização político-social dela emanada, permitiam que muitos abusos de autoridade fossem cometidos impunemente pelos senhores de engenho. Nesse sentido, a posse da terra e sua ocupação com a monocultura da cana davam o poder absoluto sobre os lavradores, agregados, trabalhadores e a imensa maioria de pobres livres, que necessitavam de terra para sobrevivência. Para Diégues Júnior (1976, p.80), "a transformação dos engenhos em usinas levou o antigo senhor de engenho a morar na cidade, para onde levou seus hábitos, seus cos- tumes e seu modo de vida, os quais iria transmitir para toda a sociedade". A mudança tecnológica, que ocorre a partir do início do século XX, com a transformação do engenho numa indústria moderna e com a utilização do arado na agricultura, não altera a estrutura de produção e de poder da atividade canavieira. Ao contrário, os antigos senhores de engenho, transformados Formação do riqueza e da pobreza de Alagoas 53
  • 33. em usineiros, discriminam seus antigos companheiros que, por não terem terra e recursos financeiros suficientes, permaneceram como senhores de engenho e, com o tempo, tornaram-se fornecedores de cana para as maiores usinas. Poucos se transformaram em usineiros, já que, nessa nova condição, necessitavam de muita terra para plantarem cana e obteremcrédito junto ao governo. Houve usinas que chegaram a incorporar dez engenhos. Todavia, é curioso que as 24 famílias de senhores de engenho tradicionais de Alagoas transformaram-se em usineiros, aumentando muitas vezes as áreas de suas propriedades e o número de fornecedores. Esse processo de concentração de terra e indústria no meio rural, nas mãos de poucas famílias, teve amplo apoio financeiro dos governos federal, estadual e municipal. Portanto, a história da cana-de-açúcar, em Alagoas, é a história da relação entre propriedade latifundiária e poder. Essa herança histórica é determinante da estrutura agrícola, econômica e social do Estado. Os senhores de engenho e, depois, os usineiros, que tinha m o controle da propriedade fundiá ria, possuíam também a base do poder político que usavam, muito bem, na obtenção de privilégios, transformando a sociedade alagoana num Estado praticamente dependente de urna única atividade econômica. Em Alagoas, em 1931, havia 27 usinas, convivendo com 618 engenhos bangüês, que produziam cerca de 31%do açúcar alagoano. Com o novo surto de desenvolvimento das usinas, . .,_ provocado pela Segunda Guerra Mundial, elas não só aumentaram a sua produção, como também, devido ao uso do caminhão e ao melhoramento das rodovias, passaram a ampliar sua área de influência, estendendo o plantio. O governo federal, através do IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool), fundado na era Vargas, cria uma série de 54 Fernando José de Lira UFAL T~CA CEN1RAl BBL0 ~ medidas que acabam por financiar a compra de terra e, conseqüentemente, o aumento da área cultivada com cana, rhcgando a atingir a Zona da Mata, o Litoral e o Plan alto, também chamado de Tabuleiro. Como afirma Pedro Ramos (1999, p.80), "entre 1885 a 1890 o governo de Pernambuco e o de Alagoas subsidiaramfortemente n montagem de diversas usinas. As facilidades oferecidas pelo governo republicano, para a montagem dessa unidade fabril isolada,foram tantas que mesmo os médios fornecedores de cana • • ~ • • li ururam-se e cnaram sua propna usma . Seguindo essa linha de apoio do período republicano, os outros subseqüentes também ofereceram os mesmos pl'ivilégios e mantiveram intacta a estrutura de dominação vigente na atividade agropecuária, só que mais ampliada, nlingindo todos os setores da sociedade alagoana. Essa ação paternalista do Estado, ao criar forte sistema de defesa da utividade açucareira, acabou por reforçar o atraso relativo das 11tividades praticadas pelos usineiros, que tinham mentalidade de grandes latifundiários. Para Pedro Ramos (1999,p.70), os diversos mecanismosque o Estado utilizou em benefício de um único segmento social serviram tão somente paraconsolidaruma estrutura de produção, que não se justifica do ponto de vista social. Como se sabe, a estrutura fundiária concentrada, herdada do passado colonial, foi fortalecida pelos sucessivos governos que têm marcado a sociedade alagoana. Com os subsídios estatais e a concentração da propriedade da terra, os senhores de engenho, desde o século XVIII, e os usineiros, a partir do final do século XIX, usam sua força política (ll·ansferida de pais para filhos), fazendo valer seus interesses e mantendo o comportamento típico da classe senhorial, com reflexos profundos na sociedade alagoana, inibindo, inclusive, quaisquer reformas e mudanças. Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 55
  • 34. Para Pedro Ramos (1999, p.80), o poder políticodos senhores de engenho e, em tempos mais modernos, o dos usineiros decorre do fato de serem grandes proprietários de terra, numa espécie de monopólio da posse dos meios de produção. Mesmo as reformas modernizantes das atividades agrícolas enão-agricolas foram bloqueadas. Aidéiade criação dos engenhos centrais, que separava a propriedade da indústria da propriedade da terra, logo foi inviabilizada pelos senhores de engenho, que temiamperdero poder de latifundiário, passandoa seremsimples fornecedores de cana. Com a crise decorrente da grande concorrência do açúcar brasileiro no mercado externo, o governo resolveu modernizar a atividade, procurando aumentar sua produtividade, oferecendo cré~ito abundante, fácil e de baixo custo no âmbito federal e apoio da irúra-estrutura física das esferas estaduais e municipais. Esse incentivo, porém, funcionou contrariamente ao esperado, como estímulo para o usineiro resistir ao processo de modernização da produção açucareira. Sensível às pressões desse segmento, o governo acabou por concordar em fornecer algumas garantias, como o tabelamento do preço da cana, que favoreceu o usineiro na compra das cotas obrigatórias da produção dos fornecedores, com prejuízo para estes. Outrofatorquedemonstrouopoderdosusineirosfoiodecorrente do a·escimento da produção.paulista que ameaçava a do Nordeste, de custo mais elevado. Preocupados em manter seus privilégios, os usineiros dessa região declaram-se ineficientes e exigiram do governo federal não só o estabelecimento de cotas por região, por estado e por usina, como também a equalização de custos. Com o argumento de queseuscustoserammaiselevadosdoqueosdeSãoPaulo,reivindicam um preço maior para o açúcar do Nordeste. Nessa nova fase deconcorrência,sobreviveramaquelas usinas que tinham mais condições de possuir mais terra. Os pequenos 56 Fernando José de Lira fornecedores, mesmo organizados em cooperativas, foram os primeiros a serem expulsos de suas terras que as usinas passarama incorporar à sua área de influência, procedendo igualmente comos medios fornecedores que tmham pequenas usinas. Reconhecendo a crise da baixa produtividade, na segunda metade do século XIX, o governo republicano tratou de modernizar ,1 produção açucareira. Para isso, foi idealizada a implantação dos L•ngenhos centrais, com máquinas modernas capazes de esmagar li canade vários engenhos bangüêse defabricar o açúcar de melhor qualidade, mais aceito no mercado externo. Na sua concepção, os engenhos centrais separariam a otividadeindustrial da atividade agrícola. Montados e garantidos pelo governo, deveriam pertencera companhias estrangeiras, que não poderiam cultivar cana, não usariam braços escravos e ueveriam construir estradas de ferro para o transporte de cana uté a fábrica, substituindo os carros de boi, que se limitariam a levar as canas de áreas distantes das estradas de ferro. Com essa visão, o Estado também tratou de determinar a localização dos engenhos centrais, a fim de que cada um tivesse ,1 sua zona de influência e de que não houvesse concorrência predatória entre eles. EmAlagoas,naúltima décadadoséculoXIX, foramimplantados os engenhos centrais Brasileiro, Utinga Leão e Sinimbu. Apesar da importânciadaidéia,essa implantaçãonão recebeuapoiodos senhores ele engenho bangüê, que temiam perder o poder de serem donos do nçúcar, ficando submetidos a grandes industriais, que iriam utilizar suas canas no fabrico do açúcar. Ou seja, haveria a separação das atividades de produção de cana e de produção do açúcar. A resistência dos senhores de engenho a essa idéia deu origem à transformação do engenho bangüê em usina, onde o senhor, agora usineiro, passaria a ser dono da cana e do açúcar, continuando, portanto,como industrial e, ao mesmo tempo, como grande latifundiário. Formação da riqueza e da pobreza de Alagoas 57