Brasília protecionista e Correa massacra liberdade de expressão
1. 6 Quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012
O GLOBO
OPINIÃO
Brasília cai na tentação protecionista
O
s motivos parecem razoáveis. Co- bre modelos com menos de 65% de conteú- o país de barreiras para forçar a vinda de fá- são” é que boa parte das importações é de
mo a indústria instalada no Brasil do fornecido pela área do Mercosul. De- bricas, de tão tosco não chega a ser uma po- componentes e insumos que fazem a indús-
— brasileira ou não — começa a pois, voltou-se contra o acordo comercial lítica industrial. O Brasil, assim, se equipa- tria brasileira ser mais competitiva interna
perder mercado para produtos assinado com o México, para também fe- ra ao protecionismo da Argentina, país que e externamente. Ou seja, caso os devaneios
importados, que se ergam barreiras às char esta porta de entrada de se converteu em pária global, protecionistas avancem, a indústria brasi-
compras no exterior, em nome do salva- automóveis. E, agora, planeja intoxicado por overdose de he- leira, já bastante integrada no mundo, pa-
mento de empregos e renda no mercado in- partir contra as importações terodoxias kirchneristas. decerá com a ruptura de linhas de supri-
terno. de têxteis, com a arma do au- Um ciclo difícil Em recente artigo no GLOBO, mento. O terremoto/tsunami no Japão e as
Na realidade, trata-se de mais uma daque- mento do IPI. Os conhecidos o economista Rogério Wer- inundações na Tailândia mostraram o que
las conclusões erradas do “senso comum”. pendores protecionistas la- do mercado neck derrubou, com números, isso significa: os desastres naturais afeta-
Indiscutível que há uma conjuntura mundi- tentes no PT dão estridente si- a ideia de que o Brasil estaria ram montadoras de veículos no mundo to-
al complexa, em que desalinhamentos de nal de vida. Assim como a mundial é usado sob inundação de um tsunami do.
taxas de câmbio — a brasileira, valorizada eclosão da crise mundial, a de importações: de 2000 a Em vez de erguer barreiras vetadas pela
— se somam à retração de mercados im- partir de Wall Street, no final para se fechar 2010, o peso das importações OMC para conter importações, o melhor ca-
portantes como o americano e europeu e de 2008, serviu de biombo pa- no consumo de bens industria- minho é aplicar políticas de aumento do po-
forçam a China e outras plataformas de ex- ra a abertura das comportas o país lizados aumentou de 11,6% do der de competição dos produtos industria-
portação orientais a ser bem mais competi- dos gastos em custeio, cujo PIB para 19%, dados da Funda- lizados nacionais, sem depender do câm-
tivas do que já eram. Porém, fechar o país, subproduto político foi a elei- ção de Estudos do Comércio bio. Alguns dos pontos a atacar são conhe-
por meio de barreiras alfandegárias, é a pi- ção de Dilma, agora, a supero- Exterior (Funcex) e Confedera- cidos: impostos, infraestrutura, burocra-
or decisão que um governo pode tomar. Ca- ferta de produtos industrializados asiáti- ção Nacional da Indústria (CNI). Não confi- cia, qualificação da mão de obra. O proteci-
so do brasileiro. Nos veículos, Brasília au- cos serve de justificativa para a ressurrei- gura qualquer desastre. onismo tarifário é o menos inteligente e efi-
mentou em 30 pontos percentuais o IPI so- ção da ideia da reserva de mercado. Cercar Outro aspecto fundamental nesta “inva- caz dos meios.
Correa massacra liberdade de expressão
O
presidente do Equador, Rafael vo “primeiro” mandato, que vai até agosto cas a donos de veículos e a jornalistas que do de contratos com o governo, o que é ile-
Correa, atua para calar a impren- de 2013, com direito à reeleição. Se a conse- ousam criticá-lo. gal. Os jornalistas afirmam no livro que Cor-
sa numa furiosa investida contra guir, ficará na presidência até 2017. Foi assim no caso de três diretores e do rea sabia dos contratos, e, por isso, foram
a liberdade de expressão que não Governos como os de Equa- editor de opinião do jornal “El condenados cada um a pagar multas de US$
deixa dúvidas sobre as aspirações ditatori- dor, Venezuela e Bolívia (e até Universo”, condenados a três 1 milhão. Correa negou que soubesse e or-
ais de seu governo. O Equador luta para cri- o da Argentina, kirchnerista) anos de prisão e a uma multa denou o cancelamento dos contratos.
ar instituições democráticas depois de um não conseguem conviver com Jornalistas de US$ 40 milhões (superior ao Na última segunda-feira, entrou em vigor
passado recente de turbulência política. críticas porque se acham do- valor da própria empresa), por o ironicamente denominado Código da De-
Correa foi eleito em 2006 na esteira de três nos da verdade. Uma de suas críticos são supostamente caluniarem o mocracia, uma lei que simplesmente proíbe
golpes civis e militares. Mas, em vez de tra- características é o hiperpresi- presidente. O jornalista, Emílio os veículos de comunicação de divulgar en-
balhar pela consolidação democrática, re- dencialismo: seus líderes for- condenados Palácio, acusou Correa de ter trevistas e reportagens com candidatos du-
solveu embarcar na demagogia chavista e talecem o Executivo, esvazi- ordenado os disparos de mili- rante as campanhas eleitorais. Ou seja: a
denominou seu governo de “Revolução Ci- am o Legislativo e manietam o a pagar multas tares contra um hospital onde imprensa equatoriana está proibida de in-
dadã”. Com isso, cada vez mais se parece Judiciário, para fazerem o que o presidente se refugiara du- formar aos eleitores o que dizem, pensam e
com os golpistas que o precederam. bem entendem, posando co- astronômicas rante a tentativa de golpe de 30 prometem os candidatos a representá-los
Seu primeiro mandato deveria ter-se en- mo salvadores da pátria. No de setembro de 2010. nas diversas assembleias legislativas e ins-
cerrado em janeiro de 2011, mas uma nova Equador, Correa entrou em Situação semelhante vivem tâncias do Executivo.
Constituição — como instrui a cartilha dos guerra com a imprensa e, co- os jornalistas Juan Carlos Cal- É assustador como governantes latino-
regimes bolivarianos recém-instalados — mo domina o Judiciário, adotou uma forma derón e Christian Zurita Ron, autores do li- americanos do Século XXI teimam em adotar
marcou eleição para abril de 2009. Correa perversa de estrangular os meios de comu- vro “El Grande Hermano”, que detalha co- práticas obscuras, ultrapassadas e já conde-
ganhou em primeiro turno e iniciou um no- nicação. Juízes aplicam multas astronômi- mo o irmão do presidente teria se beneficia- nadas, por inviáveis, ao lixo da História.
Mandem a conta para Lula
Marcelo
Carlos Alberto Sardenberg que explodira no final de 2006.
Foi quando as autoridades fi-
H
á um interessante deba- nalmente admitiram que todo
te sobre a privatização o sistema aéreo era, literal-
dos aeroportos feita pe- mente, uma permanente ame-
lo governo Dilma, mas aça de desastre: recursos mal
há também o entendimento de administrados; os aeroportos
que a mudança é positiva. E sem estrutura adequada; falta
desde já, se a coisa funcionar de pessoal especializado, co-
mais ou menos, fica assim: o mo os controladores de tráfe-
governo ganha dinheiro com go aéreo; radares com zonas
os aeroportos, ao vender as cegas; falhas nas comunica-
concessões (R$ 26 bilhões nu- ções via rádio.
ma tacada inicial!) e receber Feitas as contas, estava na
participação nos lucros e ain- cara que os recursos necessá-
da consegue turbinar os inves- rios para atacar todos esses
timentos nessa área crucial de problemas estavam muito aci-
infraestrutura. Ou seja, se ti- ma da capacidade do governo
vesse feito isso há mais tem- federal. Conclusão óbvia: era
po, o governo poderia ter utili- preciso trazer dinheiro, em-
zado em outros setores caren- presas e gente nova para o se-
tes, saúde, por exemplo, o di- tor. Vender concessões era a
nheiro que gastou em aero- óbvia saída.
portos e o que teria recebido Pelo menos três ministros
nas privatizações. E o público do governo Lula disseram a es-
estaria mais bem servido. Por te colunista que a privatização
que não se fez antes? Porque o era inevitável. A necessidade aeroporto na região de Arau- destinou uns R$ 5 bilhões à Infra- cio de 2007, houve uma se- têm de ser aprovadas em as-
então presidente Lula não dei- venceria as resistências ideo- cária. Aliás, o projeto continua ero, para os 12 aeroportos da Co- quência de greves de servido- sembleias com pelo menos
xou. lógicas. Modelos foram anali- de pé, e voltou a ser lembrado pa. Reparem como não fazia sen- res públicos da educação, pre- dois terços da categoria (a gre-
A conversa sobre privatiza- sados pelos técnicos da admi- agora que o governo fez três tido além da propaganda. Só pa- vidência, meio ambiente e ve dos PMs da Bahia seria ile-
ção dos aeroportos não é no- nistração federal, alguns che- concessões privadas de aero- ra a privatização de Guarulhos, o também da polícia. O impacto gal nos dois quesitos); e servi-
va, sobretudo no mundo pri- garam a ser anunciados. portos já existentes. Por que governo exigiu da nova concessi- foi tão negativo que até o presi- dor em greve não recebe salá-
vado. No governo FHC, tratou- Por exemplo: em julho de não autorizar a construção de onária compromisso de investi- dente Lula reclamou. Lem- rio.
se disso no segundo mandato, 2007, o então ministro da Defe- um outro, inteiramente e des- mentos de... R$ 5 bilhões. Para bram-se? Disse que funcioná- Onde está o projeto? Sumiu.
quando o presidente já estava sa, Nelson Jobim, deu prazo de de o início privado? Brasília, mais de R$ 8 bilhões. rio público em greve parecia, Os sindicatos de funcionários
desgastado e privatizar era pi- 90 dias para que a Agência Na- Resumindo: a presidente Dil- Resumo da ópera: Lula é res- na verdade, estar em férias, não gostaram, Lula esqueceu.
or do que qualquer outra coi- cional de Aviação Civil, Anac, ma e seu pessoal celebraram ponsável por um atraso de cin- pois não tinha desconto dos É sempre difícil saber como as
sa. Em suas duas campanhas e a Infraero apresentassem o os leilões de Guarulhos, Vira- co anos nessa privatização. dias parados. coisas teriam se passado se ou-
vitoriosas, Lula voltou a demo- projeto para o terceiro aero- copos e Brasília. Disseram, GREVE DE POLICIAIS Encarregou o então ministro tras providências tivessem sido
nizar a privatização, com tal porto de São Paulo. corretamente, que se inicia Tem ainda uma outra conta do Planejamento, Paulo Ber- tomadas. Mas o olhar em retros-
força que os próprios tucanos Ficou pelo caminho. A coisa uma nova era, com mais inves- para o ex-presidente, a falta de nardo, de preparar um projeto pectiva mostra, sim, o que dei-
fugiram dela como diabo da simplesmente morreu, não se timentos e mais eficiência. Por legislação regulando greves de regulamentando o tema. O mi- xou de ser feito.
cruz. Mas no segundo governo falou mais nisso. Já havia en- que não fizeram antes se todos funcionários e de policiais, co- nistro chegou a anunciar os
Lula, a partir de 2007, o tema tão um projeto preparado por estavam no governo Lula? mo essa que assombra a Ba- princípios da nova legislação. CARLOS ALBERTO SARDENBERG
voltou, quando a administra- um grupo de empresas priva- Porque Lula disse que tudo se hia. Por exemplo: servidor armado é jornalista.
ção lidava com o caos aéreo das para a construção desse resolveria com o PAC, no qual Entre o final de 2006 e o iní- não pode fazer greve; greves E-mail: sardenberg@cbn.com.br.
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