O documento discute o uso da história "A Casa Sonolenta" para ensinar matemática na educação infantil e anos iniciais do ensino fundamental. Ele descreve como a história apresenta padrões e regularidades através da repetição das cenas que podem ajudar as crianças a aprender matemática de forma significativa. O autor também relata sua experiência contando a história para uma turma e observando como as crianças aprenderam sobre padrões e resolução de problemas.
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A casa sonolenta
1. II SEMINÁRIO DE ESCRITAS E LEITURAS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA (II SELEM)
A CASA SONOLENTA:
CONTANDO HISTÓRIA E OBSERVANDO REGULARIDADES
Simone T. Ferrarezi
Universidade São Francisco
psasimone@uol.com.br
Resumo
O texto a seguir tem a intenção de apresentar as potencialidades da contação de histórias,
neste caso específico “A Casa Sonolenta”, para o ensino de matemática na pré-escola e anos
iniciais do Ensino Fundamental. Buscou-se, a partir da história,apresentar a criança ao mundo
da matemática, ao observar padrões e regularidades a fim de ajudar os alunos a aprender uma
matemática significativa.
“A Casa Sonolenta” foi escrita por Audrey Wood e ilustrada por seu marido Don
Wood em 2009.
A escolha desta história se deu justamente pela regularidade de acontecimentos em
que é possível identificar um padrão de repetição e claro por ser uma história que agrada e
encanta.
Para Vale, Palhares, Cabrita e Borralho (2006) quando usamos o termo padrão,
pensamos em padrões visuais como os que se vêem em tecidos, peças de arte etc. Para estes
autores o termo padrão é usado quando nos referimos a uma disposição ou arranjo de
números, formas, cores ou sons onde se detectam regularidades. E mais podemos inferir que
ao conceito de padrão estão associados termos tais como: regularidades, sequência, motivo,
regra e ordem.
Meu primeiro movimento após a escolha da história foi confeccionar a “casa”, fiz
sozinha, quero dizer, sem a ajuda das crianças, pois queria contar a história e não fazer uma
sequência didática, pois a intenção era primeiramente a matemática. Usei materiais simples:
uma caixa de sapatos, filtro de café usado para encapar, dentro materiais reutilizáveis.
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Descrevo a seguir um exemplo de sequência de ensino desenvolvida:
1º momento: apresentar a história, narrá-la, apresentar a capa (com perguntas sobre o
quê se vê nela), tempo para expressar sentimentos, manuseio do livro, observação de
imagens.
2º momento: construção da casa sonolenta utilizando técnicas variadas, pintura desta
casa de acordo com as imagens do livro, o mesmo sendo feito com a mobília da casa.
3º momento, matemática: construção de gráficos e tabelas, contagem do número de
pessoas e animais na história, registros e dobraduras.
4º momento, informática: levar as crianças à sala de informática e apresentar o vídeo
da história que pode ser baixado do youtube.
5º momento: colocar os personagens na caixa, que poderão ser brinquedos trazidos
de casa ou confeccionados na escola.
6º momento: as crianças contam a história.
7º momento ou final: produção de um texto.
Fiz esta descrição não a fim de menosprezar qualquer ação didática, mas por
acreditar poder apresentar outros caminhos, talvez não tão conhecidos, mas possíveis.
O Referencial Curricular Nacional para Educação Infantil (RCNEI), afirma que são muitas
asformas possíveis de se realizar o trabalho com a Matemática nessa faixa etária, mas
elesempre deve acontecer inserido e integrado no cotidiano das crianças. A contação de
história é uma prática bastante difundida entre professores, portanto devemos fazer uso dela
de maneira que possa enriquecer este momento.
Podemos usar o momento de contar histórias para irmos além da recreação. Por meio
delas podemos enriquecer as experiências infantis, oferecendovariadas formas de linguagem,
introduzir um tema para discussão, discutir temas sensíveis, proporcionando à criança
vivenciar o faz-de-conta.
As histórias estimulam o desenvolvimento de funções cognitivas importantes para o
pensamento, tais como a comparação, o pensamento hipotético, o raciocínio lógico,
pensamento divergente ou convergente, as relações espaciais e temporais (toda história tem
princípio, meio e fim).
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Lê-se no RCNEI que são muitas as possibilidades de a criança investigar as regras e
as regularidades dosistema numérico. A proposta deste documento para a contação de
histórias na Matemática está restrita em ler para as crianças o número das páginas. O
documento sugere que o professor ao ler histórias para as crianças, pode incluir a leitura do
índice e danumeração das páginas, organizando a situação de tal maneira que todos possam
participar. Outra sugestão são as históriasem capítulos, coletâneas e enciclopédias por terem
índice.
Porém não encontrei no RCNEImenções acerca de padrões e regularidades.Nosso
objetivo era,por meio da contação de histórias, mais especificamente da Casa Sonolenta,
apresentar esses padrões e regularidades através da repetição das cenas (em cima de alguém,
tinha outro alguém ...numa casa sonolenta onde todos viviam dormindo...).
Mas, porque padrões e álgebra para o pré-escolar?
Em primeiro lugar porquea criança tem contato com a matemática desde seu
nascimento e a partir desse momento, ela se insere numa sociedade da qual osnúmeros e o
espaço fazem parte. Porém ao entrar na escola ela passa a ter contato com outra forma de
aprender, diferente daquela do convívio familiar, à qual estava costumada.
Orton (1999 apud VALE, PALHARES, CABRITA E BORRALHO, 2006) sugere
que o trabalho com padrões pode contribuir para a construção de uma imagem positiva da
Matemática; permite o estabelecimento de conexões matemáticas; atrai o aluno, porque apela
para seu senso estético e sua criatividade; permite a promoção e o desenvolvimento das
capacidades e competências dos alunos; ajuda a desenvolver a capacidade de classificar e
ordenar informação e principalmente permite a compreensão da ligação entre a Matemática e
o mundo em que se vive.
Outro aspecto importante ligado aos padrões é a resolução de problemas, uma vez
que a descoberta de um padrão é uma poderosa estratégia na resolução de problemas. (Vale,
Palhares, Cabrita e Borralho, 2006).
Threlfall (1999apud VALE, PALHARES, CABRITA E BORRALHO, 2006),
defende que além de ser possível desenvolver o raciocínio lógico através da introdução dos
padrões na Educação Infantil, existem mais duas razões para se introduzir padrões de
repetição. A primeira é que estes padrões funcionam como uma base familiar concreta para
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exploração de outros conteúdos e a segunda é que o trabalho com padrões de repetição
servirá, no futuro, de suporte para a aprendizagem da álgebra ou para a introdução de
símbolos.
Portanto, conclui o autor, que os padrões no pré-escolar servem de imediato ao
desenvolvimento do raciocínio lógico, em seguida a propósitos laterais de exploração de
outros conteúdos e propósitos de criação de uma base para futura aprendizagem da álgebra.
De acordo com o RCNEI vários tipos de brincadeiras e jogos que possam interessar à
criança pequenaconstituem-se rico contexto em que ideias matemáticas podem ser
evidenciadas pelo adultopor meio de perguntas, observações e formulação de propostas. São
exemplos disso cantigas,brincadeiras como a dança das cadeiras, quebra-cabeças, labirintos,
dominós, dados dediferentes tipos, jogos de encaixe, jogos de cartas etc.
Acrescentaremos a isso a contação de histórias por acreditarmos ser este um caminho
possível, mas não contar como passa tempo.O bom contador de histórias necessita se preparar
para esta atividade, para isso não é necessário ter um dom especial, como algumas pessoas
possam acreditar, mas é necessário sensibilidade, criatividade e o desejo de encantar.
Sugiro um conhecimento antecipado do texto mesmo que ele seja escrito, eletrônico
ou imagético. Observe os elementos que o compõe, familiarize-se com os personagens. Haja
naturalmente, não omita palavras difíceis, evite o linguajar no diminutivo (livrinho,
musiquinha etc.), procure não utilizar a história para corrigir comportamentos ou para lições
de moral. Escolha um texto que lhe dê prazer, assim poderá transmiti-lo com prazer.
Ouvir uma história, ter uma experiência literária, vai além do simples arquivamento
da informação, o que nem sempre é imediatamente traduzido para o ouvinte. Devemos evitar
obrigar a criança a transformar a experiência que este momento proporcionou em outra coisa,
em outros produtos artísticos (desenhos, resumos etc.).
De acordo com Sisto (2012), na medida em que se familiarizam com a arte, a arte da
palavra, a arte do contar, no caso mais específico: a literatura, as crianças vão percebendoos
elementos estéticos, os elementos que fazem daquele “objeto” um objetode arte. Elas também
vão, desde cedo, criando critérios de valoração, de comparação, de classificação, de fruição
(o prazerde ouvir; o prazer de ter contato com uma história bonita e bem contada; oprazer de
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ver imagens instigantes nos livros etc. A convivência efamiliaridade com a arte faz surgir a
necessidade de torná-la cada vez maispresente no cotidiano, no dia-a-dia, na vida.
Entendo que contar histórias seja um caminho possível para a inserção da criança no
mundo letrado que faz parte da escola, como educadores é nosso dever oportunizar o contato
das crianças com obras de arte, neste caso, a literatura. Este contato educa num sentido mais
amplo, educa para a escuta coletiva, para regras de convivência, para a percepção de
igualdades e diferenças, para o uso da emoção, para diversidade e para constatação dos usos
do tempo e do espaço.
Podemos dizer ainda que as crianças que têm contato com histórias desenvolvem um
saudável exercício de cidadania, aguçam a imaginação, a criatividade, suacapacidade
dediscernimento e crítica, levando as crianças a assumirem um protagonismo de suas vidas.
A seguir relato a experiência com “A casa sonolenta”.
Era uma vez
uma casa sonolenta
onde todos viviam dormindo
Nessa casa
tinha uma cama
uma cama aconchegante,
numa casa sonolenta,
onde todos viviam dormindo.
Nessa cama
tinha uma avó,
uma avó roncando,
numa cama aconchegante,
numa casa sonolenta,
onde todos viviam dormindo.
Em cima dessa avó
tinha um menino,
um menino sonhando,
em cima de uma avó roncando,
numa cama aconchegante,
numa casa sonolenta,
onde todos viviam dormindo.
Em cima desse menino
tinha um cachorro,
um cachorro cochilando,
Em cima desse cachorro tinha um gato
um gato ressonando,
em cima de um cachorro cochilando,
em cima de um menino sonhando,
em cima de uma avó roncando,
numa cama aconchegante,
numa casa sonolenta,
onde todos viviam dormindo.
Em cima desse gato
tinha um rato,
um rato dormitando,
em cima de um gato ressonando,
em cima de um cachorro cochilando,
em cima de um menino sonhando,
em cima de uma avó roncando,
numa cama aconchegante,
numa casa sonolenta,
onde todos viviam dormindo.
E em cima desse rato
tinha uma pulga...
Será possível?
Uma pulga acordada,
que picou o rato,
que assustou o gato,
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em cima de um menino sonhando,
em cima de uma avó roncando,
numa cama aconchegante,
numa casa sonolenta,
onde todos viviam dormindo.
que arranhou o cachorro,
que caiu sobre o menino,
que deu um susto na avó,
que quebrou a cama,
numa casa sonolenta,
onde ninguém mais estava dormindo.
7. II SEMINÁRIO DE ESCRITAS E LEITURAS EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA (II SELEM)
Como já mencionei anteriormente confeccionei a casa com uma caixa de sapatos,
encapada com filtro de café, os utensílios da casa são brinquedos que minha filha já não
brincava mais e os personagens fiz com E.V.A. O tecido é um retalho.
Sempre que conto esta história para uma nova turma não mostro o livro, deixo que
eles se apropriem deste momento com toda a ludicidade que ele contém.
O desenvolvimento é bem simples, as crianças se sentam à minha frente, em meio
círculo, de maneira que todos possam ver os movimentos da história.
“Era uma vez uma casa sonolenta onde todos viviam dormindo” é o momento de
abrir a caixa. “Nessa casa tinha uma cama, uma cama aconchegante”, acomodo a cama. E
então com o desenrolar da história vou movimentando os personagens.
Este é uma atividade que envolve não apenas as crianças, mas também jovens e
adultos, afirmo isto por já ter vivenciado estes vários momentos.
Com as crianças da Educação Infantil, por exemplo, após contar a história as deixo
brincar um pouco com a casa e eles terminam por recontar a história, seguindo a sequência
dos personagens na cama, eles também se preocupam com as falas: roncando, sonhando,
cochilando, ressonando, dormitando e assustou, arranhou, caiu e deu um susto. Enxergamos
aqui as regularidades e a resolução de problemas.
Considerações Finais
Iniciei este relato escrevendo que a intenção era a partir da história, apresentar a
criança ao mundo da matemática, ao observar padrões e regularidades com a intenção de
ajudar os alunos a aprenderem uma matemática significativa.
Contei “a casa sonolenta” para uma turma do primeiro ano no começo do ano letivo.
No início do segundo semestre recontei a história, porém troquei a ordem entre o cachorro, o
gato e o rato. Quando terminei de contar, algumas crianças me questionaram porque eu havia
“errado” a ordem, pedi então que eles me ajudassem a ordenar as coisas.
Foi possível perceber neste momento o quanto eles estabeleceram relações,
desenvolveram a capacidade de classificar e ordenar informações e se dispuseram a resolver
um problema, e principalmente fizeram matemática de uma maneira saudável e prazerosa.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. REFERENCIAL CURRICULAR NACIONAL PARA A EDUCAÇÃO
INFANTIL.Ministério da Educação e do Desporto, Secretaria de EducaçãoFundamental. —
Brasília: MEC/SEF, 1998. Volume 3: Conhecimento de mundo.
Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/volume3.pdf
SISTO, Celso. A ARTE DE CONTAR HISTÓRIAS E SUA IMPORTÂNCIA
NODESENVOLVIMENTO INFANTIL.
Disponível em: http://www.artistasgauchos.com.br/celso/ensaios/artecontarhist.pdf
VALE, Isabel; PALHARES, Pedro; CABRITA, Isabel; BORRALHO, Antônio. NÚMEROS
E ÁLGEBRA. Na aprendizagem da matemática e na formação de professores. Os padrões no
Ensino e Aprendizagem da Álgebra. Sociedade Portuguesa de Ciências da Educação. Secção
de Educação Matemática. 2006