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(Des)Agregações

Fui hoje à escola sede de um agrupamento de escolas que conheço bem e ao qual tenho
estado ligada, por razões de investigação, desde 2011. Esta escola abriu-me as portas para que
pudesse ver, sentir e compreender modos de organização escolar alternativos, com vista à
promoção da melhoria das aprendizagens nos alunos. Estive na escola. Conheci espaços e
tempos de aprendizagem. Falei com professores, alunos, funcionários, lideranças,
coordenadores de projetos. E, durante esse tempo, observei, registei, fotografei, gravei,
relacionei, refleti. Mas, acima de tudo, entusiasmei-me… Com o que vi, senti e compreendi.

Vi uma escola dinâmica, coesa, com uma cultura organizacional voltada para a inovação e para
a superação de obstáculos.

Vi lideranças pedagógicas, transformacionais, capazes de manter o foco da escola nas
aprendizagens dos alunos.

Vi professores empenhados, a trabalhar em conjunto pela qualidade das aprendizagens dos
seus alunos.

Vi alunos felizes, a participar, de forma ativa e criativa na construção do seu próprio
conhecimento.

Vi alunos diferentes a aprender de formas diferentes, em espaços e tempos diferentes, com
professores diferentes.

Vi igualdade na diversidade.

Vi projetos em desenvolvimento, outros em emergência. Vi comunidade educativa.

Vi uma escola inclusiva, cujo lema ‘Querer para poder’ se respirava. Sim. Esta escola queria. E
sim. Esta escola podia.

Senti o que sentia aquela comunidade escolar.

Senti o que sentiam aqueles professores e aqueles alunos.

Senti o prazer de aprender. O prazer de fazer aprender. O prazer de criar, recriar,
experimentar. O prazer de pensar. O prazer de uma autoria partilhada. O prazer de ser e fazer
comunidade.

Compreendi que, de facto, onde há vontade há caminhos. E essa vontade tão viva advinha do
sentimento generalizado de fazer parte de um projeto educativo comum, coeso, construído e
reconstruído por aqueles que diariamente fazem a escola.

Hoje voltei a essa escola, para fechar o trabalho que estou a desenvolver. E o que vi foi
interpelante, porque confrangedor.

Quando cheguei, os professores preparavam-se para iniciar uma reunião geral extraordinária
na qual seria abordada a notícia da nova agregação, a quarta desde 2002… O ambiente era de
tensão. Vi e senti o desânimo, a frustração, a desilusão, a fragmentação, os anseios, o
desnorte… Os mesmos professores que, há meses, se envolviam com entusiasmo e trabalho
árduo na vida escolar, fazendo da escola um locus de aprendizagens diversificadas,
estimulantes e integradoras encontravam-se, agora, rendidos. Rendidos a uma realidade que
lhes é imposta, sob a falsa pretensão da racionalidade organizacional e pedagógica. Perdidos.
Receando pelo seu futuro, pelo futuro dos seus projetos, nos quais investiram, nos quais
acreditaram. Receando pelos seus alunos, que parecem vogar ao sabor das políticas
educativas. A escola que vi hoje não era a mesma de há uns meses. E não voltará,
definitivamente, a ser a mesma escola.

É impossível ficar indiferente a esta lógica de desautorização e desrespeito pelas escolas, pelos
professores e pelos alunos. À destruição de culturas organizacionais e de projetos que levaram
anos a ser pensados, repensados e implementados. A esta visão meramente tecnicista e
inconsequente da educação.

Não podemos, simplesmente, ignorar. Fazer de conta que a política de agregação de escolas
que está a ser seguida não vai ter efeitos catastróficos nas nossas escolas. Nas suas dinâmicas.
Na manutenção das suas identidades. Nos nossos alunos. Nas suas aprendizagens. Nas suas
vidas.



Que caminhos para o futuro?

Num tempo de desilusão, de frustração, de desânimo, em que tudo parece ruir à nossa volta, a
única solução é reforçar as dinâmicas de identidade das escolas. Apostando no
desenvolvimento profissional e organizacional. Construindo pontes. Unindo forças.
Respeitando a diferença e valorizando a riqueza que pode advir dessa diferença. Conhecendo e
reconhecendo. Aprendendo a confiar. Superando obstáculos. Recriando. Trabalhando,
colaborativamente, em prol do desenvolvimento de dinâmicas capazes de produzir impactos
diretos nas aprendizagens dos nossos alunos. Agindo. Reagindo. Só assim poderemos desviar-
nos da rota que alguém traçou por nós e que não queremos seguir.

Eu acredito que é possível. Mas temos que erguer a nossa voz. E temos que(re)agir… agora!



iv

23-05-12

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  • 1. (Des)Agregações Fui hoje à escola sede de um agrupamento de escolas que conheço bem e ao qual tenho estado ligada, por razões de investigação, desde 2011. Esta escola abriu-me as portas para que pudesse ver, sentir e compreender modos de organização escolar alternativos, com vista à promoção da melhoria das aprendizagens nos alunos. Estive na escola. Conheci espaços e tempos de aprendizagem. Falei com professores, alunos, funcionários, lideranças, coordenadores de projetos. E, durante esse tempo, observei, registei, fotografei, gravei, relacionei, refleti. Mas, acima de tudo, entusiasmei-me… Com o que vi, senti e compreendi. Vi uma escola dinâmica, coesa, com uma cultura organizacional voltada para a inovação e para a superação de obstáculos. Vi lideranças pedagógicas, transformacionais, capazes de manter o foco da escola nas aprendizagens dos alunos. Vi professores empenhados, a trabalhar em conjunto pela qualidade das aprendizagens dos seus alunos. Vi alunos felizes, a participar, de forma ativa e criativa na construção do seu próprio conhecimento. Vi alunos diferentes a aprender de formas diferentes, em espaços e tempos diferentes, com professores diferentes. Vi igualdade na diversidade. Vi projetos em desenvolvimento, outros em emergência. Vi comunidade educativa. Vi uma escola inclusiva, cujo lema ‘Querer para poder’ se respirava. Sim. Esta escola queria. E sim. Esta escola podia. Senti o que sentia aquela comunidade escolar. Senti o que sentiam aqueles professores e aqueles alunos. Senti o prazer de aprender. O prazer de fazer aprender. O prazer de criar, recriar, experimentar. O prazer de pensar. O prazer de uma autoria partilhada. O prazer de ser e fazer comunidade. Compreendi que, de facto, onde há vontade há caminhos. E essa vontade tão viva advinha do sentimento generalizado de fazer parte de um projeto educativo comum, coeso, construído e reconstruído por aqueles que diariamente fazem a escola. Hoje voltei a essa escola, para fechar o trabalho que estou a desenvolver. E o que vi foi interpelante, porque confrangedor. Quando cheguei, os professores preparavam-se para iniciar uma reunião geral extraordinária na qual seria abordada a notícia da nova agregação, a quarta desde 2002… O ambiente era de tensão. Vi e senti o desânimo, a frustração, a desilusão, a fragmentação, os anseios, o
  • 2. desnorte… Os mesmos professores que, há meses, se envolviam com entusiasmo e trabalho árduo na vida escolar, fazendo da escola um locus de aprendizagens diversificadas, estimulantes e integradoras encontravam-se, agora, rendidos. Rendidos a uma realidade que lhes é imposta, sob a falsa pretensão da racionalidade organizacional e pedagógica. Perdidos. Receando pelo seu futuro, pelo futuro dos seus projetos, nos quais investiram, nos quais acreditaram. Receando pelos seus alunos, que parecem vogar ao sabor das políticas educativas. A escola que vi hoje não era a mesma de há uns meses. E não voltará, definitivamente, a ser a mesma escola. É impossível ficar indiferente a esta lógica de desautorização e desrespeito pelas escolas, pelos professores e pelos alunos. À destruição de culturas organizacionais e de projetos que levaram anos a ser pensados, repensados e implementados. A esta visão meramente tecnicista e inconsequente da educação. Não podemos, simplesmente, ignorar. Fazer de conta que a política de agregação de escolas que está a ser seguida não vai ter efeitos catastróficos nas nossas escolas. Nas suas dinâmicas. Na manutenção das suas identidades. Nos nossos alunos. Nas suas aprendizagens. Nas suas vidas. Que caminhos para o futuro? Num tempo de desilusão, de frustração, de desânimo, em que tudo parece ruir à nossa volta, a única solução é reforçar as dinâmicas de identidade das escolas. Apostando no desenvolvimento profissional e organizacional. Construindo pontes. Unindo forças. Respeitando a diferença e valorizando a riqueza que pode advir dessa diferença. Conhecendo e reconhecendo. Aprendendo a confiar. Superando obstáculos. Recriando. Trabalhando, colaborativamente, em prol do desenvolvimento de dinâmicas capazes de produzir impactos diretos nas aprendizagens dos nossos alunos. Agindo. Reagindo. Só assim poderemos desviar- nos da rota que alguém traçou por nós e que não queremos seguir. Eu acredito que é possível. Mas temos que erguer a nossa voz. E temos que(re)agir… agora! iv 23-05-12