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  O
30 • REVISTA O GLOBO• 26 DE FEVEREIRO DE 2012




                                                convidado
                                                   Colunista

                                                                                               Samantha Schmutz*




                                                      ‘‘
                                                                     ‘Tudo na vida é passageiro’
                                                                        Estava tudo bem, a vida seguia seu curso          personagens, que nada tinham a ver com a
                                                                     normal. Minha vida era quase perfeita. De tão        minha perda. Era o momento deles viverem, era
                                                                     feliz, parecia usar óculos cor-de-rosa. Era          minha hora de viver, de fazer rir mesmo que-
                                                                     assim que eu enxergava a vida, à la pink             rendo chorar. Foi uma prova de fogo. Se con-
                                                  Era uma sexta-     panther. Até que certo dia o pior aconteceu.         seguisse me apresentar naquele dia, conseguiria
                                                                     Meu melhor amigo, meu defensor, meu herói            fazer em qualquer outro momento da vida. Foi
                                                 feira, e eu tinha   resolveu voar tão alto que nem minha visão
                                                                     cor-de-rosa pode alcançar.
                                                                                                                          uma maneira de ultrapassar meus próprios
                                                                                                                          limites, controlar minhas emoções e separar as
                                                      acabado de        Era uma sexta-feira, sete horas da manhã, e
                                                                     eu tinha acabado de voltar da missa, onde fui
                                                                                                                          coisas. E saber que a vida continua, como no
                                                                                                                          velho clichê: “The show must go on...” (O show

                                                 voltar da missa,    me ajoelhar aos pés de todos os santos para
                                                                     pedir que entendessem meu sofrimento e não
                                                                                                                          tem que continuar.)
                                                                                                                             O “xamanismo” do palco me manteve em pé
                                                                     levassem meu pai para longe de mim. Não sei          e recarregou minhas energias durante o es-
                                                       onde fui me   se eles não entenderam, não ouviram ou               petáculo. Claro que, no exato segundo que
                                                                     realmente tinham mais o que fazer, só sei que,       voltei a ser eu, desabei em lágrimas e con-
                                                  ajoelhar aos pés   ao chegar à portaria do meu prédio, um amigo
                                                                     estava lá me esperando. Já imaginei o pior,
                                                                                                                          tinuei chorando pelo restante do ano. Era
                                                                                                                          como se meus olhos fossem nuvens car-




                                                      ‘‘
                                                       de todos os
                                                santos para pedir
                                                que entendessem
                                                 meu sofrimento
                                                 e não levassem
                                                    meu pai para
                                                    longe de mim
                                                                     mas não quis acreditar quando ele veio em
                                                                     minha direção e disparou:
                                                                        — Ele não resistiu.
                                                                        Nesse exato segundo, o mundo parou à
                                                                     minha volta. E minha visão cor-de-rosa deu
                                                                     lugar a um efeito transition. Escureceu e passei
                                                                     a ver tudo cinza.
                                                                        O funeral foi na mesma sexta-feira, no final da
                                                                     tarde. Às sete da noite, fui para o teatro fazer
                                                                     minha peça. Na época, estava em turnê pelo
                                                                     Brasil. Coincidentemente, neste dia, o espe-
                                                                     táculo estava sendo apresentado em Niterói,
                                                                     minha cidade natal. Algumas pessoas pensaram
                                                                     que eu estava louca por fazer a peça mesmo com
                                                                     o acontecido naquele dia. Mas, por respeito ao
                                                                     público, ao teatro, ao meu pai, seu incomparável
                                                                                                                          regadas de chuva, que molhavam meu rosto
                                                                                                                          sem cessar e, com elas, muita dor, revolta e
                                                                                                                          saudade de um tempo que não volta mais. Um
                                                                                                                          tempo que está eternizado nas fotos da minha
                                                                                                                          estante e tatuado dentro de mim.
                                                                                                                             Precisava encontrar uma maneira de mudar
                                                                                                                          este filtro cinza que teimava em ofuscar meus
                                                                                                                          olhos. E foi na família, nos amigos, nos dias
                                                                                                                          ensolarados, nas cigarras cantando, no car-
                                                                                                                          naval e no amor que me agarrei. Fiz uma obra
                                                                                                                          na casa, doei suas roupas e objetos, quase
                                                                                                                          todos. Me agarrei no que ele mais quis em sua
                                                                                                                          existência... me ver feliz !
                                                                                                                             Percebi que a saudade é eterna, mas o
                                                                                                                          amor também é. Hoje, tento usar a cada dia
                                                                                                                          um filtro mais alegre no meu olhar e apro-
                                                                     senso de humor e a mim mesma, resolvi me             veitar o que a vida tem de melhor. E sempre
                                                                     apresentar naquela noite e superar o pior dia da     tenho em mente a mesma frase que tinha no
                                                                     minha vida com a minha arte.                         cartão de visita do táxi do meu pai: “Tudo
                                                                        A cortina se abriu e dei vida aos meus            na vida é passageiro.”
                                                                                                                                                *SamanthaSchmutzéatrizecomediante

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Divulgação sobre superar a perda do pai com arte e seguir em frente

  • 1. Divulgação O 30 • REVISTA O GLOBO• 26 DE FEVEREIRO DE 2012 convidado Colunista Samantha Schmutz* ‘‘ ‘Tudo na vida é passageiro’ Estava tudo bem, a vida seguia seu curso personagens, que nada tinham a ver com a normal. Minha vida era quase perfeita. De tão minha perda. Era o momento deles viverem, era feliz, parecia usar óculos cor-de-rosa. Era minha hora de viver, de fazer rir mesmo que- assim que eu enxergava a vida, à la pink rendo chorar. Foi uma prova de fogo. Se con- Era uma sexta- panther. Até que certo dia o pior aconteceu. seguisse me apresentar naquele dia, conseguiria Meu melhor amigo, meu defensor, meu herói fazer em qualquer outro momento da vida. Foi feira, e eu tinha resolveu voar tão alto que nem minha visão cor-de-rosa pode alcançar. uma maneira de ultrapassar meus próprios limites, controlar minhas emoções e separar as acabado de Era uma sexta-feira, sete horas da manhã, e eu tinha acabado de voltar da missa, onde fui coisas. E saber que a vida continua, como no velho clichê: “The show must go on...” (O show voltar da missa, me ajoelhar aos pés de todos os santos para pedir que entendessem meu sofrimento e não tem que continuar.) O “xamanismo” do palco me manteve em pé levassem meu pai para longe de mim. Não sei e recarregou minhas energias durante o es- onde fui me se eles não entenderam, não ouviram ou petáculo. Claro que, no exato segundo que realmente tinham mais o que fazer, só sei que, voltei a ser eu, desabei em lágrimas e con- ajoelhar aos pés ao chegar à portaria do meu prédio, um amigo estava lá me esperando. Já imaginei o pior, tinuei chorando pelo restante do ano. Era como se meus olhos fossem nuvens car- ‘‘ de todos os santos para pedir que entendessem meu sofrimento e não levassem meu pai para longe de mim mas não quis acreditar quando ele veio em minha direção e disparou: — Ele não resistiu. Nesse exato segundo, o mundo parou à minha volta. E minha visão cor-de-rosa deu lugar a um efeito transition. Escureceu e passei a ver tudo cinza. O funeral foi na mesma sexta-feira, no final da tarde. Às sete da noite, fui para o teatro fazer minha peça. Na época, estava em turnê pelo Brasil. Coincidentemente, neste dia, o espe- táculo estava sendo apresentado em Niterói, minha cidade natal. Algumas pessoas pensaram que eu estava louca por fazer a peça mesmo com o acontecido naquele dia. Mas, por respeito ao público, ao teatro, ao meu pai, seu incomparável regadas de chuva, que molhavam meu rosto sem cessar e, com elas, muita dor, revolta e saudade de um tempo que não volta mais. Um tempo que está eternizado nas fotos da minha estante e tatuado dentro de mim. Precisava encontrar uma maneira de mudar este filtro cinza que teimava em ofuscar meus olhos. E foi na família, nos amigos, nos dias ensolarados, nas cigarras cantando, no car- naval e no amor que me agarrei. Fiz uma obra na casa, doei suas roupas e objetos, quase todos. Me agarrei no que ele mais quis em sua existência... me ver feliz ! Percebi que a saudade é eterna, mas o amor também é. Hoje, tento usar a cada dia um filtro mais alegre no meu olhar e apro- senso de humor e a mim mesma, resolvi me veitar o que a vida tem de melhor. E sempre apresentar naquela noite e superar o pior dia da tenho em mente a mesma frase que tinha no minha vida com a minha arte. cartão de visita do táxi do meu pai: “Tudo A cortina se abriu e dei vida aos meus na vida é passageiro.” *SamanthaSchmutzéatrizecomediante