Bom planejamento é uma condição necessária, entre outras, para obter assertividade nas estimativas de prazo e custo de um projeto industrial ou de infraestrutura. Além da imprecisão de quantidades e da incerteza dos preços, a imprecisão nas produtividades pode afetar ambas as estimativas de custos e prazo de um projeto. Este trabalho analisa casos de montagem de transportador e ponte rolante para examinar o efeito da imprecisão nas produtividades de serviços sobre o prazo e custo dos projetos.
1. TITO LIVIO M. CARDOSO
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Tito Livio M. Cardoso
tito_livio@yahoo.com
09-03-2015
EFEITOS DA INCERTEZA NA PRODUTIVIDADE DE SERVIÇOS SOBRE O
CUSTO E PRAZO DO PROJETO
CONTEXTO
Bom planejamento é uma condição necessária, entre outras, para obter assertividade nas estimativas de
prazo e custo de um projeto industrial ou de infraestrutura.
Porém, mesmo em empresas que detém know-how no planejamento de grandes obras, é relativamente
comum ouvir expressões do tipo “o custo, em geral, nós até que acertamos, mas o prazo...”. Esta expressão
traduz o fato de que, admitindo que a empresa conheça e aplique práticas efetivas e eficientes no
desenvolvimento e gestão dos projetos (esta condição é admitida no restante de todo texto), sob a
perspectiva técnica, é em geral mais difícil acertar o prazo do que o custo. Vários fatores levam a esta
observação, sendo evidenciado que, enquanto o orçamento apresenta relativa independência entre suas
componentes, de modo que a variação a maior na execução de uma delas não implica na variação a maior de
outras e pode, eventualmente, ser compensada pela variação a menor de outras (Nota 1), o cronograma é
constituído por uma rede lógica que estabelece relações formais de dependência entre as atividades. Deste
modo, na execução, ainda que uma atividade não passe por variações, suas datas de inicio ou término são
afetadas pelas variações das atividades precedentes das quais a atividade depende para ser executada.
A estrutura de dependência entre as componentes, atividades e componentes de custo, cria uma primeira
distinção entre o potencial de assertividade entre as estimativas de custo e de prazo, mas temos ainda fatores
intrínsecos às próprias componentes que, em algumas situações são determinantes da assertividade das
estimativas de custo e prazo.
Fontes de imprecisão das estimativas
Ao estabelecer a imprecisão de uma estimativa é usual considerar duas fontes: (a) imprecisão de quantidades,
inerente ao avanço da engenharia em cada área do projeto; e (b) incerteza dos preços, geralmente referindo-
se à “confiabilidade” da base de estimativa: se baseada em cotações informais ou firmes, atualização e
aplicabilidade da base de composições de preços (CPU), referências a contratos anteriores, índices de
atualização/correção de preços, entre outros.
É usual, ao menos no Brasil, que gestores associem a imprecisão da estimativa à imprecisão de engenharia.
Isso talvez, porque, bem ou mal, é relativamente praticável se estabelecer uma faixa de variação %, linha a
linha ou geral, sobre as quantidades no projeto de engenharia. A avaliação da “confiabilidade” da base de
preços, por outro lado, é bem menos objetiva e as equipes de engenharia tendem a assumir preços como
“caixas pretas” originadas nas suas bases de dados ou sugeridas pelas áreas de contratação de serviços.
Serviços de construção civil e eletromecânica podem representar mais da metade do investimento direto em
um projeto industrial e quase a totalidade em um projeto de infraestrutura intensivo em construção civil
(estradas, obras de arte especiais, ramais ferroviários, etc.).
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No caso das atividades de serviços, a definição de preço, em sumário, depende de três variáveis: custo
unitário dos recursos, produtividade dos recursos naquela atividade e bonificação. Entre estas três variáveis,
minha sugestão é que a maior fonte de imprecisão reside na produtividade. Observe na tabela seguinte a
dispersão entre produtividades para atividades de montagem de estruturas metálicas.
Tab.1 – Dispersão de produtividades na montagem de estruturas metálicas com base na medição da
produtividade realizada em diversos projetos no Brasil entre 2006 e 2014 e valores adotados por
uma montadora.
Montagem de estrutura metálica – Produtividade (HH/tonelada)
A B C D E F G H
51,85 65,0 71,0 73,47 80,0 92,53 101,51 137,15
Pode-se argumentar que a variação na tabela acima é observada porque as produtividades não estão
estratificadas em função do peso linear da estrutura (diferentes pesos requerem utilização de recursos
diferentes, afetando a produtividade). A tabela seguinte apresenta as produtividades adotadas por diferentes
empresas intensivas em capital, em função do seu histórico, para estruturas leves, médias e pesadas.
Tab.2 – Dispersão de produtividades na montagem de estruturas metálicas. Fonte: valores adotados
por diferentes empresas com base nos históricos de projetos no Brasil.
Montagem de estrutura metálica – Produtividade
(HH/tonelada)
I J L
Leve (<60 kg/m) 70 100 100
Media (>60 kg/m) 50 80 90
Pesada (>120 kg/m) 40 60 80
Observam-se variações semelhantes nas produtividades de diversas outras atividades de construção, por
exemplo, caldeiraria.
Tab.3 – Dispersão de produtividades na caldeiraria com base na medição da produtividade realizada
em diversos projetos no Brasil entre 2006 e 2014
Caldeiraria – Produtividade (HH/tonelada)
A B C D E
48,87 92,0 92,27 100,0 120,0
Novamente, pode-se argumentar que o dado é agregado o que induz dispersão nas medições. Considerando
isto, a tabela seguinte apresenta os valores adotados por uma montadora, uma gerenciadora e três empresas
intensivas em capital, todas com base em seus históricos para produtividade de caldeiraria, especificamente,
na construção de silos metálicos.
Tab.4 – Dispersão de produtividades na construção de silos metálicos
Caldeiraria – Produtividade (HH/tonelada)
A B C D E F
40 60 60 60 80 85
Fica claro que, se a definição de preço dos serviços depende da produtividade podem ser esperadas elevadas
imprecisões na estimativa de custos do projeto tendo origem a partir dos preços, mesmo que as quantidades
do projeto de engenharia fossem, por hipótese, livres de imprecisão.
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Entretanto, as produtividades são igualmente determinantes na duração das atividades. Dada a especificação
do tipo e número de recursos alocados a uma atividade e o regime de trabalho (dias/ano, horas/dia), a
duração da atividade passa a depender exclusivamente da produtividade.
NOTA 1: excetuando-se situações específicas, por exemplo, no caso de pacotes interdependentes, onde variações de um pacote refletem em
variações no outro, podendo formar um círculo de realimentação positiva ou negativa.
ORIGENS DAS VARIAÇÕES NAS PRODUTIVIDADES DE SERVIÇOS
É comum referenciar-se o problema da localização da base de dados de custos e produtividades. De fato, o
local é uma variável identificada em pesquisas comparando produtividades de serviços em diversas regiões,
não apenas no Brasil como também em outros países.
Entretanto, pude observar mais de uma vez, dois projetos com escopos semelhantes, desenvolvidos em
municípios próximos apresentarem produtividades bastante distintas de modo que, além da localização,
outras variáveis dão origem às variações de produtividade. Podemos citar os seguintes fatores que, sem
serem exaustivos, dão, logo nas primeiras linhas, um entendimento das origens de dispersão entre
produtividades similares em diferentes obras ou mesmo entre diferentes frentes de uma mesma obra (Nota 2):
Média e dispersão da qualificação do efetivo de produção e supervisão,
Homogeneidade dos procedimentos de execução da obra entre diferentes equipes e turnos,
Condição operacional e cumprimento do plano de manutenção dos equipamentos de construção,
Calibração e ajuste dos equipamentos de elevação de cargas,
Condição de ferramentas,
Acessos, transporte, tempos e movimentos improdutivos (às frentes de obra, refeitórios, para troca de
turno, para abastecimento, etc.),
Razão entre a supervisão e o número e distanciamento de frentes de obra simultâneas (inclusive em
turnos noturnos e fim-de-semana),
Comunicação entre a supervisão de frentes, planejamento da produção e engenharia,
Qualificação, responsabilidades, procedimentos e ferramentas da equipe de planejamento e controle
de produção,
Capacidade de identificação e realocação de recursos paralisados em função de variações intraday (por
exemplo, por que o material não chegou à determinada frente, ou porque houve uma falha não
prevista que inviabiliza o trabalho dos demais recursos naquela frente),
Calibração dos instrumentos de medição,
Controle e segurança de inventários e controle da alocação de insumos, ferramentas e equipamentos
(nos almoxarifados e nas frentes de obra),
Condição de visibilidade e segurança em turnos noturnos,
Condições de refeitórios, transportes, alojamentos e ambulatório,
Políticas de remuneração do efetivo operacional e influência de ativismo e sindicatos,
Disponibilidade de água e insumos nas frentes de trabalho,
Revisões do projeto de engenharia executiva,
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Inconsistências verificadas nas frentes de trabalho quanto às cotas, distâncias, classes e volumes de
materiais, etc. com relação ao previsto no projeto de engenharia executiva,
Entre outros.
NOTA 2: A ordem de apresentação dos fatores não está associada à relevância da sua contribuição para a dispersão geral da produtividade.
ANÁLISE
Como vimos no contexto, a imprecisão nas produtividades pode afetar ambas as estimativas de custos e prazo
de um projeto. Podemos obter compreensão deste efeito se considerarmos os casos de escopos mais simples,
por exemplo, apenas as atividades de montagem de transportador de correia e ponte rolante.
Considerado:
No caso de transportador de correia, dados de produtividades de uma montadora, uma gerenciadora e
três empresas intensivas em capital.
No caso de ponte rolante, capacidade da ponte na faixa 10 a 20 t e dados de produtividades de uma
montadora, outra gerenciadora e duas empresas intensivas em capital.
A partir da média e desvio-padrão da amostra dos dados de produtividade de mão-de-obra (MO), foi
calculado o limite superior e inferior para 80% de probabilidade, admitindo uma distribuição normal.
Como MO é o recurso crítico em ambas as montagens, admitindo que todos demais parâmetros que
definem a duração da atividade ficam inalterados (recursos alocados, turnos, calendário), a imprecisão
na estimativa de duração da montagem é diretamente associada à imprecisão da estimativa de
produtividade.
A imprecisão do custo da atividade de montagem é o produto entre a variação de produtividade de
MO e a participação de MO na composição de preços da montagem.
A seguir, os dados e resultados calculados segundo a lógica descrita para os dois casos.
Caso 1 - Montagem de transportador de correia
A B C E F Média Desvio-padrão Lim Inf Lim Sup
100 110 120 120 138 117,6 14,10 105,7 129,5
Imprecisão no prazo 10,1%
Participação de MO na composição de preço 45% Imprecisão no custo 4,5%
P 80%Produtividades - Montagem Transportador de correias (HH/t)
Caso 2 - Montagem de ponte rolante
A B C D Média Desvio-padrão Lim Inf Lim Sup
50 60 90 95 73,8 22,1 55,1 92,4
Imprecisão no prazo 25,3%
Participação de MO na composição de preço 35% Imprecisão no custo 8,8%
P 80%Produtividades - Montagem Ponte Rolante Cap. 10/20 t (HH/t)
CONCLUSÃO
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• Notadamente, a indústria nacional apresenta dispersão nas produtividades de serviços.
• Como as produtividades são entradas tanto para estimativa de custos como duração das atividades
relacionadas aos serviços, podem constituir importante fonte de imprecisão no prazo e custo de
projetos.
• Nos casos analisados neste trabalho, a imprecisão da estimativa de duração e custo de montagem,
unicamente em função da dispersão de produtividades de mão-de-obra, foi, respectivamente, de 10%
no prazo e 4,5% no custo para transportador de correias e 25% no prazo e 9% no custo para ponte
rolante.
• Estes resultados caracterizam um dos motivos por que pode ser mais difícil obter assertividade no
prazo do que no custo dos projetos.