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UMA PEDAGOGIA DA COMPAIXÃO
José Matias Alves
Tal como relataHabermas,poucoantesdo
octogésimoaniversáriode Marcuse,osdois
interrogavam-sesobre comoexplicarabase
normativada teoriacrítica.
Marcuse só deua respostadoisdiasantesda sua
morte:
“Vês?– disse a Habermas – agora sei emque é
que se fundamentamosnossosjuízosmais
elementares:nacompaixão,nonossosentimento
pelador dosoutros”.
Para os teóricosdaescolade Frankfurt,a piedade
e a compaixãoconstituíramaarma da crítica. As
profundasmarcasque nelestinhamdeixadoos
mártiresdoscampos de concentraçãotornavam-
nos especialmente sensíveisàinjustiçae àdor.
(Miguel SantosGuerra.Entre Bastidores)
Eu proponho, portanto, que o homem seja definido
como uma nova espécie: o homo compassivus.
Àqueles a quem falta a compaixão falta também a
qualidade de humanidade. Não são meus irmãos.
(Rubem Alves. Gaiolas ou Asas)
Tive o privilégiode conhecerpessoalmente aautoradestashistóriasque se organizamem
torno dosprocessosde escolarização.De serseuamigo.E de ser agora um autorcomovido
que escreve tendocomopretextoosfiosque nostrazema vidana suamúltiplasrealidades.
Organizoa minhaleituraapartir de sete categoriasanalíticasque pensopoderemlera
generalidadedestestextos:omundodavidaaprisionadopelalógicasurdae absurdados
sistemas;oslaçosque é precisotecerparaque as aprendizagenssejampossíveis;ooutrolado
da escola, ora sombrioorasolar;as pessoasdosalunose dosprofessorescomassuas
irredutíveissingularidades; ahipocrisiade umsistemaenclausuradonaestupidezdofazde
conta; e,por fim,algumaspalavrassobre o olhardo sujeitoque escreve:sobre ostemasque
escolhe,aspersonagensque convocae expõe,asnarrativasque narra,o estiloque adota,
tendosendoodenominadorcomumde umaradical compaixãopelosque sofrem, uma
insaciável sedede justiça,fraternidadee dignidade.
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A. O mundoda vidae o mundodossistemas
O binómiodomundodavidaaprisionadopelomundodossistemasé umaconstante deste
livro(Habermas) .A históriadoLuís que queriaconstruirumacaixaverdadeiraparapoder
guardar a sua intimidade devassadae destruída,paraguardar as résteasde sonhos
(im)possíveisabre-nosparaummundomarcado poruma brutal desumanidade e gerauma
imensavontade de chorar.Mas tambémuma radical vontade de revolta,poiseste mundo não
podeser assim impiedosoe desumano.Nãopodemossercúmplicesdesta lógicamaquinal.
Não podemosficarindiferentesàsdorese misériasdossereshumanos.
Este é, talvez,acategoriamaispresente e maisinsidiosa:ahistóriadoportãoa separaruma
EB1 (sobrelotada) de umaEB2/3 (infralotada)domesmoagrupamento.Eaassociação de pais
que se dirige ao diretorparaque o portão se abrisse nosintervalosparaque as crianças
pudessembrincar.Ea decisãoabsurda:é impossível abriroportãoporque a 1ª pertence à
Câmara e a 2ª ao ME. E sendoemboradiretordoagrupamento tinhade pedirautorizaçãoàs
ditastutelase era uma mar de burocracia que nãovaliaa pena tentar.Triste de quemvive
presona escravidãoque constrói.
Ou a históriadoarboreto. Comorefere a autora, as escolasondese aprendefazendo são
excecionais,masexistem. E erao caso de um arboretoexcecionalque foi sendoconstruído
por alunos,professorese paisaolongode 15 anos. Que continhaexemplaresúnicos.Que
tinhasidopalcode aprendizagensque durariamtodaumavida.E entãosurge a notícia
absurdade que as máquinasiamarrancar tudo. E istoporque a Parque Escolar iarequalificar
os espaçose equipamentos.Tudoemnome dosalunose dasaprendizagens.Iasermuito
melhor. Houve protestose indignações.Masque nãohavianada a fazer.Que estavatudo já
decididoporgabinetesde arquitetose pororientaçõessuperiores. A ordempara destruir
legitimadapelos superioresinteressesdosalunos erairrevogável.A este propósito, aautora
cita YvesMagat (jornalistasuíço):“háum problemanavidapolíticaportuguesa e aponto-o
com toda a amizade que tenhoporeste país: a impiedade.Emcada mudança,sejaa nível
macro ou a nível micro,a nova equipaque chegaao poderacha-se naobrigaçãode anular
tudoo que foi feitopelaanterior.” Oraisto é uma crime públicoporque se constitui como
um atentadocontramilharesde pessoasque se dedicaramde corpoe alma a construir
espaçosvitaisnaescola.Aliás,ahistóriadasintervençõesdaParque Escolaraindahaveráde
sercontada como um processode betonizaçãoaceleradadoaamplosespaçosescolaresaoar
livre,onde aconvivialidadeabertaerapossível,oar respirável.Hoje,de ummodogeral,as
escolasintervencionadaspelaParque Escolarsãoumaenorme concentraçãode betãoonde as
pessoas,paradoxalmente,nãotêmonde estar,onde adispersãode espaçosaumentouo
isolamentoe asolidão.
Ou aindaa históriadoscastanheiros.Comoconfessaaautora: para mim a escola é um lugar
estranho.Haviaumprofessorque tinhaumprojetode plantaçãode castanheiros.Houve o
entusiasmo,adádivaoenvolvimentode alunose pais. Mas no ano seguinte, oprofessorque
tinhalideradoaaventuradoscastanheirosnãoestavajá na escola. A lotariados concursos
nacionaistinha-ocolocadonoutraescola.Emnome da igualdade de oportunidadese dajustiça
da graduação profissional. Equemo veiosubstituirnempercebeuque aquelestocoseram
castanheiros.Emilhares foramdeitadosfora. Sabe,a escola é como um campo debatalha.
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Aliás,ashistóriasde professoresque têmde pôrfima projetosextraordináriose aassumirem
o estatutode pastoreserrantesquenão podem amarassuasovelhas acontecemváriasvezes.
É o caso de Marta, professoradosmesmosalunosdurante os3primeirosanosde
escolaridade.Martaque tinhadesenvolvidopráticaspedagógicasextraordináriase inovadoras
e que interpelavaomarasmodosseuspares.Comojá diziaMaquiavel, o inovadorcria inimigos
em todososqueprosperamna velha ordem. Na velhaordemdasebentae da repetição.Do
tédioe do abandono.E porisso,quandoo sistemaa mandapara outro lugar,os colegasousam
dizer: o quea Martanosdeixou não foiuma herança foi umpesadelo.A Marta foi um
acidentenuma escolacolonizadae habitadaporquemnãotem o direitode serchamadode
professor.
Para finalizarestavisitaàinsensatez,vejamosahistóriados dispensáveis. OprofessorLtinha
sidocolocadonumavaga de Históriadaescolax. Foi umacolocação desgraçada.Quase cego,
grau zerode ensinoe de autoridade.Grauzerode aprendizagem.A escolaconseguiuuma
JuntaMédica e a meiodoano,lá se conseguiuamudançade atividade,passandoaexercer
funçõesa tempocompletonabibliotecaescolar.Eentãodá-se omilagre:L revelou-se um
hábil investigador,umextraordinárioadjuntodoscolegasnodesenvolvimentodocurrículo,
um sempre disponível orientadordasaprendizagensdosalunosque oprocuravam.Mas
chegouo final doano e umdia o vento dosnovosconcursoslevou-o.Não sabemoscomo
estará na nova escola (masnão noscusta nada imaginar).
B. Os laçosque geram a aprendizagem
Os laçossão outra categoriacentral destestextos.PorqueaAngelinanemprecisariade terlido
o diálogoentre araposa e o principezinho: o queé cativar?Porque elasabia(tambémpor
saberde experiênciafeito) que asede de aprendernasce daatenção,do cuidado,da
consideração,daconvocaçãopara a aprendizagem.Porqueelasabiaque amissãocentral do
professor(vamosusar deliberadamente estapalavramissão),que amissãocentral do
professoré procurar continuamenterespostasparaosproblemasdoexílioe doabandono.Ela
sabiaque nenhumalunoestavacondenadoadesaparecer,nenhumalunoestavacondenadoa
ficar na margemda aprendizagem,nofundodasala.Mesmoo Nunocoma Trissomia21.
Mesmoele podiaserchamadoa entrarno círculo da aprendizagem.Mesmoele podiaser
forçado a sair do exilio para onde se tinharemetido.Epor isso,aprofessorainventauma
conspiraçãocom todosos alunos,e atravésde uma brincadeira do lenço gera uma aliançaque
o faz incluir.
Ou o episódiodocantononoque eraproibidoe entãoera por aí que se iriacomeçar.Ou a
históriadoSandroe do mapa perfeito.UmalunoCEFpor quemninguémdavanadamas a
quemforamabertasas portas da aprendizagemporque se teveafelicidade de colocaro
desafiocerto – desenharo mapa dePortugal.
C. O outro ladoda escola
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Já referimosque estashistóriasse relacionamcomosprocessosde escolarização.Comos
outrosladosda escola.Ladosmuitasvezessolares,algumasvezessombriosonde germina
calada a podridão.
É a históriade Joanaque não encontraa escola comque sempretinha sonhado. Joana,a
abandonada, a tentarperceberose passavano reinodograu zeroda pedagogia,daatençãoe
do afetoe a aprenderodesânimo,adesilusãoe oprogressivoabandono.
A escoladosolharesdilacerantes. Nada há deatrativo na escola:nemno espaço físico nemna
relação com a maioria dosprofessoreseo motivo para estarali está tão longee distanteque
são poucososquefazemdo presentea gestação do seu futuro;asrelaçõesentre as matérias
ensinadaseas aprendizagenssão relaçõesdifíceisou ténues:o esforço mal percebido,a
utilidade pouco clara. Uma catedral de tédio. Alina sala , diantede nós,procuramo-losmas
não osencontramos,mesmo sedizem sim, setor.Quantosvezesosprocuramose nãoos
encontramos.Mas ao professornãose lhe pede que encontre.Nãose lhe pede aresposta
para os problemas.Nãose lhe pede asoluçãochavena mão. Pede-se-lheque procure.Pede-
se-lhe que nãodesista.Pede-se-lheque nãofique indiferente.Pede-se-lheatençãoe cuidado.
A falsaautoridade que se julgaconstruiratravésdadistância,comono caso do Obrigado,ó
palerma. Do professor,atrabalharnum TEIP,que pensaque a relaçãopedagógicase constrói
atravésda indiferença,daafirmaçãogratuitada superioridade e daimpassibilidade.
A escolaque não deixade serumespaçoprodutorde solidões. Mesmo falando do ato
pedagógico não sefazdo outro o companheiro da mesma viagem.Ena solidão se combatem
os moinhosdevento semsalvaras Dulcineias.E a solidão é sofrimento quando o esforço,a
implicação e o empenhamento são muitasvezesdesproporcionaisrelativamenteaos
resultadosalcançados. Precisamente.Estaé a escolado excessode presença,doexcessodo
trabalho,doexcessode exigênciasimpossíveis,dointensosofrimentoque reduz
progressivamente aalegriade ensinar.
Mas é tambéma escolacomo lugarde humanidade que ajudaaIsabel adolescenteadar à luz
o filhode Pedroque tinhaentretantomorridonumacidentede mota.
A escolacomorespostaface ao descalabrofamiliare que nãopode ficarinsensível aoapelo
gostava quea professora falassecomo meu homem porque ele nãosabe serpai,porque ele
estáa destruiromeuCarlos,porque estamossósneste mundocruel.
A escolada solidariedade,comonocaso doAlmerindoque queria sercarteiro.Oexame da4ª
classe erauma barreiraintransponível.Nãoque nãosoubesseosuficiente.Porummisterioso
processode bloqueamento,ochumboerao destinorecorrente. Entãoa professorae os
únicoscincosalunosque iama exame decidiramque oAlmerindotinhade cumpriroseu
sonho,decidiramque tinhade passar!Estadecisãofoi o grande objetivodaturma. Oscinco
queíamosa exame,íamospara queo Almerindo passasse.Ecolocaram-noentre eles. E
ajudarama resolveroexame doAlmerindo.
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D. As pessoasdosalunos
Antesde tudo,os alunossãopessoasconcretas.Nãotêmnúmero.Têmnome.Como o Rafael.
O caso de Rafael era difícil,disseram-nos. Porque viviasónomundo.Opai tinha
desaparecido.A mãe naprisão.E na procura de laços,uma telefonemaparaa prisãoe ouvira
mãe:que eu atéparece quese me estoira o coração desaudadesdehá maisde um ano não
ver o meu menino. Rafael. Não quero queele penseque é uma criança abandonada. Diz-lhe
isso,professora,que não é umacriança abandonada?
Ou comoo Rui: a professoraque telefonaparao nº de telefone que adiretorade turmado
Rui lhe tinhadado. De casa responde aavó:o Rui tinhaidocom a mãe para o IPO. Ele é bom,
muito bom, disse aavó, só tem muita revolta. E entãoa dor da professora vemao de cima: e
não tive coragemde voltara telefonar.Esmagadapelopesoe pelogritoclaroda revolta,digo.
Dizemosque aescoladeve seruma casa de humanidade.Refúgioúltimodosdeserdadosda
fortuna,dasvítimas da injustiça.Masteráde reinventarnosseusmodosde organização.Terá
de abdicar de ser umacadeia de montagem reguladaporumaordemfabril.E de ser regulada
pelaparafernáliadosexames.A escoladofuturoteránecessariamente de passarporesta
reinvenção.
Ou aindacomo nocaso da Marisa e da diretorade turma do 8º ano.Uma turma complexa.
Instabilidade que dificultavaacomunicaçãoe o entendimento.EntãoaDT decide inserir-se na
rede do facebook.Eatravésdeste suporte fica-se asaberque alunose professoresviviamem
mundosdiferentes. Elesliamuma escola. Nós,professores,tínhamoslido outra coisa. Ocaso
de Marisa: da incomunicaçãopara a comunicação. Percebia-se,então,como a intransigência
podeimpedir a possibilidadedeperscrutarumpouco maisadiante – lá onde,debaixo da
indisciplina,vive o sofrimento.Efoi assimque comecei a ver, quaseouvindo o grito,o pedido
de ajuda da Marisa quando escrevia,para mimecomeçava:STOOOOOOORA!
E a históriadas Vidas das famíliasemdesagregação. DaMarília que começoua chegar à escola
semos trabalhosde casa. Do Ricardoque começoua faltaràs primeirashorasdodia.Da
Andreiaque começouachegar à escolatriste,comolheiras,cansadae semas suas respostas
rápidase ágeisde sempre. DoBrunoque deixoude serumalunoregular.Da Julianaque
começoua faltar intermitentemente…Vidasemtransiçãodevidoaumprograma global de
ajustamentoestrutural impostopelossenhoresdocapital.Que é,agora,quemmaisordena.
E. As pessoasdosprofessores
E as pessoasdos professorestambém.Jáqui falamosde alguns. Maspodemosfalaraindada
professoramesmo fixeque nãose importaque a gente a ensine.Que trabalhacomosalunos
na horta escolare que bom grado aceitaserensinadapelosseusalunos.Eassimestabelece
uma rede de cumplicidade e de afetoque faznascera arte da ensinagem.
A professoraque decide oferecerum bolode aniversárioàVanessaque nuncanasua vidao
tinhatido.
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F. A hipocrisiaorganizada
Há, nestestextos,váriasevidênciasde umahipocrisiaorganizadaque nãopode deixarde ser
desmascarada.Neste prefácio,seja-me permitidodestacarduassituações,uma
particularmente dilacerante.
A primeiratem a vercom a destruiçãodosonhoda Teresa.Alunaexcecional que tinhaanota
máximaa todasas disciplinase que queriairparamedicina,Até que teve umacidente numa
aulade educaçãofísica.A 1ª e a 2ª operaçõescorrerammal.Ficoupara sempre incapacitada
do braço direito e jánão conseguiafazerlançamentossurpreendentes.Eagora o professor
classificava-acom13 porque educação física era uma disciplina como asoutrase quemnão
executano máximo não podeter o máximo. Este é umcaso de fronteira.Dilemático. Masesta
é sobretudo umahistóriade umapráticaescolarque esqueceuosentidodasuafinalidade e
que se enclausuranumaformalidade insustentável.
A outra históriatema vercom a escola a tempo inteiro. Todos os meninosnaescolaafazer
AtividadesdeEntreter Crianças(AEC). A passar tempo.A responderincessantemente ao what
is yourname,Carlos, quandoela(a professora) sabiaexatamenteque me chamavaCarlos.
Mãe,podesir lá falarcom ela? Podesirládizerque deve haverlimitesparao fazde conta?
Podesirlá dizerque maisvaleriamandar-nosparaorecreio?
G. O olhardo sujeitoque escreve
O olhar do sujeito que escreve está inundado de compaixão. Diria que é a compaixão que o
guia. E vem-me à memória uma passagem de um romance de Rosa Montero (História do rei
transparente) emque umapersonagemquerofereceraumasua amigaa melhordas palavras:
- Compaixão.Que, como sabes,é a capacidadedenos colocarmos na pela do próximo e de
com ele sentir o que ele sente.
- Sim, agrada-me. Mas por que me dizes que é a melhor?
- Porque é a única das grandes palavras em nome da qual não ferimos, na torturamos, não
prendemos e não matamos…. Pelo contrário, evita tudo isso. Há outras palavras muito
belas: amor, liberdade, honra, justiça… Mas todas elas, todas, podem ser manipuladas,
podem ser utilizadascomo armas dearremesso e causar vítimas.Por amor ao seu Deus, os
cruzados acendem piras, e por um amor aberrante, os amantes ciumentos matam as suas
amadas. Os nobres maltratam e abusam barbaramente dos seus servos em nome de uma
hipotética honra;a liberdadede uns pode significarprisão e morte para outros e, quanto à
justiça, todos julgam tê-la do seu lado, mesmo os tiranos mais cruéis. Só a compaixão
impede estes excessos; é uma ideia que não pode impor-se aos outros a ferro e fogo,
porque nos obriga a fazer justamente o contrário. Obriga-nos a aproximamo-nos dos
outros, a sentir o que sentem e a compreendê-los… Lembra-te desta palavra, minha Leola.
E, quando te lembrares, pensa também um pouco em mim.
É assimque vejoo olhar(e a escrita) daAngelina.Porque oque omove é a sede de justiça.A
defesadosmaisfracos,dosdeficientes,dosexcluídos,dosmaispobres.Oque amove é uma
ordemeducativamaisfraterna,maissensível,maispróxima.Oque move é a vontade de
denúnciadaindignidademesmoquandoelase desenhadentrodaclasse profissional aque
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pertence – comono triste caso dasTransgressões ouda Participação.Oque a move é uma
ordemmaiscolegial e colaborativaque alivie osofrimento e asolidãodosprofessorese lhes
confiraum sentidomaishumanoparaa ação. O que a move é liberdade de lutarcontraa
indiferençae a mesmice.
ComoMeirieupoderíamosafirmar: Amo a razão.Considero quea razão é um meio de
aumentara distância em relação à realidade,um instrumento crítico absolutamentenecessário
e essencial. No entanto,a razão não garantea fuga à barbárie.A garantia contra a barbárieé
a compaixão.
É a esta luz que euvejoa mão e o coração que escrevemestesmagníficostextos.Porque,
numtempoem que se celebraotriunfoda razão,é precisovisitaraemoçãoe valorizaruma
pedagogiadacompaixão.
Compaixão.Sofrercomosque sofrem.Alegrar-secomosque se alegram.Esperar(e
desesperar) comosque esperam.Sentir.Aspalavrasditas.Aspalavrasentreditas.Osilêncio.
Os olhares.Osgestos.
Há uma pedagogiadaemoçãoque é precisoredescobrirnotempodaarideztecnocrática.Há
uma pedagogiadacompaixão que é precisoacendernaescuridãodosformalismosestéreis.Na
selvadacompetição.Naangústiadosexames,dasprovasglobais,doacessoao ensino
superior. Noacessoa coisanenhuma.
Há uma comunidade de afetosaconstruirno impériosombriodasregras burocráticosque
decretama igualdade formal e aexcelênciadassoluçõesuniversais.
São estasas liçõesde umavidae de um livro.Que pelaminhaparte procurarei seguir. Termino
com a referênciaantológicade Pierre Bourdieu:
Ensinarnão é umaactividade comoas outras.Poucasprofissõesserão
causas de riscostão gravescomo os que os maus professoresfazem
correr aos alunosque lhessãoconfiados.Poucasprofissõessupõem
tantas virtudes,generosidade,dedicaçãoe,acimade tudo,talvez
entusiasmoe desinteresse.Sóumapolíticainspiradapelapreocupação
de atrair e de promoverosmelhores,esseshomense mulheresde
qualidade que todosossistemasde educaçãosempre celebraram,
poderáfazerdo ofíciode educadorda juventude oque ele deveriaser,o
primeirode todososofícios.
Angelinasabiaistomuitobem. Porissodedicoutodaasua vidae grande parte da sua
produçãoescritaa lutarpara que o ensino,aeducaçãoe a escolafosse o lugardo
cumprimentodaspromessasde humanidade.Porissolhe estamosgratosporcontinuaraser
uma referênciasingular.