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Carta Aberta
             de Sara Fidalgo
(Filha de uma Professora que não aguentou mais)




                           Avanço manual
Não sei se souberam de uma professora, em
Espinho, que se suicidou. Trabalhava na Sá Couto.
Tinha 55 anos e o marido é comentador na RTP1.
Envio-vos agora a carta da filha dela, para lerem.
Para os que são pais, mães ou filhos, alunos ou
professores, ou apenas pessoas, vale a pena ler e
pensar um bocadinho.
Ao nosso lado pode tantas vezes alguém que se
debate com um desespero que não vemos. Vamos
olhar mais uns para os outros? Uns pelos outros?
Carta a professores, alunos, pais, governantes,
cidadãos e quaisquer outros que possam sentir-se
tocados e identificados.
por Sara Fidalgo
Sexta-feira, 9 de Março de 2012 às 11:21·
As reformas na educação estão na boca do
 mundo há mais anos do que os que conseguimos
  recordar, chegando ao ponto de nem sabermos
      como começaram, nem de onde vieram.
Confessando, sou apenas uma das que passou das
   aulas de uma hora para as aulas de noventa
    minutos e achei aquilo um disparate total.
  Tirava-nos intervalos, tirava-nos momentos de
 caçadinhas e de saltar à corda e obrigava-nos a
estar mais tempo sentados a ouvir sobre reis, rios,
     palavras estrangeiras e números primos.
Depois veio o secundário e deixámos de ter
“folgas” porque passou a haver professores que
  tinham que substituir os que faltavam e nós
     ficávamos tristes. Não era porque não
 queríamos aprender, era porque as “aulas de
  substituição” nos cansavam mais do que as
   outras. Os professores não nos conheciam,
 abusávamos deles e era como voltar ao zero.
  Eu era pequenina. E nunca me passou pela
 cabeça pensar no lado dos professores.
            Até ao dia 1 de Março.
Foi o culminar de tudo. Durante semanas e
  semanas ouvi a minha mãe, uma das melhores
 professoras de Inglês que conheci, o meu pilar, a
 minha luz, a minha companhia, a encher a boca
séria com a palavra “depressão”. A seguir vinham
 os tremores, as preocupações, as queixas de pais,
   as crianças a quem não conseguimos chamar
   crianças, porque são tão indisciplinadas que
  parece que lhes falta a meninice. Acreditem ou
 não, há pais que não sabem o que estão a criar.
Como dizia um amigo meu: “Antigamente,
      fazíamos asneiras na escola e quando
chegávamos a casa levávamos uma chapada do
   nosso pai ou da mãe. Hoje, os miúdos fazem
 asneiras e os pais vão à escola para dar a dita
chapada nos professores”. Sim, nos professores.
Aqueles que tomam conta de tantos filhos cujos
    pais não têm tempo nem paciência para os
  educar. Sim, os professores que fazem de nós
 adultos competentes, formados, civilizados.
    Ou faziam, porque agora não conseguem.
A minha mãe levou a maior chapada de todas e
  não resistiu. Desculpem o dramatismo, mas a
escola, o sistema educativo, a educação especial,
 a educação sexual, as provas de aferição, e toda
  aquela enormidade de coisas que não consigo
sequer enumerar, levaram deste mundo uma das
melhores pessoas que por cá andou.
  E revolta-me não conseguir fazer-lhe justiça.
Professores e responsáveis pela educação, espero
     que leiam isto e acordem, revoltem-se,
       manifestem-se (ainda mais) mas…
… sobretudo, e acima de qualquer outra coisa,
 conversem e ajudem-se uns aos outros. Levem a
 história da minha mãe para as bocas do mundo,
 para as conversas na sala dos professores e nos
intervalos, a história de uma mulher maravilhosa
    que se suicidou, não por causa de uma vida
      instável, não por causa de uma família
desestruturada, não por dificuldades económicas,
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  um trabalho que amava, ao qual se dedicou de
         alma e coração durante 36 anos.
De todos os problemas que a minha mãe teve no
trabalho, desde que me conheço (todos os temos,
   todos os conhecemos), nunca ouvi a palavra
   “incapaz” sair da boca dela. Nunca a vi tão
    indefesa, nunca a conheci como desistente,
 nunca pensei ouvir “ando a enganar-me a mim
     mesma e não sei ser professora”. Mas era
      verdade. Ela soube. Ela foi. Ela ensinou
  centenas de crianças, ela riu, ela fez o pino no
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       a giz e depois em quadros eletrónicos.
Ela aprendeu as novas tecnologias. O que ela
 não aprendeu foi a suportar a carga imensa e
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 sem sentido rigorosamente nenhum.
       Eu, pelo menos, não o consigo ver.
    E, assim, me manifesto contra toda esta
 gentinha que desvaloriza os professores mais
velhos, que os destrói e os obriga a adaptarem-
 se a uma realidade que nunca conheceram. E
  tudo isto de um momento para o outro, sem
    qualquer tipo de preparação ou ajuda.
Esta, sim, é a minha maneira de me revoltar
 contra aquilo que a minha mãe não teve forças
  para combater. Quem me dera ter conseguido
  aliviá-la, tirar-lhe aquela carga estupidamente
  pesada e que ninguém, a não ser quem a vive,
compreende. Eu vivi através dela e nunca cheguei
      a compreender. Professores, ajudem-se.
 Conversem. E, acima de tudo, não deixem que a
educação seja um fardo, em vez de ser a profissão
      que vocês escolheram com tanto amor.
Pensem no amor. E, com ele,
honrem a vida maravilhosa que
  a minha mãe teve, até não
         poder mais.
                 Sara Fidalgo

P.S. - Não posso deixar de agradecer a todos os
  que nos ajudaram neste momento de dor*
 M  edita e divulga
    T um dia fantástico e
      em
              especial.
                   -
quarta-feira, 13 de idalgo
Autoria do texto: Sara Ffevereiro de 2
Recebido por e-mail- Isi Graça
                     de:
 M úsica : Leaves in the winter
(Ernesto Cortazar)

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  • 1. Carta Aberta de Sara Fidalgo (Filha de uma Professora que não aguentou mais) Avanço manual
  • 2. Não sei se souberam de uma professora, em Espinho, que se suicidou. Trabalhava na Sá Couto. Tinha 55 anos e o marido é comentador na RTP1. Envio-vos agora a carta da filha dela, para lerem. Para os que são pais, mães ou filhos, alunos ou professores, ou apenas pessoas, vale a pena ler e pensar um bocadinho. Ao nosso lado pode tantas vezes alguém que se debate com um desespero que não vemos. Vamos olhar mais uns para os outros? Uns pelos outros?
  • 3. Carta a professores, alunos, pais, governantes, cidadãos e quaisquer outros que possam sentir-se tocados e identificados. por Sara Fidalgo Sexta-feira, 9 de Março de 2012 às 11:21·
  • 4. As reformas na educação estão na boca do mundo há mais anos do que os que conseguimos recordar, chegando ao ponto de nem sabermos como começaram, nem de onde vieram. Confessando, sou apenas uma das que passou das aulas de uma hora para as aulas de noventa minutos e achei aquilo um disparate total. Tirava-nos intervalos, tirava-nos momentos de caçadinhas e de saltar à corda e obrigava-nos a estar mais tempo sentados a ouvir sobre reis, rios, palavras estrangeiras e números primos.
  • 5. Depois veio o secundário e deixámos de ter “folgas” porque passou a haver professores que tinham que substituir os que faltavam e nós ficávamos tristes. Não era porque não queríamos aprender, era porque as “aulas de substituição” nos cansavam mais do que as outras. Os professores não nos conheciam, abusávamos deles e era como voltar ao zero. Eu era pequenina. E nunca me passou pela cabeça pensar no lado dos professores. Até ao dia 1 de Março.
  • 6. Foi o culminar de tudo. Durante semanas e semanas ouvi a minha mãe, uma das melhores professoras de Inglês que conheci, o meu pilar, a minha luz, a minha companhia, a encher a boca séria com a palavra “depressão”. A seguir vinham os tremores, as preocupações, as queixas de pais, as crianças a quem não conseguimos chamar crianças, porque são tão indisciplinadas que parece que lhes falta a meninice. Acreditem ou não, há pais que não sabem o que estão a criar.
  • 7. Como dizia um amigo meu: “Antigamente, fazíamos asneiras na escola e quando chegávamos a casa levávamos uma chapada do nosso pai ou da mãe. Hoje, os miúdos fazem asneiras e os pais vão à escola para dar a dita chapada nos professores”. Sim, nos professores. Aqueles que tomam conta de tantos filhos cujos pais não têm tempo nem paciência para os educar. Sim, os professores que fazem de nós adultos competentes, formados, civilizados. Ou faziam, porque agora não conseguem.
  • 8. A minha mãe levou a maior chapada de todas e não resistiu. Desculpem o dramatismo, mas a escola, o sistema educativo, a educação especial, a educação sexual, as provas de aferição, e toda aquela enormidade de coisas que não consigo sequer enumerar, levaram deste mundo uma das melhores pessoas que por cá andou. E revolta-me não conseguir fazer-lhe justiça. Professores e responsáveis pela educação, espero que leiam isto e acordem, revoltem-se, manifestem-se (ainda mais) mas…
  • 9. … sobretudo, e acima de qualquer outra coisa, conversem e ajudem-se uns aos outros. Levem a história da minha mãe para as bocas do mundo, para as conversas na sala dos professores e nos intervalos, a história de uma mulher maravilhosa que se suicidou, não por causa de uma vida instável, não por causa de uma família desestruturada, não por dificuldades económicas, não por desgostos amorosos, mas por causa de um trabalho que amava, ao qual se dedicou de alma e coração durante 36 anos.
  • 10. De todos os problemas que a minha mãe teve no trabalho, desde que me conheço (todos os temos, todos os conhecemos), nunca ouvi a palavra “incapaz” sair da boca dela. Nunca a vi tão indefesa, nunca a conheci como desistente, nunca pensei ouvir “ando a enganar-me a mim mesma e não sei ser professora”. Mas era verdade. Ela soube. Ela foi. Ela ensinou centenas de crianças, ela riu, ela fez o pino no meio da sala de aulas, ela escreveu em quadros a giz e depois em quadros eletrónicos.
  • 11. Ela aprendeu as novas tecnologias. O que ela não aprendeu foi a suportar a carga imensa e descabida que lhe puseram sobre os ombros, sem sentido rigorosamente nenhum. Eu, pelo menos, não o consigo ver. E, assim, me manifesto contra toda esta gentinha que desvaloriza os professores mais velhos, que os destrói e os obriga a adaptarem- se a uma realidade que nunca conheceram. E tudo isto de um momento para o outro, sem qualquer tipo de preparação ou ajuda.
  • 12. Esta, sim, é a minha maneira de me revoltar contra aquilo que a minha mãe não teve forças para combater. Quem me dera ter conseguido aliviá-la, tirar-lhe aquela carga estupidamente pesada e que ninguém, a não ser quem a vive, compreende. Eu vivi através dela e nunca cheguei a compreender. Professores, ajudem-se. Conversem. E, acima de tudo, não deixem que a educação seja um fardo, em vez de ser a profissão que vocês escolheram com tanto amor.
  • 13. Pensem no amor. E, com ele, honrem a vida maravilhosa que a minha mãe teve, até não poder mais. Sara Fidalgo P.S. - Não posso deixar de agradecer a todos os que nos ajudaram neste momento de dor*
  • 14.  M edita e divulga  T um dia fantástico e em especial. - quarta-feira, 13 de idalgo Autoria do texto: Sara Ffevereiro de 2 Recebido por e-mail- Isi Graça de: M úsica : Leaves in the winter (Ernesto Cortazar)