O documento trata de um processo eleitoral julgando conjuntamente os pedidos de registro de candidatura de um candidato a prefeito e seu vice. A chapa foi impugnada sob a alegação de inelegibilidade do candidato a prefeito. O juiz decidiu que, embora o candidato tenha condenações criminais, uma liminar suspendeu os efeitos de uma delas para fins eleitorais, impedindo o indeferimento do registro.
Mapa de circulação proibição de giros rua 13 de maio e rua dos palmares
Registro de candidatura indeferido por inelegibilidade
1. TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL
ESTADO DE PERNAMBUCO
CARTÓRIO ELEITORAL DA 37a. ZONA - PALMARES-PE
SENTENÇA
PROCESSOS Nº 025-02.2012 e 26-84.2012 – REGISTROS DE CANDIDATURA / IMPUGNAÇÕES
REQUERENTE: Coligação “Palmares, Força, Trabalho e Determinação”
IIMPUGNANTE: Coligação “Frente Popular de Palmares”
IMPUGNADO: José Bartolomeu de Almeida Melo
EMENTA: ELEITORAL. REGISTRO DE
CANDIDATURA. PREFEITO E VICE-PREFEITO.
JULGAMENTO CONJUNTO. IMPUGNAÇÃO DO
CANDIDATO A PREFEITO. LEI DA FICHA LIMPA.
APLICAÇÃO A FATOS PASSADOS.
INELEGIBILIDADE DECORRENTE DE ABUSO DE
PODER ECONÔMICO NAS ELEIÇÕES DE 2004.
TRÂNSITO EM JULGADO. PROCEDÊNCIA DA
IMPUGNAÇÃO E INDEFERIMENTO DO REGISTRO.
CHAPA MAJORITÁRIA NÃO APTA (ART. 50,
RESOLUÇÃO 23.373 TSE).
1. A LC 135/10 deu nova redação à LC 64/90,
instituindo outras hipóteses de inelegibilidade
voltadas à proteção da probidade e moralidade
administrativas no exercício do mandato, nos
termos do parágrafo 9º do artigo 14 da
Constituição Federal.
2. Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF),
concluindo análise conjunta das Ações
Declaratórias de Constitucionalidade (ADC 29 e
30) e da Ação Direta de Inconstitucionalidade
(ADI 4578), que tratam da LC 135/2010, por
maioria de votos, entenderam em favor da
constitucionalidade da lei, que poderá ser
aplicada nas eleições deste ano, alcançando atos
e fatos ocorridos antes de sua vigência.
3. Não importa, para os fins da novel inelegibilidade
ditada na Lei Complementar n° 135/2010, qual o
tamanho da pena, a forma da pena, e, até, se
houve pena ou se foi ela cumprida. Basta lembrar
que nos casos de renúncia a mandato eletivo,
sequer condenação houve. Importa o
enquadramento do fato nas alíneas do dispositivo
legal, o que ocorre na hipótese presente (letra d
do art. 1º, I, da LC n° 64/1990, com a recente
alteração).
1
2. 4. Indeferimento da chapa majoritária, por não
preencher o candidato a Prefeito os requisitos
para disputar a eleição, tendo em vista sua
inelegibilidade.
Vistos etc.
Trata-se de hipótese de julgamento conjunto de Requerimentos de
Registro de Candidatura (RCC), por força do que dispõe o art. 36, §2o., da Resolução nº
23.373 TSE, formulados pela COLIGAÇÃO “PALMARES, FORÇA, TRABALHO E
DETERMINAÇÃO”, integrada pelos partidos PRB / PDT / PTN / PSC / PSDB / PPL,
sendo o primeiro processo, de número 25-02.2012.6.17.0037, referente a JOSÉ
BARTOLOMEU DE ALMEIDA MELO, candidato a Prefeito, e o segundo, de número 26-
84.2012.6.17.0037, apresentando PEDRO PAULO DA SILVA como candidato a vice-
prefeito na chapa majoritária da Coligação.
I. RELATÓRIO.
1. Processo nº 25-02.2012.6.17.0037 (Requerimento de Registro de
Candidatura de Prefeito)
A COLIGAÇÃO “PALMARES, FORÇA, TRABALHO E DETERMINAÇÃO”,
por seu representante, apresentou o presente Requerimento de Registro de
Candidatura (RRC) de JOSÉ BARTOLOMEU DE ALMEIDA MELO para concorrer ao
cargo de Prefeito, com o número 12, neste Município de Palmares, nas eleições
municipais deste ano, formando chapa com o sr. Pedro Paulo da Silva, candidato a
Vice-Prefeito.
O pedido veio acompanhado de documentos.
Publicado edital, foi apresentada, no prazo legal, impugnação pela
Coligação “Frente Popular de Palmares”. Alega que o candidato é inelegível, nos
termos da LC 135/10, em decorrência de: a) condenação criminal por crime de
receptação dolosa (Proc. nº 557-17.2004.8.17.1030), confirmada pelo Eg. TJPE; b)
condenação, com trânsito em julgado, por abuso de poder econômico, nas eleições
municipais de 2004. Aduz, ainda, que a liminar conseguida pelo candidato junto ao
Tribunal não pode servir para afastar sua condição de “ficha suja” (fls. 21/37). Acostou
vasta documentação (fls. 39/62).
No prazo assinalado, trouxe a Coligação Requerente certidões criminais
da Justiça Estadual e Federal (fls. 64/65).
Devidamente notificado, o impugnado ofereceu contestação (fls. 75/92).
Sustenta que apesar de ter sido condenado por órgão colegiado por crime contra o
patrimônio (acórdão nos autos do Recurso de Apelação nº 0007209-
55.2012.8.17.0000), obteve, em conformidade com o art. 26-C da LC 64/90, providência
cautelar suspendendo a execução do acórdão no que tange à inelegibilidade. Quanto à
condenação pela Justiça Eleitoral por abuso de poder econômico, defende a
irretroatividade da LC 135/10 e que o período de inelegibilidade já teria sido cumprido.
Acrescenta ainda que não haveria comprovação dessa condenação.
O Ministério Público opinou pela improcedência da impugnação (fls.
97/99), vindo-me conclusos.
2. Processo nº 26-84.2012.8.17.0037 (Requerimento de Registro de
Candidatura de Vice-Prefeito)
2
3. A COLIGAÇÃO “PALMARES, FORÇA, TRABALHO E DETERMINAÇÃO”,
através de representante, apresentou Requerimento de Registro de Candidatura (RRC)
de PEDRO PAULO DA SILVA para concorrer ao cargo de Vice-Prefeito, neste
Município de Palmares, nas eleições municipais, formando chapa com José Bartolomeu
de Almeida Melo, candidato a Prefeito.
Foi juntada a documentação pertinente.
Publicado edital, não foi apresentada impugnação.
O Ministério Público opinou favoravelmente.
O que tudo relatado, examinado e ponderado, DECIDO:
II. FUNDAMENTAÇÃO.
Consoante dispõe o art. 21, §1o., da Resolução nº 23.373 do TSE, o
registro de candidatos a prefeito e vice-prefeito será feito sempre em chapa única e
indivisível, ainda que resulte da indicação de coligação (Código Eleitoral, art. 91, caput).
Outrossim, os processos dos candidatos a prefeito e a vice-prefeito devem tramitar
apensados e ser analisados e julgados em conjunto (art. 36, §2o.). Pois bem, passo a
fazê-lo, juntamente com a impugnação oferecida, com as notícias de inelegibilidade,
conforme determina o art. 50.
De logo, observo que o feito está a prescindir de dilação probatória, sendo
a matéria discutida de direito e já havendo elementos suficientes para uma apreciação.
Analisando, primeiramente, a candidatura do vice-prefeito, vez que quanto
a esta não houve impugnação, anoto que os requisitos legais foram atendidos,
preenchendo o candidato as condições constitucionais e legais de elegibilidade. Não foi
verificada, também, nenhuma causa de inelegibilidade, sendo, ainda, apresentada a
necessária documentação, conforme informou a Secretaria Eleitoral.
Quanto à candidatura do prefeito, objeto de impugnação, necessária
análise mais aprofundada. É preciso verificar se há elementos para concluir pela
inelegibilidade. O ponto principal da discussão é o alcance da chamada Lei da Ficha
Limpa.
A edição da “Lei da Ficha Limpa” foi impulsionada pela decisão
desfavorável do Supremo Tribunal Federal na Argüição de Descumprimento de Preceito
Fundamental nº 144, proposta pela Associação dos Magistrados do Brasil (AMB), que
justamente pedia a implantação da inelegibilidade mesmo sem o trânsito em julgado de
ações de conteúdo grave ou desabonador (criminais ou de improbidade).
Para superar a decisão do STF foi necessária, contudo, uma intensa
mobilização popular. O Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral recolheu mais 1,5
milhão de assinaturas de eleitores para a apresentação de projeto de iniciativa popular.
Esse projeto foi modificado, é claro, nas tratativas congressuais, mas o resultado final é
em grande medida espelho do projeto original.
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4. Em apertada síntese, a “Lei da Ficha Limpa” alterou a Lei Complementar
nº 64/90 (Lei das Inelegibilidades) nos seguintes pontos: 1) ampliou o prazo de
inelegibilidade para 8 anos; 2) dispensou a exigência de trânsito em julgado de
decisões judiciais, bastando decisão proferida por órgão colegiado nas hipóteses
previstas; 3) aumentou o rol de crimes comuns que acarreta inelegibilidade; 4) incluiu
novas hipóteses de inelegibilidade, abarcando a corrupção eleitoral, a captação ilícita
de sufrágio, a doação, captação ou gastos ilícitos de recursos de campanha ou ainda a
conduta vedada aos agentes públicos em campanhas eleitorais que impliquem
cassação do registro ou do diploma; 5) incluiu como hipóteses de inelegibilidade as
infrações decorrentes do exercício de mandato (renúncia para escapar de
procedimento), as condenações por “ato doloso de improbidade administrativa que
importe lesão ao patrimônio público e enriquecimento ilícito”, as infrações de cunho
ético-profissional que acarretem exclusão do exercício da profissão e a demissão do
serviço público, em processo administrativo ou judicial; 6) pune justamente com
inelegibilidade a fraude no desfazimento de vínculo conjugal ou de união estável para
evitar caracterização de inelegibilidade; 7) pune as doações ilícitas, impondo a
inelegibilidade aos responsáveis por doações eleitorais tidas por ilegais; 8) impõe a
inelegibilidade aos magistrados e aos membros do Ministério Público que forem
aposentados compulsoriamente por decisão sancionatória, que tenham perdido o cargo
por sentença ou que tenham pedido exoneração ou aposentadoria voluntária na
pendência de processo administrativo disciplinar, pelo prazo de 8 (oito) anos.
A grande inovação da Lei foi a superação da anterior necessidade de
trânsito em julgado das condenações criminais ou de improbidade administrativa para
imposição da ulterior inelegibilidade. O motivo da desconsideração da necessidade do
trânsito em julgado decorre da existência de um sistema processual que, ao possibilitar
recursos quase infinitos, privilegia a dita segurança jurídica em detrimento do devido
processo legal em prazo razoável. Fica claro que uma decisão colegiada, ao menos
para as finalidades eleitorais, pode preencher o conceito constitucional de “vida
pregressa” para fins de inelegibilidade.
No caso presente, o candidato a prefeito pela Coligação impugnada conta
com condenação criminal por receptação dolosa (proc. nº 557-17.2004.8.17.1030),
confirmada na Instância Superior (Apelação Criminal nº 0169277-7), fato este
incontroverso. Seria atingido, portanto, claramente, pela Lei da Ficha Limpa, com a
redação que conferiu ao art. 1º, I, e, 2, da LC 64/90:
Art. 1º. São inelegíveis:
I – para qualquer cargo:
(...)
e) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida
por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de
8 (oito) anos após o cumprimento da pena, pelos crimes:
(...)
2. contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e
os previstos na lei que regula a falência;
(Grifos nossos)
Ocorre que foi concedida providência cautelar favorável ao candidato,
afastando os efeitos desta condenação para fins eleitorais. De fato, consta dos autos
decisão do e. Juiz Paulo Victor Vasconcelos de Almeida, Relator Substituto, deferindo
liminar e suspendendo a execução do acórdão (fls. 58).
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5. Ainda que referida decisão seja suscetível a críticas, pois faz letra morta a
Lei da Ficha Limpa, conquista de toda uma sociedade, o fato é que existe brecha legal
autorizando a medida. O art. 26-C da LC 135/10 dispõe:
Art. 26-C. O órgão colegiado do tribunal ao qual couber a apreciação do recurso
contra as decisões colegiadas a que se referem as alíneas d, e, h, j, l e n do
inciso I do art. 1º poderá, em caráter cautelar, suspender a inelegibilidade sempre
que existir plausibilidade da pretensão recursal e desde que a providência tenha
sido expressamente requerida, sob pena de preclusão, por ocasião da
interposição do recurso.
Vê-se, assim, que impossível o indeferimento do registro do candidato
com fundamento na condenação criminal que ostenta em sua ficha. A providência
cautelar, se podemos dizer assim, verdadeiramente “limpou” o candidato.
Já no que tange à condenação perante a Justiça Eleitoral, por abuso de
poder econômico, cujo acórdão vai juntado aos autos nesta ocasião (Recurso Eleitoral
nº 7069), a questão é saber se a LC 135/10 poderia retroagir para alcançá-la.
O art. 1º, I, d, da LC 064/90, com a nova redação que lhe foi dada, reza:
Art. 1º. São inelegíveis:
I – para qualquer cargo:
(...)
d) os que tenham contra sua pessoa representação julgada procedente pela
Justiça Eleitoral, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão
colegiado, em processo de apuração de abuso do poder econômico ou político,
para a eleição na qual concorrem ou tenham sido diplomados, bem como para
as que se realizarem nos 8 (oito) anos seguintes;
Parece-me que a incidência da nova lei a casos pretéritos não diz respeito
à retroatividade de norma eleitoral, mas, sim, à sua aplicação aos pedidos de registro
de candidatura futuros, posteriores à entrada em vigor, não havendo que se perquirir de
nenhum agravamento, pois a causa de inelegibilidade incide sobre a situação do
candidato no momento de registro da candidatura.
O Min. Aldir Passarinho, no julgamento do Recurso Ordinário nº 86514,
acórdão de 30.09.2010, assim se expressou:
5
6. “(...) A questão que se põe é se a orientação já sufragada pelo TSE, como visto
antes, no sentido de que a inelegibilidade não é uma pena, porém uma situação
aferível no momento do registro das candidaturas, que para a presente eleição
ocorreu a partir de 5 de julho de 2010, merece ou não ressalva em se tratando da
hipótese do art. 1º, I, d, da Lei Complementar no 64/1 990, na redação dada pela
LC n° 135/2010, que dispõe: (...) A discussão, parece-me, a respeito do prazo de
vigência da declaração de inelegibilidade, por três anos, feita no acórdão que
julgou a AIJE, não interfere na restrição trazida no bojo da "Lei da Ficha Limpa".
Não se está alterando a coisa julgada do art. 22, XIV. É uma nova eleição, regida
por outras condições, em época diferente, em que diferentes são os requisitos à
admissão da candidatura. Para o presente pleito de 2010, ante a LC n° 135/2010,
exige-se a ausência de condenação em representação julgada pela Justiça
Eleitoral decorrente de abuso de poder político e econômico nos últimos 8 (oito)
anos. Entendo, como já assinalei em voto vogal anterior, que o fato é
objetivo. (...)Não importa, para os fins da novel inelegibilidade ditada na Lei
Complementar n° 135/2010, qual o tamanho da pena, a forma da pena, e,
até, se houve pena ou se foi ela cumprida. Basta lembrar que nos casos de
renúncia a mandato eletivo, sequer condenação houve. Importa, volta-se a
frisar, o fato enquadrável nas alíneas do dispositivo legal. (...) Na espécie
dos autos - letra d do art. 10, 1, da LC n° 64/1990, com a recente alteração -
basta a procedência da ação com decisão transitada em julgado ou tomada
colegiadamente. A simples procedência anterior - fato objetivo - é que gera,
por si só, a inelegibilidade por oito anos, a partir da vigência da lei, não o
tempo antes ditado de inelegibilidade. (...) Nesses termos, sendo bastante a
procedência da ação como causa à inelegibilidade prevista no art. 1º, I, d, da LC
n° 64/90, na redação dada pela LC n° 135/2010,(...)”
Destaco, também, trecho do voto do e. Min, Luiz Fux, no julgamento
conjunto da ADC 29/ ADC 30/ ADI 4578:
6
7. “(...) A aplicabilidade da Lei Complementar n.º 135/10 a processo eleitoral
posterior à respectiva data de publicação é, à luz da distinção supra, uma
hipótese clara e inequívoca de retroatividade inautêntica, ao estabelecer
limitação prospectiva ao ius honorum (o direito de concorrer a cargos eletivos)
com base em fatos já ocorridos. A situação jurídica do indivíduo – condenação
por colegiado ou perda de cargo público, por exemplo – estabeleceu-se em
momento anterior, mas seus efeitos perdurarão no tempo. Esta, portanto, a
primeira consideração importante: ainda que se considere haver atribuição de
efeitos, por lei, a fatos pretéritos, cuida-se de hipótese de retrospectividade, já
admitida na jurisprudência desta Corte. Demais disso, é sabido que o art. 5º,
XXXVI, da Constituição Federal preserva o direito adquirido da incidência da lei
nova. Mas não parece correto nem razoável afirmar que um indivíduo tenha o
direito adquirido de candidatar-se, na medida em que, na lição de GABBA (Teoria
della Retroattività delle Leggi. 3. edição. Torino: Unione Tipografico-Editore,
1981, v. 1, p. 1), é adquirido aquele direito "[...] que é conseqüência de um fato
idôneo a produzi-lo em virtude da lei vigente ao tempo que se efetuou, embora a
ocasião de fazê-lo valer não se tenha apresentado antes da atuação da lei nova,
e que, sob o império da lei vigente ao tempo em que se deu o fato, passou
imediatamente a fazer parte do patrimônio de quem o adquiriu.” (Tradução livre
do italiano) Em outras palavras, a elegibilidade é a adequação do indivíduo ao
regime jurídico – constitucional e legal complementar – do processo eleitoral,
consubstanciada no não preenchimento de requisitos “negativos” (as
inelegibilidades). Vale dizer, o indivíduo que tenciona concorrer a cargo eletivo
deve aderir ao estatuto jurídico eleitoral. Portanto, a sua adequação a esse
estatuto não ingressa no respectivo patrimônio jurídico, antes se traduzindo numa
relação ex lege dinâmica. É essa característica continuativa do
enquadramento do cidadão na legislação eleitoral, aliás, que também
permite concluir pela validade da extensão dos prazos de inelegibilidade,
originariamente previstos em 3 (três) , 4 (quatro) ou 5 (cinco) anos, para 8
(oito) anos, nos casos em que os mesmos encontram-se em curso ou já se
encerraram. Em outras palavras, é de se entender que, mesmo no caso em
que o indivíduo já foi atingido pela inelegibilidade de acordo com as
hipóteses e prazos anteriormente previstos na Lei Complementar nº 64/90,
esses prazos poderão ser estendidos – se ainda em curso – ou mesmo
restaurados para que cheguem a 8 (oito) anos, por força da lex nova, desde
que não ultrapassem esse prazo. Explica-se: trata-se, tão-somente, de
imposição de um novo requisito negativo para a que o cidadão possa candidatar-
se a cargo eletivo, que não se confunde com agravamento de pena ou com bis in
idem. Observe-se, para tanto, que o legislador cuidou de distinguir claramente a
inelegibilidade das condenações – assim é que, por exemplo, o art. 1º, I, “e”, da
Lei Complementar nº 64/90 expressamente impõe a inelegibilidade para período
posterior ao cumprimento da pena.(...)”
A Ministra Carmem Lúcia, por sua vez, ao defender a constitucionalidade
da Lei da Ficha Limpa, ponderou que o que se passa na vida de alguém não se
desapega de sua história. “O ser humano se apresenta inteiro quando ele se propõe a
ser o representante dos cidadãos, pelo que a vida pregressa compõe a persona que se
oferece ao eleitor, e o seu conhecimento há de ser de interesse público, para se chegar
à conclusão quanto à sua aptidão que a Constituição Federal diz, moral e proba, para
representar quem quer que seja”.
Segundo ela, a vida é tudo que a gente faz todos os dias. “E, no caso, o
direito traça, marca e corta qual é a etapa e os dados desta vida passada que precisam
ser levadas em consideração”. Assim, a ministra disse não ver no caso
inconstitucionalidade, mas “a pregação e a reafirmação de cada qual dos princípios
constitucionais”.
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8. Trago ainda o posicionamento do Min. Ricardo Lewandowski:
“Também não se pode perder de vista que, nos termos da jurisprudência
desta Suprema Corte e do TSE, as normas que alteram ou impõem
inelegibilidades não têm caráter penal, como também não configuram
sanção. Constituem regras de proteção à coletividade, que estabelecem
preceitos mínimos para o registro de candidaturas, tendo em mira a
preservação dos valores republicanos. É que, como bem assevera José
Afonso da Silva, “a Constituição não veda a retroatividade da lei, a não ser da lei
penal que não beneficie o réu. Afora isto, o princípio da irretroatividade da lei não
é de direito constitucional, mas princípio geral de Direito”. No mesmo sentido,
Dalmo de Abreu Dallari afirma que: “Outra alegação é que a aplicação da Lei da
Ficha Limpa a situações estabelecidas anteriormente seria contrária à regra
constitucional que proíbe a retroatividade. Também nesse caso está ocorrendo
um equívoco. De fato, a Constituição proíbe a aplicação retroativa da lei penal,
encontrando-se essa interdição em disposição expressa do artigo 5º, inciso XL,
segundo o qual ‘a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu’. Ora, não
há como confundir uma lei que estabelece condições de inelegibilidade, uma lei
sobre as condições para o exercício de direitos políticos, com uma lei penal.
Veja-se que a própria Constituição, no já referido artigo 14, parágrafo 9º,
manda que seja considerada a vida pregressa do candidato, ou seja, o que
ele fez no passado, para avaliação de suas condições de elegibilidade.
Assim, pois, não ocorre a alegada inconstitucionalidade da Lei da Ficha
Limpa, porque ela não fixa pena, mas apenas torna explícito um dos
aspectos da vida pregressa que podem gerar a inelegibilidade”.
O julgamento da Lei da Ficha Limpa no Supremo Tribunal Federal ficou
assim ementado:
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9. EMENTA: AÇÕES DECLARATÓRIAS DE CONSTITUCIONALIDADE E AÇÃO
DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE EM JULGAMENTO CONJUNTO. LEI
COMPLEMENTAR Nº 135/10. HIPÓTESES DE INELEGIBILIDADE. ART. 14, §
9º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. MORALIDADE PARA O EXERCÍCIO DE
MANDATOS ELETIVOS. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA À IRRETROATIVIDADE
DAS LEIS: AGRAVAMENTO DO REGIME JURÍDICO ELEITORAL.
ILEGITIMIDADE DA EXPECTATIVA DO INDIVÍDUO ENQUADRADO NAS
HIPÓTESES LEGAIS DE INELEGIBILIDADE. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA
(ART. 5º, LVII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL): EXEGESE ANÁLOGA À
REDUÇÃO TELEOLÓGICA, PARA LIMITAR SUA APLICABILIDADE AOS
EFEITOS DA CONDENAÇÃO PENAL. ATENDIMENTO DOS PRINCÍPIOS DA
RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE. OBSERVÂNCIA DO
PRINCÍPIO DEMOCRÁTICO: FIDELIDADE POLÍTICA AOS CIDADÃOS. VIDA
PREGRESSA: CONCEITO JURÍDICO INDETERMINADO. PRESTÍGIO DA
SOLUÇÃO LEGISLATIVA NO PREENCHIMENTO DO CONCEITO.
CONSTITUCIONALIDADE DA LEI. AFASTAMENTO DE SUA INCIDÊNCIA
PARA AS ELEIÇÕES JÁ OCORRIDAS EM 2010 E AS ANTERIORES, BEM
COMO E PARA OS MANDATOS EM CURSO. 1. A elegibilidade é a adequação
do indivíduo ao regime jurídico – constitucional e legal complementar – do
processo eleitoral, razão pela qual a aplicação da Lei Complementar nº 135/10
com a consideração de fatos anteriores não pode ser capitulada na retroatividade
vedada pelo art. 5º, XXXV, da Constituição, mercê de incabível a invocação de
direito adquirido ou de autoridade da coisa julgada (que opera sob o pálio da
cláusula rebus sic stantibus) anteriormente ao pleito em oposição ao diploma
legal retromencionado; subjaz a mera adequação ao sistema normativo pretérito
(expectativa de direito). 2. A razoabilidade da expectativa de um indivíduo de
concorrer a cargo público eletivo, à luz da exigência constitucional de moralidade
para o exercício do mandato (art. 14, § 9º), resta afastada em face da
condenação prolatada em segunda instância ou por um colegiado no exercício da
competência de foro por prerrogativa de função, da rejeição de contas públicas,
da perda de cargo público ou do impedimento do exercício de profissão por
violação de dever ético-profissional. 3. A presunção de inocência consagrada no
art. 5º, LVII, da Constituição Federal deve ser reconhecida como uma regra e
interpretada com o recurso da metodologia análoga a uma redução teleológica,
que reaproxime o enunciado normativo da sua própria literalidade, de modo a
reconduzi-la aos efeitos próprios da condenação criminal (que podem incluir a
perda ou a suspensão de direitos políticos, mas não a inelegibilidade), sob pena
de frustrar o propósito moralizante do art. 14, § 9º, da Constituição Federal. 4.
Não é violado pela Lei Complementar nº 135/10 não viola o princípio
constitucional da vedação de retrocesso, posto não vislumbrado o pressuposto
de sua aplicabilidade concernente na existência de consenso básico, que tenha
inserido na consciência jurídica geral a extensão da presunção de inocência para
o âmbito eleitoral. 5. O direito político passivo (ius honorum) é possível de ser
restringido pela lei, nas hipóteses que, in casu, não podem ser consideradas
arbitrárias, porquanto se adequam à exigência constitucional da razoabilidade,
revelando elevadíssima carga de reprovabilidade social, sob os enfoques da
violação à moralidade ou denotativos de improbidade, de abuso de poder
econômico ou de poder político. 6. O princípio da proporcionalidade resta
prestigiado pela Lei Complementar nº 135/10, na medida em que: (i) atende aos
fins moralizadores a que se destina; (ii) estabelece requisitos qualificados de
inelegibilidade e (iii) impõe sacrifício à liberdade individual de candidatar-se a
cargo público eletivo que não supera os benefícios socialmente desejados em
termos de moralidade e probidade para o exercício de referido munus publico. 7.
O exercício do ius honorum (direito de concorrer a cargos eletivos), em um juízo
de ponderação no caso das inelegibilidades previstas na Lei Complementar nº
9
10. 135/10, opõe-se à própria democracia, que pressupõe a fidelidade política da
atuação dos representantes populares. 8. A Lei Complementar nº 135/10 também
não fere o núcleo essencial dos direitos políticos, na medida em que estabelece
restrições temporárias aos direitos políticos passivos, sem prejuízo das situações
políticas ativas. 9. O cognominado desacordo moral razoável impõe o prestígio
da manifestação legítima do legislador democraticamente eleito acerca do
conceito jurídico indeterminado de vida pregressa, constante do art. 14, § 9.º, da
Constituição Federal. 10. O abuso de direito à renúncia é gerador de
inelegibilidade dos detentores de mandato eletivo que renunciarem aos seus
cargos, posto hipótese em perfeita compatibilidade com a repressão, constante
do ordenamento jurídico brasileiro (v.g., o art. 53, § 6º, da Constituição Federal e
o art. 187 do Código Civil), ao exercício de direito em manifesta transposição dos
limites da boa-fé. 11. A inelegibilidade tem as suas causas previstas nos §§ 4º a
9º do art. 14 da Carta Magna de 1988, que se traduzem em condições objetivas
cuja verificação impede o indivíduo de concorrer a cargos eletivos ou, acaso
eleito, de os exercer, e não se confunde com a suspensão ou perda dos direitos
políticos, cujas hipóteses são previstas no art. 15 da Constituição da República, e
que importa restrição não apenas ao direito de concorrer a cargos eletivos (ius
honorum), mas também ao direito de voto (ius sufragii). Por essa razão, não há
inconstitucionalidade na cumulação entre a inelegibilidade e a suspensão de
direitos políticos. 12. A extensão da inelegibilidade por oito anos após o
cumprimento da pena, admissível à luz da disciplina legal anterior, viola a
proporcionalidade numa sistemática em que a interdição política se põe já antes
do trânsito em julgado, cumprindo, mediante interpretação conforme a
Constituição, deduzir do prazo posterior ao cumprimento da pena o período de
inelegibilidade decorrido entre a condenação e o trânsito em julgado. 13. Ação
direta de inconstitucionalidade cujo pedido se julga improcedente. Ações
declaratórias de constitucionalidade cujos pedidos se julgam procedentes,
mediante a declaração de constitucionalidade das hipóteses de inelegibilidade
instituídas pelas alíneas “c”, “d”, “f”, “g”, “h”, “j”, “m”, “n”, “o”, “p” e “q” do art. 1º,
inciso I, da Lei Complementar nº 64/90, introduzidas pela Lei Complementar nº
135/10, vencido o Relator em parte mínima, naquilo em que, em interpretação
conforme a Constituição, admitia a subtração, do prazo de 8 (oito) anos de
inelegibilidade posteriores ao cumprimento da pena, do prazo de inelegibilidade
decorrido entre a condenação e o seu trânsito em julgado. 14. Inaplicabilidade
das hipóteses de inelegibilidade às eleições de 2010 e anteriores, bem como
para os mandatos em curso, à luz do disposto no art. 16 da Constituição.
Precedente: RE 633.703, Rel. Min. Gilmar Mendes (repercussão geral).(ADI
4.578, Rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 16/02/2012)
Considerando as posições acima destacadas, estou em acolher
plenamente a possibilidade de aplicação da Lei da Ficha Limpa a fatos pretéritos, como
decorrência do dispositivo do art. 14, § 9º, da Constituição da República, quando
determina que “Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os
prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade
para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e
legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do
exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”,
expressamente apontando para fatos pretéritos como elementos dos suportes fáticos
das normas da lei complementar que prevê, tanto que não os exclui implicitamente, à
luz da sua objetividade jurídica e natureza cautelar, da proteção da normalidade e da
legitimidade das eleições, contra a influência do poder econômico ou o abuso no
exercício da função, cargo ou emprego público na administração direta ou indireta. São
normas que buscam um mínimo de moralidade e probidade, indispensáveis ao
exercício de qualquer mandato político.
10
11. Colaciono, por fim, os seguintes julgados:
“TRE-SP - REGISTRO DE CANDIDATURA. IMPUGNAÇÃO DE DIRETÓRIO
MUNICIPAL DE PARTIDO POLÍTICO. PARTE ILEGÍTIMA. RECEBIDO COMO
NOTÍCIA DE INELEGIBILIDADE. IMPUGNAÇÃO DA DOUTA PROCURADORIA
REGIONAL ELEITORAL ACOLHIDA. CONDENAÇÃO POR USO INDEVIDO
DOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO SOCIAL. INELEGIBILIDADE NOS TERMOS
NO ART. 1º, INC. I, ALÍNEA 'D', DA LC Nº 64/90. AUSÊNCIA DE CERTIDÃO DE
OBJETO E PÉ DE PROCESSO CRIMINAL. REGISTRO INDEFERIDO.” “In casu,
o impugnado N.L.A.D foi condenado por uso indevido dos meios de comunicação
social, nos termos do artigo 22, inciso XV, da Lei Complementar nº 64/90, com
trânsito em julgado em 4/12/2006 (Recurso Eleitoral nº 24.758, classe 2ª deste
Tribunal Regional Eleitoral). Não se pode olvidar que, tratando-se de
representação por uso indevido dos meios de comunicação social nas eleições
de 2004, está o pretendente inelegível até as eleições de 2012, ou seja, até o
transcurso do prazo de oito anos após a eleição em que ocorreu o abuso (art. 1º,
inc. I, alínea 'd', da Lei Complementar nº 64/90).” (REGISTRO DE CANDIDATO
nº 232045, Acórdão de 23/08/2010, Relator(a) PENTEADO NAVARRO, T.R.E.-
SP, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data 23/08/2010)
“TRE-SP - Do exame dos autos, nota-se que o impugnado Raimundo
Taraskevicius Sales foi condenado pelo colendo Tribunal Superior Eleitoral, em
sede de Ação de Investigação Judicial Eleitoral, pelo uso indevido dos meios de
comunicação social e por abuso do poder econômico e político, perpetrado nas
eleições de 2006, tendo a decisão transitado em julgado em 19 de outubro de
2009, o que, em conformidade com o disposto no art. 1º, inc. I, alínea 'd', da Lei
Complementar nº 64/90, resultou na sua inelegibilidade (fls. 35/36vº e 45/54vº). A
inelegibilidade, nos termos acima citados, é decorrência automática da decisão
condenatória transitada em julgado ou proferida por órgão colegiado que
reconhece a prática de abuso de poder econômico ou político. Verdadeiramente,
a inelegibilidade prevista no art. 1º, inc. I, alínea 'd', da Lei Complementar 64/90,
conforme já sedimentado na jurisprudência, não constitui pena, mas uma
conseqüência ética inafastável da condenação aplicada.” (REGISTRO DE
CANDIDATO nº 232822, Acórdão de 12/08/2010, Relator(a) PENTEADO
NAVARRO, T.R.E.-SP, Publicação: PSESS - Publicado em Sessão, Data
12/08/2010).
Assim, ainda que o candidato a vice preencha os requisitos estabelecidos
na lei, o registro da chapa majoritária deve ser indeferido, vez que o candidato a
Prefeito, por ter sido condenado por abuso de poder econômico, em 20 de novembro de
2007 (referente às eleições de 2004), cuja decisão transitou em julgado (TRE Proc. nº
7069 – Palmares), tornou-se inelegível, não tendo completado os oito anos previstos na
lei (art. 1º, I, d, da LC 064/90) para que a inelegibilidade fosse afastada.
Diz o art. 50 da Resolução TSE 23.373:
Art. 50. Os processos dos candidatos à eleição majoritária deverão ser julgados
conjuntamente, com o exame individualizado de cada uma das candidaturas, e o
registro da chapa somente será deferido se ambos os candidatos forem
considerados aptos, não podendo ser deferido o registro sob condição.
III. DISPOSITIVO.
(Decidindo simultaneamente:)
11
12. Isto Posto, a) defiro o pedido de registro e candidatura do candidato a
vice-prefeito Pedro Paulo da Silva, dando-o como apto a participar das eleições, por
preencher os requisitos legais; b) julgo procedente a impugnação oferecida contra o
candidato a Prefeito José Bartolomeu de Almeida Melo, indeferindo, por via de
conseqüência, com fundamento no art. 1º, I, d, da LC 64/90, e no art. 14, § 9º, da
Constituição Federal, a sua candidatura para concorrer ao pleito eleitoral neste ano de
2012.
Tendo em vista que o candidato a Prefeito não foi considerado apto, e em
observância ao que dispõe o art. 50, da Resolução TSE 23.373, resta indeferido o
registro da chapa majoritária, podendo a Coligação “PALMARES, FORÇA, TRABALHO
E DETERMINAÇÃO”, por sua conta e risco, recorrer da decisão ou, desde logo, indicar
substituto.
Publicação, intimação e prazo recursal na forma dos arts. 52 e 53 da
Resolução TSE nº 23.373.
Havendo recurso, proceda-se na forma dos artigos 54 e 55.
Transitada em julgado esta decisão, em se mantendo o teor, adotem-se as
providências finais.
PALMARES, 04 de agosto de 2012.
_______________________________
CLÁUDIO DA CUNHA CAVALCANTI
Juiz Eleitoral
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