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                                             Colunista
  O
32• REVISTA O GLOBO• 1 DE ABRIL DE 2012




                                                                                                                      Ziraldo*




                                                                                                                                                                                    Divulgação
                                                                 A invenção do brasileiro
                                                                    O Humor desmitifica tudo — é mais revelador       Limoeiro, com sua mão enorme pendurada no
                                                                 — e isso pode ser uma boa justificativa para os      braço da cadeira, como bacalhau de armazém
                                                                 poderosos torná-lo menos importante do que a         — Chico Anysio não tinha uma mão tão grande
                                                                 Tragédia, como manifestação do gênio humano.         — até Salomé, ela, lá no Sul do Brasil.
                                                                    Falo do Humor — com agá maiúsculo — porque          Um escritor poderoso usa a Palavra para
                                                                 quero falar de Chico Anysio. Sobre ele, eu poderia   construir seu personagem, criar seu rosto, seus




                                                 ‘‘
                                                                 escrever um livro chamado “A invenção do bra-        gestos, seu jeito de ser, seus mistérios, sua
                                                                 sileiro”, tomando a liberdade de parodiar Harold     incongruência. Como um Deus, ele — o escritor
                                                                 Bloom que, referindo-se a Shakespeare, escreveu      — faz nascer e morrer um ser humano que pode
                                                                 seu “A invenção do humano”.                          estar, naquele momento, sendo amado, apai-
                                                                    Estou, apenas, querendo dizer que nem toda        xonadamente, por outro ser humano realmente
                                                                 a literatura brasileira, nem toda a poesia, o        existente. É com a Palavra, afinal, que se cria a
                                                                 teatro, a pintura ou, para simplificar, nem toda     Grande Arte.
                                                                 a manifestação de arte brasileira criou um             Chico Anysio fez tudo isso com seu próprio
                                                                 elenco de seres humanos brasileiros — não            corpo (e, às vezes, com uma certa — e doce —
                                                                 estou falando de personagens — tão poderoso          ingenuidade). Ele desenhou a cara — e a face —
                                               Chico foi um      como o criado por Chico Anysio.                      de cada um dos seus tipos, como se usasse a
                                                                    Duas coisas, acredito, contribuíram, gran-        Palavra para descrevê-la para seu maquiador e
                                          fenômeno único,        demente, para Chico Anysio não aparecer,
                                                                 nunca, numa lista de nossos intelectuais mais
                                                                                                                      seu cabelereiro; inventou os trajes de cada um
                                                                                                                      deles para o seu figurinista; criou, para seu




                                                 ‘‘
                                               irrepetível, o
                                                maior artista
                                                 brasileiro de
                                            todos os tempos.
                                                 Ah, sim: eu
                                           falava isto antes
                                              de ele morrer
                                                                 importantes. Primeira: ter ocorrido a ele o
                                                                 Humor como forma de expressão. Segunda: o
                                                                 seu modo de produção — que, hoje, como
                                                                 brasileiros, podíamos chamar simplesmente de
                                                                 meio: a televisão. A televisão já completou mais
                                                                 de 50 anos e não recebeu autorização do
                                                                 mundo para produzir Arte. Acrescente-se a isto
                                                                 que o que Chico Anysio fez, através desse meio,
                                                                 não podia ser feito em nenhuma outra forma de
                                                                 expressão do nosso tempo.
                                                                    Mas ele fez tudo — e não vejam nisto um
                                                                 absurdo nem menor nem maior do que a
                                                                 referência anterior a Shakespeare — o que
                                                                 Balzac fez: a nossa “Comédia Humana”, criando
                                                                 com mais Humor, mais deboche e mais ironia o
                                                                 painel mais vistoso da nossa gente, brasileiros
                                                                                                                      cenógrafo, os espaços onde a vida ia acontecer;
                                                                                                                      criou sua hipotética família, seu entorno, seus
                                                                                                                      gestos, sua voz, seu olhar, seu sorriso, sua
                                                                                                                      alegria e tristeza, sua pequenez e grandeza,
                                                                                                                      criou seu ridículo (só não criou sua dor, e aí é
                                                                                                                      possível que o Humor o tenha feito perder-se).
                                                                                                                      O certo é que ele fez nascer sua obra, explícita,
                                                                                                                      diante de nossos olhos, ao vivo e a cores.
                                                                                                                      Exibiu-nos nosso ridículo, nossa grandeza, nos-
                                                                                                                      sa pequenez e incogruências, nosso olhar, nos-
                                                                                                                      sa voz, nossos gestos, nossa casa, nosso riso.
                                                                                                                        Chico foi um fenômeno único, irrepetível, o
                                                                                                                      maior artista brasileiro de todos os tempos.
                                                                                                                        Ah, sim: eu falava isto antes de ele morrer.
                                                                                                                        P.S.: Ouvi risos de mofa e até gargalhadas
                                                                                                                      pelas citações de Shakespeare e Balzac. Tentei
                                                                 que nós todos conhecemos e com os quais nos          amenizá-las atacando com o famoso “guar-
                                                                 identificamos intensamente. Falo, apenas, de         dadas as devidas proporções” mas recuei.
                                                                 um número aproximado de 40 tipos — entre os          Enfraqueceria o texto. No tratamento final,
                                                                 200 que se menciona — desde o Coronel                optei (epa!) por mantê-las.
                                                                                                                                                     *Ziraldoéescritorecartunista

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A invenção do brasileiro por Chico Anysio

  • 1. convidado Colunista O 32• REVISTA O GLOBO• 1 DE ABRIL DE 2012 Ziraldo* Divulgação A invenção do brasileiro O Humor desmitifica tudo — é mais revelador Limoeiro, com sua mão enorme pendurada no — e isso pode ser uma boa justificativa para os braço da cadeira, como bacalhau de armazém poderosos torná-lo menos importante do que a — Chico Anysio não tinha uma mão tão grande Tragédia, como manifestação do gênio humano. — até Salomé, ela, lá no Sul do Brasil. Falo do Humor — com agá maiúsculo — porque Um escritor poderoso usa a Palavra para quero falar de Chico Anysio. Sobre ele, eu poderia construir seu personagem, criar seu rosto, seus ‘‘ escrever um livro chamado “A invenção do bra- gestos, seu jeito de ser, seus mistérios, sua sileiro”, tomando a liberdade de parodiar Harold incongruência. Como um Deus, ele — o escritor Bloom que, referindo-se a Shakespeare, escreveu — faz nascer e morrer um ser humano que pode seu “A invenção do humano”. estar, naquele momento, sendo amado, apai- Estou, apenas, querendo dizer que nem toda xonadamente, por outro ser humano realmente a literatura brasileira, nem toda a poesia, o existente. É com a Palavra, afinal, que se cria a teatro, a pintura ou, para simplificar, nem toda Grande Arte. a manifestação de arte brasileira criou um Chico Anysio fez tudo isso com seu próprio elenco de seres humanos brasileiros — não corpo (e, às vezes, com uma certa — e doce — estou falando de personagens — tão poderoso ingenuidade). Ele desenhou a cara — e a face — Chico foi um como o criado por Chico Anysio. de cada um dos seus tipos, como se usasse a Duas coisas, acredito, contribuíram, gran- Palavra para descrevê-la para seu maquiador e fenômeno único, demente, para Chico Anysio não aparecer, nunca, numa lista de nossos intelectuais mais seu cabelereiro; inventou os trajes de cada um deles para o seu figurinista; criou, para seu ‘‘ irrepetível, o maior artista brasileiro de todos os tempos. Ah, sim: eu falava isto antes de ele morrer importantes. Primeira: ter ocorrido a ele o Humor como forma de expressão. Segunda: o seu modo de produção — que, hoje, como brasileiros, podíamos chamar simplesmente de meio: a televisão. A televisão já completou mais de 50 anos e não recebeu autorização do mundo para produzir Arte. Acrescente-se a isto que o que Chico Anysio fez, através desse meio, não podia ser feito em nenhuma outra forma de expressão do nosso tempo. Mas ele fez tudo — e não vejam nisto um absurdo nem menor nem maior do que a referência anterior a Shakespeare — o que Balzac fez: a nossa “Comédia Humana”, criando com mais Humor, mais deboche e mais ironia o painel mais vistoso da nossa gente, brasileiros cenógrafo, os espaços onde a vida ia acontecer; criou sua hipotética família, seu entorno, seus gestos, sua voz, seu olhar, seu sorriso, sua alegria e tristeza, sua pequenez e grandeza, criou seu ridículo (só não criou sua dor, e aí é possível que o Humor o tenha feito perder-se). O certo é que ele fez nascer sua obra, explícita, diante de nossos olhos, ao vivo e a cores. Exibiu-nos nosso ridículo, nossa grandeza, nos- sa pequenez e incogruências, nosso olhar, nos- sa voz, nossos gestos, nossa casa, nosso riso. Chico foi um fenômeno único, irrepetível, o maior artista brasileiro de todos os tempos. Ah, sim: eu falava isto antes de ele morrer. P.S.: Ouvi risos de mofa e até gargalhadas pelas citações de Shakespeare e Balzac. Tentei que nós todos conhecemos e com os quais nos amenizá-las atacando com o famoso “guar- identificamos intensamente. Falo, apenas, de dadas as devidas proporções” mas recuei. um número aproximado de 40 tipos — entre os Enfraqueceria o texto. No tratamento final, 200 que se menciona — desde o Coronel optei (epa!) por mantê-las. *Ziraldoéescritorecartunista